Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
913/23.1T8ENT.E1
Relator: ANABELA LUNA DE CARVALHO
Descritores: PERSI
EXTINÇÃO
CARTA MISSIVA
Data do Acordão: 11/23/2023
Votação: MAIORIA COM * VOT VENC
Texto Integral: S
Sumário: Uma carta em que a instituição bancária comunica ao cliente que o PERSI em que o mesmo havia sido integrado se extinguiu por terem decorrido 91 dias, sem qualquer outra menção factual ou normativa, não tem eficácia extintiva desse procedimento.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 913/23.1T8ENT.E1
2ª Secção

Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I
Em 21-03-2023 o Banco (…), S.A. instaurou a presente execução para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo comum ordinário, contra (…) e (…), apresentando como título executivo uma livrança alegadamente subscrita por ambos os executados, vencida em 06-03-2023 e cujo restante teor se considera integralmente reproduzido, designadamente na parte em que nela consta «ILS 3056156702».
Conclusos os autos para prolação de despacho liminar, foi em 27-04-2023 proferido despacho com a ref.ª 93148320, com o seguinte teor:
«Antes de mais, importa esclarecer qual a concreta natureza do crédito que esteve na base da emissão da livrança dada à execução tendo em vista aferir se, sendo caso disso, o exequente deu cumprimento ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) estipulado no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10.
De facto, e na esteira do que tem sido pacificamente entendido ao nível jurisprudencial, sendo o PERSI obrigatório, o seu cumprimento consubstancia uma condição objetiva de procedibilidade para a execução, impondo-se, por conseguinte, perante o seu eventual desrespeito, a absolvição do executado da instância por procedência de exceção dilatória inominada insanável de conhecimento oficioso – artigos 573.º, n.º 2, e 578.º do Código de Processo Civil.
Destarte, convido o exequente a alegar e demonstrar, no prazo de 10 (dez) dias, o que tiver por conveniente a propósito da questão ora suscitada».
Em resposta de 16-05-2023 junta sob a ref. 9690276, veio o exequente juntar quatro documentos, a saber:
1.º - Carta datada de 31-08-2022, tendo como destinatária a aqui executada e o seguinte teor:
«(…)
Assunto: Responsabilidades em incumprimento
N/Refª.: (…)
(…)
Como é do conhecimento de V. Exa., encontram-se ainda por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo. Face ao exposto, na data de emissão desta carta, foi V.Exa. integrado(a) no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e está a ser acompanhado por uma Unidade de Recuperação.
No caso de, entretanto, já ter procedido à regularização dos valores identificados, ou estar em curso a formalização de um acordo de pagamento ou de uma proposta de reestruturação, agradecemos que considere esta carta sem efeito.
Na eventualidade de não ter condições para regularizar integralmente os valores em atraso, deverá V. Exa. enviar-nos no prazo máximo de 10 dias, a documentação abaixo indicada, comprovativa da sua situação financeira, para que se possa proceder a uma avaliação correta da capacidade financeira de V. Exa. e ponderar pela apresentação de eventual proposta de regularização:
(a) cópia da última certidão de liquidação do imposto sobre o rendimento de pessoas singulares disponível;
(b) comprovativo do rendimento auferido por V. Exa., nomeadamente a título de salário, remuneração pela prestação de serviços ou prestações sociais;
(c) descrição e quantitativo dos encargos que V. Exa. suporta, nomeadamente com obrigações decorrentes de contratos de crédito, incluindo os celebrados com outras instituições de crédito.
(…)
Para mais informações agradecemos que contacte os nossos serviços através do número de telefone do Centro de Contactos do (…), abaixo indicado, ou através dos canais habituais.
Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidor, disponível em www.consumidor.pt.”.
(…)»;
2.º - Carta também datada de 31-08-2022, tendo como destinatário o aqui executado e o seguinte teor:
«(…)
Assunto: Responsabilidades em incumprimento
N/Refª.: (…)
(…)
Como é do conhecimento de V. Exa., encontram-se ainda por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo. Face ao exposto, na data de emissão desta carta, foi V.Exa. integrado(a) no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e está a ser acompanhado por uma Unidade de Recuperação.
No caso de, entretanto, já ter procedido à regularização dos valores identificados, ou estar em curso a formalização de um acordo de pagamento ou de uma proposta de reestruturação, agradecemos que considere esta carta sem efeito.
Na eventualidade de não ter condições para regularizar integralmente os valores em atraso, deverá V. Exa. enviar-nos no prazo máximo de 10 dias, a documentação abaixo indicada, comprovativa da sua situação financeira, para que se possa proceder a uma avaliação correta da capacidade financeira de V. Exa. e ponderar pela apresentação de eventual proposta de regularização:
(a) cópia da última certidão de liquidação do imposto sobre o rendimento de pessoas singulares disponível;
(b) comprovativo do rendimento auferido por V. Exa., nomeadamente a título de salário, remuneração pela prestação de serviços ou prestações sociais;
(c) descrição e quantitativo dos encargos que V. Exa. suporta, nomeadamente com obrigações decorrentes de contratos de crédito, incluindo os celebrados com outras instituições de crédito.
(…)
Para mais informações agradecemos que contacte os nossos serviços através do número de telefone do Centro de Contactos do (…), abaixo indicado, ou através dos canais habituais.
Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidor, disponível em www.consumidor.pt.”.
(…)»;
3.º - Carta datada de 30-11-2022, tendo como destinatária a aqui executada e, neste caso, do seguinte teor:
«(…)
Assunto: Responsabilidades em incumprimento
N/Refª.: (…)
(…)
Verificamos que permanecem em mora as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, em que V. Exa. figura como interveniente e obrigado da(s) responsabilidade(s) assumidas pelo(a) Sr.(…).
No caso de, entretanto, já ter procedido à regularização dos valores identificados, ou estar em curso a formalização de um acordo de pagamento ou de uma proposta de reestruturação, agradecemos que considere esta carta sem efeito.
Informamos que, na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades supra mencionadas, consideramos extinto o referido procedimento.
Assim, se decorridos que sejam 15 dias sobre a data de emissão desta carta se mantenham por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro que anexamos, o Banco reserva-se o direito de, verificadas que sejam as condições legais previstas para o efeito – conforme informações adicionais – promover pela resolução do(s) contrato(s) e avançar com a execução judicial dos créditos.
Sem prejuízo do referido anteriormente, relembramos que ainda poderá contactar a Unidade de Recuperação através do número de telefone do Centro de Contactos de Banco (…), abaixo indicado, com vista à regularização extrajudicial das referidas responsabilidades de crédito.
Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidor, disponível em www.consumidor.pt.”.
(…)»;
4.º - Carta também datada de 30-11-2022, tendo como destinatário o aqui executado e o seguinte teor:
«(…)
Assunto: Responsabilidades em incumprimento
N/Refª.: (…)
(…)
Vimos por este meio informar que, na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro em anexo, consideramos extinto o referido procedimento.
Assim, se decorridos que sejam 15 dias sobre a data de emissão desta carta se mantenham por regularizar as responsabilidades de crédito melhor identificadas no quadro que anexamos, o Banco reserva-se o direito de, verificadas que sejam as condições legais previstas para o efeito – conforme informações adicionais – promover pela resolução do(s) contrato(s) e avançar com a execução judicial dos créditos.
Sem prejuízo do referido anteriormente, relembramos que ainda poderá contactar a Unidade de Recuperação através do número de telefone do Centro de Contactos de Banco (…), abaixo indicado, com vista à regularização extrajudicial das referidas responsabilidades de crédito.
(…)
Informamos que existe uma rede de apoio ao consumidor endividado. As informações sobre esta rede poderão ser consultadas no “Portal do Consumidor, disponível em www.consumidor.pt.”.
(…)».

- Foi então proferido o despacho de 15-06-2023 plasmado na ref.ª 93600129:
«Analisados os teores dos documentos juntos pelo exequente através da ref.ª 9690276 de 16-05-2023, faculto-lhe um prazo de 10 (dez) dias para exercer, querendo, o respetivo contraditório acerca da eventual adoção do entendimento de acordo com o qual as cartas de comunicação de extinção do PERSI não são suscetíveis de traduzir o cabal cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, por não indicarem o concreto fundamento legal da extinção nem, de forma conveniente, as concretas razões de facto pelas quais foi considerada inviável a manutenção do procedimento».
- A resposta surgiu por intermédio da ref.ª 9835779 de 05-07-2023, em termos que se consideram reproduzidos, aí concluindo o exequente que, no seu entendimento, «estão integralmente preenchidos os requisitos legais, pois que das cartas remetidas aos Executados constam expressamente os motivos que determinaram a extinção do procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento, por referência ao Decreto-Lei 227/2012 e aos fundamentos materiais que impuseram tal extinção – no caso, o mero decurso do tempo de 91 dias, sem qualquer regularização das responsabilidades em incumprimento».
- Na sequência, o Mm.º Juiz a quo proferiu decisão julgando oficiosamente verificada a exceção dilatória inominada insanável decorrente do desrespeito, pelo exequente, da demonstração do válido cumprimento da obrigação de comunicação de extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento instituído pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, e, em consequência, absolveu os executados da instância executiva, indeferindo liminarmente o requerimento executivo, com referência aos artigos 573.º, n.º 2, 576.º, n.ºs 1 e 2, 578.º, e 726.º, n.º 2, alínea b), todos do Código de Processo Civil.

Inconformado com tal decisão, veio o exequente recorrer assim concluindo as suas alegações de recurso:
1. A douta sentença recorrida indeferiu liminarmente o requerimento executivo, porquanto entendeu que as comunicações remetidas aos Mutuários relativas à extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) não cumpriram os requisitos legalmente exigidos pelo artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 na redação em vigor e pelo artigo 8.º do Aviso do Banco de Portugal n.º 17/2112.
2. A integração dos devedores no PERSI foi comunicada por cartas de 30.08.2022, onde o Banco solicitava especificamente quais os documentos necessários para proceder à avaliação da capacidade financeira dos devedores, para efeitos de apresentação de proposta e solicitava o contacto, indicando os meios ao dispor para esse efeito.
3. Estas cartas incluíam dois anexos: o primeiro identificava pormenorizadamente o crédito em dívida (montante, data de vencimento, taxa de juro aplicável) e o segundo explicava o que é o PERSI, quais as garantias e deveres do devedor, bem como o procedimento a adotar e a forma de extinção.
4. Consta expressamente do Anexo II que o PERSI se extingue no 91.º dia seguinte ao seu início se não for prorrogado por acordo entre as partes.
5. Uma vez que as responsabilidades em dívida não foram regularizadas e que os mutuários nada disseram e nada remeteram, o Banco Recorrente, na data de 30.11.2022 remeteu-lhes novas cartas, agora comunicando “que, na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades supra mencionadas, consideramos extinto o referido procedimento (*)”.
6. No caso dos autos, o fundamento de extinção do procedimento operou de forma automática, por força da Lei, nos termos do disposto no artigo 1.º, alínea c), do artigo 17.º do DL supra referido, pelo que as comunicações de 30.11.2022 respeitaram todos os requisitos que lhe são impostos pelo disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 na redação em vigor e pelo artigo 8.º do Aviso do Banco de Portugal n.º 17/2112.
7. Efetivamente, no entender do Banco Exequente, não lhe era exigível a demonstração das razões da inviabilidade da manutenção do procedimento, para além da referência ao decurso do prazo de 91 dias desde a inclusão dos Clientes em PERSI – o que foi feito – uma vez que a carta de integração no PERSI datada de 31.08.2022 explicava claramente que o procedimento se extinguia decorridos que fossem 91 sobre o seu início, exceto se prorrogado por acordo entre as partes.
8. A explicação das razões da inviabilidade da manutenção do procedimento só faz sentido quando a extinção do PERSI tenha por fundamento, não o simples decurso do prazo, como sucedeu no caso sub judice, mas antes uma qualquer das situações em que o Banco decide pôr termo ao processo ao abrigo do disposto no n.º 2 do mesmo artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 na redação em vigor.
9. Este entendimento já foi, aliás, diversas vezes perfilhado por este Tribunal, nomeadamente nos seus Acórdãos de 09.02.2023 (proferido no âmbito do processo n.º 3358/20.1T8ENT.E1); 11.05.2023 (proferido no processo n.º 3309/20.3T8ENT.E1); 26.05.2022 (referente ao processo n.º 18/22.2T8ENT.E1) e de 15.06.2023 (proferido no processo n.º 93/23.2T8ENT.E1).
10. A sentença recorrida violou, por deficiente interpretação e aplicação, o disposto no artigo 9.º do C.C., 17.º, n.º 1, alínea c), n.º 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10.
A final requereu a revogação da decisão recorrida e a sua substituição por outra que admita o requerimento inicial e ordene o prosseguimento dos autos.

Não foram apresentadas contra-alegações.

II
Do objeto do recurso:
Considerando a delimitação que decorre das conclusões das alegações (artigos 635.º, 3 e 639.º, 1 e 2, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (artigo 608.º, in fine), o ponto em discussão é o seguinte:
- Se as comunicações remetidas aos mutuários relativas à extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), cumpriram os requisitos legalmente exigidos pelo artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, sendo, por isso, aptas à extinção do procedimento.
Ou, de outra forma:
- Se a mera referência à permanência da mora aos 91 dias de integração no PERSI, permite dar por extinto o referido procedimento, sem que a entidade bancária careça de indicar ao devedor as razões que inviabilizaram a sua manutenção.

III
Os Factos:
A factualidade a considerar resulta integralmente do relatório supra.

IV
O Direito:
O Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25-10 visou criar uma série de medidas preventivas de incumprimento (Plano de Ação para o Risco de Incumprimento – PARI) e, caso já exista incumprimento, um procedimento de regularização do mesmo (Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento – PERSI) que passa pela identificação das razões do incumprimento das obrigações e pela adoção de medidas/propostas viáveis e suscetíveis de reverter o incumprimento.
Não se discute nos autos a obrigatoriedade da inclusão dos executados no PERSI, reconhecida que está essa obrigatoriedade pelo próprio exequente através das diversas comunicações que enviou aos executados e que documentou nos autos com o articulado-resposta de 16-05-2023.
Tal o impõe a natureza do contrato de crédito pessoal que a livrança garante, nos termos do artigo 2.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, que dispõe:
«1 - O disposto no presente decreto-lei aplica-se aos seguintes contratos de crédito celebrados com clientes bancários:
(…)
c) Contratos de crédito aos consumidores abrangidos pelo disposto no Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de junho, na sua redação atual».
O que importa apreciar é se o PERSI se mostra validamente extinto através das comunicações datadas de 30-11-2022, enviadas pelo exequente aos executados, permitindo àquele executá-los.
Fundamentou a 1ª instância que:
“[a]lém de não ser indicada qualquer base legal de suporte, o que só por si constitui uma fragorosa violação dos artigos 17.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 227/2012 e 9.º, alínea a), do Aviso 7/2021, aos executados foi transmitido que os procedimentos se extinguiram «na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades», mas nenhuma palavra se acrescentou no sentido de, «em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis», informá-los em que concretas razões se terá baseado a inviabilidade da manutenção dos procedimentos, descrevendo os concretos factos materiais e objetivos que determinaram a extinção ou que justificaram a decisão de pôr termo aos mesmos.”
Idêntico entendimento foi por nós corroborado como adjunta, no âmbito do Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora de 07/04/2022, Proc. 451/21.7T8ENT.E1, (Graça Araújo) in www.dgsi.pt, assim sumariado:
«Uma carta em que a instituição bancária comunica ao cliente que o PERSI em que o mesmo havia sido integrado se extinguiu por terem decorrido 91 dias, sem qualquer outra menção, não tem eficácia extintiva desse procedimento.»
No mesmo sentido, o desenvolvido Acórdão deste TRE de 25-11-2021, Proc. 17026/20.0T8PRT.E1 (Adelaide Domingos), no mesmo site.
Fundamentando-se esse entendimento, em primeira linha, na letra da lei.
Assim, o artigo 17.º do DL 227/2012 que regula as situações de extinção do PERSI, sendo de salientar o seguinte segmento normativo.
«1- O PERSI extingue-se:
(…)
c) No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação;
(…)
«3 - A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento.
4 - A extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1.
5 - O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no n.º 3». (sublinhados nossos).
Do artigo 17.º, n.º 1, alínea c), n.ºs 3 e 4, transcritos, decorre que o PERSI se extingue no 91.º dia subsequente à data da integração do cliente bancário neste procedimento (salvo se as partes tiverem acordado por escrito a sua prorrogação, o que não se mostra alegado), devendo a extinção ser comunicada ao cliente bancário em suporte duradouro «(…) descrevendo o fundamento legal para a extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento».
Parece-nos claro face à letra da lei e à interpretação sistemática do n.º 1, alínea c), com os nºs 3 e 4 do artigo 17.º, que a eficácia da extinção do PERSI depende da sua comunicação ao devedor, e que essa declaração deve conter quer as razões de facto, quer a norma jurídica que fundamentam tal extinção.
Em reforço desse entendimento, o n.º 5 do artigo 17.º que remete para Aviso do Banco de Portugal definidor dos elementos informativos que devem acompanhar a comunicação de extinção, sendo esse um instrumento normativo regulamentar de acatamento obrigatório para as instituições bancárias.
Assim, o atual Aviso do Banco de Portugal n.º 7/2021, cujo artigo 9.º dita:
«Comunicação de extinção do PERSI
A comunicação pela qual a instituição informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, os seguintes elementos:
a) Descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de pôr termo ao referido procedimento, com indicação do respetivo fundamento legal;
b) Identificação das consequências da extinção do PERSI nos casos em que não tenha sido alcançado um acordo entre as partes, devendo ser feita, em particular, referência à possibilidade de resolução do contrato e de execução judicial dos créditos e explicitadas as condições que, de acordo com o regime jurídico aplicável ao contrato de crédito em causa, têm de estar preenchidas para que a instituição possa proceder à resolução desse contrato;
c) Apresentação de informação sobre as disposições previstas no Decreto-Lei n.º 74-A/2017, de 23 de junho, a respeito do direito à retoma do contrato de crédito, quando esteja em causa um contrato de crédito à habitação;
d) Identificação das situações em que o cliente bancário pode solicitar a intervenção do Mediador do Crédito mantendo as garantias associadas ao PERSI;
e) Indicação dos elementos de contacto da instituição através dos quais o cliente bancário pode obter informações adicionais ou negociar soluções para a regularização da situação de incumprimento» (sublinhados nossos).
Só perante este conjunto de informações poderá o cliente bancário aferir da regularidade e legalidade de todo o procedimento, em particular quando é demandado judicialmente pela instituição. E, tratando-se da extinção do PERSI, só conhecendo os concretos motivos que levaram à decisão da instituição bancária se poderá, efetivamente, defender.
Comunicar apenas que «na sequência de terem decorrido 91 dias da integração no PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento e permanecendo em mora as responsabilidades supra mencionadas, consideramos extinto o referido procedimento», como decorre dos factos, sem sequer indicar o dispositivo legal que o fundamenta, não preenche as exigências legais.
Exigências legais que, como se colhe do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, assentam, entre outros, nos seguintes critérios: na importância de uma atuação prudente, correta e transparente das referidas entidades em todas as fases das relações de crédito estabelecidas com os seus clientes enquanto consumidores”, na “necessidade de um acompanhamento permanente e sistemático, por parte de instituições, públicas e privadas, da execução dos contratos de crédito, bem como ao desenvolvimento de medidas e de procedimentos que impulsionem a regularização das situações de incumprimento daqueles contratos”, na necessidade de “atentas as assimetrias de informação entre consumidores e instituições de crédito, a eficaz implementação das medidas previstas neste diploma depende da criação de uma rede que apoie os consumidores em dificuldades financeiras, nomeadamente através da prestação de informação, do aconselhamento e do acompanhamento nos procedimentos de negociação que estabeleçam com as instituições de crédito”.
Assim, para que a extinção do PERSI produzisse os seus efeitos seria necessário que o Banco (…), S.A. tivesse comunicado a extinção aos clientes, através de menções factuais e normativas, nos termos do artigo 17.º, n.º 3, do DL n.º 227/2012 e do artigo 9.º do Aviso do Banco de Portugal (ex vi do artigo 17.º, n.º 5, do DL n.º 227/2012), nomeadamente, para que o Banco pudesse resolver o contrato de crédito com fundamento em incumprimento e intentar ações judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito [cfr. artigos 17.º, n.º 4 e 18.º, n.º 1, alíneas a) e b), do DL n.º 227/2012].
Da decisão sobre a matéria de facto não decorre que o Banco tenha cumprido estes deveres.
Em consequência, temos por ineficaz a extinção do PERSI.
E tal acarreta, como se escreveu na decisão recorrida, o indeferimento liminar do requerimento executivo (artigo 726.º, n.º 2-b), do Código de Processo Civil).

Em suma: (…)

V
Por todo o exposto, acordamos em julgar improcedente a apelação e, em consequência, mantemos a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Évora, 23 de Novembro de 2023
Anabela Luna de Carvalho (Relatora)
Francisco Matos (1º Adjunto) – com voto de vencido.
Mário Canelas Brás (2º Adjunto)

Vencido:
A leitura do artigo 17.º do DL n.º 227/2012, de 25/10, que prevê as causas de extinção do Procedimento extrajudicial de regularização de situações de incumprimento (PERSI), distingue entre causas de extinção que ocorrem por verificação de factos objetivos – pagamento, acordo, decurso do prazo de 90 dias e insolvência do devedor – que enumera (n.º 1) e as causas de extinção promovidas pela instituição de crédito (n.º 2).
A exigência de fundamentação prevista no n.º 3 – indicação das razões pelas quais a instituição de crédito considera inviável a manutenção do procedimento – só terá lugar nos casos em que a causa de extinção resulta da iniciativa da instituição de crédito, uma vez que, só nestes casos, esta emite um juízo sobre a inviabilidade da manutenção do procedimento [perfilharam este entendimento os acórdãos desta Relação de 26/5/2022 (proc. n.º 18/22.2T8ENT.E1), de 9/2/2023 (proc. n.º 3358/20.1T8ENT.E1), de 15/6/2023 (proc. N.º 93/23.2T8ENT.E1) – (disponíveis em www.dgsi.pt) e de 23/11/2023 (proc. n.º 1195/22.8T8ENT.E1) hoje levado à tabela].
Por aplicação desta solução, julgaria procedente o recurso.
Francisco Matos