Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
5226/19.0T8LSB.L1-7
Relator: ALEXANDRA DE CASTRO ROCHA
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
PARTES COMUNS
OBRAS NOVAS
APROVAÇÃO PELOS CONDÓMINOS
ABUSO DO DIREITO
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 05/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I – Deve ser rejeitado o recurso da matéria de facto se não constar das alegações, nem das conclusões, a indicação das passagens exactas da gravação dos depoimentos ou declarações em que o recorrente se funda para que possa ser proferida decisão diversa e que possam permitir ao tribunal ad quem sindicar a decisão proferida em primeira instância.
II – Num prédio constituído em regime de propriedade horizontal, o alteamento das paredes de uma arrecadação comum, ainda que afecta ao uso exclusivo de uma fracção, constitui obra inovadora, a qual, não se tendo provado ter sido autorizada por uma maioria dos condóminos representativa de (pelo menos) dois terços do valor total do prédio, se considera ilícita e, assim, deve ser demolida, por violação do disposto no art. 1425º nº1 do Código Civil.
III – A utilização, para habitação, de uma fracção autónoma destinada a loja ou oficina é contrária à limitação imposta pelo art. 1422º nº2 c) do Código Civil.
IV – Justifica-se a paralisação do direito dos restantes condóminos à demolição referida em II e à cessação da utilização mencionada em III, por via do abuso de direito, na modalidade de suppressio, se se provou que nenhum dos condóminos exerceu o seu direito durante um lapso de tempo significativo, sendo a sua inacção rodeada de circunstâncias que legitimam a confiança de que o mesmo já não viria a ser exercido.
V – Para que a parte seja condenada como litigante de má fé é mister que não haja quaisquer dúvidas em qualificar a sua conduta processual como dolosa ou gravemente negligente.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

RELATÓRIO:
B…, E…, C… e D… intentaram a presente acção declarativa, com processo comum, contra F…, pedindo a condenação do R. a:
«1 – Devolver à compropriedade do condomínio a parte comum de que ilicitamente se apropriou, e que é, “o pequeno quintal onde está construído um Arrumo”, demolindo consequentemente a cozinha e casa de banho que ali ilicitamente construiu, tudo a expensas do Réu.
2 – Demolir o alteamento de cerca de 50cm das paredes externas do anexo designado por letra “D” na planta supra referida e constante de docs 7 a 9 juntos à presente PI, reconstituindo a situação original antes de ter efectuado as alterações, tudo a expensas do Réu.
3 – Repor o sistema de esgotos como existia antes de efectuar obras que transformaram uma oficina em casa de habitação com mais de 200 m2 e cozinha e casas de banho que antes não existiam.
4 – Dar à fracção “A” o destino que lhe está fixado pelo título constitutivo da propriedade horizontal, ou seja, oficina, abstendo-se da utilização para habitação própria e do seu agregado familiar.
5 – Pagar aos Autores a quantia de € 38 610,00 (trinta e oito mil seiscentos e dez euros) a título de indemnização, proporcional ao arrendamento do espaço de cerca de 30 M2 na parte que cabe à permilagem de cada condómino, pela apropriação ilegítima ilícita e abusiva daquela área propriedade comum durante cerca de 13 anos e meio.
6 – Ser o Réu condenado ao pagamento de cláusula compulsória no montante de € 100,00/dia após 30 dias a contar do transito em julgado da Sentença condenatória, e até integral cumprimento da mesma.
7 – Ser o Réu condenado ao pagamento de juros de mora à taxa legal, a partir do momento em que a obrigação se torne exequível e até integral cumprimento da obrigação decorrente da Sentença».
Alegam, em síntese, os AA. que:
- O prédio sito na Calçada …, Lisboa, encontra-se constituído em regime de propriedade horizontal, sendo integrado pelas fracções A, B e C e pelas partes comuns;
- Os 1.ºs AA., os 2.ºs AA. e o R. são proprietários, respectivamente, da fracção B, da fracção C e da fracção A daquele prédio;
- Do título constitutivo da propriedade horizontal resulta que a fracção A corresponde a uma loja no rés-do-chão, com uma única divisão, destinada a oficina, tendo ainda o uso exclusivo de um pequeno quintal, no qual se encontra construído um anexo;
- Porém, no Verão de 2005, o R. efectuou obras, alocando a sua fracção a habitação própria, transformando-a, criando dois pisos na zona do quintal e alteando, em cerca de meio metro, as paredes exteriores desse quintal e arrecadação;
- O que significa que o R. deu à fracção uso diverso daquele a que se destina (sem ter licença de habitação e sem autorização dos restantes condóminos), invadiu o espaço aéreo correspondente a uma parte comum, alterou significativamente a linha arquitectónica e estética do edifício (sem a aprovação da maioria representativa de dois terços do valor total do prédio) e, construindo uma cozinha e uma casa-de-banho no quintal, fez sua uma área de 30 m2, subtraindo-a à propriedade comum;
- Além disso, a nova utilização que o R. faz da fracção é muito mais intensiva, com águas de esgoto provenientes da cozinha e casas-de-banho, gerando um esforço desproporcionado na fossa comum, o que propicia o entupimento da mesma;
- Assim, o R. deverá pagar ao condomínio o valor que resultaria do arrendamento do espaço comum de que se apropriou ilicitamente, deverá restituir à compropriedade a área onde construiu a cozinha e uma casa-de-banho e deverá destruir aquelas edificações, o alteamento das paredes externas do anexo e as canalizações, devolvendo o espaço nas exactas condições constantes do título constitutivo da propriedade horizontal, devendo ainda abster-se de utilizar a fracção para habitação.
       O R. contestou, invocando, por um lado, a falta de capacidade judiciária do A. E…, por alegado quadro demencial, sendo ainda falsa a procuração forense junta em nome daquele A., pelo que ocorre igualmente falta de patrocínio judiciário. Por outro lado, alega, em síntese, que:
- A sua fracção, embora se situe ao nível do rés-do-chão, é composta por dois pisos, interligados por uma escada interior, com sete divisões (numa das quais existiu em tempos um forno), três casas-de-banho e um quintal, configuração essa que existia já em 1998, aquando da sua aquisição pela sociedade H…, de que o R. era sócio-gerente, e que se mantém actualmente, não tendo o R. procedido a qualquer alteamento ou alteração do telhado;
- Os 1.os AA., na segunda metade da década de 1980, ampliaram a área da sua fracção, construindo um terraço de 30 m2 em placa de betão onde antes existia apenas um passadiço de acesso a umas escadas que davam acesso ao logradouro de uso exclusivo dessa fracção;
- Aquele terraço assentou nas paredes dos arrumos do rés-do-chão, o que obrigou à demolição do telhado desses arrumos, passando a placa de betão que constitui o chão do terraço a constituir também a cobertura dos arrumos do rés-do-chão;
- Apesar disso, a descrição predial permaneceu inalterada;
- Aquando da aquisição da fracção A, em 1998, pela sociedade H..., na divisão situada por debaixo do terraço dos 1.os AA. existiam umas enormes tinas, com canalização de fornecimento de água potável e de escoamento de água suja;
- Enquanto ali laborou, a H... tinha a trabalhar nove funcionários, que utilizavam as casas-de-banho, cozinhavam, almoçavam e lavavam a louça;
- Naquelas tinas eram ainda lavadas as partes plásticas das impressoras a laser que eram reparadas pela H...;
- Em 2001, o R. começou a viver no piso superior da fracção A, à vista de todos os seus vizinhos;
- Passando a estender roupa no quintal, que é visível do exterior, afirmando perante todos os vizinhos que ali residia e apercebendo-se estes, ao vê-lo entrar e sair, de que o R. tinha ali organizada a sua vida e ali pernoitava;
- Os AA. nunca se opuseram a tal e, quando questionados pelo R. no sentido de alterarem a escritura pública de constituição da propriedade horizontal, para legalizarem a situação, afirmaram que não valia a pena, porque não havia problema nenhum de ele ali morar e o prédio estava dispensado de licença de habitação;
- Ficando o R. convicto da permissão dos AA. para que ali continuasse a residir, tanto mais que a construção do prédio remonta a 1887;
- Em meados de 2005, a H... mudou de instalações e o R. forrou as paredes e tecto da sala principal da fracção A a pladur, colocou chão de madeira na mesma sala, instalou móveis na divisão que funcionava como cozinha, substituiu as tinas ali existentes por lava-louças mais modernos e pintou o interior da fracção;
- Após o que, em 2006, na convicção de que podia ali continuar a habitar legalmente, adquiriu a propriedade da fracção à H...;
- Os AA. tiveram conhecimento dessa mudança, tendo mesmo pedido ao R. que atrasasse a colocação do pladur e do chão de madeira até que se concluíssem as obras de reparação do telhado do prédio;
- Tendo até os AA. visitado o interior da habitação do R., elogiando a sua decoração;
- Desde então até ao presente, o R. sempre ali viveu e constituiu família, tudo com o conhecimento dos AA.;
- O 2º A., enquanto presidente da Junta de Freguesia de I…, convidou mesmo o R. para prestar serviços de acupunctura naquela Junta, tendo celebrado com o R.  um contrato em que este se identifica como residente na fracção A;
- No Verão de 2005, os 2.ºs AA., aproveitando as obras de reparação do telhado, sem consentimento do R., destruíram parcialmente a água traseira do telhado do prédio (parte comum) e construíram um terraço, com placa de betão, que gradearam e ao qual têm acesso exclusivo pelo interior da sua fracção, da qual abriram uma porta para o exterior - motivo pelo qual o R. interpôs contra eles uma acção, que se encontra pendente;
- Recentemente, os 1.ºs AA., mediante a expressa oposição do R., construíram no logradouro que é parte comum (embora do seu uso exclusivo) uma piscina - motivo pelo qual o R. interpôs contra eles uma acção, que se encontra pendente;
- A presente acção é uma mera vingança dos AA. e contraria todas as atitudes que estes antes tinham adoptado e que tinham criado no R. a profunda convicção de que os seus vizinhos aceitavam que ali residisse;
- Pelo que os AA. litigam em abuso de direito.
Em reconvenção, pede que o tribunal «se digne suprir a omissão dos Autores/ Reconvindos, através da prolação de uma sentença que produza efeitos idênticos aos de uma escritura pública de alteração do título constitutivo da propriedade horizontal, no que respeita à utilização dada à fração “A”, do prédio dos autos, de oficina para habitação, uma vez que é essa a vontade, sempre manifestada através de factos e atitudes, dos proprietários das fracções “A”, “B” e “C”, e únicos comproprietários das partes comuns, aqui Autores e Réu, e o dito prédio encontra-se, legalmente, dispensado de licença de utilização».
Os AA. replicaram, defendendo a inadmissibilidade da reconvenção, por não se enquadrar em nenhum dos casos do art. 266º nº2 do Código de Processo Civil, sendo ainda certo que, de qualquer forma, o pedido teria de ser julgado improcedente, por não existir previsão legal que permita ao tribunal substituir-se à vontade das partes na modificação do título constitutivo da propriedade horizontal. No mesmo articulado, pugnam pela improcedência das excepções de incapacidade do 1º A. e de falta de patrocínio judiciário do mesmo, e afirmam nunca terem autorizado ou sequer tolerado que o R. utilizasse a fracção A para outro fim que não o de oficina.
Realizada audiência prévia, foi saneado o processo, tendo os AA. sido absolvidos da instância reconvencional, com fundamento na inadmissibilidade de alteração do título constitutivo da propriedade horizontal mediante decisão judicial. Foi, ainda, indicado o objecto do litígio [“Da responsabilidade do Réu no que se refere à utilização e obras realizadas na sua fracção e nas partes comuns”] e foram enunciados os temas da prova [“Do alteamento das paredes exteriores. Da incorporação de cerca de 30m2 das partes comuns na fracção do Réu e do valor. Das obras realizadas pelo Réu. Do conhecimento dos Autores das obras, da incorporação e do destino da fracção”].
Tendo, entretanto, ocorrido o óbito do 1º A., veio a ser proferida nestes autos, em 1/2/2022, sentença de habilitação de herdeiros, que julgou habilitadas, para prosseguirem a acção, na posição daquele A., a 1ª A. e a 2ª A., respectivamente cônjuge e filha do de cujus.
Procedeu-se a audiência final, finda a qual o R. requereu a condenação dos AA. como litigantes de má fé, por terem alterado a verdade dos factos. Os AA. pronunciaram-se pela improcedência de tal pedido.
Após, foi proferida sentença, que concluiu com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, ao abrigo de todas as disposições legais citadas:
a) julgo a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolvo o Réu do pedido;
b) Julgando procedente o pedido de condenação dos Autores como litigantes de má-fé, condeno os mesmos no pagamento de multa no valor de 4 UC’s e, ainda, de uma indemnização a favor do Réu no valor de € 1000,00.
Custas pelos Autores».
Não se conformando com esta decisão, dela apelaram os AA., formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões:
«I. No entender dos ora Recorrentes a sentença proferido pelo Mm.º Juiz a quo padece de erros de julgamento, quer em matéria de facto quer em matéria de Direito.
II. Com efeito, no que concerne à matéria de facto, os Recorrentes consideram que o Tribunal a quo errou no julgamento dos factos provados n.os 12, 17 e 18 e nos factos não provados das alíneas E e K;
III. A prova gravada, a prova pericial e o depoimento dos aqui Recorrentes e Recorridos impunham que tivesse sido dado como não provados os factos constantes dos citados n.os 12, 17 e 18 e como provados os factos constantes das citadas alíneas E e K;
IV. No que concerne à prova gravada, o depoimento da testemunha J… na audiência de 17 de abril de 2023, ao minuto 08:40 e depois ao minuto 09:58, e ainda o depoimento da testemunha A… ao minuto 06:45, impunham que, segundo as regras da experiência comum, os factos não provados sob a alínea E e K fossem dados como provados e ainda que fosse acrescentado um novo facto provado ao elenco de factos provados, a saber: “do exterior da fracção A não é possível visualizar a cozinha que o Réu construiu no anexo dessa fracção A”;
V. Este facto é relevante na medida em que demonstra a boa-fé dos ora Recorrentes quanto ao seu conhecimento concreto da situação da fracção A e, portanto, quanto à sua conduta processual e adjectiva, com influência nas decisões do Tribunal a quo quanto ao alegado abuso de Direito e à litigância de má-fé dos ora Recorrentes.
VI. Também o facto provado n.º 12 foi incorrectamente julgado porquanto da prova produzida, nomeadamente dos depoimentos de parte dos 3.º e 4.º Autores (o 1.º autor faleceu e a 2.ª autora não foi ouvida) resulta claro que estes Autores nunca acederam ao interior da fracção;
VII. Acresce que a testemunha A… foi bastante esclarecedora quando afirmou que do exterior ninguém diz que aquele local se destina a habitação -vide depoimento ao minuto 06:45;
VIII. Também o facto provado n.º 18 foi incorrectamente julgado porquanto os autores negaram terem tido conhecimento das obras que ali foram realizadas, o que apenas foi contraditado por uma testemunha do Réu, ao caso a sua companheira/mulher, depoimento a valorizar com as devidas nuances considerando que a matéria em discussão se reportava à casa de morada de família, na qual a testemunha tem evidente interesse;
IX. Relativamente ao julgamento da matéria de Direito, os aqui Recorrentes entendem que a decisão do Tribunal a quo não fez uma correcta apreciação das normas legais aplicáveis.
X. Com efeito, a sentença violou os artigos 1419.º e 1422.º do CC ao considerar que a alteração do uso de uma fracção pode ocorrer por mera deliberação dos restantes proprietários ou por mero silêncio dos mesmos, não sendo necessário a alteração do título constitutivo, contradizendo expressamente a referida norma que exige essa alteração do título constitutivo para que o uso diverso possa ser legal;
XI. O Tribunal a quo deveria ter declarada a ilegalidade da atuação do Réu e ordenado a cessação da utilização da fracção para habitação, respeitando assim o previsto na al. c do n.º 2 do artigo 1422.º do CC.
XII. A sentença violou ainda o artigo 1425.º do CC ao considerar que as obras realizadas pelo Recorrido não constituem uma inovação pois, nos termos da citada norma, constitui inovação toda a obra realizada após a emissão da respectiva licença de utilização que tenha carácter inovatório, sendo por demais evidente que a construção de uma cozinha moderna no lugar onde antes existia um anexo abarracado é uma inovação.
XIII. Assim, o Tribunal a quo deveria ter declarado que a referida obra constitui uma inovação e consequentemente deveria ter ordenado a sua demolição, como decorre do artigo 1425.º do CC.
XIV. A decisão violou também o artigo 334.º do CC ao considerar que os Recorrentes agiram em abuso de direito.
XV. Contudo, os factos provados e a restante matéria probatória existente nos autos não permitem afirmar que estavam reunidos os pressupostos legais para essa conclusão pois a atuação dos Recorrentes não é contrária ao seu comportamento anterior nem este seu comportamento criou no Réu qualquer convicção, sólida, de que a situação ilegal não seria invocada pelos Recorrentes;
XVI. Por fim, a sentença violou o artigo 542.º do CPC ao condenar os ora Recorrentes como litigantes de má fé porquanto em momento algum os Recorrentes deturparam factos ou ocultaram elementos de prova;
XVII. Pelo exposto, deverá a referida decisão ser revogada e substituída por outra que declare a ilegalidade da atuação do Recorrido condenando o mesmo a cessar o uso da fracção como habitação e a destruir as inovações que efetuou em área comum, assim se fazendo JUSTIÇA! ».
O R. contra-alegou, pugnando pela improcedência da apelação.
QUESTÕES A DECIDIR
Conforme resulta dos arts. 635º nº4 e 639º nº1 do Código de Processo Civil, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, as quais desempenham um papel análogo ao da causa de pedir e do pedido na petição inicial. Ou seja, este Tribunal apenas poderá conhecer da pretensão e das questões [de facto e de direito] formuladas pelos recorrentes nas conclusões, sem prejuízo da livre qualificação jurídica dos factos ou da apreciação das questões de conhecimento oficioso (garantido que seja o contraditório e desde que o processo contenha os elementos a tanto necessários – arts. 3º nº3 e 5º nº3 do Código de Processo Civil). Note-se que «as questões que integram o objecto do recurso e que devem ser objecto de apreciação por parte do tribunal ad quem não se confundem com meras considerações, argumentos, motivos ou juízos de valor. Ao tribunal ad quem cumpre apreciar as questões suscitadas, sob pena de omissão de pronúncia, mas não tem o dever de responder, ponto por ponto a cada argumento que seja apresentado para sua sustentação. Argumentos não são questões e é a estes que essencialmente se deve dirigir a actividade judicativa». Por outro lado, não pode o tribunal de recurso conhecer de questões novas que sejam suscitadas apenas nas alegações / conclusões do recurso – estas apenas podem incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, salvo os já referidos casos de questões de conhecimento oficioso, uma vez que os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação [cfr. António Santos Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, 2022 – 7ª ed., págs. 134 a 142; Ac. STJ de 7/7/2016, proc. 156/12, disponível em http://www.dgsi.pt]. Finalmente, cabe, ainda, conhecer das questões suscitadas em sede de contra-alegações, relativas aos pressupostos processuais, conforme resulta do art. 638º nº5 e 6, também do Código de Processo Civil.
Nessa conformidade, são as seguintes as questões que cumpre apreciar:
- a impugnação da decisão sobre a matéria de facto;
- o preenchimento dos pressupostos da obrigação do R. de demolir construções que tenha efectuado em partes comuns de imóvel constituído em regime de propriedade horizontal e de proceder ao pagamento de uma sanção compulsória, com início 30 dias após o trânsito em julgado da decisão, enquanto não cumprir aquela obrigação de demolição;
- o preenchimento dos pressupostos da obrigação do R. de indemnizar os AA. pela utilização ilícita de partes comuns daquele imóvel;
- o preenchimento dos pressupostos da obrigação do R. de se abster de utilizar a sua fracção autónoma para habitação;
- o abuso de direito dos AA.;
- a litigância de má fé dos AA..
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A decisão sob recurso considerou provados os seguintes factos:
«1. Os 1ºs Autores são proprietários da fracção autónoma designada pela letra B, a que corresponde o 1º andar do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Calçada …, actual Freguesia de H… Concelho de Lisboa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob o artigo …, e na matriz predial urbana daquela Freguesia, actualmente, sob o artigo …;
2. Os segundos Autores são proprietários da fracção autónoma designada pela letra C, a que corresponde o 2º andar do mesmo prédio urbano;
3. O Réu é proprietário da fracção autónoma designada pela letra A, a que corresponde o rés-do-chão, do mesmo prédio urbano;
4. Autores e Réu são os únicos proprietários das partes comuns do referido prédio, nas seguintes percentagens: Fracção “A” - 45%, Fracção “B” - 32% e Fracção “C” - 23%;
5. A fracção A é constituída por uma única divisão, a que corresponde o uso exclusivo de um pequeno quintal, embora área comum do condomínio, onde se encontrava construído um anexo;
6. A fracção A está destinada ao uso como oficina;
7. O Réu foi sócio e gerente da sociedade designada H..., Lda.;
8. Tal sociedade adquiriu, em 1998, a propriedade da fracção A;
9. O Réu vive na fracção desde pelo menos 2005;
10. Quando a H... mudou as suas instalações para a extinta L…, o Réu forrou as paredes e tecto da sala principal da fracção A a pladur, colocou chão de madeira na mesma sala, instalou móveis na divisão que funcionava como cozinha, substituiu as tinas ali existentes por lava loiças mais modernos e pintou o interior da fracção;
11. Em 2006, o Réu adquiriu a propriedade da fracção A à sociedade H..., passando a fazer do local exclusivamente habitação própria;
12. Os Autores visitaram a habitação do Réu;
13. Pelo menos desde 2011 que os Autores sabem que o Réu ali vivia e que tinha ali constituído família;
14. O 4º Autor, enquanto Presidente da Junta de Freguesia de H…, convidou o Réu para prestar serviços de acupunctor naquela Junta de Freguesia, tendo, para esse efeito, celebrado um contrato, onde o Réu se identifica como residente na Calçada …, em Lisboa;
15. O Réu alteou a zona do antigo forno de padaria e da arrecadação;
16. Contudo, esse alteamento não beneficiou apenas o Réu;
17. Na zona do pequeno quintal e arrumos, o Réu construiu uma cozinha;
18. Os Autores sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo Réu;
19. Os Autores nunca se opuseram a que o Réu ali organizasse a sua vida pessoal e ali residisse com a sua família;
20. Em 2015, os Autores dirigiram ao Réu, como forma de resposta, duas cartas, nas quais mencionam como assunto: “Impermeabilização pátio por cima da sua cozinha”;
21. O telhado existente no piso superior interno da fracção A propriedade do Réu existe desde a construção do edifício, apesar de ter sido alteado;
22. A construção do prédio em causa nos autos remonta a 1887».
Por outro lado, a decisão recorrida considerou como não provados os seguintes factos:
«Não existem outros factos provados, designadamente:
a) A área do antigo forno de padaria e da arrecadação situa-se fora do corpo principal do prédio e adjacente a este, com paredes externas próprias e telhado próprio;
b) O Réu alteou a zona do antigo forno de padaria e da arrecadação em cerca de meio metro;
c) Na zona do pequeno quintal e arrumos, o Réu construiu uma casa de banho;
d) As obras realizadas pelo Réu alteraram o edifício;
e) As obras realizadas pelo Réu foram feitas em zonas não visíveis a partir das fracções B e C;
f) A nova utilização muito mais intensiva com águas de esgoto, muito mais abundante, provenientes de cozinha, com respectivas máquinas e lava loiça, com quatro casas de banho com a proporcional utilização, gerou um esforço desproporcionado, agravando, o esforço da fossa comum, o que propicia o entupimento da mesma;
g) Com as obras realizadas, o Réu criou dois pisos na sua fracção;
h) Quando questionados pelo Réu, no ano de 2005, para legalizar a situação, procedendo à alteração da escritura pública de constituição da propriedade horizontal, os Autores disseram ao Réu que não valia a pena, que eram só eles, eram família, não havia problema nenhum dele ali morar e não valia a pena estarem a gastar dinheiro em mais escrituras, pois a sua palavra valia mais do que uma escritura e o prédio estava dispensado de licença de habitação;
i) Tais conversas deixaram o Réu convicto da permissão dos seus vizinhos, ora Autores, para ali poder continuar a residir;
j) Os Autores incentivaram a que o Réu ali vivesse;
k) O valor de arrendamento do metro quadrado na zona em causa nos autos ronda entre os 12,00€ e os 15,00€ por m2.
MÉRITO DO RECURSO
Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
Nos termos do art. 640º do Código de Processo Civil:
«1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º».
Como refere António Santos Abrantes Geraldes[1], naquilo que para aqui releva, são os seguintes os ónus do recorrente que pretenda impugnar a decisão sobre a matéria de facto:
a) Indicar na motivação e, em síntese, nas conclusões, os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Especificar, na motivação, os meios de prova que, no seu entender, determinam uma decisão diversa;
c) Indicar, com exactidão, na motivação, as passagens da gravação relevantes e proceder, se assim o entender, à transcrição dos excertos que considere oportunos;
d) Deixar expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos.
Em consonância, o recurso apenas deverá ser rejeitado se houver[2]:
1. Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto [arts. 635º nº4 e 641º nº2 b) do Código de Processo Civil];
2. Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorrectamente julgados [art. 640º nº1 a)];
3. Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados;
4. Falta de indicação exacta, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
5. Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação.
Se a impugnação do recorrente respeitar os requisitos formais previstos naquele art. 640º, então a Relação, nos termos do art. 662º nº1 do Código de Processo Civil, deverá alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
«Sem embargo da correcção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afectam a decisão da matéria de facto (v.g. contradição) e também sem prejuízo do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que está concretizado nos termos previstos no art. 640º, quando esteja em causa a impugnação de determinados factos cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação, a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência». A modificação deverá, ainda, ocorrer sempre que «o tribunal recorrido tenha desrespeitado a força plena de certo meio de prova» ou «quando for apresentado pelo recorrente documento superveniente que imponha decisão diversa» [3].
Note-se, no entanto, que «quando a apreciação da impugnação deduzida contra a decisão de facto da 1ª instância seja, de todo, irrelevante para a solução jurídica do pleito, ainda que a tal impugnação satisfaça os requisitos formais prescritos no art. 640º nº1 do Código de Processo Civil, não se justifica que a Relação tome conhecimento dela, à luz do disposto no art. 608º nº2 do Código de Processo Civil» (cfr. Ac. STJ de 23/1/2020, proc. 4172/16, disponível em https://jurisprudencia.csm.org.pt)[4]. Caso contrário, estaríamos a praticar um acto inútil, proibido à luz do art. 130º, do mesmo diploma.
Balizadas que estão as regras que nos orientarão, passemos à apreciação da pretensão dos recorrentes, que é a de que seja alterada a matéria de facto provada e não provada, da seguinte forma:
A – A matéria do ponto 12 dos factos provados [12. Os Autores visitaram a habitação do Réu] seja considerada não provada;
B – A matéria do ponto 17 dos factos provados [17. Na zona do pequeno quintal e arrumos, o Réu construiu uma cozinha] seja considerada não provada, sendo tal ponto substituído pela seguinte matéria provada: «Quando a H... mudou as suas instalações para a extinta L…, o Réu procedeu à construção, em área comum do condomínio, de uma cozinha onde antes se encontrava construído um anexo, ali instalando móveis de cozinha, lava loiças e eletrodomésticos»;
C – A matéria do ponto 18 dos factos provados [18. Os Autores sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo Réu] seja considerada não provada;
D – A matéria da alínea e) dos factos não provados [e) As obras realizadas pelo Réu foram feitas em zonas não visíveis a partir das fracções B e C] seja considerada provada, com a seguinte redacção: «Do exterior da fracção A não é possível visualizar a cozinha que o R. construiu no anexo dessa fracção A»;
E – A matéria da alínea k) dos factos não provados [k) O valor de arrendamento do metro quadrado na zona em causa nos autos ronda entre os 12,00€ e os 15,00€ por m2] seja considerada provada.
Apreciando.
Quanto ao ponto 12 dos factos provados [Os Autores visitaram a habitação do Réu], o tribunal recorrido fundou a sua convicção nas seguintes considerações:
«A testemunha P… também acompanhou as referidas obras, referindo-se às mesmas como “de grande envergadura”, sendo visíveis pelos vizinhos. Esta afirmou, convictamente, que os vizinhos visitaram a fracção A, depois de serem realizadas as obras na mesma, uma vez que existia uma boa relação de vizinhança e cordialidade entre todos, acrescentando ainda que o 1.º Autor tinha consultas de acupunctura com o Réu, nessa mesma casa (facto n.º 12)».
Já os recorrentes pretendem que esta matéria não pode considerar-se provada, porque «quer a 3.ª quer o 4.º Autor negaram tal facto, tendo o Réu alegado, por sua vez, que o 1.º Autor teria entrado no imóvel para realizar sessões de acupunctura. Isto é, o Tribunal apenas poderia ter dado como provado que o 1.º Autor visitou a habitação do Réu». Mais referem que «dos depoimentos de parte dos 3.º e 4.º Autores (o 1.º autor faleceu e a 2.ª autora não foi ouvida) resulta claro que estes Autores nunca acederam ao interior da fracção (…). Acresce que a testemunha A… foi bastante esclarecedora quando afirmou que do exterior ninguém diz que aquele local se destina a habitação -vide depoimento ao minuto 06:45».
Constata-se, assim, que os recorrentes fundam a impugnação do ponto 12 dos factos provados, além do mais, nos depoimentos de parte dos AA. C… e D… e nas declarações de parte do R.. No entanto, ao contrário daquilo que constituía o seu ónus, não indicaram, nem na motivação, nem nas conclusões, as concretas passagens da gravação daqueles depoimentos e declarações a que se reportam e em que se baseiam para que possa ser proferida decisão diversa.
Deste modo, e considerando que «a exigência da (…) especificação dos concretos meios probatórios convocados (…) integra[m] um ónus primário, na medida em que têm por  função delimitar o objecto do recurso e fundamentar a impugnação da decisão da matéria de facto» e que, por outro lado, «a exigência da  indicação exacta das passagens da gravação dos depoimentos que se pretendem ver analisados (…), integra um  ónus secundário, tendente a possibilitar  um acesso mais ou menos  facilitado aos meios de prova gravados relevantes  para a apreciação da impugnação deduzida», não tendo sido cumprido, minimamente, este último ónus, ficando impedido «o exercício  do contraditório pela parte contrária e/ou o exame pelo  tribunal  de recurso», tal implica a imediata rejeição do recurso, nessa parte[5].
Pelo exposto, rejeita-se a impugnação da matéria constante da alínea A) supra, permanecendo intocado o ponto 12 dos factos provados.
Relativamente ao facto provado nº17 [Na zona do pequeno quintal e arrumos, o Réu construiu uma cozinha], que os recorrentes pretendem que seja substituído [por: «Quando a H... mudou as suas instalações para a extinta L…, o Réu procedeu à construção, em área comum do condomínio, de uma cozinha onde antes se encontrava construído um anexo, ali instalando móveis de cozinha, lava loiças e eletrodomésticos»], o tribunal a quo fundamentou a sua fixação da seguinte forma:
«Quanto ao facto n.º 17, considerou-se o resultado da 2ª perícia, quando indica que na zona primitiva de arrumos está instalada Parte da Cozinha e da Instalação Sanitária Comum adjacente, bem como o terraço sobrejacente da fracção B, que constitui a sua cobertura. Ademais, é possível retirar do art.27.º, do documento 47 e do art.87.º do documento 63, ambos juntos com a petição inicial, certificados pelos documentos n.ºs 32 a 34, também juntos com a petição inicial, que o Réu construiu, no local indicado, uma cozinha. É de referir, quanto às perícias efectuadas nos autos, que as mesmas se complementaram, na tarefa de mais fielmente descrever e apurar os trabalhos promovidos no imóvel, sendo o valor de qualquer uma delas livremente apreciado pelo Tribunal – artigo 489º do C.P.C.».
Por seu turno, os recorrentes entendem que esta matéria não pode considerar-se provada e deve ser substituída, porque «resulta do depoimento dos ora Recorrentes e da testemunha J… que o telhado alteado, que se encontra rente à janela do 1.º andar, correspondia a um anexo preexistente à compra da fracção pela empresa do Recorrido, anexo esse que no título constitutivo da propriedade horizontal do imóvel consta parte comum do edifício com uso exclusivo da fracção A – vide depoimento da referida testemunha prestado na audiência de 17 de abril de 2023, ao minuto 09:58 até ao minuto 10:44, a 2.ª perícia constante dos autos (em particular fotos 13 e 14) e os factos provados sob os n.ºs 5, 10 e 17».
Ocorre que, mais uma vez, os recorrentes fundam a impugnação deste ponto dos factos provados, além do mais, nos seus depoimentos de parte. No entanto, ao contrário daquilo que constituía o seu ónus, não indicaram, nem na motivação, nem nas conclusões, as concretas passagens da gravação daqueles depoimentos a que se reportam e em que se baseiam para que possa ser proferida decisão diversa. Note-se que, tratando-se de factos favoráveis aos AA., os mesmos não são susceptíveis de confissão (cfr. art. 352º do Código Civil) e, portanto, não constam (nem poderiam constar) da assentada constante da acta da audiência final, sendo que, nessa parte, os depoimentos teriam de valer e de ser apreciados como declarações de parte. No entanto, não o podem ser, simplesmente porque, como se disse, não foram indicadas as passagens das respectivas gravações.
Pelo exposto, rejeita-se a impugnação da matéria referida na alínea B) supra, permanecendo intocado o ponto 17 dos factos provados.
Em relação ao facto provado nº18 [ Os Autores sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo Réu], na sentença recorrida discorre-se do seguinte modo:
«Os factos n.ºs (…) 18 (…) foram confessados, em sede de depoimentos de parte, por C… e D…».
Os recorrentes entendem que esta matéria tem de considerar-se como não provada, porque «do depoimento dos Recorrentes não resulta essa confissão, mas apenas que os Autores tiveram conhecimento de obras feitas pelo Réu na fracção e na parte comum de seu uso exclusivo, desconhecendo o seu exacto e preciso alcance. Nenhuma testemunha corroborou a alegação do Réu/Recorrido sobre esta matéria pelo que as regras de experiência comum ditam que este facto deverá ser dado como não provado, porquanto, como refere a sentença, não basta alegar um facto para que este seja dado como provado». Mais referem que «os autores negaram terem tido conhecimento das obras que ali foram realizadas, o que apenas foi contraditado por uma testemunha do Réu, ao caso a sua companheira/mulher, depoimento a valorizar com as devidas nuances considerando que a matéria em discussão se reportava à casa de morada de família, na qual a testemunha tem evidente interesse».
Ora, o ponto 18 dos factos provados corresponde a parte da matéria alegada no art. 76º da contestação, cujo teor é o seguinte: «Os Autores sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo aqui Réu, bem como sempre tiveram conhecimento que este ali reside desde 2001».
Compulsada a acta da audiência final de 17/4/2023, dela consta o seguinte, quanto à A. C…:
«Nos termos do art. 463.º do CPC, a Mm.ª Juiz ordenou que se procedesse à assentada, nos seguintes termos:
A A. confirmou a matéria referente aos arts. 53º, 68º, 75º, 76º, 82º com a especificação de que o telhado existe, mas o R. alteou-o e quanto ao art. 90º, restringindo-se do depoimento à 1ª parte da frase aí constante até “arranjo estético”, a A. declarou que o R. apenas alargou a entrada na sua fracção, mas que os trabalhos por si efectuados não constituíram significativa alteração da linha arquitectónica nem o seu arranjo estético».
A mesma acta, em relação ao A. D…, reza assim:
«Nos termos do art. 463.º do CPC, a Mm.ª Juiz ordenou que se procedesse à assentada, nos seguintes termos:
O A. confirmou a matéria referente aos arts. 52º, 53º, 66º, 67º, 68º, 75º (com a especificação de que estas missivas foram resposta a interpelações efectuadas pelo R.), 76º, 82º e 83º com a especificação de que o telhado sempre existiu, mas foi alterado por iniciativa do R. e art. 90º restringindo-se do depoimento à 1ª parte da frase aí constante até “arranjo estético” o A. declarou que o R. apenas alargou a entrada na sua fracção, mas que os trabalhos por si efectuados não constituíram significativa alteração da linha arquitectónica nem o seu arranjo estético».
Não tendo sido invocada a falsidade da acta em causa, resulta assim das assentadas supra transcritas que ambos os AA. C… e D… admitiram a matéria alegada no art. 76º da contestação e, portanto, admitiram que sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo aqui Réu, o que corresponde ao ponto 18 dos factos provados. É certo que tal admissão não tem a força probatória plena de uma confissão, atendendo a que estamos perante um caso de litisconsórcio necessário e a A. B… nada confessou a esse respeito - cfr. art. 353º nº2 do Código Civil. No entanto, nada impede que os depoimentos dos AA., nessa vertente, sejam valorados como declarações de parte e, assim, fundem a prova dos factos em causa.
Ocorre, também aqui, que os recorrentes fundam a impugnação deste ponto dos factos provados, além do mais, nos seus depoimentos de parte e no depoimento da testemunha P... (ex-companheira do R.). No entanto, ao contrário daquilo que constituía o seu ónus, não indicaram, nem na motivação, nem nas conclusões, as concretas passagens da gravação daqueles depoimentos a que se reportam e em que se baseiam para que possa ser proferida decisão diversa.
Pelo exposto, rejeita-se a impugnação da matéria referida na alínea C) supra, permanecendo intocado o ponto 18 dos factos provados.
Quanto ao facto não provado constante da alínea e) da sentença [As obras realizadas pelo Réu foram feitas em zonas não visíveis a partir das fracções B e C], que os recorrentes pretendem que seja considerado provado [com a seguinte redacção: «Do exterior da fracção A não é possível visualizar a cozinha que o R. construiu no anexo dessa fracção A»], o tribunal recorrido fundou a sua convicção da seguinte forma:
«Da 1ª perícia é possível retirar que, relativamente ao alteamento das paredes e reassentamento do telhado, as obras executadas são de vulto e impossíveis de não serem visíveis das fracções pertencentes aos Autores (facto não provado e)). Além disso, conclui-se da 2ª perícia que, sendo a área de telhado em questão visível dos vãos de tardoz, terraços e/ou logradouro de utilização privativa das referidas fracções, bem como da própria escada de acesso ao último, afigura-se improvável que o alteamento das paredes e reassentamento do telhado não fossem visíveis das fracções B e C do mesmo prédio. Para além disso, o Réu, em sede de declarações de parte, referiu, de forma plausível, que foram carregadas tábuas de 4 metros, que até chegaram a permanecer no exterior, facto que era visível pelos Autores».
Os AA. pretendem que tal matéria tem de considerar-se provada, porque «das fotografias constantes da 2.ª Perícia e do depoimento da testemunha J…, interpretados de acordo com as regras de experiência comum, resulta claro que da fracção B e C não é possível ver e perceber que existe uma cozinha na fracção A pois “só se vê a caixilharia” – vide depoimento ao minuto 09:58 desta testemunha na audiência de 17 de abril de 2023 e ainda o depoimento da testemunha A… ao minuto 06:45. Ou seja, o Tribunal a quo deveria ter dado como provado que do exterior da fracção A não é possível perceber que foi edificada uma cozinha, tal como os autores alegaram».
Acontece que os factos que os AA. querem aditar à matéria provada são irrelevantes para a decisão, atendendo a que, mesmo que as obras não fossem visíveis do exterior, o que importa é apenas saber se os AA. tinham, ou não, conhecimento das mesmas e encontra-se provado (ponto 18) que os AA. sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo Réu.
Assim, face à irrelevância de tal matéria pretendida aditar, não se procede à apreciação da impugnação, nesta parte.
Quanto à matéria não provada constante da alínea k) da sentença [O valor de arrendamento do metro quadrado na zona em causa nos autos ronda entre os 12,00€ e os 15,00€ por m2], o tribunal a quo discorreu do seguinte modo:
«Finalmente, quanto ao facto não provado em k), o Tribunal considera que não foi feita prova suficiente dos valores ali em causa, já que o único meio de prova apresentado se traduziu no depoimento da testemunha J…; este, apesar de ser engenheiro civil e estar dentro da actividade de construção e conhecer muito bem o bairro, não estava suficientemente apetrechado para confirmar ou infirmar com rigor estes ou quaisquer outros valores».
Os AA. entendem que tal matéria tem de considerar-se provada, porque «a prova produzida era suficiente e bastante para julgar tal facto como provado porquanto a testemunha em causa foi convincente no seu depoimento e mostrou ter amplo conhecimento da zona em questão, não só por ali ter nascido e ainda viver, mas pela profissão que exerce, tendo explicitado a lógica desta sua resposta – vide depoimento da testemunha J… na audiência de julgamento de 17 de abril de 2023, ao minuto 08:30 da respectiva gravação». Mais referem que «o depoimento da testemunha J… na audiência de 17 de abril de 2023, ao minuto 08:40 e depois ao minuto 09:58, e ainda o depoimento da testemunha A… ao minuto 06:45, impunham que, segundo as regras da experiência comum, os factos não provados sob a alínea E e K fossem dados como provados».
Vejamos.
Quanto à testemunha A…, referida pelos recorrentes, a mesma nada disse acerca da matéria constante da alínea k) da sentença. A única prova produzida a este respeito foi, efectivamente, o depoimento da testemunha J…, que disse ser engenheiro civil, trabalhar na área da construção civil, viver e trabalhar naquele bairro, sendo o preço que, nessa zona, se costuma pedir pelo arrendamento «entre os 12 e os 15 euros» por m2, ou entre os «10 - 12 euros» por m2.
Ora, tal como considerou o tribunal a quo, o referido depoimento não se mostra suficiente para, desacompanhado de quaisquer outros elementos [designadamente, documentais, ou depoimento de uma testemunha que tenha arrendado recentemente um espaço na zona], se estabelecer o valor do arrendamento no local. É que a testemunha J… dedica-se à construção civil, mas não ao arrendamento, e, por outro lado, não explicou como é que sabe qual é o valor que se «costuma pedir» pelo arrendamento (v.g., se já tentou arrendar algum espaço, se há alguém seu conhecido que tenha um espaço para arrendar ou que o tenha arrendado…). Portanto, não tendo sido fornecida uma especial e consistente razão de ciência, o depoimento desta testemunha, na parte que nos ocupa, não atingiu o standard mínimo da prova, ou seja, não é suficiente para corroborar o facto em causa, o qual, assim, deve permanecer na matéria não provada, nessa medida improcedendo a pretensão dos AA..
Em conclusão, nenhuma alteração, decorrente das conclusões de recurso, existe a efectuar nos factos provados e não provados constantes da sentença.
No entanto, por se tratar de factos assentes, que relevam para a decisão e se encontram provados por documento autêntico, aditam-se oficiosamente os seguintes pontos à matéria provada[6]:
23. O prédio referido em 1 foi constituído em regime de propriedade horizontal por escritura pública de 29/3/1985, conforme documento de fls. 3 a 8 do requerimento que consta do sistema informático CITIUS com data de 14/3/2019 (ref. 22221414), o qual aqui se dá por integralmente reproduzido.
24. Dessa escritura consta que o prédio é submetido ao regime de propriedade horizontal, de harmonia com o auto de vistoria da Câmara Municipal de Lisboa, compondo-se das fracções A, B e C e sendo a fracção A uma «loja, no rés-do-chão, com uma divisão, a que corresponde o uso exclusivo de um pequeno quintal onde se encontra construído um anexo, com a percentagem de quarenta e cinco».
25. Os factos referidos em 23 e 24 foram levados a registo em 4/7/1985 - documento de fls. 46 a 54 da contestação que consta do sistema informático CITIUS com data de 20/5/2019 (ref. 22908176), o qual aqui se dá por integralmente reproduzido.
26. O direito de propriedade sobre a fracção A, do prédio mencionado em 23, encontra-se registado a favor do R. desde 12/12/2006 [documento referido em 25].
27. O direito de propriedade sobre a fracção B, do prédio mencionado em 23, encontra-se registado a favor dos 1.ºs AA. desde 4/7/1985 [documento referido em 25].
28. O direito de propriedade sobre a fracção C, do prédio mencionado em 23, encontra-se registado a favor dos 2.ºs AA. desde 23/2/2005 [documento referido em 25].
29. O uso referido em 6 foi indicado pela Comissão Permanente de Vistorias da Câmara Municipal de Lisboa, em 11/2/1985, conforme auto de vistoria que constitui o documento de fls. 19-20 do requerimento que consta do sistema informático CITIUS com data de 14/3/2019 (ref. 22221414), o qual aqui se dá por integralmente reproduzido.
Do mérito da decisão recorrida:
Pela presente acção pretendem os AA. que o R. deverá destruir determinadas edificações que levou a cabo numa parte comum de um imóvel de que todos são condóminos, restituindo assim à compropriedade do condomínio essa parte de que ilicitamente se apropriou, deverá indemnizá-los pela ocupação da referida parte comum e deverá abster-se de utilizar a sua fracção para fim diverso daquele que consta do título constitutivo da propriedade horizontal.
Apreciando.
Conforme resulta da matéria provada, o prédio em causa nos autos foi constituído em regime de propriedade horizontal por escritura pública outorgada em 29/3/1985, tendo tal facto sido levado a registo em 4/7/1985.
Nos termos do art. 1420º do Código Civil, cada condómino é proprietário exclusivo da fracção que lhe pertence e comproprietário das partes comuns do edifício, sendo o conjunto dos dois direitos incindível e não sendo lícito renunciar à parte comum como meio de o condómino se desonerar das despesas necessárias à sua conservação ou fruição.
Por seu turno, refere o art. 1421º nº2 a) e nº3, do mesmo diploma, que se presumem comuns os pátios e os jardins anexos ao edifício, mas podendo o título constitutivo afectar ao uso exclusivo de um condómino certas zonas das partes comuns.
Na situação sub judice, provou-se que, sendo o R. proprietário da fracção autónoma designada pela letra A, do prédio de que as partes da presente acção são os únicos condóminos, tal fracção tem adjacente um quintal que, em conformidade com aquele art. 1421º nº2 a), se presume comum (o que, aliás, não é posto em causa pelas partes). No entanto, na escritura de constituição da propriedade horizontal do prédio consta expressamente que aquele quintal é de uso exclusivo pela fracção A, ou seja, é de uso exclusivo pelo R..
Assim, desde logo, carece de fundamento a peticionada condenação do R. a restituir aquele quintal à compropriedade dos condóminos, com fixação de sanção compulsória, bem como a indemnizar os AA. pela sua ocupação, uma vez que, de acordo com o título constitutivo da propriedade horizontal - em conformidade com o art. 1421º nº3 do Código Civil - é precisamente ao R. (com exclusão dos restantes condóminos) que cabe o uso do quintal.
Não existe também fundamento para, como vinha peticionado, condenar o R. a demolir a casa-de-banho que construiu naquele quintal, nem a repor o sistema de esgotos existente previamente à construção da cozinha e casas-de-banho, porquanto simplesmente não se provou que tenha sido efectuada qualquer construção de casas-de-banho, nem qualquer alteração à rede de esgotos (ónus que cabia aos AA. - art. 342º nº1 do Código Civil).
Isto posto, temos que se provou que, naquele quintal com arrecadação e na sua fracção, o R. efectuou as seguintes obras:
- forrou as paredes e tecto da fracção a pladur, colocou chão de madeira nessa fracção, instalou móveis na divisão que funcionava como cozinha, substituiu as tinas ali existentes por lava-louças mais modernos e pintou o interior da fracção;
- alteou a zona do antigo forno de padaria e da arrecadação;
- construiu uma cozinha na zona do quintal;
- alteou o telhado do piso superior interno da sua fracção.
Daquelas obras, os AA. pretendem que o R. seja condenado a demolir a cozinha e o alteamento das paredes externas do anexo. Trata-se de obras efectuadas no quintal com arrecadação, que, como vimos é uma parte comum (embora de uso exclusivo) e que, portanto, se encontra sujeita ao regime da compropriedade a que alude o citado art. 1420º.
De acordo com o art. 1422º do Código Civil, na versão em vigor à data daquelas obras:
«1. Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.
2. É especialmente vedado aos condóminos:
a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;
b) Destinar a sua fracção a usos ofensivos dos bons costumes;
c) Dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada;
d) Praticar quaisquer actos ou actividades que tenham sido proibidos no título constitutivo ou, posteriormente, por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem oposição.
3 - As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.
4 - Sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma, a alteração ao seu uso carece da autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio».
Ocorre que, como se refere no Ac. STJ de 22/2/2017[7], o disposto nos nº2, 3 e 4 daquele art. 1422º confina-se às inovações feitas nas fracções autónomas, não se aplicando às obras de inovação realizadas sobre as partes comuns, as quais estão antes sujeitas ao regime previsto no artigo 1425º, do mesmo diploma.
Prevê este art. 1425º, naquilo que para aqui importa, que:
«1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio.
(…)
7. Nas partes comuns do edifício não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, tanto das coisas próprias como das comuns».
Como ensinam Pires de Lima e Antunes Varela[8], esta norma «não se refere às inovações introduzidas nas fracções autónomas, sujeitas à propriedade exclusiva de cada condómino. Nesse domínio vigoram as normas relativas à propriedade de coisas imóveis, nas quais cabem, entre outras, as limitações das relações de vizinhança (art. 1422º). O preceituado no artigo 1426º não deixa quaisquer dívidas de que a regra consagrada no nº1 do artigo anterior foi prevista apenas para as inovações a introduzir nas coisas comuns (…). O nº1 do artigo 1425º refere-se às  obras inovadoras, que tanto podem beneficiar coisas comuns já existentes, como introduzir novas coisas comuns no edifício (instalações gerais de aquecimento, ar condicionado, água, electricidade, etc.) ou demolir antigas coisas comuns (arrancar uma instalação, entupir um poço, destruir uma garagem, etc.). O nº2[9] do artigo 1425º é que apenas se refere às inovações introduzidas nas coisas comuns já existentes, para estabelecer, quanto a algumas delas, uma verdadeira proibição (…). No conceito de inovação, que corresponde ao pensamento da nossa disposição legal, cabem tanto as alterações introduzidas na substância ou na forma da coisa (…), como as modificações estabelecidas na afectação ou destino da coisa (…). Tanto constitui invocação a construção de uma nova garagem ou a demolição dum terraço, como a instalação de um pára-raios, de um sistema de ar condicionado, de um ascensor, de uma piscina». Violando a inovação o disposto nesta norma «a sanção aplicável será, em princípio, a destruição da obra», já que mesmo «a aprovação das obras pela Câmara Municipal competente não prejudica os direitos dos condóminos, nem de terceiros ilicitamente lesados por elas».
Em suma, tem de considerar-se inovadora uma obra que altera a forma, o volume ou a afectação do prédio existente. Nas palavras do Ac. STJ de 28/9/1995[10], «é inovadora a obra que constitua uma alteração do prédio tal como originariamente foi concebido, licenciado por ocasião da outorga da licença de utilização e existia à data da constituição da propriedade horizontal, com o fim de proporcionar a um, a vários ou à totalidade dos condóminos, maiores vantagens, melhores benefícios, ainda que só de natureza económica, o uso ou o gozo mais cómodo ou maior rendimento; para que a obra em parte comum seja considerada inovação não é preciso que se revele capaz de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, da sua fracção autónoma ou das partes comuns; esse prejuízo só releva para o efeito de a inovação contra a vontade do prejudicado ser proibida, ainda que aprovada pela maioria dos condóminos que representem dois terços do valor total do prédio».
No caso dos autos, parece-nos evidente que o alteamento das paredes de uma arrecadação comum constitui uma obra inovadora (já que altera a configuração do prédio, aumentando o seu volume), a qual, não se tendo provado ter sido autorizada por uma maioria dos condóminos representativa de (pelo menos) dois terços do valor total do prédio, se considera ilícita e, assim, tem como consequência legal a sua demolição. Note-se, por um lado, que é irrelevante o teor da alínea d) dos factos não provados [não se provou que «as obras realizadas pelo R. alteraram o edifício»], já que tal segmento não constitui matéria de facto, mas sim matéria de direito - a matéria de facto diz respeito às concretas obras efectuadas e só perante a aplicação, a tal matéria, das normas jurídicas (maxime, do art. 1425º nº1 do Código Civil) é que se pode chegar à conclusão (de direito) de saber se tais obras constituem, ou não, alterações relevantes ao edifício. Uma última nota para referir que o título constitutivo da propriedade horizontal confere ao proprietário da fracção A a faculdade de usar, em exclusivo, o quintal com anexo, mas não de efectuar obras nesse anexo - muito menos, obras da envergadura de um alteamento de paredes, que encerra em si um carácter de permanência.
Já quanto às obras de construção da cozinha, não podemos considerar que as mesmas tenham constituído uma inovação, porque se provou que o espaço de arrumos / arrecadação já antes funcionava também como cozinha (cfr. pontos 10 e 17 dos factos provados) e o R. se limitou a colocar móveis (que, por definição, não fazem parte do prédio e, portanto, não o alteram) e a substituir as tinas antigas por lava-louças mais modernos (portanto, tratou-se da mera substituição de materiais). Assim, nesta parte, tem de improceder o recurso, já que inexiste fundamento para determinar a demolição.
Imputam ainda os AA. ao R. uma utilização ilícita da sua fracção autónoma, por a vir usando como habitação, quando a mesma é destinada a oficina.
E, com efeito, como resulta do art. 1422º nº2 c) do Código Civil, supra transcrito, é especialmente vedado aos condóminos dar à sua fracção um uso diverso do fim a que é destinada. Trata-se de uma limitação que encontra explicação no facto de «estando as diversas fracções autónomas integradas na mesma unidade predial, como propriedades sobrepostas ou confinantes, haver entre elas e no respectivo uso especiais relações de interdependência e de vizinhança. A estreita comunhão em que vivem os condóminos, como co-utentes de um mesmo edifício, sujeita-os a limitações que a lei não impõe ao proprietário normal e que são reclamadas pela necessidade de conciliar os interesses de todos ou de proteger interesses de outra ordem (…). O destino das fracções autónomas tanto pode ser estabelecido no título constitutivo, mediante declaração expressa, como resultar da forma como elas se encontram aí descritas, designadamente pelo que respeita às características das divisões que as integram[11]».
Compulsados os factos provados, deles consta que a fracção A está descrita no título constitutivo da propriedade horizontal como uma «loja», devendo entender-se como tal o lugar onde é exercido, com carácter fixo e permanente, de modo profissional, uma actividade de comércio[12]. Mas aquele título alude também a que a constituição da propriedade horizontal é feita em conformidade com o auto de vistoria, do qual consta que a fracção A se destina a «oficina», substantivo que, na linguagem corrente, é o «lugar onde se exerce algum ofício ou onde trabalham os oficiais e aprendizes de alguma arte ou ofício; casa onde está o maquinismo de uma fábrica, ou os instrumentos de uma indústria, arte ou profissão; casa de arrecadação; dependência de igreja, etc, destinada a refeitório, cozinha ou arrecadação[13]», ou ainda «estabelecimento onde se fazem reparações em veículos automóveis; laboratório onde se preparam ou guardam produtos farmacêuticos[14]», ou também «lugar onde se exerce um ofício, onde trabalham operários; casa ou local onde funcionam os maquinismos de uma fábrica; laboratório; dependência das igrejas e de outros edifícios destinada a refeitório, despensa, cozinha, etc.[15]».
De qualquer forma, em nenhuma daquelas acepções se inclui a habitação.
Ora, provou-se que o R. vive na fracção A pelo menos desde 2005, fazendo, desde 2006, do local exclusivamente habitação própria, tendo ali constituído a sua família e organizado a sua vida pessoal. Trata-se, portanto, de uma utilização para  uso diverso daquele a que a fracção se destina e, portanto, violadora do disposto no art. 1422º nº2 c) do Código Civil, implicando que tal utilização cesse.
Pretende, no entanto, o R. que os AA., ao exigirem a demolição do alteamento das paredes do anexo, bem como a cessação da utilização da fracção para habitação, agem em abuso de direito.
Vejamos se é assim.
Nos termos do art. 334º do C.C., «é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito».
Trata-se de uma cláusula geral, que constitui um limite normativo imanente ou interno dos direitos subjectivos – age em abuso de direito aquele que ultrapassa os limites normativo-jurídicos do direito particular que invoca. Esses limites são as regras éticas elementares, de carácter suprapositivo, que enformam o Direito[16].
O abuso de direito foi consagrado no Código Civil segundo uma concepção objectiva – para que haja lugar ao abuso de direito, é necessária a existência de uma contradição entre o modo ou o fim com que o titular exerce o seu direito e o interesse a que o poder nele consubstanciado se encontra adstrito, sem se indagar da intenção do agente[17]. A boa fé funciona aqui como um princípio normativo, pelo qual todos devem actuar, num quadro de honestidade, correcção, probidade e lealdade, de forma a não defraudar as legítimas expectativas e a confiança gerada nos outros[18]. Ocorre abuso de direito «quando alguém, detentor de um determinado direito, consagrado e tutelado pela ordem jurídica, o exercita, todavia, no caso concreto, fora do seu objectivo natural e da razão justificativa da sua existência e ostensivamente contra o sentimento jurídico dominante[19]».
A doutrina vem desdobrando o abuso de direito em diversas figuras, como o venire contra factum proprium, o tu quoque, o desequilíbrio no exercício de posições jurídicas, ou a suppressio. Esta última abarca as hipóteses em que, devido ao facto de o titular de um direito não o ter exercido durante um lapso de tempo significativo, as circunstâncias que rodearam essa inacção criaram na contraparte a confiança de que o mesmo já não viria a ser exercido, merecendo essa confiança a protecção da ordem jurídica, através de um impedimento a esse exercício tardio ou da atribuição à contraparte de um direito subjetivo obstaculizador[20]. À sua caracterização não basta o mero não-exercício e o decurso do tempo, impondo-se a verificação de outros elementos circunstanciais que melhor alicercem a justificada / legítima situação de confiança da contraparte[21]. Já o venire contra factum proprium, correspondente a um comportamento contraditório com um comportamento anterior, ocorre quando se verificam os seguintes pressupostos: «a existência de um comportamento anterior do agente susceptível de basear uma situação objectiva de confiança; a imputabilidade das duas condutas (anterior e actual) ao agente; a boa fé do lesado (confiante); a existência de um “investimento de confiança”, traduzido no desenvolvimento de uma actividade com base no factum proprium; o nexo causal entre a situação objectiva de confiança e o “investimento” que nela assentou[22]». Por seu turno, o desequilíbrio no exercício de posições jurídicas pode definir-se «como o exercício de um direito que devido a circunstâncias extraordinárias dá origem a resultados totalmente estranhos ao que é admissível pelo sistema, quer por contrariar a confiança ou aquilo que o outro podia razoavelmente esperar, quer por dar origem a uma desproporção manifesta e objectiva entre os benefícios recolhidos pelo titular ao exercer o direito e os sacrifícios impostos à outra parte resultantes desse exercício (aqui se incluem o exercício danoso inútil, a exigência injustificada de coisa que de imediato se tem de restituir e o puro desequilíbrio objectivo)[23]». Finalmente, o tu quoque «exprime a máxima segundo a qual a pessoa que viole uma norma jurídica não pode, depois e sem abuso: ou prevalecer-se da situação jurídica daí decorrente; ou exercer a posição jurídica violada pelo próprio; ou exigir a outrem o acatamento da situação já violada[24]».
No caso sub judice, provou-se, com relevância, que: AA. e R. são os únicos condóminos do prédio; os AA. são condóminos desde, respectivamente, 4/7/1985 (os 1.ºs AA.) e 23/2/2005 (os 2.ºs AA.); o R. vive na fracção A pelo menos desde 2005; em 2006, o R. adquiriu a propriedade da fracção A à sociedade H... e passou a fazer do local exclusivamente habitação própria, tendo forrado as paredes e tecto da sala principal da fracção a pladur, tendo colocado chão de madeira na mesma sala, tendo instalado móveis na divisão que funcionava como cozinha, tendo substituído as tinas ali existentes por lava-louças mais modernos, tendo pintado o interior da fracção e tendo alteado a zona do antigo forno de padaria e da arrecadação; os AA. visitaram a habitação do R. e pelo menos desde 2011 sabiam que o R. ali vivia e tinha ali constituído família; o 2º A., enquanto Presidente da Junta de Freguesia de Santa Engrácia, convidou o R. a prestar serviços de acupunctor naquela Junta, tendo, para esse efeito, celebrado contrato onde o R. se identifica como residente na fracção A; o alteamento da zona do antigo forno de padaria e da arrecadação não beneficiou apenas o R.; os AA. sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo R.; os AA. nunca se opuseram a que o R. ali organizasse a sua vida pessoal e ali residisse com a sua família; em 2015, os AA. dirigiram aos R. duas cartas, nas quais mencionam como assunto «impermeabilização pátio por cima da sua cozinha».
Por outro lado, não se provou que a nova utilização tenha causado qualquer prejuízo concreto aos AA., designadamente, que tenha agravado o esforço da fossa comum, provocando o entupimento da mesma, ou sequer que o alteamento do antigo forno de padaria e da arrecadação tenha atingido meio metro e que tenha beneficiado exclusivamente o R..
Constata-se, assim, que, apesar de terem conhecimento de todas as obras que o R. fez (em 2006), os AA. nada fizeram durante cerca de 13 anos [a acção foi intentada apenas em 2019]. Por outro lado, não obstante terem conhecimento, pelo menos desde 2011, de que o R. ali residia, os AA. também nada fizeram durante cerca de 8 anos. Durante esse tempo, os AA. visitaram mesmo a casa do R., o 2º A. até convidou o R. a prestar serviços de acupunctor na Junta de Freguesia de que era presidente (constando do respectivo contrato a residência do R. na fracção) e em 2015 os AA. remeteram ao R. cartas a propósito da impermeabilização do terraço de cobertura da sua cozinha, sem que nada conste acerca de qualquer oposição às obras feitas pelo R. ou à sua residência no local. Face a estes factos, temos de considerar que a falta de exercício do direito ocorreu durante um lapso temporal significativo, durante o qual o comportamento dos AA., totalmente desinteressado e sem qualquer manifestação de oposição - apesar de terem tido oportunidade para tanto, quer aquando da visita à casa, quer aquando do convite para trabalhar na Junta, quer aquando do envio de cartas a propósito da impermeabilização -, foi de molde a fazer concluir que já não o iriam exercer. Ao pretenderem agora a demolição de um alteamento e a cessação da habitação com base em fundamentos que conheciam há 13 e 8 anos e que nunca antes invocaram, os AA. agem em violação dos princípios éticos fundamentais, violando, com tal comportamento, a mais elementar boa-fé.
Assim, por via do instituto do abuso de direito justifica-se a paralisação do direito dos AA. a obterem a demolição do alteamento das paredes do anexo e a cessação da utilização da fracção A para habitação[25].
Improcedem, assim, também nesta óptica, as conclusões do recurso.
Resta apreciar a condenação dos AA. como litigantes de má fé, condenação essa que os AA. pretendem ver revogada.
De acordo com o art. 542º nº1 e 2 do Código de Processo Civil, tendo litigado de má fé, a parte será condenada em multa e numa indemnização à parte contrária, se esta a pedir. Diz-se litigante de má fé quem, com dolo ou negligência grave:
«a) Tiver deduzido pretensão ou oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar;
b) Tiver alterado a verdade dos factos ou omitido factos relevantes para a decisão da causa;
c) Tiver praticado omissão grave do dever de cooperação;
d) Tiver feito do processo ou dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, impedir a descoberta da verdade, entorpecer a acção da justiça ou protelar, sem fundamento sério, o trânsito em julgado da decisão».
Como se refere no Ac. TCAN de 30/4/2009[26], «Alberto dos Reis costumava caracterizar as lides, com referência à conduta do litigante, como lides cautelosas, lides simplesmente imprudentes, lides temerárias e lides dolosas – Código de Processo Civil Anotado, volume II, págs. 254 e ss. Ora, apenas esta última parece caber no conceito legal de litigância de má fé, embora a atitude dolosa [dolo directo, necessário, ou eventual] deva ser estendida até ao ponto de abranger a negligência grave, que convive paredes-meias, como é sabido, com o dolo eventual. Assim, para que se condene a parte como litigante de má fé não basta uma lide ousada ou uma conduta meramente culposa, sendo necessário, face ao manifesto gravame jurídico-social associado a tal condenação, que não haja quaisquer dúvidas em qualificar a conduta como dolosa ou gravemente negligente».
 A decisão a proferir apenas se pode basear nos factos provados e no seu confronto com a conduta processual da parte.
O tribunal a quo discorreu, a propósito da litigância de má fé, da seguinte forma:
«(…) verifica-se que os Autores alteraram a verdade dos factos para, com isso, obterem ganho de causa. Tal, aliás, foi patente em sede de depoimentos de parte, tendo os Autores confessado factos contrários às suas alegações, ou seja, eles próprios demonstraram a falsidade do que foi, por eles, alegado: os Autores sabiam – sempre souberam do uso que o Réu dava à fracção, bem como a natureza e características das obras que o mesmo levou a cabo, nunca se tendo oposto a tal status quo. Este circunstancialismo é, em nossa perspectiva, suficiente para qualificar a conduta dos Autores em sede de litigância de má-fé».
Ora, desde logo, constata-se que, na petição inicial, os AA. alegaram que sempre desconheceram as alterações efectuadas pelo R. (obras e residência), só tendo tomado conhecimento das mesmas no âmbito de processo que aquele R. contra eles intentou em 2018 [cfr. art. 22º da petição inicial]. Porém, muito pelo contrário, provou-se que [cfr. pontos 13 e 18 dos factos provados]: «Pelo menos desde 2011 que os Autores sabem que o Réu ali vivia e que tinha ali constituído família» e «os Autores sempre tiveram conhecimento de todas as obras que foram executadas pelo Réu».
Trata-se de factos pessoais, que os AA. tinham, forçosamente, de conhecer, o que significa que alteraram conscientemente a verdade dos factos, agindo, necessariamente, com dolo ou, pelo menos, com negligência grosseira.
Terão, assim, de ser condenados, como litigantes de má fé (sendo certo que os recorrentes não põem em causa o montante da multa e da indemnização fixadas, mas apenas a verificação dos pressupostos da litigância de ma fé que, como vimos, se encontram preenchidos).
Nada há, assim, a alterar na decisão recorrida relativamente à litigância de má fé, pelo que, também nessa vertente, improcede a apelação.

DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.
Custas pelos apelantes – arts. 527º do Código de Processo Civil e 6º nº2, com referência à Tabela I-B, do Regulamento das Custas Processuais.

Lisboa, 07-05-2024
Alexandra de Castro Rocha
Ana Mónica Mendonça Pavão
Ana Rodrigues da Silva
_______________________________________________________
[1] Ob. cit., págs. 197 -198; a este propósito pode ver-se ainda, com interesse, o Ac. STJ de 19/2/2015, proc. 299/05, disponível em http://www.dgsi.pt.
[2] Ob. cit., págs. 200-201.
[3] Cfr. António Santos Abrantes Geraldes, ob. cit., págs. 333 e ss.),
[4] A este respeito pode ver-se, ainda, o Ac. RC de 27/5/2014 (proc. 1024/12, disponível em http://www.dgsi.pt): «Não há lugar à reapreciação da matéria de facto quando o (s) facto (s) concreto (s) objecto da impugnação for insusceptível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica, sob pena de se levar a cabo uma actividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente».
[5] Cfr. Ac. STJ de 21/3/2019, proc. 3683/16, disponível em http://www.dgsi.pt.
[6] O que se faz ao abrigo do art. 662º nº1 do Código de Processo Civil.
[7] Proc. 2064/10, disponível em http://www.dgsi.pt. No mesmo sentido, pode ver-se Abílio Neto, Manual da Propriedade Horizontal, 3ª ed., em anotação ao art. 1425º.
[8] Código Civil Anotado, Volume III, 2ª ed., em anotação ao art. 1425º.
[9] Correspondente ao actual nº7.
[10] Proc. 087044, sumário disponível em http://www.dgsi.pt.
[11] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, ob. cit., em anotação ao art. 1422º.
[12] Cfr. Abílio Neto, ob. cit., pág. 189.
[13] Cfr. Dicionário da Língua Portuguesa, 5ª Edição, Porto Editora.
[14] Cfr. Dicionário da Língua Portuguesa - Acordo Ortográfico, 2018, Porto Editora.
[15] Cfr. Dicionário Enciclopédico Lello Universal, Lello Editores, Setembro de 2002.
[16] Cfr. Baptista Machado, C.J., 1984, t. II, pág. 17, citando Castanheira Neves; e ainda Baptista Machado, Tutela da Confiança e venire contra factum proprium, in R.L.J., nº3725, pág. 231.
[17] Cfr. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 6ª ed., pág. 516, cit. pelo Ac. STJ de 5-3-1996, CJ STJ, ano IV, t. I, págs. 115 e ss..
[18] Cfr. Fernando Augusto Cunha de Sá, Abuso do Direito, págs. 171 e ss..
[19] Cfr. Ac. RC de 9/1/2017, proc. 102/11, disponível em http://www.dgsi.pt.
[20] Cfr. Ac. RC de 24/11/2020, proc. 4472/18.9, disponível em http://www.dgsi.pt.
[21] Cfr. Ac. STJ de 11/12/2013 proc. 629/10.9, disponível em http://www.dgsi.pt.
[22] Cfr. Ac. STJ de 12/11/2013, proc. 1464/11.2, disponível em http://www.dgsi.pt.
[23] Cfr. Ac. RC de 9/1/2017, já citado.
[24] Cfr. António Menezes Cordeiro – Do abuso do direito: estado das questões e perspectivas, ponto12, in ROA, ano 2005, ano 65, Vol II, Setembro. 2005, disponível em https://portal.oa.pt/publicacoes/revista-da-ordem-dos-advogados-roa/ano-2005/ano-65-vol-ii-set-2005/artigos-doutrinais/antonio-menezes-cordeiro-do-abuso-do-direito-estado-das-questoes-e-perspectivas-star/
[25] Actualmente, e ao abrigo do art. 1422º-B do Código Civil, aditado pelo DL 10/2024 de 8-1, que entrou em vigor em 1/1/2024, o R. poderá até, independentemente do acordo dos restantes condóminos, diligenciar sozinho pela alteração do fim da fracção para o de habitação, o que tornaria ainda mais abusivo determinar agora a cessação da utilização da fracção A para tal fim.
[26] Proc. 01657/08, disponível em http://www.dgsi.pt.