Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2245/17.5T8STR.E1
Relator: JOSÉ ANTÓNIO MOITA
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
EQUIDADE
Data do Acordão: 10/26/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 - No caso do apuramento do dano consistente na perda de capacidade de ganho , que integra o dano patrimonial futuro , a jurisprudência dos Tribunais Superiores tem vindo a defender um critério que poderemos considerar misto, uma vez que parte da factualidade concretamente provada em cada caso, admitindo o recurso a critérios objectivos, aceitando (sem lhes reconhecer, porém, qualquer obrigatoriedade de observância por parte do Juiz no âmbito do cômputo da indemnização), os plasmados na Portaria n.º 377/2008, de 26/05/2008, actualizada pela Portaria n.º 679/2009, de 25/06, utilizando-os como variáveis em fórmulas matemáticas mais ou menos complexas com vista a determinar o capital necessário para, diluído ao longo do tempo de vida do lesado juntamente com o respectivo rendimento, poder proporcionar ao mesmo o rendimento perdido e corrigindo ainda a valorização obtida com base em critérios de equidade, por força do disposto no artigo 566.º, n.º 3, do CC, este sim o critério que legalmente se impõe ao Juiz atender no âmbito da avaliação do dano patrimonial futuro dado que, em regra, não se consegue averiguar o valor exacto deste;
2 - Os danos não patrimoniais consubstanciam danos não susceptíveis de avaliação pecuniária, reportando-se a valores de ordem moral, ideal, ou espiritual.
3 - Trata-se, por conseguinte, de danos não susceptíveis de avaliação pecuniária e que não se refletem no património do lesado.
4 - O critério de fixação do montante indemnizatório de tais danos é o da equidade, sustentando a jurisprudência dos Tribunais Superiores, de forma mais ou menos unânime, que se deve atender aos valores arbitrados em situações concretas semelhantes, desta forma se garantindo coerência, segurança jurídica, melhor Justiça e salvaguardando, ainda, o princípio da igualdade.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 2245/17.5T8STR.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo Central Cível de Santarém – Juiz 1
Apelantes: Lusitânia, Companhia de Seguros SA
(…)
Apelados: Lusitânia, Companhia de Seguros SA
(…)
Fidelidade, Companhia de Seguros, SA
Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Santarém.
***
Sumário do Acórdão
(Da exclusiva responsabilidade do relator – artigo 663.º, n.º 7, do CPC)
(…)
*
Acordam os Juízes na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora no seguinte:
I – Relatório
(…) intentou a presente acção contra a Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A. e contra Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., pedindo a condenação da primeira no pagamento de uma indemnização no valor de € 58.974,24, acrescida de juros desde a citação, por danos patrimoniais e não patrimoniais decorrentes do acidente de viação de que foi vítima, sem prejuízo de posterior ampliação do pedido relativo a outros danos e despesas médicas, tratamentos e medicamentos futuros, pedido que é deduzido alternativamente contra a segunda R., caso se apure que o acidente é imputável a esta, de forma total ou parcial.
Alegou, em síntese que, no dia 9 de setembro de 2012, foi vítima de acidente de viação quando viajava como ocupante do veículo de matrícula (…), conduzido por (…), pessoa que deu causa ao acidente e cujo veículo se encontrava segurado na R. Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., e que foi embatido pelo veículo de matrícula (…), conduzido por (…), segurado na R. Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A.
Acrescentou que o acidente foi objecto de processo crime que condenou o condutor (…) pela prática, como autor material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo artigo 148.°, n.º 1, do Código Penal.
Mais invocou que caso assim não se entenda e se venha a apurar que foi o condutor do veículo de matrícula (…) que perdeu o controle do seu veículo e foi embater no veículo onde o A. viajava como ocupante, deverá a Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A. responder pelo acidente.
Referiu ainda que o acidente causou-lhe danos de natureza patrimonial e não patrimonial, sofrendo lesões traumáticas generalizadas que lhe deixaram sequelas, que o impossibilitam, de forma definitiva, de exercer a profissão habitual e profissões que exijam grande disponibilidade física, tendo recebido da Segurança Social prestações por doença no valor de € 2.826,46, bem como subsídio de desemprego no período de 17.04.2013 a 01.12.2014, no valor de € 6.788,70, não dispondo, desde então, de rendimentos, vivendo da ajuda de terceiros e dos pais.
Reclamou, a título de danos patrimoniais, o valor de € 13.369,24 relativo a perdas salariais, acrescido do rendimento na actividade agrícola e pecuária que desenvolvia, que lhe rendia pelo menos € 100,00 por mês, num total de € 6.000,00 até à data, bem como o pagamento do custo suportado com o apoio de terceira pessoa de que necessitou, no valor de € 4.875,00 e despesas com tratamentos, consultas e medicamentos, no valor de € 750,00, despesas de transporte, no valor de € 750,00 e os artigos de vestuário danificado no acidente, no valor de € 230,00.
Rematou, alegando ter sofrido igualmente danos não patrimoniais com as dores sofridas, com os problemas psicológicos devidos à ansiedade e ao medo de ficar incapacitado, com o dano estético, e com às limitações decorrentes das lesões sofridas, pedindo a condenação da R. no pagamento de uma indemnização no valor de € 33.000,00.
Citadas, ambas as Rés apresentaram contestação.
A Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., alegou, em síntese, que a responsabilidade pelo acidente é do condutor do veículo de matrícula (…) que, ao descrever uma curva, se deparou com o veículo de matrícula (…), que seguia em sentido contrário e perdeu o controle, invadindo a faixa contrária, embatendo no veículo de matrícula (…).
Acrescentou que o veículo de matrícula (…) era propriedade de (…) e era conduzido por (…), à ordem, com conhecimento, por conta e no interesse do proprietário, pelo que se presume a culpa, mais impugnando os factos alegados na petição inicial.
A Ré Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., invocou a sua ilegitimidade, por não ter responsabilidade no acidente, alegando, em síntese, que o acidente ocorreu quando o veículo (…) circulava numa via que entronca na estrada onde veio a ocorrer o embate e deveu-se ao facto de o condutor não ter respeitado o sinal de Stop, invadindo a via por onde circulava o veículo de matrícula (…).
Disse, ainda, que devido a estes factos, a Ré Lusitânia, SA, foi condenada a pagar indemnizações aos lesados no âmbito do processo crime, que correu termos, mais impugnando os factos alegados na petição inicial.
Foi citada a Segurança Social que veio reclamar o pagamento de € 1.329,31, acrescida de juros, relativo ao reembolso das prestações pagas ao Autor a título de subsídio de doença.
Houve lugar a audiência prévia, na qual foram saneados os autos, considerando-se parte legítima a R. Fidelidade, mais se identificando o objecto do litígio e indicados os temas de prova.
Por requerimento datado de 21.06.2021, o A. veio ampliar o pedido inicial de € 58.974,24 para o valor de € 145.974,24, aditando o valor de € 60.000,00 decorrente do défice funcional permanente fixado em 6 pontos e o valor de € 27.000,00, a título de danos não patrimoniais.
Oportunamente realizou-se a audiência final a que se seguiu a prolação de sentença, que contém o seguinte dispositivo:
“IV – Decisão
Termos em que julgo a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência:
a) condeno a R. Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao A. a quantia de € 46.054,62, a que acrescem juros, desde a data da sentença, à taxa legal de 4%, nos termos da Portaria n.º 291/03, de 8 de abril, ou outra taxa que lhe sobrevier, até integral pagamento;
b) absolvo a R. Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., do pedido.
Custas por A. e R. Lusitânia, na proporção do respectivo decaimento.
Registe e notifique.
*
Atento o valor da indemnização a pagar ao A., afigura-se que este deixou de ter os requisitos para que lhe seja mantido o apoio judiciário, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a), da Lei de Protecção Jurídica, aprovada pela Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto.
Nestes termos, o A. passou a dispor de meios próprios, estando em condições de dispensar o apoio judiciário inicialmente concedido, devendo suportar as custas que lhe competem.
Notifique o Ministério Público e a Segurança Social.”
*
Notificada da sentença apressou-se desde logo o Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, a requerer nos autos o seguinte:
“1 – O Instituto da Segurança Social, I.P. – Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, reclamou nos presente autos, o reembolso das prestações pagas ao Autor, a título de subsídio de doença, no valor de € 1.329,31, acrescido de juros.
2 – A douta decisão elenca como questões a decidir: “apurar a responsabilidade civil extracontratual decorrente do acidente de viação, e determinar os danos causados e o montante da indemnização e o reembolso do Instituto da Segurança Social das importâncias pagas ao A., a título de subsídio de doença, em decorrência do acidente de viação.”
3 – E considera como factos provados que o Autor, desde a data do acidente até ao dia 30 de março de 2013, esteve a receber do Instituto da Segurança Social as prestações por doença, ao abrigo do certificado temporário para o trabalho por estado de doença direta, ou seja, a baixa médica, auferindo da Segurança Social até esse período o montante de € 1.329,31.
4 – Sendo que a convicção do Tribunal se fundou, nomeadamente, na Certidão do ISS, I.P. relativa ao subsídio de doença pago ao Autor e no depoimento de parte do mesmo.
5 – Todavia, por lapso manifesto, a douta sentença não se pronuncia a final sobre o pedido de reembolso apresentado pelo ISS, I.P..
6 – Termos em que, ao abrigo do disposto nos artigos 613.º, n.º 2 e 614.º, n.º 1, do CPC, se requer a retificação da sentença.”
Nenhuma das Partes respondeu em prazo ao requerimento em apreço.

Inconformada com a sentença, veio a Co-Ré Lusitânia apresentar requerimento de recurso para este Tribunal da Relação de Évora, alinhando as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES
1. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Meritíssimo Tribunal a quo que julgou a presente acção parcialmente procedente, condenando a Seguradora Ré a pagar ao Autor a quantia de Euro 6.054,62, a titulo de indemnização por danos patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento, acrescida da quantia de Euro 40.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora desde a data da decisão até efectivo e integral pagamento.
2. Com todo o respeito, não concorda a ora apelante com a douta decisão proferida, na medida em que levou a cabo o Meritíssimo Tribunal a quo uma incorrecta apreciação da prova produzida, operando, consequentemente, um errado juízo a propósito da concreta dinâmica do acidente, bem como uma incorrecta análise jurídica da conduta estradal do condutor do veículo (…), a qual sempre se impunha julgar incumpridora do disposto nos artigos 3.º, n.º 2, 13.º, n.º 1, 18.º, n.º 2, 24.º, n.º 1, 25.º, n.º 1, c) e f), 27.º, n.º 1 e 28.º, n.º 1, b), do Código da Estrada (e isto independentemente de se conceder ou não provimento à infra requerida alteração da decisão de facto).
3. Do mesmo modo, considera ainda a Seguradora Recorrente que a douta sentença aqui posta em crise contempla desadequado juízo a propósito da existência, extensão e quantificação de alguns dos danos peticionados, mormente em sede de dano não patrimonial.
4. O Mmo. Tribunal a quo proferiu, pois, uma decisão que, além de não encontrar arrimo na prova efectivamente produzida, operando verdadeiro erro de julgamento quanto à matéria de facto, arbitrou montantes indemnizatórios a título de danos patrimoniais e não patrimoniais ao Apelado, manifestamente desadequados à natureza, relevo e extensão dos danos efectivamente sofridos por aquele, sendo que por força destas desconformidades, se mostra em verdadeira violação da lei.
DO ERRO DE JULGAMENTO QUANTO À MATÉRIA DE FACTO
DA REAPRECIAÇÃO DA PROVA:
5. O presente recurso, quanto à matéria de facto, funda-se na convicção da Seguradora Recorrente de que o Douto Tribunal a quo terá efectuado uma incorrecta apreciação da prova, e concretamente na instrução da matéria plasmada nos artigos 14º, 17º, 20º a 22º, 27º a 31º e 35º dos factos provados e 13.º, 17.º, 21.º a 29.º e 35.º a 37.º dos factos não provados, os quais se acham incorrectamente julgados.
6. Considera, assim, a Seguradora Recorrente que a prova produzida ao longo do processo não permitia que se pudesse considerar tais factos integralmente provados.
7. No que diz respeito à prova da dinâmica do evento, revestiu particular relevo, para a formação da convicção do Mmo. Tribunal a quo, o depoimento do condutor do veículo (…) e a testemunha (…).
8. Porém, e nos moldes que infra se irá evidenciar, impunha-se ao Mmo. Tribunal a quo, ponderar e valorar de forma diversa o depoimento do condutor do veículo (…), porquanto, para além do mesmo ter um claro interesse em afastar a imputação de qualquer tipo de responsabilidade (handicap este que sempre terá de ser considerado em sede de valoração da prova) o mesmo mostrou-se eivado de contradições que não podiam, de forma alguma, deixar de ser consideradas num sentido de valoração negativa do mesmo.
9. Desde logo, saliente-se que não se provou, de forma alguma, esta versão dos factos quanto à dinâmica do acidente alegada pelo próprio Autor na petição inicial – entre outras – e corroborada na contestação da Ré Fidelidade, no sentido de que o condutor do veículo seguro circulava no Caminho Municipal n.º (…) e iniciou a sua entrada no cruzamento, na Estrada Nacional n.º (…), pretendendo mudar de direcção para a esquerda, de forma inopinada, sem parar no sinal stop ali existente e, assim, se colocando na linha de trânsito na qual seguia o veículo tripulado por (…).
10. O que, desde logo, evidencia que o depoimento da testemunha (…), condutor do veículo (…), não encontrou arrimo com a realidade fáctica atinente ao modo como o acidente se deu.
11. Considerando a localização dos veículos no local do acidente, logo após a ocorrência do mesmo, de acordo com a participação de acidente de viação e do croquis elaborados por autoridade policial no local, logo após o embate, cuja elaboração e subscrição a testemunha (…), militar da GNR, confirmou, assim como a localização dos danos verificados em ambos os automóveis, não se afigura como plausível a versão da testemunha (…) de que o veículo (…) surgiu pela direito, no entroncamento.
12. Aliás, e no nosso modesto entendimento, é por demais evidente que o veículo (…) circulava na estrada nacional n.º (…), no sentido (…) – (…), só assim se explicando o facto de o local provável do embate entre os dois veículos ter ocorrido junto ao eixo das faixas de rodagem da EN n.º (…), mas já na faixa de rodagem no sentido (…) – (…), local onde existiam marcas no pavimento (ponto 32 dos factos provados).
13. Do mesmo modo, também só o facto de o veículo (…) circular na estrada nacional n.º (…), no sentido (…) – (…) explica porque é que os veículos colidiram de frente, conforme demonstram os danos verificados em ambos os automóveis e de acordo com o auto de participação do acidente, cujo teor, lembre-se, não foi impugnado.
14. Por fim, sempre se acrescentará que os danos sofridos em ambos os veículos, que ficaram completamente destruídos, e o estado do local do acidente logo após a colisão evidenciam de forma manifesta que se tratou de um embate brutal, não restando dúvidas de que o veículo (…) circulava necessariamente em excesso de velocidade para o local.
15. Foi, pois, a conduta pouco atenta, imprudente e negligente do condutor do veículo (…), que deu causa exclusiva ao acidente, o que decorre da prova produzida, tal como se passará a demostrar.
16. Para a prova dos factos que se consideram incorrectamente julgados – 14º, 17º, 20º a 22º, 27º a 31º e 35º dos factos provados e 13.º, 17.º, 21.º a 29.º e 35.º a 37.º dos factos não provados – entende a apelante Seguradora que se impõe reapreciar:
- Participação de Acidente de Viação e respectivo croquis;
- depoimento da testemunha (…); e
- depoimento da testemunha (…).
DOS PONTOS 14º, 17º, 20º a 22º, 27º a 31º E 35º DOS FACTOS PROVADOS E 13.º, 17.º, 21.º A 29.º E 35.º A 37.º DOS FACTOS NÃO PROVADOS
17. É entendimento da Seguradora Apelante que, fruto da prova produzida os autos, sempre se impunha julgar os factos 14º, 17º, 20º a 22º, 27º a 31º e 35º dos factos provados como não provados e, consequentemente, julgar os factos 13.º, 17.º, 21.º a 29.º e 35.º a 37.º dos factos não provados como provados.
18. Do depoimento da testemunha (…) decorre, desde logo, que:
- o veículo (…) circulava na EN n.º (…), no sentido (…) – (…);
- o veículo (…) circulava na EN n.º (…), no sentido (…) – (…);
- o veículo (…) circulava em excesso de velocidade para a curva;
- o embate dá-se dentro da faixa de rodagem destinado ao sentido (…) – (…);
- o embate é feito frente com frente.
19. Considerando o teor do depoimento do averiguador de sinistros, e aquilo que à data lhe foi transmitido por todos os intervenientes quanto ao modo como o acidente se deu, bem como todos os elementos por si recolhidos, uma vez mais se constata que deveria ter sido conferida credibilidade ao depoimento prestado em audiência de julgamento por (…).
20. É, ainda, de notar que a testemunha, para além de ser um profissional com experiência na averiguação da dinâmica de acidentes de viação, descreveu as averiguações por si levadas a cabo na averiguação do caso sub judice, bem como os elementos em que fundou o seu raciocínio lógico-dedutivo, não se vislumbrando, assim, qualquer motivo para desconsiderar, sem qualquer fundamento, o seu testemunho.
21. Por outro lado, deu-se, em sentido contrário, como demonstrados factos que não foram corroborados pelo depoimento das testemunhas e dos documentos constantes dos autos, nomeadamente do auto de participação de acidente de viação.
22. Não se retira do depoimento da testemunha (…) que:
- o veículo de matrícula (…) passou por si na estrada de terra batida que entronca na EN (…);
- era conduzido por (…); nem que
- ia em excesso de velocidade.
23. No seu depoimento, a testemunha (…), em momento algum, identifica o veículo de matrícula (…) e muito menos identifica quem o conduzia.
24. A testemunha apenas concluiu que, tendo passado por um automóvel num local em que, posteriormente se apercebeu, houve um acidente, esse automóvel esteve envolvido no acidente.
25. A testemunha não foi ao local do acidente, não estabeleceu qualquer relação entre a hora a que passou no local – que, aliás, nem sabe precisar – e a hora em que o acidente ocorreu e não viu o veículo acidentado, de modo a confirmar se foi o mesmo pelo qual passou.
26. Quanto à velocidade, também estamos perante uma mera perceção subjetiva, sendo certo que a testemunha, quando passou pelo veículo que não identifica se encontrava também em movimento, o que, por si só cria uma ilusão de maior velocidade.
27. A testemunha não verificou a velocidade permitida no local, não refere a que velocidade circulava no seu motociclo, nem teve oportunidade para medir a velocidade do veículo com que se cruzou.
28. Em bom rigor, o depoimento da testemunha (…) mais não passa do que um acervo de considerações e convicções subjetivas de quem, em concreto, nada viu.
29. Considerando todo este evento estradal como uma sucessão de eventos, atendendo às fotografias do local com as características do mesmo, aos depoimentos das testemunhas (aqui com especial relevo para o averiguador de sinistros …), aos danos verificados nos veículos e sua posição final pós embate, impunha-se alterar a decisão proferida quanto à matéria de facto, no que diz respeitos aos factos provados vertidos nos pontos 14º, 17º, 20º a 22º, 27º a 31º e 35º, dando-se os mesmos como não provados.
30. Precisamente, com base nos mesmos meios de prova, dever-se-iam dar como provados os pontos 13.º, 17.º, 21.º a 29.º e 35.º a 37.º dos factos não provados.
31. Ao contemplar diverso entendimento, incorreu o Mmo. Tribunal a quo em verdadeiro erro de julgamento.
DOS PONTOS 12º E 50º DOS FACTOS NÃO PROVADOS
32. No que particularmente diz respeito aos factos 12.º e 50.º dos factos dados como não provados, tem para si a Seguradora Apelante que andou mal o Mmo. Tribunal a quo a dar tais factos como não provados, uma vez que o teor de tais pontos consta dos factos provados 9 (idêntico ao ponto 12.º dos factos dados como não provados) e 2, in fine (idêntico ao teor do ponto 50.º dos factos não provados).
33. Ao contemplar diverso entendimento, o Mmo. Tribunal a quo incorreu em verdadeiro erro de julgamento.
34. As propugnadas alterações da decisão quanto à matéria de facto, reflectir-se-ão, inequívoca e automaticamente, na decisão de mérito da causa demandando a improcedência do pedido formulado pelo Autor/Recorrido e a consequente absolvição total da ora Recorrente Seguradora.
DO DIREITO
1 - DA RESPONSABILIDADE PELA OCORRÊNCIA DO ACIDENTE
35. Da supra propugnada alteração da decisão de facto, impõe-se a alteração da decisão quanto à responsabilidade pela ocorrência do acidente.
36. Sempre com o máximo respeito por diverso entendimento, considera a Seguradora recorrente que se imporá atribuir a responsabilidade pela ocorrência do acidente dos autos, em exclusivo, e a título de culpa, não ao condutor do veículo de matrícula (…), mas ao condutor do veículo de matrícula (…), cuja conduta estradal imprudente foi a única causal do evento.
37. Assim, e com relevância para o apuramento da culpa, há que atender à seguinte factualidade:
- O condutor do veículo (…) seguia na Estrada Nacional n.º (…), no sentido (…) – (…);
- Em sentido oposto, seguia o condutor do veículo (…), na mesma Estrada Nacional n.º (…), no sentido (…) – (…);
- O local é composto por uma curva para a direita, atento o sentido de marcha do veículo (…);
- O condutor do veículo (…), por circular em excesso de velocidade, ao fazer a curva saiu da sua mão, tendo ocupado a faixa do seu lado esquerdo;
- O condutor do veículo (…), impossibilitado de se desviar para a direita, onde se situava um talude, viu-se forçado a desviar-se para a sua esquerda;
- Os veículos bateram frente com frente, dando-se o embate dentro da faixa de rodagem destinada ao sentido (…) – (…).
38. Posto isto, e perante a dinâmica do acidente que se julga dada como provada (fruto da propugnada impugnação da decisão sobre a matéria de facto), não se compadece a ora recorrente com a fixação da culpa pela produção do acidente ao veículo seguro.
39. O embate deveu-se à actuação imprudente e flagrantemente violadora das regras estradais do condutor do veículo (…), que despoletou o processo causal com os actos que praticou:
- Circulando em excesso de velocidade;
- Conduzindo distraído; e
- Tendo ocupado a faixa de rodagem destinada ao trânsito em sentido contrário.
40. O Autor violou, pois, o disposto nos artigos 3.º, n.º 2, 13.º, n.º 1, 18.º, n.º 2, 24.º, n.º 1, 25.º, n.º 1, c) e f), 27.º, n.º 1 e 28.º, n.º 1, b), do Código da Estrada, com o que deu causa ao acidente.
41. Sempre com o máximo respeito por diverso entendimento, considerando que o veículo (…) ocupou, de forma inusitada e inesperada a via em que circulava, não teve o condutor do veículo seguro qualquer hipótese de evitar a colisão, não podendo este agir de outra forma e não se lhe podendo, pois, imputar qualquer conduta infractora das regras da condução estradal.
42. A responsabilidade, a título de culpa, pela ocorrência do acidente deverá, pois, e face ao supra vertido, ser totalmente imputada ao condutor do veículo (…).
43. Ao decidir diferentemente, a douta decisão recorrida incorreu numa desajustada interpretação dos factos, com a consequente inadequada aplicação do direito, sustentando um entendimento que, salvo o devido respeito por diversa opinião, desrespeita o critério da culpa plasmado do artigo 483.º do Código Civil, bem como as regras atinentes à responsabilidade civil extracontratual.
44. O que se deixa alegado, para todos os devidos efeitos e legais consequências, designadamente para a alteração da decisão de mérito no sentido da absolvição da Seguradora recorrente.
45. Sem conceder, sempre se dirá, pela prova produzida, que se o douto Tribunal a quo não tivesse ficado minimamente convencido quanto à dinâmica do acidente, assim como ao sentido de marcha dos veículos – sem esquecer que está assente o local de embate na via –, sempre deveria o mesmo decidir com base no risco e não tentar encaixar na responsabilidade do condutor do veículo (…).
46. Sem esquecer que o veículo (…) não era conduzido pelo seu proprietário, (…), mas por (…), por conta e no interesse do seu proprietário, presumindo-se a sua culpa, nos termos do artigo 503.º, n.º 3, do Código Civil. Presunção que aqui expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos e que V. Exas. também não poderão deixar de apreciar.
2 - DOS DANOS
DO MONTANTE INDEMNIZATÓRIO ARBITRADO EM SEDE DE DANO NÃO PATRIMONIAL:
47. Sem nunca prescindir ao antecedentemente alegado cumpre igualmente salientar que andou mal o Mmo. Tribunal a quo ao fixar ao Autor, a título de danos não patrimoniais sofridos, uma indemnização no quantitativo de Euro 40.000,00, a qual se reputa manifestamente excessiva e desadequada aos danos efectivamente provocados.
48. Também neste particular aspecto carece de alteração a douta sentença recorrida.
49. Atendendo à factualidade considerada provada e relevante para esta questão, com ênfase no facto do quantum doloris ter sido fixado em 5/7 e do dano estético em 2/7 e, temos que o montante indemnizatório fixado, de Euro 40.000,00, é gritantemente excessivo.
50. Atendendo, assim, à factualidade provada e relevante para o apuramento dos danos não patrimoniais sofridos pelo apelado, temos que se mostraria justo e adequado o montante nunca superior a Euro 15.000,00, atribuído a esse título.
51. Ao consignar diverso entendimento, andou mal a douta sentença proferida, devendo igualmente nesta sede, ser revogada, nos termos supra alegados. […]”

O Autor apresentou igualmente requerimento de recurso independente fazendo constar do mesmo um extenso segmento de conclusões recursivas com mais de 100 pontos terminando a pedir a este Tribunal Superior a alteração da sentença recorrida proferida pelo Tribunal a quo, com base em violação do disposto nos artigos 496.º, 562.º e 566.º, todos do Código Civil, mais pugnando pela manutenção da protecção jurídica.

A Co-Ré Fidelidade apresentou resposta a ambos os recursos interpostos alinhando no final da peça apresentada as seguintes conclusões:
“CONCLUSÕES:
1.º- A decisão recorrida não merece qualquer reparo, já que a mesma resultou de uma exaustiva produção de prova, tendo a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo, realizado uma valoração criteriosa e prudente de toda a prova produzida.
2.º- A sentença recorrida que não merece reparo – resultou a livre apreciação e valoração da prova, segundo critérios práticos e realistas e lógico-intuitivos colhidos da inquirição das testemunhas.
3.º- Pelo que a Meritíssima Juiz do Tribunal a quo elaborou a sentença cumprindo escrupulosamente os requisitos constantes do artigo 607.º do CPC, não merecendo a decisão nela constante qualquer reparo.
4.º- No que respeita à dinâmica do acidente, dúvidas não há que o condutor do veículo seguro da Recorrida em nada contribuiu para a produção do acidente, pois o mesmo apresentou uma versão clara, imparcial e conhecedora dos factos em análise nos autos, na qualidade de testemunha.
5.º- Do confronto do depoimento das testemunhas, resulta de forma clara e inequívoca de quem tem conhecimento verdadeiro dos factos e que ofereceu no âmbito do seu depoimento a verdade ao Tribunal.
6.º- O depoimento prestado pela testemunha (…), averiguador de sinistros da própria Seguradora que é único, parcial e baseado em probabilidades e não em factos concretos, esta não viu o acidente, nem esteve presente no local no dia em que o mesmo ocorreu.
7.º- Dúvidas não há quanto à matéria de facto provada e não provada da douta sentença proferida pelo Tribunal a quo, devendo a matéria vertida nos referidos pontos ser mantida na matéria de facto dada como provada e não provada.
8.º- Assim não deverá o Tribunal ad quem alterar a decisão proferida pelo Tribunal a quo sobre a matéria de facto, pois os factos tidos como assentes e a prova produzida não impõem decisão diversa daquela que foi proferida.
9.º- Pelo que, salvo devido respeito que é muito, não deve o Tribunal ad quem, ordenar a renovação da produção de prova, anular a decisão proferida pelo tribunal a quo.
10.º- Não devendo a Recorrida Fidelidade ser condenada a pagar ao A. quantia alguma.
11.º- A sentença recorrida não violou o disposto nos artigos 607.º, n.º 1, do CPC, nem tão pouco os artigos 483.º, n.º 1, 503.º, 562.º e 805.º do CC.
12.º- Do quantum indemnizatório, atendendo à factualidade considerada provada e relevante para esta questão, com ênfase no facto do quantum doloris ter sido fixado em 5/7 e do dano estético em 2/7 e, temos que o montante indemnizatório fixado, de Euro 40.000,00, é efetivamente excessivo.
13.º- Atendendo, assim, à factualidade provada e relevante para o apuramento dos danos não patrimoniais sofridos pelo apelado, temos que se mostraria justo e adequado o montante nunca superior a Euro 15.000,00, atribuído a esse título.
14º.- No que se refere aos danos não patrimoniais, ao contrário do que o Autor Recorrente refere, o Tribunal a quo acabou por supervalorizar os danos não patrimoniais sofridos pelo Recorrente, atendendo aos dispositivos legais que regulam esta matéria, da doutrina e jurisprudência dominante e mais recente dos nossos Tribunais, pelo que, deverá negar-se provimento ao recuso do Autor/Recorrente nesta matéria.
15º.- O mesmo se diga quanto ao quantum indemnizatório fixado a título de indemnização por danos patrimoniais.
Só assim se fará verdadeira Justiça!!
Termos em que e por tudo o mais que V. Ex.ªs doutamente suprirão, deve o recurso ser
julgado improcedente, confirmando-se na integra a decisão recorrida.”
*
Ambos os recursos foram admitidos na 1ª Instância como apelação, a subir de imediato, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Na data da admissão dos ditos recursos o Tribunal a quo proferiu ainda e previamente despacho com o seguinte teor:
“Da Retificação da Sentença:
O ISS, IP, CDSS de Santarém, ao abrigo do disposto nos artigos 613.º, n.º 2 e 614.º, n.º 1, do CPC, requereu a retificação da sentença proferida no dia 27/07/2022, porquanto, apesar de na mesma estar elencado, como questão a decidir, o direito ao reembolso das prestações pagas ao Autor, a título de subsídio de doença, no valor de € 1.329,31, acrescido de juros, por si reclamadas, e estar dado como provado que, desde a data do acidente até ao dia 30 de março de 2013, o Autor esteve a receber do Instituto da Segurança Social as prestações por doença, ao abrigo do certificado temporário para o trabalho por estado de doença direta, ou seja, a baixa médica, auferindo da Segurança Social até esse período o montante de € 1.329,31 [cfr. artigos 86 e 87 da factualidade provada], com base na certidão do ISS, I.P. junta aos autos, relativa ao subsídio de doença pago ao Autor, e no depoimento de parte prestado por ele [cfr. fundamentação da matéria de facto], não se pronunciou a final sobre o pedido de reembolso apresentado pelo ISS, I.P..
O Autor e os Réus, notificados do requerimento em causa, nada disseram no prazo legal.
*
Assiste razão na omissão apontada pelo ISS, I.P., CDSS de Santarém, advinda de lapso manifesto, sendo ao Tribunal legalmente possível suprir tal omissão, ao abrigo do disposto nos artigos 613.º, n.º 2 e 614.º, n.º 1 e 2, do CPC.
Assim, e porque em tempo, defere-se o requerido.
Subsequentemente, com vista a suprir a apontada omissão, passa-se a retificar a sentença proferida nos autos, devendo passar a constar do seu texto e em seu complemento o seguinte:
Na fundamentação de Direito [a final]:
«O Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, ao abrigo do disposto no n.º 2 do artigo 1.º do DL n.º 59/89, de 22 de fevereiro, reclamou das demandadas Lusitânia – Companhia de Seguros, SA e Fidelidade – Companhia de Seguros, SA, ambas melhor identificadas nos autos, o reembolso das prestações pagas, a título de Subsídio na Doença, ao aqui Autor, (…), em consequência dos factos descritos na petição inicial, no período compreendido entre 09/09/2012 e 30/03/2013, no valor global de € 1.329,31, acrescido de juros vencidos e vincendos.
Conforme resulta da factualidade apurada, mostra-se demonstrado o referido pagamento pelo ISS, I.P., CDSS de Santarém.
E, nos termos do n.º 3 do artigo 7.º do DL n.º 28/2004, de 4 de fevereiro, o ISS, I.P., CDSS de Santarém tem direito ao reembolso do referido valor, sendo a Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A, enquanto responsável pelo sinistro ocorrido, nos termos precedentemente expendidos, responsável também pelo seu pagamento.
Ao referido valor acrescem os juros de mora legais vencidos e vincendos, sobre o capital em dívida, desde a data da notificação da Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A. para contestar o pedido de reembolso e até integral pagamento.
[...]
IV – Decisão
Termos em que, julgo a acção parcialmente procedente, por parcialmente provada e, em consequência:
a) condeno a R. Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao A. a quantia de € 46.054,62, a que acrescem juros, desde a data da sentença, à taxa legal de 4%, nos termos da Portaria nº 291/03, de 8 de abril, ou outra taxa que lhe sobrevier, até integral pagamento;
b) condeno a R. Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A. a reembolsar o Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém da quantia de € 1.329,31, acrescida de juros legais vencidos e vincendos, sobre o capital em dívida, desde a data da sua notificação para contestar o pedido de reembolso e até integral pagamento.
c) absolvo a R. Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., do pedido.
Custas por A. e R. Lusitânia, na proporção do respectivo decaimento.
Registe e notifique.
[...]».
Sem custas, uma vez atendida a retificação.
Notifique, incluindo a Ré Lusitânia para os efeitos tidos por convenientes face ao recurso por si, entretanto, interposto.”
*
A Co-Ré Lusitânia, SA, apresentou peça processual com o seguinte teor:
“Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., Ré e Recorrente no processo supra referenciado, notificada do teor do douto despacho que antecede para os efeitos tidos por convenientes face à agora retificação da sentença e ao recurso por si interposto, vem muito respeitosamente junto de V. Exa. expor e requerer o seguinte:
1. Atenta a retificação da sentença nos termos que antecedem e por motivos de economia e celeridade processuais, vem a ora Ré e Recorrente requerer a ampliação do objeto do seu recurso oportunamente apresentado, devendo passar a constar também do mesmo a agora condenação da Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A. a reembolsar o Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém da quantia de € 1.329,31, acrescida de juros legais vencidos e vincendos, sobre o capital em dívida,
desde a data da sua notificação para contestar o pedido de reembolso e até integral pagamento.
2. Deverá, assim, ter-se por incluído no objeto do recurso, em consideração aos fundamentos nesse mesmo recurso invocados pela Recorrente Lusitânia em ordem à sua absolvição, também a apreciação da agora condenação da ora Ré/Recorrente no reembolso ao Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém.
3. Deverá, ainda, também por razões de economia processual, e apenas quanto à condenação da Ré Lusitânia no reembolso ao Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, dar-se aqui por integralmente transcrito e reproduzido tudo o invocado em sede de alegações e conclusões do recurso oportunamente apresentado quanto à absolvição da Ré Lusitânia.
Sem conceder, e apenas motivada por razões de mera cautela processual,
4. No caso de se entender que deverá a Ré e Recorrente juntar novas alegações e respetivas conclusões, no que à condenação no reembolso ao Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém se refere, requerer a notificação para o efeito.
Nestes termos e nos melhores de Direito, requer a ampliação do objeto do recurso nos termos ora peticionados ou, subsidiariamente, a notificação para apresentação de novas alegações e respetivas conclusões.”
*
Após o Tribunal a quo proferiu despacho com o seguinte teor:
“Requerimento apresentado pela Ré/Recorrente Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A. datado de 13/12/2022:
Notificada da retificação da sentença, apresentou-se a Ré a requerer a requerer a ampliação do objeto do seu recurso oportunamente apresentado, devendo passar a constar também do mesmo a agora condenação da Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A. a reembolsar o Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém da quantia de € 1.329,31, acrescida de juros legais vencidos e vincendos, sobre o capital em dívida, desde a data da sua notificação para contestar o pedido de reembolso e até integral pagamento, tendo-se por incluído no objeto do recurso, em consideração aos fundamentos nesse mesmo recurso invocados pela Recorrente Lusitânia em ordem à sua absolvição, também a apreciação da agora condenação da ora Ré/Recorrente no reembolso ao Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém.
Para o efeito, requer que se dê por integralmente transcrito e reproduzido tudo o invocado em sede de alegações e conclusões do recurso oportunamente apresentado quanto à absolvição da Ré Lusitânia.
Ao abrigo do disposto no artigo 6.º do CPC, admite-se o requerimento em causa para efeitos de fazer valer o recurso apresentado também relativamente ao ISS, I.P., CDSS de Santarém.
Notifique, designadamente o ISS, I.P., CDSS de Santarém nos termos e para os efeitos por si requeridos no requerimento datado de 06/01/2023.”
*
O Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Santarém, apresentou a sua alegação concluindo do seguinte modo:
“Conclusões:
A. O Instituto da Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Santarém, interveniente acidental, tem um interesse que depende da manutenção da sentença ora recorrida.
B. Resultou provado, que o autor esteve de baixa, ou seja, incapacitado para o trabalho, nos períodos entre 09/09/2012 e 30/03/2013 e que o Instituto de Segurança Social, I.P. - Centro Distrital de Santarém pagou ao autor subsídio de doença, no regime de doença direta, relativo aos períodos supra indicados, no valor de € 1.329,31 (mil, trezentos e vinte e nove euros e trinta e um cêntimos).
C. Nos termos do artigo 70.º da Lei n.º 4/2007, de 16/01, no caso de concorrência pelo mesmo facto do direito a prestações pecuniárias dos regimes de segurança social, com o de indemnização a suportar por terceiros, as instituições de segurança social ficam sub-rogadas nos direitos do lesado até ao limite do valor das prestações que lhes cabe conceder.
Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Exas. mui doutamente suprirão, deve o
recurso apresentado pela Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., ser julgado improcedente e em consequência ser mantida a sentença proferida e consolidada por Acórdão que caracterize o acidente sofrido pelo Autor como acidente de viação e a Responsabilidade pelos mesmos seja transferida para a Companhia de Seguros responsável”.
*
O processo subiu a este Tribunal da Relação de Évora e nele houve lugar à prolação pelo relator de despacho convidando ao aperfeiçoamento do segmento recursivo das conclusões do recurso independente apresentado pelo Autor atenta a diagnosticada extensão do mesmo.
*
O Apelante acedeu ao convite e apresentou em tempo novo segmento de conclusões recursivas nos seguintes termos:
“CONCLUSÕES
1. Por entender que a prova efetivamente produzida em audiência de julgamento não é coincidente com a que foi dada como definitivamente assente, não se conforma o ora recorrente com a decisão recorrida, estando mesmo em crer que o Meritíssimo Tribunal a quo operou uma incorreta apreciação da prova produzida, o que necessariamente conduziu a um errado juízo a propósito da existência e extensão de alguns dos danos (patrimoniais e não patrimoniais) peticionados, proferindo, pois, uma decisão que não encontra arrimo na prova produzida, e que, por força dessa desconformidade, se mostra em verdadeira violação da lei, não se conformando, ainda, com o decidido quanto à dispensa do apoio judiciário inicialmente concedido e consequente responsabilização por parte das custas.
2. No que respeita aos pontos 84º a 86º, 92º, 94º, 96º a 105º, 107º a 109º, 113º a 122º, 125º a 160º, 162º, 171º a 173º, 191º a 195º, 201º, 204º a 207º, 209º a 217º, 221º a 228º, 230º a 238º, 241º, 247º a 249º, 254º a 257º, 264º a 268º, 270º a 272º, 275º a 279º, 281º, 285º, 286º, 288º, 289º, 304º, 305º, 333º, 345º, 348º, 349º, 355º a 360º, 372º a 374º, 382º e 383º da matéria de facto dada como não provada, considera o recorrente que a prova produzida ao longo do processo se afigura como suficiente e adequada a permitir dar tais factos como provados.
3. Quanto aos factos relativos aos rendimentos auferidos pelo apelante à data do acidente (pontos 348º, 349º, 355º a 359º dos factos não provados), resulta claro do depoimento da Testemunha … (gravado em CD, produzido na sessão de julgamento de 24/11/2021, com início às 10h:52m:24s e conclusão às 11h:00m:57s) que o recorrente exercia a atividade de agricultor, representando tal atividade um trabalho extra, a que se dedicava aos fins-de-semana.
4. Este depoimento foi considerado credível pelo douto Tribunal a quo.
5. Resulta da experiência comum que ninguém se dedica a tarefas árduas, como é o caso da agricultura, sem receber uma contrapartida patrimonial.
6. Confirmando-se, assim, o alegado em sede de petição inicial – “O Autor trabalhava, no desempenho da sua actividade de agricultor ao longo de um período de tempo nunca inferior a duas horas por dia” –, uma vez que duas horas de trabalho diário (10 horas de trabalho semanal) equivalem perfeitamente a um part-time ao fim de semana.
7. Deveria constar do elenco dos factos provados que o Autor, ora recorrente, à data do sinistro, para além da sua atividade na empresa, exercia ainda a atividade de agricultor, numa quinta, aos fins-de-semana, auferindo dos seus serviços de atividade pecuária e agrícola, nunca menos de € 100,00 por mês, devendo, em conformidade, os pontos 348º, 349º, 355º a 359º dos factos não provados (por referência à Petição Inicial) ser considerados provados, sendo que ao contemplar diverso entendimento, incorreu o Mmo. Tribunal a quo em verdadeiro erro de julgamento.
8. No que se refere aos episódios hospitalares e cirúrgicos do recorrente após o acidente por si sofrido, aos tratamentos médicos e medicamentosos a que foi submetido e às dores, sintomas físicos e desconfortos de que padeceu (pontos 84º a 86º, 92º, 94º, 96º a 109º, 113º a 122º, 125º a 129º, 131º a 151º, 153º a 162º, 171º a 173º, 191º a 195º, 201º, 203º, 207º, 209º a 217º, 221º a 228º, 230º a 238º, 247º a 249º, 254º, 271º, 275º a 277º, 382º e 383º dos factos não provados), defende o ora recorrente que, em sede de prova destes factos ora enunciados sempre se necessitará de reapreciar:
- Documentação clínica junta com a PI;
- Relatório do IML de 21/02/2019, com a ref.ª 5704803;
- Documentação clínica enviada pelo Hospital de Vila Franca de Xira de 11/04/2019, com a ref.ª 5848074;
- Documentação clínica enviada pelo H.P.P. – Hospital de Cascais de 29/04/2019, com a ref.ª 5884597;
- Relatório do IML de 31/05/2019, com a ref.ª 5981391;
- Documentos clínicos enviado pelo Hospital de Vila Franca de Xira de 08/01/2020, com a Ref.ª 6540515;
- Relatório do IML de 22/01/2020, com a ref.ª 6579782.
9. Por resultarem diretamente do teor dos relatórios periciais juntos aos autos, da extensa informação clínica e dados documentais nos mesmos referidos – diga-se, não impugnada – e dos demais elementos clínicos também constantes dos autos, deveriam estes concretos pontos constar do elenco dos factos provados.
10. Por fim e no que se refere às repercussões no quotidiano do apelante após o acidente por si sofrido (pontos 278º a 281º, 285º a 288º, 304º, 305º, 372º a 374º, 382º e 383º dos factos não provados), entende o apelante, que, em bom rigor, o quadro descrito e valorado nos factos provados 106º, 112º a 115º, 117º a 119º e 120º a 128º em pouco ou nada difere do constante destes factos não provados, impondo-se aqui atender a que se certos factos não decorrem ipsis verbis do depoimento das testemunhas ou mesmo da prova documental valorada, a verdade é decorrerão da conjugação de todos os meios de prova carreados aos autos.
11. Conjugando o facto provado 119º com a prova testemunhal, com a informação dos relatórios periciais e demais documentação clínica, facilmente se conclui que, antes do presente sinistro, o autor era um jovem saudável, ágil e robusto, nunca havia sido vítima de qualquer outro acidente, nunca havia sofrido de qualquer enfermidade, não sofrendo de qualquer aleijão, deformidade, insuficiência, incapacidade ou limitação da sua capacidade laboral ou de utilização do seu corpo (pontos 372º e 373º dos factos não provados).
12. Até porque se sofresse o autor, ora recorrente, de alguma deformidade ou limitação prévia ao acidente tal facto estaria documentado em sede de perícia médico-legal.
13. Da mesma forma, se o autor sofreu dores muito intensas, localizadas ao nível da coluna lombar e lombosagrada, na parte dorsal, lombar, torácica e nos membros superiores, que ainda hoje atormentam o autor, continuado a ser acometido de intensas dores, que ainda o atormentam (factos provados 114º e 113º), estando o mesmo impossibilitado de praticar desportos (facto provado 121º), sempre se imporá concluir que se encontrará impossibilitado para exercer definitivamente profissões que exijam grande disponibilidade física (288º dos factos não provados), na medida em que tais dores não vão surgir na prática sexual e desportiva e automaticamente parar numa atividade profissional.
14. Ou seja, em consequência das lesões e sequelas de que ficou a padecer definitivamente, não poderá o apelante, nem no presente, nem no futuro, exercer as atividades profissionais que exercia, bem com qualquer outra atividade que exija ao apelante estar algum tempo de pé, deslocações em terrenos irregulares (i. é., não pavimentados), caminhadas, corrida, subir e descer escadas e movimentos em carga durante períodos de tempo prolongados, com frequência e/ou que obriguem a repetição.
15. Isto porque, uma coisa é conseguir praticar atos isolados, outra coisa é dedicar-se a qualquer uma dessas atividades, de modo a obter resultados e/ou rendimentos.
16. É forçoso, pois, concluir que o apelante consegue fazer as atividades referidas, apenas com um esforço físico incomportável com o seu estado de saúde, agravando-se indubitavelmente as sequelas de que ficou a padecer, bem como conduzirá seguramente ao espoletar de novas lesões e sequelas. que, aliás, se coaduna com o dado como provado no ponto 128º dos factos provados.
17. Motivo pelo qual defende o ora recorrente que o ponto 288º dos factos não provados deverá ter-se como provado, só assim se reparando o erro de julgamento em que a douta Sentença a quo incorreu, devendo também os pontos 278º a 281º, 285º a 287º, 304º, 305º, 372º a 374º, 382º e 383º dos factos não provados ser considerados provados, na medida em que resultam direta ou indiretamente da factualidade dada como provada nos factos 106º, 112º a 115º e 117º a 128º dos factos provados, sendo complementares dos mesmos, o que sempre se imporá a alteração, pelo Tribunal superior, da matéria de facto apurada, no sentido de passarem a constar como provados, os pontos supra referidos.
18. Relativamente ao valor da indemnização fixada pelos danos patrimoniais sofridos, sempre deveria o douto Tribunal recorrido ter considerado as especiais características da situação, afigurando-se-nos este valor exíguo face à prova produzida.
19. Deveria o Tribunal a quo ter valorado que o Apelante prosseguia, ainda que a tempo parcial, uma atividade agrícola e recebia géneros que afetava ao consumo do seu agregado familiar, auferindo, além dos géneros alimentícios, um valor nunca inferior a € 100,00 por mês.
20. Atendendo a que, a partir data da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem aos presentes autos, e como consequência direta e necessária das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes, o apelante deixou de poder, e não poderá mais, exercer qualquer atividade agrícola e, consequentemente, de retirar lucros da mesma, deveria, o Tribunal a quo, além de dar como provado a existência e quantitativo desses rendimentos, como supra melhor se alega, ter contabilizado os mesmos ao determinar o valor da indemnização por perdas salariais.
21. No entanto, e ainda que se entenda que o ora recorrente não fez prova do valor por si auferido a este título, o que não se aceita, a verdade é que provou que se dedicava a tal atividade agrícola e que recebia géneros agrícolas e pecuários que o auxiliavam no seu sustento e no dos elementos que compõe o seu agregado familiar.
22. Atendendo à normalidade das coisas (ninguém trabalha sem contrapartida financeira), sempre se deveria ter atribuído um valor a tal atividade, ainda que por via da equidade.
23. Em ultima ratio, e na impossibilidade de determinar tal montante, sempre deveria o tribunal a quo lançar mão do disposto no n.º 2 do artigo 609.º do CPC.
24. Entende o ora apelante que se reputa adequado atribuir uma indemnização a título de perdas salariais no valor € 13.369,24 (já computados no valor da indemnização por danos patrimoniais fixada na sentença ora recorrida), acrescido do rendimento na atividade agrícola e pecuária que desenvolvia e que lhe rendia pelo menos € 100,00 por mês, num total de € 6.000,00, pelo que o valor final a entregar ao ora recorrente sempre se deveria computar em € 19.369,24 e não em € 13.369,24.
25. Ao contemplar diverso entendimento, a sentença recorrida violou, entre outros, o artigo 562.º, o n.º 2 do artigo 566.º e o n.º 1 do artigo 564.º, todos do Código Civil.
26. Quanto ao dano patrimonial futuro e ao dano biológico, na sua vertente patrimonial, não pode, jamais, o ora apelante conformar-se com a sentença ora recorrida, que considerou, ao arrepio da jurisprudência dominante dos nossos Tribunais superiores, que não resulta provada uma efetiva perda de rendimentos por parte do Autor recorrente, pois que o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-psíquica de 6 pontos não se reflete numa incapacidade efetiva, ou seja, não reflete uma diminuição da sua capacidade de ganho.
27. O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica assume para o autor recorrente um dano in natura ou dano biológico, cujos efeitos negativos podem atingir bens patrimoniais ou não patrimoniais do lesado, sendo incontroverso que se trata de um dano indemnizável.
28. O próprio Tribunal a quo admite que das lesões sofridas no acidente ficou o recorrente afetado de sequelas que representam défice funcional permanente fixável em 6 pontos.
29. Naturalmente que esse défice funcional implica esforços suplementares no desenvolvimento das atividades que exercia à data do acidente.
30. Ora, a atividade do Autor, à data do acidente, era a de trabalhador por conta de outrem, exercendo funções próprias da categoria profissional de pendurador (ponto 85 dos factos provados), sendo que, como consequência direta e necessária do acidente o recorrente sofreu lesões ao nível da coluna lombar e lombosagrada na parte dorsal, lombar, torácica e nos membros superiores (pontos 106º e 113º dos factos provados).
31. Por isso, no caso em apreço, quer pela sua extensão (défice funcional de 6 pontos), quer pela sua incidência concreta na locomoção – como pendurador o Autor recorrente utilizava de forma permanente a força dos braços e ficou com lesões físicas permanentes na zona torácico-abdominal e na coluna cervical e dorsal – deve admitir-se que a atividade profissional do recorrente ficou lesada.
32. De facto, resulta da experiência comum que qualquer lesão na coluna – como ficou a padecer o Autor recorrente – afeta irremediavelmente a capacidade de trabalho, obrigando o trabalhador a fazer mais pausas no trabalho e, por isso, tem reflexos negativos na produtividade.
33. Por outro lado, as lesões na coluna afetam o exercício de qualquer outra atividade profissional – e não apenas a de pendurador – pelo que a capacidade produtiva do Autor para o exercício de qualquer outra atividade profissional ficou irremediavelmente afetada pelo acidente de viação em causa, devendo assim ser indemnizado a este título.
34. Tanto assim é que o recorrente, tendo começado a trabalhar, já após o acidente, na construção civil, acabou por ser despedido ainda na pendência da presente ação. O que não deixa de ser demonstrativo do que ora se alega.
35. O Tribunal a quo errou, pois, ao não fixar a devida indemnização que permita compensar o recorrente, lesado, dos danos em virtude da perda aquisitiva ou de trabalho.
36. Defende o ora recorrente que a incapacidade funcional em causa constitui uma desvalorização efetiva com expressão patrimonial e dentro da factualidade que resultou provada, para fixar a correspondente indemnização.
37. Tal desvalorização vem devidamente plasmada nos factos dados como provados na sentença proferida pelo Tribunal a quo e merece, indubitavelmente, a tutela do Direito.
38. No caso sub judice, e a este respeito, há que relembrar a matéria dos pontos 84º, 85º, 106º, 107º, 112º a 115º, 117º a 128º dos factos provados, salientando-se, entre o mais, que:
- à data do acidente, o Autor tinha 23 anos de idade;
- auferia o vencimento base de € 520,00, acrescido de subsídio de alimentação no valor de € 101,20 e outros subsídios;
- era robusto e dinâmico;
- por consequência direta e necessária do acidente, sofreu lesões ao nível da coluna lombar e lombosagrada na parte dorsal, lombar, torácica e nos membros superiores;
- ainda se queixa, atualmente, de dores nas partes lesionadas;
- as atividades que desenvolve exigem-lhe atualmente muito mais esforços do que outrora.
39. Deve ainda referir-se, a este respeito, a inexistência de culpa do recorrente na produção do acidente.
40. Considerando que o recorrente tem uma esperança média de vida até aos 81 anos – segundo os dados do INE a esperança média de vida, no período de 2018-2020, foi estimada em 81,06 anos –, decorre que, em termos estatísticos, as sequelas descritas previsivelmente o afetarão durante 58 anos (tinha 23 anos à data do acidente, até ao fim da esperança média de vida).
41. Atendendo a que uma pessoa com incapacidade está numa situação diferente e pior do que outra sem qualquer incapacidade, é inequívoco que o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de que o ora recorrente ficou a padecer irá dificultar a realização de muitas tarefas quotidianas.
42. Sendo certo que tal défice determina ainda restrição às possibilidades do recorrente no mercado de trabalho, implicando a perda de oportunidades geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente ficou a sofrer.
43. Tratando-se, como se como trata, de encontrar um valor indemnizatório para ressarcir um dano futuro, projetado num horizonte temporal mais ou menos dilatado e independente da efetiva perda de retribuição, é maioritário o entendimento de que o decisor deve recorrer, essencialmente, a critérios de equidade.
44. No caso em apreço, provou-se que o recorrente apresenta sequelas das lesões sofridas que lhe determinam um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 6 pontos, com rebate profissional.
45. Assim, sopesando os apontados elementos com recurso a critérios de equidade, entende o recorrente, salvo douta opinião em sentido contrário, que o montante justo e adequado para ressarcimento do dano em apreço, atualmente chamado de dano biológico, sempre por referência aos valores mais atualmente arbitrados pelos Tribunais superiores em casos idênticos, deveria ser fixado em quantia nunca inferior a € 50.000, 00.
46. No que se refere aos danos não patrimoniais, a propugnada alteração da decisão quanto à matéria de facto terá, inequívoca e automaticamente, de se refletir na decisão de mérito, mormente, na majoração da fixação do seu quantum.
47. De todo o modo, sempre se dirá, que ainda que assim não fosse, entendemos, com o devido respeito, que o Tribunal a quo acabou por subvalorizar os danos não patrimoniais sofridos pelo recorrente lesado, em claro e inequívoco alheamento dos dispositivos legais que regulam esta matéria, da doutrina e jurisprudência dominante e mais recente dos nossos Tribunais.
48. Desde logo, para fixação da indemnização a título de danos não patrimoniais seja o grau de culpabilidade do agente, a sua situação económica bem como a do lesado, o Tribunal a quo acaba não atender a tais circunstâncias ao fixar a aludida indemnização.
49. Realmente, o Autor apelante sofreu inúmeros e gravíssimos danos, devidamente descritos nos factos dados como provados, e que são, sem sombra de dúvida, dignos de tutela (artigos 496.º e 499.º do Código Civil).
50. Porque o dano, sem ser patrimonial, pode não ser simplesmente moral, como é o caso das dores físicas, porque quer as dores psíquicas, quer as dores físicas, são danos não patrimoniais merecedores da tutela do Direito, porque o direito à integridade física e à vida são os principais direitos de personalidade (ambos com consagração constitucional, aparecendo o direito à integridade física escalonado imediatamente a seguir ao direito à vida) e porque a compensação por danos não patrimoniais deve repercutir-se de forma efetiva e significativa na esfera do lesado, a verba arbitrada a este título é manifestamente escassa.
51. Realmente, não se pode olvidar o “quadro negro” que a sentença retrata, quanto a esta matéria, de danos sofridos pelo Apelante.
52. Ponderando todos os factos supra expostos, temos necessariamente que concluir que a verba arbitrada pelo Tribunal recorrido para compensar o sofrimento, os danos e as sequelas definitivas de que o Autor recorrente ficou a padecer, é manifestamente escassa, desadequada à situação em apreço e manifestamente desajustada aos padrões em vigor.
53. É certo que, no seu pedido, o Autor pecou por defeito no que respeita a este iter.
54. No entanto, não se pode ignorar que o douto tribunal a quo não está limitado ao valor dos pedidos parcelares, mas sim ao valor global do pedido.
55. Atento o quadro retratado nos autos e às lesões nos mesmos melhor descritas, o montante indemnizatório justo e adequado a atribuir à ora apelante a título de danos não patrimoniais, considerando os valores mais recentemente arbitrados pelos Tribunais superiores em casos semelhante, deveria ser fixada em quantia não inferior a € 50.000,00.
56. Quanto ao cancelamento do benefício do apoio judiciário, decorre dos autos que a sentença recorrida foi proferida sem que previamente fosse dada ao ora recorrente a possibilidade de se pronunciar sobre essa intenção de cancelamento da proteção jurídica, tendo, deste modo, sido omitida uma formalidade cuja observância era imposta pelo n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 34/2004.
57. Essa omissão impediu o recorrente de invocar argumentos que poderiam obstar à prolação de tal decisão, nomeadamente, os fundamentos invocados neste recurso, pelo que é, por si só, suscetível de influir na decisão a proferir quanto ao cancelamento da proteção jurídica, e constitui uma nulidade processual nos termos do artigo 195.º, n.º 1, do CPC – que expressamente se argui para todos os efeitos legais –, impondo-se julgar procedente o presente recurso por inobservância do princípio do contraditório.
58. Acresce que a competência para apreciar os pedidos de concessão de proteção jurídica está reservada aos serviços da Segurança Social, estando a intervenção do tribunal de 1ª instância limitada aos casos de impugnação judicial dessas decisões (artigos 20.º, n.º 1, 26.º, n.º 2, 27.º e 28.º, todos da Lei n.º 34/2004, de 29/07), sendo também a estes serviços, de acordo com o disposto no n.º 3 do artigo 10.º da Lei n.º 34/2004, que cabe a competência para proceder ao cancelamento da proteção jurídica.
59. Sem conceder, o citado artigo 10.º da Lei n.º 34/2004 apenas prevê o cancelamento da proteção jurídica no caso de o beneficiário adquirir, na pendência do processo, meios que lhe permitam suportar os encargos processuais, estando fora da sua tutela os casos, como o presente, em que essa capacidade económica surge a posteriori, ou seja, depois de o processo terminar e em consequência da decisão proferida nesse processo.
60. Ainda que fosse lícita a decisão de cancelamento, a mesma apenas produziria efeitos para o futuro, o que significaria que os efeitos da concessão de apoio judiciário se mantinham e mantêm relativamente a todos os atos processuais praticados na vigência do mesmo.
61. A questão do eventual cancelamento da proteção jurídica apenas se pode colocar na pendência da ação e não após o término da mesma e com vista ao pagamento das custas.
62. Deste modo, não poderá ser exigido ao recorrente o pagamento da taxa de justiça inicial ou seu complemento, nem de despesas com as peritagens, porque tais montantes apenas eram exigíveis num momento em que o apoio judiciário ainda se mantinha em vigor.
63. Impõe-se também considerar que o facto da Ré Seguradora ser condenada no pagamento ao Autor, ora recorrente, de uma indemnização decorrente de acidente de viação que vitimou o mesmo não pode ser considerado uma “aquisição de meios suficientes para pagar (…) [os] encargos de cujo pagamento haja sido declarado isento”, a que se refere o n.º 1 do artigo 13.º da Lei n.º 34/2004, que pressupõe uma aquisição efetiva de meios e não apenas o reconhecimento do direito ao recebimento de certo valor.
64. Com a atribuição da referida indemnização ao recorrente, este não obtém um verdadeiro ganho, uma vez que apenas se pretende, na medida do possível, repor a situação patrimonial anterior ao dano e a compensação pelos danos não patrimoniais sofridos com o sinistro.
65. Por outro lado, da simples condenação da Ré não resulta necessariamente que as referidas quantias indemnizatórias tenham sido já efetivamente recebidas pelo lesado, ora recorrente.
66. Por tudo o que se deixou exposto, terá de proceder o recurso interposto pelo Autor e apelante com a alteração da sentença recorrida, determinando-se a manutenção da proteção jurídica.
67. Ao decidir nos termos constantes da douta Sentença em recurso o Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 496.º, 562.º e 566.º, todos do Código Civil.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicável,
Deve o presente recurso merecer provimento, sendo a presente decisão revogada e consequentemente substituída por outra nos moldes acima apresentados, como é de inteira Justiça!”
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Não foi apresentada resposta às conclusões recursivas aperfeiçoadas.
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Correram Vistos pelo que cumpre, agora, decidir.
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II - Objecto do Recurso
Nos termos do disposto no artigo 635.º, n.º 4, conjugado com o artigo 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil (doravante apenas CPC), o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recurso, salvo no que respeita à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas ao caso concreto e quando se trate de matérias de conhecimento oficioso que, no âmbito de recurso interposto pela parte vencida, possam ser decididas com base em elementos constantes do processo, pelo que as questões a apreciar e decidir traduzem-se objectivamente no seguinte:
A – Recurso independente do Apelante (…)
1 – Nulidade processual;
2 – Impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
3 – Reapreciação de mérito incidente sobre:
I – Danos patrimoniais (e respectivo cômputo), alegadamente sofridos pelo Apelante por perda de rendimentos relativos à prática da actividade da agricultura;
II – Cômputo indemnizatório devido a défice funcional permanente (dano biológico);
III – Cômputo indemnizatório a título de danos não patrimoniais sofridos pelo Apelante.
B – Recurso independente da Co-Ré Lusitânia – Companhia de Seguros, SA:
1 – Impugnação da decisão relativa à matéria de facto;
2 – Reapreciação de mérito incidente sobre:
I – Alegada responsabilidade pela produção do acidente do condutor da viatura de matrícula (…), segurada na Apelada Fidelidade, SA.
II – Cômputo indemnizatório a título de danos não patrimoniais sofridos pelo Apelante.
III – Reembolso de prestações por doença (baixa médica), pagas ao Apelante pelo Centro Distrital de Santarém do Instituto de Segurança Social, I.P.
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III - Fundamentação de Facto
Decorre da sentença recorrida o seguinte no tocante a matéria de facto:
“A – Factos provados
Com relevância para a acção, consideram-se provados os seguintes factos:
1 - No dia 9 de setembro de 2012, pelas 06:00, na Estrada Nacional (…), junto ao Km 1,700, em (…), concelho de Benavente e distrito de Santarém ocorreu um acidente de viação (artigo 1º da petição inicial).
2 - Nesse acidente foram intervenientes, o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula (…), propriedade de (…) e conduzido por (…) e o veículo ligeiro de mercadoras de matrícula (…), propriedade de (…), conduzido pelo … (artigos 1º e 2º, parte, da petição inicial, artigo 5º da contestação da R. Lusitânia e artigos 9º e 10º da contestação da R. Fidelidade).
3 – (…) conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula … (artigo 2º, parte, da petição inicial).
4 - A responsabilidade civil por danos causados a terceiros pela viatura (…) havia sido transferida para a 1.ª Ré, Lusitânia – Companhia de Seguros, S.A., por contrato de seguro titulado pela apólice n.º … (artigo 4º da petição inicial).
5 - No exercício da sua actividade, a R. Lusitânia celebrou com (…) um contrato de seguro do ramo automóvel titulado pela apólice n.º (…) em que esta transferiu para aquela a responsabilidade civil emergente da circulação rodoviária de um veículo de matrícula (…), cfr. doc. 1 que ora se junta e se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais (artigo 1º da contestação da R. Lusitânia).
6 - Por sua vez, a responsabilidade civil por danos causados a terceiros pela viatura (…), havia sido transferida para a 2.ª Ré, Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., por contrato de seguro titulado pela apólice n.º … (artigos 5º e 65º da petição inicial e artigo 1º da contestação da R. Fidelidade).
7 - Na altura da ocorrência do acidente de trânsito que deu origem à presente acção, o Autor (…) seguia como passageiro, no veículo automóvel ligeiro de passageiro de matrícula (…) no banco da frente ao lado do condutor (artigos 6º e 67º da petição inicial).
8 - No dia 9 de setembro de 2012, pelas 05h30m, na Estrada Nacional n.º (…), ao km 1,7, em Benavente, (…) conduzia o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula (…), no sentido … – … (artigo 7º da petição inicial e artigo 18º da contestação da R. Lusitânia).
9 - Nessas circunstâncias de tempo não chovia, o pavimento da estrada encontrava-se seco e limpo, não havia vento ou nevoeiro, nem luminosidade natural, mas no local existia iluminação pública (artigos 9º da petição inicial e 15º da contestação da R. Fidelidade).
10 - O piso era betuminoso e estava em bom estado de conservação (artigos 10º da petição inicial e 15º da contestação da R. Fidelidade).
11 - Nesse local, a via mede 6,3 metros de largura e o traçado da via é composto por duas faixas de rodagem, uma para casa sentido, separadas por uma linha longitudinal contínua e com linhas de guia (artigo 11º da petição inicial e artigos 12º e 15º da contestação da R. Fidelidade).
12 - O local é composto por uma curva para a direita, atento o sentido de marcha do veículo ligeiro de mercadorias de matrícula (…) e, ao final da curva e do lado direito, existe um entroncamento que liga o Caminho Municipal n.º (…) à referida Estrada Nacional (artigo 12º da petição inicial, artigo 13º da contestação da R. Fidelidade e artigo 16º da contestação da R. Lusitânia).
13 - Junto ao entroncamento, a linha que separa as duas faixas de rodagem da Estrada Nacional n.º (…) é descontínua e, atendo o sentido de marcha do veículo ligeiro de mercadorias de matrícula (…), do lado direito existe uma berma com valeta e do lado esquerdo um talude de grande inclinação (artigo 13º da petição inicial e artigo 14º da contestação da R. Fidelidade).
14 - Nas circunstâncias de tempo atrás referidas, o (…) conduzia o veículo ligeiro de passageiros de matrícula (…), no Caminho Municipal n.º (…), o qual é composto por terra batida, em direcção a … (artigos 14º da petição inicial e 16º da contestação da Ré Fidelidade).
15 - No final no Caminho Municipal n.º (…) e antes de entroncar na Estrada Nacional n.º (…), encontra-se colocado o sinal vertical B2 ‘STOP’ (artigos 15º da petição inicial e 16º da contestação da R. Fidelidade).
16 - Sinal esse bem visível para quem pretende aceder à Estrada Nacional n.º (…) e que impõe a todos os automobilistas a obrigatoriedade de parar e de imobilizar a sua marcha, antes de penetrar na faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º (…) e ainda a obrigatoriedade de ceder a passagem a todos os veículos automóveis que transitem pela faixa de rodagem da Estrada Nacional … (artigo 16º da petição inicial).
17 - Todavia, quando chegou ao final do Caminho Municipal n.º 515, o condutor do veiculo ligeiro de passageiros de matrícula (…), iniciou a sua entrada no cruzamento, na Estrada Nacional n.º (…), pretendendo mudar de direcção para a esquerda, de forma inopinada, sem parar no sinal stop ali existente e, assim, se colocando na linha de trânsito na qual seguia o veículo tripulado por … (artigo 17º da petição inicial).
18 - Quando o veículo ligeiro de mercadorias de matricula (…) se encontrava a uma distância não superior a dez metros do preciso local do centro do supra-referido entroncamento (artigo 18º da petição inicial).
19 - O entroncamento apresenta-se pela margem direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º (…), tendo em conta o sentido seguido pelo veículo de matrícula … (artigo 19º da petição inicial).
20 - De forma súbita, brusca, imprevista e inopinada, surgiu ao veículo (…), o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matricula n.º (…), conduzido pelo … (artigo 20º da petição inicial e artigo 17º da contestação da R. Fidelidade).
21 - Provindo do Caminho Municipal n.º (…), em direcção à faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º … (artigo 21º da petição inicial e artigo 18º da contestação da R. Fidelidade).
22 - O condutor desse veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula (…) pretendia penetrar, com o veículo automóvel que tripulava, na faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º. … (artigo 22º da petição inicial).
23 - O condutor desse veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula () conduzia de forma distraída (artigo 23º da petição inicial).
24 – Pois não prestava qualquer atenção à actividade – condução – que desempenhava (artigo 24º da petição inicial).
25 - Nem aos restantes veículos automóveis que, na altura, transitavam pela Estrada Nacional n.º … (artigo 25º da petição inicial).
26 - O condutor desse veículo automóvel não se apercebeu, por essa razão, da presença e da aproximação do veículo (…) que transitava pela Estrada Nacional n.º (…), rigorosamente pela metade direita da faixa de rodagem da referida via, tendo em conta o seu indicado sentido de marcha, nas circunstâncias supra-referidas (artigo 26º da petição inicial).
27 - Não imobilizou o veículo automóvel que tripulava em obediência ao sinal de STOP – vertical e horizontal. que se ali apresentavam à sua frente, no topo da via de onde provinha antes de penetrar na faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º … (artigo 27º da petição inicial).
28 - Pelo contrário, de forma súbita, brusca, imprevista e inopinada, o condutor desse veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula (…), sem travar, sem reduzir a velocidade de que vinha animado e sem imobilizar o que tripulava, penetrou com o que tripulava na Estrada Nacional n.º ... (artigo 28º da petição inicial).
29 - De forma a invadir e a ocupar, também, de forma súbita, brusca, imprevista e inopinada, como, efectivamente, invadiu e ocupou, toda a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º (…), tendo em conta o sentido seguido pelo … (artigo 29º da petição inicial).
30 - Face à actuação do condutor do veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula (…), o condutor do veiculo de matricula (…), (…), apesar de ainda ter mudado a direcção para a esquerda, não logrou desviar-se do veículo conduzido pelo … (artigo 30º da petição inicial).
31 - Pelo que foi embater com a dianteira do veículo por si conduzido na parte frontal do veículo conduzido pelo … (artigo 31º da petição inicial).
32 - O local provável do embate entre os dois veículos ocorreu junto ao eixo das faixas de rodagem da Estrada Nacional n.º (…), mas já na faixa de rodagem no sentido (…) – (…), local onde existiam marcas no pavimento (artigo 32º da petição inicial e artigos 32º, 33º e 34º da contestação da R. Lusitânia).
33 - Após embater no veículo de matrícula (…), conduzido pelo (…), o veículo de matrícula (…), tripulado por (…), seguiu em direcção ao lado esquerdo, subindo uma barreira que confina com a valeta, tendo de seguida capotado e ficado imobilizado na faixa de rodagem, ao lado do veículo conduzido pelo … (artigo 33º da petição inicial).
34 - Por sua vez e após o embate, o veículo conduzido pelo (…) rodou sobre si cerca de 90º para a direita, atento o sentido de marcha do veículo ligeiro de mercadorias de matrícula (…), ficando imobilizado atrás do ponto de conflito e por referência ao veículo conduzido pelo ... (artigo 34º da petição inicial).
35 - Se o condutor do veículo de matrícula (…), conduzido pelo (…) tivesse parado à entrada do referido entroncamento e apenas retomasse marcha após se certificar que na via não circulavam outras viaturas, o embate não teria ocorrido (artigo 35º da petição inicial).
36 - Correu termos na Comarca de Santarém – Benavente – Instância Local – Secção Criminal – J1, uns autos de Processo Comum Singular n.º 613/12.8TABNV, nos termos do qual, o arguido (…), condutor do veículo de matrícula (…), foi condenado pela prática como autor material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punido pelo artigo 148.°, n.º 1, do Código Penal, na pena de 100 dias de multa, à razão de € 6,00, perfazendo o montante total de € 600,00, a que corresponde, caso o arguido não pagasse voluntaria ou coercivamente a multa, a uma pena de prisão subsidiária reduzida a dois terços, condenando-o ainda na pena acessória de inibição de conduzir pelo período de 4 meses (artigos 47º e 49º da petição inicial).
37 - Devido ao estado grave do Autor, o mesmo foi assistido no local e foi transportado de ambulância para o Hospital de Vila Franca de Xira (artigo 81º da petição inicial).
38 - O Autor foi transportado para as urgências daquela unidade hospitalar, com imobilização total e através de plano duro, com colocação de colar cervical (artigo 82º da petição inicial).
39 - Como consequência directa e necessária do referido embate resultaram lesões corporais várias para o ora Autor, o que fez com que fosse transportado em ambulância para o Hospital de Vila Franca de Xira, onde foi assistido no serviço de urgência desta Unidade Hospitalar, onde lhe foram prestados os primeiros socorros (artigo 83º da petição inicial).
40 - O Autor apresentava traumatismo abdominal (artigo 87º da petição inicial).
41 - Apresentava queixas de dor nos quadrantes inferiores do abdómen (artigo 88º da petição inicial).
42 - Apresentava ainda um traumatismo da coluna lombar (artigo 89º da petição inicial).
43 - Evidenciava fratura de L3 (artigo 90º da petição inicial).
44 - E dores na coluna lombar (artigos 91º, 93º e 95º da petição inicial).
45 - Devido ao seu grave estado de saúde, o Autor foi sujeito a vários exames clínicos, nomeadamente, RMN, TAC, RX, colheitas de sangue, de urina, entre outros, tendo sido recomendada vigilância clínica e imagiológica (artigo 106º da petição inicial).
46 - Ao TAC da coluna lombar, o Autor evidenciava fratura com destacamento ósseo interessando a vertente inferior da plataforma inferior L3, com discreto recuo deste fragmento ósseo, o qual ocupa a vertente anterior do buraco de conjugação direito L3-L4 (artigo 110º da petição inicial).
47 - Define-se ainda traço linear de fratura nas lâminas de L4 e respectiva apófise transversa direita, aspeto que indicia instabilidade (artigo 111º da petição inicial).
48 - Salienta-se ainda fraturas lineares nos istmos de L2, com sinais de desalinhamento dos topos ósseos, mas sem evidência de luxação dos corpos vertebrais (artigo 112º da petição inicial).
49 - O Autor foi transferido para a especialidade de ortopedia (artigo 123º da petição inicial).
50 - Perante este estado clínico grave o Autor ficou internado no Serviço de Ortopedia até ao dia 1 de outubro de 2012 (artigo 124º da petição inicial).
51 - O Autor foi ainda submetido a fixação da coluna lombar transpedicular com fixação em L2 e L5, também com anestesia geral (artigo 152º da petição inicial).
52 - Em 1 de outubro de 2012, o Autor teve alta hospitalar, passando ao regime de consulta externa (artigo 161º da petição inicial).
53 - E com marcação para consulta de especialidade de ortopedia, para o dia 16 de outubro de 2012, com o Dr. ... (artigo 163º da petição inicial).
54 - Onde foi seguido no pós-operatório (artigo 164º da petição inicial).
55 - O Autor teve alta hospitalar no dia 1 de outubro de 2012, regressando a casa dos seus pais, com quem vivia (artigo 165º da petição inicial).
56 - Onde se manteve acamado e retido no leito durante mais de quatro meses (artigo 166º da petição inicial).
57 - Isto devido às fortes dores que sentia, ao seu estado de fraqueza física e à forte limitação de movimentos devido às fracturas de que foi vítima e supra descritas (artigo 167º da petição inicial).
58 - Era no leito que se alimentava (artigo 168º da petição inicial).
59 - E onde fazia as suas necessidades fisiológicas (artigo 169º da petição inicial).
60 - Sempre com o auxílio de uma aparadeira (artigo 170º da petição inicial).
61 - Teve que ingerir medicação para tentar defecar (artigo 174º da petição inicial).
62 - No período em que veio para casa, o Autor apenas se levantando da cama para ir à Consulta Externa, mas sempre com muito sacrifício e dores (artigo 175º da petição inicial).
63 - Mas como estava absolutamente incapacitado de exercer as tarefas mais elementares do dia-a-dia, como caminhar autonomamente, levantar-se, deitar-se, alimentar-se, tomar a medicação, vestir-se, calçar-se, ir à casa de banho, tomar banho (artigo 176º da petição inicial).
64 - E como os seus pais trabalhavam, e não podiam faltar aos seus empregos (artigo 177º da petição inicial).
65 - E como se encontrava nesta situação clínica, o Autor teve necessidade de ser acompanhado por uma terceira pessoa (artigo 178º da petição inicial).
66 - O Autor solicitou a uma amiga da sua mãe, de nome (…), a fim de esta tratar e acompanhar a evolução do seu estado clínico (artigo 181º da petição inicial).
67 - Dar a medicação, durante o dia (artigo 182º da petição inicial).
68 - Levantar e deitar o Autor (artigo 183º da petição inicial).
69 - Ajudar o Autor a fazer as suas necessidades fisiológicas (artigo 184º da petição inicial).
70 - Vestir o autor e mais tarde, coloca-lo na cadeira de rodas e no cadeirão (artigo 185º da petição inicial).
71 - Levá-lo aos tratamentos e às Consultas Externas no Hospital de vila Franca de Xira (artigo 186º da petição inicial).
72 - Com a contrapartida de a ressarcir pelo montante de € 650,00 mensais, quantia que seria paga quando recebesse da companhia de seguros responsável pela produção do acidente (artigo 187º da petição inicial).
73 - Tendo a amiga da sua mãe aceitado cuidar do autor nestas circunstâncias e condições (artigo 188º da petição inicial).
74 - O Autor teve o acompanhamento desta pessoa desde o dia 2 de outubro de 2012 até ao dia 31 de março de 2013 (artigos 189º e 240º da petição inicial).
75 - No dia 13 de janeiro de 2015, o Autor ao realizar um movimento de torção da coluna sentiu uma dor forte ao nível da coluna lombar (artigo 196º da petição inicial).
76 - O A. recorreu às urgências do Hospital de Cascais (artigo 197º da petição inicial).
77 - Nas urgências dessa Unidade Hospitalar, o Autor realizou exames de diagnóstico, nomeadamente RX à coluna lombar (artigo 198º da petição inicial).
78 - Foi-lhe diagnosticado uma fratura do parafuso pedicular de L4 direito (artigo 199º da petição inicial).
79 - O Autor foi sujeito a medicação e teve indicação para no dia seguinte dirigir-se às urgências do Hospital de Vila Franca de Xira, uma vez que já andava a ser acompanhado nessa unidade hospitalar (artigo 200º da petição inicial).
80 - No dia 14 de janeiro de 2015, deslocou-se às urgências do Hospital de Vila Franca de Xira, onde foi sujeito a uma intervenção cirúrgica para remoção de instrumental da coluna lombar (artigos 202º e 208º da petição inicial).
81 - O Autor, em 12 de março de 2015, foi internado no Hospital de Vila Franca de Xira para remoção de instrumental de fixação da coluna lombar L1-L4 (artigos 218º e 220º da petição inicial).
82 - Nesse mesmo dia foi submetido a intervenção cirúrgica, com anestesia geral (artigo 219º da petição inicial).
83 - O Autor ficou internado no Hospital até ao final do dia 13 de março, altura que teve indicação para regressar para o seu domicílio (artigo 229º da petição inicial).
84 - À data do sinistro, o Autor trabalhava na empresa (…), SA, desempenhando a função de pendurador, com um vencimento base mensal de € 520,00, acrescido de € 101,20 de subsídio de alimentação, e outros subsídios (artigo 319º da petição inicial).
85 - Em virtude do acidente ocorrido e das lesões advindas, a (…), S.A., fez cessar o contrato com o autor, em 25-03-2013 (artigo 320º da petição inicial).
86 - O Autor, desde a data do acidente até ao dia 30 de março de 2013, esteve a receber do Instituto da Segurança Social as prestações por doença, ao abrigo do certificado temporário para o trabalho por estado de doença direta, ou seja, a baixa médica (artigo 323º da petição inicial).
87 - Auferindo da Segurança Social até esse período o montante de € 1.329,31 (artigo 324º da petição inicial e artigo 2º do requerimento do Instituto da Segurança Social, I.P.).
88 - A partir desta data, e em função da cessação do contrato de trabalho do Autor, foi-lhe concedido o subsídio de desemprego (artigo 329º da petição inicial).
89 - No período de 17/04/2013 a 16/10/2013, no valor diário de € 12,49 e no total de € 2.248,20 (artigo 330º da petição inicial).
90 - No período de 17/10/2013 a 16/05/2014, no valor diário de € 11,24 e no total de € 2.360,40 (artigo 331º da petição inicial).
91 - No período de 17/05/2014 a 01/12/2014, no valor diário de € 11,18 e no total de € 2.180,10 (artigo 332º da petição inicial).
92 - O Autor, no momento da ocorrência do acidente e nos instantes que se seguiram sofreu um enorme susto (artigos 68º e 258º da petição inicial).
93 - E, dada a sua incapacidade de lhe escapar e da violência do embate, receou pela própria vida (artigo 69º da petição inicial).
94 - O Autor, apesar de todas as lesões que abaixo se descreverão, nunca perdeu a consciência do mal que lhe estava a acontecer, encontrando-se num estado de profunda angústia e desespero (artigo 70º da petição inicial).
95 - Foram momentos de indescritível aflição, terror, dor e pânico (artigo 71º da petição inicial).
96 - Até hoje, tais momentos ainda, continuamente, assaltam o autor, provocando-lhe angústia e desespero (artigo 72º da petição inicial).
97 - Após o embate já descrito, o Autor ficou impossibilitado de sair do carro, uma vez que a viatura em que seguia ficou praticamente toda destruída (artigo 73º da petição inicial).
98 - Foram momentos de pânico e de terror vividos pelo Autor, porque encarcerado e impossibilitado de sair da viatura (artigo 74º da petição inicial).
99 - Nesses momentos, apenas gritava com a angústia, a dor e o desespero de quem se encontrava absolutamente imobilizado e encarcerado dentro da viatura (artigo 75º da petição inicial).
100 - Temendo que o veiculo a qualquer momento se incendiasse, ou explodisse (artigo 76º da petição inicial).
101-Só com a vinda dos Bombeiros que, munidos do respetivo material de desencarceramento, procederam à retirada do Autor (artigo 77º da petição inicial).
102 - O Autor sofreu naqueles momentos que viveu aquando da saída do veículo (artigo 78º da petição inicial).
103 - Até hoje, tais momentos ainda, continuamente, assaltam o Autor, provocando-lhe angústia e desespero (artigo 79º da petição inicial).
104 - Treme e sente perturbação quando recorda esses momentos, chorando muitas vezes o seu infortúnio (artigo 80º da petição inicial).
105 - Por via dos tratamentos e das lesões de que foi vítima, o autor sofreu dores muito intensas (artigo 250º da petição inicial).
106 - Essas dores, localizadas sobretudo na parte dorsal, lombar, torácica e nos membros superiores ainda hoje atormentam o autor, sendo que, na presente data, de resto, ainda é acometido de intensas dores (artigo 251º da petição inicial).
107 - E ainda os efeitos psicológicos advindos por causa do presente sinistro (artigo 252º da petição inicial).
108 - Sofreu os incómodos e as dores, por vezes com grande intensidade, referentes aos períodos de acamamento a que se encontrou sujeito (artigo 253º da petição inicial).
110 - Foram momentos de indescritível aflição, terror, dor e pânico (artigo 259º da petição inicial).
111 - Até hoje, tais momentos ainda assaltam o Autor, provocando-lhe angústia e desespero (artigo 260º da petição inicial).
112 - O autor tinha, à data do acidente, vinte e três (23) anos pois nasceu em 18 de março de 1989 (artigo 261º da petição inicial).
113 - O autor sofreu dores muito intensas, localizadas ao nível da coluna lombar e lombo sagrada, na parte dorsal, lombar, torácica e nos membros superiores ainda hoje atormentam o autor, sendo que, na presente data, de resto, ainda é acometido de intensas dores (artigo 262º da petição inicial).
114 - Essas dores ainda hoje atormentam o Autor (artigo 263º da petição inicial).
115 - E, invariavelmente, nas mudanças de tempo (artigo 269º da petição inicial).
116 - Sofreu os incómodos e as dores, por vezes com grande intensidade, referentes aos períodos de acamamento a que se encontrou sujeito (artigo 273º da petição inicial).
117 - Tem limitações na actividade sexual provocada por lombalgia (artigo 280º da petição inicial).
118 - Tudo em consequência exclusiva das lesões advindas do referido sinistro (artigo 282º da petição inicial).
119 - Era um jovem forte, robusto e dinâmico e com grande alegria de viver (artigo 283º da petição inicial).
120 - E com grande gosto e apetência pela prática desportiva, praticando com regularidade … (artigos 284º e 298º da petição inicial).
121 - O que tudo deixou de fazer, por impossibilidade, em consequência exclusiva das lesões advindas do referido sinistro (artigo 287º da petição inicial).
122 - Antes do acidente o Autor era uma pessoa alegre, bem disposta, sem quaisquer preconceitos; actualmente o mesmo é uma pessoa abalada psicologicamente, impaciente, com o sistema nervoso alterado e revoltado com a situação que lhe foi criada pelo predito acidente, a ponto de se sentir complexado (artigo 290º da petição inicial).
123 - O autor tem cicatrizes nas costas, nos membros superiores e inferiores e na face (artigo 291º da petição inicial).
124 - Sente inibição em mostrar as mesmas em lugares públicos (artigo 293º da petição inicial).
125 - Evita ir à praia para que as pessoas não olhem com pena para as suas cicatrizes (artigo 294º da petição inicial).
126 - O Autor no acidente perdeu o dente da frente do maxilar superior, que por falta de meios não conseguiu ainda proceder ao seu devido tratamento (artigo 292º da petição inicial).
127 - Tendo-se transformado de um jovem alegre, bem-disposto, extrovertido e com facilidade para as relações sociais, que era antes do acidente, numa pessoa triste, sisuda e com tendências para o isolamento (artigo 301º da petição inicial).
128 - O mesmo queixa-se de dores nas partes lesionadas e as actividades que desenvolve exigem-lhe actualmente muito mais esforço do que outrora, chegando ao fim de um dia bastante mais cansado do que antes do sinistro (artigo 302º da petição inicial).
129 - (…) é beneficiário deste Centro Distrital com o número de inscrição … (artigo 1º do requerimento do Instituto da Segurança Social, I.P.).

B – Factos não provados
Da petição inicial:
2.º (parte) … por conta, interesse, ordens, instruções e por um percurso previamente determinado pelo seu proprietário.
3.º (parte) E o veículo ligeiro de mercadoras de matrícula (…), propriedade de (…), conduzido pelo (…), por conta, interesse, ordens, instruções e por um percurso previamente determinado pelo seu proprietário.
8.º Circulava a uma velocidade superior a 90 Km/h.
52.º Caso se venha a provar que nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 9 a 16, o veículo de matrícula (…) desenvolvesse a sua marcha na referida EN (…), no sentido (…) – (…), a uma velocidade nunca superior a 40-50 Km/H, atentas as características do local.
53.º Que o veículo de matrícula (…) circulasse o mais à direita da sua hemi-faixa de rodagem, com os seus rodados direitos a uma distância não superior a 0,50 metros da linha delimitativa da berma do mesmo lado.
54.º Que o condutor do veículo (…), ao aproximar-se da referida curva, esta para a esquerda, atento seu sentido de trânsito, se tivesse deparado com o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula (…) em sentido contrário, isto é, a circular no sentido (…) – (…).
55.º Que o condutor do veiculo de matrícula (…), (…), tivesse conduzido sem se aperceber do trânsito que se processava e à via por onde circulava.
56.º Que (…) circulasse a uma velocidade superior a 110 Km/h.
57.º Que, ao fazer a curva à sua direita, tivesse perdido o controlo do veículo do seu veículo de matrícula (…) e tivesse invadido a hemi-faixa de rodagem destinada ao sentido contrário àquele em que seguia, isto é, (…) – (…).
58.º Que, para tanto tivesse pisado e transposto com o seu veículo a linha longitudinal continua – M1 – que separa os dois sentidos de trânsito.
59.º Que aquando se deu o embate descrito supra, (…) prosseguisse a sua marcha em contramão.
60.º Que o embate tivesse ocorrido sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º (…), a cerca de 2,60 m da berma direita, atento o sentido (…) – (…).
61.º Que (…) tivesse realizado uma curva à direita no local descrito supra imediatamente antes do embate, sem travar e sem reduzir a velocidade, invadindo desta forma a faixa de rodagem contrária, onde seguia o arguido (…).
62.º Que o condutor do veículo de matrícula (…), (…) não circulasse pelo lado direito da sua hemi-faixa de rodagem, o mais próximo possível da berma direita, a uma velocidade adequada para o local, e que não tivesse imobilizado o veículo que tripulava, no espaço livre e visível à sua frente em condições que tivesse evitado o embate entre os dois veículos.
63.º Com esta condução temerária, o condutor de veículo de matrícula (…) atentou, ofendeu e feriu gravemente o corpo dos aqui Autores.
84.º Na triagem, o Autor recebeu a prioridade de muito urgente.
85.º O Autor à chegada nas urgências dessa unidade hospitalar apresentava:
- Politraumatizado;
- Traumatismo Crânio Encefálico com Hemorragia Sub-Aracnoide (HSA);
- Trauma face (fracturas envolvendo as paredes póstero-lateral e orbitária do seio maxilar esquerdo, com hemossinus, derrame de sangue;
- volumoso hematoma peri-orbitário esquerdo;
- Traumatismo coluna lombar, dorsal, cervical;
- Traumatismo torácico (contusão pulmonar esquerda; vários arcos costais superiores esquerdas);
- Traumatismo abdominal.
- Traumatismo com contusão dos ombros esquerdo e direito
- Trauma com contusão joelho esquerdo e direito.
- Traumatismo na mão esquerda e direita.
- Diversas escoriações nos membros superiores e inferiores.
- Dor, edema e desvio do punho esquerdo ( imobilização após redução)
- Dor á mobilização do ombro direito.
- Dor à palpação da coluna dorsal; com parastesias dos membros.
- Dor nos quadrantes inferiores do abdómen;
- Dor na coluna lombar;
- Feridas na face;
- fratura e perda do dente da frente do maxilar superior;
- disfunção respiratória;
- diversas contusões e escoriações nos membros inferiores e superiores, na face, cabeça e no tórax.
- Ferida inciso-contusa a nível frontal.
86.º O Autor apresentava-se desorientado e pouco colaborante no auxílio.
92.º Apresentava ao EO: ECG 15 pupilas isocorridas e isoreativas, sem défices focais NSC.
94.º E dado à gravidade da situação que o Autor apresentava, os médicos da urgência daquela unidade hospitalar optaram por manter o colar cervical, na esperança que a situação clínica não se agravasse.
96.º Bem como apresentava parestesias ao nível da face anterior da coxa direita.
97.º Nas urgências desta unidade hospitalar o A. já apresentava amnésia para o acidente.
98.º Apresentava traumatismo torácico e abdominal à direita.
99.º O autor apresentava fractura do ramo isquio-púbico direito, fractura do ramo ílio-púbico direito e no pilar anterior do acetábulo homolateral.
100.º Revelava ainda uma ferida incisiva na região frontal direita e esquerda.
101.º Apresentava ainda tonturas e cefaleias, ficando em observações por via do traumatismo crânio encefálico que sofreu.
102.º Nas urgências dessa unidade hospitalar, foram-lhe ministradas várias injeções.
103.º Dada a gravidade da situação, e as fortes dores que o Autor apresentava, os médicos tiveram que prescrever morfina.
104.º O Autor não podia realizar movimentos.
105.º Nem se podia mexer, tamanha era as dores que sentia.
107.º O Autor logo nessas urgências foi submetido à realização de TAC crânio-encefálico, RMN da Coluna Lombar, TAC Pélvico, TAC Abdómen superior e inferior, RX à coluna lombar, RX à cervical, entre outras incidências.
108.º Ao TAC Abdominal efetuado ao autor, observou-se uma fina lâmina de derrame peritoneal no espaço de Marrison. Observa-se discreta densificação da gordura da raiz do mesentério, por provável infiltração edematosa.
109.º Neste TAC Abdominal observou-se alterações estruturais do corpo vertebral de L3, traduzindo fratura sem afundamento das plataformas articulares.
113.º O Autor foi sujeito a lavagem cirúrgica às feridas e às escoriações sofridas.
114.º Foram-lhe efectuados curativos vários.
115.º E RX, TAC e RMN às zonas lesionadas, conforme já resultou alegado.
116.º À colheita ao sangue e à análise de controlo, o autor apresentava anemia de provável etiologia pós-hemorrágica.
117.º Devido às fortes dores que o Autor sentia, foi efetuado reforço da analgesia, com a prescrição de morfina.
118.º Foi pedido a observância com controlo de RX.
119.º O A. realizou, ainda, outros exames: Ecocardiograma transtorácico bidimensional.
120.º O Autor foi internado pela cirurgia interna com o diagnóstico de hematoma retroperitoneal para investigação.
121.º O autor foi constantemente sujeito a vários exames de diagnóstico e submetido à realização de exames radiológicos aos locais traumatizados.
122.º Foi solicitado a realização de uma RMN ao autor para avaliação de compressões radiculares.
125.º Onde teve que permanecer, com a maior vigilância e cuidados clínicos, neste serviço desta Unidade Hospitalar, desde a data do acidente.
126.º Tendo permanecido no leito em repouso absoluto, uma vez que não se podia mexer.
127.º Tendo sido feitas diversas drenagens aos locais afectados e traumatizados.
128.º Foi medicado com vários analgésicos e anti-inflamatórios devido às fortes dores que sentia.
129.º E sujeito a alimentação a soro e depois a dieta líquida.
131.º Aliás, neste período de internamento o autor não conseguia evacuar devido às dores que sofria.
132.º Eram momentos de grande aflição para o Autor, onde este gritava e chorava em virtude das dores que padecia.
133.º Sempre com dores lombares e com muitas queixas álgicas em repouso.
134.º Sentindo, contudo, imensas tonturas, mau estar, dores e ausência completa de forças para se movimentar.
135.º Devido ao seu estado de fraqueza e aos cuidados médicos a que tinha sido sujeito, o Autor manteve-se acamado em posição decúbito dorsal.
136.º Ficando completamente retido no leito, não se levantando do mesmo.
137.º Não ingerindo qualquer alimento sólido durante o período de internamento daquela especialidade.
138.º E era também no leito que fazia as suas necessidades fisiológicas, sempre com o auxílio de uma aparadeira, que lhe era servida por uma terceira pessoa.
139.º Era também no leito que as enfermeiras lhe faziam a higiene pessoal, com o auxílio de esponjas húmidas que passavam pelo corpo do autor.
140.º O autor sentia dores muito fortes na coluna, no tórax, ao ponto de não conseguir dormir, mesmo com os efeitos de analgésicos.
141.º O Autor era constantemente sujeito a medicação e a exames radiológicos, no sentido de se avaliar a evolução clínica das lesões sofridas.
142.º O Autor, durante o período de internamento referido, fazia também curativo diário às partes intervencionadas.
143.º O Autor neste serviço desta unidade hospitalar como já se referiu encontrava-se, imobilizado e com um colar cervical.
144.º Por força desta imobilização e do uso do colar cervical o autor ganhou uma ferida inflamatória na cabeça, mais precisamente da parte da nuca, ao ponto de aquele estar sempre a sangrar.
145.º Fruto daquela ferida, o A. ficou com uma pelada na cabeça, que até hoje, mantém.
146.º Em 17 de Setembro de 2012, o médico ortopedista solicitou a realização de uma RMN para avaliação de compressões radiculares.
147.º A RMN confirma disrupção do ligamento interespinhoso em L2-L3.
148.º Fratura de L3 associada ao traumatismo abdominal.
149.º Perante este quadro clinico do autor, o médico faz proposta operatória para tratamento da fratura da coluna lombar.
150.º Com o procedimento de fixação da coluna lombar e lombosagrada, técnica lateral transversal.
151.º Em 24 de Setembro de 2012, o Autor foi submetido a uma intervenção cirúrgica, para redução e fixação de fratura L1-L4, sob anestesia geral.
153.º No pós-operatório imediato, foi pedida a sua vigilância permanente, uma vez que o seu quadro clinico era reservado
154.º Tendo o autor permanecido no leito em repouso absoluto.
155.º Tendo sido feitas diversas drenagens aos locais cirúrgicos.
156.º Foi medicado com vários analgésicos e anti-inflamatórios devido às fortes dores que sentia.
157.º O Autor apresentava muitas queixas ao nível da sutura operatória.
158.º Ficando completamente retido no leito, não se levantando do mesmo.
159.º E era também no leito que fazia as suas necessidades, com o auxílio de uma aparadeira, que lhe era servida por uma terceira pessoa.
160.º Fez o autor penso às partes intervencionadas todos os dias do internamento.
162.º Tendo indicação para o seu domicílio, mas com a prescrição para repouso absoluto.
171.º Diga-se, que o Autor no primeiro mês não conseguia fazer as suas necessidades fisiológicas mais básicas, nomeadamente defecar, devidas às fortes dores nas costas.
172.º O Autor não podia fazer qualquer esforço para tentar defecar, porque as dores das costas aumentavam, ao ponto de não aguentar as dores.
173.º Eram momentos de dor e aflição, uma vez que o autor sentia vontade de fazer as suas necessidades, mas não conseguia devido às fortes lesões que tinha nas costas.
190.º Depois dessa data apenas acompanhava o Autor às consultas e a tratamentos.
191.º Em consultas externas da especialidade de ortopedia no hospital de Vila Franca de Xira o Autor foi, pelo menos, nos dias 16 e 30 de outubro, nos dias 6 e 26 novembro e no dia 12 de dezembro 2012.
192.º Foi ainda nos dias 8 e 11 de janeiro, dia 10 de fevereiro, dias 13 de março, dias 3 e 16 abril de 2013.
193.º Neste período o Autor fez vários exames de diagnóstico, nomeadamente RX, TAC às zonas lesionadas.
194.º O Autor sempre andou, como ainda anda, com dores nas zonas do corpo atingidas em consequência do acidente.
195.º E sem conseguir fazer nada, nem trabalhar, tamanhas eram as dores que sentia e as lesões de que padecia.
201.º O Autor inicia quadro de dor dorso-lombar súbita.
203.º O Autor nesta unidade hospitalar já apresentava dor irradiada ao membro inferior direito.
204.º Apresentava ainda parestesias da perna e do pé direito.
205.º Nesse hospital os médicos observaram o Autor, realizaram-lhe vários exames médicos.
206.º Os clínicos desta unidade hospitalar diagnosticaram ao Autor falência de material de fixação da coluna lombar, por fratura de parafuso pedicular L4 esquerdo.
207.º Neste episódio de urgência, o seu médico assistente considerou que a situação clinica do Autor agravou e requer uma intervenção cirúrgica.
209.º O Autor ficou internado mais 1 dia, naquela unidade hospitalar.
210.º O Autor, desse hospital, regressou para casa dos seus pais, onde vivia.
211.º Onde se manteve acamado e retido no leito até ser chamado para a cirurgia.
212.º Apenas se levantando para deslocações ao hospital para realizar exames e consultas.
213.º Era no leito que se alimentava.
214.º E onde fazia as suas necessidades fisiológicas.
215.º Sempre com o auxílio de uma aparadeira.
216.º O Autor teve a necessidade de voltar a contratar a amiga da sua mãe, para cuidar dele, e nas mesmas condições.
217.º O autor deslocou-se ao Hospital de Vila Franca de Xira nos dias 20 e 22 de janeiro, 1 e 4 de março de 2015.
221.º No pós-operatório imediato, foi pedida a sua vigilância permanente, uma vez que o seu quadro clinico era reservado.
222.º Tendo o autor permanecido no leito em repouso absoluto.
223.º Tendo sido feitas diversas drenagens aos locais cirúrgicos.
224.º Foi medicado com vários analgésicos e anti-inflamatórios devido às fortes dores que sentia.
225.º Apesar dos analgésicos e anti-inflamatórios que se encontrava a tomar, o Autor sofreu fortes dores ao ponto de lhe impedir o sono durante a noite.
226.º O Autor apresentava muitas queixas ao nível da sutura operatória.
227.º Após a cirurgia, autor ficou com presença de agrafes, com bordos unidos e regulares.
228.º O Autor fez penso no dia 13 de março, com indicação para fazer penso de 3 em 3 dias.
230.º Autor teve ainda indicação para iniciar a remoção de material de sutura, alternadamente, a partir do 15º dia pós-operatório.
231.º Conforme já se alegou, no final do dia 13 de março de 2015, o autor teve alta hospitalar, passando ao regime de consulta externa, tudo conforme doc. 6, que se junta, para os efeitos legais.
232.º Tendo indicação para o seu domicílio, mas com a prescrição para repouso absoluto.
233.º Onde se manteve acamado e retido no leito durante mais de 1 mês e meio.
234.º Era no leito que se alimentava.
235.º O Autor tinha dificuldades em dormir, devido às dores que sentia.
236.º Apenas se levantando da cama para se deslocar a consultas e tratamentos médicos.
237.º O Autor encontrava-se totalmente dependente de terceiros para se alimentar e para fazer a sua higiene pessoal.
238.º Sempre com a ajuda da pessoa que havia contratado para cuidar de si.
241.º E do dia 13 de março de 2015 até ao dia 30 de abril de 2015.
247.º Acontece que nesta cirurgia realizada, por não conseguirem remover o fragmento de parafuso partido, anteriormente fixado na coluna, o mesmo teve que permanecer implantado na intravertebral.
248.º O que provoca imensas dores ao Autor, principalmente quando tenta rodar ou fletir as costas.
249.º O Autor sente uma forte picadela na coluna que lhe provoca dores insuportáveis.
254.º Sofreu, sofre e continuará a sofrer, os malefícios inerentes a medicamentos vários que se viu na necessidade de ingerir, nomeadamente os analgésicos e os anti-inflamatórios.
255.º Até à presente data, o autor nunca mais voltou a trabalhar na área da sua especialidade, da construção civil.
256.º Que ainda se vai prolongar para o resto da sua vida.
257.º Tudo em consequência das lesões advindas com o presente sinistro.
264.º Na presente data, de resto, ainda é acometido de intensas dores quando caminha, tendo marcha claudicante fruto das lesões que tem na coluna.
265.º Quando tenta caminhar mais apressadamente ou correr, o que já não consegue.
266.º Quando tenta subir e descer escadas.
267.º Quanto tenta levantar objectos pesados, o que já não consegue.
268.º Quando tenta fletir o tronco, o que já não consegue.
270.º Não consegue estar de pé, parado, mais do que cinco minutos.
271.º Tens muitas dores na coluna, na cervical, no tórax, na parte das costelas quando inspira e expira com mais intensidade.
272.º Não consegue caminhar continuadamente por um período superior a cinco minutos.
275.º Sofreu, sofre e continuará a sofrer, os malefícios inerentes a medicamentos vários que se viu na necessidade de ingerir, e continuará a ingerir nomeadamente os analgésicos e os anti-inflamatórios.
276.º Em consequência do acidente, o Autor sofreu as seguintes lesões:
- Traumatismo torácico de que resultaram:
- fractura do ramo isqueopúbico direito e fractura do pilar do acetábulo homolateral.
- fratura da coluna lombar.
- Contusões lombar e cervical.
- Fratura com destacamento ósseo da plataforma inferior de L3:
- fratura e recuo dos fragmentos ósseos de L2 a L5.
- fraturas lineares nos istmos de L2.
- Várias contusões e escoriaçãos por todo o corpo, com maior incidência nos membros superiores, inferiores e na cabeça.
- apresenta cervicalgias e dores dorso-lombares e um “formigueiro” e falta de pressão nas mãos.
- Traumatismo Crânio Encefálico com Hemorragia Sub-Aracnoide (HSA).
- Trauma face (fracturas envolvendo as paredes póstero-lateral e orbitária do seio maxilar esquerdo, com hemossinus, derrame de sangue.
- volumoso hematoma peri-orbitário esquerdo.
- Traumatismo coluna lombar, dorsal, cervical.
- Traumatismo torácico.
- Traumatismo abdominal.
- Traumatismo com contusão dos ombros esquerdo e direito.
- Trauma com contusão joelho esquerdo e direito.
- Traumatismo na mão esquerda e direita.
- Diversas escoriações nos membros superiores e inferiores.
- Dor, edema e desvio do punho esquerdo (imobilização após redução).
- Dor à mobilização do ombro direito.
- Dor à palpação da coluna dorsal; com parastesias dos membros.
- Dor nos quadrantes inferiores do abdómen.
- Dor na coluna lombar.
- Feridas na face.
- fratura e perda do dente da frente do maxilar superior.
- disfunção respiratória.
- diversas contusões e escoriações nos membros inferiores e superiores, na face, cabeça e no tórax.
- várias cicatrizes por todo o seu corpo.
- Ferida inciso-contusa a nível frontal.
- apresenta sintomatologia compatível com – Síndrome Subjectivo Pós-Traumático.
- Alterações da memória, amnésia para factos recentes, dificuldades de concentração, irritabilidade fácil, insónias, choro fácil, terrores noturnos.
- Medos patológicos (fobias) vários, incluindo o de andar de carro, diminuição das capacidades cognitivas, cefaleias de tensão, dificuldades no ritmo do sono e pesadelos constantes.
- Passou a sair menos de veículo automóvel, por receio de voltar a sofrer outro acidente.
- Cefaleias esporádicas, perturbações de memória (amnésia para factos recentes) perturbações do sono, intolerância aos ruídos, estado de hiperalerta, recordações traumáticas do acontecido (acidente dos autos), ansiedade marcada nas situações que lhe recordam o acidente, com reacções de evitamento, dificuldades relacionais, sentindo dificuldades no seu funcionamento a nível familiar e social.
277.º Como sequelas do acidente, o Autor apresenta dores e impossibilidade de flexão e rotação do tronco.
278.º Em consequência das lesões advindas, o Autor apresenta humor depressivo e encontra-se desanimado e desmotivado.
279.º Manifesta desinteresse e falta de vontade em estar com a família.
281.º Tem muita ansiedade e irregularidade no sono, pois sofre muitas insónias.
285.º Competindo em torneios organizados para o efeito, sendo rapaz de fácil e bem-disposto relacionamento.
286.º E praticando com regularidade musculação e jogava futebol com os amigos.
288.º Em consequência das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes, o Autor encontra-se impossibilitado, de forma definitiva, de exercer profissões que exijam grande disponibilidade física.
289.º O Autor (…), de forma inelutável, apresenta-se no mercado do trabalho incapaz de se apoiar com firmeza nas duas pernas, flexão ou rotação do tronco, e sem disponibilidade física para suportar as exigências de certas profissões, apresentando limitações, dores e incómodos.
299.º Diga-se que o Autor passou, por via de todo o exposto anteriormente, a apresentar um comportamento apático, triste e de indiferença perante a vida.
300.º E ainda dificuldades acrescidas na vida de relação, refugiando-se, não raras vezes no seu quarto a chorar em virtude de não poder levar a vida que levava antes de lhe surgir o infortúnio aqui em crise.
303.º Lamenta-se bastante com o que lhe sucedeu, falando do acidente muitas vezes e tem temor à condução de veículos automóveis.
304.º Perdendo o seu sentido de auto-estima, refugiando-se muitas vezes na solidão.
305.º Com as lesões do acidente ajuizado, tornou-se uma pessoa facilmente irritável e irascível.
306.º Sente grande transtorno na esfera sexual, porque já não consegue ter intimidade com a sua companheira mulher.
307.º O Autor esteve, depois do acidente, não conseguiu ter qualquer tipo de intimidade com a sua companheira mulher, sendo que antes o seu relacionamento era normal.
308.º Só o conseguindo recentemente, e de forma muito rara e sempre sentindo dores.
309.º A ausência de líbido e de intimidade com a mulher em muito desgosta o Autor.
310.º Antes do acidente, o Autor e a sua mulher constituíam um casal com muito afecto e carinho.
311.º E viviam muito bem na sua intimidade.
312.º Tudo em consequência do presente sinistro.
321.º Por via das lesões advindas do presente sinistro, o Autor ainda se mantém com Incapacidade Temporária Absoluta para o trabalho habitual.
322.º Pelo que se ainda se vê absolutamente impossibilitado de desempenhar a sua profissão.
333.º A partir do dia 1 de dezembro de 2014, o Autor deixou de receber a prestação do subsídio de desemprego, tudo conforme documentos 10 e 11 que ora se juntam, para todos os efeitos legais.
334.º Em virtude disto, o Autor passou por graves e sérias dificuldades económicas.
335.º Não tinha dinheiro para a sua alimentação nem para proceder aos tratamentos médicos que necessitava.
336.º Vivia de favores de terceiros e das ajudas dos seus pais.
337.º Os quais também já tinham gasto as suas poucas economias que amealharam, com os tratamentos do Autor.
338.º Já não tinham dinheiro para dar ou para emprestar ao Autor.
339.º O Autor chegou a não ter dinheiro para comprar pão.
340.º Foram momentos de muita aflição, tristeza e vergonha.
341.º Tudo em consequência das lesões sofridas no acidente dos presentes autos.
342.º Até que no final de outubro de 2015, um amigo do Autor, contou a situação deste ao seu patrão.
343.º O qual ao ter conhecimento da situação em que o Autor se encontrava, por pena e por solidariedade, contratou-o.
344.º Não para exercer uma actividade em concreto, nem para desempenhar funções que exijam esforço físico, uma vez que o Autor não consegue, mas para estar na empresa e justificar o salario de € 530,00 que aufere.
345.º Se o autor continuasse a trabalhar, desde o dia 1 de abril de 2013 até ao dia 20 de outubro de 2015, receberia o montante de € 18.636,00.
348.º À data do sinistro, para além da sua atividade na empresa, o autor exercia ainda a atividade de agricultor.
349.º No desempenho da sua actividade de agricultor o autor agricultava um terreno.
350.º Era ele que lavrava e gradava a terra.
351.º Semeava os cereais e plantava as batatas e produtos hortícolas e saladas.
352.º E cortava e colhia os cereais e demais produtos que cultivava e plantava.
353.º O Autor cultivava e colhia, com abundância milho, batatas, cebolas, feijão, cenouras e toda a espécie de legumes, produtos hortícolas e saladas.
354.º E criava e engordava animais domésticos, designadamente galinhas e coelhos.
355.º Como resultado da sua actividade da agricultura, o Autor produzia géneros agrícolas e pecuários que lhe garantiam o seu sustento.
356.º O Autor trabalhava, no desempenho da sua actividade de agricultor ao longo de um período de tempo nunca inferior a duas horas por dia.
357.º O resultado ou rendimento líquido da actividade da agricultura exercidas pelo Autor não pode computar-se em menos de € 100,00 por mês.
358.º O Autor, em consequência do acidente, foi obrigado a deixar a atividade de agricultura, pois a mesma exige um esforço físico incomportável com o seu estado de saúde.
359.º Assim, após o acidente dos presentes autos e até à presente data, o Autor deixou de executar a sua referida tarefa de agricultura, pelo que teve uma perda de rendimento até à presente data de € 6.000,00 que aqui se peticiona.
360.º E, bem assim, todas as diferenças salariais verificadas, desde a presente data até à data em que a alta clínica ocorra, e que o mesmo se torne apto para exercer estas actividades o que, desde já, se liquidará em incidente próprio, no âmbito dos presentes autos.
361.º Nas relações laborais, era tido como bom profissional, alegre, dedicado e cumpridor.
362.º Desempenhando de forma ágil e desembaraçada todas as tarefas inerentes à sua actividade profissional.
363.º Subindo e descendo escadas com a referida carga com grande desenvoltura e agilidade.
364.º Manuseava com grande facilidade todos os instrumentos de trabalho inerentes à sua profissão.
365.º A partir da ocorrência do acidente dos presentes autos e das lesões e sequelas que ficou a padecer, o requerente jamais poderá exercer a sua actividade profissional como fazia antes do acidente.
366.º As lesões e sequelas que o Autor padece em consequência do acidente de viação em discussão nos autos, não são compatíveis com o exercício das actividades/profissões habituais.
367.º Porquanto o exercício de tal profissão obriga a um permanente esforço quer nos membros inferiores quer nos membros inferiores quer na própria zona abdominal e lombar e coluna.
368.º Jamais apresentando a mesma desenvoltura de movimentos que apresentava anteriormente ao acidente.
369.º E bem assim todas as lesões e sequelas – a dificuldade em equilibrar-se, em movimentar-se, enfim, a redução funcional quer nas actividades de índole laboral, quer naquelas mais básicas e atinentes ao normal dia a dia.
370.º Não pode carregar e transportar objectos pesados, garrafão de água de litros, sacos de batatas, sacos de géneros alimentares, panelas e tachos, não pode lavar e torcer a roupa e passara roupa a ferro, na sua actividade de doméstica.
371.º O Autor não consegue pegar no seu filho ao colo.
372.º Antes do presente sinistro, o autor era um jovem saudável, ágil e robusto e nunca havia sido vítima de qualquer outro acidente e nunca havia sofrido de qualquer enfermidade.
373.º E não sofria de qualquer aleijão, deformidade, insuficiência, incapacidade ou limitação da sua capacidade laboral ou de utilização do seu corpo.
374.º Os factos descritos nos precedentes artigos causaram um profundo desgosto.
375.º Conforme já se referiu, nesta data, o autor ainda mantém a situação de incapacidade temporária absoluta para o trabalho, pois ainda sente dores incapacitantes de desenvolver a sua actividade profissional.
376.º A final, ficará a padecer de uma Incapacidade Parcial Permanente, para o trabalho, ainda não fixada, nem quantificada, na presente data, porquanto ainda se encontra numa situação de incapacidade temporária absoluta para o trabalho.
377.º E a qual, por essa razão, o Autor não conhece, na presente data, na sua precisa dimensão, nem as rés procederam a qualquer consulta ao Autor para procederem à avaliação do dano corporal.
378.º Mas que será fixada, quantificada e conhecida do A. após a realização dos exames médicos – exame pericial –, a levar a efeito ao longo da tramitação da presente acção, no momento processual adequado.
379.º Encontrando-se ainda a ser submetido a tratamento médico e a ir às Consultas Externas no Hospital de Vila Franca de Xira e a tomar medicação para as dores.
380.º Sendo que ainda poderá o autor vir a ser submetido a novas intervenções cirúrgicas.
381.º O que significa que ainda se encontra doente em consequência das lesões sofridas e das sequelas delas resultantes.
382.º O Autor carece ainda de uma intervenção da especialidade de medicina dentária, para tratamento e implante do dente da frente do maxilar superior que perdeu no acidente, que será avaliada aquando da realização do competente exame pericial.
383.º Certo é que por esse acompanhamento pode implicar algumas despesas e custos inerentes, nomeadamente pagamento a clínicas, honorários médicos, despesas com medicamentos e outros encargos médicos que se revelarem adequados.
384.º Como não é possível determinar desde já essa indemnização (da IPP que o autor fique a padecer e outras despesas futuras que se revelem adequadas) relega-se a sua determinação para ampliação do pedido ou liquidação posterior.
390.º O Autor, por força do acidente de viação descrito nos autos teve necessidade de ser submetido a vários tratamentos, a vários internamentos hospitalares, de recorrer a consultas médicas, de ajuda medicamentosa, de efetuar vários exames clínicos, nas quais despendeu até à presente data a quantia, ainda não liquidada pelas Rés, de cerca de € 750,00, quantia essa ainda não paga e cujo pagamento o Autor desde já peticiona das Rés.
391.º O Autor, por forças das lesões sofridas em virtude do acidente de viação descrito nos autos, teve necessidade de efetuar várias deslocações, quer de táxi, quer em viatura particular a hospitais e clínicas, nas quais despendeu até à presente data a quantia, ainda não liquidada pelas Rés, de cerca de € 750,00, quantia essa ainda não paga e cujo pagamento o Autor desde já peticiona das Rés.
393.º O Autor, por via das lesões ocorridas no presente sinistro, o autor viu danificadas e inutilizadas as seguintes peças de vestuário, que usava na altura da ocorrência do acidente, nomeadamente:
1 camisa, 1 par de calças, 1 par de sapatos e um casaco no valor de (€ 30,00 + € 50,00 + € 50,00 + € 100,00), num total de € 230,00 – que aqui se peticiona.
Da contestação da R. Lusitânia:
5.º (parte) O veículo ligeiro de mercadoras de matrícula (…), propriedade de (…), conduzido pelo (…), por conta, interesse, ordens, instruções e por um percurso previamente determinado pelo seu proprietário.
9.º Pelas suas duas margens, a faixa de rodagem da EN (…) apresentava bermas também pavimentadas em asfalto.
10.º Para quem circule na EN (…), no sentido (…) – (…), existe sinalização vertical de proibição de ultrapassar (C14a), entroncamento com via sem prioridade à direita (B9b) e ainda com linha continua (M1) a separar as duas hemifaixas de rodagem.
11.º O local onde deflagrou o acidente de trânsito que deu origem à presente acção configura-se, assim, como uma localidade.
12.º Na altura do acidente era ainda de noite, mas o tempo estava bom e seco.
13.º Nas circunstâncias de tempo e lugar, o veículo seguro desenvolvia a sua marcha na referida EN (…), no sentido (…) – (…), a uma velocidade nunca superior a 40-50 Km/H, atentas as características do local.
14.º Circulava ainda o (…) o mais à direita da sua hemi-faixa de rodagem, no mais estrito cumprimento das regras de trânsito.
15.º Rigorosamente com os seus rodados direitos a uma distância não superior a 0,50 metros da linha delimitativa da berma do mesmo lado.
17.º O condutor do veículo (…), ao aproximar-se da referida curva, esta para a esquerda, atento seu sentido de trânsito, deparou repentina e abruptamente com o veículo ligeiro de mercadorias de matrícula (…) em sentido contrário, isto é, a circular no sentido (…) – (…).
19.º Conduzia completamente distraído ao trânsito que se processava e à via por onde circulava.
20.º Circulava a uma velocidade superior a 110 Km/h.
21.º De tal modo que, ao fazer a curva supra referida, isto é à sua direita, perdeu o controlo o veículo de matrícula (…).
22.º Por via disso invadiu a hemi-faixa de rodagem destinada ao sentido contrário àquele em que seguia, isto é, (…) – (…).
23.º Para tanto pisou e passou totalmente com o veículo que conduzia de matrícula (…) a linha longitudinal contínua – M1 – que separa os dois sentidos de trânsito.
24.º Assim, prosseguindo a sua marcha em contramão, até embater violentamente com a frente do veículo de matrícula (…) contra a frente do veículo de matrícula (…) seguro na ora demandada, que circulava regularmente nesse sentido de trânsito, ou seja no sentido (…) – (…).
25.º Ocorrendo o embate, assim, totalmente sobre a metade direita da faixa de rodagem da Estrada Nacional n.º (…), a cerca de 2,60 m da berma direita, atento o sentido (…) – (…).
28.º Resulta, assim, claro, que a colisão se deveu exclusivamente ao comportamento culposo do condutor do veículo de ligeiro de mercadorias de matrícula (…) que, ao circular a uma velocidade superior 110Km/h, completamente distraído ao trânsito e à via por onde circulava, não conseguiu controlar o veículo por si conduzido.
29.º Com o que invadiu a hemifaixa de rodagem por onde circulava o veículo seguro, aí ocorrendo o embate, assim praticando uma condução imprudente e irresponsável, contribuindo de forma exclusiva para a eclosão do sinistro aqui em crise.
30.º Assim sendo, e pelos circunstancialismos expostos, o condutor do veiculo seguro (…) ainda tentou evitar o embate, travando e encostando-se o mais possível à sua direita, assim que se apercebeu da presença do veiculo de matrícula (…),
31.º Mas, atenta a velocidade que seguia o veículo de matrícula (…), conduzido pelo (…), totalmente distraído, não foi possível evitar o embate.
35.º Resulta, assim, que a colisão se deveu única e exclusivamente ao comportamento culposo do condutor do veículo (…), que ao circular a uma velocidade que não lhe era permitida, desatento e negligentemente, fora da sua faixa de rodagem, praticou uma condução imprudente e irresponsável, originando a colisão.
36.º Na verdade, o embate frontal entre as duas viaturas ocorre em plena faixa de rodagem afecta ao trânsito donde provinha o veículo seguro na ora Ré.
37.º E que, no lado donde provinha o veículo (…) nada existia na via que impedisse a sua regular marcha ou que impusesse, numa qualquer manobra de extremo risco, que passasse a circular na faixa de contrária ao seu sentido de marcha.
38.º Simplesmente o condutor deste ao conduzir àquela velocidade e ao fazer a curva à direita, sem travar e sem reduzir a velocidade de que seguia animado, de forma brusca, súbita e imprevista, invadiu desta forma a faixa de rodagem contrária, que estava reservada à circulação do veículo seguro, e por onde este seguia regularmente.
39.º Paralelamente, o condutor do (…) agiu com desconhecimento prático e em desacordo com as regras de aptidão para a condução, e com falta de atenção imposta pelos cuidados ou precauções que o dever geral de precaução aconselha.
50.º Acresce que, o veículo de matrícula (…) à data do acidente era propriedade de (…) e conduzido pelo (…).
51.º Ora acontece que este conduzia o veículo à ordem, com conhecimento, com autorização, por conta, por um percurso previamente determinado, no interesse e sob a direcção efectiva do seu proprietário.
*
A restante matéria não foi considerada por ser conclusiva, irrelevante ou se tratar de matéria de direito.”
*
IV – Fundamentação de Direito
A – 1 – Nulidade processual
No respectivo recurso independente o Apelante (…) invocou em sede de conclusões recursivas aperfeiçoadas uma nulidade alegadamente cometida pelo Tribunal a quo por inobservância do principio do contraditório fundamentando-a no facto de na sentença recorrida ter sido decidido o cancelamento do beneficio do apoio judiciário ao Apelante em apreço sem que previamente fosse concedido a este último a possibilidade de se pronunciar sobre tal propósito, omitindo, desse modo, o Tribunal recorrido uma formalidade cuja observância é imposta pelo n.º 4 da Lei n.º 34/2004, de 29/07.
Mais aduziu que a competência para apreciar os pedidos de concessão de protecção jurídica está reservada aos serviços da Segurança Social, estando a intervenção do tribunal de 1ª instância limitada aos casos de impugnação judicial dessas decisões.
Apreciando:
Decorre do artigo 3.º do CPC, epigrafado “Necessidade do pedido e da contradição”, o seguinte:
1- O tribunal não pode resolver o conflito de interesses que a ação pressupõe sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamada para deduzir oposição.
2- Só nos casos excecionais previstos na lei se podem tomar providências contra determinada pessoa sem que esta seja previamente ouvida.
3- O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o principio do contraditório, não lhe sendo licito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.”
Diz o artigo 195.º, n.º 1, do CPC, o seguinte:
1- Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.”
Sobre a arguição destas nulidades atípicas dispõe o artigo 199.º do CPC, que:
“1.[…] se a parte estiver presente, por si ou por mandatário, no momento em que forem cometidas, podem ser arguidas enquanto o ato não terminar; se não estiver, o prazo para a arguição conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum ato praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.”
Dito isto impõe-se baixar ao caso concreto que temos em mãos.
Da leitura da sentença recorrida verificamos constar da sua parte final, mais concretamente do dispositivo, o seguinte:
“Atento o valor da indemnização a pagar ao A., afigura-se que este deixou de ter os requisitos para que lhe seja mantido o apoio judiciário, nos termos do artigo 10.º, n.º 1, alínea a), da Lei de Protecção Jurídica, aprovada pela Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 47/2007, de 28 de agosto.
Nestes termos, o A. passou a dispor de meios próprios, estando em condições de dispensar o apoio judiciário inicialmente concedido, devendo suportar as custas que lhe competem.”
Pese embora não se refira expressamente no transcrito segmento da sentença recorrida que se cancela o apoio judiciário concedido anteriormente pela Segurança Social ao Apelante (…) o certo é que a norma invocada e a conclusão a que se chega de impor àquele “suportar as custas que lhe competem”, dissipam quaisquer dúvidas de que se quis determinar o cancelamento de tal beneficio.
Com efeito, resulta do artigo 10.º da Lei n.º 34/2004, de 29/07, epigrafado “Cancelamento da protecção jurídica”, o seguinte:
1-A protecção jurídica é cancelada, quer na sua totalidade quer relativamente a alguma das suas modalidades:
a) Se o requerente ou o respectivo agregado familiar adquirirem meios suficientes para poder dispensá-la;
[…]
3-A protecção jurídica pode ser cancelada oficiosamente pelos serviços da segurança social ou a requerimento do Ministério Público, da Ordem dos Advogados, da parte contrária, do patrono nomeado ou do agente de execução atribuído
4-O requerente de protecção jurídica é sempre ouvido.
5-Sendo cancelada a protecção jurídica concedida, a decisão é comunicada ao tribunal competente e à Ordem dos Advogados ou à Camara dos Solicitadores, consoante os casos”.
Por seu turno, decorre do artigo 12.º do mesmo diploma legal, o seguinte:
Da decisão que determine o cancelamento ou verifique a caducidade da protecção jurídica cabe impugnação judicial, que segue os termos dos artigos 27.º e 28.º”.
Da leitura conjugada das normas acima reproduzidas conclui-se que o Tribunal de 1.ª instância apenas pode determinar o cancelamento do beneficio da protecção jurídica, anteriormente concedida a partes de um processo, em sede de impugnação judicial da decisão proferida pelos competentes serviços da Segurança Social.
Por outras palavras, a decisão de cancelamento de tal beneficio é da competência material dos ditos serviços, podendo posteriormente ser revogada/alterada pelo tribunal de 1ª instância material e territorialmente competente apenas em sede de impugnação apresentada para o mesmo.
No caso vertente, não resulta da análise dos autos que tenha sido apresentada tal impugnação judicial para o Tribunal a quo e menos ainda que tenha sido decidido o cancelamento por parte dos serviços da Segurança Social.
Como tal, estava vedado ao Tribunal recorrido determinar no dispositivo da sentença aquando da apreciação da questão atinente à responsabilidade pelas custas judiciais, como veio a suceder, o cancelamento do beneficio do apoio judiciário anteriormente concedido ao ora Apelante (…).
Estando subjacente uma verdadeira questão de incompetência material entende-se não haver lugar à invocada nulidade, por alegada violação do principio do contraditório, uma vez que no caso vertente o eventual cumprimento prévio deste último pelo Tribunal a quo não permitiria solucionar o vício de incompetência que sempre se verificaria na apreciação subsequente realizada pelo Tribunal, donde tal omissão ser inábil para influenciar no exame ou na decisão da causa, sendo certo ainda que a prévia audição prevista no n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 34/2004, de 29/07 é imposta aos serviços da Segurança Social competentes para apreciar eventual cancelamento da protecção jurídica e não ao Tribunal de 1.ª instância.
Do exposto, resulta improceder a invocada nulidade processual, procedendo, porém, as conclusões recursivas no tocante à, também, invocada incompetência material do Tribunal a quo para determinar o cancelamento da protecção jurídica em sede de dispositivo da sentença recorrida, o que implicará a revogação da sentença recorrida nessa parte.
Para concluir este segmento decisório impõe-se apenas acrescentar que apesar da norma do n.º 5 do artigo 28.º da Lei n.º 34/2004, de 29/07 aludir a decisão irrecorrível certo é que a mesma está a referir-se à decisão do tribunal de 1ª instância que tenha apreciado o pedido de impugnação judicial dirigido ao mesmo, situação que, conforme já deixamos claro, não é a que se verifica no caso vertente.

A – 2 e B – 1 Impugnação da decisão relativa à matéria de facto
Sobre a impugnação apresentada pela Apelante Lusitânia, SA:
Abordemos de seguida a questão relativa a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, comum a ambos os recursos independentes interpostos para este Tribunal Superior, avançando desde já para a apreciação da impugnação apresentada pela Apelante Lusitânia, SA, impondo-se, prima facie, avaliar se a mesma cumpriu o ónus de obrigatória especificação que impende sobre o recorrente que pretenda impugnar a decisão relativa à matéria de facto.
Resulta do artigo 640.º do CPC, que se debruça sobre o aludido ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto, o seguinte:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b), do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respectiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
[…]”.
A este propósito sustenta o Conselheiro António Abrantes Geraldes (“Recursos no Novo Código de Processo Civil“, Almedina, 5ª ed., a págs. 168-169), que a rejeição total ou parcial respeitante à impugnação da decisão da matéria de facto deve ser feita nas seguintes situações:
“a) Falta de conclusões sobre a impugnação da decisão da matéria de facto (artigos 635.º, n.º 4 e 641.º, n.º 2, alínea b));
b) Falta de especificação, nas conclusões, dos concretos pontos de facto que o recorrente considera incorretamente julgados (artigo 640.º, n.º 1, a));
c) Falta de especificação, na motivação, dos concretos meios probatórios constantes do processo ou nele registados (v.g. documentos, relatórios periciais, registo escrito, etc.);
d) Falta de indicação exata, na motivação, das passagens da gravação em que o recorrente se funda;
e) Falta de posição expressa, na motivação, sobre o resultado pretendido relativamente a cada segmento da impugnação“, esclarecendo, ainda, que a apreciação do cumprimento de qualquer uma das exigências legais quanto ao ónus de prova prevenidas no mencionado n.º 1 e 2, a), do artigo 640.º do CPC, deve ser feita “à luz de um critério de rigor”.
Resulta do artigo 662.º do CPC, o seguinte:
1-A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa“
Refere a propósito deste normativo o Conselheiro António Abrantes Geraldes (obra acima identificada, pág. 287), que:
“O actual artigo 662.º representa uma clara evolução no sentido que já antes se anunciava […] , através dos nºs 1 e 2 , alíneas a) e b), fica claro que a Relação tem autonomia decisória, competindo-lhe formar e formular a sua própria convicção, mediante a reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes ou daqueles que se mostrem acessíveis e com observância do principio do dispositivo no que concerne à identificação dos pontos de discórdia.“
Diz-nos também sobre este preceito o Conselheiro Fernando Pereira Rodrigues (“Noções Fundamentais de Processo Civil”, Almedina, 2ª edição atualizada, 2019, pág. 463-464), o seguinte:
“A redação do preceito [662.º, n.º 1] não parece ter sido muito feliz quando manda tomar em consideração os “factos assentes” para proferir decisão diversa, que só pode ser daqueles mesmos factos considerados assentes, porque o que está em causa é modificar a decisão em matéria de facto proferida pela primeira instância.
[…]
A leitura que se sugere como mais adequada do preceito, salvaguardada melhor opinião, é que ele pretende dizer que a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, “confrontados” com a prova produzida ou com um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Nesta sede importa ainda recordar o teor do n.º 5 do artigo 607.º do CPC, relativo à “Sentença”, que se traduz no seguinte:
5- O juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto; a livre apreciação não abrange os factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, nem aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes”
A Apelante pretende impugnar vários pontos de facto respeitantes á dinâmica do acidente procurando fazer vingar uma versão diversa da que foi considerada como assente na sentença recorrida.
Concretamente insurge-se contra o teor dos factos considerados na sentença recorrida como provados sob os pontos nºs 14º, 17º, 20º a 22º, 27º a 31º e 35º defendendo que os mesmos deveriam ter sido considerados como não provados e bem assim contra o teor dos factos considerados como não provados na mesma sentença sob os pontos n.º 13º, 17º, 21º a 29º e 35º a 37º entendendo que os mesmos deveriam ter sido considerados como provados.
Insurge-se ainda a Apelante contra o teor dos factos considerados como não provados na sentença sob os pontos nºs 12º e 50º por considerar que esses factos foram considerados pelo Tribunal a quo como provados sob os pontos 9º e 2º, in fine, respectivamente.
Na respectiva resposta aos recursos pugna a Apelada Fidelidade, SA, pela total improcedência da impugnação de que ora nos ocupamos.
Dado o número elevado de factos em causa não iremos novamente reproduzi-los aqui e agora remetendo para a transcrição feita supra constante do segmento deste acórdão respeitante precisamente à matéria de facto provada e não provada descriminada na sentença, apenas com o esclarecimento de que a facticidade considerada como não provada e impugnada respeita à matéria de facto alegada pela Apelante na sua contestação.
Começando pelos pontos de facto 12º e 50º do segmento dos factos considerados como não provados não se vislumbra verdadeiramente fundamento para impugnação da matéria de facto à luz do artigo 640.º do CPC, mas apenas para eventual modificação de pontos de facto constantes da decisão proferida no Tribunal a quo atinente à matéria de facto com base em contradição entre facticidade provada e não provada, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 662.º do CPC.
Da leitura comparativa dos pontos de facto convocados pela Apelante em apreço verificamos que não lhe assiste razão no tocante à defendida contradição entre o teor do ponto 12º dos factos considerados como não provados e o teor do ponto 9º dos factos dados como provados, pois ela não existe, visto que o que resultou demonstrado neste último não conduz necessariamente à conclusão que seria ainda “de noite” (seria de madrugada) e que o tempo estivesse “bom e seco”, tendo apenas resultado demonstrado a este propósito que o piso estava seco e limpo e que não chovia, não ventava e não havia nevoeiro.
Já no tocante à apontada contradição entre o teor do ponto 50º dos factos considerados como não provados e o teor da segunda parte do ponto 2 dos factos tidos como provados entendemos assistir razão à Apelante Lusitânia, SA, sendo como tal de considerar o primeiro (50º), como não escrito.
Incidindo agora a nossa atenção sobre os pontos de facto incorrectamente considerados pela Apelante Lusitânia como provados e não provados, respectivamente, percebemos que aquela alude e identifica meios probatórios que, na sua óptica, justificariam a diversa decisão que defende para os ditos pontos de facto, tendo, inclusive, feito tal menção no segmento respeitante às conclusões recursivas, designadamente sob os pontos n.ºs 16 e 30 dessas conclusões.
Como tal é de considerar suficientemente cumprido o ónus de obrigatória especificação previsto no artigo 640.º, nºs 1 e 2, a), do CPC, justificando-se a apreciação do mérito desta impugnação.
Antes de avançarmos impõe-se, porém, considerar como não escrito o conteúdo dos pontos de facto nºs 28º e 35º dos factos considerados como não provados uma vez que não descrevem factos concretos e naturalísticos, reproduzindo, antes, factos puramente conclusivos e com conotação eminentemente jurídica, razão pela qual a sua formulação como demonstrados jamais poderia transmutá-los em factos concretos e despidos da referida conotação jurídico-conclusiva.
Prosseguindo, verificamos que a Apelante indica os seguintes meios probatórios:
“Participação do acidente de viação e respectivo croquis, depoimento da testemunha (…) e depoimento de (…)”.
Como tal, percebemos que se ancora em meios de prova não vinculada sujeitos a livre apreciação do julgador pautada pela prudência, experiência e bom senso do mesmo, devendo prevalecer no caso de versões antagónicas sobre factos o standard de prova assente essencialmente no critério da maior probabilidade.
Vejamos seguidamente de que modo motivou o Tribunal a quo a sua posição quanto à demonstração e indemonstração dos factos abrangidos na impugnação da Apelante Lusitânia, SA:
“A convicção do Tribunal fundou-se na apreciação crítica, conjugada e concatenada, dos documentos juntos aos autos, do relatório pericial do INML, do depoimento e das declarações do A. e do depoimento das testemunhas.
Foram juntos os seguintes documentos:
a) a participação de acidente de viação (fls. 28 verso a 30 e 89);
b) Aditamento ao acidente, auto de declarações, fotografias e declaração (fls. 91 a 95);
c) a sentença do processo-crime (fls. 30 verso a 67 e 438 a 475);
[…]
m) Certidão do processo-crime com o Relatório Pericial do NICAV e a acta da audiência de discussão e julgamento (fls. 173 a 179).
[…]
O Autor prestou depoimento e foi ouvido em declarações.
[…]
Prestaram depoimento as seguintes testemunhas:
1) (…), condutor do veículo de matrícula (…), interveniente no acidente. Esta testemunha relatou a forma como o acidente ocorreu, descrevendo de forma detalhada os pormenores, designadamente, as circunstâncias em que o veículo de matrícula (…), conduzido por (…), surgiu inesperadamente na sua frente, desrespeitando o sinal de STOP, não lhe dando qualquer hipótese de evitar a colisão, tendo em conta a configuração da estrada.
2) (…), militar da GNR, que subscreveu a Participação de Acidente de Viação, que referiu a existência do entroncamento no local do acidente, confirmando a elaboração da participação de acidente de viação e do croquis.
[…]
6) (…), averiguador de sinistros por conta da Lusitânia. Fez a sua investigação, indo ao local e falando com os intervenientes, concluindo pela responsabilidade do veículo seguro na Fidelidade, por o embate ter ocorrido na faixa de rodagem em que o veículo seguro e os pontos de embate não coincidirem com a versão do condutor do veículo seguro na Fidelidade.
7) (…), profissional de seguros, gestor de sinistros da Lusitânia. Referiu que a posição inicial da Lusitânia foi declinar a responsabilidade, porque consideravam o outro condutor responsável pelo acidente, de acordo com os elementos reunidos. Após o processo-crime verificaram que o seu segurado não estava a falar verdade.
[…]
9) (…), perito averiguador. Falou com os intervenientes no acidente, condutores e ocupantes e foi ao local. Quando falou com os ocupantes do veículo de matrícula (…), conduzido por (…), todos tomaram uma posição dizendo que não sabiam de que estrada vinham e que não se lembravam do acidente. Falou também com o condutor do veículo de matrícula (…) que lhe explicou que o veículo (…) provinha do entroncamento, da estrada de terra batida, e que desviou à esquerda para evitar um mal maior, sem conseguir evitar o acidente, o que se mostrou credível, face à tipologia dos danos que os veículos apresentavam.
10) (…), profissional de seguros, pessoa que geriu o processo do A. na Fidelidade e que transmitiu que a Fidelidade nunca assumiu a responsabilidade porque considerou que a responsabilidade cabe ao condutor do veículo seguro na Lusitânia.
11) (…), economista, piloto profissional de carros e motas. Esta testemunha, embora não tenha presenciado o acidente, quando circulava de mota à procura da sua filha, de madrugada, pelas quatro ou cinco da manhã, pôde comprovar que o veículo de matrícula (…), conduzido por (…), passou por si na estrada de terra batida que entronca na EN (…), em alta velocidade, momentos antes do acidente, tendo depois visualizado o outro carro já após o acidente.
12) (…), ajudante de mecânico. Relatou que viajava no veículo de matrícula (…), circulando no sentido (…) – (…), e que lhes surgiu um veículo vindo de uma estrada de terra batida à direita e deu-se o embate.
Da análise conjugada e concatenada da prova produzida foi possível apurar que o acidente ocorreu nos termos em que o A. o descreve e que ficou consignado na sentença proferida no processo crime.
De facto, a versão apurada é a que consta do processo-crime e que foi trazida pelo A. e acompanhada pela R. Fidelidade, e não a versão trazida pela R. Lusitânia.
A versão do A. resultou apurada no processo-crime e a R. Lusitânia não logrou ilidir a presunção no que se refere aos factos que integraram os pressupostos de punição do condutor do veículo segurado. Também da investigação levada a cabo pelo NICAV, resultou apurada a versão do A., quer quanto à posição dos veículos na estrada, quer quanto ao local donde provinha o veículo (…) e à forma como surgiu na EN (…), desrespeitando o sinal de STOP. O aparecimento na estada nacional do veículo (…), no sentido (…) – (…), provindo do caminho de terra batida, sem efectuar a paragem obrigatória, cortou a linha de trânsito e não permitiu que o condutor do veículo (…), pudesse evitar o acidente. Esta versão foi confirmada pela testemunha (…), condutor do veículo (…), interveniente no acidente e corroborada pela testemunha (…).
Os artigos 2º (parte), 3º (parte) da petição inicial e o artigo 5º (parte) da contestação da Lusitânia referem-se à forma como os dois condutores exerciam a condução, matéria que não resultou apurada, por não ter sido feita qualquer prova.
Assim, e com os fundamentos atrás indicados, consideraram-se provados os nºs. 1º a 35º, 97º, 98º e 101º dos factos provados e não provados os artigos 2º (parte), 3º (parte), 8º, 52º a 63º da petição inicial e os artigos 5º (parte), 9º a 15º, 17º, 19º a 25º, 28º a 31º, 35º a 39º, 50º e 51º, da contestação da Lusitânia.”
Não descortinamos razões ponderosas para discordar da exposição de motivos feita pelo Tribunal a quo atinente à forma como se produziu o acidente, que acabamos de transcrever, posto que a mesma revela inegável cuidado na produção e análise da prova carreada aos autos, abarcando a mesma declarações de parte, depoimentos de testemunhas e exame documental, avaliados de per si e de forma conjugada entre si.
Na verdade, o universo probatório de que se serviu o Tribunal a quo para chegar à decisão de facto sobre a dinâmica do acidente é amplamente maior que os meios probatórios indicados pela Apelante, sendo certo que a testemunha (…), averiguador de sinistros, não presenciou o acidente, revelando no depoimento prestado, designadamente no excerto transcrito pela Apelante Lusitânia, SA, na motivação recursiva, não ter ouvido o condutor da viatura de matrícula (…), não podendo, ainda, no contexto em apreço, olvidar-se que o mesmo é averiguador de sinistros “por conta da Lusitânia”.
Já no tocante à testemunha (…), que também não presenciou o acidente, é de aceitar que o mesmo se cruzou escassos momentos antes da produção daquele com a viatura onde seguia o Apelante (…), de matrícula (…), precisamente no Caminho Municipal n.º (…) de terra batida, que entronca com a Estrada Nacional (…) por onde seguia o condutor da viatura de matrícula (…) na direcção (…) – (…), sendo por isso de admitir com elevado grau de probabilidade que a viatura (…) não circulasse no momento do embate com a viatura (…) pela Estrada Nacional (…) no sentido (…) – (…).
Acresce que, conforme decorre do segmento da motivação constante da sentença recorrida, a testemunha (…) “relatou que viajava no veículo de matrícula (…), circulando no sentido (…) – (…) e que lhes surgiu um veículo vindo de uma estrada de terra batida à direita e deu-se o embate”.
Vale ainda por dizer que a testemunha (…), gestor de sinistros “da Lusitânia” referiu que “Após o processo-crime verificaram que o seu segurado não estava a falar verdade”, sem que, obviamente, se possa descurar o que resultou do depoimento da testemunha (…), que confirmou o embate nos moldes descritos como provados na sentença recorrida, bem como o que resultou factualmente apurado documentalmente e designadamente em sede de sentença proferida no processo-crime que correu termos dado não ter sido ilidida a presunção estabelecida no artigo 623.º do CPC.
Dito isto, afigura-se-nos francamente mais provável que o embate tenha ocorrido nos moldes enunciados como provados na sentença recorrida do que da forma defendida pela Apelante Lusitânia, SA.
Como tal decide-se julgar parcialmente procedente a impugnação dirigida contra a matéria de facto apresentada pela Apelante Lusitânia, considerando-se como não escritos os pontos de facto vertidos sob os pontos nºs 28º, 35º e 50º do segmento atinente aos factos considerados como não provados na sentença recorrida, em tudo o mais improcedendo a dita impugnação.
- Sobre a impugnação suscitada pelo Apelante (…)
Insurge-se o Apelante em apreço sobre inúmeros factos vertidos em larguíssimas dezenas de pontos carreados para o segmento da sentença destinado aos factos considerados como não provados entendendo que os mesmos deveriam ter sido considerados como provados.
Reiteramos o que supra dissemos sobre a não repetição aqui e agora do elenco de factos impugnados remetendo para a transcrição feita no segmento do relatório desta peça processual.
Cabe vestibularmente sublinhar que não assiste ao Tribunal Superior, enquanto Tribunal de recurso, proceder a um novo julgamento da causa decidida na primeira instância, mas apenas reapreciar aspectos concretos e pontuais que eventualmente tenham sido incorrectamente apreciados e julgados pelo Tribunal recorrido, devendo ainda reter-se que este último conta sempre com a vantagem da imediação no respectivo processo decisório.
Dito isto percebemos da leitura das respectivas conclusões recursivas aperfeiçoadas que o Apelante (…) pretende que este Tribunal ad quem considere como provados os factos considerados na sentença como não provados vertidos sob os pontos 84º a 86º, 92º, 94º, 96º a 105º, 107º a 109º, 113º a 122º, 125º a 160º, 162º, 171º a 173º, 191º a 195º, 201º, 203º a 207º, 209º a 217º, 221º a 228º, 230º a 238º, 241º, 247º a 249º, 254º a 257º, 264º a 268º, 270º a 272º, 275º a 279º, 281º, 285º, 286º, 287º, 288º, 289º, 304º, 305º, 333º, 345º, 348º, 349º, 355º a 360º, 372º a 374º, 382º e 383º.
Estão, por conseguinte, em causa 152 pontos de facto (!!!), relativos a episódios hospitalares e cirúrgicos após a produção do acidente sofrido pelo Apelante (…), além de tratamentos médicos e medicamentosos a que foi submetido, dores, sintomas físicos e desconfortos de que padeceu, bem como a rendimentos alegadamente auferidos pelo Apelante em causa à data da produção do acidente.
Desde já impõe-se dizer que da matéria sindicada pelo Apelante são destituídos de qualquer interesse para a boa decisão da causa, sendo como tal desnecessário aferir da eventual comprovação dos mesmos, os factos contidos nos pontos 84.º, 86.º, 118.º e 230.
Por outra banda, revela-se notoriamente conclusivo e/ou com conotação jurídica, como tal insusceptível de descrever factos concretos e naturalísticos caso resultassem demonstrados, o teor dos pontos 195º, 205º, 254º, 257º, 275º, 288º, 289º, 358º, 360º, 374º e 383º, os quais, por tal razão, se consideram como não escritos.
Prosseguindo na análise, verificamos pela leitura da motivação e conclusões recursivas aperfeiçoadas que o Apelante (…) logrou cumprir de modo minimamente sofrível o ónus primário e fundamental de obrigatória especificação previsto nas alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 640.º do CPC supra transcrito relativamente aos pontos de facto que sindicou, o que justifica apreciar de mérito a questão.
Percebemos, porém, que, com excepção do concernente aos factos relativos aos “rendimentos auferidos pelo Apelante à data do acidente”, vertidos sob os pontos 348º, 349º, 355º a 357º e 359º (o ponto 358º foi já considerado supra como não escrito), o Apelante limitou-se a mencionar meios probatórios de uma forma meramente indicativa e acrítica sem lograr demonstrar perante este Tribunal de recurso em que medida é que se extrai de cada um desses meios de prova e para cada um dos pontos de facto censurados o eventual erro de julgamento que aponta e a decisão diversa que defende para os mesmos.
Com efeito, o Apelante em apreço limita-se a dizer em sede de motivação recursiva, repetindo nas conclusões recursivas aperfeiçoadas, que relativamente aos factos em causa “sempre se necessitará de reapreciar:
- Documentação clínica junta com a PI;
- Relatório do IML de 21/02/2019, com a ref.ª 5704803;
- Documentação clínica enviada pelo Hospital de Vila Franca de Xira de 11/04/2019, com a ref.ª 5848074;
- Documentação clínica enviada pelo H.P.P. – Hospital de Cascais de 29/04/2019, com a ref.ª 5884597;
- Relatório do IML de 31/05/2019, com a ref.ª 5981391;
- Documentos clínicos enviados pelo Hospital de Vila Franca de Xira de 08/01/2020, com a Ref.ª 6540515;
- Relatório do IML de 22/01/2020, com a ref.ª 6579782.”
Apenas logrando acrescentar o seguinte:
“Face ao teor dos relatórios periciais juntos aos autos, da extensa informação clínica e dados documentais nos mesmos referidos e dos demais elementos clínicos também constantes dos autos, facilmente se verifica que o douto Tribunal a quo deveria ter considerado tais factos como provados.
Atenta a prova documental, fundamentalmente a informação clínica – diga-se, não impugnada – constante dos relatórios periciais já mencionados, o Tribunal recorrido julgou incorretamente estes factos.
Assim, entende o ora recorrente que deve ser alterada a matéria dos factos 84º a 86º, 92º, 94º, 96º a 109º, 113º a 122º, 125º a 129º, 131º a 151º, 153º a 162º, 171º a 173º, 191º a 195º, 201º, 203º, 207º, 209º a 217º, 221º a 228º, 230º a 238º, 247º a 249º, 254º, 271º, 275º a 277º, 372º, 373º, 382º e 383º não provados, passando a constar do elenco dos factos provados.
Alteração pela qual expressamente se pugna, deve este Tribunal superior alterar a matéria de facto apurada, no sentido de passar a constar provada a matéria supra referida.”
Quanto aos pontos de facto 278º a 281º, 285º a 288º, 304º, 305º, 372º a 374º, 382º e 383º (sendo que o teor dos pontos 288º, 374º e 383º já foi considerado supra como não escrito atenta a fórmula eminentemente conclusiva em que se traduzem), atinentes “às repercussões no quotidiano do Apelante após o acidente por si sofrido” invocou ainda o Apelante (…), após aludir aos factos considerados na sentença recorrida como provados sob os pontos 106º, 112º, 113º, 114º, 115º e 117º a 128º, que “[…] do confronto destes factos dados como provados com os factos não provados, bem como dos relatórios médicos e do depoimento das testemunhas, resulta claro que este tema da prova beneficiaria de uma maior sensibilidade e ponderação”, não cuidando, mais uma vez, de demonstrar perante este Tribunal ad quem em que medida é que se extrai de cada um dos meios de prova que somente genericamente refere (sem sequer identificar as testemunhas) e para cada um dos pontos de facto apontados o eventual erro de julgamento que aponta e a decisão diversa que defende para os mesmos, limitando-se a discorrer em sede meramente interpretativa concluindo “que os pontos 278º a 281º, 285º a 287º, 304º, 305º, 372º a 374º, 382º e 383º dos factos não provados deveriam, também, ser considerados provados, na medida em que resultam direta ou indiretamente da factualidade dada como provada nos factos 106º, 112º a 115º e 117º a 128º dos factos provados, sendo complementares dos mesmos.”
A nosso ver impõe-se recordar a propósito da matéria tratada nestes pontos o que ficou registado no segmento da sentença recorrida destinado à motivação, sem esquecer que nos mantemos no domínio da prova não vinculada, como tal sujeita á livre apreciação do julgador, que abrange, inclusive, o teor dos relatórios periciais, conforme decorre expresso da segunda parte do artigo 489.º do CPC.
Consta então da sentença recorrida que:
“A convicção do Tribunal fundou-se na apreciação crítica, conjugada e concatenada, dos documentos juntos aos autos, do relatório pericial do INML, do depoimento e das declarações do Autor e do depoimento das testemunhas.
Foram juntos os seguintes documentos:
[…]
d) documentação clínica (fls. 67 verso a 72, 201 a 206, 208 a 254, 257, 292 e 293, 296 a 299);
[…]
Foi junto a fls. 259-264 o Relatório Pericial do INML relativo à primeira perícia e a fls. 301-313 foi junto o Relatório Pericial do INML da segunda perícia.
O senhor perito médico prestou esclarecimentos na audiência final.
Referiu que as sequelas do acidente não têm impacto quanto a esforços, mas apenas a título de dano estético. Este dano foi considerado de grau 2, mas poderia ser de grau 3 se existisse registo documental das feridas, o que não aconteceu, pois só assim se poderia verificar o nexo de causalidade.
Quanto às condições para o exercício da actividade laboral, à data do acidente era operário fabril e, quando retoma a actividade profissional fá-lo na construção civil, pelo que se considerou que, se tinha condições para a actividade da construção civil, também poderia desempenhar a actividade de empregado fabril, uma vez que o que releva para a consideração do perito é a actividade à data do evento.
Relativamente aos danos futuros, o senhor perito médico declarou pretender fazer uma alteração ao seu relatório, uma vez que, a partir da situação de ter sido cirurgicamente intervencionado, não há que considerar dano futuro, só o dano estético e a peça dentária.
No mais, o senhor perito médico manteve o que consta do relatório pericial.
O relatório pericial foi elaborado com recurso a critérios técnicos e científicos de carácter objectivo e encontra-se sustentado pela análise dos elementos documentais de que o senhor perito dispôs.
Deste modo, o relatório pericial foi considerado pelo tribunal como elemento essencial para o apuramento dos danos físicos causados ao A. pelo acidente e as suas repercussões, quer a título patrimonial, quer a título não patrimonial, atribuindo-se especial relevo ao segundo relatório, por ser o mais actual.
[…]
Ouvido em declarações, o Autor relatou os ferimentos sofridos, a dores e as mazelas com que ficou, que lhe diminuem a qualidade de vida e o impedem de realizar as actividades de que gostava e lhe causam desgosto.
[…]
3) (…), engenheiro civil, que trabalhou na mesma empresa em que o A. também trabalhou como servente da construção civil, há 4 ou 5 anos atrás, recordando-se de que o Autor, por vezes, se queixava de certos trabalhos.
4) (…), amiga da mãe do Autor e que prestou serviços ao A., cuidando dele quando esteve incapacitado, estando a aguardar o desfecho do processo para receber o pagamento dos serviços que lhe prestou. Cuidou do A. durante maio ano, tratando da sua higiene, da alimentação, ajudando-o em casa e acompanhando-o a consultas e a tratamentos de fisioterapia e tudo o que fosse necessário.
5) (…), mãe do Autor, referiu que, à data do acidente, o A. trabalhava numa fábrica e ao fim-de-semana trabalhava numa casa onde os patrões lhe davam produtos alimentares para trazer para casa. Antes do acidente, o filho fazia desporto, corria, andava de bicicleta. Depois do acidente ficou muito afectado psicologicamente, com medo de não voltar a andar. Como ela e o marido trabalhavam, quando o filho teve alta do hospital, teve de contratar uma senhora para tomar conta dele, dando-lhe banho, cuidava da alimentação, dava-lhe os medicamentos e quando necessário, levava-o a consultas e tratamentos, contratando a amiga (…) pelo valor de € 650,00 por mês, que tomou conta dele pelo menos seis meses, até ele começar a andar, mas ainda não lhe pagou.
[…]
8) (…), mulher do Autor, que explicou a condição física do Autor e as actividades que desenvolvia antes e depois do acidente. Antes do acidente o Autor praticava desporto, tinha músculos e frequentava aulas de (…). Gostava de sair e de estar com amigos e de ir à praia. Após o acidente, ficou triste e desanimado, e não gostava de falar sobre o acidente. Partiu dois dentes e tem cicatrizes na cabeça e no corpo em resultado da cirurgia, perdeu massa muscular e ficou muito magro, o que o deixa desgostoso.
[…]
Quanto aos danos, haverá que apurar os danos físicos causados ao A. pelo acidente. Para o efeito, apresenta-se relevante toda a documentação clínica que se encontra nos autos, cristalizada nos relatórios periciais juntos. Para a sua demonstração, mostrou-se relevante as duas perícias médico-legais levadas a cabo pelo INML, resultando dos respectivos relatórios periciais juntos a fls. 259-264 e a fls. 301-313, com especial incidência neste último, por ser aquele que, por ser o mais recente, se apresenta actualizado.
Do relatório do INML decorre que, do acidente de viação ocorrido em 09.09.2012, resultou para o Autor fracturas no corpo vertebral de L3, fractura das lâminas de L4 e da apófise transversa direita, fractura dos istmos de L2 e protusões discais L4-L5 e L5-S1. O Autor foi acompanhado pelo Hospital de Vila Franca de Xira, tendo sido operado a 24.09.2012. Fez uma segunda cirurgia em março de 2015 para retirada do material de osteossíntese.
Observado pelo perito médico, como sequelas do acidente, o A. apresentava marcha normal, sem apoio ou claudicação, cicatriz na coluna lombar decorrente de cirurgia, cicatriz no crânio, cicatrizes na face e no pescoço e na mão direito, ausência do dente 21 e fractura do dente 41.
O A. esteve 37 dias totalmente incapacitado, entre 09.09.2012 e 15.10.2012, período em que esteve internado e em que não dispunha de autonomia. Posteriormente, entre 12.03.2015 e 13.03.2015 esteve internado para remover o material de osteossíntese, sendo de prever um período de mais 10 dias de incapacidade total.
Entre 16.10.2012 e 16.04.2013, durante 183 dias, o A. passou a ter alguma autonomia, ainda que com limitações, sendo de considerar que, desde a data do acidente e até 16.04.2013, durante 220 dias, o A. esteve impedido de exercer a sua actividade profissional, acrescendo a este um período de mais 10 dias em que esteve incapacitado após a remoção do material de osteossíntese.
Foi fixado ao Autor uma incapacidade funcional permanente geral de seis pontos.
Quanto ao dano futuro, o perito médico referiu que as sequelas do acidente não têm impacto quanto a esforços e que, por ter sido cirurgicamente intervencionado, não há que considerar dano futuro, só o dano estético e a peça dentária.
Especificamente quanto às condições para o exercício da actividade laboral, tendo em consideração que o A. retomou a actividade profissional trabalhando na construção civil e que, à data do acidente era operário fabril, considerou-se que, se tinha condições para a actividade da construção civil, também poderia desempenhar a actividade de empregado fabril, uma vez que o que releva para a perícia é a actividade à data do evento.
Para apurar os danos físicos sofridos pelo Autor e as sequelas que ficou a padecer, o tribunal tomou em consideração o relatório pericial, complementado com os depoimentos das testemunhas que acompanharam a situação do Autor, por força dos laços familiares e da prestação de cuidados.
Deste modo, optou-se por considerar provada apenas a matéria de facto que resulta do relatório pericial, considerando-se não provada a matéria alegada e que, embora não essencial, poderia ter sido demonstrada com recurso a elementos provenientes da documentação clínica hospitalar, que não foi junta ao processo.
Resultou, assim, demonstrada a matéria vertida nos nºs. 37º a 55º e 75º a 83º, 105º a 108º, 113º a 118º e 123º, dos factos provados e não provada a matéria dos artigos 84º a 86º, 92º, 94º, 96º a 105º, 107º a 109º, 113º a 122º, 125º a 129º, 131º a 151º, 153º a 160º, 162º, 171º a 173º, 190º a 195º, 201º, 203º a 207º, 209º a 217º, 221º a 228º, 230º a 238º, 241º, 247º, 248º, 249º, 254º a 257º, 264º a 268º, 270º a 272º, 275º a 279º, 281º, 285º, 286º, 288º, 289º, 299º, 300º, 303º a 312º, 321º, 322º, 333º a 345º e 348º a 384º da petição inicial.
A restante matéria: nºs. 56º a 74º, 92º a 96º, 99º, 100º, 102º a 104º, 110º, 111º, 119º a 122º e 124º a 128º dos factos provados assenta na prova testemunhal, em especial, na amiga dos pais, (…), que acompanhou a Autor no período de convalescença, e a ajudou nas tarefas do dia-a-dia. Para esta matéria, mostraram-se também relevantes os depoimentos da mãe do Autor, (…) e da mulher do Autor, (…), que acompanharam de perto a situação do Autor antes e depois do acidente e puderam transmitir de forma credível, o sofrimento do Autor e as repercussões do acidente, física e psicologicamente, e puderam constatar as alterações que o acidente produziu no comportamento do Autor, testemunhando que antes era pessoa alegre e que gostava de fazer desporto, de sair e conviver com amigos e de ir à praia, actividades que teve de deixar, e que o Autor sofria de muitas dores, e estava desanimado e psicologicamente abatido. […]”
Voltamos a dizer que a motivação/convicção do julgador da primeira instância revela um trabalho de análise e valoração probatória adequadamente efectuado seguindo os ditames legalmente expressos no tocante a essa tarefa não se vislumbrando razões para não aceitar as conclusões a que se chegou na sentença recorrida quanto aos pontos de facto ora em apreço, em face da patente insuficiência da fundamentação probatória do Apelante em causa, já acima assinalada.
Finalmente. quanto ao conjunto de factos considerados como não provados elencados sob os pontos 348º, 349º, 355º a 357º (o ponto 358º foi acima considerado como não escrito face à fórmula conclusiva que encerra) e 359º, afigura-se-nos que os excertos selecionados e transcritos pelo Apelante na motivação recursiva do depoimento da testemunha (…), mãe daquele, não conduzem à decisão defendida pelo Apelante, na medida em que das respostas dadas nem sequer se pode concluir que este último se dedicava à actividade da agricultura.
Na verdade a singela menção a “trabalhava numas hortas, cuidava de uns animais”, “numa quinta nos fins-de semana “, recebendo “qualquer coisa de comida que trazia sempre para casa” revela-se claramente insuficiente para considerar como provada a prática pelo Apelante (…) de agricultura num terreno, em período nunca inferior a duas horas por dia, nele produzindo géneros agrícolas e pecuários que lhe garantiam o sustento, passível de gerar um rendimento liquido não inferior a € 100,00 mensais, bem como uma perda de rendimento entre o acidente e a data da interposição da acção em juízo de € 6.000,00.
Do exposto, resulta a improcedência da impugnação apresentada no respectivo recurso independente pelo Apelante (…) contra a decisão relativa à matéria de facto, que assim se mantem com excepção dos pontos de facto vertidos no segmento relativo aos factos considerados como não provados que foram considerados como não escritos.
Aqui chegados, é tempo de passarmos à análise das várias questões que aportam ao mérito.

B – 2, I – Da alegada responsabilidade na produção do acidente do condutor da viatura de matrícula (…), segurada na Apelada Fidelidade, S.A..
Conforme decorre das conclusões recursivas da Apelante Lusitânia, SA, a atribuição da responsabilidade do acidente em causa nestes autos à pessoa do condutor da viatura (…) baseava-se na versão apresentada por essa Apelante sobre a dinâmica do acidente, versão essa frontalmente oposta à que resultou como provada na sentença recorrida.
Dito de outro modo, a solução jurídica defendida no recurso pela Apelante Lusitânia, SA, no respeitante à dinâmica do evento danoso em análise nestes autos fundava-se na procedência da impugnação relativa à decisão sobre a matéria de facto dirigida pela mesma contra a sentença recorrida implicando que o acervo de factos atinentes ao modo como se produziu o acidente considerados como não provados naquela fosse considerado como provado e concomitantemente como não provados os factos que resultaram assentes na sentença recorrida relativos à dinâmica do embate.
Sucede que a impugnação no tocante a todos aqueles factos ilustradores do acidente foi considerada supra como improcedente, mantendo-se incólume a facticidade descritiva do acidente revelada pela sentença recorrida, a qual aponta inequivocamente para a culpa exclusiva na produção do acidente do condutor da viatura de matrícula (…), segura na Apelante Lusitânia, SA, sendo que no tocante a tal factualidade não apresentou a Apelante Lusitânia, SA, uma diferente solução jurídica, soçobrando a tese da responsabilidade pelo risco baseada no n.º 1 do artigo 503.º do Código Civil e menos ainda a alvitrada presunção prevista no n.º 3 desse normativo face à indemonstração do segundo facto considerado como não provado na sentença recorrida.
Improcedem, assim, as conclusões recursivas da Apelante Lusitânia, SA, no tocante à questão que acabamos de abordar.

- A – 3, I – Cômputo indemnizatório a título de danos materiais alegadamente sofridos pelo Apelante (…) por perda de rendimentos relativos à actividade da agricultura.
Nas respectivas conclusões recursivas aperfeiçoadas sustenta o Apelante (…) que o Tribunal a quo deveria ter valorado em sede de danos patrimoniais sofridos que o mesmo prosseguia a tempo parcial uma actividade agrícola e pecuária reclamando, como tal, a atribuição de indemnização por perda do correspondente rendimento agrícola e pecuário, que estimou em pelo menos € 100,00 mensais, um total de € 6.000,00.
Sucede que também no tocante a esta questão não resultou assente na sentença recorrida o prosseguimento por parte do Apelante (…) da actividade agrícola e pecuária alegada e menos ainda de qualquer rendimento auferido pelo desempenho da mesma.
Na verdade, apesar de ter alegado factualidade nesse sentido a mesma não resultou assente na sentença recorrida, não tendo igualmente procedido a impugnação respeitante à decisão sobre a matéria de facto dirigida contra tal facticidade arquitectada pelo Apelante (…) no respectivo recurso independente, designadamente nos pontos 348º, 349º e 355º a 359º do segmento da sentença recorrida respeitante aos factos considerados como não provados.
Do exposto, improcedem as conclusões recursivas aperfeiçoadas do Apelante (…) no tocante à questão que acabamos de abordar.

- A – 3, II – Cômputo indemnizatório devido a défice funcional permanente (dano biológico)
Nas respectivas conclusões recursivas aperfeiçoadas pugna o Apelante (…) pelo ressarcimento de dano biológico sofrido em quantia não inferior a € 50.000,00.
Para o efeito, deixou alegado o seguinte:
“26. Quanto ao dano patrimonial futuro e ao dano biológico, na sua vertente patrimonial, não pode, jamais, o ora apelante conformar-se com a sentença ora recorrida, que considerou, ao arrepio da jurisprudência dominante dos nossos Tribunais superiores, que não resulta provada uma efetiva perda de rendimentos por parte do Autor recorrente, pois que o Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-psíquica de 6 pontos não se reflete numa incapacidade efetiva, ou seja, não reflete uma diminuição da sua capacidade de ganho.
27. O défice funcional permanente da integridade físico-psíquica assume para o autor recorrente um dano in natura ou dano biológico, cujos efeitos negativos podem atingir bens patrimoniais ou não patrimoniais do lesado, sendo incontroverso que se trata de um dano indemnizável.
28. O próprio Tribunal a quo admite que das lesões sofridas no acidente ficou o recorrente afetado de sequelas que representam défice funcional permanente fixável em 6 pontos.
29. Naturalmente que esse défice funcional implica esforços suplementares no desenvolvimento das atividades que exercia à data do acidente.
30. Ora, a atividade do Autor, à data do acidente, era a de trabalhador por conta de outrem, exercendo funções próprias da categoria profissional de pendurador (ponto 85 dos factos provados), sendo que, como consequência direta e necessária do acidente o recorrente sofreu lesões ao nível da coluna lombar e lombosagrada na parte dorsal, lombar, torácica e nos membros superiores (pontos 106 e 113 dos factos provados).
31. Por isso, no caso em apreço, quer pela sua extensão (défice funcional de 6 pontos), quer pela sua incidência concreta na locomoção – como pendurador o Autor recorrente utilizava de forma permanente a força dos braços e ficou com lesões físicas permanentes na zona torácico-abdominal e na coluna cervical e dorsal – deve admitir-se que a atividade profissional do recorrente ficou lesada.
32. De facto, resulta da experiência comum que qualquer lesão na coluna – como ficou a padecer o Autor recorrente - afeta irremediavelmente a capacidade de trabalho, obrigando o trabalhador a fazer mais pausas no trabalho e, por isso, tem reflexos negativos na produtividade.
33. Por outro lado, as lesões na coluna afetam o exercício de qualquer outra atividade profissional – e não apenas a de pendurador – pelo que a capacidade produtiva do Autor para o exercido de qualquer outra atividade profissional ficou irremediavelmente afetada pelo acidente de viação em causa, devendo assim ser indemnizado a este título.
34. Tanto assim é que o recorrente, tendo começado a trabalhar, já após o acidente, na construção civil, acabou por ser despedido ainda na pendência da presente ação. O que não deixa de ser demonstrativo do que ora se alega.
[…]
38. No caso sub judice, e a este respeito, há que relembrar a matéria dos pontos 84º, 85º, 106º, 107º, 112º a 115º, 117º a 128º dos factos provados, salientando-se, entre o mais, que:
- à data do acidente, o Autor tinha 23 anos de idade;
- auferia o vencimento base de € 520,00, acrescido de subsídio de alimentação no valor de € 101,20 e outros subsídios;
- era robusto e dinâmico;
- por consequência direta e necessária do acidente, sofreu lesões ao nível da coluna lombar e lombosagrada na parte dorsal, lombar, torácica e nos membros superiores;
- ainda se queixa, atualmente, de dores nas partes lesionadas;
- as atividades que desenvolve exigem-lhe atualmente muito mais esforços do que outrora.”
Vejamos de que forma a sentença recorrida abordou, apreciou e decidiu a questão ora em análise:
“O Autor actualmente apresenta um défice funcional permanente fixável em 6 pontos. Apesar do défice fixado pelo INML, não foi perspetivada a existência de dano futuro, pelo que, não foi considerada a existência de dificuldade em executar tarefas e as lesões sofridas são compatíveis com a sua actividade profissional habitual, não existindo qualquer diminuição da capacidade de ganho do Autor.
[…]
Também não ficou demonstrado a existência de um défice funcional permanente, pelo que, nada há a considerar a este propósito.”
Podemos, pois, retirar do raciocínio expresso a este propósito na sentença recorrida não existir fundamento para indemnizar no caso vertente o Apelante (…) por eventual dano resultante do défice funcional permanente que foi fixado em seis pontos.
Apreciando:
Prevê o artigo 564.º, n.º 1, do CC, relativo ao cálculo da indemnização, o seguinte:
1 – O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão”.
Seguindo a lição de Mário Júlio de Almeida Costa (“Direito das Obrigações”, Almedina, 12ª edição, revista e actualizada, 2018, pág. 596), “o dano emergente compreende a perda ou diminuição de valores já existentes no património do lesado; e o lucro cessante refere-se aos benefícios que ele deixou de obter em consequência da lesão, ou seja , ao acréscimo patrimonial frustrado (artigo 564.º, n.º 1)”.
Neste contexto podemos enquadrar o dano ora em análise (“perda de capacidade de ganho”), neste conceito do “lucro cessante”, enquanto beneficio patrimonial que o lesado deixa de obter em consequência das lesões sofridas, que hodiernamente também é tratado por alguns autores como dano biológico, assumindo-se que este último também pode possuir uma vertente não patrimonial.
Consta do segmento motivatório da sentença recorrida, que confere particular validade e ênfase aos relatórios periciais elaborados pelo INML, mormente o último elaborado na sequência de segunda perícia, datado de 15/01/2020, o seguinte:
Quanto às condições para o exercício da actividade laboral, à data do acidente era operário fabril e, quando retoma a actividade profissional fá-lo na construção civil, pelo que se considerou que, se tinha condições para a actividade da construção civil, também poderia desempenhar a actividade de empregado fabril, uma vez que o que releva para a consideração do perito é a actividade à data do evento.
Relativamente aos danos futuros, o senhor perito médico declarou pretender fazer uma alteração ao seu relatório, uma vez que, a partir da situação de ter sido cirurgicamente intervencionado, não há que considerar dano futuro, só o dano estético e a peça dentária.
[…]
Deste modo, o relatório pericial foi considerado pelo tribunal como elemento essencial para o apuramento dos danos físicos causados ao A. pelo acidente e as suas repercussões, quer a título patrimonial, quer a título não patrimonial, atribuindo-se especial relevo ao segundo relatório, por ser o mais actual.
[…]
Quanto aos danos, haverá que apurar os danos físicos causados ao Autor pelo acidente. Para o efeito, apresenta-se relevante toda a documentação clínica que se encontra nos autos, cristalizada nos relatórios periciais juntos. Para a sua demonstração, mostrou-se relevante as duas perícias médico-legais levadas a cabo pelo INML, resultando dos respectivos relatórios periciais juntos a fls. 259-264 e a fls. 301-313, com especial incidência neste último, por ser aquele que, por ser o mais recente, se apresenta actualizado.
[…]
Foi fixado ao Autor uma incapacidade funcional permanente geral de seis pontos.
Quanto ao dano futuro, o perito médico referiu que as sequelas do acidente não têm impacto quanto a esforços e que, por ter sido cirurgicamente intervencionado, não há que considerar dano futuro, só o dano estético e a peça dentária.
Especificamente quanto às condições para o exercício da actividade laboral, tendo em consideração que o A. retomou a actividade profissional trabalhando na construção civil e que, à data do acidente era operário fabril, considerou-se que, se tinha condições para a actividade da construção civil, também poderia desempenhar a actividade de empregado fabril, uma vez que o que releva para a perícia é a actividade à data do evento.
Para apurar os danos físicos sofridos pelo Autor e as sequelas que ficou a padecer, o tribunal tomou em consideração o relatório pericial, complementado com os depoimentos das testemunhas que acompanharam a situação do Autor, por força dos laços familiares e da prestação de cuidados.
Deste modo, optou-se por considerar provada apenas a matéria de facto que resulta do relatório pericial”.
Conforme foi transcrito supra da sentença recorrida, mencionado pelo Tribunal a quo já em sede de enquadramento jurídico, “O Autor actualmente apresenta um défice funcional permanente fixável em 6 pontos”, percebendo-se da leitura do segmento da motivação que se extraiu tal conclusão do relatório junto aos autos, elaborado pelo INML, datado de 15/01/2020, para pouco depois se mencionar que “Também não ficou demonstrado a existência de um défice funcional permanente, pelo que, nada há a considerar a este propósito.”
Esta segunda afirmação afigura-se contraditória relativamente à primeira podendo, porém, a sua razão de ser estar relacionada com o facto de na sentença se ter afirmado também não se vislumbrar a existência de dano futuro ao Apelante (…)
Desde logo convêm sublinhar que a fixação de incapacidade ou desvalorização funcional permanente, seja em maior ou menor grau, na perspectiva de perda de capacidade de ganho nada tem a ver com o “dano estético” nem com a “peça dentária”.
Por outro lado, se nos ativermos com atenção no teor do facto contido no ponto 128 dos factos considerados como provados na sentença recorrida não parece como mais ajustado concluir, sem mais, pela insusceptibilidade de dano futuro, dado que daquele ponto de facto decorre assente que as actividades desenvolvidas pelo Apelante em causa (sem que se especifique quais, donde dever admitir-se incluída todo o tipo de actividade inclusive profissional),“exigem-lhe actualmente muito mais esforço do que outrora, chegando ao fim de um dia bastante mais cansado do que antes do sinistro”.
Por outro lado, da leitura dos factos contidos nos pontos 117º, 118º, 120º e 121º do segmento atinente aos factos considerados como provados na sentença recorrida também se alcança que “em consequência exclusiva das lesões advindas” do acidente sofrido pelo mesmo o Apelante (…) tem limitações na actividade sexual provocada por lombalgia e ficou impedido de poder prosseguir com o exercício da modalidade desportiva de luta denominada “(…)”, que anteriormente ao acidente praticava com regularidade.
Assim, afigura-se-nos que no contexto descrito extraído de factos considerados como provados na sentença recorrida temperado com a atribuição de um défice funcional permanente ao Apelante (…) fixado em seis pontos, inequivocamente assumido no relatório da perícia de avaliação do dano corporal em direito civil, realizado após segunda perícia, datado de 15/01/2020, revela-se acertado, por justificado, aceitar que o Apelante sofreu um dano biológico com impacto futuro na respectiva vida pessoal e mesmo profissional.
De resto, tal decorre das conclusões do aludido relatório pericial do INML, datado de 15/01/2020, onde, além do mais, ficou consignado que existe “Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-psíquica fixável em 6 pontos, sendo de admitir a existência de Dano Futuro”, bem como que “As sequelas descritas são, em termos de Repercussão Permanente na Atividade Profissional compatíveis com o exercício da atividade habitual desempenhada à data do acidente, mas implicam esforços suplementares”, sendo ainda de considerar “Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer” , bem como “Repercussão Permanente na Atividade Sexual fixável”, além das “Ajudas técnicas permanentes“ (itálico nosso).
Afigura-se-nos que os mencionados “esforços suplementares” não poderão no contexto revelado e descrito nos autos ser dissociados de uma franca probabilidade de afectação da capacidade de ganho do Apelante (…), o mesmo sucedendo em virtude da necessidade de ajudas medicamentosas e tratamentos médicos regulares previstos em sede de “Ajudas técnicas permanentes”.
Por outra banda, será de sublinhar, por um lado, não estar minimamente explicado / concretizado em que medida é que a intervenção cirúrgica posteriormente efectuada ao Apelante levou a que não seja de considerar dano futuro ao mesmo e por outro lado não ter ficado demonstrado no acervo dos factos considerados como provados na sentença recorrida que subsequentemente ao acidente e lesões sofridas o Apelante (…) desempenhe, ou tenha desempenhado, funções na construção civil e menos ainda que as sequelas do acidente não sejam impactantes quanto a esforços.
Isto dito, é de considerar, como o mesmo sustenta nas suas conclusões recursivas aperfeiçoadas, indemnizável o dano biológico, enquanto dano resultante de défice funcional permanente com influência na sua vida pessoal e profissional sofrido pelo Apelante (…).
Diz-nos o artigo 566.º do CPC que:
2-Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal e a que teria nessa data se não existissem danos.
3-Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados”.
No n.º 2 acima reproduzido encontra-se consagrada a teoria da diferença.
Com base na dita teoria na avaliação da indemnização pecuniária procede-se ao “apuramento da «diferença» entre a situação real e a situação hipotética actuais do património do lesado – isto é , na data mais recente possível –, devendo o montante da indemnização apagar ou compensar a exacta separação entre elas” (“Direito das Obrigações“, Almeida Costa, Almedina, 12ª ed., págs. 777-778 ).
A teoria da diferença conhece algumas excepções designadamente a que decorre do supra referido n.º 3 do artigo 566.º do CC, aí relevando o critério da equidade, não oferecendo dúvidas de que a fixação da indemnização segundo a mesma “somente tem lugar quando se encontre esgotada a possibilidade de recurso aos elementos com base nos quais se determinaria com precisão o montante dos danos” (Almeida Costa , obra citada, pág. 780).
No caso do apuramento do dano consistente na perda de capacidade de ganho, ou ganho futuro, a jurisprudência dos Tribunais Superiores tem vindo a defender um critério que poderemos designar como misto, uma vez que parte da factualidade concretamente provada em cada caso, admitindo o recurso a critérios objectivos, aceitando (sem lhes reconhecer, porém, qualquer obrigatoriedade de observância por parte do Juiz no âmbito do cômputo da indemnização), os plasmados na Portaria n.º 377/2008, de 26/05/2008, actualizada pela Portaria n.º 679/2009, de 25/06, utilizando-os como variáveis em fórmulas matemáticas mais ou menos complexas com vista a determinar o capital necessário para, diluído ao longo do seu tempo de vida juntamente com o respectivo rendimento, poder proporcionar ao lesado o rendimento perdido e corrigindo ainda a valorização obtida com base em critérios de equidade, por força do disposto no mencionado n.º 3 do artigo 566.º do CC, este sim o critério que legalmente se impõe ao Juiz atender no âmbito da avaliação do dano patrimonial futuro, cujo valor exacto em regra não pode ser averiguado.
A este propósito escreveu-se no Acórdão do STJ de 04/12/2007 (Proc. 07A3838, Relator Conselheiro Mário Cruz ), em nota sumativa, o seguinte:
“I – Na determinação da indemnização compensatória por danos patrimoniais futuros, as fórmulas financeiras ou tabelas de cálculo habitualmente utilizadas para a determinação do capital necessário que, diluído ao longo do tempo da vida activa e juntamente com o respectivo rendimento proporcione à vítima o rendimento perdido, não satisfazem o objectivo de indemnização reparadora, por levarem a resultados francamente insuficientes e que a realidade desmente, havendo por isso que recorrer, em último grau , à equidade;
II – Tais fórmulas ou tabelas não contemplam a tendência de melhoria do nível de vida, a ascensão da produtividade, o aumento progressivo dos salários, as despesas que por via das incapacidades geradas o lesado vai ter que efectuar e não efectuaria se não fosse a lesão, não conta com a inflação nem com o aumento da longevidade e parte do pressuposto que a situação profissional do lesado se manteria definitivamente estática, sem progressões na carreira […]”
Ora bem, no caso concreto apenas podemos fazer apelo, no tocante à avaliação e ressarcimento do dano biológico reclamado pelo Apelante (…), a escassos dados objectivos, que resultaram do acervo dos factos considerados como provados na sentença recorrida, tais como trabalhar, à data da produção do evento danoso em causa, numa empresa com a categoria de pendurador, auferindo um vencimento base mensal de € 520,00, acrescido de € 101,20 de subsídio de alimentação e “outros subsídios”, a pouca idade que tinha na dita ocasião (23 anos), ser um jovem forte, robusto e dinâmico e com grande alegria de viver e praticar com regularidade a modalidade de luta “(…)” (cfr. factos provados, respectivamente, sob os pontos 84º, 112º, 119º e 120º), sem olvidar o coeficiente de incapacidade funcional permanente de seis pontos fixado ao Apelante em causa revelado no relatório pericial de 15/01/2020, aceite na sentença recorrida.
A escassez desta factualidade justifica, sem margem para rebuços, que no caso vertente se apele fundamentalmente ao critério da equidade.
Deste modo, tendo presente a esperança média de vida actual em Portugal para o sexo masculino (78 anos segundo o INE), o rendimento médio anual percebido pelo Apelante (…) à data do acidente que rondaria os € 8.500,00 (€ 520,00 + € 101,20 x 12 + € 520,00 x 2) e a desvalorização funcional permanente de seis pontos que ficou a afectá-lo julgamos ajustado fixar o cômputo indemnizatório pelo peticionado dano biológico no montante de € 25.000,00, procedendo, como tal, parcialmente, as conclusões recursivas do Apelante (…) quanto a esta questão.

A-3, III e B-2, II – Cômputo indemnizatório a título de danos não patrimoniais sofridos pelo Apelante.
Impõe-se agora analisar a questão atinente ao montante indemnizatório a título de danos não patrimoniais sofridos pelo Apelante (…).
Nas conclusões recursivas aperfeiçoadas este Apelante entende dever ser fixado por este Tribunal, àquele título, quantia não inferior a € 50.000,00.
Por seu turno, a Apelante Lusitânia, SA, pugna nas respectivas conclusões recursivas pela fixação de montante nunca superior a € 15.000,00.
Na respectiva resposta aos dois recursos independentes interpostos pelos Apelantes a Apelada Fidelidade, SA, entende que tais danos foram supervalorizados pelo Tribunal recorrido afigurando-se-lhe adequada a fixação de quantia não superior a 15.000,00.
Espreitando de novo a fundamentação carreada para a sentença recorrida relativamente à apreciação e valorização de tais danos verificamos constar no enquadramento jurídico da mesma com relevo para decisão da questão ora em causa o seguinte:
“No caso dos autos, temos como danos não patrimoniais o sofrimento, o dano estético, em grau 2, a tristeza pelas limitações, a repercussão permanente nas actividades de lazer, em grau 4, e as dores que o A. sofreu em consequência do acidente, no grau 5, todos numa escala de 0 a 7 graus de gravidade crescente.
Ponderados os factos atrás descritos, crê-se como adequada a atribuição ao A. de uma indemnização no montante de € 40.000,00 a título de danos não patrimoniais.”
Apreciando:
Dispõe o artigo 496.º do CC, epigrafado “Danos não Patrimoniais”, o seguinte:
1 – Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
[…]
4 – O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; […]
Os danos não patrimoniais consubstanciam danos não susceptíveis de avaliação pecuniária, reportando-se a valores de ordem moral, ideal, ou espiritual.
Trata-se, por conseguinte, de danos não susceptíveis de avaliação pecuniária e que não se reflectem no património do lesado.
“Constituem danos não patrimoniais, por exemplo, o sofrimento ocasionado pela morte de uma pessoa, o desgosto derivado de uma injúria, as dores físicas produzidas por uma agressão” (Almeida Costa , obra supra citada, pág. 592).
Os danos não patrimoniais indemnizáveis são apenas aqueles que se mostrem suficientemente graves para merecerem a tutela jurídica.
O critério de fixação do montante indemnizatório de tais danos é o da equidade, sustentando a jurisprudência dos Tribunais Superiores, de forma mais ou menos unânime, que se deve atender aos valores arbitrados em situações concretas semelhantes, por forma a garantir alguma coerência e melhor Justiça a nível do decisório nesta matéria e do mesmo modo salvaguardar igualmente o principio da igualdade.
A nível da jurisprudência do STJ, que se debruçou sobre esta matéria dos danos não patrimoniais, chamamos à colação quatro recentes arestos, todos eles acessíveis para consulta in www.dgsi.pt, que nos parecem elucidativos e nos ajudarão, a final, a decidir pelo cômputo dos mesmos no caso concreto.
Assim no Acórdão proferido em 04/06/2015 (Proc. 1166/10.7TBVCD.P1.S1), Relatora Conselheira Teresa Pizarro Beleza, referiu-se o seguinte:
Tendo ficado provado que as sequelas decorrentes de um acidente ocorrido em 2005 determinaram para a autora, então com 17 anos de idade, uma incapacidade parcial permanente para o trabalho de 16,9 pontos – e, por isso, com efectiva repercussão na actividade laboral –, nada há a censurar à utilização de tabelas e à introdução das correcções habitualmente citadas na jurisprudência, nem ao recurso ao valor de € 800,00 ilíquido auferido pela lesada a título de salário, a partir de 2013, para fixar o valor da indemnização devida por danos patrimoniais futuros em € 55.000,00, como decidiu a Relação.
Tendo em consideração: (i) as circunstâncias do acidente, o sofrimento que implicou, os tratamentos médicos, intervenções, internamentos e períodos que se lhe seguiram que se prolongaram no tempo, tendo a lesada apenas tido alta mais de 4 anos depois do acidente; (ii) a repercussão não patrimonial da incapacidade parcial permanente fixada à autora; (iii) as sequelas do acidente, as repercussões estéticas, as dores e demais sofrimento que se prolongarão pela vida da autora, que à data do acidente era saudável e tinha apenas 17 anos, e, finalmente; (iv) o grau de culpa da condutora do veículo causador do acidente que resultou de uma infracção séria às regras de circulação automóvel, traduzidas no desrespeito de um sinal de stop colocado à entrada de um cruzamento, mostra-se ajustado fixar a indemnização devida à autora por danos não patrimoniais em € 40.000,00, como decidiu a Relação.”
Já no Acórdão proferido em 21/01/2016 (Processo 1021/11.3TBABT.E1.S1), Relator Conselheiro Lopes do Rego, decidiu-se o seguinte:
“O juízo de equidade das instâncias, essencial à determinação do montante indemnizatório por danos não patrimoniais, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida - se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspectiva actualística, generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade.
Não é desproporcionada à gravidade objectiva e subjectiva das lesões sofridas por lesado em acidente de viação o montante de € 50.000,00, atribuído como compensação dos danos não patrimoniais, num caso caracterizado pela existência em lesado jovem, de 27 anos de idade, de múltiplos traumatismos (traumatismo na bacia, traumatismo toráxico, com hemotórax, traumatismo crânio-encefálico grave, com hemorragia subaracnoideia e contusão cortico-frontal, à esquerda, traumatismo abdominal, fratura do condilo occipital esquerdo, fratura do acetábulo direito e desernevação do ciático popliteu externo direito), envolvendo sequelas relevantes ao nível psicológico e de comportamento, produzindo as lesões internamento durante 83 dias, quantum doloris de 5 pontos em 7 e dano estético de 2 pontos em 7; ficando com um deficit funcional permanente da integridade físico-psíquica, fixável em 16 pontos, e com repercussão nas actividades desportivas e de lazer, fixável em grau 2 em 7,envolvendo ainda claudicação na marcha e rigidez da anca direita; implicando limitações da marcha, corrida, e todas as actividades físicas que envolvam os membros inferiores e determinando alteração relevante no padrão de vida pessoal do lesado, que coxeia e é inseguro, física e psiquicamente, triste, deprimido e com limitação na capacidade de iniciativa; sofrendo incómodos, angústias e perturbações resultantes das lesões que teve, dos tratamentos e intervenções cirúrgicas a que foi sujeito; terá de suportar até ao fim dos seus dias os sofrimentos e incómodos irreversivelmente decorrentes das limitações com que ficou.
Salientando ainda o acórdão proferido em 30/05/2019 (Proc. 3710/12.6TJVNF.G1.S1), Relator Conselheiro Bernardo Domingos, encontramos o seguinte segmento decisório:
Resultando dos factos provados que a autora: (i) tinha 17 anos, completados no dia do acidente que a vitimou, ocorrido em 01-01-2010; (ii) em virtude desse acidente, ficou encarcerada no veículo, com perda de consciência; (iii) foi transportada para o serviço de urgência do Hospital, no qual ficou internada, tendo sido submetida a tratamentos e a operação ao fémur e ao punho; (iv) recebeu acompanhamento das especialidades de ortopedia, odontologia e psicologia, foi submetida a fisioterapia e a novas cirurgias, tendo tido alta definitiva em 31-03-2011; (v) devido às lesões e aos tratamentos, sofreu dores de grau 5 numa escala de 1 a 7; (vi) ficou a padecer de edema de ambos os calcanhares necessitando de usar calçado com um número acima; (vii) apresenta cicatrizes que determinam dano estético de grau 3 numa escala de 1 a 7; (viii) perdeu o ano lectivo 2009/2010, mudando para o curso de técnica de recepção no ano lectivo seguinte, sem que tenha ingressado no ensino superior como idealizara antes do sinistro; (ix) deixou de praticar futsal, o que lhe traz desgosto, valorizado como repercussão permanente as actividades desportivas e de lazer de grau 1 numa escala de 1 a 7; (x) dependeu de terceiros na realização das suas tarefas diárias, passou a isolar-se, deixou de ter vontade de conviver com os amigos, tornou-se facilmente irritável, de trato difícil, ansiosa e sente medo de andar de automóvel quando circula a velocidade superior a 90km/hora; (xi) devido a cansaço, deixou de poder correr e fazer caminhadas como anteriormente e ganhou peso por não poder praticar desporto, tendo de fazer dieta para o manter controlado; considera-se adequado o montante de € 25 000,00 fixado, pela Relação, a título de indemnização por danos não patrimoniais (arts. 496.º, n.os 1 e 3, e 494.º, do CC).
Finalmente, vejamos ainda o que se decidiu a este título no acórdão proferido em 19/09/2019 (Proc. 2706/17.6T8BRG.G1.S1), Relatora Conselheira Maria do Rosário Morgado:
Resultando dos factos provados que: (i) o recorrente foi sujeito a exames médicos e vários ciclos de fisioterapia, bem como uma intervenção cirúrgica; (ii) ficou afetado com um défice funcional permanente de 32 pontos; (iii) sofreu dores quantificáveis em 5 numa escala de 7 pontos; (iv) sofreu um dano estético quantificado em 3 numa escala de 7 pontos; (v) a repercussão das sequelas sofridas nas atividades desportivas e de lazer é quantificada em 3 numa escala de 7 pontos; (vi) o recorrente sofreu um rebate em termos psicológicos, em virtude das lesões e sequelas permanentes, designadamente por não poder voltar a exercer a sua profissão habitual e/ou outra no âmbito da sua formação profissional; revela-se ajustado o montante de € 50 000,00 para compensar os danos não patrimoniais por aquele sofridos.
Face a todo o exposto, tendo presente a facticidade descrita no segmento atinente aos factos considerados como provados na sentença recorrida sob os pontos 56º, 57º, 63º, 92º a 99º, 103º a 110º, 113º a 118º e 122º a 127º, bem como as conclusões plasmadas no relatório de perícia de avaliação de dano corporal efectuado no INM, datado de 15/01/2020, respeitantes ao quantum doloris fixado (grau 5/7), ao dano estético permanente fixado (grau 2/7), à Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas e de Lazer fixada (grau 4/7), e à Repercussão permanente na Actividade Sexual fixada (grau 2/7), considera-se adequado manter a quantia de € 40.000,00 arbitrada na sentença recorrida a título de danos não patrimoniais, montante já devidamente actualizado, sem olvidar os anos de pendência da acção na 1ª Instância.
Conclui-se, assim, quanto a esta questão ora reapreciada procederem parcialmente as conclusões recursivas do Apelante (…) e improcederem as conclusões recursivas da Apelante Lusitânia, SA.
Em sede de juros a contabilizar, quer no caso da indemnização por dano biológico com rebate patrimonial futuro, quer no tocante à indemnização por danos não patrimoniais, face à actualização considerada neste acórdão (conforme já efectuado na sentença recorrida relativamente a estes últimos danos), impõe-se respeitar a jurisprudência fixada no acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 4/2002.

B – 2, III – Reembolso de prestações por doença (baixa médica), pagas ao Apelante (…) pelo Centro Distrital de Santarém do Instituto de Segurança Social, I.P.
Por último, impõe-se reapreciar a questão do ressarcimento ao Instituto de Segurança Social, I.P., das prestações pagas ao Apelante (…) por doença (baixa médica).
Ora, considerando a facticidade constante dos pontos 86, 87 e 129 do segmento da sentença recorrida respeitante aos factos considerados como provados, relembrando o naufrágio da versão da Apelante Lusitânia, SA, no tocante à dinâmica do acidente em apreciação nestes autos, resta apenas reconhecer a responsabilidade da Apelante Seguradora pelo reembolso ao Centro Distrital de Santarém do Instituto de Segurança Social, I.P, da quantia paga por este último ao Apelante (…) traduzida no montante de € 1.329,31, acrescido de juros legais vencidos e vincendos sobre o capital em dívida desde a data da sua notificação para contestar o pedido de reembolso até integral pagamento.
Improcedem, em consequência, as conclusões recursivas da Apelante Lusitânia, SA, no tocante a esta última questão.
Em suma, procede parcialmente o recurso de apelação independente interposto pelo Apelante (…) e improcede o recurso de apelação independente interposto pela Apelante Lusitânia, SA.
*
V – Decisão
Face a todo o exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar parcialmente procedente o recurso de apelação independente interposto pelo Apelante (…) e improcedente o recurso de apelação independente interposto pela Apelante Lusitânia – Companhia de Seguros, SA, revogando parcialmente a sentença recorrida, decidindo-se o seguinte:
1 – Condenar a Apelante Lusitânia, SA a pagar ao Apelante (…) a quantia indemnizatória total de € 71.054,62 (setenta e um mil e cinquenta e quatro euros e sessenta e dois cêntimos), a título de danos patrimoniais sofridos e ainda não ressarcidos (€ 6.054,62), danos não patrimoniais (€ 40.000,00) e dano biológico decorrente de défice (incapacidade) funcional permanente com impacto a nível pessoal e profissional (€ 25.000,00), acrescida de juros à taxa legal, desde a data da sentença até integral pagamento;
2 – Condenar a Apelante Lusitânia, SA, a reembolsar o Instituto de Segurança Social, I.P., Centro Distrital de Segurança Social de Santarém, na quantia de € 1.329,31 (mil e trezentos e vinte e nove euros e trinta e um cêntimos), acrescida de juros legais vencidos e vincendos, sobre o capital em dívida, desde a data da sua notificação para contestar o pedido de reembolso até integral pagamento;
3 – Condenar o Apelante (…) e a Apelante Lusitânia, S.A., no pagamento das custas relativas ao recurso de apelação independente interposto pelo primeiro, na proporção de metade para cada um (sem prejuízo do apoio judiciário de que o primeiro beneficia) e esta última no pagamento da totalidade das custas relativamente ao recurso de apelação independente por si interposto para este Tribunal Superior (artigo 527.º, nºs 1 e 2, do CPC);
4 – Revogar a sentença recorrida no segmento final composto por dois parágrafos, que se inicia em “Atento o valor da indemnização […]” e termina em […] devendo suportar as custas que lhe competem”.
Notifique.

Évora, 26 de Outubro de 2023
José António Moita (Relator)
Maria da Graça Araújo (1º Adjunto)
Maria Adelaide Domingos (2º Adjunto)