Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
955/22.4T8MCN.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANABELA MORAIS
Descritores: PRESTAÇÃO DE CONTAS
ADMINISTRAÇÃO DE BENS DO CASAL
CASO JULGADO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RP20240408955/22.4T8MCN.P1
Data do Acordão: 04/08/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL
Indicações Eventuais: 5. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Recai sobre o ex-cônjuge, enquanto administrador dos bens comuns do casal, a obrigação de prestar contas. Não tendo cumprido o ónus de apresentar contas, no âmbito de acção de prestação de contas, apesar de notificado para o efeito e com a cominação de, não o fazendo, não lhe ser permitido apresentar contestação às contas que a autora venha a apresentar, a preclusão intraprocessual obsta a que o acto seja praticado em momento posterior.
II - A preclusão intraprocessual transforma-se em extraprocessual quando o obrigado que não cumpriu o ónus de apresentar as contas, pretende, após o momento definido para o efeito, apresentar contas em acção de prestação de contas por si intentada pois, o que não foi praticado no processo anterior também não pode ser realizado em processo posterior.
III - Existindo no processo antecedente, uma decisão transitada em julgado, a preclusão extraprocessual actua através da excepção de caso julgado e conduz à absolvição da ré da instância.
IV - A condenação como litigante de má fé só deve ocorrer quando se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu dolosamente ou com grave negligência, com o fito de impedir ou a entorpecer a acção da justiça.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 955/22.4T8MCN.P1

Acordam os Juízes da 5ª Secção (3.ª Secção Cível) do Tribunal da Relação do Porto, sendo

Relatora: Anabela Morais

Primeiro Adjunto: Desembargador Jorge Martins Ribeiro

Segundo Adjunto: Desembargador José Eusébio Almeida

I - Relatório

AA intentou a presente acção especial de contas, nos termos do artigo 941º e seguintes do Código de Processo Civil, contra BB, pedindo que sejam aprovadas as contas por si prestadas e, consequentemente, condenada a Ré a pagar-lhe a quota parte pela qual é responsável, no montante de €31.287,52 (trinta e um mil duzentos e oitenta e sete euros e cinquenta e dois cêntimos) ou no montante que se vier a apurar.

Subsidiariamente, com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa, pediu que a presente acção seja julgada procedente por provada e a Ré condenada a pagar-lhe a quantia de €31.287,52 (trinta e um mil duzentos e oitenta e sete euros e cinquenta e dois cêntimos), acrescida de juros contados à taxa legal desde a citação até integral e efectivo pagamento.

Alegou, em síntese, que:

i. O processo de inventário para partilha dos bens comuns por dissolução do matrimónio correu no Cartório Notarial do Dr. CC, sob o nº 246/13, no qual o A. foi nomeado cabeça de casal, tendo transitado para a via judicial para a homologação do mapa da partilha, o que sucedeu por sentença proferida no âmbito do processo n.º 1114/19.9T8PRD que correu termos no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, Juízo de Família e Menores de Paredes – Juiz 2.

ii. As contas ora apresentadas reportam-se ao período entre Outubro de 2013 e a data do trânsito em julgado da sentença, proferida em 2 de Maio de 2019, no processo de inventário, e à administração dos bens comuns do casal, após decretado o divórcio;

iii. Sem esta prestação de contas, “permanecerão por partilhar determinados montantes que não foram reconhecidos pela Ré”, quer no processo de inventário e na partilha, quer na acção de prestação de contas por esta proposta (Proc. n.º 768/15.0T8MCN), mas dos quais tem pleno conhecimento.

iv. A prestação de contas em causa reporta-se:

a) a dois créditos bancários contraídos com vista à compra da casa de morada de família, entretanto pagos pelo A. e cuja responsabilidade de pagamento era de ambos os cônjuges;

b) um crédito contraído, por ambos, após o divórcio;

c) às contas nunca efectuadas entre as partes, referentes às despesas várias após a propositura do divórcio e o trânsito em julgado do processo de inventário.

v. Tanto em sede de inventário, como no âmbito da acção para prestação de contas (processo nº 768/15.0T8MCN), tão só foram prestadas contas relativas ao período de 26 de Agosto de 2010 a Outubro de 2013, não obstante ter continuado a pagar as despesas e encargos referentes aos bens sem que a Ré contribuísse com a sua parte.

vi. Não se encontra precludido o direito do Autor porquanto,  as partes “não acertaram contas no que se reporta às prestações bancárias, capital, juros e comissões bancárias, seguros e semelhantes, decorrentes dos empréstimos bancários para aquisição/construção do imóvel que foi a casa de morada de família”, no montante de €60.569,13 (sessenta mil quinhentos e sessenta e nove euros e treze cêntimos), bem como, não acertaram contas quanto:

a) ao imposto (IMI) pago pelo cabeça de casal – aqui A., em 2014 e 2015, o que ascende à quantia de €1.637,42 (mil seiscentos e trinta e sete euros e quarenta e dois cêntimos);

b) ao imposto de circulação do veículo automóvel de Marca Fiat, no montante de € 290,54 (duzentos e noventa euros e cinquenta e quatro cêntimos);

c) ao pagamento de uma coima, ao Serviço de Finanças, no montante de €77,94 (setenta e sete euros e noventa e quatro cêntimos);

vii. O Autor pagou, na qualidade de cabeça de casal, sem que a Ré contribuísse com a sua parte, no valor global de €31.287,52 (trinta e um mil duzentos e oitenta e sete euros e cinquenta e dois cêntimos).

Concluiu que se verificam todos os requisitos do instituto do enriquecimento sem causa porquanto, foi quem, investido na qualidade de cabeça de casal, suportou as despesas alegadas e que eram responsabilidade do dissolvido casal, não tendo a Ré pago qualquer valor.


*

Citada, a Ré apresentou contestação, invocando a ineptidão da petição inicial com fundamento na cumulação de pedidos e de causas de pedir distintos, diferenciados e substancialmente incompatíveis; e a excepção do caso julgado.

Alegou, em síntese, que:

i. Em 07 de Janeiro de 2015, intentou acção de prestação de contas que correu os seus termos  sob o nº 768/15.0T8MCN, na qual formulou o pedido de o Réu, aqui Autor, na qualidade de administrador dos bens que integravam o património comum do ex-casal, apresentar contas relativamente a esse exercício de administração.

ii. Nessa acção, foi apresentada contestação e em audiência de julgamento, realizada em 13 de Abril de 2016, foi alcançada transacção, homologada por sentença, nos termos da qual comprometeu-se o Réu a apresentar tais contas, no prazo de vinte dias.

iii. Não tendo o Réu, ora Autor, apresentado quaisquer contas e por via disso, e nos termos do disposto no artº 943 do Código de Processo Civil, a então Autora foi notificada para apresentar contas, o que fez.

iv. Proferida sentença que foi objecto de recurso interposto pelo ora Réu para o Tribunal da Relação que o julgou parcialmente procedente, reduzindo o montante fixado na sentença proferida na primeira instância para metade, julgando, com fundamento no caso julgado, improcedente o mais alegado e invocado pelo recorrente, atenta a transacção atrás referida homologada por sentença transitada; deste Acórdão o então Réu, agora Autor, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que confirmou a decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto.

v. Na pendência da referida Acção de Prestação de Contas, o Réu apresentou articulado superveniente através do qual pretendia apresentar contas, o que foi indeferido, por intempestivo.

vi. Estando definitivamente solucionada a questão da prestação de contas, está vedado, ao Autor, reclamar a prestação de quaisquer contas relativas ao período de Setembro de 2010 a Setembro de 2020, por força do instituto do caso julgado.

viii. Nos termos do disposto no artigo 45º da Lei 23/2013 – lei em vigor à data do referido inventário — até quinze dias antes da realização da Conferência de Interessados, o cabeça de casal deve apresentar a conta do cabecelato, ou seja, as contas relativas a eventuais despesas por ele suportadas e respeitantes aos bens comuns a partilhar, o que o Autor, enquanto cabeça de casal, não fez, pelo que se encontra precludido o direito de, agora, reclamar prestação de contas.

ix. Nos termos do disposto no artº 474 do Código Civil, não há lugar à restituição por enriquecimento sem causa, caso a lei preveja e faculte outro meio para a obtenção da quantia reclamada, o que sucede no caso pois, a lei prevê e faculta meios processuais ao cabeça de casal para prestar contas relativas a despesas por ele efectuadas respeitantes a bens do património comum.

x. Ainda sobre o instituto do enriquecimento sem causa, invoca a prescrição porquanto o Autor, pelo menos, desde 6 de Junho de 2016, tem perfeito conhecimento da sentença que homologou a partilha.

xi. A prestação de contas não obedece aos requisitos processuais, o que obstaculiza o exercício do direito de defesa da Ré, limitando-se a alegar que permanecem por partilhar determinados montantes que não foram reconhecidos pela Ré, mas dos quais tem pleno conhecimento.

xii. Todo o património comum do ex-casal acha-se definitivamente partilhado, pois o que é objecto de partilha é o património comum e não as contas.

Conclui, pugnando pela procedência das excepções com a consequente absolvição do pedido ou se assim se não entender, deve ser julgada improcedente a acção por não obedecer aos requisitos processuais.

I.1 - Por despacho de 6/11/2022, foi determinada a notificação do autor “para, em 10 dias apresentar as contas de acordo com o nºs 1 e 3 do artigo 944º do CPC.”.

I.2 - Em 21/11/2022, o Autor apresentou requerimento com a conta-corrente.

I.3 - Em 5/12/2022, foi proferido o seguinte despacho:

Cite a ré para contestar as contas apresentadas nos termos do artigo 946º, nº1 do CPC”.

I.4 - A Ré apresentou requerimento, reiterando o já alegado. Sustentou, ainda, que a conta corrente apresentada apenas retrata débitos e, no período nela expresso, de 31 de Julho 2013 a 10 de Setembro 2021, o Autor possuiu e fruiu, de forma exclusiva, todos os imóveis que integravam o património comum do casal, pelo que, da conta corrente deve, obrigatoriamente, constar na rubrica haver, a receita arrecadada decorrente desse uso e fruição, designadamente o rendimento auferido pelo uso exclusivo de um dos imóveis, onde tem instalada uma oficina de reparação de veículos automóveis, venda de pneus e objectos afectos a veículos.

Argumentou, ainda, que não pode aceitar as contas apresentadas pois, o Autor não indicou com precisão a que se refere o pagamento de prestações ao Banco; na conta-corrente alude a supostos pagamentos feitos em datas anteriores à Conferência Preparatória à Conferência de Interessados, pese embora, a presente acção se reporte “ao período entre Outubro de 2013 até à data do trânsito em julgado do processo de inventário, cuja sentença data de 2/05/2019”; o  Autor não era, nem é, administrador de bens alheios, designadamente, da Autora desde, pelo menos, a data em que foi proferida a sentença judicial que homologou a partilha ou do seu trânsito ocorrido em 6 de Junho 2019.

I.5 - Por despacho de 17/1/2023, foi determinada a notificação do Autor, “nos termos do artigo 945º, nº1 e do artigo 3º do CPC, para responder à matéria e excepção invocada”.

I.6 - Por Requerimento de 17/1/2023, a Ré reiterou o já alegado por requerimento datado de 5 de Dezembro de 2022.

I.7 - Por Requerimento de 30/1/2023, o Autor pronunciou-se sobre a ineptidão da petição inicial e o caso julgado.

Alegou, em síntese, que exerceu as funções de cabeça de casal no processo de inventário/partilha e que a presente acção de prestação de contas em nada colide com a acção de prestação de contas proposta pela Ré – processo n.º 768/15.0T8MCN - que se encontra finda e acertadas as contas sob a qual versou.

No processo nº 768/15.0T8MCN, as contas então prestadas reportaram-se ao período de 26 de Agosto de 2010 a Outubro de 2013 e: a) à ocupação da residência e proveito exclusivo do R.; b) à utilização exclusiva do recheio; c) ao rendimento médio mensal proveniente do exercício da actividade da oficina; e d) à utilização exclusiva dos veículos automóveis. A presente prestação de contas reporta-se ao período entre Outubro de 2013 e a data do trânsito em julgado do inventário, passando pelos créditos entretanto pagos pelo A. e cuja responsabilidade era de ambos os cônjuges.

Pronunciando-se sobre a prescrição, refere que a sentença proferida no processo de inventário transitou em julgado em 6 de Junho de 2019, mas continuou a pagar créditos bancários cuja responsabilidade era de ambos os cônjuges – A. e Ré. Só em Agosto e Setembro do ano transacto é que liquidou, sozinho, os créditos bancários, data a partir da qual pode, com clareza e exactidão, reclamar junto da R. o seu crédito.

Concluiu, pugnando pela improcedência das excepções invocadas.

I.8 - Em 26/5/2023, foi realizada audiência prévia, tendo sido proferido o seguinte despacho: “Ouvidas as partes sobre a matéria das excepções alegadas e o Tribunal entender que a resolução das mesmas, obriga a um estudo aprofundado, razão pela qual, e ainda considerando que não é possível qualquer acordo, se determina que os autos sejam conclusos, para prolação do respectivo despacho saneador”.

I.9 - Em 3/7/2023, foi proferida decisão, tendo o Tribunal a quo julgado “precludido o direito do autor de apresentar contas e em consequência absolv[ido] a ré dos pedidos”.

I.10 - Inconformado com a decisão, o Autor/Recorrente interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões:

“1ª Recorre do despacho/sentença que pós termo ao processo em nosso entender não vislumbrou questões fulcrais e indispensáveis – quer de facto quer de direito – para uma justa e equitativa decisão da causa - o que resultou em lato erro na apreciação da matéria, de facto e de direito, trazida à lide e consequente decisão;

2ª Erro notório na apreciação da matéria factual e consequente do pedido trazido à lide - **PRESTAÇÃO DE CONTAS DO PERÍODO ENTRE OUTUBRO DE 2013 E MAIO DE 2019 - data do trânsito em julgado do processo de inventário/partilha - contemplando ainda o pagamento efectuado pelo A/recorrentes dos empréstimos contraídos pelo ex. casa - vide documentos 78 e 79 da petição inicial - consequente erro na aplicação da lei;

3ª Discorda o Recorrente da decisão que recaiu sobre a ação por si apresentada, relativamente à:

• Inadmissibilidade da prestação de contas;

• Decisão de caso julgado anterior;

4ª Neste peça o A./Recorrente transcreveu as seguintes peça:

* P.I. de prestação de contas; Contestação da R.; Resposta às excepções; Despacho/sentença de que se recorre - que dão para efeitos conclusões reproduzidos;

5ª A proceder a decisão em crise levará a que o A., aqui Recorrente, suporte todas as despesas, desde 2013, sozinho, despesas estas que dizem respeito ao ex-casal e que a ex-cônjuge, R., nunca suportou e ao que parece sequer teve intenção de suportar;

6ª Visa-se na presente lide Outubro de 2013 a Maio de 2019 - data em que transitou o processo de inventário/partilha, sendo certo que, as contas ora que se pretende prestar englobam, igualmente empréstimos bancários liquidados pelo A./Recorrentes e que são da responsabilidades de ambos - isto já no decorrer do anos de 2021 - vide doc. 78 e 79 da p.i. - interpôs a ação com a finalidade de ver acertadas as contas entre si e a sua ex-cônjuge, algo que não foi realizado nem na pendência do processo de inventário, e nem após o seu trânsito em julgado - Maio de 2019;

7ª Não é justo e nem é de lei ser desconsiderado, em função de uma anterior prestação de contas, que em nada se relaciona com esta, o pedido trazido nesta lide à consideração do Tribunal “a quo”;

8ª As contas prestadas nos autos de proc. nº 768/15.0T8MCN em nada colidem com as que ora se pretende prestar sequer o período temporal coincide;

9ª Continuamos a ter um hiato temporal que se encontra desprovido de prestação de contas, pelo menos de parte delas, bem contas pagas pelo A./Recorrente e que nunca prestou contas à Recorrida;

10ª Entendemos não ter precludido o direito por em 2016 ter sido peticionada uma acção de prestação de contas a já identificada, até porque, na data os empréstimos ainda não haviam sido liquidados vide doc 78 e 79 da p.i, em resumo:

** não falamos do mesmo período;

** nem tão pouco do mesmo objecto, repare-se as contas que ora se prestam naquela data ainda era impossível prestá-las só posteriormente foram para pelo A./Recorrente,

11ª No primeiro processo de prestação de contas, prestavam-se contas referentes:

i. Ocupação da residência e proveito exclusivo do R.;

ii. Utilização exclusiva do recheio;

iii. Rendimento médio mensal proveniente do exercício da actividade da oficina; oficina;

iv. Utilização exclusiva dos veículos automóveis;

12ª Há que ter em conta o período posterior em que o A., aqui Recorrente, continuou a fazer face a despesas que incumbiam a ambos – Falamos aqui de despesas relativas a créditos bancários da responsabilidade do aqui Recorrente e da R., ex. cônjuges;

13ª De modo a não se suscitarem dúvidas, referimo-nos, em concreto, a:

E) Dois créditos bancários contraídos com vista à compra da casa de morada de família;

F) Um outro crédito contraído por ambos já após o divórcio;

G) Contas nunca efectuadas entre as partes, relativas a despesas diferenciadas após a propositura do divórcio e o trânsito em julgado do processo de inventário;

14ª Falamos de:

despesas relativas à casa de morada de família, desde 2016 até 2021, nomeadamente créditos, seguros, capital, juros e comissões bancárias, no valor de € 60.569,13 (sessenta mil quinhentos e sessenta e nove euros e treze cêntimos);

IMI relativo aos anos de 2013 e 2014, no valor de € 1.637,42 (mil seiscentos e trinta e sete euros e quarenta e dois cêntimos);

IUC relativo ao veículo automóvel marca FIAT, dos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017, no valor de €290,54 (duzentos e noventa euros e cinquenta e quatro cêntimos);

Coimas ao Serviço de Finanças do Marco de Canaveses no valor de € 77,94 (setenta e sete euros e noventa e quatro cêntimos) -

• Somando estes valores obtemos um total de € 62.575,03 (sessenta e dois mil quinhentos e setenta e cinco euros e três cêntimos), que, divido por ambos, perfaz o valor de € 31.287,52 (trinta e um mil duzentos e oitenta e sete euros e cinquenta e dois cêntimos);

15ª São créditos e despesas da responsabilidade de ambos, apenas o Recorrente assumiu a liquidação, não por sua vontade, mas tão só porque a R. ignorou uma responsabilidade que também era sua;

16ª Responsabilidade esta que, e voltando a reforçar, nunca foi objecto de qualquer prestação de contas como se quer fazer crer ou fazer ignorar;

17ª O argumento para a decisão é, portanto, o de que o Recorrente não prestou contas quando o deveria ter feito, pelo que não tem agora esse direito. Basear a decisão nesse argumento – e apenas esse – demonstra uma má leitura dos factos, por tudo aquilo que já foi dito;

18ª Sei que nos repetimos mas... as contas em questão na presente acção não serem as mesmas que outrora foram objecto de um outro processo (já acima mencionado);

19ª A primeira prestação de contas, no âmbito do proc. 768/15.0T8MCN, abarcou os seguintes bens, que vêm descriminados na respectiva p.i., no art. 6º, alíneas a), b) e c):

H) “A) Prédio urbano sito na Travessa ... [a folhas 101 verso dos autos a autora afirma que este prédio urbano se situa na rua ... extinta freguesia ..., Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial de Marco de Canaveses pela ficha ...38 e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...48 (antigo 18) - OCUPAÇÃO DA RESIDÊNCIA E PROVEITO EXCLUSIVO UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA DO RECHEIO DO A./RECORRENTE;

I) Prédio urbano sito na Rua ..., freguesia ..., concelho de Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial pela ficha ...23 e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...92 (antigo ...20) -UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA DO RECHEIO;

J) Estabelecimento de reparação de veículos automóveis e comércio de pneus, que gira comercialmente em nome individual de AA, instalado na Rua ..., Marco de Canaveses (extinta freguesia ...), descrito na Conservatória do Registo Predial sob a ficha ...23, inscrito na matriz sob o artigo ...92 (artigo ...20 da extinta freguesia ...), no qual se inclui a universalidade de máquinas, peças, máquinas, ferramentas, equipamentos, mobiliário e várias peças rendimento médio mensal proveniente do exercício da actividade da oficina -RENDIMENTO MÉDIO MENSAL PROVENIENTE DO D O EXERCÍCIO DA ACTIVIDADE DA OFICINA;

K) Veículo automóvel da marga Peugeot, matrícula TN-..-..; veículo automóvel da marca FIAT, modelo ..., matrícula ..-..-QB; veículo automóvel da marca Ford, modelo ..., matrícula HB-..-..; veículo automóvel da marca Volkswagen, modelo GF modelo ...”, com matrícula GF--..-.. -..; veículo automóvel da marca Kia, matrícula ..-..-LA; veículo automóvel da marca Fiat, modelo ..., matrícula RT-..-..; veículo automóvel da marca Ford, modelo ...; veículo automóvel da marca Renault, modelo ..., matrícula ..-..-GE.” UTILIZAÇÃO EXCLUSIVA DOS VEÍCULOS AUTOMÓVEIS.

20ª Voltamos a reiterar:

* Não se tratam dos mesmos bens;

** O objecto das prestações de contas não é o mesmo;

*** Nem se reporta ao mesmo período.

21ª Em momento algum foi mencionado nos autos deste processo o estabelecimento comercial em nome individual do aqui Recorrente nos os autos deste processo estão em causa créditos bancários que apenas em Agosto e Setembro do ano transacto foram liquidados pelo A., aqui Recorrente, e que, por esse motivo, nunca poderiam ter sido objecto de outra prestação de contas.

22ª Ignorar este facto reforça na pessoa do Recorrente um sentimento de injustiça, já que vê serem sucessivamente ignorados os seus direitos, quando o mesmo não ignorou os seus deveres, muito embora não fossem apenas seus.

ERRO NA APLICAÇÃO DA MATÉRIA DE DIREITO:

23ª Entendeu O tribunal “ a quo” que: “.... o legislador consagrou expressamente a impossibilidade de contestar as contas prestadas, quando o obrigado não o faça no prazo fixado (artigo 942º, nº5 e 943º, nº2 do CPC), impossibilitando-o de sindicar as contas apresentadas pela parte que não estava obrigada a fazê-lo.

Admitir que a parte que não pode contestar, sancionada com a restrição imposta, possa à posteriori vir apresentar ação de prestação de contas é desvirtuar a imposição legal, admitindo à posteriori o que fora vedado.

Entendemos que tal não é admissível e contraria expressamente o que foi consagrado pelo legislador. ”

“Não pode o autor pretender exercer um direito cujo exercício está precludido e por conseguinte, cumpre absolver a ré do pedido formulado, considerando-se inútil a apreciação das demais questões suscitadas.”

23ª Salvo mais douta opinião, entende o Recorrente estarmos perante um erro na aplicação e interpretação do Direito, e com todo o respeito o dizemos isto porque, como já foi anteriormente exposto pelo Recorrente em sede de resposta às excepções, e como aliás já foi referido no presente recurso, a acção de prestação de contas que está aqui em causa em nada colide com a anterior acção – proc. nº 768/15.0T8MCN –, nem com o também anterior processo de inventário.

24ª A decisão judicial transita em julgado quando já não é susceptível de reclamação, nem de recurso ordinário, formando, nesse momento, o caso julgado formal ou material;

25ª No que respeita ao caso julgado formal, e como bem indica o artigo 620º do CPC, no seu nº1, este tem força dentro do próprio processo, ou seja, a sentença ou despacho que recaiam simplesmente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro daquele processo, não indo para além do mesmo;

26ª No caso julgado material tem por finalidade evitar que a relação jurídica material seja apreciada novamente, ofendendo o princípio da economia processual, no entanto, a situação controvertida que aqui analisamos e pretendemos ver julgada não é a mesma, como temos, aliás, vindo a referir ao longo das alegações - foram prestadas contas, mas não aquelas que se pretendem ver prestadas na acção em crise, pelo que não existe caso julgado algum a conflituar com o direito do ora Recorrente;

27ª No entanto, o caso julgado pode fazer-se valer por outra via: a via da autoridade, no entanto não nos parece, de todo, que estejamos perante uma relação de prejudicialidade.

28ª A acção relativa à primeira prestação de contas realizada, está completamente finda. As contas foram prestadas e não se pretende agora corrigir qualquer valor ou decisão outrora tomada.

29ª A situação agora em crise evidencia-se individual, autónoma, relativamente à anterior, não existindo qualquer prejudicialidade - daí que, de forma alguma, estejamos perante caso julgado.

30ª A interpretação jurídica realiza-se através de elementos, meios, factores ou critérios que devem utilizar-se harmónica e não isoladamente, isto é, além do elemento literal, o intérprete tem de se socorrer dos elementos lógicos, com os quais se tenta determinar o espírito da lei, a sua racionalidade ou a sua lógica.

31ª Posto isto, quem decide tem, para além de avaliar a matéria de direito e aplicá-la, de se colocar na posição do homem médio e assim interpretar as circunstâncias em que os factos ocorreram, assim se dispondo a produzir uma solução justa e equitativa e adequada à realidade do factos.

32ª E como bem se tem vindo a dizer, não estamos perante a mesma situação, estamos perante períodos e objectos distintos dos que outrora já foram julgados e decididos, daí que não haja risco de contradição ou reprodução de decisão anterior.

33ª O que nos é referido pelo legislador, no artigo 943º, n.º2 do CPC, é que o réu não pode contestar as contas apresentadas, “depois de obtidas as informações e feitas as averiguações convenientes” – isto depois de o mesmo não ter apresentado as contas a que estava obrigado, em sede de outro processo.

34ª O Tribunal “a quo” vai neste mesmo sentido, quando refere que “admitir que a parte não pode contestar, sancionada por uma restrição imposta, possa à posteriori vir apresentar ação de prestação de contas é desvirtuar a imposição legal, admitindo à posteriori o que fora vedado”.

35ª No entanto, parece-nos, mais uma vez, que estamos perante uma confusão e má interpretação da letra da lei e dos factos enunciados, no sentido em que o Recorrente não pretende contestar quaisquer contas que foram apresentadas em sede de outro processo.

36ª Não se está, por isso, a desvirtuar qualquer imposição legal, já que o Recorrido aceitou a imposição que lhe foi feita e não tem por objectivo fazer sequer menção a contas já realizadas - pretende, somente, exercer um direito seu, que não se encontra precludido.

37ª O A., aqui Recorrente, não tem pretensão de exigir uma prestação de contas que já não é possível, precisamente porque essas contas anteriores já foram prestadas e as contas foram acertadas.

38ª Sendo o Recorrente o administrador dos bens comuns do casal, não existem dúvidas de que ele é igualmente o titular deste direito e, aliás, um dos obrigados a fazer a prestação de contas - no entender do Recorrente, não existe qualquer oposição legal à prestação de contas que na presente data ele tem como pretensão.

39ª E, posto tal, existindo um qualquer caso julgado, o mesmo não interfere com a presente acção de prestação de contas intentada pelo Recorrido - Tratamos de situações díspares, que não se encontram temporalmente ou ao nível do seu objecto.

Conclui-se pela existência de uma má interpretação na leitura da matéria de facto e de Direito, e por isso devem as mesmas ser reapreciadas, sob pena de uma injusta divisão das despesas que dizem respeito aos ex. cônjuges, que apenas o aqui Recorrido suportou, reforçando na sua pessoa um sentimento de desagrado e total descrença na Justiça.

Devendo, consequentemente o presente despacho/sentença ser substituído por outro que mande prosseguir os autos de prestação de contas.

Assim se fazendo justiça”.


*

I.11 - Notificada, a Recorrida/Ré apresentou resposta, formulando as seguintes conclusões:

“1) A peça recursiva do recorrente padece de vício formal: as conclusões apresentadas não cumprem o ónus legal de síntese e condensação que a lei processual exige, nem indica a norma ou normas legais que no seu entender não foram observadas pela Mtª Juíza a quo o que obsta ao conhecimento do recurso [artigos 639.º n.º 1 e 652.º n.º 1 alínea b) do CPC.]

2) O inventário para partilha dos bens comuns do ex-casal findou por sentença homologatória da partilha datada de 2 de Maio 2019.

3) Efectuada a partilha dos bens comuns do ex-casal cessaram as funções de cabeça de casal em que tinha sido investido o Apelante.

4) E, consequentemente, as de administrador dos bens da Apelada.

5) Daí a falta de legitimidade do mesmo para deduzir o pedido dos autos.

6) Nos autos de Inventário que correu os seus termos pelo Cartório Notarial do Licenciado CC sob o nº…46/13 cujos principais peças se acham juntas aos presentes autos, o aí Cabeça de Casal não cumpriu a as funções de lhe impunham a apresentação de todas as contas – activos e passivo.

7) E igualmente não utilizou o disposto o artº 45 da Lei 12/2013.

8) Na conferência de Interessados foi fixado o valor do passivo por acordo e o mapa de partilhas respeita esse valor.

9) As contas não são objecto de partilha. As contas acertam-se.

10) O documento ―Conta Corrente, apresentado pelo Apelante, sinaliza como despesas sob o item prestação da casa e seguros, valores que foram integrados no passivo, ainda que com pagamento diferido no tempo.

11) E os valores referentes a impostos correspondem a datas anteriores quer à Conferência Preparatória e Conferência de interessados quer à sentença homologatória da partilha.

12) Esta factualidade expressa à evidência nos autos, constituem fundamento acessório à absolvição da Apelada.

13) A sentença em escrutínio limitou-se a aplicar a lei face aos factos constantes dos autos e fez o adequado enquadramento jurídico/legal.

14) O Apelante não apresentou contas conforme sentença que homologou a transacção na  qual a tanto se obrigou.

15) Sendo-lhe vedado por força da lei — artº 943 do Código Processo Civil— contestar as contas apresentadas pela aqui Apelada.

16) A conduta processual do Apelante desenvolvida nos autos da acção de prestação de contas – Proc. nº 768/15.0T8MCN, nos autos de inventário –Proc. nº ..6/13 e nos presentes autos é passível de repreensão legal como conduta abrangida pelo disposto no artº 542 do Código de Processo Civil.

17) Donde se impõe a condenação do Apelante como litigante de má fé, nos termos da indicada norma processual e seguintes”.


*

Por despacho de 11/11/2023, foi admitido o recurso, nos termos legais.

*

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

*

II - Questões a decidir:

Nos termos dos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil, são as conclusões das alegações de recurso que estabelecem o thema decidendum do mesmo, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso que resultem dos autos.

Assim, são as seguintes as questões a decidir:
a. Não cumprimento, pelo Recorrente, do ónus de formular conclusões e do ónus de enunciar a norma ou normas jurídicas violadas.
b. Preclusão do direito do Autor de apresentar contas referente à administração dos bens do ex-casal, por referência ao período de Outubro de 2013 até à data do trânsito da sentença proferida no processo de inventário que homologou o mapa de partilha.
c. Ilegitimidade do Recorrente para a presente acção de prestação de contas em face da sentença homologatória da partilha dos bens comuns do ex-casal, datada de 2 de Maio 2019, e da cessação das funções de cabeça de casal em que o mesmo tinha sido investido.
d. Direito do Autor a metade do saldo por si indicado com fundamento no instituto do enriquecimento sem causa.
e. Condenação do Recorrente como litigante de má fé pela conduta processual do Recorrente, desenvolvida no processo de prestação de contas nº 768/15.0T8MCN, no processo de inventário nº ...46/13 e nos presentes autos.

III. Fundamentação de facto

Com relevância para apreciação do objecto do presente recurso, encontram-se assentes os seguintes factos:

1. O Autor AA e a Ré BB contraíram matrimónio um com o outro segundo o regime de comunhão de adquiridos [certidão junta com a petição].

2. Por sentença de 13/12/2012, transitada em julgado em 1/2/2013, foi decretado o divórcio e dissolvido o casamento entre o ora Autor, AA, e a ré BB.

3. No Cartório Notarial do Dr. CC, sito na cidade ..., correu o processo de inventário para partilha de bens subsequente ao divórcio, para separação das meações, sob o nº ...46/13, no qual exerceu o cargo de cabeça-de-casal o ora Autor, AA [certidão junta com a petição].

4. Nesse inventário, o cabeça de casal, ora Autor, apresentou relação de bens, constando da mesma:

“Direitos de crédito”

Do cabeça de casal sobre a Requerida BB

Verba nº1 – crédito no valor de €3.645,20 relativo ao pagamento de IMI pago pelo Cabeça de Casal, correspondente aos prédios descritos nas verbas nºs 13 e 14 dos bens imóveis…

- no ano de 2010: 838,76€

- no ano de 2011: 838,76€

- no ano de 2012: 838,76€

- no ano de 2013: 1.128,92€

Verba nº2 – Imposto único de circulação, referente ao automóvel descrito na verba nº7 dos veículos, pago pelo requerente …

- 2010, no valor de 33,10€

- 2011, no valor de 48,83€

- 2012, no valor de 34,61€

- 2013, no valor de 35,06€

Verba nº3 – Crédito que o cabeça de casal detém relativamente ao pagamento por si efectuado, correspondente a metade do valor da prestação para pagamento do crédito descrito na verba nº2 do passivo, no valor de 1.240,00€ que corresponde a oito prestações pagas por ele no valor de 155,35€ cada, desde o mês de Março de 2012 a Outubro de 2012…

Verba nº4 - Crédito do cabeça de casal relativamente às despesas geradas com o crédito descrito na verba nº2 do passivo, nomeadamente:

- cobrança de avaliação

- comissão do processo

- escritura

 

Verba nº5  – Crédito do cabeça de casal no valor de €16.5676,50, relativo às prestações do crédito à habitação, pagas ao Banco 1..., conta nº ...42, desde a data da separação até à data de 15 de Setembro de 2013 ….

Veículos

Verba nº6 – um veículo automóvel da marca Peugeot, matrícula TN-..-.., …;

Verba nº7 - um veículo automóvel da marca Fiat, modelo ..., matrícula ..-..-QB;

Verba nº8 – um veículo automóvel da marca Ford, modelo ..., matrícula HB-..-..;

Verba nº9 - um veículo automóvel da marca Volkswagen, modelo ..., com a matrícula GF-..-..;

verba nº 10 - um veículo automóvel da marca Kia, com a matrícula ..-..-LA;

verba nº11 – um veículo automóvel da marca Fiat, modelo ..., matrícula RT-...-..;

verba nº12 – um veículo automóvel da marca Ford, modelo ...;

verba nº 13 – um veículo automóvel da marca Renault, modelo ..., matrícula ..-..-GE.

Bens móveis…

verba nº 14 –

verba nº 15 –

verba nº 16 –

Bens imóveis

Verba nº17 - Prédio urbano sito na Travessa ... extinta freguesia ..., Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial de Marco de Canaveses pela ficha ...38 e inscrito na respectiva matriz sob o artº ...46 …

Verba nº18 - Prédio urbano destinado a armazém, sito na Rua ..., extinta freguesia ..., concelho de Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial pela ficha ...23 e inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...20, actualmente 2192;

Passivo

Verba nº1: crédito hipotecário da casa de habitação, contraído no Banco 1..., conta nº ...42, cujo valor à data de 15 de Dezembro é de 39.171,64€…

Verba nº2: crédito ao consumo nº ...03, conta nº ...07 contraído junto do Banco 1... em Fevereiro de 2012, com montante financiado de 15.824,34, actualmente no valor de 19.420,00€

II

Estabelecimento comercial de reparação de veículos automóveis e comércio de pneus, que gira comercialmente em nome individual de AA, instalado na Rua ..., em Marco de Canaveses (extinta freguesia ..., no prédio urbano identificado e relacionado sob a verba nº18, no qual se inclui a universalidade de máquinas, ferramentas, equipamentos, mobiliário e peças…”.[certidão junta com a petição e documento nº5 junto com a Contestação]

5. Em 14 de Abril de 2015, foi realizada a Conferência de Interessados, no âmbito do processo de inventário. Nessa diligência, obtida a informação junto do Banco 1... que o valor total em dívida do casal, referente a três empréstimos, era €35.785,66 (trinta e cinco mil setecentos e oitenta e cinco euros e sessenta e seis cêntimos), foi o passivo fixado nesse valor e aceite pelos interessados. [certidão junta com a petição].

6. Esse valor foi tomado em conta no mapa de partilhas para efeitos, designadamente, de cálculo das tornas que não mereceu qualquer impugnação ou reclamação. [certidão junta com a petição].

7. Em 25 de Março de 2017, foi elaborado o mapa de partilhas do qual consta:

“…não foi contestado o passivo e houve licitações de ambos os interessados, sendo que:

Um) A AA, foram adjudicados

5) …o prédio urbano relacionado na verba 17 da relação de bens

Dois) A BB foi adjudicado o veículo … verba 8 da relação de bens

….

O passivo aprovado importa em … 35.785,66€.

Relativamente ao passivo de 35.785,66€, cada um é responsável por metade, ou seja, pela quantia de 17.892,83€

Como o indicado valor declarado dos imóveis a partilhar é de 69.305,00€ e o total do passivo é de 35.785,66, é de €33.519,34 o valor líquido do património comum do casal; e como a cada um dos ex-cônjuges pertence metade do mesmo, a cada um pertence, o património líquido do casal (activo deduzido do passivo), o valor de dezasseis mil setecentos e cinquenta e nove euros e sessenta e sete cêntimos (16.759,67€).

O interessado AA licitou bens que lhe são adjudicados, no valor de 66.750,00€ e fica responsável por metade do passivo no valor de 17.892,83€, sendo assim a sua adjudicação líquida de 48.157,17€, como no património liquido a partilhar (activo deduzido do passivo) tinha direito a bens  no valor de 16.759.00€, leva a mais em seu pagamento a quantia de 32.097,50€.

A interessada BB licitou bens que lhe são adjudicados, no valor de 2.505,00€ e fica responsável por metade do passivo no valor de 17.892,83€, sendo assim a sua adjudicação líquida no valor negativo de 15.337,83€, como no património líquido a partilhar (activo deduzido do passivo) tinha direito a bens  no valor de 16.759.00€, leva a menos em seu  pagamento a quantia de 32.097,50. (…)”.[certidão junta com a petição].

8. O mapa de partilha foi homologado por sentença, datada de 02/05/2019, proferida no âmbito do processo nº 1114/19.9T8PRD [certidão junta com a petição].

9. Em 07 de Janeiro de 2015, a ora Ré intentou acção especial de prestação de contas, contra o ora Autor, pedindo que este seja condenado a apresentar as contas respeitantes ao património comum das partes, desde Agosto de 2010 até à instauração da acção.

Alegou, em síntese, que foi casada com o réu e que o casamento foi dissolvido por divórcio, tendo a acção na qual foi decretada essa dissolução sido instaurada em 26 de Agosto de 2010. Na sequência do divórcio, o património comum do casal ficou sob administração do réu, no qual se englobam bens imóveis, bens móveis e um estabelecimento comercial, utilizando o réu todos os bens do casal em proveito exclusivo e sem pagar qualquer contrapartida. [consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN e documentos nºs 3 e 4 juntos com a contestação]

10. Nessa acção de prestação de contas que correu termos com o nº 768/15.0T8MCN, foi realizada a audiência final, tendo as partes no início da mesma transigido nos seguintes termos:

“1 – O Réu reconhece que está obrigado a prestar contas à Autora por referência aos bens indicados no art.º 6.º da P.I., alíneas a) [Prédio urbano, sito na Travessa ..., extinta freguesia ..., Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial de Marco de Canaveses pela ficha ...38 e inscrito na respectiva matriz sob o artº ...46], b) [Prédio urbano sito na Rua ..., extinta freguesia ..., concelho de Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial pela ficha ...23], c) [Estabelecimento de reparação de veículos automóveis e comércio de pneus] e d) [Veículo automóvel da marca Peugeot, matrícula TN-..-..; Veículo automóvel da marca Fiat ..., matrícula ..-..-QB; Veículo automóvel da marca Ford ..., com a matrícula HB-..-..; Veículo automóvel da marca Volkswagen ..., com a matrícula GF-..-..; Veículo automóvel da marca Kia – ..., com a matrícula ..-..-LA; Veículo automóvel da marca Fiat ..., com a matrícula RT-..-..; Veículo automóvel da marca Ford ...; Veículo automóvel da marca Renault ..., com a matrícula ..-..-GE] com excepção dos veículos Renault …, Ford ... … e Fiat …. Em relação aos veículos ... … e Fiat …, o Réu obriga-se a entregar as chaves e documentos que tiver em sua posse às filhas, se e quando estas o solicitarem;

2 – As contas a prestar abarcarão o período compreendido entre a data da apresentação em juízo do pedido de divórcio, 26-08-2010, e a entrega efectiva dos bens que se encontram em partilha no processo de Inventário no Cartório Notarial … (…);

3 – O Réu compromete-se a apresentar as contas em 20 dias;

4– Custas eventualmente em dívida em partes iguais, prescindindo ambas de custas de parte;

5 – Autora e Réu prescindem do prazo de recurso relativamente à sentença que vier a homologar este acordo.” [documento nº1 junto com a contestação]

12. A transação celebrada entre as partes foi homologada por sentença, de 13/4/2016, sendo o réu notificado para prestar as contas sob pena de não lhe ser permitido apresentar contestação às contas que a autora vier a apresentar. [documento nº1 junto com a contestação]

13. O réu não apresentou contas, tendo, por via disso e nos termos do disposto no artº 943 do Código de Processo Civil, a então Autora BB sido notificada para apresentar contas, o que fez. [consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

14. Em 24 de Maio de 2016 foi proferido despacho a determinar a notificação da Autora para apresentar contas sob a forma de conta-corrente nos termos do disposto no artigo 943º, n.º 1 do Código de Processo Civil em virtude de o réu não as ter apresentado.

[consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

15. Em 27 de Junho de 2016, a Autora apresentou as contas.[consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

16. Em 14 de Setembro de 2016 foi proferido despacho a determinar a correcção das contas apresentadas e após várias e sucessivas prorrogações do prazo, em 15 de Dezembro de 2017, a autora apresentou novas contas. [consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

17. Em 19 de Março de 2018 foi proferida sentença a julgar improcedente a dita acção de prestação de contas, que, objecto de recurso, foi revogada por Acórdão de 27 de Junho de 2018, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto. [consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

18. Baixado o processo à primeira instância, em 25 de Novembro de 2019, o réu, ora Autor, apresentou articulado superveniente, visando “a prestação de contas (…) no que concerne à administração dos bens comuns do casal”, no período “entre Outubro de 2013 e até à data do trânsito em julgado” da sentença proferida no processo de inventário”. Nesse articulado superveniente, alegou ter pago  prestações bancárias, capital, juros, comissões bancárias, seguros, e semelhantes, decorrentes dos empréstimos contraídos para aquisição/construção do imóvel que foi a casa de morada de família, no montante de €39.023,81 (trinta e nove mil e vinte e três euros e oitenta e um cêntimos)”;  IMI de 2014 e 2015 na quantia de €813,34  (oitocentos e treze euros e trinta e quatro cêntimos);  imposto de circulação do veículo automóvel de Marca Fiat, no montante de €221,00 (duzentos e vinte e um euros); uma coima ao Serviço de Finanças, no montante de €124,14 (cento e vinte e quatro euros e catorze cêntimos); oito prestações referentes ao empréstimo nº ...72, no montante de €1.242,80 (mil duzentos e quarenta e dois euros e oitenta cêntimos); despesas referentes ao contrato de avaliação do empréstimo no montante de €542,92 (quinhentos e quarenta e dois euros e noventa e dois cêntimos); e honorários referentes à outorga da escritura no montante de €559,00 (quinhentos e cinquenta e nove euros). [consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

19. Por despacho de 6 de Julho 2020, proferido nesses autos, transitado em julgado, decidiu o Tribunal “julg[ar] inadmissível o articulado superveniente apresentado” por se entender que “o réu vinculou-se com a apresentação das contas e não o fez no momento processual próprio. Em virtude dessa conduta omissiva, viu-se a autora na contingência de ter que apresentar contas (…). Posto isto o momento processual adequado para o réu apresentar contas já decorreu. Essa faculdade está-lhe agora vedada. É à autora que incumbe apresentar contas as quais serão julgadas pelo tribunal nos termos da aludida norma – artigo 943º do Código de Processo Civil”. [consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

20. BB, em 10 de Setembro de 2020, apresentou contas reportadas ao período de Setembro de 2010 a  Setembro de 2020. [consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

21. Proferida sentença em 12/10/2020, objecto de recurso, por Acórdão de 10 de Maio de 2021, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, foram aprovadas “as contas apresentadas por BB em 10 de setembro de 2020, com o saldo ilíquido global de € 100.275,00 (cem mil duzentos e setenta e cinco euros), a que se deduzem as despesas no valor total de € 39.820,26 (trinta e nove mil oitocentos e vinte euros e vinte e seis cents), obtendo-se o saldo líquido de € 60.454,74 (sessenta mil quatrocentos e cinquenta e quatro euros e setenta e quatro cents) que dividido em duas partes iguais totaliza € 30.227,37 (trinta mil duzentos e vinte e sete euros e trinta e sete centos), valor que AA vai condenado a pagar a BB”. [documento nº 3 junto com a contestação e consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

22. Por Acórdão de 14 de Setembro de 2021, o Supremo Tribunal de Justiça confirmou o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto. [documento nº 4 junto com a contestação e consulta, através da plataforma Citius, do processo nº 768/15.0T8MCN]

IV_ Fundamento de Direito

1ª Questão:

Invoca a Recorrida que a peça recursiva do recorrente padece de vício formal: “as conclusões apresentadas não cumprem o ónus legal de síntese e condensação que a lei processual exige, nem indica a norma ou normas legais que no seu entender não foram observadas pela Mmª Juíza a quo o que obsta ao conhecimento do recurso [artigos 639.º n.º 1 e 652.º n.º 1 alínea b) do CPC.]”,  constando da sua motivação que “as Conclusões apresentadas pelo Recorrente, não passam de uma versão/reprodução, nem sequer abreviada, das alegações”.

Como decorre do disposto no artigo 639º, nº1, do Código de Processo Civil, a interposição de um recurso em processo civil sujeita o recorrente a dois ónus:
a) O ónus de alegação, no cumprimento do qual o Recorrente deve identificar as questões suscitadas e relativamente às quais pretende uma resposta diversa daquela que foi dada pelo Tribunal a quo; indicar as normas violadas, o sentido que deve ser atribuído às normas cuja aplicação e interpretação determinou o resultado que pretende impugnar e, perante eventual erro na determinação das normas aplicáveis, indicação das que deveriam ter sido aplicadas; e deve expor os fundamentos da sua pretensão no sentido da alteração, anulação ou revogação da decisão.
b) O ónus de conclusão, no cumprimento do qual o Recorrente deve condensar os fundamentos por que pede a revogação, a modificação ou a anulação da decisão em função da resposta que deve ser dada às questões de direito suscitadas.

Ensinava o Professor Alberto dos Reis[1], a palavra conclusões é expressiva. No contexto da alegação o recorrente procura demonstrar esta tese: Que o despacho ou sentença deve ser revogado, no todo ou em parte. É claro que a demonstração desta tese implica a produção de razões ou fundamentos. Pois bem: essas razões ou fundamentos são primeiro expostos, explicados e desenvolvidos no curso da alegação; hão-de ser, depois, enunciados e resumidos, sob a forma de conclusões, no final da minuta.”, acrescentando “As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao necessário que diga expressamente Fundamentos. O que importa essencialmente, é que a alegação feche ela indicação resumida das razões por que se pede o provimento do recurso”.

A falta absoluta de alegações ou de conclusões gera o indeferimento do recurso [artigo 641.º, nº 2, al. b), do CPCivil].

Da leitura das alegações apresentadas pelo Recorrente facilmente se constata que não existiu a preocupação de condensar nas conclusões os fundamentos por que pede a revogação da decisão. No entanto, a reprodução, quase integral, da motivação, nas conclusões não consubstancia falta absoluta de conclusões, fundamento de indeferimento do recurso. Ponderando os fins das conclusões, o princípio do contraditório que, nos autos, não foi posto em causa, e, bem assim, o critério da celeridade processual, entende-se não se justificar o convite ao aperfeiçoamento.

Da leitura das conclusões verifica-se que o Recorrente advoga que o Tribunal a quo  fez uma “má interpretação” da norma constante do nº 2 do artigo 943º do Código de Processo Civil e, nos pontos 34º a 39º, expõe o sentido que, no seu entender, o legislador quis conferir a essa norma, enunciando as razões pelas quais pugna pela não verificação da excepção do caso julgado e da força e autoridade do caso julgado [ainda que pelo Tribunal a quo não tenha julgado a acção improcedente com fundamento nessa excepção ou na autoridade do caso julgado].

Pelo exposto, improcede o vício formal da peça recursiva do Recorrente, invocada pela Recorrida.

2ª Questão

O Recorrente pugna pela revogação da decisão recorrida alegando, em síntese, que interpôs a presente acção “com a finalidade de ver acertadas as contas entre si e a sua ex-cônjuge, algo que não foi realizado, nem na pendência do processo de inventário, nem após o seu trânsito em julgado”. Visa o período de “Outubro de 2013 a Maio de 2019, data em que transitou o processo de inventário/partilha” e “as contas que pretende prestar englobam, igualmente empréstimos bancários liquidados pelo A./Recorrentes e que são da responsabilidades de ambos”. Não pretende contestar as contas que foram apresentadas na antecedente acção de prestação de contas e “a proceder a decisão em crise, levará a que o A., aqui Recorrente, suporte todas as despesas, desde 2013, sozinho, despesas estas que dizem respeito ao ex-casal e que a ex-cônjuge, R., nunca suportou”.

Advoga, ainda, que as “contas prestadas nos autos de proc. nº 768/15.0T8MCN em nada colidem com as que ora se pretende prestar”, por duas ordens de razões:

i. o período temporal em causa em ambas as acções não coincide, continuando a existir “um hiato temporal que se encontra desprovido de prestação de contas (…) pagas pelo A./Recorrente e que nunca prestou contas à Recorrida”;

ii. as acções não têm o mesmo objecto: no proc. nº 768/15.0T8MCN, era impossível prestar as contas que ora visa prestar pois, só posteriormente foram pagas pelo A./Recorrente.

No “primeiro processo de prestação de contas, prestavam-se contas referentes: à ocupação da residência e proveito exclusivo do R.; à utilização exclusiva do recheio; ao rendimento médio mensal proveniente do exercício da actividade da oficina; oficina; e à utilização exclusiva dos veículos automóveis.

Posteriormente, “o A., aqui Recorrente, continuou a fazer face a despesas que incumbiam a ambos”: despesas relativas à casa de morada de família, desde 2016 até 2021, nomeadamente créditos, seguros, capital, juros e comissões bancárias, no valor de € 60.569,13 (sessenta mil quinhentos e sessenta e nove euros e treze cêntimos); IMI relativo aos anos de 2013 e 2014, no valor de € 1.637,42 (mil seiscentos e trinta e sete euros e quarenta e dois cêntimos);  IUC relativo ao veículo automóvel marca FIAT, dos anos de 2014, 2015, 2016 e 2017, no valor de € 290,54 (duzentos e noventa euros e cinquenta e quatro cêntimos); Coimas ao Serviço de Finanças do Marco de Canaveses no valor de € 77,94 (setenta e sete euros e noventa e quatro cêntimos).

Nestes autos, estão “em causa créditos bancários que apenas em Agosto e Setembro do ano transacto foram liquidados pelo A., aqui Recorrente, e que, por esse motivo, nunca poderiam ter sido objecto de outra prestação de contas”.

Sustenta, por último, que pelo Tribunal “a quo” foi feita “má interpretação da letra da lei e dos factos enunciados” porquanto, “não pretende contestar quaisquer contas que foram apresentadas em sede de outro processo, (…) somente, exercer um direito seu, que não se encontra precludido”. Dissente da aplicação do instituto do caso julgado, argumentando que o caso julgado formal “tem força dentro do próprio processo, ou seja, a sentença ou despacho que recaiam simplesmente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro daquele processo, não indo para além do mesmo”;  não se verifica o caso julgado material porquanto, as contas que foram prestadas na anterior acção não são as que pretende ver prestadas nesta acção, nem pretende “corrigir qualquer valor ou decisão outrora tomada”; e sendo a “situação agora em crise (...) individual, autónoma, relativamente à anterior, não existindo qualquer prejudicialidade”, a decisão proferida na anterior acção não se impõe por via da autoridade do caso julgado.

Conclui que sendo o Recorrente “administrador dos bens comuns do casal, não existem dúvidas de que ele é igualmente o titular deste direito e, aliás, um dos obrigados a fazer a prestação de contas”, tendo o Tribunal a quo feito “má interpretação na leitura da matéria de facto e de Direito”.

Cumpre apreciar e decidir.

Relacionando-se o processo de prestação de contas com a obrigação a que alguém esteja sujeito de prestar a outrem contas dos seus actos, no que concretamente diz respeito ao obrigado à prestação de contas pode, como ensinava José Alberto dos Reis[2], formular-se o princípio geral de que “quem administra bens ou interesses alheios está obrigado a prestar contas de tal administração ao titular desses bens ou interesses”.

Determina o artigo 941º do Código de Processo Civil que "A ação de prestação de contas pode ser proposta por quem tenha o direito de exigi-las ou por quem tenha o dever de prestá-las e tem por objeto o apuramento e aprovação das receitas obtidas e das despesas realizadas por quem administra bens alheios e a eventual condenação no pagamento do saldo que venha a apurar-se."

Esta disposição preliminar contém duas regras autónomas: a primeira, relativa à legitimidade, diz quem tem o direito de exigir a prestação de constas e quem tem o dever de as prestar; a segunda, relativa ao objecto da acção, define-o como pré-ordenado ao apuramento e a aprovação das receitas obtidas e das despesas realizadas por quem administre bens alheios (função puramente declarativa) e a eventual condenação (função condenatória) no pagamento do saldo que se venha a apurar.

Socorrendo-nos dos ensinamentos do Professor José Alberto dos Reis, “o saldo proveniente de determinada gestão não pode ser pedido directamente em acção de dívida; têm de ser apuradas em acção de prestação de contas na qual se condenará o devedor a pagar a quantia que resultar do julgamento de contas”[3].

Assim, a acção de prestação de contas tem por finalidade o estabelecimento do montante das receitas cobradas e das despesas efectuadas, de modo a obter-se a definição de um saldo e a determinar a situação de crédito ou de débito [4].

Este processo inicia-se com a petição inicial, peça processual onde o autor deve invocar o acto ou facto que justifica o seu pedido; esse acto ou facto constitui a causa de pedir, a razão por que se julga no direito de exigir a prestação de contas e por que entende que sobre o réu impende a obrigação de as prestar ou a razão pela qual entende ter a obrigação de prestar contas.

Pela ora Ré foi intentada a acção especial de prestação de contas, contra o ora Autor e cujos termos correram sob o processo nº 768/15.0T8MCN, pedindo que este seja condenado a apresentar as contas respeitantes ao património comum das partes, desde Agosto de 2010 até à instauração da acção.

Para tanto alegou que foi casada com o réu e que o casamento foi dissolvido por divórcio, tendo a acção na qual foi decretada essa dissolução do seu casamento sido instaurada em 26 de Agosto de 2010. Na sequência do divórcio, o património comum do casal ficou sob administração do réu, no qual se englobam bens imóveis, bens móveis e um estabelecimento comercial, utilizando o réu todos os bens do casal em proveito exclusivo e sem pagar qualquer contrapartida.

O objecto do litígio no processo nº 768/15.0T8MCN encontra-se definido na transacção que o Recorrente outorgou, nesses autos: “O Réu reconhece que está obrigado a prestar contas à Autora por referência aos bens indicados no art.º 6.º da P.I., alíneas a), b), c) e d), com excepção dos veículos Renault ..., Ford ... … e Fiat ... (…)”, por referência ao “período compreendido entre a data da apresentação em juízo do pedido de divórcio, 26-8-2010, e a entrega efectiva dos bens que se encontram em partilha no processo de inventário no Cartório…”. [negrito nosso]

As contas apresentadas em 10 de Setembro de 2020, por BB, tendo por base as diligências instrutórias realizadas, respeitam ao período de Setembro de 2010 a Setembro de 2020.

Advoga o Recorrente, nas suas pretensões recursórias, que não se encontra precludido o seu direito de prestar contas por, em 2016, ter sido proposta uma acção de prestação de contas, desde logo por, nessa data, os empréstimos ainda não haviam sido liquidados[5] e não se verifica a excepção do caso julgado, nem a força e autoridade do caso julgado. No que respeita ao caso julgado formal, sustenta que este tem força dentro do próprio processo, não indo para além do mesmo. Não se verifica o caso julgado material porquanto a situação controvertida não é a mesma pois “foram prestadas contas, mas não aquelas que se pretendem ver prestadas na acção em crise”. Não se verifica a força e autoridade do caso julgado pois, não estamos perante uma relação de prejudicialidade. E conclui [t]ratamos de situações díspares, que não se encontram temporalmente ou ao nível do seu objecto”.

Resulta do exposto que, contrariamente ao defendido pelo Recorrente, no ponto 8 das suas conclusões, as contas que ora pretende prestar, por referência à administração dos bens comuns do ex-casal, entre Outubro de 2013 a Maio de 2019 ( conclusão constante do ponto 6), inserem-se no período abrangido na prestação de contas objecto do processo nº 768/15.0T8MCN e respeitam aos bens comuns do ex-casal que foram especificados no acordo homologado por sentença proferida em 13/4/2016, no âmbito desses autos.  

O Tribunal a quo julgou a acção improcedente e absolveu a Ré do pedido com fundamento na preclusão do direito que o Autor pretende exercer e não com fundamento na autoridade do caso julgado ou da excepção do caso julgado.

Decidiu o Tribunal a quo que “o legislador consagrou expressamente a impossibilidade de contestar as contas prestadas, quando o obrigado não o faça no prazo fixado (artigo 942º, nº5 e 943º, nº2 do CPC), impossibilitando-o de sindicar as contas apresentadas pela parte que não estava obrigada a fazê-lo.

Admitir que a parte que não pode contestar, sancionada com a restrição imposta, possa à posteriori vir apresentar ação de prestação de contas é desvirtuar a imposição legal, admitindo à posteriori o que fora vedado.

Entendemos que tal não é admissível e contraria expressamente o que foi consagrado pelo legislador.

Não pode o autor pretender exercer um direito cujo exercício está precludido…”.

Aqui chegados, importa aferir se assiste ao Autor/Recorrente o direito de, agora, apresentar contas por referência à administração dos bens comuns do ex-casal [6] ou se se mostra precludido esse direito.

A decisão considera-se transitada em julgada logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação, nos termos do artigo 628.º do Código de Processo Civil.

Enquanto o nº 1 do artigo 620º do Código de Processo Civil dispõe que «as sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo», o nº 1 do artigo 619º do Código de Processo Civil estatui que «transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados nos artigos 580º e 581º (…) ».

Assim, o conceito de caso julgado abrange duas espécies: a do caso julgado formal ou externo, relativo a questões de carácter processual e a do caso julgado material, substancial ou interno, referente à relação material em litígio.

Ensinava o Professor Alberto dos Reis, em Código de Processo Civil Anotado, anotação ao art. 672º, que “com o trânsito da sentença em julgado, facto processual definido no § único do art. 677º, produz-se este fenómeno: a formação do caso julgado. O art. 671º propõe-se determinar a autoridade e o valor desta formação. E determina-os assim: a decisão proferida fica tendo força obrigatória dentro do processo e fora dele. Se confrontarmos este ditame com o que se lê no art. 672º, ficamos logo advertidos de que a decisão transitada em julgado nem sempre tem o mesmo valor ou a mesma eficácia: ao passo que o art. 671º fala de força obrigatória dentro do processo e fora dele, o art. 672º só atribui à decisão força obrigatória dentro do processo.

Estamos pois em presença de duas figuras diferentes, de duas realidades perfeitamente distintas. À que o art. 671º considera dá-se o nome de caso julgado material ou substancial: à que o art. 672º desenha cabe a designação de caso julgado formal ou processual. Quando é que o caso julgado reveste a primeira ou a segunda modalidade? A aproximação dos dois artigos habilita a dar a resposta. Se a decisão recai unicamente sobre a relação jurídica processual, temos o caso julgado formal. Se recai sobre o mérito da causa, e portanto sobre a relação jurídica substancial, temos o caso julgado material”.

Nas palavras de Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “O caso julgado material tem força obrigatória dentro do processo e fora dele, impedindo que o mesmo ou outro tribunal, ou qualquer outra autoridade, possa definir em termos diferentes o direito concreto aplicável à relação material litigada. O caso julgado formal tem força obrigatória apenas dentro do próprio processo, obstando a que o juiz possa, na mesma acção, alterar a decisão proferida, mas não impedindo que, noutra acção, a mesma questão processual concreta seja decidida em termos diferentes pelo mesmo tribunal, ou por outro entretanto chamado a apreciar a causa.” [7]

Refere Manuel de Andrade[8] , o caso julgado material «consiste em a definição dada à relação jurídica controvertida se impor a todos os tribunais (e até a quaisquer outras autoridades) – quando lhes seja submetida a mesma relação, quer a título principal (repetição da causa em que foi proferida a decisão), quer a título prejudicial (acção destinada a fazer valer outro efeito dessa relação). Todos têm que acatá-la, julgando em conformidade, sem nova discussão».

A força obrigatória reconhecida ao caso julgado material, segundo o mesmo Autor, encontra arrimo na necessidade de garantir o prestígio dos tribunais, que ficaria seriamente comprometido «se a mesma situação concreta, uma vez definida por eles em dado sentido, pudesse depois ser validamente definida em sentido diferente». Impõe-se por razões de «certeza ou segurança jurídica», pois, sem a força do caso julgado, cairíamos «numa situação de instabilidade jurídica (instabilidade das relações jurídicas) verdadeiramente desastrosa - fonte perene de injustiças e paralisadora de todas as iniciativas»”.

A excepção do caso julgado pressupõe a repetição de uma  causa, quando na primeira causa já tenha sido proferida decisão final transitada em julgado (cfr. art. 628º do CPC), dispondo o nº 1 do artigo 578º do Código de Processo Civil que “Repete-se a causa quando se propõe uma ação idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir”.

A exigência desta tríplice identidade fixa os limites subjectivos e objectivos do caso julgado. Referem Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “É através desta tríplice identidade – de sujeitos, do pedido e da causa de pedir – que se define a extensão do caso julgado (...). O caso julgado forma-se diretamente sobre o pedido, que a lei define como o efeito jurídico pretendido pelo autor (ou pelo réu, através da reconvenção) (…). É a resposta dada na sentença à pretensão do autor, delimitada em função da causa de pedir, que a lei pretende seja respeitada através da força e autoridade do caso julgado(…)”.[9]

No que respeita aos limites subjectivos, importa salientar que a identidade dos sujeitos relevante para efeito da excepção de caso julgado é, como dispõe o artigo 580º, nº 2, do CPC, a identidade jurídica, ou seja, não interessa tanto a identidade física dos sujeitos envolvidos nas várias acções, mas a qualidade jurídica em que intervieram no processo. Assim, é irrelevante que na primeira acção, a iniciativa tenha sido tomada por aquele que tem direito a exigir a prestação de contas e figure como réu aquele que tem obrigação de as prestar; e na segunda acção, se apresente como autor aquele que está sujeito à obrigação de prestar contas, ficando na posição de réu aquele a quem as contas têm de ser prestadas.

A identidade de pedidos assume grande relevância no âmbito do caso julgado, já que este se forma directamente sobre o pedido. Referem Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora que “a ordem pela qual, compreensivelmente, a lei enumera as três identidades caracterizadoras do caso julgado (a identidade do pedido antes da identidade da causa de pedir) mostra que é sobre a pretensão do autor, à luz do facto invocado como seu fundamento, que se forma o caso julgado”. [10]

O pedido é o efeito jurídico que a parte activa pretende obter pela decisão do tribunal e que ela retira materialmente da causa de pedir que invoca. “Esse efeito jurídico tem por objeto certo e determinado bem jurídico a que se refere a causa de pedir. Em termos simples, o pedido tem por objeto imediato determinado efeito jurídico que se retira da causa de pedir e por objeto mediato o bem jurídico a que se refere a causa de pedir. Donde, há identidade de pedido quando em causas diferentes a parte ativa pretende uma sentença com idêntico efeito jurídico para um mesmo e determinado bem jurídico”.[11]
Tem sido discutida a problemática da extensão do caso julgado material. É entendimento maioritário que a força do caso julgado material abrange, para além das questões directamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado. Nas palavras de Miguel Teixeira de Sousa[12], “não é a decisão, enquanto conclusão do silogismo judiciário, que adquire o valor de caso julgado, mas o próprio silogismo considerado no seu todo: o caso julgado incide sobre a decisão como conclusão de certos fundamentos e atinge estes fundamentos enquanto pressupostos daquela decisão”.

A “autoridade de caso julgado implica o acatamento de decisão proferida em acção anterior, cujo objecto se inscreve, como pressuposto indiscutível, no objecto de uma acção posterior, obstando assim a que a relação jurídica ali definida venha a ser contemplada, de novo, de forma diversa”.[13]

A figura da autoridade do caso julgado não se afeiçoa à ideia de identidade jurídica, mas de prejudicialidade entre objectos processuais. Referem António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, “respeitada a identidade dos sujeitos (…), a autoridade de caso julgado decorrente de decisão proferida em anterior ação pode funcionar independentemente da verificação do restante condicionalismo de que depende a exceção de caso julgado (art.º 581.º), em situações em que a questão anteriormente decidida não possa voltar a ser discutida entre os mesmos sujeitos (…), abarcando, para além das questões directamente decididas na parte dispositiva da sentença, as que sejam  antecedente lógico necessário à emissão da parte dispositiva do julgado(…). Seguro é que tal mecanismo, que visa evitar contradições decisórias entre os mesmos sujeitos, não poderá ser invocado em ação que corra entre sujeitos diversos na perspectiva da sua qualidade jurídica...”.[14]

A excepção de caso julgado e a autoridade do caso julgado não são duas figuras distintas, mas antes dois efeitos distintos da mesma realidade jurídica – o caso julgado material (cfr. arts. 619º e 621º do CPC). Todavia, enquanto que a excepção de caso julgado comporta um efeito negativo de inadmissibilidade da segunda acção, obstando a nova decisão de mérito da causa e impondo ao juiz a absolvição do réu da instância (cfr. art. 576º, nº 2 do CPC), a autoridade do caso julgado tem, antes, o efeito positivo de impor a primeira decisão à segunda decisão de mérito.

Refere Miguel Teixeira de Sousa[15] que “o caso julgado material pode valer como autoridade de caso julgado, quando o objecto da acção subsequente é dependente do objecto da acção anterior, ou como excepção do caso julgado, quando o objecto da acção posterior é idêntico ao objecto da acção antecedente”.

Na excepção do caso julgado, o caso julgado material garante “não apenas a impossibilidade de o tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira diferente, mas também a inviabilidade do tribunal decidir sobre o mesmo objecto duas vezes de maneira idêntica”, e tem como finalidade “obstar que o órgão jurisdicional da acção subsequente seja colocado perante a situação de contradizer ou de repetir a decisão transitada”. E representa para o tribunal “comando de omissão que lhe estabelece o não proferimento de decisão idêntica ou diversa da anterior”, implicando a absolvição dos réus da instância.

Diversamente, quando vigora como autoridade de caso julgado, o caso julgado material manifesta-se no seu aspecto positivo de proibição de contradição da decisão transitada: a autoridade do caso julgado é o comando de acção ou a proibição de omissão respeitante à vinculação subjectiva à repetição no processo subsequente do conteúdo da decisão antecedente”.

Nas palavras de Rui Pinto[16], “A força obrigatória desdobra-se numa dupla eficácia, designada por efeito negativo do caso julgado e efeito positivo do caso julgado. O efeito negativo do caso julgado consiste numa proibição de repetição de nova decisão sobre a mesma pretensão ou questão, por via da exceção dilatória de caso julgado, regulada em especial nos artigos 577.º, al. i), segunda parte, 580.º e 581.º. Classicamente, corresponde-lhe o brocardo non bis in idem. O efeito positivo ou autoridade do caso lato sensu consiste na vinculação das partes e do tribunal a uma decisão anterior. Classicamente, corresponde-lhe o brocardo judicata pro veritate habetur.

Enquanto o efeito negativo do caso julgado leva a que apenas uma decisão possa ser produzida sobre um mesmo objeto processual, mediante a exclusão de poder jurisdicional para a produção de uma segunda decisão, o efeito positivo admite a produção de decisões de mérito sobre objetos processuais materialmente conexos, na condição da prevalência do sentido decisório da primeira decisão.(…). Explicado de outro modo, enquanto com o efeito negativo um ato processual decisório anterior obsta a um ato processual decisório posterior, com o efeito positivo um ato processual decisório anterior determina (ou pode determinar) o sentido de um ato processual decisório posterior”.

Relacionado com o caso julgado, em particular se abrange os meios de defesa que o réu deduziu e os que não chegou a deduzir e até aos que  poderia ter deduzido com base num direito seu, surge ainda a figura do efeito preclusivo, decorrente das normas constantes dos artigos 564.º, alínea c), e 573.º do CPC, impondo ao demandado o ónus da oportuna dedução de todos os meios de defesa que considere ter ao seu dispor no confronto da pretensão do autor, sob pena de lhe ficar vedada a possibilidade de colocar questões não abordadas e decididas em acções futuras que corram entre as mesmas partes.

A correlatividade entre o ónus de concentração e a preclusão significa que, sempre que seja imposto um ónus de concentração, se verifica a preclusão de um facto não alegado, mas também exprime que a preclusão só pode ocorrer se e quando houver um ónus de concentração.

O princípio da preclusão ou da eventualidade é um dos princípios enformadores do processo civil, decorre da formulação da doutrina e encontra acolhimento no instituto da litispendência e do caso julgado – art. 580º, nº2, do Código de Processo Civil – e nos preceitos de onde decorre o postulado da concentração dos meios de alegação dos factos essenciais da causa de pedir e das razões de direito – art. 552º, nº1, d) – e das excepções, quanto à defesa – art. 573º, nº1 do Código de Processo Civil.

Ensinava o Professor Alberto dos Reis[17], “uma coisa é não ter sido apreciada uma parte da pretensão deduzida em juízo, outra completamente diferente, é não terem sido apresentados ou deduzidos alguns meios de defesa do réu, ou algumas razões ou fundamentos do autor.

A este respeito, o Prof. Manuel Andrade afirma: O caso julgado preclude todos os meios de defesa do réu, mesmo os que ele poderia ter deduzido, mas não deduziu, assim como preclude todas as possíveis razões do autor. Desde que a sentença reconhece o direito do autor ficam precludidos, fica fechada a porta a todos os meios de defesa do réu, mesmo os que ele não chegou a deduzir. É a significação da máxima tantum judicatum quantum disputatum vel disputari debebat. Por outro lado, a sentença que julga improcedente a acção, preclude incontestavelmente ao autor a possibilidade de, em novo processo, invocar outros factos instrumentais ou outras razões (argumentos de direito) não produzidas nem consideradas no processo anterior)”.

Sobre a questão, referem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre[18], “Com o caso julgado condenatório precludem definitivamente todos os meios de defesa invocáveis contra a pretensão deduzida, absorvendo-se neste efeito preclusivo extraprocessual a preclusão intraprocessual produzida quando, na contestação, não são invocadas excepções que não sejam de conhecimento oficioso (…)”. Conclui “Fala-se de efeito preclusivo do caso julgado para caracterizar esta inadmissibilidade de qualquer ulterior indagação sobre a relação material controvertida”.

Sobre o efeito preclusivo decorrente das normas constantes dos artigos 564.º, alínea c), e 573.º do CPC, impondo ao demandado o ónus da oportuna dedução de todos os meios de defesa que considere ter ao seu dispor no confronto da pretensão do autor, sob pena de lhe ficar vedada a possibilidade de colocar questões não abordadas e decididas em acções futuras que corram entre as mesmas partes, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 10/10/2012[19]:“constitui uma grave violação da estabilidade da relação jurídica definida pela sentença transitada em julgado a posterior dedução daquela mesma pretensão fundada em factos materiais que na ocasião já se haviam verificado e que, sem qualquer inconveniente ou prejuízo para o direito material, poderiam ter sido alegados, discutidos e apreciados em toda a sua extensão na primeira acção.(…) Fazendo-o, teriam permitido que a sentença apreciasse em toda a extensão a realidade emergente dos factos apurados, para efeitos de confirmar ou infirmar o juízo sobre a existência e a titularidade do direito de propriedade inerente à faixa de terreno litigada ou para afirmar ou negar, com base em todos os factores pertinentes, a obrigação de restituição dessa faixa e de demolição da construção que sobre a mesma fora erigida. O sistema não pode admitir, sem limites, a discussão eterna de questões jurídicas.

Refere Rui Pinto[20],pode dizer-se que na perspectiva da posição do autor vencedor, a procedência do seu pedido determina a preclusão de alegabilidade futura tanto da causa de pedir deduzida, como das causas de pedir que poderia ter deduzido: as primeiras, em razão da exceção de caso julgado e as segundas em razão da falta de interesse processual. Essa “preclusão” resulta de dois mecanismos processuais distintos, como se constata”. (…) Mas, simetricamente e em plena e justa igualdade com o que sucede com o autor vencedor, em caso de caso julgado positivo, para o réu vencido a condenação no pedido determina a preclusão de alegabilidade futura tanto dos fundamentos de defesa deduzidos, como dos fundamentos de defesa que poderia ter deduzido. E, também quanto ao réu, essa “preclusão” resulta de dois mecanismos processuais distintos.

Efetivamente, o princípio da concentração da defesa na contestação (cf. artigo 573.º), incluindo na defesa superveniente (como se deduz da conjugação dos artigos 588.º, n.º 1, e 729.º, al. g)), determina a preclusão de toda a defesa que não haja oportunamente feito valer contra a concreta causa de pedir invocada pelo autor. Assim, o réu que perdeu não pode, depois, na oposição à execução (cf. artigos 729.º, al. g), a contrario, e 860.º, n.º 3.º) invocar as exceções que não usara, como, por ex., a nulidade do contrato invocado pelo autor, para se negar ao pagamento.

Mas, por outro lado, tampouco o pode fazer em (i) ação autónoma ou em (ii) reconvenção, porque lhe vai ser oposta a autoridade de caso julgado, decorrente da vinculação positiva externa ao caso julgado assente no artigo 619.º, em sede de objetos em relação de prejudicialidade» (obra citada, p. 42).

Pronunciando-se sobre a problemática da preclusão e do caso julgado, Miguel Teixeira de Sousa[21] define a preclusão como “a inadmissibilidade da prática do acto processual pela parte depois do prazo peremptório fixado, pela lei ou pelo juiz, para a sua realização” [sendo possível reconduzir a preclusão a outras causas que não a omissão do acto no prazo devido, a preclusão temporal]”. Trata-se de “um fenómeno processual que é correlativo da situação subjectiva processual típica: esta situação é o ónus processual”. Atribui-lhe duas funções primordiais: uma função ordinatória e uma função estabilizadora.

Distingue a preclusão referida a factos, caso em que é correlativa de um ónus de alegação e de um ónus concentração e a preclusão resultante de um ónus espacial, dando como exemplo o do artº 564º, alínea c):  determinando a citação do réu a inibição deste para propor contra o autor acção destinada à apreciação da mesma questão por este colocada, “a propositura de uma acção impõe ao demandado um ónus de concentração de toda a sua defesa na acção pendente”.

Refere que a preclusão intraprocessual que obsta a que, num processo pendente, um acto possa ser praticado depois do momento definido pela lei ou pelo juiz,  “torna-se uma preclusão extraprocessual quando o que não foi praticado num processo anterior também não pode ser realizado num processo posterior”, sendo “duas manifestações sucessivas de uma mesma preclusão” : “a preclusão começa por ser intraprocessual e transforma-se em extraprocessual quando se pretende realizar o acto num outro processo”.

Analisada a relação entre preclusão e caso julgado, refere que a “preclusão intraprocessual é, naturalmente, autónoma de qualquer caso julgado” e a preclusão extraprocessual não necessita do caso julgado da decisão do primeiro processo para operar num outro processo.

Na análise das relações entre caso julgado e efeito preclusivo, defende  que aquele não produz um efeito preclusivo próprio, exemplificando com o regime decorrente do disposto no artigo 611º, nº1, do CPC: as partes “têm o ónus de alegar os factos supervenientes ou a verificação superveniente dos factos alegados que ocorram até ao encerramento da discussão em primeira instância, sendo a consequência dessa omissão a preclusão da sua alegação posterior. O encerramento da discussão em primeira instância não é o único momento preclusivo, mas o último momento preclusivo”; “se o facto superveniente ocorreu ou foi conhecido antes da audiência final, a preclusão da alegação do facto verifica-se igualmente antes do encerramento da discussão na 1ª instância”. Conclui que o “pretenso efeito preclusivo do caso julgado não é diferente do efeito preclusivo que, independentemente desse caso julgado, já tenha sido produzido na acção pendente quanto a factos ou a ocorrências supervenientes anteriores ao encerramento da discussão em 1ª instância”, ou seja, “o caso julgado não produz nenhum efeito preclusivo próprio”. “este efeito é anterior ao caso julgado”.

Chegado a esta conclusão, afirma que o “caso julgado não produz nenhuma função estabilizadora própria: a função estabilizadora – isto é, a imutabilidade da decisão – que é normalmente atribuída ao caso julgado não é afinal outra que não a função de estabilização que decorre da preclusão”.

Dito de outro modo, “o que há de estabilização (ou de imutabilidade) no caso julgado é o que resulta da preclusão ou, mais em concreto, da preclusão dos factos ou das ocorrências supervenientes verificadas até ao encerramento da discussão em 1ª instância, mas não alegadas em juízo até esse momento. A medida da estabilização oferecida pelo caso julgado coincide com a medida dos factos que estão precludidos e que, por isso, não podem atingir esse caso julgado. O facto que não está precludido por ser posterior ao encerramento da discussão é precisamente o facto que é susceptível de afectar o caso julgado. Sendo assim, o caso julgado não oferece nenhuma estabilização diversa daquela que resulta da preclusão. Quer dizer, na estabilização das situações processuais, a centralidade não pertence ao caso julgado, mas antes à preclusão”.

Por último, refere “Impõe-se ainda uma última observação sobre este ponto. Se o que há de estável no caso julgado é o que se encontra precludido e se o caso julgado pode ser afectado por um facto não precludido, então há que concluir que a preclusão é um factor de estabilização mais forte do que o caso julgado. Enquanto a preclusão não é reversível e está adquirida para todo o sempre, o caso julgado pode ser a afectado por um facto não precludido: um facto precludido nunca pode vir a ser alegado em nenhum processo, mas o caso julgado pode ser atingido por um facto não precludido. Neste contexto, é possível afirmar que nada é mais estável do que a preclusão e nada é mais instável do que o caso julgado”.

Da reflexão efectuada, extrai a segunda conclusão: “o caso julgado, em sim mesmo, não produz nenhum efeito preclusivo da invocação de um facto num outro processo”.

A terceira conclusão prende-se com o “efeito preclusivo produzido pelas excepções de litispendência e de caso julgado”: “…identifica um efeito preclusivo com a inadmissibilidade de uma duplicação de acções, dado que as excepções dilatórias de litispendência e de caso julgado tornam inadmissível uma segunda acção entre as mesmas partes com o mesmo objecto (cf. art. 580.º. n.º 1, 581.º, n.º 1, e 577.º, al. i)). Trata-se, por isso, de uma preclusão que se destina a obstar à repetição da alegação do mesmo facto e procura evitar um bis in idem, não de uma preclusão que incide sobre um facto não alegado num processo e que tem por finalidade impedir uma pronuncia sobre um aliud num outro processo. Isto basta para que se possa concluir que a preclusão que muitos qualificam como um efeito da litispendência e do caso julgado não pode coincidir com a preclusão que é efeito da omissão de um acto: uma não permite a prática do mesmo acto duas vezes, a outra não permite a prática do acto uma única vez”.

Aqui chegado, conclui que “Estes resultados são totalmente concordantes com a conclusão (…) de que o caso julgado não produz nenhuma preclusão de factos não alegados. Todavia, estando afastado que a excepção de caso julgado possa produzir a preclusão destes factos, não está excluído que essa excepção possa ser um meio de realização dessa preclusão”, o que explica da seguinte forma: “a excepção de caso julgado também opera quando a diferença entre o objecto da primeira acção e o da segunda acção decorre da alegação nesta última de um fundamento não invocado naquela primeira. A questão que se coloca é a de saber como se compatibiliza esta conclusão com a afirmação comum de que a excepção de caso julgado pressupõe a repetição de uma causa quanto às partes e ao objecto.

A resposta a esta questão é facilitada se se considerar que, para que a excepção de caso julgado não possa actuar, é necessário que seja alegado na segunda acção um facto diferente daquele que foi invocado no primeiro processo. Ora, este requisito não é preenchido se a alegação deste facto se encontrar precludida, dado que, nesta hipótese, essa alegação não pode deixar de ser considerada irrelevante. Se a invocação do facto é irrelevante, o tribunal não pode utilizar esse facto para contrariar a decisão transitada. Sendo assim - dir-se-á -, só resta ao tribunal a hipótese de proferir uma decisão idêntica à decisão transitada. No entanto, é precisamente a repetição de decisões que, nos termos do disposto no art. 580.º n.º 2, a excepção de caso julgado visa evitar. Assim, o tribunal deve absolver o réu da instância com base naquela excepção (cf. art. 577.º al. i), 576.º, n.º 2, e 278.º, n.º 1, al. e)).

 Conclui que “a preclusão extraprocessual pode operar num outro processo antes de se constituir qualquer caso julgado nesse processo: portanto, os efeitos dessa preclusão não estão dependentes do caso julgado”; “o caso julgado e a excepção de caso julgado não produzem nenhum efeito preclusivo distinto daquele que, quanto aos factos não alegados, se verifica no processo em que é proferida a decisão transitada em julgado”; e “depois de haver no processo uma decisão transitada em julgado, a preclusão extraprocessual deixa de operar per se, passando a actuar através da excepção de caso julgado.” mesmo que os objectos da primeira e da segunda acção não sejam idênticos. [negrito nosso]

Sobre a questão, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 21/4/2010[22]:

1.Em processo especial de prestação de contas recai sobre o réu que está obrigado a prestá-las o ónus de as apresentar tempestivamente, com a cominação de, não o fazendo, não poder contestar as contas apresentadas pelo autor, ficando, consequentemente, sujeito ao apuramento dos movimentos pecuniários e do saldo respectivo em função do julgamento prudencial das contas apresentadas pela parte contrária, complementadas pelas diligências e perícias que o tribunal haja determinado.

2. Não é lícito ao demandado no referido processo especial isentar-se de tal efeito cominatório ou preclusivo através da propositura de ulterior acção, estribada no instituto do enriquecimento sem causa, procurando demonstrar a existência de fluxos pecuniários, muito anteriores ao encerramento da controvérsia sobre a matéria de facto naquele processo especial, e que não curou de invocar e fazer valer nas contas que teve plena oportunidade de apresentar.

3. Na verdade, se intentar tal acção ulterior, é-lhe oponível a excepção dilatória de caso julgado, que abrange a indiscutibilidade da sentença transitada e do efeito preclusivo que lhe subjaz – equivalendo inteiramente à estrita repetição da causa a invocação de matéria de facto, anterior ao encerramento da discussão, não tempestiva e adequadamente suscitada nessa acção - e que o efeito preclusivo irremediavelmente cobriu.”

Nesse Acórdão pode ler-se “A questão é aprofundadamente analisada por Castro Mendes (Limites Objectivos do Caso Julgado em Processo Civil, pags.178 e segs.) onde se afirma a propósito da questão da possível autonomia deste efeito preclusivo relativamente ao instituto do caso julgado: Fora da hipótese de factos objectivamente supervenientes – e esta hipótese reconduz-se à ideia dos limites temporais do caso julgado: a sentença só é válida «rebus sic stantibus» - cremos que os «contradireitos» que o réu podia fazer valer são ininvocáveis contra o caso julgado. O fundamento essencial do caso julgado não é de natureza lógica, mas de natureza prática; não há que sobrevalorizar o momento lógico do instituto, por muito que recorramos a ele na técnica e construção da figura. «O que se converte em definitivo com o caso julgado não é a definição de uma questão, mas o reconhecimento ou não reconhecimento de um bem».(…)

«A paz e a ordem na sociedade civil não permitem que os processos se eternizem e os direitos das partes reconhecidos pelo juiz após uma investigação conduzida pelo juiz de acordo com as normas legais voltem a ser contestados sob qualquer pretexto».

Outro problema que se põe é o de saber se esta figura do efeito preclusivo pertence ao instituto do caso julgado, ou lhe é estranha.

A dogmática tradicional e dominante integra-o no caso julgado. Uma regra clássica diz-nos aqui que tantum judicatum quantum disputatum vel disputari debebat, o caso julgado abrange aquilo que foi objecto de controvérsia, e ainda os assuntos que as partes tinham o ónus (não o dever) de trazer à colação; neste último caso, estão os meios de defesa do réu.(…)

Outro autores vêem este efeito preclusivo como efeito da sentença transitada, mas efeito distinto do caso julgado.(…)

Apreciando esta construção, notaremos antes de mais estarmos inteiramente de acordo com Schwab, quando este salienta que «não tem qualquer relevância prática, se os factos são excluídos com fundamento na eficácia do caso julgado ou com fundamento numa preclusão estranha ao caso julgado». O próprio Habscheid reconhece que caso julgado e efeito preclusivo «ambos se completam, ambos prosseguem o mesmo fim», tutela da paz e da segurança jurídica e chama ao efeito preclusivo «princípio-irmão» do caso julgado material.(…)

A indiscutibilidade de uma afirmação, o seu carácter de res judicata, pode resultar pelo contrário tanto de uma investigação judicial, como do não cumprimento dum ónus que acarrete consigo vi legis esse efeito. Sucede isso no processo cominatório pleno, em que faz caso julgado uma questão decidida apenas pela aplicação de normas de direito processual civil. E sucede ainda a respeito das questões que as partes têm o ónus de suscitar, sob pena de serem ulteriormente irrelevantes para impugnar ou defender uma situação jurídica acertada ou rejeitada em termos de caso julgado.(…)

E - após acentuar que o efeito preclusivo precede a própria prolação da sentença, já que se verifica no momento em que ocorre a cominação ou preclusão processual que está na sua base – conclui:

Com o trânsito em julgado da sentença, o efeito preclusivo dissolve-se porém no instituto geral do caso julgado, e traduz-se no afastamento de possíveis limites argumentativos do mesmo. Se o tribunal condena o réu a pagar 100, fica assente que o réu deve 100 ao autor; e a indiscutibilidade desta afirmação não pode ser posta em causa invocando argumentos, factos ou razões que o efeito preclusivo cobriu. Tal efeito apresenta-se portanto, segundo cremos, como uma das bases do caso julgado material, e não como um instituto teleologicamente convergente, mas autónomo”.

Acolhendo-se a posição defendida por Miguel Teixeira de Sousa de que o caso julgado e a excepção de caso julgado não produzem efeito preclusivo distinto daquele que, quanto aos factos não alegados, se verifica no processo em que é proferida a decisão transitada em julgado e que “depois de haver no processo uma decisão transitada em julgado, a preclusão extraprocessual deixa de operar per se, passando a actuar através da excepção de caso julgado, vejamos a situação dos presentes autos”, não assiste razão ao Recorrente.

Vejamos.

Assiste razão ao Recorrente quanto à não verificação – não constituindo este o fundamento da decisão recorrida – da força e autoridade do caso julgado pois, esta só é aplicável quando, inexistindo identidade de partes, pedidos e causas de pedir, as relações de prejudicialidade entre os objectos processuais impõem que o objecto da primeira decisão funcione como pressuposto indiscutível da nova decisão de mérito, a proferir na segunda causa, o que não se verifica entre a antecedente acção de prestação de contas e a presente acção.

Assiste igualmente razão ao Recorrente quando sustenta que não se verifica a tríplice identidade – de sujeitos, do pedido e da causa de pedir -, pressupostos da excepção do caso julgado, considerando o pedido deduzido e a causa de pedir.

Porém, a questão dos presentes autos centra-se nos efeitos da preclusão do direito do Autor de apresentar contas referentes à administração dos bens comuns do ex-casal até à sentença homologatória da partilha, preclusão que actua através da excepção do caso julgado, mesmo que os objectos da primeira e da segunda acção não sejam idênticos, conforme já exposto.

Esta acção de prestação de contas foi precedida da acção de prestação de contas, intentada pela ora Ré contra o ora Autor - processo nº 768/15.0T8MCN -, invocando, entre o mais, que na sequência do divórcio que dissolveu o matrimónio entre ambos, o património comum do casal que integra bens imóveis, bens móveis e um estabelecimento comercial, ficou sob administração do segundo que utilizou todos os bens do casal em proveito exclusivo e sem pagar qualquer contrapartida.

Nessa acção, Autora e Réu [ora Ré e Autor, respectivamente] transigiram nos seguintes termos:

“1 – O Réu reconhece que está obrigado a prestar contas à Autora por referência aos bens indicados no art.º 6.º da P.I., alíneas a) [Prédio urbano, sito na Travessa ..., extinta freguesia ..., Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial de Marco de Canaveses pela ficha ...38], b)[ Prédio urbano sito na Rua ..., extinta freguesia ..., concelho de Marco de Canaveses, descrito na Conservatória do Registo Predial pela ficha ...23], c)[ Estabelecimento de reparação de veículos automóveis e comércio de pneus, que gira comercialmente em nome individual de AA, instalado na Rua ..., Marco de Canaveses] e d) [Veículo automóvel da marca Peugeot, matrícula TN-..-..; Veículo automóvel da Marca ..., matrícula ..-..-QB; Veículo automóvel da marca Ford ..., com a matrícula HB-..-..; Veículo automóvel da marca Volkswagen ..., com a matrícula GF-..-..; Veículo automóvel da marca Kia – ..., com a matrícula ..-..-LA; Veículo automóvel da marca Fiat ..., com a matrícula RT- ..-..; Veículo automóvel da marca Ford ...; Veículo automóvel da marca Renault ..., com a matrícula ..-..-GE] com excepção dos veículos Renault ..., Ford ... … e Fiat ... (…). Em relação aos veículos ... (…) e Fiat ... (…), o Réu obriga-se a entregar as chaves e documentos que tiver em sua posse às filhas, se e quando estas o solicitarem;

2 - As contas abarcarão o período compreendido entre a data da apresentação em juízo do pedido de divórcio, 26-8-2010, e a entrega efectiva dos bens que se encontram em partilha no processo de inventário no Cartório…” [negrito nosso].

Nesse processo, por sentença proferida em 13/4/2016, foi homologado o acordo entre Autora e Réu (ora, Réu e Autora, respectivamente). Notificado para prestar as contas sob pena de não lhe ser permitido apresentar contestação às contas que a autora vier a apresentar, o réu não apresentou contas.

A então Autora BB apresentou contas tendo por base as diligências instrutórias entretanto realizadas - entre as quais a prova pericial -, em 10 de Setembro de 2020, referentes ao período de Setembro de 2010 a Setembro de 2020.

Proferida sentença em 12/10/2020, objecto de recurso, por Acórdão de 10 de Maio de 2021, proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, foram aprovadas “as contas apresentadas por BB em 10 de setembro de 2020, com o saldo ilíquido global de €100.275,00 (cem mil duzentos e setenta e cinco euros), a que se deduzem as despesas no valor total de € 39.820,26 (trinta e nove mil oitocentos e vinte euros e vinte e seis cents), obtendo-se o saldo líquido de €60.454,74 (sessenta mil quatrocentos e cinquenta e quatro euros e setenta e quatro cents) que dividido em duas partes iguais totaliza €30.227,37 (trinta mil duzentos e vinte e sete euros e trinta e sete centos), valor que AA vai condenado a pagar a BB”.

Com a decisão transitada em julgada, nessa acção, as contas referentes à administração dos referidos bens consideram-se definivamente prestadas e apurado o saldo decorrente da diferença entre as despesas e as receitas.

Todos os factos invocados na presente acção de prestação de contas respeitam a data anterior a Setembro de 12/10/2020. Os pagamentos alegadamente efectuados em data posterior a Setembro de 2020, respeitam aos empréstimos bancários relacionados, no processo de inventário, como passivo [Verba nº1: crédito hipotecário da casa de habitação, contraído no Banco 1..., conta nº ...42, cujo valor à data de 15 de Dezembro é de 39.171,64€  e Verba nº2: crédito ao consumo nº ...03, conta nº ....07 contraído junto do Banco 1... em Fevereiro de 2012, com montante financiado de 15.824,34, actualmente no valor de 19.420,00€], ou seja, respeitam a fluxos financeiros anteriores a Setembro de 2020.

Em suma, todos os valores ora invocados podiam ter sido carreados, pelo ora Autor, para a acção de prestação de contas quando notificado para prestar as contas, com a cominação de, não o fazendo, não lhe ser permitido apresentar contestação às contas que a autora viesse a apresentar.

Não o tendo feito, sujeitou-se ao saldo apurado com base nas contas apresentadas, em sua substituição, pela ora Ré, complementadas com a prova pericial e demais diligências realizadas. A não consideração, no apuramento do saldo, dos movimentos patrimoniais ora mencionados é imputável ao Recorrente que optou por não apresentar contas, quando notificado para o efeito.

O Recorrente alega, nas conclusões vertidas nos pontos 28º a 36º, que não pretende “corrigir qualquer valor ou decisão outrora tomada”, nem “tem a pretensão de exigir uma prestação de contas que já não é possível” . Contudo, essa é a situação configurada nestes autos. 

Assiste razão ao Recorrente quando alega que, enquanto administrador dos bens comuns do casal, recai sobre si a obrigação de prestar contas. Todavia, notificado para o efeito, o Recorrente não cumpriu o ónus de apresentar as contas, pretendendo, agora, fazê-lo, eximindo-se ao efeito preclusivo do nº2 do artigo 943º do CPC. Contrariamente ao alegado, o Recorrente, ao alegar pretensas despesas, pretende retirar eficácia à Decisão, transitada em julgado na antecedente acção de prestação de contas, que condenou o ora Recorrente a pagar à ora Recorrida a quantia de €30.227,37 correspondente a metade do saldo definitivamente apurado.

Como decidido pelo Tribunal a quo, “o legislador consagrou expressamente a impossibilidade de contestar as contas prestadas, quando o obrigado não o faça no prazo fixado (artigo 942º, nº5 e 943º, nº2 do CPC), impossibilitando-o de sindicar as contas apresentadas pela parte que não estava obrigada a fazê-lo.

Admitir que a parte que não pode contestar, sancionada com a restrição imposta, possa à posteriori vir apresentar ação de prestação de contas é desvirtuar a imposição legal, admitindo à posteriori o que fora vedado”.

Em suma, o ora Autor, Réu na antecedente acção de prestação de contas, por estratégia ou não, optou por não apresentar as contas quando notificado para o efeito, com a cominação de que, não o fazendo, não lhe seria permitido apresentar contestação às contas que a autora viesse a apresentar.

Proferido Acórdão, transitado em julgado, na acção de prestação de contas, mostra-se estabelecido o valor das despesas e o valor das receitas e, consequentemente, o saldo.

O caso julgado assegura a confiança nas decisões dos tribunais, pois evita a repetição de acções mas, também, o proferimento de decisões contraditórias, pelo que a decisão de mérito, transitada em julgado, proferida na primeira acção de prestação de contas, não pode ser contrariada por factos que podiam ter sido alegados na correspondente acção e que, por esse motivo, se encontram precludidos.

Pretende o Recorrente, nesta acção, apresentar as contas não apresentadas na antecedente acção de prestação de contas. Os fundamentos da obrigação de prestação de contas é o mesmo: obrigação da prestação de contas com fundamento na administração dos bens comuns do ex-casal. Admitir-se que o Autor/Recorrente pudesse apresentar as contas, na segunda acção de prestação de contas, que omitiu, voluntariamente, na primeira acção de prestação de contas, cuja decisão transitou em julgado, seria – conforme referido pelo Tribunal a quo – “contornar o efeito preclusivo” constante do nº 2 do artigo 943º do Código de Processo Civil e violar a estabilidade do caso julgado.

A preclusão intraprocessual tornou-se numa preclusão extraprocessual, pois que o que não foi praticado no processo anterior também não pode ser realizado em processo posterior, pretendendo o Recorrente, com a apresentação das contas, na presente acção, eximir-se à consequência do incumprimento do ónus de apresentação das contas. Estando precludida a apresentação das contas, pelo Recorrente/Autor, não podem deixar de ser consideradas irrelevantes as contas por si apresentadas. Sendo a prestação das contas com as pretensas despesas irrelevante, o tribunal não pode utilizar esses factos para contrariar a decisão transitada.

Sendo assim, como nos diz Miguel Teixeira de Sousa, já acima citado, só resta ao tribunal a hipótese de proferir uma decisão idêntica à decisão transitada. No entanto, é precisamente a repetição de decisões que, nos termos do disposto no art. 580.º n.º 2, a excepção de caso julgado visa evitar. Assim, o tribunal deve absolver a Ré da instância com base naquela excepção (cf. art. 577.º al. i), 576.º, n.º 2, e 278.º, n.º 1, al. e)).

Como referido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/4/2010, “a não ser assim, a sentença proferida no processo especial de prestação de contas seria pouco menos que inútil, já que sempre seria possível ao demandado que não curou de cumprir atempadamente o ónus de apresentação de contas refazê-las inteiramente em acção ulterior, apresentada sob a capa da figura do «enriquecimento sem causa»”.

O Tribunal a quo absolveu a Ré do pedido. A absolvição da Ré da instância não se revela mais desfavorável para o recorrente – cfr. artigo 635º, nº5, do Código de Processo Civil.

Assim, ainda que não com fundamentação totalmente coincidente, improcedem as pretensões recursórias.

3ª Questão

A apreciação desta questão mostra-se prejudicada face à apreciação e decisão da antecedente questão.

4ª Questão

A Recorrida pugna pela condenação do Recorrente como litigante de má fé alegando que “A conduta processual do Apelante desenvolvida nos autos da acção de prestação de contas – Proc. nº 768/15.0T8MCN, nos autos de inventário –Proc. nº ..6/13 e nos presentes autos é passível de repreensão legal como conduta abrangida pelo disposto no artº 542 do Código de Processo Civil”.

Cumpre apreciar e decidir.

Nos termos do nº2 do artigo 542º do Código de Processo Civil, “Diz-se litigante de má-fé quem, com dolo ou negligência grave:
a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a ação da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão”.

As partes estão vinculadas aos deveres de probidade e cooperação, agir de boa fé e cooperar para se obter, com brevidade e eficácia a justa composição do litígio. Se, com propósito malicioso, a parte pretende convencer o tribunal de um facto ou pretensão que sabe não ser legítima, ou que não pode ignorá-lo, distorcendo ou omitindo a verdade dos factos, fizer do processo um uso reprovável ou deduz oposição cuja falta de fundamento não pode ignorar, actua de má fé e, por essa razão, pode e deve ser sancionada em multa e indemnização à parte contrária, se o pedir.

Algum exagero na pretensão que foi deduzida não é, por si só, litigância de má fé.

Não consubstancia litigância de má fé a dedução de pretensão que vem a decair por não se convencer o tribunal da realidade trazida a julgamento ou resultar da discordância na interpretação e aplicação da lei aos factos, ou mesmo, convencida que lhe assiste razão, vê os seus argumentos afastados por razões mais ponderosas ou legalmente fundadas.

A condenação só deve ocorrer quando se demonstre, de forma manifesta e inequívoca, que a parte agiu dolosamente ou com grave negligência, com o fito de impedir ou a entorpecer a acção da justiça, o que, no caso, não se verifica.

Pronunciando-se sobre a litigância de má fé, no Acórdão de 22/1/2024, proferido por este Tribunal da Relação, no processo nº1944/21.1.T8VFX.P1, pode ler-se:

“No Acórdão de 23-4-2008 (proc. 07S2894, Mário Pereira) consigna que a sustentação de posições jurídicas porventura desconformes com a correta interpretação da lei não implica, por si só, em regra, a qualificação de litigância de má-fé na espécie de lide dolosa ou temerária, porque não há um claro limite entre o que é razoável e o que é absolutamente inverosímil ou desrazoável, no que concerne à interpretação da lei e à sua aplicação aos factos.

A litigância de má-fé exige a consciência de que quem pleiteia de certa forma tem a consciência de não ter razão (ac. do S.T.J. de 11-9-2012, proc. 2326/11.09TBLLE.E1.S1, Fonseca Ramos).

A má-fé depende de intenção maliciosa ou uma negligência de tal modo grave ou grosseira que, aproximando-a da atuação dolosa, justifica um elevado grau de reprovação e idêntica reação punitiva (ac. do S.T.J. de 12-11-2020, proc. 279/17.9T8MNC-A.G1.S1, Maria do Rosário Morgado).

Na verdade, nem sempre a condenação na lide significa que o réu ou o autor reconvindo agiu sob o signo da má-fé ou formulou pretensão injusta, a reclamar o seu sancionamento como litigante de má-fé. Traduzindo a lide processual um conflito de interesses, poderá compreender-se que as partes, convictas do seu direito, percam algum discernimento e objetividade, congeminando uma versão dos factos que é para elas a verdadeira e que pode não corresponder àquela que venha a ser reconhecida a final.

Trata-se de uma área de elevado melindre. É, pois, compreensível que se observe um grau de prudência razoável, numa apreciação casuística da situação em confronto.

É verdade que a interpretação acurada da norma em apreço permite uma maior exigência quanto ao desempenho das partes, mas até ao momento a análise jurisprudencial não permite concluir que os tribunais venham a usar de um crivo mais apertado, erigindo a boa-fé em verdadeiro esteio do sistema. Conferem às partes o benefício da dúvida e só as confrontam com a litigância de má-fé em casos de manifesto desrespeito ético - Menezes Cordeiro (Litigância de Má-Fé, Abuso do Direito de Ação e Culpa in Agendo, Coimbra, Almedina, pp. 30-32) elenca situações em que tribunais superiores procederam a condenações de litigância de má-fé, exemplificativas do grau de exigência praticado”.

No caso dos autos, entende este tribunal que não se mostram ultrapassados os limites da “litigiosidade séria" que "dimana da incerteza” [23], não se verificando os pressupostos da condenação do Recorrente, como litigante de má fé.


*

Custas

Perante as considerações de facto e de direito expendidas, improcede o recurso interposto pelo Autor/Recorrente, bem como a pretensão recursória da Recorrida de condenação daquele como litigante de má fé, pelo que ambos são responsáveis pelas custas, na proporção de 5/6 e 1/6, respectivamente – cf. artigos 527.º, 529.º e 607.º, n.º 6, do CPC.


*

V - Decisão

Pelo exposto, acorda-se em:
a. julgar improcedente o recurso;
b. revogar a decisão proferida pelo Tribunal a quo na parte em que absolveu a Ré do pedido, absolvendo a mesma da instância;
c. no mais, confirmar a decisão recorrida.

Custas do recurso pelo Recorrente e Recorrida, na exacta proporção de 5/6 e 1/6, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficiam - cfr. artigo 527.º, n.º1, do Código de Processo Civil.

*
*
*


Sumário:
……………………….
……………………….
……………………….






Porto 2024/4/8.
Anabela Morais
Jorge Martins Ribeiro
José Eusébio Almeida

__________________
[1] Professor Alberto dos Reis, “ Código de Processo Civil Anotado ”, vol. V, pág. 359.
[2] José Alberto dos Reis, Processos Especiais, Vol. I, Coimbra Editora, pág. 303.
[3] Alberto dos Reis, “Processos Especiais”, vol. I, pág. 308.
[4] António Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Almedina, vol. II, 2022 - 2ª ed., pág. 407.
[5] As relações patrimoniais entre os cônjuges cessam com a dissolução do casamento, designadamente através do divórcio (cfr. artigos 1788.º e 1795.º-A do C.Civil), produzindo-se, neste caso, os seus efeitos entre eles a partir do trânsito em julgado da respectiva sentença, retroagindo-se à data da propositura da acção (cfr. artigos 1688.º e 1789.º, nº1 do mesmo diploma). Cessadas as relações patrimoniais entre os cônjuges, procede-se à partilha dos bens do casal (cfr. artigo 1689.º do C.Civil). Cada cônjuge recebe os seus bens próprios, na partilha, e a sua meação nos bens comuns, conferindo previamente o que dever a este património. Havendo passivo a liquidar, são pagas em primeiro lugar as dívidas comunicáveis até ao valor do património comum, e só depois as restantes (cfr. artigo 1689.º, nºs 1 e 2 do C.Civil). Na liquidação do passivo entram ainda as dívidas dos cônjuges entre si que resultam de terem sido pagas com bens próprios de um dos cônjuges dívidas da responsabilidade de ambos, as quais são pagas pela meação do cônjuge devedor no património comum (cfr. artigo 1689.º, nº 3 do C.Civil).
Todas estas operações foram efectuadas no processo de inventário. Nesses autos, obtida a informação junto do Banco 1... que o valor total em dívida do casal, referente a três empréstimos era de €35.785,66 (trinta e cinco mil setecentos e oitenta e cinco euros e sessenta e seis cêntimos), foi esse valor fixado e aceite pelos interessados como valor do passivo. Consta do mapa de partilhas “…não foi contestado o passivo e houve licitações de ambos os interessados (…). O passivo aprovado importa em … 35.785,66€. (…). Relativamente ao passivo de 35.785,66€, cada um é responsável por metade, ou seja, pela quantia de 17.892,83€. Como o indicado valor declarado dos imóveis a partilhar é de 69.305,00€ e o total do passivo é de 35.785,66, é de 33.519,34 o valor liquido do património comum do casal; e como a cada um dos ex-cônjuges pertence metade do mesmo, a cada um pertence, o património líquido do casal (activo deduzido do passivo), o valor de dezasseis mil setecentos e cinquenta e nove euros e sessenta e sete cêntimos (16.759,67€)”.
Consta, ainda, do mapa de partilhas que “A interessada BB licitou bens que lhe são adjudicados, no valor de 2.505,00€ e fica responsável por metade do passivo no valor de 17.892,83€, sendo assim a sua adjudicação líquida no valor negativo de 15.337,83€, como no património líquido a partilhar (activo deduzido do passivo) tinha direito a bens  no valor de 16.759.00€, leva a menos em seu  pagamento a quantia de 32.097,50€”.
Assim,
[6] O empréstimo contraído por Autor e Ré, após decretado o divórcio, a que alude o Recorrente, em termos genéricos, no ponto 13º das suas conclusões, já não se integra nas relações patrimoniais entre os cônjuges que cessam com a dissolução do casamento – cfr. artigos 1688º e 1789º, nº1, do C.C..
[7] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2.ª edição revista e actualizada, 1985, pág. 703.
[8] Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág. 305.
[9]  Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, Lda., 1985, págs. 712 a 714.
[10] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2.ª edição, Coimbra Editora, Lda., 1985, pág. 712.
[11] Rui Pinto, Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias, Julgar Online, Novembro de 2018.
[12] Miguel Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, Lex – Lisboa 1997, 2ª ed., pág. 579.
[13] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 30 Março de 2017, no processo n.º 1375/06.3TBSTR.E1, acessível em www.dgsi.pt.
[14] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, Almedina 2023, vol. I, 3.ª edição, págs.798-780.
[15]Miguel Teixeira de Sousa, Objecto da Sentença e Caso Julgado Material, BMJ n.º 325, págs. 171 a 179.
[16] Rui Pinto, Exceção e autoridade de caso julgado – algumas notas provisórias, Revista Julgar online, Novembro  de 2018.
[17] Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 174.
[18] Lebre de Freitas e Isabel Alexandre,  Código de Processo Civil Anotado, Almedina, 2021, 4ª ed., vol. II, pág. 748.
[19] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10/10/2012, proferido no processo 1999/11.7TBGMR.G1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[20] Rui Pinto, Exceção e autoridade de caso julgado, Julgar Online, Novembro 2018, pág. 42.
[21] Miguel Teixeira de Sousa, “Preclusão e Caso Julgado”, https://blogippc.blogspot.com/2016/05/paper-199.html.
[22] Acórdão de 21/4/2010, do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no processo nº 6640/07.0TBSTB.E1.S1, acessível em www.dgsi.pt.
[23] Fernando Luso Soares, A Responsabilidade Processual Civil, Almedina, 1987, página 26.