Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
Processo:
679/11.8TYLSB-B.L1-1
Relator: PEDRO BRIGHTON
Descritores: CONTRATO PROMESSA DE COMPRA E VENDA
TRADIÇÃO DA COISA
DIREITO DE RETENÇÃO
QUALIDADE DE CONSUMIDOR DO PROMITENTE COMPRADOR
Nº do Documento: RL
Data do Acordão: 08/25/2023
Votação: DECISÃO INDIVIDUAL
Texto Integral: S
Texto Parcial: N
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE
Sumário: I- São pressupostos do reconhecimento do direito de retenção previsto no artº 755º nº 1, al. f) do Código Civil :
-A existência de promessa de transmissão ou de constituição de um direito real.
-A entrega ou tradição da coisa objecto do contrato-promessa.
-A titularidade, por parte do beneficiário, de um crédito sobre a outra parte, decorrente do incumprimento definitivo do contrato-promessa.
II- A tradição exigida para que se constitua o direito de retenção nos termos do artº 755º nº 1, al. f) do Código Civil exige apenas a detenção material lícita da coisa, não se confundindo com a posse e podendo existir sem esta.
III- Nos termos do Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 4/2014, de 20/3/2014, no âmbito da graduação de créditos em insolvência, o promitente comprador apenas goza do direito de retenção caso detenha, simultaneamente, a qualidade de consumidor.
IV- Tomando como referencial para tal efeito a noção de consumidor prevista no artº 2º nº 1 da Lei nº 24/96, de 31/7, relevante é que o promitente comprador destine o imóvel a uso particular, no sentido de não o comprar para revenda, nem o afectar a uma actividade profissional ou lucrativa.
Decisão Texto Parcial:
Decisão Texto Integral: Decisão

I – Relatório
1-  Por Sentença já transitada em julgado, proferida nos autos principais, foi decretada a insolvência de “J…, S.A.”
2-  Nos presentes autos foi proferida, em 15/1/2021, a Sentença prevista no artº 136º nº 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (C.I.R.E.) e Saneador-Sentença em 14/3/2021, transitados em julgado, nos quais foram verificados os seguintes créditos :
1. “… – Instalações de Aluguer de Ar Condicionado, no montante de 5.000 €.
2. “Banco A…”, no montante de 66.969,75 €.
3. “Banco B…”, no montante de 238.951,31 €.
4. “Banco C…”, no montante de 4.940.157,13 €.
5. “L… S.A.R.L (em substituição do “Banco D…”), no montante de 238.208,98 €.
6. “B… & F…. Construções, Ldª”, no montante de 34.915,85 €.
7. “Banco E…”, no montante de 577.470,13 €.
8. “P… J…, S.A.” (em substituição do “Banco F…”), no montante de 275.281,58 €.
9. “C…– Materiais de Construção, Ldª”, no montante de 1.427,39 €.
10. “P… S.A.R.L.” (em substituição da “C… G…, Ldª”), no montante de 1.310.330,68 €.
11. “D… – Indústria de Portas, S.A.”, no montante de 4.297,27 €.
12. Instituto da Segurança Social, I.P., no montante de 17.610,22 €.
13. IAA Gonçalves, no montante de 75.775 €.
14. “L…”, no montante de 783.69 €.
15. MAN Dias e SR Pinto, no montante de 12.000 €.
16. “Móveis e Materiais de Decoração e Construção Civil Q…, Ldª, no montante de 8.662,81 €.
17. “R… – Remodelação de Interiores, Ldª, no montante de 13.004,73 €.
18. “X… – Ascensores e …, S.A.”, no montante de 18.352,35 €.
19. “S… – Produtos Siderúrgicos, S.A.”, no montante de 22.9222,34 €.
20. “T… – Serviço de Águas e Saneamento, Ldª”, no montante de 4.246,188 €.
21. TICR Cruz, no montante de 71.844,93 €.
22. “TMN – Telecomunicações Móveis Nacionais, S.A.”, no montante de 2.193,57 €.
23. EO ..., no montante de 400.000 €.
24. Fazenda Nacional, no montante de 28.796,79 €, sendo 23.600,02 € crédito garantido (IMI), 393,15 € crédito privilegiado (IRS e IRC) e 4.803,62 € crédito comum.
25. CMD Ribeiro, no montante de 3.500 €, crédito privilegiado (crédito laboral – privilégio mobiliário geral).
26. DSL Tavares, no montante de 3.500 €, crédito privilegiado (crédito laboral – privilégio mobiliário geral).
27. FMF Trindade, no montante de 11.253 €, crédito privilegiado (crédito laboral – privilégio mobiliário geral).
28. MJMM Queirós, no montante de 5.520 €, crédito privilegiado (crédito laboral – privilégio mobiliário geral).
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3-  Na acção de verificação ulterior de créditos processada como apenso D foi verificado o crédito reclamado pelo Ministério Público, em representação da Fazenda Nacional, no valor de 12.182,85 €, sendo 9.924,04 € crédito garantido (IMI), 102,97 € crédito privilegiado (IRC) e 2.155,84 € crédito comum.
4-  No apenso O, por Sentença transitada em julgada, a “P… S.A.R.L.” foi habilitada em substituição do credor “C… G…, Ldª”.
5-  No apenso P, por Sentença transitada em julgada, a “L… S.A.R.L.” foi habilitada em substituição do credor “Banco D…”.
6-  No apenso Q, por Sentença transitada em julgada, a “S… – Construção Civil e Obras Públicas, S.A.” foi habilitada em substituição do credor “GO…, S.A.”.
7-  No apenso R, por Sentença transitada em julgada, a “P… J…, S.A.” foi habilitada em substituição do credor “Banco F…”.
8-  Foi determinado o prosseguimento dos autos para apreciação das impugnações aos créditos de EB Sanches, “S… – Construção Civil e Obras Públicas, S.A.”, JS ... e EO ....
9-  Foi proferido despacho saneador onde foram indicados os temas de prova.
10-  Seguiram os autos para julgamento, ao qual se procedeu com observância do legal formalismo.
11-  Foi proferida Sentença onde se decidiu :
“Nos termos e pelos fundamentos expostos:
A) Julgo procedente a impugnação apresentada por EO ... e, em consequência qualifico como garantido por direito de retenção sobre a verba n.º 2 o crédito no montante de 400.000,00 € reconhecido a este credor.
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B) Julgo parcialmente procedente a impugnação apresentada pela P… S.A.R.L. ao crédito de EB Sanches e em consequência julgo verificado a EB Sanches um crédito no montante de 25.000,00 €, crédito comum.
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C) Julgo totalmente improcedente a reclamação apresentada por S… – Construção Civil e Obras Públicas, S.A. e, em consequência julgo não verificado o crédito reclamado por esta no montante de 868.148,40 €.
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D) Julgo totalmente procedente a impugnação apresentada pela P… S.A.R.L. aos créditos de S… – Construção Civil e Obras Públicas, S.A. e de JS ... e, em consequência julgo não verificado os créditos
a) no montante de 434.074,20 € reconhecido pelo Administrador da Insolvência a S… – Construção Civil e Obras Públicas, S.A.;
b) no montante de 100.000,00 € reconhecido pelo Administrador da insolvência a JS ....
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E) Graduo os créditos verificados na sentença de 15.01.2021, no saneador-sentença de 14.03.2021, na presente sentença e no apenso D nos seguintes termos:
I – para serem pagos pelo produto da venda da verba n.º 2:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito garantido da Fazenda Nacional referente a IMI, no montante de 1.127,15 €, relativo à verba n.º 2;
2. Em segundo lugar:
- Crédito garantido de EO ..., no montante de 400.000,00 €;
3. Em terceiro lugar:
- Crédito garantido da L S.A.R.L (em substituição do Banco D…), no montante de 238.208,98 €;
4. Em quarto lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 393,15 €;
5. Em quinto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
6. Em sexto lugar, os créditos subordinados.
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II – para serem pagos pelo produto da venda da verba n.º 4:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito garantido da Fazenda Nacional referente a IMI, no montante de 999,32 €, relativo à verba n.º 4;
2. Em segundo lugar:
- Crédito garantido do Banco E, no montante de 97.727,50 €;
3. Em terceiro lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 496,12 €;
4. Em quarto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
5. Em quinto lugar, os créditos subordinados.
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III – para serem pagos pelo produto da venda da verba n.º 28:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito garantido da Fazenda Nacional referente a IMI, no montante de 1.314,90 €, relativo à verba n.º 28;
2. Em segundo lugar:
- Crédito garantido de IAA Gonçalves, no montante de 30.000,00 €;
3. Em terceiro lugar:
- Crédito garantido da P… J…, S.A., no montante de 266.027,46 €;
4. Em quarto lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 496,12 €;
5. Em quinto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
6. Em sexto lugar, os créditos subordinados.
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IV – para serem pagos pelo produto da venda das verbas n.ºs 29 e 30:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito garantido da Fazenda Nacional referente a IMI, relativo às verbas n.ºs 29 e 30;
2. Em segundo lugar:
- Crédito garantido da P… J…, S.A., no montante de 266.027,46 €;
3. Em terceiro lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 496,12 €;
4. Em quarto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
5. Em quinto lugar, os créditos subordinados.
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V – para serem pagos pelo produto da venda das verbas n.ºs 5 a 27, 33 a 61 e 70:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito garantido da Fazenda Nacional referente a IMI, relativo às verbas n.ºs 5 a 27, 33 a 61 e 70;
2. Em segundo lugar:
- Crédito garantido de P… S.A.R.L (em substituição da C… G…, Lda.), no montante de 1.310.330,68 €;
3. Em terceiro lugar:
- Crédito garantido do Banco C…, no montante de 1.099.057,96 €;
4. Em quarto lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 496,12 €;
5. Em quinto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
6. Em sexto lugar, os créditos subordinados.
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VI – para serem pagos pelo produto da venda das verbas n.ºs 31, 32 e 62 a 69:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito garantido da Fazenda Nacional referente a IMI, relativo às verbas n.º 31, 32 e 62 a 69;
2. Em segundo lugar:
- Crédito garantido de P… S.A.R.L (em substituição da C… G…, Lda.), no montante de 1.310.330,68 €;
3. Em terceiro lugar:
- Crédito garantido do Banco C…, no montante de 387.500,00 €;
4. Em quarto lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 496,12 €;
5. Em quinto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
6. Em sexto lugar, os créditos subordinados.
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VII – para serem pagos pelo produto da venda da verba n.º 71:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 496,12 €;
2. Em segundo lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
3. Em terceiro lugar, os créditos subordinados.
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VIII – para serem pagos pelo produto da venda dos restantes bens ou direitos:
1. Em primeiro lugar:
- Crédito privilegiado de CMD Ribeiro, no montante de 3.500,00 €;
- Crédito privilegiado de DSL Tavares, no montante de 3.500,00 €;
- Crédito privilegiado de FMF Trindade, no montante de 11.253,00 €;
- Crédito privilegiado de MJMM Queirós, no montante de 5.520,00 €;
2. Em segundo lugar:
- Crédito privilegiado da Fazenda Nacional referente a IRC e IRS, no montante de 496,12 €;
3. Em terceiro lugar:
- Crédito privilegiado da Requerente B… & F… Construções, Lda., no montante de 8.728,96 €;
4. Em quarto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quantos aos bens sobre os quais não incida o privilégio);
5. Em quinto lugar, os créditos subordinados.
*
Nos termos do disposto nos artigos 303.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, a actividade processual relativa à verificação e graduação de créditos, quando as custas devam ficar a cargo da massa, não é objecto de tributação autónoma.
*
Registe e Notifique”.
12-  Inconformada com tal decisão, dela recorreu a credora “L…, SARL”, para tanto apresentando as suas alegações com as seguintes conclusões :
“A. Conforme disposto, na reclamação de créditos apresentada nos presentes autos, a ora Recorrente é credora da insolvente.
B. A ora Recorrente detém um crédito garantido por hipoteca sobre o imóvel:
prédio urbano, sito em …, casa 81, na freguesia de …, concelho de …, inscrito na respetiva matriz sob o artigo número 1175, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o número 2838.
C. O crédito reclamado (238.208,98 €) pela Recorrente foi devidamente reconhecido como garantido pela ilustre Administradora de Insolvência.
D. Ora, a hipoteca é uma garantia real das obrigações que se traduz no direito concedido a certos credores de serem pagos pelo valor de certos bens imobiliários do devedor, com preferência a outros credores estando os seus créditos devidamente registados.
E. “In casu” a hipoteca, a favor da ora Recorrente, encontrava-se devidamente registada para os devidos efeitos legais.
F. Sucede que, na pendência da presente insolvência, veio o credor, EO ..., reclamar um crédito igualmente garantido, por direito de retenção, sobre o mesmo imóvel (verba nº. 2 do auto de apreensão de bens).
G. Alegadamente, entre a insolvente e o credor EO ... foi celebrado um acordo, designado por “contrato promessa de compra e venda”, datado de 1/09/2006, mediante o qual a insolvente prometeu vender e EO ... prometeu comprar o prédio urbano, sito na …, Casa 81, descrita na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 2838 da freguesia da … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1175 da mesma freguesia (verba n.º 2), pelo preço de 200.000,00 € tendo o valor sido alegadamente pago.
H. Mais, alegadamente a partir de 01/09/2006 o credor EO ... terá passado a utilizar o imóvel supra discriminado.
I. O crédito reclamado pelo credor EO ... foi devidamente reconhecido pela Administradora de insolvência tendo a mesma, e bem, graduado o crédito como comum.
J. Após impugnação por parte do credor EO ..., o Tribunal a quo julgou procedente a impugnação apresentada e, em consequência qualificou como garantido, por direito de retenção sobre a verba n.º 2 o crédito no montante de 400.000,00 €.
K. O direito de retenção encontra-se previsto nos artigos 754.º e seguintes do Código de Processo Civil. Conforme referem Pedro Romano Martinez e Pedro Fuzeta da Ponte, o direito de retenção “confere ao devedor, que se encontra adstrito a entregar certa coisa e disponha de um crédito sobre o seu credor, de não efetuar a prestação, mantendo a coisa que deveria entregar em seu poder” (in Garantias de Cumprimento, 5.º Edição, Almedina, pág. 226).
L. Consequentemente o crédito do EO ... foi graduado em primazia sobre o crédito (garantido por hipoteca) da ora Recorrente.
M. Ora, não pode a Recorrente conformar-se com tal decisão.
N. A ora Recorrente discorda, em absoluto, com a qualificação do crédito do credor EO ... como garantido por direito de retenção.
O. A ora recorrente não considera estarem reunidos os pressupostos, legalmente exigíveis, para o reconhecimento do direito de retenção, senão vejamos;
P. Constituem pressupostos do reconhecimento do direito de retenção, previsto no art. 755.º, n.º 1, al. f), do CC: a) a existência do crédito; b) o incumprimento definitivo e c) a entrega/tradição do objecto do negócio.
Q. A ora Recorrente nada tem a obstar quanto à existência do crédito, já no que se refere aos restantes pressupostos não poderá, a Recorrente, anuir.
R. Quanto ao preenchimento do pressuposto do incumprimento, considera a Recorrente que:
S. O acordo foi alegadamente celebrado entre o credor EO ... e a insolvente remonta a 1/09/2006.
T. Conforme mencionado, pelo credor EO ..., este terá interpelado a insolvente, para cumprimento do acordo, em 25/11/2011, ora volvidos quase 6 anos da data prevista para cumprimento do acordo.
U. Salvo merecido respeito, é questionável o real interesse das partes (promitente comprado e promitente vendedor) no cumprimento do acordo.
V. É pouco razoável admitir que, tendo pago a totalidade do valor atribuído ao imóvel, o promitente comprador tenha aguardado quase 6 anos para interpelar o promitente vendedor para o cumprimento do acordo.
W. Salvo merecido respeito, houve um claro desinteresse das partes no cumprimento do acordo pelo que é questionável se o incumprimento definitivo é da responsabilidade da insolvente.
X. Ainda que esteja preenchido o pressuposto do incumprimento definitivo o mesmo não se poderá dizer quanto à entrega/tradição do imóvel.
Y. Segundo o credor, EO ..., terá passado a utilizar o imóvel supra discriminado a partir de 01/09/2006.
Z. O credor EO ... não faz/junta qualquer prova de que tenha tido efectivamente tradição sobre o imóvel desde 2006.
AA. O Tribunal a quo julgou provada a tradição uma vez que, segundo este, ficou provado que, no contrato promessa as partes acordaram que o promitente comprador ficaria na posse do imóvel e que lhe poderia dar o uso que entendesse.
BB. Salvo merecido respeito, que é muito, não basta a posse do imóvel devendo igualmente se provar a tradição do objecto do acordo.
CC. No caso em concreto não foi junto qualquer prova da tradição do imóvel por parte do credor EO ....
DD. Consequentemente não pode a ora Recorrente se conformar com a decisão quanto ao preenchimento deste pressuposto do direito da retenção
EE. Mais, a Administradora de Insolvência considerou, e bem, não ter havido entrega/tradição do objecto do acordo, optando pelo não cumprimento nos termos do artigo 102.º, n.º 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE).
FF. Segundo o douto Tribunal é aplicável ao caso em concreto o acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2014.
GG. Neste acórdão, o Supremo Tribunal de Justiça veio uniformizar jurisprudência no sentido de “no âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor promitente comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, goza do direito de retenção nos termos do estatuído no artigo 755.º n.º 1, alínea f) do Código Civil” (publicado no Diário da República, I.ª Série, n.º 95, de 19.05.2014).
HH. O Supremo Tribunal de Justiça veio assim restringir, no âmbito da verificação e graduação de créditos em processo de insolvência, o direito de retenção previsto no artigo 755.º, n.º 1, alínea f) ao promitente comprador consumidor.
II. Posteriormente no acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 4/2019, o Supremo Tribunal de Justiça estabeleceu que “na graduação de créditos em insolvência, apenas tem a qualidade de consumidor, para os efeitos do disposto no Acórdão n.º 4 de 2014 do Supremo Tribunal de Justiça, o promitente-comprador que destina o imóvel, objecto de traditio, a uso particular, ou seja, não o compra para revenda nem o afecta a uma actividade profissional ou lucrativa” (publicado no Diário da República, I.ª Série, n.º 141/2019, de 25.07.2019).
JJ. Face à jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, apenas poderá ser reconhecido o direito de retenção ao crédito do impugnante, se este for um consumidor.
KK. Face ao supra mencionado, para o reconhecimento do direto de retenção ao credor, EO ..., este teria que provar não só a qualidade de consumidor como também a uso particular do imóvel o que, no entendimento da ora Recorrente, também não aconteceu.
LL. O credor EO ... juntou aos autos, na tentativa de provar a qualidade de consumidor, duas faturas de eletricidade, da entidade EDP, datadas de Dezembro de 2013 e Março de 2014.
MM. Importa para os factos em causa relembrar que a declaração de insolvência da ora insolvente data de Fevereiro de 2012 – data do suposto incumprimento definitivo do contrato.
NN. Ora, alega o credor EO ... ter a qualidade de consumidor juntando, para o efeito, duas faturas, posteriores ao incumprimento definitivo do acordo entre as partes.
OO. Não pode, salvo melhor entendimento, o credor EO ... alegar a qualidade de consumidor com faturas posteriores ao incumprimento definitivo do alegado acordo.
PP. O Tribunal a quo julgou provada a qualidade de consumidor.
QQ. Não pode a ora Recorrente conformar-se com tal decisão.
RR. Devem, no entendimento da ora Recorrente, ser reapreciados os factos e reapreciada a prova.
SS. Mais, no que concerne à prova testemunhal, requerida pelo o credor EO ..., pediu a ora Recorrente a gravação da prova para apreciação dos factos ali elencados uma vez que importa, para o apuramento dos factos aqui em causa, perceber se as testemunhas facultaram elementos indubitáveis e inquestionáveis sobre o lapso de tempo em que terá, alegadamente, sido utilizada a casa.
TT. Reitera a ora Recorrente que a prova documental, junta nos autos, pelo credor EO ..., reporta a faturas posteriores ao incumprimento definitivo do contrato pelo que não devem ser consideradas.
UU. Face ao exposto considera a Recorrente importante reapreciar tanto a prova documental como testemunhal.
VV. Não pode, nestes termos, ser reconhecido, ao credor EO ..., o direito de ser ressarcido em primazia sobra a ora Recorrente.
WW. Segundo a ora Recorrente ao credor EO ... não deve ser reconhecido o direito de retenção, não podendo o crédito deste ser graduado em prevalência sobre o crédito da ora Recorrente.
XX. O reconhecimento deste direito de retenção (onde não foi provada a tradição do imóvel nem a qualidade de consumidor do credor EO ...) em primazia sobre o crédito da ora Recorrente desrespeita, claramente, os princípios da segurança jurídica, da proteção e da confiança.
YY. A Recorrente não se conforma com a douta sentença recorrida.
ZZ. A Douta sentença proferida pelo Tribunal a quo não fez uma correcta interpretação e adequada aplicação do Direito, designadamente das citadas disposições legais, devendo, por isso, concluir-se no sentido de não reconhecer o direito de retenção do credor EO ..., por não provado, e consequentemente graduar o crédito da ora Recorrente no lugar e com a primazia que lhe compete.
Termos em que deverá ser revogada a decisão recorrida, com todas as consequências legais.
Só assim se decidindo, será cumprido o Direito e feita Justiça”.
13-  O credor EO ... apresentou contra-alegações onde conclui pela improcedência do recurso e pela confirmação da Sentença recorrida.

*  *  *

II – Fundamentação
a)  A matéria de facto dada como provada na 1ª instância foi a seguinte :
1-  Na relação de créditos reconhecidos apresentada pelo Administrador de Insolvência constam, além do mais, os seguintes créditos:

CredorCréditoNatureza
4EB Sanches50.000,00 €Comum
5EO ...400.000,00 €Comum
7G…– Gestão de Obras Públicas e Particulares, S.A.
434.074,20 €Comum
8JS ...100.000,00 €Comum


2-  No apenso Q, a “S… – Construção Civil e Obras Públicas, S.A.” foi habilitada em substituição do credor “GOPP, S.A.”.
3-  Entre a insolvente e EO ... foi celebrado acordo, designado por “contrato promessa de compra e venda”, datado de 1/9/2006, mediante o qual a insolvente prometeu vender e EO ... prometeu comprar o prédio urbano, sito na …, Casa 81, descrita na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 2838 da freguesia da … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1175 da mesma freguesia (verba nº 2), pelo preço de 200.000 € já pago e de que a insolvente deu quitação.
4-  Na cláusula oitava do contrato as partes acordaram que :
“Um – Uma vez que o preço da ajustada compra se encontra pago na totalidade a Promitente Vendedora transmite a partir de hoje, a posse da moradia objecto do contrato prometido para o Promitente Comprador.
Dois – Todavia, até que a escritura do contrato prometido seja celebrada o administrador único da Promitente Vendedora terá direito a 1 mês de férias na mesma.
Três – A partir de hoje, e na sequência do acordado no número um da presente cláusula, os outorgantes acordam que o Promitente Comprador poderá utilizar e usufruir da moradia como entender, podendo, nomeadamente, arrendá-la e fazer suas as rendas recebidas”.
5-  A partir de 1/9/2006, EO ... passou a utilizar e a ocupar o imóvel como quis.
6-  EO ... utilizava a verba nº 2 como casa de férias e como residência para a filha quando esta esteve a trabalhar no Algarve.
7-  O Administrador da Insolvência recusou celebrar com EO ... o contrato de compra e venda da verba nº 2.
8-  Entre a insolvente e EB Sanches foi celebrado acordo, designado por “contrato promessa de compra e venda”, datado de 4/9/2007, mediante o qual a insolvente prometeu vender e EB Sanches prometeu comprar a fracção autónoma designada pela letra “H”, do prédio sito na Urbanização do …, lote 35, P…, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... (verba nº 67), pelo preço de 160.000 €.
9-  No contrato, a insolvente declarou ter recebido de EB Sanches a título de sinal e princípio de pagamento a quantia de 25.000 €, de que deu quitação.
10-  Os 25.000 € foram pagos através do cheque nº 422832508, datado de 10/9/2007 emitido à ordem da insolvente.
11-  Por documento particular, denominado “adenda ao contrato promessa de compra e venda” e datado de 31/1/2009, a insolvente e EB Sanches acordaram aditar ao contrato celebrado em 4.09.2007, além do mais, que a “escritura de compra e venda será celebrada no prazo máximo de doze (12) meses a contar da data da assinatura desta adenda, cabendo a sua marcação à segunda outorgante (EB Sanches) que, após receber informação da emissão da licença de utilização referente ao imóvel, convocará a primeira para o efeito, com oito dias de antecedência por carta, com indicação de dia, hora e local”.
12-  EB Sanches enviou à insolvente, que recebeu, carta datada de 11/7/2011, convocando-a para a escritura de compra e venda.
13-  A insolvente enviou a EB Sanches, que recebeu, carta datada de 18/7/2011, com o seguinte teor:
“Assunto: Vossa carta de 11-07-2011 – Marcação a Escritura fracção H Lote 35
Exmª Srª
Acuso a recepção da vossa carta para a marcação da escritura acima referida.
Informo que ainda não nos é possível obter a respectiva licença de utilização, documento essencial a realização da escritura ora marcada.
A obtenção da respectiva licença está condicionada à conclusão de trabalhos que por dificuldades de financiamento ainda não nos foi possível realizar.
Deste modo informo que não dispomos da necessária documentação para a realização da escritura, razão pela qual não iremos comparecer para a sua outorga na data e local indicados, por tal facto pedimos desculpa.
Poderá na defesa dos seus interesses, agir como entender nomeadamente recorrer a tribunal”.
14-  Entre a insolvente e a “GOPP, S.A.” foi celebrado acordo, designado por “contrato promessa de compra e venda”, datado de 8/2/2011, mediante o qual a insolvente prometeu vender e a “GOPP, S.A.” prometeu comprar os lotes 8, 11, 13, 15, 43, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66 e 67 (verbas nºs. 10, 13, 15, 17, 33, 46, 18, 19, 1d, 21, 22, 23, 24, 25 e 26) do prédio sito na Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 3498, da freguesia de … e inscrito na matriz predial rústica sob os artigos 370, 371 e 372 da secção G, pelo preço total de 740.710 €, sendo 64.843,73 € (13.000.000$00) o lote 58, 59.855,75 € (12.000.000$00) o lote 67 e 47.385,80 € (9.500.000$00) os restantes lotes.
15-  No contrato, as partes acordaram, além do mais que :
“Cláusula Quinta
(…)
a) No acto da assinatura do presente Contrato Promessa de Compra e Venda, Segunda Outorgante entrega à Primeira Outorgante a quantia de Esc. 77.000.000$00 (384.074,38 €) (…) a título de sinal e início de pagamento, do qual a Primeira Outorgante dá neste acto a respectiva quitação.
b) O remanescente, ou seja a quantia de 71.500.000$00 (356.640,50 €) (…) será pago à Primeira Outorgante, pela Segunda Outorgante no acto da outorga da escritura de compra e venda.
Cláusula Sexta
A marcação da escritura de compra e venda será efectuada logo que a Primeira Outorgante obtenha o Alvará de Loteamento, aprovação pela Câmara Municipal de … dos projectos das várias especialidades das moradias, ou seja quando a Primeira Outorgante obtenha a respectiva Licença de Construção, e que toda a documentação referente ao imóvel objecto deste Contrato Promessa se encontre pronta pela Primeira Outorgante, em dia, hora e Cartório à sua escolha, que para o efeito deverá avisar a Segunda Outorgante, com pelo menos oito dias de antecedência, através de carta registada com aviso de recepção, enviada para a sede desta última.
16-  Por documento particular, denominado “aditamento ao contrato promessa de compra e venda” e datado de 12/10/2009, a insolvente e a “GOPP, S.A.” acordaram alterar o contrato celebrado em 8/2/2001, “no sentido de passar a constar que por força dos sucessivos reforços de sinal o mesmo perfaz nesta data um total de 434.074,20 € (…)”.
17-  Por documento particular, denominado “aditamento ao contrato promessa de compra e venda” e datado de 27/10/2009, a insolvente e a “GOPP, S.A.” acordaram alterar o contrato celebrado em 8/2/2001 nos seguintes termos :
“Cláusula Primeira
Pelo presente Aditamento ao Contrato Promessa de Compra e Venda (…), as Outorgantes declaram que:
A) A segunda Outorgante já entregou à Primeira a título de sinal e reforço de sinal a quantia de € 434.074,20, da qual a primeira dá neste acto a respectiva quitação;
B) Sem prejuízo do estipulado na Cláusula Sexta do Contrato Promessa, já é possível identificar no terreno os lotes objecto do Contrato Promessa;
C) Que a Segunda Outorgante tem todo o interesse em começar os trabalhos de desbravamento e preparação dos lotes que prometeu comprar, o que é para si condição essencial para ter dado sinal e reforços de sinal tão elevados, para assim tentar compensar os atrasos que a Urbanização tem sofrido e os consequentes prejuízos que tal facto lhe tem causado;
D) Que a Primeira Outorgante nada tem a opor ao começo desses trabalhos, o que até é uma forma de atrair outros promitentes-compradores para outros lotes da Urbanização;
Cláusula Segunda
Pelo presente Aditamento ao Contrato Promessa a Primeira Outorgante confere à Segunda Outorgante a posse dos lotes de terreno devidamente identificados no Considerando I, permitindo que a Segunda Outorgante use os lotes, podendo utilizá-los como quiser e lhe aprouver”.
18-  A “GOPP, S.A.” contratou a sociedade “R… – Sociedade de Construções, Ldª” para realizar trabalhos de limpeza e nivelamento dos lotes.
19-  A “R… – Sociedade de Construções, Ldª” iniciou os trabalhos.
20-  A “GOPP, S.A.” contratou a “A… G… & J… – Sociedade de Construções, Ldª” para a construção das moradias a incorporar nos lotes.
21-  A “A… G… & J… – Sociedade de Construções, Ldª” colocou contentores no local.
22-  A “GOPP, S.A.” enviou à insolvente, que recebeu, carta datada de 6/10/2011 informando-a de que a escritura estava marcada para o dia 26/10/2011, pelas 9 horas e 30 minutos, no Cartório Notarial do Dr. C…, no B… e solicitando a entrega dos elementos e documentos necessários à realização da escritura e advertindo-a de que “caso não entreguem a solicitada documentação, não desonerem os lotes e não compareçam no dia, hora e cartório indicado, ou ainda que compareçam para a celebração da escritura com os elementos referidos anteriormente regularizados, se mão tiverem a situação fiscal em devida ordem, por forma a que a escritura se celebre, consideraremos definitivamente incumprido o Contrato Promessa aqui em causa, com a sua consequente resolução e sem prejuízo da posse dos lotes que nos foi conferida”.
23-  O Notário C… certificou que no dia 26/10/2011, não foi realizada a escritura de compra e venda dos lotes 8, 11, 13, 15, 43, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 64, 65, 66 e 67 da Urbanização …, descritos na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 5305, 5308, 5310, 5312, 5355, 5356, 5357, 5358, 5359, 5360, 5361, 5362, 5363 e 5364 da freguesia de Pinhal Novo por falta de comparência da insolvente.
24-  A “GOPP, S.A.” enviou à insolvente, que recebeu, carta datada de 31/10/2011, na qual comunicou à insolvente a resolução do contrato promessa de compra e venda e exigiu o pagamento do sinal em dobro no montante de 868.148,40 €.
25-  Entre a insolvente e JS ... foi celebrado acordo, designado por “contrato promessa de compra e venda”, datado de 24/3/2006, mediante o qual a insolvente prometeu vender e JS ... prometeu comprar o lote designado pelo nº 20, do prédio sito na Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 3498, da freguesia de … e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 387 da secção G da mesma freguesia, pelo preço de 50.000 €.
26-  No contrato, as partes declararam que o preço foi integralmente pago nessa data, tendo a insolvente dado através do contrato a respectiva quitação.
27-  No contrato as partes acordaram, além do mais que :
“Cláusula Sexta
A marcação da escritura de compra e venda será efectuada logo que a Primeira Outorgante obtenha o Alvará de Loteamento, aprovação pela Câmara Municipal de … dos projectos das várias especialidades das moradias, ou seja quando a Primeira Outorgante obtenha a respectiva Licença de Construção, e que toda a documentação referente ao imóvel objecto deste Contrato Promessa se encontre pronta pela Primeira Outorgante, em dia, hora e Cartório à sua escolha, que para o efeito deverá avisar a Segunda Outorgante, com pelo menos oito dias de antecedência, através de carta registada com aviso de recepção, enviada para a sede desta última.
(…)
Cláusula Oitava
Se todavia a escritura definitiva de compra e venda não se realizar dentro do prazo acordado e estipulado por acusa imputável à Primeira Outorgante, esta assume desde já a obrigação de pagar à Segunda Outorgante, uma compensação igual à taxa de juros fixada por lei, sobre o capital em dívida, e pelo tempo que exercer o prazo estipulado para a realização da referida escritura, mas por um período nunca superior a 180 dias, findos os quais o presente Contrato Promessa de Compra e Venda será havido por incumprido definitivamente”.
28-  JS ... enviou ao administrador da insolvente, que recebeu, carta datada de 10/7/2008, com o seguinte teor :
“Assunto: Marcação de Escritura
1. JS ... (…) tendo em 24 de Março de 2006 celebrado com Vª Exª um contrato Promessa de Compra e Venda, na qual é o 2º outorgante, vem agora nos termos da cláusula oitava, atento a que Vª Exª não cumpriu o prazo estipulado, razoável e aceitável, solicito a marcação da Escritura, do lote de terreno para construção urbana designado por lote 20, inserido na urbanização da …, freguesia de …, Concelho de … (…)
3. Atento que se verifica incumprimento da parte da primeira outorgante, o 2º outorgante solicita a marcação no prazo de 15 dias da escritura pública do lote referido no nº 1 no Cartório Notarial de ….
4. caso a mesma escritura não se realize nesse prazo por factos imputáveis à 1ª outorgante serão accionados os meios legais com vista ao cumprimento do nº 2 do Artº 442 do Código Civil com as respectivas correcções monetárias, acrescidas de juros à taxa em vigor pelo Banco de Portugal, contabilizados a partir da data da entrega da referida importância, 24 de Março de 2006 até à data da resolução ou realização da Escritura”.
29-  JS ... enviou à insolvente, que recebeu, carta datada de 9/2/2012, com o seguinte teor :
“Assunto: Realização da Escritura do Lote 20 – Quinta … – P…
Como é do seu conhecimento, existe entre o signatário e essa empresa um Contrato Promessa de Compra e Venda datado de Março de 2006, relativo ao Lote em referência.
Apesar das várias tentativas da minha parte em realizar a escritura, tal nunca se concretizou por motivos que não me podem ser imputáveis.
Serve a presente carta para notificar Vª Exª de que a Escritura se encontra marcada para o próximo dia 17 de Fevereiro de 2012, pelas 15H00, no Cartório Notarial da Drª S… em ….
Assim, solicito a V.ª ex.ª a sua comparência na hora e local acima referidos para a realização da referida escritura”.
30-  Foram apreendidos os seguintes bens :
a) Verba nº 1 – veículo automóvel da marca Mitsubishi, com a matrícula …;
b) Verba nº 2 – prédio urbano, sito na …, Casa 81, descrita na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 2838 da freguesia da … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1175 da mesma freguesia;
c) Verba nº 3 – prédio rústico, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 3498, da freguesia de … e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 387 da secção G da mesma freguesia;
d) Verba nº 4 – fracção autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do prédio sito na Rua …, nº 44-B, …, descrita na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 4263 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9037 da mesma freguesia;
e) Verba nº 5 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 2, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5299, da freguesia de …, e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9287 da mesma freguesia;
f) Verba nº 6 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 3, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5300 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9288 da mesma freguesia;
g) Verba nº 7 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 4, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5301 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9289 da mesma freguesia;
h) Verba nº 8 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 5, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5302 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9290 da mesma freguesia;
i) Verba nº 9 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 6, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o 5303 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9291 da mesma freguesia;
j) Verba nº 10 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 8, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5305 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9293 da mesma freguesia;
k) Verba nº 11 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 9, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5306 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9294 da mesma freguesia;
l) Verba nº 12 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 10, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5307 da freguesia de Pinhal Novo e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9295 da mesma freguesia;
m) Verba nº 13 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 11, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5308 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9296 da mesma freguesia;
n) Verba nº 14 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 12, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5309 da freguesia de … Novo e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9297 da mesma freguesia;
o) Verba nº 15 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 13, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5310 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9298 da mesma freguesia;
p) Verba nº 16 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 14, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5311 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9299 da mesma freguesia;
q) Verba nº 17 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 15, sito na …. Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5312 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9300 da mesma freguesia;
r) Verba nº 18 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 59, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5356 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9344 da mesma freguesia;
s) Verba nº 19 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 60, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5357 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9345 da mesma freguesia;
t) Verba nº 20 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 61, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5358 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9346 da mesma freguesia;
u) Verba nº 21 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 62, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5359 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9347 da mesma freguesia;
v) Verba nº 22 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 63, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5360 da freguesia de Pinhal Novo e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9348 da mesma freguesia;
w) Verba nº 23 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 64, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5361 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9349 da mesma freguesia;
x) Verba nº 24 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 65, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5362 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9350 da mesma freguesia;
y) Verba nº 25 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 66, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5363 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9351 da mesma freguesia;
z) Verba nº 26 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 67, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5364 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9352 da mesma freguesia;
aa) Verba nº 27 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 53, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5350 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9423 da mesma freguesia;
aa) (numeração constante da Sentença, que aqui mantivemos) Verba nº 28 – fracção autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do prédio sito na Rua … nºs. 15, 17 e 19 e Rua … nºs. 2 e 4, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 4265 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9467 da mesma freguesia;
ab) Verba nº 29 – fracção autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do prédio sito na Rua … nºs. 21, 23 e 25 e Rua …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 4266 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9468 da mesma freguesia;
ac) Verba nº 30 – fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão direito, do prédio sito na Rua … nºs. 21, 23 e 25 e Rua … nºs. 6 e 8, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 4266 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9468 da mesma freguesia;
ad) Verba nº 31 – fracção autónoma designada pela letra “A”, correspondente ao rés-do-chão esquerdo, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
ae) Verba nº 32 – fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao rés-do-chão frente, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
af) Verba nº 33 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 43, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5340 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9328 da mesma freguesia;
ag) Verba nº 34 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 44, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5341 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9329 da mesma freguesia;
ah) Verba nº 35 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 45, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5342 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9330 da mesma freguesia;
ai) Verba nº 36 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 46, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5343 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9331 da mesma freguesia;
aj) Verba nº 37 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 47, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5344 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9332 da mesma freguesia;
ak) Verba nº 38 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 48, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5345 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9333 da mesma freguesia;
al) Verba nº 39 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 49, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5346 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9334 da mesma freguesia;
am) Verba nº 40 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 50, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5347 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9335 da mesma freguesia;
an) Verba nº 41 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 51, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5348 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9336 da mesma freguesia;
ao) Verba nº 42 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 52, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5349 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9337 da mesma freguesia;
ap) Verba nº 43 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 54, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5351 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9339 da mesma freguesia;
aq) Verba nº 44 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 55, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5352 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9340 da mesma freguesia;
ar) Verba nº 45 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 57, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5354 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9342 da mesma freguesia;
as) Verba nº 46 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 58, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5355 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9343 da mesma freguesia;
at) Verba nº 47 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 16, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5313 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9301 da mesma freguesia;
au) Verba nº 48 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 20, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5317 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9305 da mesma freguesia;
av) Verba nº 49 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 22, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5319 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9307 da mesma freguesia;
aw) Verba nº 50 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 24, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de  … sob o nº 5321 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9309 da mesma freguesia;
ax) Verba nº 51 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 28, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5325 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9313 da mesma freguesia;
ay) Verba nº 52 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 30, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5327 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9315 da mesma freguesia;
az) Verba nº 53 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 31, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5328 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9316 da mesma freguesia;
ba) Verba nº 54 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 32, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5329 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9317 da mesma freguesia;
bb) Verba nº 55 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 33, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5330 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9318 da mesma freguesia;
bc) Verba nº 56 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 34, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5331 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9319 da mesma freguesia;
bd) Verba nº 57 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 35, sito na …,, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5332 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9320 da mesma freguesia;
be) Verba nº 58 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 36, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5333 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9321 da mesma freguesia;
bf) Verba nº 59 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 38, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5335 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9323 da mesma freguesia;
bg) Verba nº 60 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 40, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5337 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9325 da mesma freguesia;
bh) Verba nº 61 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 42, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5339 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9327 da mesma freguesia;
bi) Verba nº 62 – fracção autónoma designada pela letra “C”, correspondente ao rés-do-chão direito, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bj) Verba nº 63 – fracção autónoma designada pela letra “D”, correspondente ao primeiro andar esquerdo, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bk) Verba nº 64 – fracção autónoma designada pela letra “E”, correspondente ao primeiro andar direito, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bl) Verba n.º 65 – fracção autónoma designada pela letra “F”, correspondente ao segundo andar esquerdo, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bm) Verba nº 66 – fracção autónoma designada pela letra “G”, correspondente ao segundo andar frente, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bn) Verba nº 67 – fracção autónoma designada pela letra “H”, correspondente ao segundo andar direito, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bo) Verba nº 68 – fracção autónoma designada pela letra “I”, correspondente ao terceiro andar esquerdo, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bp) Verba nº 69 – fracção autónoma designada pela letra “J”, correspondente ao terceiro andar direito, do prédio sito na Rua … nºs. 5 e 5A, …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ... da mesma freguesia;
bq) Verba nº 70 – prédio urbano, composto por terreno para construção, designado por Lote nº 56, sito na …, Urbanização …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 5353 da freguesia de … e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 9341 da mesma freguesia;
br) Verba nº 71 – prédio rústico, sito no …, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o nº 2862 da freguesia de … e inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 49 da secção L (parte) da mesma freguesia;
31-  A verba nº 3 foi doada à Câmara Municipal de … para integração no domínio público.
32-  Sobre a verba nº 2 encontra-se registada, pela Ap. 6 de 14/8/2006, hipoteca voluntária a favor do “Banco D…” que garante o capital de 200.000 € e o montante máximo de 262.000 €.
33-  Sobre a verba nº 4 encontra-se registada, pela Ap. 17 de 28/8/2008 (convertida pela Ap. 19 de 18/9/2008), hipoteca voluntária a favor do “Banco E…” que garante o capital de 65.000 € e o montante máximo de 97.727,50 €.
34-  Sobre a verba n.º 28 encontram-se registados os seguintes ónus e encargos :
a) Pela Ap. 13 de 19/11/2004, hipoteca voluntária a favor do “Banco F…”, que garante o capital de 625.000 € e o montante máximo de 957.812,50 €.
b) Pela Ap. 3583 de 5/1/2009, hipoteca voluntária a favor do “Banco F…”, que garante o capital de 175.000 € e o montante máximo de 268.187,50 €.
35-  Sobre as verbas nºs. 29 e 30 encontra-se registada, pela Ap. 15 de 19/11/2004, hipoteca voluntária a favor do “Banco F…” que garante o capital de 625.000 € e o montante máximo de 957.812,50 €.
36-  Sobre as verbas nºs. 31, 32 e 62 a 69 encontram-se registados os seguintes ónus e encargos :
a) pela Ap. 46 de 7/8/2006 hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” (transmitida pela Ap. 511 de 27/2/2012 a favor da “C…– Consultores de Gestão, Ldª) que garante o capital de 1.500.000 € e o montante máximo de 2.190.000 €.
b) pela Ap. 30 de 7/7/2007 hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” que garante o capital de 250.000 € e o montante máximo de 387.500 €.
37-  Sobre as verbas nºs. 5 a 9, 14, 16, 27, 34, 35, 37 a 45, 47, 50, 52 a 61 e 70 encontram-se registados os seguintes ónus e encargos :
a) pela Ap. 57 de 3/12/2004 hipoteca voluntária a favor do “Banco G…” (transmitida pela Ap. 3356 de 8/6/2012 a favor da “C…– Consultores de Gestão, Ldª”) que garante o capital de 1.700.000 € e o montante máximo de 2.227.000 €.
b) pela Ap. 58 de 3/12/2004 hipoteca voluntária a favor do “Banco C…, que garante o capital de 820.192,51 € e o montante máximo de 1.099.057,96 €.
c) pela Ap. 1620 de 29/9/2009 (convertida pela Ap. 5300 de 30/11/2009) hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” (transmitida pela Ap. 3358 de 8/6/2012 a favor da “C… – Consultores de Gestão, Ldª), que garante o capital de 450.000 € e o montante máximo de 697.500 €.
d) pela Ap. 2000 de 29/9/2009 (convertida pela Ap. 1440 de 14/11/2009) hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” (transmitida pela Ap. 3357 de 8/6/2012 a favor da “C… – Consultores de Gestão, Ldª”), que garante o capital de 1.400.000 € e o montante máximo de 2.170.000 €.
38-  Sobre as verbas nºs. 10 a 13, 15, 17 a 26, 33, 46, 48, 49 e 51 encontram-se registados os seguintes ónus e encargos :
a) pela Ap. 57 de 3/12/2004 hipoteca voluntária a favor do “Banco G…” (transmitida pela Ap. 3356 de 8/6/2012 a favor da “C… – Consultores de Gestão, Ldª”) que garante o capital de 1.700.000 € e o montante máximo de 2.227.000 €.
b) pela Ap. 58 de 3/12/2004 hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” que garante o capital de 820.192,51 € e o montante máximo de 1.099.057,96 €.
c) pela Ap. 2000 de 29/9/2009 (convertida pela Ap. 1440 de 14/11/2009) hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” (transmitida pela Ap. 3357 de 8/6/2012 a favor da “C… – Consultores de Gestão, Ldª”), que garante o capital de 1.400.000 € e o montante máximo de 2.170.000 €.
39-  Sobre a verba nº 36 encontram-se registados os seguintes ónus e encargos :
a) pela Ap. 57 de 3/12/2004 hipoteca voluntária a favor do “Banco G…” (transmitida pela Ap. 3356 de 8/6/2012 a favor da “C… – Consultores de Gestão, Ldª) que garante o capital de 1.700.000 € e o montante máximo de 2.227.000 €.
b) pela Ap. 58 de 3/12/2004 hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” que garante o capital de 820.192,51 € e o montante máximo de 1.099.057,96 €.
c) pela Ap. 2000 de 29/9/2009 (convertida pela Ap. 1440 de 14/11/2009) hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” (transmitida pela Ap. 3357 de 8/6/2012 a favor da “C… – Consultores de Gestão, Ldª”), que garante o capital de 1.400.000 € e o montante máximo de 2.170.000 €.
d) pela Ap. 5299 de 30/11/2009 hipoteca voluntária a favor do “Banco C…” (transmitida pela Ap. 3359 de 8/6/2012 a favor da “C… – Consultores de Gestão, Ldª”), que garante o capital de 450.000 € e o montante máximo de 697.500 €.
40-  O crédito verificado à “L… S.A.R.L.” (em substituição do “Banco D…), no montante de 238.208,98 €, é garantido por hipoteca sobre a verba nº 2.
41-  Do crédito verificado ao “Banco E…” o montante de 98.499,37 € é emergente do contrato garantido por hipoteca sobre a verba nº 4.
42-  Do crédito verificado à “P… J…, S.A.” (em substituição do “Banco F…”) o montante de 266.027,46 € é garantido por hipoteca sobre as verbas nºs. 28 a 30.
43-  Do crédito verificado ao “Banco C….”, o montante de 4.119.964,62 € é emergente do contrato garantido por hipotecas sobres as verbas nºs. 5 a 27, 31 a 70.
44-  Do crédito verificado ao “Banco C…”, o montante de 820.192,51 € é referente a garantias bancárias ainda não honradas.
45-  O crédito verificado à “P… S.A.R.L.” (em substituição da “C… – Consultores de Gestão, Ldª”), no montante de 1.310.330,68 €, é garantido por hipoteca sobre as verbas nºs. 5 a 27, 31 a 70.
46-  Do crédito verificado a IAA Gonçalves, o montante de 30.000 € goza de direito de retenção sobre a verba nº 28.
47-  Do crédito da Fazenda Nacional verificado como privilegiado na sentença de 14/3/2021 :
a) 292,35 € é referente a IRS e respectivos juros.
b) 100,80 € é referente a IRC e respectivos juros.
48-  Do crédito referente a IMI verificado como garantido na sentença de 14/3/2021 e no apenso D :

             





49-  Os créditos verificados a CMD Ribeiro, DSL Tavares, FMF Trindade e MJMM Queirós são emergentes de contrato de trabalho e/ou da sua cessação.
50-  Do crédito verificado a “C… – Materiais de Construção, Ldª”, o montante de 10,79 € é referente a juros de mora vencidos após a declaração de insolvência.
51-  A insolvência foi requerida por “B… & F… Construções, Ldª”.
*
b)  Como resulta do disposto nos artºs. 635º nº 4 e 639º nº 1 do Código de Processo Civil, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, as conclusões da alegação do recorrente servem para colocar as questões que devem ser conhecidas no recurso e assim delimitam o seu âmbito.
Assim, perante as conclusões das alegações da recorrente, as únicas questões em recurso consistem em determinar :
-Se existem razões para alterar a matéria de facto dada como provada na 1ª instância.
-Determinar se pode o recorrido (enquanto promitente comprador) invocar o direito de retenção e se existe fundamento para alterar a graduação de créditos efectuada na decisão recorrida.
*
c)  Vejamos agora se existem razões para alterar a matéria de facto dada como provada na 1ª instância.
Ora, de acordo com o disposto no artº 640º nº 1 do Código de Processo Civil, quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente, sob pena de rejeição do recurso, especificar :
-Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados.
-Quais os concretos meios de probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
-A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Há que realçar que as alterações introduzidas no Código de Processo Civil com o Decreto-Lei nº 39/95, de 15/2, com o aditamento do artº 690º-A (posteriormente artº 685º-B e, actualmente, artº 640º) quiseram garantir no sistema processual civil português, um duplo grau de jurisdição.
De qualquer modo, há que não esquecer que continua a vigorar entre nós o sistema da livre apreciação da prova conforme resulta do artº 607º nº 5 do Código de Processo Civil, o qual dispõe que “o Juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto”.
*
d)  A este propósito diz a recorrente nas suas alegações :
“41. Não pode, salvo melhor entendimento, o credor EO ... alegar a qualidade de consumidor com faturas posteriores ao incumprimento definitivo do alegado acordo.
42. O Tribunal a quo julgou provada a qualidade de consumidor.
43. Não pode a ora Recorrente conformar-se com tal decisão.
44. Devem, no entendimento da ora Recorrente, ser reapreciados os factos e reapreciada a prova.
45. Mais, no que concerne à prova testemunhal, requerida pelo o credor EO ..., pediu a ora Recorrente a gravação da prova para apreciação dos factos ali elencados uma vez que importa, para o apuramento dos factos aqui em causa, perceber se as testemunhas facultaram elementos indubitáveis e inquestionáveis sobre o lapso de tempo em que terá, alegadamente, sido utilizada a casa.
46. Reitera a ora Recorrente que a prova documental, junta nos autos, pelo credor EO ..., reporta a facturas posteriores ao incumprimento definitivo do contrato pelo que não devem ser consideradas.
47. Face ao exposto considera a Recorrente importante reapreciar tanto a prova documental como testemunhal.
48. Não pode, nestes termos, ser reconhecido, ao credor EO ..., o direito de ser ressarcido em primazia sobra a ora Recorrente”.
*
e)  Ora, o sentido e alcance dos supra referidos requisitos formais de impugnação da decisão de facto devem ser equacionados à luz das razões que lhes estão subjacentes, mormente em função da economia do julgamento em sede de recurso de apelação e da natureza da própria decisão de facto.
Assim, em primeira linha, importa ter presente que, no domínio do regime de recursos constante do Código de Processo Civil, o meio impugnatório mediante recurso para um Tribunal superior visa uma reapreciação do julgamento proferido pelo tribunal “a quo” com vista a corrigir eventuais erros da decisão recorrida.
Em segundo lugar, no que respeita à impugnação da decisão de facto, esta decisão consiste no pronunciamento que é feito, em função da prova produzida, sobre os factos alegados pelas partes ou oportuna e licitamente adquiridos no decurso da instrução e que se mostrem relevantes para a resolução do litígio.  Essa decisão tem, pois, por objecto os juízos probatórios parcelares, positivos ou negativos, sobre cada um dos factos relevantes, embora com o alcance da respectiva fundamentação ou motivação (neste sentido cf. Acórdão do S.T.J. de 22/10/2015, consultado na “internet” em www.dgsi.pt)..
“Neste quadro, a apreciação do erro de julgamento da decisão de facto é circunscrita aos pontos impugnados, embora, quanto à latitude da investigação probatória, o tribunal de recurso tenha um amplo poder inquisitório sobre a prova produzida que imponha decisão diversa, como decorre do preceituado no artigo 662º, nº 1, do CPC, incluindo os mecanismos de renovação ou de produção dos novos meios de prova, nos exactos termos do nº 2, alíneas a) e b), do mesmo artigo, sem estar adstrito aos meios de prova que tiverem sido convocados pelas partes e nem sequer aos indicados pelo tribunal recorrido” (cf. Acórdão do S.T.J. de 22/10/2015, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
De resto, como tem decidido o S.T.J., a reapreciação da decisão de facto não se limita à verificação da existência de erro notório por parte do Tribunal “a quo”, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, por parte do Tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa.
São, portanto, as referidas condicionantes da economia do julgamento do recurso e da natureza da decisão de facto que impõem ao recorrente o ónus de delimitar com precisão o objecto do recurso, ou seja, de definir as questões a reapreciar pelo Tribunal de recurso, especificando os concretos pontos de facto ou juízos probatórios, nos termos do artº 640º nº 1, al. a) do Código de Processo Civil.
Como se refere no já citado Acórdão do S.T.J. de 22/10/2015:
“Tal especificação pode fazer-se de diferentes modos :  o mais simples, por referência ao ponto da sentença em que se encontram inseridos ;  ou então pela transcrição do próprio enunciado”
“Por seu turno, a indicação dos concretos meios probatórios convocáveis pelo recorrente, nos termos da alínea b) do mesmo artigo, já não respeita propriamente à delimitação do objecto do recurso, mas antes à amplitude dos meios probatórios a tomar em linha de conta, sem prejuízo, porém, dos poderes inquisitórios do tribunal de recurso de atender a meios de provas não indicados pelas partes, mas constantes dos autos ou das gravações nele realizadas”.
Por fim, de salientar que se impõe, também, ao recorrente, nos termos do artº 640º nº 1, al. c) do Código de Processo Civil, o requisito formal de indicar a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Este é, pois, o método processual assumido como garantia de um julgamento equitativo das questões de facto e da legitimidade da decisão que sobre elas venha a recair, com observância dos princípios do contraditório e do tratamento igual das partes.
Voltando ao referido Acórdão do S.T.J. :  “Por outro lado, o legislador terá sido cauteloso em não permitir a utilização abusiva ou facilitação do mecanismo-remédio de impugnação da decisão de facto.  Aliás, mal se perceberia que o impugnante atacasse a decisão de facto sem ter bem presente cada um dos enunciados probatórios e os meios de prova utilizados ou a utilizar na sua fundamentação cirúrgica.  Daí a cominação severa da sua imediata rejeição”.
*
f)  No caso dos autos verifica-se que, em bom rigor, lidas as alegações e as conclusões, não é totalmente perceptível qual a impugnação apresentada, conforme acima descrevemos.
Ora, o que, em primeira linha, se impunha à apelante era simplesmente indicar os juízos probatórios tidos por incorrectamente julgados, mormente com referência aos diversos factos considerados como provados ou não provados e, em relação a cada um deles, especificar a decisão que entendia dever ser proferida, nos termos do artº 640º nº 1, als. a) e c) do Código de Processo Civil.  Só depois de assim definido o âmbito dessa impugnação é que caberia então convocar os meios de prova a reapreciar em relação a cada um desses pontos, tecendo as considerações pertinentes à sua valoração.
Ou seja, e a título meramente exemplificativo, não se vislumbra que a apelante diga com um mínimo de clareza que os Factos “x” e “y” tenham sido mal julgados e devam ser considerado como Não Provados. 
Apenas faz uma impugnação de forma genérica, sem indicação de quais os factos e a redacção que os mesmos deveriam passar a ter.
Quanto aos meios de prova, não temos qualquer transcrição de passagens de depoimentos, seguida de uma análise crítica aos mesmos.
No fundo, a recorrente diz apenas que devem ser “reapreciados os factos e reapreciada a prova” e que considera “importante reapreciar tanto a prova documental como testemunhal”.
Mas que factos impugna ?
E quais os depoimentos testemunhais a reapreciar ?
E que partes de depoimentos devem ser reapreciadas ? 
Se aceitássemos esta impugnação genérica e não concretizada, desacompanhada do exigido por lei, tal constituiria uma subversão da exigência dos requisitos formais de impugnação, a perturbar gravemente o exercício esclarecido do contraditório e até a comprometer o princípio da imparcialidade do próprio Tribunal.
Ou seja, a recorrente não identifica os factos impugnados, nem transcreve passagens de depoimentos de testemunhas, com a respectiva análise crítica, que poderiam levar o Tribunal a ter uma decisão diferente da que foi apresentada na Sentença.
E em sede de Conclusões, a impugnação da matéria de facto não é diversa da que consta do corpo das alegações.
Veja-se, por exemplo, o Acórdão do S.T.J. de 18/2/2016 (consultado na “internet” em www.dgsi.pt), onde aquele Tribunal considera correctamente interposto um recurso sobre a matéria de facto onde :
-O recorrente enunciou na apelação, “como tendo sido mal julgados com base na prova testemunhal produzida, os pontos 8º, 15º, 22º, 29º, 36º e 43º, da base instrutória, pontos esses que elencou ainda nas conclusões das alegações”.
-“Indicou também os depoimentos que, na sua perspectiva, justificavam a pretendida alteração dos pontos de facto impugnados.  Para o efeito, identificou as testemunhas (…), assim como a matéria sobre a qual foram ouvidas ;  referenciou as datas em que tais depoimentos foram prestados e o CD onde se encontra a respectiva gravação, indicando o seu tempo de duração, e, para além disso, transcreveu e destacou a “negrito” as passagens da gravação tidas por relevantes e que, em seu entender, relevavam para a alteração do decidido”.
-“Por fim, especificou a decisão que, em seu entender, deveria ser proferida sobre os mencionados pontos de facto impugnados, tendo para o efeito sustentado que os mesmos deveriam ter sido dados como provados”.
Nada disto é feito pela apelante no recurso em apreço.
E, nesta medida, ao abrigo do disposto no artº 640º nº 2 do Código de Processo Civil, rejeita-se o recurso na parte atinente à impugnação da decisão da matéria de facto por parte da recorrente.
*
g)  É, pois, com base na factualidade fixada pelo Tribunal “a quo” que importa doravante trabalhar no âmbito da análise das restantes questões trazidas em sede de recurso.
*
h)  Quanto à questão de Direito :
O processo de insolvência é uma execução colectiva ou universal (artº 1º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (C.I.R.E.).
Na acção executiva promove-se, em geral, a realização coactiva de uma única prestação contra um único devedor e, em observância de um princípio de proporcionalidade, apenas são penhorados e executados os bens do devedor que sejam suficientes para liquidar a dívida exequenda (artºs. 745º e 748º do Código de Processo Civil).
Esta execução distingue-se do processo de insolvência que é uma execução universal, tanto porque nela intervêm todos os credores do insolvente, como porque nele é atingido, em princípio, todo o património deste devedor (artºs. 1º, 47º nºs. 1 a 3, 128º nºs. 1 e 3 e 149º nºs. 1 e 2 do C.I.R.E.).
Como o devedor se encontra em situação de insolvência, quer dizer, impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas, todos os credores podem reclamar os seus créditos e todo o património do devedor responde pelas suas dívidas (artº 3 nº 1 do C.I.R.E.).
Na execução singular, um credor pretende ver satisfeito o seu direito a uma prestação necessitando de uma legitimação formal, que é um título executivo e se o devedor for solvente obtém na acção executiva a satisfação do seu crédito (artºs. 10º nºs. 4 e 5 e 53º nº 1 do Código de Processo Civil).
No processo de insolvência podem apresentar-se todos os credores do insolvente, ainda que não possuam qualquer título executivo, porque todos eles podem concorrer ao pagamento rateado do seu crédito, através do produto apurado na venda de todos os bens arrolados para a massa insolvente.
O processo de insolvência baseia-se na impossibilidade de o devedor saldar todas as suas dívidas e, portanto, orienta-se por um princípio de distribuição de perdas entre os credores.
Admite-se, por isso, a par das reclamações preferenciais, a reclamação dos créditos comuns.
Mas à igualdade dos credores na admissão ao concurso não corresponde necessariamente uma igualdade na satisfação dos créditos reclamados, em razão de uma diferente ponderação pelo legislador dos interesses da generalidade dos credores e dos titulares de direitos preferenciais de pagamento.
Abstraindo de soluções intermédias, a posição relativa recíproca dos credores em processos concursais, pode organizar-se de harmonia com dois sistemas :  Um deles fundamenta-se no princípio da prioridade e expressa-se na máxima “prior tempore, prior iure”, dado que atribui ao credor que primeiro obteve a penhora, ou acto equivalente, de bens do devedor uma preferência em relação aos demais credores que não sejam titulares de quaisquer garantias reais sobre esses mesmos bens.  Outro sistema possível é o da igualdade ou da “par conditio (omnium) creditorum”, que não concede ao exequente qualquer preferência resultante da penhora, ou acto executivo equivalente, em relação aos demais credores comuns do executado (cf. Catarina Serra, in “A Falência no Quadro da Tutela Jurisdicional dos Direitos de Crédito”, pgs. 150 e ss.).
Mas a diferença entre o sistema da “par conditio creditorum” e o sistema da prioridade não corresponde, verdadeiramente, a qualquer contraposição entre igualdade e a desigualdade dos credores.  Qualquer dos sistemas baseia-se num pressuposto de igualdade entre os credores :  O que é diferente é a igualdade que está subjacente a qualquer dos sistemas.  No sistema da “par conditio”, a igualdade manifesta-se na possibilidade de qualquer credor impedir a satisfação integral dos créditos dos outros credores ;  no sistema da prioridade, a igualdade manifesta-se na possibilidade de qualquer credor conseguir a satisfação integral do seu crédito.  Um sistema prejudica, de forma igual, todos os credores.  O outro pode beneficiar, também de forma igual, qualquer credor (cf. Miguel Teixeira de Sousa, in “A Reforma da Acção Executiva”, pgs. 40 e 41).
Mas, “seja como for, à igualdade dos credores na admissão ao concurso não o corresponde necessariamente uma igualdade na satisfação dos créditos reclamados, em razão de uma diferente ponderação pelo legislador dos interesses da generalidade dos credores e, designadamente, dos titulares de direitos preferenciais de pagamento” (cf. Acórdão da Relação de Coimbra de 14/2/2012, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
Os créditos sobre a insolvência separam-se em três classes :  Os créditos garantidos e privilegiados – que são os que beneficiam, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais, e de privilégios creditórios gerais sobre bens integrantes da massa insolvente ;  os créditos subordinados ;  e os créditos comuns, que são nitidamente a categoria residual (artº 47º nºs. 1, 2 e 4, als. a) a c) do C.I.R.E.).
Os créditos subordinados recebem da lei um nítido tratamento de desfavor, de que o exemplo mais acabado é a circunstância de, independentemente da sua fonte, serem graduados e, portanto, satisfeitos, depois de todos os restantes créditos sobre a insolvência (artºs. 48º e 177º nº 1 do C.I.R.E.).
Outro ponto onde é notório o tratamento de desfavor dos créditos subordinados diz respeito ao direito de voto.  Com efeito, os créditos subordinados não conferem direito de voto, excepto se a deliberação tiver por objecto a aprovação de um plano de insolvência (artº 77º nº 3 do C.I.R.E.).  A solução compreende-se, tendo em conta o efeito “violento” que, na ausência de estatuição expressa constante do plano de insolvência, decorre para os créditos subordinados da sua aprovação :  O perdão total dos créditos dessa classe (artº 197º al. b) do C.I.R.E.).
É a esta luz que deve ser lido o princípio da igualdade dos credores que, por exemplo, o plano de insolvência deve acatar, princípio que a norma que o consagra, de resto, logo admite que seja objecto de restrição, desde que a diferenciação se justifique por razões objectivas (artº 194º nºs. 1 e 2 do C.I.R.E.).
Ou seja, os credores da insolvência são tratados de forma igual, mas segundo a qualidade dos seus créditos.
Na insolvência, os créditos são satisfeitos de harmonia com o princípio da satisfação integral sucessiva, isto é, segundo a ordem da sua graduação, razão pela qual um crédito só pode ser pago depois de o crédito anteriormente graduado se encontrar totalmente solvido (artºs. 173º do C.I.R.E. e 604º nº 1, 1ª parte, do Código Civil).  Assim, mesmo que o produto obtido com a venda dos bens apreendidos para a massa seja insuficiente para satisfazer todos os créditos graduados, isso não obsta à satisfação daqueles que, segundo a sua graduação, puderem ser integralmente pagos (artºs. 174º nº 1 e 175º nº 1 do C.I.R.E.).
Apesar dessa insuficiência, não há qualquer pagamento proporcional de todos os créditos graduados, ou seja, não se realiza qualquer rateio entre eles.
O problema do rateio apenas se coloca no tocante ao pagamento dos créditos que gozem da mesma garantia e tenham sido graduados a par e, naturalmente, quanto aos créditos comuns, quando a massa insolvente se mostrar insuficiente para a respectiva satisfação integral (artºs. 175º nº 1 e 176º do C.I.R.E. e 604º nº 1, 2ª parte, do Código Civil).  Quando isso suceda, o pagamento da pluralidade de créditos faz-se por rateio, segundo o princípio da proporcionalidade, assegurando-se o princípio da igualdade entre os créditos da mesma espécie, ou melhor, distribuindo por todos os credores da mesma categoria, proporcionalmente, as respectivas perdas (neste sentido cf. Acórdão da Relação de Coimbra de 14/2/2012, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
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i)  Vejamos, então, se o recorrido goza do direito de retenção sobre o imóvel descrito no Facto 30. b).
O direito de retenção consiste na faculdade de origem legal (por contraposição à génese negocial, administrativa ou judicial) de recusa do cumprimento da obrigação de restituição ou entrega de uma coisa detida enquanto o credor de tal obrigação não cumprir, por sua vez, uma obrigação de que é devedor, e de executar a coisa, pagando-se pelo valor dela, com preferência sobre os demais credores.
Representa, claramente, um meio de autotutela (cf. Antunes Varela, in “Sobre o contrato-promessa”, 2ª ed., pg. 110).
De acordo com tal conceitualização, o referido direito apresenta duas vertentes funcionais :  Uma primeira, de constrangimento, persuasão, do cumprimento do crédito do retentor por parte do credor da obrigação de entrega ou restituição (naturalmente por força da privação material da coisa).  Uma segunda, de garantia, conferida pela titularidade de uma preferência no pagamento sobre o produto da venda do bem (cf. Menezes Cordeiro, in “Da retenção do promitente na venda executiva”, R.O.A., Ano 57, 1997, pg. 550).
Neste sentido, constitui um direito real de garantia, que proporciona ao respectivo titular a realização de valor certo pelo produto da venda da coisa, com preferência sobre credores comuns ou privilegiados com garantia de grau inferior.
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j)  Ou seja, “in casu” cumpre indagar se, num contrato-promessa, devidamente sinalizado, o promitente comprador goza, ou não, do direito de retenção sobre a coisa objecto do contrato-prometido.
Como já acima referimos, o direito de retenção regulado nos artºs. 754º e ss. do Código Civil traduz-se no direito conferido ao credor, que se encontra na detenção de coisa que deva ser entregue a outra pessoa, de não a entregar enquanto esta não satisfizer o seu crédito, verificada alguma das relações de conexidade entre o crédito do detentor e a coisa que deva ser restituída a que a lei confere tal tutela.
Mas, para além desse carácter compulsório que está na origem do instituto, atento o escopo de garantia desse direito (que constitui um verdadeiro direito real de garantia) o seu titular pode executar a coisa nos mesmos termos que um credor pignoratício ou hipotecário, a que a lei o equipara, consoante a coisa seja móvel ou imóvel.  Tem assim o direito a pagar-se à custa do valor dela, com preferência sobre os demais credores do devedor (artºs. 758º, 759º e 604º do Código Civil).
O artº 755º nº 1 do Código Civil consagra casos especiais de direito de retenção, reconhecendo-o, na al. f), ao “beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442º”.
São três os pressupostos do reconhecimento deste direito de retenção :
-A existência de promessa de transmissão ou de constituição de um direito real.
-A entrega ou tradição da coisa objecto do contrato-promessa.
-A titularidade, por parte do beneficiário, de um crédito sobre a outra parte, decorrente do incumprimento definitivo do contrato-promessa.
Temos, assim, que o direito de retenção como direito real de garantia é invocável pelo promitente comprador que obteve a tradição da coisa, visando garantir os créditos indemnizatórios previstos no artº 442º nº 2 do Código Civil, em caso de incumprimento definitivo do contrato pelo promitente-vendedor (cf. Calvão da Silva, in “Sinal e Contrato-Promessa”, 3ª ed., pg. 120).
No caso especial do artº 755º nº 1, al. f) do Código Civil, a concessão do direito de retenção ao beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa justifica-se no facto de o crédito garantido emergir do incumprimento da obrigação da contraparte (promitente vendedor) e de aquele estar impedido de recorrer à excepção de não cumprimento do contrato, uma vez que inexiste relação sinalagmática entre a obrigação de restituição da coisa e o crédito do promitente-comprador (cf. Mariana Coimbra Piçarra, in “O direito de retenção do promitente-comprador:  Algumas reflexões”, estudo publicado na Revista “Julgar”, nº 34, pgs. 20, 21 e 26).
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k)  No caso em apreço é invocado o incumprimento de um contrato promessa de compra e venda do imóvel que constitui a Verba nº 2.
Com efeito, apurou-se que, em 1/9/2006, entre a insolvente e o recorrido EO ... foi celebrado um contrato promessa de compra e venda, mediante o qual a insolvente prometeu vender e o apelado prometeu comprar o prédio urbano em causa, pelo preço de 200.000 € já pago e de que a insolvente deu quitação.
Verifica-se, assim, que houve uma promessa de transmissão de um bem imóvel, pertença da insolvente, a favor do recorrido.
No entanto, diz a recorrente que a titularidade do crédito do recorrido não decorre do incumprimento definitivo do contrato-promessa por parte da insolvente, sendo o mesmo de imputar ao apelado.  Com efeito, segundo defende nas suas alegações, o recorrido apenas interpelou a insolvente, para cumprimento do acordo, em 25/11/2011, volvidos quase 6 anos da data prevista para cumprimento do acordo.  Conclui que tal facto demonstra “um claro desinteresse das partes no cumprimento do acordo pelo que é questionável se o incumprimento definitivo é da responsabilidade da insolvente”.
Ora, o certo é que a insolvente, nos termos contratuais, deveria proceder ao agendamento da escritura de compra e venda definitiva.
Não se vê que o tenha feito, e acabou por ser o recorrido quem procedeu à marcação da escritura.
Foi muito tempo depois da celebração do contrato promessa?
Objectivamente sim (mais de cinco anos depois).
Mas nada nos autos se apurou sobre um eventual desinteresse das partes no negócio, nem qualquer facto que permita imputar a culpa da não celebração do contrato prometido ao apelado.
Mostra-se, assim, plenamente provada a existência de um crédito do recorrente sobre a insolvente, decorrente do incumprimento definitivo do contrato-promessa.
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l)  Defende ainda a recorrente, não ter ocorrido a entrega ou tradição do imóvel objecto do contrato-promessa.
A esse respeito diremos que a “traditio” exigida para que se constitua o direito de retenção nos termos do artº 755º nº 1, al. f) do Código Civil, impõe apenas a detenção material lícita da coisa, não sendo necessário, para esse efeito, uma posse (cf. Acórdão da Relação de Coimbra de 15/1/2013, Relator Henrique Antunes, e Acórdão da Relação do Porto de 25/10/2016, Relator Rui Moreira, ambos consultados na “internet” em www.dgsi.pt).
O exercício do direito de retenção assenta numa detenção lícita da coisa, que pode traduzir-se tanto em posse, como em detenção ou posse precária.
A entrega antecipada do imóvel na vigência do contrato-promessa, não é um efeito do contrato, mas resulta de uma convenção de natureza obrigacional entre o promitente vendedor (dono da coisa) e o promitente-comprador.
Assim, e em regra, o promitente-comprador que obteve a “traditio” apenas frui um direito de gozo que exerce em nome do promitente vendedor e por tolerância deste (é, nesta perspectiva, um detentor precário nos termos do artº 1253º do Código Civil, agindo não com “animus possidendi”, mas apenas com “corpus” possessório (cf. Acórdão do S.T.J. de 14/6/2011, Relator Fonseca Ramos, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
Como se decidiu no Acórdão do S.T.J. de 25/3/2014 (Relator Azevedo Ramos, consultado na “internet” em www.dgsi.pt), “é possível concluir que, radicando o direito de retenção num contrato-promessa, não é necessário que o beneficiário da promessa tenha a posse da coisa objecto do contrato prometido.  É suficiente que a detenha, por simples tradição.  A tradição de que fala a alínea f), do nº 1, do art. 755º do CC não se confunde com a posse e pode existir sem esta”.
Como explica Antunes Varela (in Revista “Decana”, Ano 124, pg. 351), o direito de retenção é hoje um verdadeiro direito real de garantia, que não de gozo, em virtude do qual o promitente-comprador que seja credor da indemnização prevista no artº 442º do Código Civil, goza, contra quem quer que seja, da faculdade de não abrir mão da coisa enquanto se não extinguir o seu crédito.
Trata-se, pois, de um direito que, decorrendo apenas de uma certa conexão eleita pela lei, e não, por exemplo, da própria natureza da obrigação, representa uma garantia directa e especialmente concedida pela lei.  Desde que o credor tenha um crédito relacionado, nos termos legalmente previstos, com a coisa retida, reconhece-se-lhe o direito de garantia, válido “erga omnes”.
Há, porém, que distinguir dois diferentes direitos, que podem surgir na esfera jurídica do promitente-comprador com tradição :  Um direito pessoal de gozo sobre a coisa, que radica na entrega ou tradição desta, e que se assemelha, por exemplo, ao do locatário ou do comodatário ;  e um direito real de garantia (o direito de retenção).
Só por si, o contrato-promessa não é susceptível de transmitir a posse ao promitente-comprador :  Se este obtém a entrega da coisa antes da celebração do contrato prometido, adquire o “corpus” possessório, mas não o “animus possidendi”, ficando, pois, na situação de mero detentor ou possuidor precário.
Daí que se entenda que a tradição da coisa, móvel ou imóvel, realizada a favor do promitente comprador, no caso de promessa de compra e venda sinalizada, não investe o “accipiens” na qualidade de possuidor da coisa.
Com efeito, refere Antunes Varela (in Rev. Leg. Jur., Ano 124º, pgs. 347 a 349), o “que a entrega (tradição) do móvel ou imóvel atribuiu ao promitente comprador é um direito pessoal de gozo sobre a coisa”, sendo que estes direitos, “compreendendo embora as faculdades de uso e fruição da coisa”, “assentam sempre sobre a pura expectativa da alienação prometida, e não podem, por essa razão, exceder os limites impostos por tal situação”.
Por sua vez, o conceito de tradição da coisa foi profusamente tratado no Acórdão do S.T.J. de 19/4/2001 (publicado na Rev. Leg. Jur., Ano 133º, pgs. 367 e ss., com Anotação do Prof. Calvão da Silva), onde se refere :
“A tradição da coisa exprime, na disciplina dos direitos reais, a transmissão da detenção de uma coisa entre dois sujeitos de direito, sendo constituída por um elemento negativo (o abandono pelo antigo detentor) e um elemento positivo, a tradicionalmente chamada apprehensio (acto que exprime a tomada de poder sobre a coisa)”.
“A alínea b) do artigo 1263º do C.C., na esteira de uma velha tradição romanista, confere igual valor à tradição material e à tradição simbólica”.
“É no elemento positivo da traditio (apprehensio) que se verificam as variações que explicam a distinção entre tradição material e tradição simbólica”.
“A tradição é material quando, p. ex., o livreiro entrega em mão o livro ao comprador, ou o vendedor de uma casa leva o comprador a entrar nela, abandonando-a de seguida ;  será simbólica quando o vendedor de um apartamento entrega as chaves ao comprador, ou o vendedor de uma quinta entrega ao comprador os títulos ou os documentos que justificavam o seu direito, ou, como nos antigos costumes, lhe entregava uma porção de terra do prédio ou, p. ex., uma cepa de uma vinha”.
“A tradição material é, portanto, a realizada através de um acto físico de entrega e recebimento da própria coisa ;  a tradição simbólica é o resultado do significado social ou convencional atribuído a determinados gestos ou expressões”.
“A relevância atribuída à tradição simbólica foi a natural consequência de nem sempre a apprehensio poder ser materialmente realizada, por impossibilidade objectiva ou subjectiva, mas o seu uso generalizou-se e diversificou-se de acordo com as necessidades do comércio jurídico”.
“O valor simbólico de um acto depende, naturalmente, do tipo de coisa que se transmite, como supra ficou exemplificado e explicado”.
Mas também a traditio material varia de configuração e intensidade, de acordo com a natureza da coisa alienada”.
“A chamada traditio longa manu ou traditio oculis et affectu, que exprimiam o consenso das partes junto das coisas transmitidas, com o significado de abandono e apprehensio, sofreu, nos direito romano e comum, uma evolução no seio da tradição material, para formas atenuadas de transmissão da coisa”.
“A traditio material, suposta pelo legislador, não implica, portanto, um acto plasticamente representável, de largar e tomar, bastando-se com a inequívoca expressão de abandono da coisa e a consequente expressão de tomada de poder material sobre a mesma, por parte do beneficiário”.
E, conforme se salienta no Acórdão do S.T.J. de 16/2/2016 (Relatora Maria Clara Sottomayor, consultado na “internet” em www.dgsi.pt), a “traditio” configura-se como o poder de facto sobre a coisa que o promitente vendedor conferiu ao promitente comprador, passando este a ter uma relação material com a coisa, revelada em actos materiais ou simbólicos demonstrativos do controlo que tem sobre a mesma, que fica na sua disponibilidade, renunciando, simultaneamente, o promitente vendedor do poder que tinha sobre ela.
A tradição basta-se com este poder de facto e não necessita de ser tão enérgica como na aquisição originária, porque está em causa apenas a transferência do poder do promitente-vendedor para o promitente comprador, e não a aquisição de um direito novo.
O conceito legal de tradição do imóvel é, assim, o principal requisito ou elemento constitutivo do direito de retenção, excluindo-se este direito em todos os casos em que se verifique que, afinal, o promitente comprador não deu ao imóvel uso real, permanente e efectivo, afectando-o à satisfação dos seus interesses e necessidades de forma que se justificasse a tutela reforçada da confiança na estabilidade da sua posição jurídica.
Revertendo ao caso dos autos, face aos factos provados, são de considerar verificados os necessários pressupostos da tradição da coisa da coisa prometida.
Na verdade apurou-se que, nos termos do contrato promessa, a insolvente transmitiu a posse do imóvel objecto do contrato prometido para o recorrido, a partir da data da celebração do mesmo (1/9/2006), a posse do imóvel.
Mais foi acordado que o recorrido poderia utilizar e usufruir do imóvel como entendesse, podendo, nomeadamente, arrendá-lo e fazer suas as rendas recebidas.
Mais se apurou que, a partir da referida data (1/9/2006), o apelado passou a utilizar e a ocupar o imóvel como quis, utilizando-o, nomeadamente, como casa de férias e como residência para a sua filha quando esta esteve a trabalhar no Algarve.
Entrou, assim, no uso, gozo e fruição do imóvel.
Tais factos devem ser interpretados “como a expressão possível de domínio material” por parte do promitente comprador sobre o imóvel, o que mostra que a recepção do mesmo “se não resumiu a um simples acordo ou expressão verbal, sem consequências físicas, mas se materializou nos actos de detenção que, até aí, eram possíveis” (cf. Acórdão do S.T.J. de 25/3/2014, Relator Azevedo Ramos, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
Assim sendo, a tradição do imóvel, efectuada a favor do recorrido, é válida e eficaz, integrando o direito de retenção daquele, previsto no artº 755º nº 1, al. f) do Código Civil.
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m)  Vejamos, por fim, a questão da qualidade de consumidor do promitente comprador (o recorrido).
Defende a recorrente que o recorrido (promitente comprador) não preenche o conceito legal de consumidor previsto no artº 2º nº 1 da Lei nº 24/96, de 31/7, porquanto o mesmo não teria utilizado o imóvel objecto do contrato promessa para o fim que a este lhe havia sido destinado e que era o de habitação.
A propósito da controvérsia jurídica de saber se, num contrato promessa com eficácia meramente obrigacional (que não é o caso), o promitente-comprador, que tendo entregue o sinal e obtido a tradição da coisa objecto do contrato-prometido, goza ou não do direito de retenção sobre ela, caso o Administrador de Insolvência opte por não cumprir o contrato promessa, o S.T.J., no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 4/2014, de 20/3/2014 (Relator Fernandes do Vale, publicado no D.R., 1ª série, de 19/5/2014), acabou por firmar Jurisprudência nos seguintes termos :
“No âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor promitente-comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente obrigacional com “traditio”, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, goza do direito de retenção nos termos do estatuído no artigo 755º, nº 1, alínea f) do Código Civil”.
Decorre deste Acórdão que, no âmbito da graduação de créditos em insolvência, o promitente comprador apenas goza do direito de retenção previsto no artº 755º nº 1, al. f), do Código Civil se detiver, simultaneamente, a qualidade de consumidor.
De facto, interpretando restritivamente o artº 755º n.º 1, al. f) do Código Civil, o S.T.J., no Acórdão uniformizador referido, pronunciou-se em termos de só atribuir o direito de retenção ao promitente comprador consumidor, recusando, expressamente, tal garantia aos demais.
Assim, se tiver havido tradição da coisa e o promissário da transmissão for um consumidor, o direito à restituição do sinal em duplicado será um crédito garantido pelo direito de retenção do artº 755º nº 1, al. f) do Código Civil.  Se for um profissional será só um crédito comum (cf. Catarina Serra, in “Lições de Direito da Insolvência”, 2018, pgs. 240 e 241).
Apesar desta exigência (quanto à qualidade do promitente comprador consumidor), o conceito de consumidor não foi, porém, objecto do âmbito da uniformização.
Todavia, na fundamentação do Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 4/2014, o conceito de consumidor adoptado corresponde à visão mais restrita, constante da Lei nº 24/96, de 31/7, que é, também, a do Decreto-Lei nº 24/2014 de 14/2, mostrando-se definido, na nota 10 do aludido Acórdão, da seguinte forma :  “o promitente comprador é, in casu, um consumidor no sentido de ser um utilizador final com o significado comum do termo, que utiliza os andares para seu uso próprio e não com escopo de revenda”.
Ou seja, para que se reconheça o direito de retenção do promitente comprador, tem de se exigir que este, além de ter obtido a tradição do imóvel negociado, revista a qualidade de consumidor prevista no artº 2º nº 1 da Lei nº 24/96, de 31/7, excluindo, portanto, o promitente comprador que não seja consumidor e competindo ao credor reclamante (promitente comprador) a alegação e prova dessa qualidade de consumidor, por aplicação da regra geral do artº 342º nº 1 do Código Civil, visto a qualidade de consumidor ser um elemento constitutivo essencial da garantia real/direito de retenção (veja-se, por todos, o Acórdão da Relação de Guimarães de 2/5/2019, Relator Alcides Rodrigues, que seguimos ao longos deste Acórdão, e que se encontra disponível na “internet” em www.dgsi.pt).
Tomando, pois, como referencial a noção de consumidor prescrita no artº 2º nº 1 da Lei nº 24/96, de 31/7, “considera-se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios”.
É assim a finalidade do acto em causa que determina, essencialmente, a qualificação do consumidor como sujeito do regime de benefício que aquele diploma instituiu.
Por sua vez, o Decreto-Lei nº 24/2014, de 14/2, que transpôs para o nosso ordenamento jurídico a Directiva 2011/83/EU do Parlamento e do Conselho Europeus, define como consumidor a pessoa singular que actue com fins que não se integrem no âmbito da sua actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional (artº 3º al. c)).
Partindo daquela concepção legal, a Jurisprudência maioritária vem entendendo que se deve atender ao “conceito restrito, funcional, segundo o qual consumidor é a pessoa singular, destinatário final do bem transaccionado, ou do serviço adquirido, sendo-lhe alheio qualquer propósito de revenda lucrativa” (cf. Acórdão do S.T.J. de 17/11/2015, Relator Fonseca Ramos, consultado na “internet” em www.dgsi.pt), ou, noutra formulação, consumidor é “aquele que adquirir bens ou serviços para satisfação de necessidades pessoais e familiares (uso privado) e para outros fins que não se integrem numa actividade económica levada a cabo de forma continuada, regular e estável”, “relevante é que não seja dado ao bem adquirido um uso profissional” (cf. Acórdão do S.T.J. de 13/7/2017, Relator Pinto de Almeida, consultado na “internet” em www.dgsi.pt).
Numa síntese desse entendimento maioritário, diz o Acórdão do S.T.J. de 9/4/2019 (Relator Raimundo Queirós, consultado na “internet” em www.dgsi.pt), que consumidor para tal efeito é o promitente-comprador que destina o imóvel a uso particular no sentido de não o comprar para revenda nem o afectar a uma actividade profissional ou lucrativa.
Na Doutrina Carlos Ferreira de Almeida (in “Direito do Consumo”, 2005, pg. 50) refere que “parece, em princípio, mais ajustado que, quando se adopte um conceito genérico e supletivo de consumidor, ele se contenha em limites restritos, relacionados apenas com o uso pessoal ou familiar de bens fornecidos (ou disponíveis para fornecer) por quem exerça uma actividade profissional”.
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n)  Feita esta análise verifica-se que, no caso “sub judice”, o recorrido detém um crédito de 400.000 € sobre a insolvente, correspondente ao valor que lhe pagou num contrato promessa de compra e venda de um imóvel, definitiva e culposamente incumprido sem culpa daquele.
Em momento anterior a esse incumprimento, o apelado  obteve a tradição do imóvel objecto do referido contrato promessa por parte da insolvente.
Verifica-se, por último, que o recorrido é uma pessoa singular e destina a fracção por ele pretendida adquirir a sua habitação própria (sendo irrelevante que se trate de uma segunda habitação).
O mesmo é dizer que destina o bem objecto do contrato promessa a um uso não profissional, não se mostrando apurado nos autos que tivessem qualquer propósito de revenda lucrativa do referido bem.
Conclui-se, por isso, que o recorrido preenche o conceito de consumidor, nos termos e para os efeitos do disposto no artº 2º nº 1 da Lei nº 24/96 de 31/7.
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o)  Deste modo, conclui-se que a apelação deduzida não merece provimento, sendo de manter a Sentença recorrida.

III – Decisão
Pelo exposto decide-se julgar a apelação improcedente e confirmar a decisão recorrida.
Custas :  Pela recorrente (artigo 527º do Código do Processo Civil).

Processado em computador e revisto pelo relator

Lisboa, 25 de Agosto de 2023
Pedro Brighton