Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1812/18.4T8PVZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Descritores: SOCIEDADE COMERCIAL
RESPONSABILIDADE DO GERENTE
PARTICIPAÇÃO NOS LUCROS
DIREITO AOS LUCROS
DIREITO À INFORMAÇÃO
Nº do Documento: RP202306011812/18.4T8PVZ.P1
Data do Acordão: 06/01/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O artigo 79.º do Código das Sociedades Comerciais não contém um regime especial de responsabilidade do gerente perante os sócios, antes remete para o regime geral de responsabilidade civil, contemplando apenas a indemnização dos danos directamente causados aos sócios.
II - O direito a participar nos lucros da sociedade tem por objecto não os proveitos de cada acto ou negócio praticado pela sociedade, mas apenas os lucros distribuíveis apurados em cada exercício e que foram objecto de uma deliberação de distribuição.
III - A falta de prestação de informação ao sócio só pode ser considerada causa adequada de danos directamente sofridos pelo sócio como o custo das diligências que teve de realizar para obter por outra via a informação e as despesas que suportou por ter sido induzido em erro pela falta de informação ou que não teria tido se a informação lhe tivesse sido prestada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: RECURSO DE APELAÇÃO
ECLI:PT:TRP:2023:1812.18.4T8PVZ.P1
*

SUMÁRIO:
………………..
………………..
………………..


ACORDAM OS JUÍZES DA 3.ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

I. Relatório:
AA, contribuinte fiscal n.º ..., residente em ..., Vila do Conde, instaurou acção judicial contra BB, contribuinte fiscal n.º ..., residente em Vila do Conde, pedindo a condenação da ré a pagar ao autor €45.000,00, acrescidos de juros vencidos e vincendos até integral pagamento.
Para fundamentar o seu pedido alegou, em súmula, que no dia 07/06/1999 celebrou com a ré um contrato de sociedade, constituindo a sociedade com a denominação social A..., Limitada, que se encontra matriculada no registo comercial sob o n.º ...22, e cujo objecto social era a indústria e comércio de pastelaria, confeitaria e panificação. Para desenvolvimento desse objecto social, a sociedade, representada pelo autor, na qualidade de gerente, comprou em 15/02/2002 uma fracção autónoma para comércio. Em 07/08/2006, sem prévia deliberação social que o autorizasse e sem dar conhecimento autor, a ré, na qualidade de representante da sociedade, vendeu essa fracção pelo preço de €70.000,00, causando o imediato encerramento da sociedade que não possuía outro espaço para laborar e privando de imediato o autor da sua actividade laboral e dos respectivos rendimentos.
Em sede de direito, refere que não discute a validade do acto praticado pela ré mas apenas a falta de comunicação do mesmo ao autor, que tinha o direito de ser informado do mesmo, para além de ter o direito de quinhoar nos lucros da sociedade na proporção da sua quota, sendo que a ré não distribuiu o produto da venda da fracção e a sua actuação redundou na eliminação do posto de trabalho do autor o qual tem o direito a ser indemnizado pela ré pelos danos individuais que sofreu com essa eliminação.
A ré contestou a acção, por excepção e por impugnação, refutando os factos alegados pelo autor e sustentando a validade do acto praticado e concluindo pela improcedência da acção.
No decurso da acção o autor ampliou o seu pedido, referindo que feitas as contas aos salários que deixou de auferir se viu privado não do montante de €10.000 estimados na petição inicial, mas do montante de €252.000, requerendo a ampliação do pedido nesse montante.
Realizado julgamento foi proferida sentença, tendo a acção sido julgada improcedente e a ré absolvida do pedido.
Do assim decidido, o autor interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:
1. Vem o presente recurso interposto pelo Autor, AA, versando sobre matéria de facto, com reapreciação da prova gravada, no sentido de obter a revogação da douta sentença proferida em 22/01/2023, pela Juízo Central Cível da Póvoa de Varzim, na parte em que julgou totalmente improcedente os pedidos formulados pelo Autor, deles absolvendo a Ré.
2. Assim sendo, o objecto do presente recurso cinge-se à discussão da decisão na parte em que absolve a ré dos pedidos contra si formulados, deixando-se intocada a restante matéria em apreciação, que assim fica coberta pelo caso julgado e deve ter-se por irrepetivelmente decidida.
3. Nos termos do artigo 612.º do CPC, a recorrente impugna, desde logo, a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto julgada como provada, com vista à sua reapreciação e modificação pelo tribunal ad quem.
4. A decisão recorrida julgou que o estabelecimento instalado na fracção autónoma designada pela letra “B”, sita na Rua ..., Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória de Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o n.º ...26, funcionou até ao final do terceiro trimestre de 2005 (ponto 20 dos factos dados como provados).
5. Da prova testemunha produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, dúvidas não restam que o estabelecimento instalado na fracção identificada em 7) dos factos dados como provados esteve a laborar até ao dia da realização escritura de compra e venda da fracção, tendo, inclusive, o recorrente lá trabalhado até esse mesmo dia.
6. Nesta medida, não pode o tribunal a quo única e exclusivamente concluir, que pelo simples facto de o autor não ter procedido à junção dos seus recibos de vencimento desde Outubro de 2005 até pelo menos Julho de 2006 que o mesmo não tenha trabalhado no estabelecimento e/ou na padaria/pastelaria A... Lda.
7. Além disso, a recorrida instaurou contra o recorrente, um processo de suspensão imediata e destituição de gerente, o qual correu termos sob o n.º 413/03.6TYVNG no Tribunal de Vila Nova de Gaia, tendo, em 30/03/2006, sido proferido Acórdão pelo Tribunal da Relação do Porto que revogou a decisão proferida, em 15/07/2004, de suspensão imediata do autor de funções de gerente da sociedade A... Lda.
8. Nesta senda, constata-se que a motivação apresentada na douta sentença: “esclareceu que o autor saiu quando foi destituído [o que coincide com o hiato no pagamento do vencimento], houve recurso e regressou desconhecendo se o fez na qualidade de gerente”, não faz qualquer sentido.
9. Pois que, e seguindo o raciocínio apresentado na motivação da douta sentença, o recorrente, supostamente, deixou de trabalhar na padaria/pastelaria quando foi destituído das suas funções de gerente.
10. Ora, ele foi destituído das suas funções em 15/07/2004 e não em Setembro de 2005.
11. No entanto, e atendendo aos recibos de vencimento juntos aos autos, em 20/02/2019, através de requerimento com a referência Citius 31622596, constata-se que foram juntos os recibos de Julho de 2004, Agosto de 2004, Janeiro 2005, Fevereiro 2005, Março 2005, Abril 2005, Maio 2005, Junho 2005, Agosto 2005 e Setembro 2005.
12. Nesta medida, é imperativo concluir que a falta de junção de alguns dos recibos de vencimento no hiato compreendido entre 15/07/2004 e 30/03/2006, não determina automaticamente que o trabalhador não tenha prestado trabalho no estabelecimento.
13. Em face do que antecede, atenta a prova produzida nesse sentido, dever-se-á alterar o ponto 20 dos factos provados, que deverá passar a ser a seguinte: 20. O estabelecimento instalado na fracção identificada em 7) funcionou até ao dia 07 de Agosto de 2006, data da realização da escritura de compra e venda da fracção.
14. No tocante aos pontos a) e b) dos factos dados como não provados entende o recorrente que não poderão ser dados como não provados, uma vez que, foi dado como provado que a assinatura atribuída ao recorrente que consta da acta da Assembleia Geral Extraordinária de 28 de Julho de 2006 não foi aposta pelo seu punho.
15. Na motivação da douta sentença é referido: impõe-se concluir que a assinatura que consta da acta não foi aposta pelo punho do Autor, o que conduziu à fixação do ponto 19 da fundamentação de facto; contudo, daqui não se pode concluir que os sócios não deliberaram a venda da fracção, nem que o Autor desconhecesse esse negócio (aliás, estando pendentes duas acções com as partes devidamente patrocinadas, é perfeitamente possível que houvesse influência dos Mandatários para encontrar uma solução e, perante a existência de dívidas, designadamente, do passivo alusivo ao financiamento da Banco 1..., a venda da fracção faz todo o sentido).
16. Ora, a motivação invocada pelo tribunal a quo, e salvo o devido respeito, não faz qualquer sentido.
17. Primeiro, uma das acções a que se refere a motivação da douta sentença – Processo n.º 413/03.6TYVNG – aquando da realização da Assembleia Geral Extraordinária, bem como aquando da data da venda da fracção, em 07/08/2006, já não se encontrava pendente, pois que, em 30/03/2006, foi proferido Acórdão que revogou a decisão de suspensão imediata e destituição de gerente.
18. Além disso, foi dado como provado que a assinatura do recorrente na referida Acta de Assembleia Geral Extraordinária, não foi aposta pelo seu punho, acta, essa, que se destinou única e exclusivamente a conceder, alegadamente, poderes à sócia recorrida para vender a fracção onde se encontrava instalada a padaria/pastelaria.
19. Se atentarmos ao seu teor é mencionado que “foi aprovado por unanimidade que a sócia BB poderá vender o prédio acima identificado.”
20. Na verdade, a alegada Assembleia Geral Extraordinária não passou de uma tentativa dissimulada de deliberação e aprovação da venda da já identificada fracção autónoma.
21. Nesta medida não poderá, logicamente, concluir-se, como concluiu o tribunal a quo, que a venda do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial da Póvoa de Varzim sob o n.º ...26, fracção “B” foi deliberada e aprovada pela sociedade, pois que a acta que resultou da suposta Assembleia nem sequer foi assinada pelo recorrente.
22. Além disso, e atendendo à prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento é imperativo concluir que o recorrente não participou na deliberação e aprovação da venda da fracção, onde se encontrava instalada a padaria/pastelaria, tanto que a assinatura constante na respectiva acta não foi aposta pelo seu punho.
23. Bem como não teve qualquer conhecimento prévio da sua realização.
24. Em face do que antecede, atenta a prova produzida nesse sentido, dever-se-á alterar aditar-se aos factos provados o seguinte ponto: 19-A. A decisão da venda referida em 16) não foi deliberada pela sociedade, não tendo, por isso, o autor tomado qualquer conhecimento da decisão de venda;
25. No que se refere aos pontos c) e d) dos factos dados como não provados entende o recorrente que não poderão ser dados como não provados, porquanto o recorrente não ter deliberado, nem aprovado a decisão de venda da identificada fracção, bem como por só ter tido conhecimento da realização da referida venda no dia em que se apresentou para trabalhar, como o habitualmente, e constatou que se encontrava nas instalações o comprador da identificada fracção.
26. Além disso resulta da prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, verifica-se que entre o ano de 2002 e 2003 a recorrida apresentou ao recorrente uma proposta no sentido em que cedia a parte que detinha na sociedade A... Lda. pelo preço de € 75.000,00 (setenta e cinco mil euros), acrescida da condição de cancelamento da hipoteca voluntária a favor Banco 1..., que havia sido constituída sob as fracções autónomas “A” e “B” da propriedade da Ré e do marido, sitas na Avenida ..., em Vila do Conde.
27. Além desta proposta, o contabilista da sociedade, conhecedor da má relação entre o recorrente e a recorrida, e com o conhecimento do recorrente, entre o ano de 2003 e 2004, apresentou à recorrida uma proposta no sentido em que havia um casal interessado na compra do estabelecimento/padaria/pastelaria pelo preço de €250.000,00 (duzentos e cinquenta mil euros).
28. Não tendo, contudo, tal proposta sido aceite pela recorrida.
29. Resulta ainda da prova produzida que o comprador da fracção – CC – confidenciou que o valor declarado na escritura não havia sido o valor real da compra e venda do imóvel.
30. Tendo adquirido a já identificada fracção pelo preço de €300.000,00 (trezentos mil euros).
31. Contudo, a recorrida em sede de audiência de discussão e julgamento, convenientemente, prescindiu da testemunha CC.
32. Ora, atendendo à prova testemunhal produzida em sede de audiência de discussão e julgamento dúvidas não subsistem que a fracção autónoma onde se encontrava instalado o estabelecimento/padaria/pastelaria foi vendida por um preço superior ao declarado.
33. Pois que e considerando a proposta apresentada pela recorrida entre os anos de 2002 e 2003, a mesma estava disposta a ceder a parte que detinha no estabelecimento/padaria/pastelaria pelo preço de €75.000,00 (setenta e cinco mil euros).
34. Quer isto dizer, que o estabelecimento/padaria/pastelaria teria pelo menos o valor de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros) em 2002/2003.
35. Ademais o, o próprio comprador conferenciou com o recorrente que teria pago pelo estabelecimento/padaria/pastelaria o valor de €300.000,00 (trezentos mil euros).
36. Nesta medida impunha-se ao tribunal a quo dar como provado que a venda do estabelecimento/padaria/pastelaria acarretou lucro para a sociedade, mesmo no fim de saldar o valor remanescente do empréstimo contraído à Banco 1... em 23/03/2000.
37. Em face do que antecede, atenta a prova produzida nesse sentido, dever-se-á alterar aditar-se aos factos provados o seguinte ponto: 25. a venda referida em 16) acarretou lucro para a sociedade de pelo menos 230.000,00 (duzentos e trinta mil euros), o qual poderia ser distribuído pelo sócios, cabendo a cada um a quantia de €115.000,00 (cento e quinze mil euros).
Nestes termos, deverá ser recebido e julgado procedente o presente recurso, sendo revogada a decisão proferida e substituída por douto acórdão que julgue a acção parcialmente procedente e (i) condene a recorrida a pagar ao recorrente a quantia de €35.000,00 (trinta e cinco mil euros) a título de distribuição de lucros, acrescida de juros vencidos e vincendo até efectivo e integral pagamento, e ainda (ii) a quantia de €22.500,00 (vinte e dois mil e quinhentos euros) por conta dos salários que o recorrente deixou de auferir, em consequência da venda do estabelecimento/padaria/pastelaria (18 meses x €1.250,00), acrescida de juros vencidos e vincendo até efectivo e integral pagamento.
A recorrida respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.
Após os vistos legais, cumpre decidir.

II. Questões a decidir:
As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida as seguintes questões:
i. Se cumpre conhecer da impugnação da decisão sobre a matéria de facto e, na afirmativa, se esta decisão deve ser modificada.
ii. Se estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade civil a que se refere o artigo 79.º do Código das Sociedades Comerciais.

III. Impugnação da decisão sobre a matéria de facto:
O recorrente impugnou a decisão sobre a matéria de facto, questionando a decisão de julgar provado o facto do ponto 20, cuja redacção, na sua tese, deverá ser um pouco diferente, bem como a decisão de julgar não provados todos os factos que o tribunal elencou como tendo julgados desse modo, defendendo que os mesmos devem ser julgados provados com a redacção que propõe.
Mostram-se cumpridos de modo satisfatório os requisitos específicos desta impugnação, consagrados no artigo 640.º do Código de Processo Civil, pelo que em princípio nada obsta à apreciação da mesma.
Sucede, no entanto, que vem sendo entendido que o Tribunal da Relação pode abster-se de conhecer da impugnação da decisão sobre a matéria de facto quando os factos objecto dessa impugnação sejam absolutamente irrelevantes para a apreciação do mérito da causa ou do recurso.
Abrantes Geraldes, in Recursos em Processo Civil Novo Regime, 2.ª edição revista e actualizada pág. 298, escreveu que «de acordo com as diversas circunstâncias, isto é, de acordo com o objecto do recurso (alegações e, eventualmente, contra-alegações) e com a concreta decisão recorrida, são múltiplos os resultados que pela Relação podem ser declarados quando incide especificamente sobre a matéria de facto. Sintetizando as mais correntes: (…) n) Abster-se de conhecer da impugnação da decisão da matéria de facto quando os factos impugnados não interfiram de modo algum com a solução do caso, designadamente por não se visionar qualquer solução plausível da questão de direito que esteja dependente da modificação que o recorrente pretende operar no leque de factos provados ou não provados».
O Acórdão da Relação do Porto de 21.06.2022, proc. n.º 191/18.4T8PRD.P1, in www.dgsi.pt. acompanha esta passagem, defendendo que o que o autor escreveu para o anterior regime processual civil, conserva «inteira valia à luz do regime processual vigente». E, de facto, na 7ª edição actualizada da mesma obra, agora com o título Recursos em Processo Civil, 2022, página 334, nota 526, Abrantes Geraldes escreveu de novo o seguinte: «É claro que a apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto apenas se justifica nos casos em que da eventual modificação da decisão possa resultar algum efeito útil relativamente à resolução do litígio no sentido propugnado pelo recorrente, sendo dispensável nos demais casos em que não interfira de modo algum no resultado declarado pela 1.ª Instância (cf. Ac. do STJ, de 28-1-20, 287/11, www.dgsi.pt, e Ac. do STJ, de 23-1-20, 4172/16, https://jurispru dencia.csm.org.pt)» (sublinhados nossos).
O mesmo entendeu o Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de 19.05.2021, proc. n.º 1429/18.3T8VLG.P1.S1, onde se lê: «Pode recusar-se a conhecer do recurso de impugnação da matéria de facto relativamente àqueles factos concretos objecto da impugnação, que careçam de maneira evidente de relevância jurídica à luz das diversas soluções plausíveis da questão de direito, evitando, de acordo com o artigo 130.º do CPC, a prática de um acto inútil» (in https://www.stj.pt).
Igual posição foi seguida no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14.07.2021, proc. n.º 65/18.9T8EPS.G1.S1, afirmando-se que «se o facto que se pretende impugnar for irrelevante para a decisão, segundo as várias soluções plausíveis, não há qualquer utilidade naquela impugnação da matéria de facto, pois o resultado a que se chegar (provado ou não provado) é sempre o mesmo: absolutamente inócuo. O mesmo é dizer que só se justifica que a Relação faça uso dos poderes de controlo da matéria de facto da 1.ª instância quando essa actividade da Relação recaia sobre factos que tenham interesse para a decisão da causa, ut art. 130.º do CPC. Quando assim não ocorre, a Relação deve abster-se de apreciar tal impugnação» (in https://www.stj.pt).
Ora, pelas razões que de seguida serão expostas e desenvolvidas, ainda que os factos cuja decisão foi impugnada devessem ser julgados no sentido defendido pelo recorrente, a qualificação jurídica proporcionada pelos mesmos jamais poderia interferir com a decisão de mérito da acção; pelo contrário, os factos alegados na petição inicial conduzem inabalavelmente à improcedência da acção e, consequentemente, à improcedência do recurso, desfecho que podia ter motivado o indeferimento liminar da petição inicial e que em caso algum aqueles factos poderiam ou poderão impedir ou modificar.
Por esse motivo, abstemo-nos de reapreciar a decisão da matéria de facto relativamente aos factos referidos pelo recorrente.
Passaremos, pois, directamente às questões de direito.

IV. Fundamentação de facto:
O tribunal a quo julgou provados os seguintes factos:
1. A sociedade A..., Ld.ª, NIPC ..., registada pela Ap. ... de 25 de Junho de 1999, tinha por objecto a indústria e comércio de pastelaria, confeitaria e panificação e sede na Rua ..., Edifício ..., ....
2. O capital da sociedade identificada em 1), no valor de €5.000 estava dividido em duas quotas de €2.500, uma pertencente ao Autor e outra à Ré.
3. A sociedade identificada em 1) tinha dois gerentes obrigando-se pela intervenção de um deles.
4. Por deliberação de 7 de Junho de 1999, Autor e Ré foram nomeados gerentes.
5. Por escritura lavrada no Cartório Privativo da Banco 1..., na agência de ..., concelho ... a 23 de Março de 2000, o procurador daquela, DD e em sua representação, a Ré e o Autor, em representação da sociedade A..., Ld.ª, o primeiro declarou que a Banco 1... concedia à sociedade uma abertura de crédito até ao montante de Esc. 26.000.000$00, tendo os segundos confessado a sociedade por si representada devedora das quantias que fossem debitadas na conta de depósitos à ordem nº ...30 da referida agência, destinadas a financiar a instalação e criação de um estabelecimento de panificação e pastelaria do tipo “pão quente e snack bar”, pelo prazo de dez anos, a contar daquela data, que compreendiam período de utilização e carência de dois anos, com pagamento em prestações semestrais e postecipadas de juros a uma taxa nominal indexável à taxa “Euribor” a três meses, acrescida de um spread de 3%, à data, uma taxa nominal de 6,818%/ano, calculadas sobre o saldo do capital em dívida, a primeira em 23 de Setembro do referido ano e um período de amortização do capital nos restantes oito anos, em prestações mensais e postecipadas, vencendo-se a primeira em 23 de Abril de 2002 e as restantes em igual dia de cada um dos meses seguintes, incluindo os juros relativos ao respectivo mês.
6. Na escritura identificada em 5) a Ré e marido EE declararam constituir a favor da Banco 1... hipoteca sobre as fracções autónomas “A” e “B” integradas no prédio afecto ao regime da propriedade horizontal, sito na Avenida ..., cidade e concelho ..., descrito na Conservatória de Registo Predial sob o nº ...06- Vila do Conde, inscrito na matriz sob o artigo ...69, para segurança do capital da abertura de crédito no montante de Esc. 26.000.000, dos respectivos juros até à taxa anual de 11,45%, acrescida de sobretaxa de 4% em caso de mora e a título de cláusula penal e das despesas emergentes que para efeitos de registo fixavam em Esc. 1.040.000$00.
7. Por escritura pública outorgada a 15 de Fevereiro de 2002, no Segundo Cartório Notarial da Póvoa de Varzim, FF, na qualidade de gerente e em representação da sociedade B..., Limitada, declarou vender a A..., Limitada, representada pelo seu gerente aqui Autor, que declarou a aceitar, livre de ónus e encargos e pelo preço já recebido de € 49.879,79, a fracção autónoma designada pela letra “B” correspondente ao rés-do-chão direito, entre a fracção “A” e a primeira entrada, destinada a actividades económicas com acesso directo pela Rua ..., Primeira Fase, de um prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito nas Ruas ...., Póvoa de Varzim, descrito na Conservatória de Registo Predial desse concelho, sob o nº ...26 da freguesia ..., ainda não inscrito na matriz mas participado em 22 de Outubro de 2001.
8. A Ré intentou contra o Autor processo especial de suspensão imediata e destituição de gerente que correu termos sob o nº 413/03.6TYVNG no tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, na qual, em 15 de Julho de 2004 foi decretada a suspensão imediata do Autor das funções de gerente da sociedade A..., Ld.ª, ficando os poderes de gerência confiados apenas à Requerente.
9. Interposto recurso, por Acórdão de 30 de Março de 2006, transitado em julgado, o tribunal da Relação do Porto revogou a decisão referida em 8).
10. A Ré intentou contra o Autor processo de exclusão judicial de sócio que correu termos sob o nº 411/03.0TYVNG, no qual, em 27 de Julho de 2007, foi requerida a suspensão da instância por quinze dias e, decorrido tal prazo, por nada ter sido direito ou requerido, foi remetido à conta e remetido ao arquivo geral.
11. Durante o tempo da gestão e administração exclusiva do Autor, este vendeu o outro estabelecimento sito na Rua ..., sem disso dar contas à sociedade.
12. O último estabelecimento da sociedade identificada em 7) funcionou na fracção descrita m 7).
13. Além de gerente, o Autor desempenhava funções como padeiro, pasteleiro do estabelecimento e, quando necessário, atendia o público e fazia a entrega dos produtos nos estabelecimentos dos clientes.
14. Durante o período de funcionamento do estabelecimento identificado em 7) o Autor pelas funções de sócio trabalhador e gerente auferiu os seguintes valores líquidos:
- Agosto de 2000: € 539,60
- Setembro de 2000: € 534,74
- Outubro de 2000: € 534,74
- Dezembro de 2000: € 520,15 + € 183,30 (Subsídio de Natal)
- Janeiro 2001: € 539,60
- Fevereiro de 2001: € 525,01
- Março de 2001: € 539,60
- Maio de 2001: € 466,28
- Junho de 2001: € 515,21
- Julho de 2001: € 524,95
- Agosto de 2001: € 524,95
- Setembro de 2001: € 515,21 + € 417,94 (subsídio de férias)
- Outubro de 2001: € 417,94
- Novembro de 2001: € 520,07€
- Dezembro de 2001: € 515,21 + € 417,94 (subsídio de natal)
- Janeiro de 2002: € 525,08
- Fevereiro de 2002: € 510,47
- Abril de 2002: € 539,77
- Maio de 2002: € 525,10
- Junho de 2002: € 515,36
- Julho de 2002: € 534,84
- Setembro de 2002: € 525,10 + e 422,83 (subsídio de férias)
- Outubro de 2002: € 422,83
- Novembro de 2002: € 716,15
- Dezembro de 2002: € 721,02 + € 618,75 (subsídio de natal)
- Janeiro de 2003: € 725,09
- Fevereiro de 2003: € 716,15
- Março de 2003: € 716,15
- Abril de 2003: € 716,15
- Maio de 2003: € 1.869,43
- Junho de 2003: € 1.023,78
- Julho de 2003: € 1.043,26
- Agosto de 2003: € 1.028,65
- Setembro de 2003: € 1038,35
- Outubro de 2003: € 1.043,26 + € 931,25 (subsídio de férias)
- Novembro de 2003: € 931,25
- Dezembro de 2003: € 1.018,65 + € 931,25 (subsídio de natal)
- Fevereiro de 2004: € 1.023,78
- Março de 2004: € 1.080,76
- Abril de 2004: € 1.046,02
- Maio de 2004: € 1.046,02
- Junho de 2004: € 1.046,02
- Julho de 2004: € 1.051,14
- Agosto de 2004: € 1.051,14
- Janeiro de 2005: € 1.046,27
- Fevereiro de 2005: € 1.036,53
- Março de 2005: € 1.051,14
- Abril de 2005: € 1.041,40
- Maio de 2005: € 1.046,27
- Junho de 2005: € 1.046,27
- Agosto de 2005: € 1.051,14
- Setembro de 2005: € 1.051,14 + € 944,00 (subsídio de férias).
15. À data do pagamento do último vencimento auferido pelo Autor na sociedade, referente a Setembro de 2005, o mesmo correspondia ao valor bruto de €1.250, sendo acrescido de €4,87 por cada dia de trabalho, a título de subsídio de refeição.
16. Por escritura pública outorgada a 7 de Agosto de 2006, no Cartório da Dr.ª GG, sito na Avenida ..., ..., Vila do Conde, a Ré, na qualidade de sócia gerente e em representação da sociedade A..., Ld.ª, declarou vender a CC, que declarou aceitar, pelo preço de €70.000, a fracção autónoma identificada em 7).
17. Na escritura identificada em 16) a Notária fez constar que a Ré estava “no uso dos poderes que lhe foram conferidos na reunião a Assembleia Geral Extraordinária de 28 de Julho de 2006, da qual foi lavrada a acta nº 10 e da mesma extraída pública-forma, que arquivo”.
18. Da acta referida em 17) consta a reunião do Autor e da Ré, representando a totalidade do capital social, como ponto único da ordem de trabalhos “conceder à sócia BB todos os poderes para vender o prédio descrito na Conservatória de Registo Predial sob o nº ...26 fracção “B” da Póvoa de Varzim e inscrito na matriz urbana sob o nº ...09” e sua aprovação por unanimidade.
19. A assinatura atribuída ao Autor que consta da acta referida em 18) não foi aposta pelo seu punho.
20. O estabelecimento instalado na fracção identificada em 7) funcionou até ao final do terceiro trimestre de 2005.
21. Após a data referida em 16) o estabelecimento foi ocupado pelo adquirente.
22. O Autor cessou as funções de gerente por renúncia de 30 de Setembro de 2006.
23. A Ré cessou as funções de gerente por renúncia de 24 de Março de 2007.
24. Por decisão proferida pela Conservadora de Registo Comercial de Vila do Conde em 19 de Outubro de 2011, transitada em julgado a 8 de Novembro de 2011, foi declarada a dissolução e o encerramento da liquidação da sociedade A..., Ld.ª.

V. Matéria de Direito:
O presente recurso é algo insólito pela simples razão de que não contém, no corpo ou nas conclusões das alegações, a referência, abordagem ou colocação de qualquer questão sobre matéria de direito!
O objecto do recurso é composto exclusivamente pela modificação da decisão sobre a matéria de facto, aspecto que é abordado do primeiro ao último § do corpo das alegações e da primeira à última das conclusões das alegações.
A sentença judicial assenta sempre no silogismo judiciário: o juiz parte da fundamentação de facto para de seguida interpretar e aplicar o direito à realidade apurada, apurando e enunciando a solução jurídica que o direito oferece à pretensão da parte e decidindo essa pretensão.
Tal como a sentença, também o recurso tem de respeitar esse silogismo precisamente por se tratar do meio de impugnação da sentença através da defesa de que deve ser outra a decisão. Por isso, o recorrente só não carece de abordar o modo como foi feita e deve ser feita a qualificação jurídica dos factos nos casos em que concorda inteiramente com a qualificação feita na sentença e apenas pretende impugnar a decisão sobre a matéria de facto para obter a modificação do pressuposto factual a que aquela aplicação foi feita e, por mera correcção desse dado, justificar a modificação da sentença recorrida.
Desde que o recorrente defenda no recurso que a matéria de facto deve ser modificada e que por via dessa alteração a decisão de julgar a acção improcedente deve ser revogada e a acção ser julgada procedente, ou vice-versa, tem obrigatoriamente de incluir no objecto do recurso questões relativas à matéria de direito, pela óbvia razão de que se o silogismo judiciário seguido na sentença conduziu à improcedência da acção, para se fundamentar a decisão da procedência desta terá de se efectuar um diferente enquadramento jurídico.
É certo que, tal como o tribunal a quo, o tribunal de recurso é livre na qualificação jurídica dos factos. Todavia, tal como naquele, essa liberdade não significa a possibilidade de se exceder o objecto do processo tal como ele foi delimitado pela parte, também neste essa liberdade não consente a superação dos limites de cognição do tribunal resultantes do objecto do recurso fixado pelas conclusões das alegações de recurso. Também é certo que o objecto do recurso é a decisão, não são os respectivos fundamentos; todavia, no nosso sistema de recursos cíveis, que têm, em regra, a natureza de recursos de reponderação, para se impugnar a decisão é indispensável indicar as questões – de facto e/ou de direito – que foram mal decididas e como devem elas ser decididas.
Portanto, se perante uma decisão que julgou a acção improcedente, o recorrente quer ver modificada a matéria de facto e que o tribunal de recurso julgue a acção procedente, tem obrigatoriamente de incluir no objecto do recurso as questões de direito que por aplicação a essa matéria de facto permitirão concluir juridicamente desse modo. Se assim não fosse, bastaria então ao recorrente defender que a decisão recorrida devia ser revogada, alterada ou modificada para obrigar o tribunal de recurso a analisar oficiosamente não apenas a fundamentação jurídica da sentença como qualquer outra fundamentação de direito que pudesse suportar a pretensão do recorrente, o que consabidamente não é o caso do nosso sistema de recursos cíveis.
Tanto bastaria para julgar improcedente o recurso por não vir incluída no objecto do recurso qualquer questão em matéria de direito atinente à fundamentação jurídica da sentença recorrida em resultado do qual o tribunal de recurso possa decidir diferentemente do tribunal recorrido.
De todo o modo, uma vez que se acima se escreveu que a matéria de facto é irrelevante para a decisão sobre o mérito da acção, cujo desfecho ainda que se provassem todos os factos alegados pelo autor, é inelutável, passamos a analisar o enquadramento jurídico dos factos alegados.
Como está configurada a acção?
O autor alega que era sócio de uma sociedade comercial e que a ré e gerente desta vendeu um imóvel da sociedade, sem informar o autor que o ia fazer e sem entregar ao autor qualquer parte do produto da venda, provocando o encerramento do estabelecimento da sociedade onde o autor trabalhava e desse modo privando-o dos rendimentos desse trabalho.
Com base nesses factos o autor pede que a ré seja condenada a entregar-lhe metade do produto da venda do imóvel (partindo da circunstância de a sua participação no capital social da sociedade ser de 50%) e o montante dos rendimentos do trabalho perdidos pelo autor … pasme-se até à data da instauração da acção (cujo montante passou de €10.000 na petição inicial para €252.000 na ampliação do pedido, correspondendo a 14 anos de rendimentos perdidos!!).
Qual a norma legal ou principio jurídico que o autor invoca para servir de fundamento ao seu pedido?
O autor cita e apoia-se nos artigos 21.º, 22.º, 214.º, 72.º e 79.º do Código das Sociedades Comerciais.
Como a acção tem a natureza de acção de indemnização, no sentido de que a pretensão deduzida corresponde a um direito de indemnização por danos sofridos, o fundamento jurídico do pedido do autor só pode ser uma das normas legais constantes do Capítulo VII do Título I do Código das Sociedades Comerciais porque são estas o fundamento legal da «responsabilidade civil pela constituição, administração e fiscalização da sociedade».
Entre estas normas contam-se de facto os artigos 72.º e 79.º.
O primeiro, no entanto, absolutamente nada tem a ver com a situação dos autos, porque a sua estatuição tem por objecto a «responsabilidade dos membros da administração para com a sociedade», sendo que a acção não foi instaurada pela sociedade para exercer o direito de indemnização de que esta seja titular, foi instaurada por um sócio para o exercício do direito de indemnização que ele reivindica como direito próprio, cujo objecto é o ressarcimento dos danos sofridos pelo próprio enquanto sócio e não pela sociedade de que era sócio. Por conseguinte, esse fundamento jurídico está totalmente arredado da acção.
É o artigo 79.º do Código das Sociedades Comerciais que regula a responsabilidade dos membros da administração para com os sócios, pelo que só pode ser este o fundamento jurídico da pretensão do autor. A sua redacção é a seguinte:
1 - Os gerentes ou administradores respondem também, nos termos gerais, para com os sócios e terceiros pelos danos que directamente lhes causarem no exercício das suas funções.
2 - Aos direitos de indemnização previstos neste artigo é aplicável o disposto nos n.os 2 a 6 do artigo 72.º, no artigo 73.º e no n.º 1 do artigo 74.º.
Comentando este preceito, Coutinho de Abreu e Maria Elisabete Ramos, in Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Coord. Coutinho de Abreu, Almedina, Coimbra, Volume I, 2013, página 906 e seguintes, escrevem o seguinte: «Pelos danos directamente causados a sócios ou terceiros, os administradores respondem “nos termos gerais” (artigo 79º, 1). Esta remissão para os termos gerais tem sido entendida como visando os arts. 483º e s. do CCiv. Os administradores são responsáveis por conduta ilícita e culposa. A conduta será ilícita quando os administradores violam: a) direitos absolutos de sócios ou de terceiros, b) normas legais de protecção de uns ou de outros, e) certos deveres jurídicos específicos. (…) Outro pressuposto da responsabilidade dos administradores para com os sócios e terceiros é, “nos termos gerais”, a culpa (dolo ou negligência). Salvo quando haja presunção legal de culpa …, é aos sócios ou terceiros lesados que incumbe provar a culpa dos administradores. Assim deflui do facto de o artigo 79º, 2, não remeter para o artigo 72º, 1. (…) Os administradores não respondem para com os sócios e terceiros por quaisquer danos sofridos por estes; respondem somente “pelos danos que directamente lhes causarem” no exercício das suas funções. O dano há-de incidir, portanto, directamente no património de sócio ou de terceiro. Não releva o dano meramente reflexo, derivado de dano sofrido (directamente) pela sociedade. Se resulta prejuízo para a sociedade de um comportamento indevido de administrador (desrespeitador de deveres para com ela), podem os sócios e terceiros sofrer (indirectamente) prejuízos também: v.g, os sócios deixam de receber ou recebem menos lucros e vêem diminuir o valor das suas participações sociais, os credores sociais deparam-se com o enfraquecimento da garantia patrimonial dos seus créditos. Nestes casos, porém, têm cabimento as acções sociais de responsabilidade (arts. 75º, s.) e, eventualmente, as acções de credores sociais (art. 78º), não as acções individuais de sócios ou terceiros para indemnização dos mesmos (art. 79º); o administrador responderá tão-só para com a sociedade.»
Na senda desses autores, extrai-se da norma que a responsabilidade a que a mesma se refere tem lugar «nos termos gerais», ou seja, os seus pressupostos coincidem com os pressupostos gerais da responsabilidade civil: o facto ilícito, a culpa, o nexo de causalidade e o dano. Pode por isso dizer-se com Carneiro da Frada, in A responsabilidade dos administradores perante os credores entre o direito das sociedades e o direito da insolvência”, IV Congresso de direito da insolvência, Livraria Almedina, Coimbra, 2017, pág. 192 e seguintes, que o «recurso ao art. 79.º do Código das Sociedades Comerciais para justificar … a responsabilidade dos administradores … constituiria sempre um arrimo puramente formal, que não dispensa nem substitui o direito comum» na medida em que o artigo 79.º não contém um regime especial de responsabilidade, ele remete para o regime geral de responsabilidade e nesse sentido «não dá aos credores nem mais nem menos que aquilo que lhes dá o regime geral» (apud Nuno Pinto de Oliveira, in Responsabilidade civil dos administradores pela violação do dever de apresentação à insolvência, www.revistadedireito comercial.com, 05.04.2018).
Cremos que o que o artigo faz é tornar claro que o dever de indemnização (só) inclui os danos directamente causados pelos administradores aos sócios da sociedade e terceiros, eliminando, portanto, a dúvida sobre se esses danos estariam compreendidos nesse dever de indemnização quando a relação dos administradores é com a sociedade, não havendo nenhuma relação obrigacional entre os administradores e os sócios ou terceiros, o que podiam levar a qualificar os danos sofridos pelos sócios ou por terceiros como danos económicos puros, excepto quanto estivesse em causa directamente a violação de direitos de personalidade dos sócios ou de terceiros.
Cabem na previsão da norma as situações de responsabilidade pré-contratual, de responsabilidade extracontratual por violação de normas de protecção e de responsabilidade extracontratual por violação da norma geral do artigo 483.º do Código Civil.
O artigo 483.º do Código Civil define o âmbito da responsabilidade civil dividindo a ilicitude em duas modalidades básicas: a violação de um direito de outrem e a violação de qualquer disposição legal destinada à protecção de interesses alheios. No primeiro caso, a ilicitude resulta da ofensa a um determinado bem jurídico que a lei qualifica como um verdadeiro direito da pessoa. No outro, a ilicitude deriva de uma actuação desconforme com a regra de conduta que a lei impõe como forma de tutela de interesses de outrem.
A melhor doutrina considera, com apoio no elemento histórico e de coerência sistemática, que o direito de outrem que a norma tem em vista tem de pertencer à categoria dos direitos subjectivos. Como quer que se defina o conceito de direito subjectivo, há-de reconhecer-se que o mesmo não se confunde com os meros interesses jurídicos nem com os direitos relativos ou de crédito cuja violação importa responsabilidade contratual.
Esta delimitação legal dos direitos cuja violação gera responsabilidade civil conduz a que a violação de um direito de crédito de uma pessoa não gera responsabilidade civil por parte do incumpridor, o titular de um direito de crédito não pode exigir indemnização pelos danos gerados pela insatisfação do seu crédito de qualquer outra pessoa cuja actuação possa ter contribuído ou mesmo gerado esse incumprimento. Ele dispõe somente da possibilidade de responsabilizar o próprio devedor, em sede de responsabilidade contratual.
Por via dessa delimitação, nos casos de violações de direitos de crédito (em que a responsabilidade é contratual e perante a outra parte no contrato, o credor) ou nos casos de violação de outras posições jurídicas ou ainda nos casos de danos causados não ao titular do direito subjectivo violado, mas a terceiros, em regra está excluída a responsabilidade civil. Só não será assim se esses danos estiverem cobertos por uma previsão específica de responsabilidade (v.g. 495.º), se estiveram abrangidos pelo âmbito de tutela de uma disposição legal de protecção (ou seja, existir uma norma jurídica que proíba o comportamento gerador do dano com a intenção de conferir uma protecção ao menos também ao grupo qualificado de pessoas em que se compreende o lesado concreto).
No caso está absolutamente excluído o recurso à previsão da primeira parte do artigo 483.º do Código Civil para fundar a ilicitude do comportamento atribuído à ré na medida em que como vimos não está em causa a violação de qualquer direito subjectivo absoluto do autor.
Qual é então a disposição legal de protecção que o autor invoca ou se ajusta à configuração que ele deu à acção para fundar o juízo de ilicitude do comportamento da ré passível de possibilitar o preenchimento desse pressuposto de responsabilidade?
Refira-se e sublinhe-se de modo enfático que o autor assinala expressamente na sua contestação que não «discute a validade do acto praticado, mas sim a falta de comunicação do mesmo pela ré ao autor». Dito de outro modo, o autor não arguiu nem pretende arguir ou fazer-se valer de qualquer vício do acto de venda do imóvel da sociedade, praticado pela ré na qualidade de gerente da sociedade, razão pela qual para efeitos da acção esse acto foi válida e eficazmente praticado.
Então de que se queixa afinal o autor?
Queixa-se de não ter sido contemplado como nenhuma parte do produto da venda e de não ter sido informado da venda realizada. A primeira situação considera o autor que é uma violação do seu direito social a quinhoar nos lucros da sociedade, a segunda uma violação do seu direito à informação.
Em resultado da primeira pretende receber a parte daquele produto equivalente à medida da sua participação no capital social; em resultado da segunda, presume-se, o equivalente aos salários que deixou de auferir com o encerramento do estabelecimento da sociedade que funcionava no imóvel vendido.
Nenhuma destas pretensões tem, a nosso ver, fundamento legal.
Em primeiro lugar o direito a participar nos lucros da sociedade tem por objecto não os proveitos de cada acto ou negócio praticado pela sociedade, as apenas os lucros distribuíveis apurados em cada exercício e que foram objecto de uma deliberação de distribuição, respeitados os limites legais com que se defronta a possibilidade da sua distribuição.
Jorge Coutinho de Abreu, in Curso de Direito Comercial, Das Sociedades, Vol. II, 5ª edição, págs. 413, explica que o termo lucro possui uma noção genérica, o incremento patrimonial da sociedade, e várias noções específicas, entre as quais se conta o lucro de balanço ( o acréscimo patrimonial, revelado em balanço, equivalente à diferença entre, por um lado, o valor do património social líquido e, por outro lado, o valor conjunto do capital social e das reservas indisponíveis) que marca o limite máximo dos bens que, durante a vida da sociedade, podem ser distribuídos aos sócios, o lucro de exercício (excedente do valor do património social líquido no final do exercício ou período, normalmente anual, sobre o valor do património social líquido no início do mesmo período) o qual releva designadamente para a determinação da parte do lucro que em regra deve ser distribuída pelos sócios depois de findo o exercício, e o lucro final ou de liquidação (que é apurado na fase terminal da sociedade, nas contas finais, correspondendo ao excedente do património social líquido sobre o capital social).
Explica ainda este autor que quando o artigo 21.º estabelece «que todo o sócio tem direito a quinhoar nos lucros» está a querer dizer que «cada sócio tem o poder de exigir parte dos lucros (em regra na proporção do valor da respectiva participação no capital social: art. 22º, 1) quando os mesmos sejam (ou tenham de ser) distribuídos. Não quer dizer que, quando haja lucros distribuíveis, cada sócio pode exigir da sociedade, a todo o tempo, o seu quinhão ou quota-parte na totalidade desses lucros. Só pode exigi-lo se e quando os lucros forem (ou devam ser) distribuídos (normalmente por força de deliberação dos sócios), e tendo em conta a medida da distribuição. É por isso comum na doutrina contrapor o direito abstracto aos lucros (o direito de quinhoar nos lucros de que falamos, enquanto direito integrante da participação social) ao direito concreto aos lucros (o direito credito a quota-parte dos lucros distribuídos).»
O mesmo autor assinala a página 419 que «em regra, os sócios não têm um direito propriamente dito ao lucro de balanço ou total (balizado no art. 32º), não têm o poder de exigir que ele, no todo ou em parte, lhes seja atribuído consequentemente à aprovação do balanço. Têm é o direito de exigir que anualmente a administração lhes apresente um relatório de gestão (art. 65º, 1, 5) contendo também uma proposta de aplicação de resultados (art. 66º, 5, f)) e de deliberar sobre tal aplicação (arts. 189º, 3, 246º, 1, e), 376º, 1, b)).». Anteriormente, a página 418, o autor já assinalara que «nem todo o lucro de exercício pode ser distribuído. O lucro de exercido distribuível tem de, antes do mais, conter-se ou estar compreendido no lucro de balanço (é possível uma sociedade obter lucro de exercício e registar resultado de balanço negativo) - art. 33º, 1.»
Por fim, escreve este autor, a página 420, que uma vez «adoptada uma deliberação (válida) de distribuição de lucro, ficam os sócios com direito de crédito relativamente aos quinhões respectivos – direito de crédito dos sócios enquanto terceiros, inatacável por acto societário. Nas sociedades por quotas … o crédito do sócio à quota-parte lucro de balanço não se vence imediatamente. Aplicar-se-á o disposto nos arts. 217º, 2, e 294º, 2, para os lucros de exercício: o crédito vence-se decorridos trinta dias sobre a deliberação de atribuição de lucros; mas podem os sócios deliberar, com fundamento em situação excepcional da sociedade (v.g., liquidez insuficiente), estender esse prazo até mais sessenta dias …. Vencido o crédito ao lucro, deve a sociedade, pelos administradores, satisfazê-lo. Contudo, não devem os administradores executar a deliberação (originariamente válida) de distribuição de lucro se tiverem fundadas razões para crer que, por mor de alterações entretanto ocorridas no património social, daquela execução resultaria um património social líquido inferior ao capital social e reservas indisponíveis (art. 31º, 2, a))»
No Código das Sociedades Comerciais em Comentário, Coord. Coutinho de Abreu, Almedina, Coimbra, Volume I, 2013, comentário ao artigo 21.º, página 352 e seguintes, Margarida Costa Andrade escreveu que da «actividade comercial resultarão benefícios que no património desta se vão acumulando … cujo destino principal … está logo desde o início definido: a distribuição pelos sócios. Uma vez que os sócios, porém, não pretenderão esperar até ao momento da liquidação para obter o retomo do seu investimento, a lei permite que se proceda a distribuições periódicas desse lucro…. Faz-se, então, uma avaliação daquilo que a sociedade tinha ao início e no fim do exercício, o saldo positivo sendo partilhado. Mas, enquanto houver prejuízos a cobrir e reservas a constituir ou engrossar, não poderão os sócios receber quaisquer quantias ou bens a título de lucros­ cfr. arts. 32º e33º.» A propósito do direito do sócio a receber os dividendos a mesma autora acrescenta que ele apenas se constituirá «na esfera jurídica do sócio após a deliberação de aprovação do balanço e de distribuição dos lucros, que concretiza aquele abstracto direito aos lucros, transformando o accionista num credor da sociedade».
Na mesma obra, em anotação ao artigo 31.º, página 480 e seguintes, Paulo de Tarso Domingues ensina que «no ordenamento jurídico português, o art. 31º expressamente estabelece que a competência para deliberar sobre a atribuição de bens, seja a que título for, aos sócios cabe, em princípio, exclusivamente aos próprios sócios. … Afora os casos expressamente previstos na lei, o órgão de administração não pode decidir a atribuição de bens aos sócios qua tale. Se o órgão de administração deliberar uma atribuição de bens aos sócios – violando o regime legal imperativo da competência dos órgãos societários sobre esta matéria –, tal deliberação será nula (art. 56º, 1, d)) e os sócios terão, em princípio, que devolver os valores que receberam. Acresce que os gerentes ou administradores que atribuam bens aos sócios, sem uma prévia deliberação social, ficam sujeitos a sanções penais, podendo ainda ser responsabilizados pela sociedade ou por terceiros – nos termos dos arts. 72º e 78º, respectivamente – pelos prejuízos decorrentes dessa distribuição ilícita de bens».
Por fim, em anotação ao artigo 32.º, página 487 e seguintes, Paulo de Tarso Domingues depois de assinalar que só é distribuível o lucro de balanço, verificados determinados limites legais relacionados com o capital social e as reservas indisponíveis, ensina que «muito embora o direito subjectivo ao lucros seja um dos essentialia elementa do conceito de sociedade, isso não significa que os sócios, individualmente considerados, tenham direito a exigir a distribuição do lucro de balanço (ou lucro total). Cabe à colectividade dos sócios livremente decidir, por maioria absoluta se, quando e como se procederá à sua repartição. … a titularidade deste direito (que se pode designar como direito abstracto) ao lucro, não permite ao sócio exigir da sociedade a distribuição da riqueza por ela criada; não lhe permite reclamar da sociedade uma qualquer concreta repartição do lucro. … o sócio não é titular de um direito concreto sobre o lucro. Com efeito, a distribuição do lucro dependerá sempre de uma deliberação social que a aprove . … só com a deliberação social de distribuição é que o “lucro se torna dividendo”, é que o direito do sócio ao lucro se determina e materializa, podendo então designar-se por direito ao dividendo, tomando-se então o sócio titular de um direito de crédito … sobre a própria sociedade. Trata-se, pois, de um direito que apenas nasce com aquela deliberação e, portanto, só existe a partir dela.»
Tendo presentes estes ensinamentos sobre o regime jurídico das normas que tutelam o direito do sócio de quinhoar nos lucros e levando em conta única a factualidade alegada pelo autor para fundamentar o seu pedido – a gerente vendeu, validamente, um imóvel e não lhe entregou qualquer parte do produto da venda – é manifesto que jamais o autor se pode arrogar titular de um direito de crédito que aquela actuação da gerente tenha afectado ou prejudicado.
Aliás, independentemente do mais a sociedade até pode ter vendido o imóvel e obtido uma receita significativa e não ter tido lucro com essa operação, designadamente face ao custo de aquisição e transformação do imóvel para o adaptar à sua actividade. Além disso, tenha ou não tido lucro neste negócio concreto, a sociedade pode no fim do exercício não ter tido quaisquer lucros para distribuir ou mesmo acabar o exercício com prejuízos. A associação que o autor faz é por isso, além de jurídica, também factualmente, totalmente descabida.
Por outro lado, o produto do negócio de venda do imóvel é uma receita da sociedade, integra o património social, pelo que a resultar algum prejuízo desse negócio, trata-se de um dano directo da sociedade e apenas de um dano indirecto do sócio, sendo certo que, como se referiu, o artigo 79.º do Código das Sociedades Comerciais apenas prevê a responsabilidade por danos directos causados ao sócio ou a terceiro.
Dos fundamentos jurídicos da acção sobra então a violação das normas relativas ao direito do sócio à informação, enquanto modalidade de responsabilidade civil ao abrigo da segunda parte do n.º 1 do artigo 483.º do Código Civil.
O artigo 21.º do Código das Sociedades Comerciais inclui entre os direitos dos sócios, o direito a «obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato». Este direito à informação tem assim um âmbito definido pelas cláusulas do contrato social e pelas disposições do Código das Sociedades Comerciais que se lhe referem.
Coutinho de Abreu, loc. cit, página 234, diz que o direito à informação compreende direito à informação em sentido estrito, o poder de o sócio fazer perguntas à sociedade (ao órgão de administração, normalmente) sobre a vida social e de exigir que ela responda verdadeira, completa e elucidativamente; o direito de consulta, o poder de o sócio exigir à sociedade (ao órgão de administração) a exibição dos livros de escrituração e de outros documentos sociais para serem examinados, e o direito de inspecção, o poder de o sócio exigir à sociedade ( ao órgão de administração) o necessário para que vistorie os bens sociais.
Efectivamente o n.º 1 do artigo 181.º, para as sociedades em nome colectivo, e o n.º 1 do artigo 214.º, do Código das Sociedades Comerciais, para as sociedades por quotas, estabelecem que «os gerentes devem prestar a qualquer sócio que o requeira informação verdadeira, completa e elucidativa sobre a gestão da sociedade, e bem assim facultar-lhe na sede social a consulta da respectiva escrituração, livros e documentos». A informação será dada por escrito, se assim for solicitado». Estas disposições acrescentam que «podem ser pedidas informações sobre actos já praticados ou sobre actos cuja prática seja esperada, quando estes sejam susceptíveis de fazerem incorrer o seu autor em responsabilidade, nos termos da lei».
A ser verdade que o autor pediu à gerente da sociedade informação relativa à venda do imóvel, informação que tinha direito a obter dada a sua qualidade de sócio e o relevo económico do negócio jurídico em causa, e que a ré não lhe prestou essa informação, incumprindo o dever de prestar aos sócios informação clara, verdadeira e completa, a ré incorreu em responsabilidade civil perante o autor ao abrigo do disposto nos artigos 79.º do Código das Sociedades Comerciais e 483.º, n.º 1, segunda parte do Código Civil.
Por conseguinte reunidos que sejam os demais pressupostos da responsabilidade civil, a ré pode estar obrigada a reparar os danos causados ao autor. Entre esses pressupostos, como atrás se fez referência, conta-se o nexo de causalidade adequada entre o dano e a violação concretamente imputada à ré: a não prestação da devida informação. Acresce que, como também já se assinalou, o artigo 79.º do Código das Sociedades Comerciais apenas é fundamento jurídico para o sócio reclamar da gerente da sociedade a indemnização dos danos que directamente lhe foram causados.
Dito isto é fácil de verificar que não existe absolutamente nenhum nexo de causalidade entre a falta de informação sobre o negócio e a perda de rendimentos que o autor diz ter sofrido.
Mesmo que o autor pudesse ter fundamento jurídico para reclamar o pagamento dos rendimentos, não da entidade que lhos vinha pagando e que respondia perante o credor por virtude do vínculo jurídico existente entre ambos e fonte dessa obrigação / direito de crédito, o que não se vislumbra sequer na petição inicial, mas sim da ré que era sócia gerente da sociedade comercial, não era empregadora do autor, nem com ele tinha celebrado qualquer contrato de prestação de serviços, sempre resultaria que a falta de informação é totalmente indiferente para o processo causal da produção desses danos.
A causa da perda desse rendimento é a dissolução da sociedade, não é a falta de informação sobre a venda do imóvel, ainda que essa venda possa ter constituído um pressuposto natural daquela dissolução. A falta de informação apenas pode ter sido causa adequada de danos como o custo das diligências que o autor teve de realizar para obter por outra via a informação (por exemplo, com a realização de um inquérito judicial), despesas que o autor suportou por ter sido induzido em erro pela falta de informação ou que não teria tido se a informação lhe tivesse sido prestada.
Nessa medida, o pedido de indemnização formulado na acção carece de fundamento jurídico, pelo que a acção e agora o recurso não podem deixar de ser julgados improcedentes.

VI.Dispositivo:
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação julgar o recurso improcedente e, em consequência, confirmam a sentença recorrida.

Custas do recurso pelo recorrente, cabendo ao IGFEJ a obrigação de reembolso da taxa de justiça suportada pela recorrida uma vez que aquele beneficia de apoio judiciário (artigo 26.º, n.º 6, do RCP).
*
Porto, 1 de Junho de 2023.
*
Os Juízes Desembargadores
Aristides Rodrigues de Almeida (R.to 750)
Isabel Silva
António Paulo Vasconcelos


[a presente peça processual foi produzida pelo Relator com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas qualificadas]