Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1598/20.2T8MTS.B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ISBEL PEIXOTO PEREIRA
Descritores: ARTICULADO SUPERVENIENTE
FACTOS INSTRUMENTAIS
JUNÇÃO DE DOCUMENTOS
Nº do Documento: RP202403211598/20.2T8MTS.B.P1
Data do Acordão: 03/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGAÇÃO PARCIAL
Indicações Eventuais: 3. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A admissibilidade dos articulados supervenientes depende, além do mais, da relevância ou irrelevância do facto respectivo quanto à pretensão deduzida ou à defesa apresentada.
II - Estando em causa no articulado superveniente facto instrumental de contraprova/contra indiciação de excepcionado pelo Réu comportamento abusivo, não se trata de facto que careça sequer de ser alegado pela parte, podendo, contudo, sê-lo, sem necessidade de o ser mediante articulado superveniente, quando se considere já o propósito deste articulado excepcional.
III - Os factos instrumentais puramente probatórios não têm que ser (nem devem ser) objecto de articulação específica pelas partes, sendo a instrução e julgamento o momento próprio para os mesmos emergirem, cabendo ao juiz atendê-los e valorá-los em sede da fundamentação da convicção quanto fixa os factos provados e não provados (Artigo 607º, nº 4, do Código de Processo Civil).
IV - Donde, pode ser objecto de prova, na medida do interesse ou relevância para a infirmação de facto levado aos temas da prova.
V - Inadmissível, por impróprio, o articulado superveniente, a questão vem a sê-lo já a da admissibilidade da junção do documento comprovativo do facto instrumental relevante para matéria integrada nos temas da prova.
VI - O artigo 411.º do CPC estabelece um “poder-dever” do juiz que não se limita à prova de iniciativa oficiosa, incumbindo-lhe realizar ou ordenar as diligências relativos aos meios de prova propostos pelas partes, na medida em que necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio.
VII - Não obstante o princípio da autorresponsabilidade das partes, subjacente à inflexibilidade manifesta no disposto no artigo 423º, n.º 2 do CPC, impõe-se a articulação daquela norma com outros preceitos e outros princípios, desde logo, os que legitimam a iniciativa oficiosa do tribunal na determinação da junção ou requisição de documentos que, estando embora fora daquelas condições de admissibilidade da junção, sejam tidos como relevantes para a justa composição do litígio. Convocam-se, em especial, o princípio do inquisitório, consagrado no artigo 411.º e concretizado ainda no art.º 436.º Em causa a interpretação e aplicação da lei sob o prisma da unidade e a coerência do sistema jurídico, nos termos do artigo 9.º/1 do CC.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: 1598/20.2T8MTS - B.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível de Matosinhos - Juiz 4

Relatora: Isabel Peixoto Pereira

1º Adjunto: Paulo Dias da Silva

2º Adjunto: Francisca Micaela Mota Vieira


*


Acordam os juízes da 3.ª secção do Tribunal da Relação do Porto:

I.

Nos autos acima referenciados, pelo A. foi apresentado articulado superveniente, invocando, para o efeito, e em primeiro lugar, que, na sessão de audiência de discussão e julgamento de 19/09/2023, obteve conhecimento de que existiria uma sentença no processo que correu os seus termos sob o n.º 1925/19.5T8PRT no Juízo Local Cível de Matosinhos, Juiz 4, correlacionada com os factos em discussão nos presentes autos.

Alega que no âmbito da mencionada acção, a Ré (na qualidade de autora) demandou a A... – Companhia de Seguros, S.A. peticionando o pagamento de indemnização de valor equivalente a 20.000,00€ (vinte mil euros), quantia essa correspondente aos danos sofridos pelo Autor, o que sucedeu em data anterior à de entrada da propositura da presente acção. Assim, na óptica do Autor, “ou a Ré se pretendia prevalecer de uma responsabilidade que sabia não ter para aceder a uma indemnização por parte da companhia de seguros, ou sempre a ré reconheceu que os danos do aqui Autor foram efetivamente sofridos, e no montante em que o Autor peticionou, reconhecendo tacitamente que sobre si impende tal responsabilidade”.  Nessa sequência, sustenta que tais factos contrariam a postura da Ré nestes autos, tratando-se de factos subjectivamente supervenientes, nos termos do disposto no artigo 588.º, n.º 1 e n.º 3, alínea c), do Código de Processo Civil.

Por outro lado, alega que, em momento posterior ao termo da fase dos articulados, o Autor tomou conhecimento de que a testemunha AA ficou insolvente, afigurando-se como tal “juridicamente impossível, ou pelo menos, bastante custoso que o Autor viesse a conseguir obter ressarcimento dos danos por si sofridos” junto do mesmo.

O Autor, por considerar tais factos igualmente relevantes, por modificarem ou extinguirem a alegação da Ré no que concerne no que respeita à eventual duplicação de indemnizações e litigância de má-fé, enquadra-os igualmente no disposto no artigo 588.º, n.º 3, alínea c) do Código de Processo Civil.

Finalmente, requer o Autor a junção dos documentos mencionados ao longo do requerimento, quer em virtude de ambos os processos judiciais em causa terem corrido termos neste Tribunal e se enquadrarem no disposto no artigo 5.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil, quer porque a sua junção se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior. Mais acrescenta que, caso assim não se entenda, sempre os mesmos deverão ser admitidos ao abrigo do disposto nos artigos 411.º e 436.º do Código de Processo Civil.

Notificada do sobredito articulado, veio a Ré pugnar pela sua rejeição, alegando que o mesmo, além de extemporâneo, é manifestamente improcedente, por não se enquadrar na matéria a decidir, não revestindo qualquer interesse para a causa.

Para o efeito invoca, em síntese, que do mencionado articulado não se extraem quaisquer factos susceptíveis de interesse ou relevo para a boa decisão da causa, e, em particular no que respeita à acção judicial em que a companhia de seguros foi por si demandada, não configura factualidade nova alguma ou com relevo para os temas da prova enunciados no despacho saneador.

Nos termos e com os fundamentos que dele melhor resultam, que se reconduzem, essencialmente, ao desinteresse dos factos que importam à acção referida no articulado superveniente e à falta de caracterização da superveniência da insolvência de testemunha, alegada ademais, foi julgado inadmissível o articulado superveniente e, em consequência, não foi admitido, nem os documentos que o instruem.

            É desse despacho que vem interposto o presente recurso, pelo Autor/apresentante do articulado superveniente, que conclui nos termos seguintes:

I. O presente recurso tem como objeto a matéria de Direito do despacho proferido nos presentes autos que julgou inadmissível o articulado superveniente aduzido pelo aqui Recorrente, e, consequentemente, os documentos que o instruíram.

II. Não se conforma o Recorrente com a decisão revidenda, pois que se trata de uma decisão processual e materialmente injusta, não atendendo às finalidades últimas da descoberta da verdade e da boa decisão da causa, devendo ser revogada.

III. O Apelante está compenetrado de que Vossas Excelências, reapreciando a factualidade descrita nos autos, bem como, a tramitação ali produzida, e subsumindo a mesma às normas legais efetivamente aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar a decisão proferida.

Perscrutemos,

IV. O Apelante propôs ação declarativa de condenação contra a Apelada, alegando, em suma, que foi mordido numa perna por um animal da propriedade da Apelada, existindo uma relação de comissão entre esta e um terceiro, sendo que, em virtude de tal mordedura, o Apelante sofreu inúmeros danos, patrimoniais e não patrimoniais.

V. A Ré apresentou contestação, alegando, em suma, a existência de seguro de responsabilidade civil obrigatório (preterição de litisconsórcio necessário) e a verificação de caso julgado (em virtude de a Ré ter sido absolvida em processo-crime), de litispendência (em virtude de tal valor e pedido ter sido deduzido já em pedido de indemnização civil contra o terceiro AA, tendo obtido àquela data ganho de causa parcial) e ilegitimidade passiva.

VI. Após foi proferido despacho saneador, no qual foram julgadas improcedentes as exceções suscitadas pela Ré, e indicados, entre outros, os seguintes temas da prova: “(…) d) Actuação de AA relativamente ao encerramento dos animais; e) Comportamento dos dois animais, mormente saber se ambos saíram a correr da sua jaula, ou apenas o cão Alf após provocação do autor; f) Recusa do autor em seguir instruções de AA para se manter em segurança; g) Danos concretamente sofridos pelo autor com as mordeduras dos animais, incluindo as respetivas consequências/sequelas a nível laboral e despesas médicas; h) Atuação de AA sob ordens, direção e instruções da ré; i) Atuação do autor sabendo que deduz pretensão cuja falta de fundamento não pode ignorar, ou fazendo do processo uso reprovável.”.

VII. Na data de 8-11-2023, o aqui Apelante apresentou articulado superveniente, alegando, para o efeito, o seguinte:

- O conhecimento de uma sentença proferida num processo existente entre a aqui Apelada e a sua seguradora, que teria em vista a condenação desta no pagamento de indemnização, no caso de a Ré vir a ser condenada em pagamento de indemnização ao Autor, peticionando o montante de 20.000,00 € idêntico ao que se discute nestes autos;

- O conhecimento de que a testemunha AA, e Arguido no processo-crime que sob o n.º 2160/18.5T9MTS correu os seus termos no T.J.C. Porto- Juízo Local Criminal- Juiz 3, ficou insolvente, afigurando-se juridicamente impossível ou, pelo menos, bastante custoso que o Autor viesse a conseguir obter ressarcimento total dos danos por si sofridos, junto do ali arguido, os quais resultam já comprovados por decisão transitada em julgado no processo n.º 2160/18.5T9MTS, através de Acórdão da Relação do Porto de 14-10-2020, facto relevante para a presente causa, desde logo por modificar ou extinguir a alegação aventada pela Ré quando refere que o Autor pretende a duplicação de indemnizações e que litiga de má-fé requerendo a sua condenação.

VIII. Em tal articulado superveniente, foram alegados institutos jurídicos e deduzidos pedidos subsidiários, requerendo-se, prevenindo a não admissão do articulado superveniente nesses moldes, a admissibilidade dos documentos com ele carreados (identificados como Doc. 1 a Doc. 3 de tal requerimento).

IX. Sucede que, judiciou o Tribunal a quo pela não admissão do articulado, e consequentemente, pela não admissão dos documentos que o instruíram, decisão que padece de ilegalidade.

Pois que,

Das nulidades da decisão a quo:

X. A Mma. Juiz a quo não se pronunciou sobre a possível admissão dos documentos carreados ao abrigo da alegação e instituto subsidiários utilizados no requerimento de 8-11-2023, para além da mera dedução de articulado superveniente.

XI. Apesar de, na súmula dos factos realizada no despacho a quo constar a expressa menção a tal requerimento subsidiário, certo é que o Tribunal a quo não conheceu de tais questões suscitadas, judiciando pela não admissibilidade dos documentos somente com base na inadmissibilidade do articulado superveniente.

XII. Atendendo à improcedência do primeiro pedido, que contendia com a admissão do articulado superveniente, deveria o Tribunal a quo ter conhecido dos pedidos e questões subsidiárias aduzidas.

XIII. A conclusão a que chegou ao Tribunal a quo quanto à inadmissibilidade do articulado superveniente não é bastante para se considerar que o conhecimento das questões omitidas resultou prejudicado.

XIV. Padece o despacho a quo de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos dos artigos 615.º n.º 1 d) e 608.º n.º 2 do CPC, o que desde já se argui para os devidos efeitos e com as necessárias consequências legais,

XV. devendo o Tribunal a quo ter conhecido das questões submetidas e da admissão de documentos requerida, quer ao abrigo do disposto no artigo 5.º n.º 2 c) do CPC, quer subsidiariamente, ao abrigo do artigo 423.º n.º 3 do CPC (ocorrência posterior), ou ainda, ao abrigo dos artigos 411.º e 436.º do CPC, e, por último, nos termos do artigo 421.º n.º 1 do CPC.

Dessarte, e ainda que se entendesse inexistir nulidade por omissão de pronúncia,

Da violação das normas jurídicas constantes dos artigos 588.º nº 4 do CPC, 5.º n.º

2 c), 423.º n.º 3, 411.º, 436.º e 421.º n.º 1 do CPC:

XVI. Ainda que se entendesse inexistir a nulidade assacada, cumpre referir que se verifica a transgressão de normas jurídicas.

Ora,

XVII. Considerou o Tribunal a quo na decisão proferida que “Uma vez que o articulado superveniente deve conter as respectivas provas do alegado, ónus que impende sobre a parte a quem o mesmo aproveita, in casu o Autor, não pode o mesmo ser atendido pelo tribunal, por manifesta impossibilidade de aferir da sua tempestividade à luz do disposto no artigo 588.º, n.º 3, do Código de Processo Civil. Pelo exposto, ao abrigo do artigo 558.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, julgo inadmissível o articulado superveniente e, em consequência, não o admito nem aos documentos que o instruem.”.

XVIII. Ao decidir como decidiu, interpretou e aplicou erradamente o Tribunal a quo o disposto no artigo 588.º n.º 4 do CPC, pois que, tal norma é aplicável aos casos em que se verifica rejeição imediata e liminar do articulado em virtude de os factos não interessarem à boa decisão da causa, ou em virtude de o articulado ser apresentado de forma indubitavelmente extemporânea, o que não sucede in casu.

XIX. Se, por um lado, alega o Tribunal a quo, - erradamente, no nosso entendimento, pois que do edital de insolvência carreado com o articulado como Doc. 2 resulta precisamente a verificação de data posterior ao término dos articulados, facto que é para além de subjetivamente superveniente, também objetivamente superveniente- que não é possível aferir da sua tempestividade, não poderá valer-se daquele preceito para judiciar pela inadmissibilidade do articulado em virtude da alegada intempestividade.

XX. Tal incongruência é, inclusive, suscetível de gerar nulidade por contradição ou ininteligibilidade, nos termos do artigo 615.º n.º 1 c) do CPC, o que desde já se argui para os devidos efeitos e com as necessárias consequências legais.

XXI. Deveria, outrossim, ter interpretado e aplicado tal norma, quanto ao facto da insolvência da testemunha e comissário AA, no sentido de não ser de rejeitar o articulado superveniente, podendo, quando muito, o Tribunal, em caso de dúvida, convidar ao aperfeiçoamento, nos termos do artigo 6.º n.º 2 do CPC, norma jurídica que resultou, de igual forma, transgredida.

Em todo o caso, e mesmo que não se pugnasse pela admissibilidade do articulado superveniente, cumpre ainda reforçar que,

XXII. Os factos alegados no articulado superveniente aduzido, bem como os respetivos documentos que os comprovam, são do necessário conhecimento do Tribunal a quo, nos termos do artigo 5.º n.º 2 c) do CPC, por ocorrerem no exercício das suas funções judiciais, pois que, quer o processo-crime da aqui testemunha e ali Arguido AA, quer o presente processo, quer o processo civil entre a Apelada e a sua Seguradora, correram termos no Tribunal de Matosinhos, encontrando-se correlacionados por versarem sobre a mesma factualidade.

XXIII. Sob a égide de tais normas, deveria o Tribunal a quo ter tido em consideração os factos alegados, e a prova documental juntamente carreada.

XXIV. Ao decidir como decidiu, transgrediu o Tribunal a quo as normas jurídicas constantes do artigo 5.º n.º 2 c) do CPC, devendo ter interpretado e aplicado tal norma no sentido do necessário conhecimento do Tribunal sobre os factos alegados e da admissão dos documentos carreados que os comprovam.

Em todo o caso, e mesmo que assim não se entendesse,

XXV. Salvo devido respeito por superior entendimento, sempre haveria que admitir-se a junção de documentos operada no articulado superveniente, pois que, a sua junção se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior, ora em virtude do conhecimento posterior dos factos sobre que estes versam, ora porque, no que ao documento 3 concerne, a junção afigurou-se necessária em virtude da alegação da Ré no requerimento do dia 8/11/2023, no qual coloca em causa, pela primeira vez, o trânsito em julgado da decisão proferida no processo-crime n.º 2160/18.5T9MTS.

XXVI. Afigurava-se, outrossim, absolutamente imperioso elucidar o Tribunal a quo, uma vez que se pronunciará a final sobre a exceção de autoridade do caso julgado, de que a decisão de condenação do comissário AA havia transitado em julgado, tendo sido proferido o Acórdão carreado.

XXVII. Ao decidir como decidiu, transgrediu a Mma. Juiz a quo a norma jurídica do artigo 423.º n.º 3 do CPC, devendo ter judiciado pela admissibilidade dos aportados documentos em virtude das ocorrências posteriores sobreditas.

Para além disso, e mesmo que Vossas Excelências assim não entendam, o que por dever de patrocínio se concebe,

XXVIII. As normas jurídicas constantes dos artigos 411.º e 436.º do CPC estipulam o princípio do inquisitório e um dever de ofício do Tribunal que se traduzem na prevalência do necessário apuramento da verdade para a boa decisão da causa e justa composição do litígio.

XXIX. Afigura-se necessária a admissão da junção de documentos operada, uma vez que se afiguram essenciais para a descoberta da verdade e da boa decisão da causa, atendendo a um critério de justiça material, ao invés de um critério puramente formalista, uma vez que sem a prova e o conhecimento do estado dos processos contíguos ao objeto da causa, designadamente do trânsito em julgado da decisão que determinou a condenação do comissário/testemunha AA, por responsabilidade civil por factos ilícitos, no pagamento de indemnização ao aqui Autor, (e, bem assim, o seu estado insolvencial), que impede que, sobre a mesma matéria, venha a incidir decisão distinta, não poderá verificar-se a prolação de uma decisão eficaz e justa[1]

XXX. In casu, deveria a Mma. Juiz a quo ter admitido/ordenado a junção dos referidos documentos, porquanto tais informações se afiguravam necessárias à descoberta da verdade, e sobre o princípio da autorresponsabilidade e do dispositivo deveria prevalecer, in casu, o princípio do inquisitório.

XXXI. A junção dos documentos realizada pelo Autor afigura-se de assaz relevância e pertinência para a descoberta da verdade e para uma decisão processualmente justa e eficaz, não trazendo qualquer inconveniente para a tramitação processual e para a discussão da causa.

Pelo que,

XXXII. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo transgrediu as normas jurídicas constantes dos artigos 411.º e 436.º do CPC, devendo ter interpretado e aplicado tais normas no sentido da admissibilidade, relevância e pertinência, in casu, dos documentos carreados.

Por fim, e ainda que assim não se entendesse,

XXXIII. Considerando que os Documentos 1 a 3 se tratam de documentos relativos aos mesmos intervenientes processuais (envolvendo quer, por um lado, a aqui Ré BB, quer, por outro, o comissário AA), oriundos de processos correlacionados, com audiência contraditória e nos quais os intervenientes processuais tiveram as mesmas garantias, sempre deveriam ser admitidos tais documentos, ao abrigo do disposto no artigo 421.º n.º 1 do CPC.

XXXIV. Não tendo sido admitidos ao abrigo de tal princípio, resultou transgredida a norma jurídica constante do artigo 421.º n.º 1 do CPC, devendo ter sido interpretada e aplicada no sentido da admissibilidade da junção considerando o valor extraprocessual das aportadas provas.

XXXV. Alfim, revogando a douta decisão recorrida, e substituindo por uma outra que judicie pela admissão do articulado superveniente ou, mesmo que assim não se entenda, pela admissão dos documentos carreados pelo Autor, farão Vossas Excelências inteira e sã Justiça.

Conclui, requerendo se revogue a decisão revidenda, substituindo-se por outra que judicie pela admissibilidade do articulado superveniente ou, mesmo que assim não se entenda, que judicie pela admissibilidade dos documentos com ele carreados.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

II.

É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).

Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito:

- à apreciação da questão da admissibilidade do articulado superveniente e, sendo de confirmar a decisão recorrida;

- à verificação da nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia e ininteligibilidade, no que concerne à pretensão subsidiária de junção dos documentos;
- ao erro da decisão no que importa à não junção.

III .

         À decisão das questões importa-nos a consideração do teor dos articulados da acção, do requerimento do Autor, que denominou de articulado superveniente e os termos da decisão recorrida, para os quais nos remetemos, por constarem dos autos.


*

Conforme dispõe o artº. 5º do C.P.C., às partes impõe-se o ónus de alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas –nº. 1.

Para além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz os factos instrumentais que resultem da instrução da causa, os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar, e os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções –nº. 2.

Face ao disposto no artº. 552º, nº. 1, d), do C.P.C., a petição inicial é o articulado no qual o autor deve expor os factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação. E face ao disposto no artº. 572º, b) e c), do mesmo C.P.C., na contestação o réu expõe as razões de facto e de direito por que se opõe à pretensão do autor e os factos essenciais em que se baseiam as exceções deduzidas, se for o caso. O artº. 573º do C.P.C. consagra o princípio da concentração que por sua vez implica o princípio da preclusão, impondo que a defesa deve ser deduzida na contestação e que depois desta só podem ser deduzidas as exceções, incidentes e meios de defesa que sejam supervenientes, que a lei expressamente admita passado esse momento ou de que se deva conhecer oficiosamente.

A lei processual contudo prevê uma possibilidade de desvio a estas regras, consagrando o articulado superveniente para factos superveniente relativamente àqueles momentos temporais.

Dispõe o art. 588º, do CPC, que: “1 - Os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito que forem supervenientes podem ser deduzidos em articulado posterior ou em novo articulado, pela parte a quem aproveitem, até ao encerramento da discussão. 2 - Dizem-se supervenientes tanto os factos ocorridos posteriormente ao termo dos prazos marcados nos artigos precedentes como os factos anteriores de que a parte só tenha conhecimento depois de findarem esses prazos, devendo neste caso produzir-se prova da superveniência. 3 - O novo articulado em que se aleguem factos supervenientes é oferecido:

a) Na audiência prévia, quando os factos hajam ocorrido ou sido conhecidos até ao respetivo encerramento;

b) Nos 10 dias posteriores à notificação da data designada para a realização da audiência final, quando não se tenha realizado a audiência prévia;

c) Na audiência final, se os factos ocorreram ou a parte deles teve conhecimento em data posterior às referidas nas alíneas anteriores.

4 - O juiz profere despacho liminar sobre a admissão do articulado superveniente, rejeitando-o quando, por culpa da parte, for apresentado fora de tempo, ou quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa; ou ordenando a notificação da parte contrária para responder em 10 dias, observando-se, quanto à resposta, o disposto no artigo anterior. 5 - As provas são oferecidas com o articulado e com a resposta. 6 - Os factos articulados que interessem à decisão da causa constituem tema da prova nos termos do disposto no artigo 596.º”.

A possibilidade de apresentação de articulado superveniente está diretamente relacionada com o disposto no artº. 611º, nºs. 1 e 2, do C.P.C., que consagra que a sentença deva ser actual, tomando em consideração todos os factos constitutivos, modificativos ou extintivos do direito produzidos até ao encerramento da discussão, desde que, segundo o direito substantivo aplicável, eles influam na existência ou conteúdo da relação controvertida. Desde logo, porém, estabelece a ressalva da verificação das condições em que pode ser alterada a causa de pedir –artºs. 264º e 265º do C.P.C.-, ou do respeito pelas restrições previstas noutras disposições legais, o que se entende estar a referir-se ao respeito pelo disposto no artº. 588º do C.P.C., além doutros (cfr. António Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa, “Código de Processo Civil Anotado, Vol I, pag. 732).

Conforme decorre do artº. 588º, nº. 2, citado, a superveniência factual tanto pode ser objetiva, como subjetiva. Ocorre a superveniência objetiva quando os factos têm lugar após o decurso do prazo para a apresentação dos articulados. Verifica-se a superveniência subjetiva quando os factos ocorreram em momento anterior ao prazo para a apresentação dos articulados, mas a parte só deles teve conhecimento posteriormente, sendo que, neste caso, tem de ser efetuada a prova da superveniência.

Do exposto decorre que o articulado superveniente é rejeitado se for extemporâneo ou se os factos aí alegados não interessarem à decisão da causa (do ponto de vista de quem o vem alegar, acrescentamos nós).

Como se adiantou, a admissibilidade dos articulados supervenientes depende, além do mais, da relevância ou irrelevância do facto respectivo quanto à pretensão deduzida[2]. Refere Lebre de Freitas que «podem, depois de terminado o prazo para o último articulado da parte, ocorrer novos factos – ou elementos de facto – constitutivos da situação jurídica do autor (ou do facto objecto da acção de simples apreciação) ou factos modificativos ou extintivos dessa situação (superveniência objectiva)»[3].

A lei impõe ao julgador uma intervenção de controlo no sentido de apurar da tempestividade e, bem assim, da utilidade dos factos supervenientes para a justa decisão do litígio, expressa esta última na alocução «quando for manifesto que os factos não interessam à boa decisão da causa».

Os factos supervenientes atendíveis terão de ser relevantes – ainda que instrumentais – com aptidão para modificarem ou extinguirem o direito peticionado, quer por via principal, quer reconvencional. O juízo decisor terá de ponderar se o facto que se apresenta importa para a decisão nos precisos termos em que a bosquejou, sendo que, nesse primeiro esboço do silogismo judiciário, a alteração da premissa menor por um facto recém-aparecido pode conduzir a uma diferente conclusão. Mas desconsiderá-lo-á se o sentido da decisão se mantiver mau grado aquele surgimento, na formulação lapidar do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22/09/2009, in www.dgsi.pt.

         Ora, no que se reporta, desde logo, aos factos que importam à propositura pela aqui Ré de uma acção contra a Companhia de Seguros que garante a responsabilidade civil (da Ré mesma) por danos causados por animais, ainda quando se discorde do segmento da decisão recorrida em que se refere que a litigância de má fé, não tendo sido reclamada/arguida pelo Autor quanto à Ré, permanece fora do objecto do litígio, quando é certo que a mesma é também de conhecimento oficioso e pode ser suscitada em qualquer momento/estado da causa, desta feita sem limitação implicada pelo princípio da estabilidade da instância, quando se verifiquem os termos mesmos da acção a que se reporta o autos, por via da certidão cuja junção vem requerida, impõe-se concluir pela total impertinência ou irrelevância dos factos atinentes à propositura da acção…

         Na verdade, aquela propositura, visto o objecto definido pela causa de pedir daquela acção, conforme certidão cuja junção vem requerida, reforçada ademais tal estraneidade ou inocuidade pela sentença ali proferida, não se constitui como um comportamento da Autora contraditório com a postura assumida nesta acção…

Com efeito, ali em causa a discussão sobre o âmbito de cobertura do seguro de responsabilidade civil contratado (pela falta de comunicação de uma causa de exclusão oposta pela Seguradora), sendo que o sinistro em causa nestes autos se constitui ali como o pretexto ou contexto para a pretensão principal deduzida, como bem o compreendeu a sentença; sendo certo que a ora Ré e aqui Autora em lado algum daquela acção assume a responsabilidade pelos factos aqui em apreço, limitando-se a aludir a essa possibilidade, por ser do seu conhecimento a pretensão do ora Autor.

Tudo para reiterar a absoluta impertinência da propositura da acção pela Ré, que se constitui como o facto superveniente que justifica o articulado respectivo, por em nada relevar para o objecto dos autos, ainda do ponto de vista do comportamento processual da Ré.

É, pois, de manter a decisão de indeferimento do articulado superveniente, nessa parte.

E, adiante-se, a decisão de não admitir a junção da certidão respectiva, ainda do ponto de vista da requerida subsidiariamente junção de documento.

Desde logo, não se tem por caracterizada a omissão de pronúncia, nem a ininteligibilidade da decisão nessa parte.

Com efeito, ainda quando o conhecimento de ambas as pretensões seja conjunto e, aparentemente, a parte final da decisão pareça referir-se tão só ao indeferimento da junção de documento formulada também para a hipótese de se haver por inadmissível o articulado superveniente(melhor se diria, os articulados supervenientes) como mera consequência desta, a decisão quanto à não admissão dos documentos é expressa e ademais da fundamentação do despacho elucida a razão da sua não junção, a saber, a imprestabilidade para o objecto atendível da acção.

Na verdade, o despacho constitui-se como um acto jurídico não negocial ao qual são aplicáveis, ex vi do art. 295º do CC, as regras gerais da interpretação…

Ora, patente a consideração do requerimento subsidiário de junção de documentos e a decisão no sentido do seu indeferimento.

Outrossim não se segue que a desconsideração na decisão recorrida da totalidade dos argumentos convocados para a junção (subsidiária) se constitua como nulidade emergente da falta ou omissão de pronúncia, sabido que é que o tribunal não decide argumentos, mas pretensões…

Ainda quando se houvesse de admitir uma tal omissão de pronúncia, sempre em condições este tribunal de a suprir, decidindo, precisamente, pela mesma inadmissibilidade de junção aos autos de certidão da acção interposta pela Ré contra a companhia de seguros da responsabilidade civil respectiva, pela total impertinência ao objecto da acção.

A proposição e a produção da prova em juízo visam demonstrar a realidade dos factos relevantes para o processo[4], sendo que regras existem, para a balizar, de direito probatório material, de natureza substantiva, a regular a admissibilidade e força probatória, inseridas no Código Civil, e de direito probatório formal, a regular os procedimentos probatórios, e que têm sede no Código de Processo Civil.

O artigo 410º, do Código de Processo Civil, com a epígrafe “Objeto da instrução”, bem estatui que “A instrução tem por objeto os temas da prova enunciados ou, quando não tenha de haver lugar a esta enunciação, os factos necessitados de prova”.

São os próprios temas da prova o objeto da instrução[5], neles se incluindo os factos, quer os essenciais quer os instrumentais, sobre que a prova incide, pois que o real e efetivo objeto da instrução é sempre matéria fáctica, nos termos dos arts 341º e segs, do Código Civil.

Assim, enunciados temas da prova - para, no final da instrução, o juiz decidir, na sentença, os factos que considera provados e não provados -, correspondendo um deles a um facto, tem de ser o mesmo objeto direto da instrução, não estando, contudo, as partes inibidas de produzir prova sobre factos instrumentais ou circunstâncias que indiciem ou revelem aquele. Nos temas de prova de formulação mais genérica é objeto de instrução toda a factualidade pertinente para a sua concretização, tendo em conta a previsão normativa de que depende o resultado da ação, aí se incluindo a livre discussão dos factos em relação de instrumentalidade[6].

Destarte, havendo enunciação dos temas de prova, o objeto da instrução são os temas da prova, densificados pelos factos, principais e instrumentais (constitutivos, modificativos, impeditivos ou extintivos do direito afirmado) – arts 410º, do CPC e 341º e segs, do Código Civil. E é garantida ampla liberdade, em sede de instrução, no sentido de permitir que, na produção de meios de prova sejam averiguados os factos circunstanciais ou instrumentais, designadamente aqueles que possam servir de base à posterior formulação de presunções judiciais, sendo que a instrução da causa “deve ter como critério delimitador o que seja determinado pelos temas da prova erigidos e deve ter como objetivo final habilitar o juiz a expor na sentença os factos que relevam para a decisão da causa, de acordo com as diversas soluções plausíveis da questão de direito”[7].

Sendo as diversas fases do processo a proposição, a audiência contraditória e a admissão (ou rejeição), com vista à produção das provas e decisão, podendo ser objeto de instrução tudo quanto, de algum modo, possa interessar à prova dos factos relevantes para a decisão da causa, não deve ser permitido seja objeto de instrução aquilo que se apresenta como irrelevante para a concreta causa, tal como desenhada se mostra.

Assim, para a apreciação da prova, que tem lugar na fase da sentença, só são admitidos os meios de prova propostos, após audiência da parte contrária, que relevem de acordo com as diversas soluções plausíveis da questão de direito.

Tem, pois, de ser olhado o objeto do litígio, que se define pelo pedido formulado e respetiva causa de pedir, para se aferir dessa relevância, nenhuma a podendo ter se nem sequer cabe apreciar a concreta questão a que a prova em causa pode interessar.

E para além da relevância/pertinência e após tem de se analisar da admissibilidade legal, só sendo de admitir um meio de prova se legalmente admissível.

Na verdade, esse o primeiro e essencial pressuposto de admissibilidade de junção de documentos a processos, o respectivo interesse ou relevância a demonstrar/provar factos importantes à decisão. Ausente, sempre de indeferir, qualquer que seja a disposição legal convocada[8].

Como se adiantou, não se antevê relevo, sequer instrumental, aos factos que emergem da certidão cuja junção vem requerida e atinente à acção que correu termos entre a ora Ré e a “sua” seguradora.

Mantendo-se, nessa parte, o indeferimento da junção.

Quanto ao articulado superveniente, no que respeita já à declaração de insolvência do responsável criminal e alegado comissário da Ré e documento comprovativo da declaração respectiva.

Temos para nós não estar em causa qualquer facto extintivo ou modificativo da excepção invocada pela Ré, a do comportamento abusivo pelo Autor, mediante a duplicação de pretensão indemnizatória. 

Antes e só facto instrumental de contraprova/contra indiciação daquele excepcionado comportamento abusivo…

Como tal, não se trata de facto que careça sequer de ser alegado pela parte, podendo, contudo, sê-lo, sem necessidade de o ser mediante articulado superveniente, quando se considere já o propósito acima exposto deste articulado excepcional.

Os factos instrumentais puramente probatórios não têm que ser (nem devem ser) objecto de articulação específica pelas partes, sendo a instrução e julgamento o momento próprio para os mesmos emergirem, cabendo ao juiz atendê-los e valorá-los em sede da fundamentação da convicção quanto fixa os factos provados e não provados (Artigo 607º, nº 4, do Código de Processo Civil).

Donde, pode ser objecto de prova, na medida do interesse ou relevância para a infirmação de facto levado aos temas da prova; assim aquele sob a alínea i) dos mesmos: Atuação do autor sabendo que deduz pretensão fazendo do processo uso reprovável.

Assim, inadmissível, por impróprio, o articulado superveniente, a questão vem a sê-lo já a da admissibilidade da junção do documento comprovativo da declaração de insolvência, enquanto facto instrumental relevante para matéria integrada nos temas da prova.

Juízo perfeitamente idêntico quanto à também requerida junção (protestada) de certidão dos autos de processo crime que versaram sobre a conduta do alegado comissário, AA.

Nessa parte, em causa já a relevância probatória de sentença crime transitada, no que concerne a um selecionado tema da prova, aquele sob d), a actuação de AA relativamente ao encerramento dos animais[9], na medida em que caracterizando os elementos do tipo legal pelo qual foi condenado…

 Relativamente à prova por documentos, com a epígrafe “Momento de apresentação”, dispõe o art. 423º, do Código de Processo Civil, em matéria de oportunidade de junção: “1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes. 2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado. 3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”.

Assim, quanto à junção de documentos, em 1ª instância, este diploma permite a junção em três momentos distintos (cfr art. 423º): i) com o articulado, sendo essa a regra geral (nº1); ii) até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas com a cominação de multa, exceto se a parte alegar e demonstrar que os não pode oferecer antes (nº2); iii) até ao encerramento da discussão em 1ª instância, mas, neste caso, somente daqueles cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior (nº3).

Assim, sendo rígida a imposição legal, os documentos destinados a provar os fundamentos da acção e da defesa (factos principais), bem como os factos instrumentais que constituam a base duma presunção legal ou facto contrário ao legalmente presumido, devem ser apresentados com o articulado em que os mesmos sejam alegados, sendo que, embora não um ónus (salvo quando o documento é essencial) é um dever e a violação do mesmo com apresentação ulterior, permitida se efetuada sem ultrapassar o limite referido em ii), é punida com multa.

Ultrapassado o limite referido em ii) não podem mais ser juntos documentos pelas partes em primeira instância, apenas sendo admitida apresentação, e até ao encerramento da discussão em 1ª instância (que se dá com o termo das alegações orais – v. al. e), do nº3, do art. 604º e cfr., ainda, art. 425º), dos documentos: 1) cuja junção não tenha sido possível até àquele momento, por se ter verificado um impedimento que não pôde ser ultrapassado em devido tempo;

2) que sejam objetiva ou subjetivamente supervenientes (apenas produzidos ou que vieram ao conhecimento da parte apresentante depois daquele momento);

3) cuja apresentação se tenha revelado necessária em virtude de “ocorrência posterior”, esta a determinar casuisticamente, como é o caso de se verificar facto novo oficiosamente cognoscível[10].

Sempre não pode uma parte estar à espera do que vai dizer uma testemunha arrolada para decidir da conveniência da junção de documentos destinados à instrução da causa, sendo que as necessidades de prova são as já existentes nos autos e já conhecidas das partes quanto a factos já verificados (não factos/ocorrências posteriores).

Pacífico é, na Doutrina e na Jurisprudência[11]/[12], que “ocorrência posterior” que legitima a entrada de documentos no processo não respeita a factos que constituem o fundamento da ação ou da defesa (factos essenciais – art. 5º), pois que alegados se mostram nos articulados ou têm de o ser na sequência de despacho de aperfeiçoamento (art. 590º, nº4), nem a factos supervenientes, pois que a alegação de tais factos deve ser acompanhada dos documentos (art. 588º, nº5), respeitando, sim, a factos instrumentais ou a factos relativos a pressupostos processuais.

Como refere Lebre de Freitas “O facto (“ocorrência”) posterior a que se refere o nº3, do art. 423º não é um facto principal, pois este só pode ser introduzido na causa mediante alegação em articulado superveniente, caso já coberto pela norma do nº1 do artigo; a previsão do nº3 respeita a factos instrumentais relevantes para a prova dos factos principais ou factos que interessem à verificação dos pressupostos processuais. Sendo a ocorrência posterior, o documento que a prova não pode deixar de ser formado, também ele, posteriormente; mas a esta situação há que assimilar os casos em que o facto (ainda que principal e como tal alegado) tenha ocorrido antes da preclusão do art. 423º-2, fazendo já parte do processo, mas o documento que o prova (contendo, por exemplo, uma declaração confessória extrajudicial) só posteriormente se tenha formado”.

Cabe ao requerente, apresentante do meio de prova documental, que se apresenta a exercer o direito à junção, os ónus de alegação e da prova de que não foi possível apresentar o documento até àquele momento ou de ocorrência posterior a tornar necessária a junção. E nada tendo, sequer, sido alegado pelo apresentante, não pode deixar de ser indeferido o requerimento formulado com vista à obtenção para os autos do meio de prova documental em causa.

Neste conspecto, por não ser legalmente admissível a junção em audiência de julgamento, já que os pressupostos de tal junção não foram alegados e provados.

Irreleva, pois, que a data de proferimento da declaração de insolvência e do trânsito do Acórdão proferido em processo crime o tenham sido após a apresentação dos articulados e do saneamento da causa, adquirido que se mostra, mediante os termos respectivos, que o foram bem antes dos 20 dias anteriores ao início da audiência de julgamento, respectivamente, a 16.12.2021 e 14.10.2020.

Ora, nessa medida, cabia ao requerente alegar e provar quando tomou conhecimento daqueles meios de prova, que não apenas reconduzir-se à superveniência dos mesmos com relação aos articulados.

Sem prejuízo, aduz o requerente, logo no requerimento respectivo, que a junção da certidão dos autos de processo crime vem a sê-lo na medida em que a Ré colocou em causa o trânsito em julgado da decisão condenatória…

Não colhe o argumento[13], tanto mais que, quando se tenha presente a qualidade de demandante, mister é inferir-se que o conhecimento do trânsito e, consequentemente, a afirmação da eficiência probatória da decisão penal condenatória, o foi bem antes dos 20 dias que precederam o início efectivo da audiência…

Sempre não alegada a ocasião do conhecimento da declaração de insolvência, nem justificada a razão para a apresentação do documento comprovativo já no decurso mesmo da audiência.

Donde, não caracterizados os pressupostos de admissibilidade legal/geral para a junção tardia ou intempestiva de ambos os documentos.

Manifestamente não em causa factos do conhecimento oficioso pelo tribunal, subjacente a esta alegação uma construção perfeitamente artificiosa, desconsiderando já a realidade de estarem em causa decisões de tribunais de competência especializada perfeitamente distintos, sendo que o “tribunal” para o efeito da convocada norma vem a sê-lo já “o juiz do processo”.

Insubsistente a junção por via de um tal expediente.

Por fim, tem-se entendido que o princípio do inquisitório (art. 411 do CPC) não pode ser utilizado para, objectivamente, auxiliar uma das partes, prejudicando a outra, permitindo àquela introduzir no processo documentos que não apresentou atempadamente nos termos do art. 423 do CPC.

Na oportuna consideração do Acórdão da Relação do Porto de 18/02/2016[14], “[…] não se ceda à tentação de santificar a violação de proibições de prova em atenção ao fim da descoberta de uma (pretensa) verdade ‘material’. Hoc sensu, a chamada ‘verdade material’ continua a ser, ainda aqui, uma verdade intraprocessual.” “[A ‘verdade material’] há–de ser antes de tudo uma verdade judicial, prática e, sobretudo, não uma verdade obtida a todo o preço mas processualmente válida.”

De todo o modo, no que importa agora à admissão da junção por via da iniciativa oficiosa do juiz, aqui convocamos a síntese de Lemos Jorge, OS PODERES INSTRUTÓRIOS DO JUIZ: ALGUNS PROBLEMAS, JULGAR - N.º 3 – 2007, p. 61 e ss., em termos de um desejável equilíbrio dos interesses em causa.

Sob a epígrafe “Princípio do inquisitório”, preceitua o citado artigo 411.º do Código de Processo Civil: «Incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.».

Quanto ao conteúdo do ‘poder-dever’ em causa,  por todos, o Acórdão da Relação de Lisboa, de 17.05.2018 [processo n.º 32063/15.9T8LSB.L1]: «O artigo 411º do Código de Processo Civil, determinando que incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer, consagra um claro poder-dever do juiz, com vista à plena realização dos fins do processo».

A dinâmica evolutiva do processo civil tem-se afirmado no confronto dialético entre dois princípios que na aparência se contradizem – dispositivo e inquisitório – com sucessivas cedências do primeiro e prevalência do segundo, com vista à realização do verdadeiro desiderato do processo, afirmado nos artigos 8.º, n.º 1 e 411.º do CPC: o apuramento da verdade e a justa composição do litígio.

Como referem Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Pires de Sousa[15], o artigo 411.º do CPC faz apelo à realização de diligências probatórias que importem a justa composição do litígio, cumprindo ao juiz exercitar a inquisitoriedade, preservando o necessário equilíbrio de interesses, critérios de objetividade e uma relação de equidistância e de imparcialidade.

No mesmo sentido, escrevem Lebre de Freitas e Isabel Alexandre: Os poderes-deveres do juiz, estabelecidos na norma em apreço, não se limitam à prova de iniciativa oficiosa, como mostra o segmento “mesmo oficiosamente”. Ao juiz cabe também realizar ou ordenar as diligências dos procedimentos probatórios relativos aos meios de prova propostos pelas partes, na medida em que necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio[16]. Ainda no mesmo sentido, refere J. M. Gonçalves Sampaio[17]: Sendo certo que o juiz não pode, nem deve, em princípio, substituir-se à parte, atento o princípio do dispositivo, temos para nós que, após a Reforma de 1995-1996, o juiz passou a ter uma intervenção mais activa na instrução do processo, devendo fazer uso do poder-dever conferido pelo normativo do n.º 3 do artigo 265.º (princípio do inquisitório) sempre que as circunstâncias e a boa instrução do processo o aconselhem, visando, em última instância […] obter um melhor apuramento da verdade material e justa composição do litígio.

A definição do dever funcional do juiz emergente da norma processual convocada, como “poder-dever” subordinado ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, vem sendo sistematicamente afirmada na jurisprudência, apenas com os limites que se sintetizam no sumário do acórdão da Relação de Guimarães, de 14.05.2020 [processo n.º 659/18.2T8GMR-A.G1] que parcialmente se transcreve: «I- O uso de poderes instrutórios está sujeito aos seguintes requisitos: i) a admissibilidade do meio de prova; ii) a sua manifestação em momento processualmente desadequado; iii) a necessidade da diligência ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio; e iv) a prova a produzir incidir sobre factos que é lícito ao juiz conhecer».

         Como se sustentou, numa linha coincidente, no Acórdão da Relação do Porto de 07.01.2019, acessível na base de dados da dgsi, «Com a inovação do n.º 2 do artigo 423.º do CPC, decorrente da última reforma do processo civil, que impõe como limite para a junção de documentos o prazo de «20 dias antes da data em que se realize a audiência final», o legislador visou evitar surpresas no julgamento, decorrentes da junção inesperada de um qualquer documento, com consequências negativas traduzidas, nomeadamente, no arrastamento e no adiamento das audiências, obrigando as partes a uma maior lisura e cooperação processual na definição das suas estratégias probatórias. (…). Advertem, no entanto, os citados autores (Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Parte Geral e Processo de Declaração, Almedina, 2018, pág. 500 e 501): «Apesar da rigidez para que o preceito parece apontar, em parte associada ao princípio da autorresponsabilidade das partes, o mesmo não pode deixar de ser compatibilizado com outros preceitos ou com outros princípios que justificam a iniciativa oficiosa do tribunal na determinação da junção ou requisição de documentos que, estando embora fora daquelas condições, sejam tidos como relevantes para a justa composição do litígio, à luz, pois, de um critério de justiça material, cabendo realçar em especial o princípio do inquisitório consagrado no artigo 411.º e concretizado ainda no art.º 436.º (acerca do necessário equilíbrio entre a autorresponsabilidade das partes e a oficiosidade do inquisitório, cf. Paulo Pimenta, ob cit., pp. 372-373)». Em suma, a lei deve ser interpretada e aplicada, perspetivando sempre a unidade e a coerência do sistema jurídico (artigo 9.º/1 do CC), sopesando os princípios em presença, nomeadamente o princípio da verdade material, estruturante de todo o processo civil (visa-se a verdade substancial, até porque a ‘verdade formal’ ou meramente processual é mera ficção).»

         E ainda, o mesmo Relator, desta feita, no Acórdão 08/09/2020, da mesma Relação (também na base de dados da dgsi): «O artigo 411.º do CPC estabelece um “poder-dever” do juiz que não se limita à prova de iniciativa oficiosa, como se conclui do segmento “mesmo oficiosamente”, incumbindo-lhe realizar ou ordenar as diligências relativos aos meios de prova propostos pelas partes, na medida em que necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, preservando sempre o necessário equilíbrio de interesses, critérios de objetividade e uma relação de equidistância e de imparcialidade.»

         Já se discorreu sobre o interesse ou relevância probatória dos documentos cuja junção vinha requerida, integrando prova da declaração de insolvência do co-responsável e do trânsito em julgado de decisão penal condenatória daquele, acentuando-se até, no que a esta certidão importa, o interesse no aproveitamento do esforço probatório já levado a cabo pelo tribunal penal, sendo certo que perfeitamente salvaguardado o direito de defesa da contraparte, vista a natureza ilidível da presunção assim estabelecida.

         Tudo para conceder parcial provimento ao recurso, admitindo-se a junção aos autos dos dois versados documentos, por iniciativa oficiosa, sem prejuízo da condenação em multa do apresentante, por ter dado causa à junção intempestiva, com a consequente perturbação da produção da prova.

         III.

         Pelo exposto, decide-se:

- manter a decisão de indeferimento, por inadmissibilidade legal, de articulado superveniente, no que tange aos factos de propositura pela Ré de acção contra a Companhia de Seguros para a qual havia transferido a responsabilidade civil por dano causado pelo animal sua propriedade, alegadamente causador do dano reclamado nos autos;

- manter a decisão de indeferimento da junção de certidão daqueles autos;

- manter a decisão de indeferimento, por inadmissibilidade legal, de articulado superveniente, no que tange ao facto da insolvência do putativo comissário da ora Ré;

- alterar a decisão de indeferimento da junção aos autos dos documentos comprovativo da insolvência daquele, bem como da certidão dos autos de processo crime em que foi o mesmo condenado, admitindo-se a mesma junção, condenando-se o Autor/apresentante na multa que vai fixada no mínimo legal, por ter dado causa à necessidade de junção temporã, sem prejuízo ademais do prazo de pronúncia pela contraparte quanto aos documentos cuja junção vai admitida.

            Custas do recurso a meias, por recorrente e recorrida.

            Notifique.

Porto, 21 de Março de 2024
Isabel Peixoto Pereira
Paulo Dias da Silva
Francisca da Mota Vieira
____________________
[1] Vide, a este propósito, o entendimento propalado pelo Tribunal da Relação do Porto de 11-01-2021, pelo relator Pedro Damião e Cunha, nos termos do qual “O artigo 411.º do CPC (princípio do inquisitório) estabelece um “poder-dever” do juiz que não se limita à prova de iniciativa oficiosa, incumbindo-lhe também realizar ou ordenar oficiosamente as diligências relativas aos meios de prova propostos pelas partes, na medida em que julgue que aquelas são necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio relativamente a factos que o Tribunal pode (e deve) conhecer.
[2] Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Almedina, Coimbra, 1982, página 242.
[3] Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, página 340.
[4] Ana Prata (Coord.), Código Civil Anotado, vol. I, 2017, Almedina, pág 420.
[5] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de processo Civil Anotado, vol. 2º, 3ª edição, pág 205.
[6] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Almedina, pág. 482
[7] Ibidem, pág 483.
[8] Desnecessário, assim, afrontar a argumentação recursiva de que a junção requerida logra fundamento no conhecimento dos factos pelo tribunal ou na iniciativa oficiosa deste.
[9] Afastada já a possibilidade de uso probatório para ter como demonstrados os factos caracterizadores do dano, na medida da não intervenção da Ré naqueles autos, fora dos pressupostos, também, do artigo 623º do CPC, que rege quanto à oponibilidade a terceiros da decisão penal condenatória.
[10] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, O Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2ª Edição, pág. 520 e seg..
[11] Cfr. jurisprudência de todas as Relações, designadamente, acessíveis in dgsi.pt os seguintes:
- Ac.s da RP de 17/1/2022, proc. 1172/20.3T8VLG-A.P1, onde se sumaria “I - Pretendendo a parte juntar documentos após o limite temporal estabelecido no n.º2, do art.º 423.º do CC, ou seja, socorrendo-se do disposto no n.º3, é-lhe exigível que justifique e deixe demonstrado porque razão faz a apresentação nesses termos, nomeadamente: i) se não lhe foi possível apresenta-los pelo menos até 20 dias antes da data de realização da audiência final, qual a razão dessa impossibilidade; ii) se a junção se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior, qual o facto que consubstancia essa ocorrência e o fundamento dessa necessidade. II - Nada tendo sido alegado para fundamentar a junção de documentos já depois de iniciada a audiência final, não podia o Tribunal a quo admitir a sua junção, pese embora considerasse serem eventualmente pertinentes para a decisão, por tal não ter cobertura no regime definido no art.º 423.º do CPC. Nessas circunstâncias, apenas se impunha indeferir o requerimento, rejeitando a admissão dos documentos que o autor pretendia juntar”.
e de 2/7/2020, proc. 285/14.5TVPRT.P1, onde se se refere: “I- A junção de documentos no decurso da audiência pressupõe, além do mais, a existência de uma ocorrência posterior fundada. II- Não integra esse fundamento a necessidade de confrontar uma testemunha com esses documentos, pois os factos carecidos de prova são fixados em momento anterior. III- Todavia regulamentação do art. 424º, do CPC não impede a aplicação de normas especiais ou princípios gerais. IV - Por causa disso, os documentos devem ser juntos ao abrigo do principio do inquisitório se o interesse destes para a decisão da causa for superior às desvantagens provocadas na sua tramitação, e afectação do direito de defesa da parte contrária. V- A utilização desse poder dever não afecta a independência do tribunal, pois, este desconhece e é alheio aos efeitos concretos da decisão; exerce um poder dever e visa carrear para os autos todos os elementos para uma decisão conforme com a realidade”,
- Acs da RL de 12/10/2021, proc. 5984/18.0T8FNC-B.L1-7, onde se decidiu “A tempestividade de um documento apresentado com a audiência final a decorrer implica a alegação e a prova de que a apresentação anterior não foi possível ou de que a apresentação se tornou necessária em virtude de ocorrência posterior” e “Não se verifica uma ocorrência posterior para efeitos de apresentação de documentos com fundamento na parte final do nº 3 do artigo 423º do Cód. Proc. Civil, quando uma testemunha alude a um facto, ainda que em sentido contrário ao pretendido pelo apresentante dos documentos, se se tratar de um facto essencial anteriormente alegado nos autos”
e de 25/9/2018, proc. 744/11.1TBFUN-D.L1-1 “I. O art.º 423º do CPC regula tão só e apenas o direito que assiste às partes de fazerem juntar ao processo documentos, independentemente da sua pertinência, da sua relevância e da apreciação do seu valor probatório; II. Ele não invalida que a junção dos mesmos documentos possa ser ordenada pelo juiz ao abrigo dos poderes inquisitoriais previsto no art.º 411º do CPC; III. É, aliás, essa possibilidade que afasta eventuais objecções de inconstitucionalidade, por violação da garantia do processo equitativo (fair trial), da norma do nº 3 do art.º 423º do CPC; IV. As circunstâncias que tornam admissível a apresentação de documentos depois dos 20 dias que antecedem a audiência final têm de ser alegadas e provadas pela parte que pretende a junção do documento; V. A impossibilidade da prévia apresentação haverá de ser apreciada segundo critérios objectivos e de acordo com padrões de normal diligência; VI. A necessidade de apresentação deve surgir de uma circunstância posterior, ou seja, de uma circunstância que ocorra depois do vigésimo dia anterior à audiência final; VII. O grau dessa necessidade não tem de ser significativo, bastando que a apresentação do documento se revele útil como meio de prova; VIII. A ocorrência posterior deve ser relacionada com a dinâmica do desenvolvimento do próprio processo, designadamente tendo em vista a dialéctica que se desenvolve durante o processo de produção de prova no julgamento da causa, e consistirá, na generalidade dos casos, na revelação de factos instrumentais, complementares ou concretizadores;
- Ac. da RE de 25/6/2020, proc. 3013/11.3TBLLE-H.E1, onde se considerou “A admissão dos documentos apresentados no decurso da audiência final segue o regime inserto no artigo 423.º/3 do CPC, pelo que depende da invocação e demonstração de factos donde resulte afirmado que, num quadro de normal diligência, foi impossível ao apresentante ter tido conhecimento anterior da existência daqueles documentos, que revelam terem sido produzidos antes dos momentos indicados nos n.ºs 1 e 2 da mencionada disposição legal”.
[12] António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Idem, pág 520 e Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Idem, pág. 241.
[13] Assim é que a questão não vem a sê-lo a da afirmação pela Ré do desconhecimento do trânsito da sentença penal, como razão para a necessidade da junção… Esta junção, com nota do trânsito, vem a ser um ónus de quem pretenda valer-se da eficiência probatória da decisão penal condenatória, como acontece com o A.
[14] Acessível em https://outrosacordaostrp.com/2016/02/19/ac-do-trp-de-18022016-78814-1t8vng-juncao-de-documentos-principio-do-inquisitorio-verdade-material/.
[15] In Código de Processo Civil Anotado, Volume I, Almedina, 2018, pág. 484.
[16] Código de Processo Civil Anotado, Volume 2.º, 3.ª edição, Almedina 2017, pág. 208.
[17] A Prova por documentos particulares na doutrina, na lei e na jurisprudência, Almedina, 3.ª edição, 2010, pág. 224.