Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
3599/23.0T8STB.E1
Relator: ANA MARGARIDA LEITE
Descritores: DESPEJO
PROCEDIMENTO
OPOSIÇÃO
Data do Acordão: 10/26/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Em procedimento especial de despejo, a falta de dedução de oposição pela requerida, com a consequente conversão pelo BNA do requerimento de despejo em título para a desocupação do locado, preclude a possibilidade de alegação em fase processual posterior de fundamentos que visem obstar à constituição de tal título.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 3599/23.0T8STB.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal
Juízo Local Cível de Setúbal


Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

1. Relatório

(…) moveu procedimento especial de despejo contra (…), o qual se iniciou com a apresentação, no Balcão Nacional do Arrendamento (BNA), de requerimento de despejo relativo ao imóvel sito na Rua (…), n.º 18, 1.º-direito, frente, em Setúbal, com fundamento na cessação do contrato de arrendamento celebrado com a requerida, por oposição deduzida pela senhoria à respetiva renovação automática.
Recebido o requerimento, o BNA notificou a requerida.
A requerida não apresentou oposição.
O BNA converteu o requerimento de despejo em título para desocupação do locado.
O agente de execução deslocou-se ao locado para tomar posse do imóvel e lavrou auto de diligência, datado de 17-05-2023, do qual consta o seguinte:
No dia 13 de Maio de 2023, pelas 13.00 horas, desloquei-me à morada sita na Rua (…), n.º 18-1.º-Dto., Frente, em Setúbal, na qualidade de Agente de Execução no processo supra identificado, para tomar a posse do imóvel e proceder à entrega do mesmo à Requerente.
Acontece que, ninguém atendeu.
Pelo que, deixei aviso com hora certa, a agendar a diligência para o dia 15.05.2023, pelas 18.30 horas.
No dia 15.05.2023, pelas 18.30 horas, a AE deslocou-se novamente ao imóvel. No local encontrava-se a requerida (…), que se recusou a entregar voluntariamente o imóvel arrendado sito Rua (…), n.º 18-1.º-Dto., Frente, em Setúbal.
Pelo exposto, não foi possível proceder à imediata desocupação do local arrendado, nem foi possível convencionar entre a Senhoria e a arrendatária um prazo para que o imóvel fique devoluto, havendo injustificada resistência da arrendatária à desocupação do imóvel, e para constar se lavrou o presente auto de diligência.
Os autos foram remetidos ao Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, acompanhados por requerimento visando a autorização judicial para a entrada imediata no domicílio.
Por despacho de 19-05-2023, foi determinada a notificação da requerida para se pronunciar, querendo, em cinco dias, quanto ao requerimento de autorização judicial para entrada imediata no domicílio.
Notificada, a requerida apresentou articulado de resposta – acompanhado por documentos e procuração –, invocando a nulidade e a falsidade do contrato de arrendamento, o incumprimento do prazo de antecedência da comunicação da oposição à renovação do contrato deduzida pela requerente, o não recebimento das cartas contendo tal comunicação e a inexistência de rendas em dívida, pugnando seja recusada a autorização para entrada no domicílio.
Por despacho de 15-06-2023, foi conferida autorização para entrada imediata no domicílio, com a fundamentação seguinte:
Antes de mais, importa referir que já decorreu o prazo de oposição que a Requerida tinha para se opor ao procedimento especial de despejo. Com efeito, a notificação do requerimento de despejo considerou-se efetuada no dia 30-03-2023, nos termos do artigo 230.º, n.º 2, do Novo Código de Processo Civil, aplicável pela via do artigo 15.º-D, n.º 3, NRAU e já [não] correram mais de 15 dias a contar do dia 30-03-2023. Em virtude de já ter decorrido o prazo de oposição, não pode a resposta ao pedido de autorização para entrada no domicílio constituir novo meio para apresentar oposição.
Nesta fase, a Lei impõe somente que se verifique:
- Se foi utilizado o modelo de requerimento para autorização judicial para entrada no domicílio e se este se encontra corretamente preenchido [artigo 15.º-L, n.º 4, alínea a), NRAU];
- Se o requerimento está instruído com o título para desocupação do locado e documento comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida [artigo 15.º-L, n.º 4, alínea a), NRAU];
- Se foi respeitada a forma da notificação da Requerida exigida para cessação do contrato e para a notificação no âmbito do procedimento especial de despejo [artigo 15.º-L, n.º 4, alínea a), NRAU].
Assim, nesta fase processual já não pode ser apreciada a questão de saber se o contrato é nulo, se a oposição à renovação não respeitou o prazo de antecedência, se a Requerida sempre pagou as rendas, se os problemas de saúde da Requerida podem constituir obstáculo à cessação do contrato de arrendamento, pois tais questões são fundamento de oposição ao requerimento de despejo e, como se viu, já decorreu o prazo de oposição.
Posto isto, no caso vertente, verificamos que os requisitos previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 4 do artigo 15.º-L mostram-se integralmente cumpridos. Em especial, no que concerne à oposição à renovação, foi respeitada a forma prevista no artigo 9.º, n.º 1, NRAU, dado que a oposição à renovação, operou-se por carta registada com aviso de receção. Relativamente ao procedimento especial de despejo, denotamos que a carta registada com aviso de receção para notificação da Requerida, enviada nos termos do n.º 1 do artigo 15.º-D, NRAU foi devolvida com a menção “objeto não reclamado”. Contudo, foi enviada nova notificação para o locado, e a carta com a notificação foi depositada no recetáculo postal domiciliário da morada do locado no dia 30-03-2023 (conforme documento junto aos autos), ficando assim cumprido o disposto no n.º 4 e 5 do artigo 229.º do Novo Código de Processo Civil, para o qual o artigo 15.º-D, n.º 3, NRAU remete. Desta feita, foi cumprido o procedimento para notificação do requerimento de despejo à Requerida e a notificação do requerimento de despejo considera-se efetuada no dia 30-03-2023, nos termos do artigo 230.º, n.º 2, Novo Código de Processo Civil, aplicável pela via do artigo 15.º-D, n.º 3, NRAU.
Por todo o exposto, autoriza-se a entrada imediata no domicílio, nos termos do artigo 15.º-L, n.º 1, NRAU.

Inconformada, a requerida interpôs recurso deste despacho, pugnando pela anulação do procedimento especial de despejo, bem como pela revogação do despacho recorrido e respetiva substituição por decisão que reponha a vigência do contrato de arrendamento, terminando as alegações com a formulação das conclusões que se transcrevem:
«1. Os autos branqueiam ou omitem cabalmente a existência de um quadro legal que garante à recorrente a permanência no locado sua habitação.
2. Tendo falecido a senhoria, cujo contrato vigorava em associação com a Associação de Proprietários de Setúbal,
3. A herdeira a partir do contrato inicial, falsificou-o, dando-lhe nova data e intervenção abusiva de assinaturas inexistentes, pelo menos que não contou com a assinatura da recorrente.
4. Por processo de falsas assinaturas a herdeira da senhoria “fabricou” um suposto contrato que supostamente desejaria alterar o inicialmente celebrado.
5. A herdeira omitiu nomeadamente que a recorrente não falhou uma única renda, tendo essa obrigação absolutamente cumprida.
6. A recorrente é enfermeira e paradoxalmente carece de tratamentos continuados e ajuda de enfermeiras.
7. Vem sofrendo sucessivos internamentos hospitalares que a afastam de casa, pelo que a recorrente não teve conhecimento do procedimento de despejo intentado pela via do BNA.
8. O despejo pretendido assenta em atos graves, nulos e a nulidade que se invoca nesta sede é invocável a todo o tempo nos termos do disposto no artigo 286.º do CC e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal.
9. Invocação sem prazo e com efeitos retroativos ex vi do artigo 289.º do CC.
10. A decisão judicial ora recorrida, ao acolher um tal procedimento ilegal premeia o lado errado do direito.
11. A decisão que se requer deste Superior Tribunal apreciará essa nulidade e ordenará a sustação e anulação do procedimento de despejo em curso.
12. Pois que o despacho recorrido despreza as normas vigentes, não apenas as constitucionais – artigo 65.º, n.º 1, da CRP – como normas vulgares NRAU no tocante aos direitos fundamentais da recorrente.
13. A qual nem uma renda lhe deve.
14. Inexiste título válido para a desocupação pretendida.
15. Foi violada a forma de notificação da recorrente para cessar o contrato.
16. A recorrente apela para a revogação da sentença e a sua substituição por douto acórdão deste TRE que reponha os seus direitos e a vigência do contrato de arrendamento cujas rendas estão em dia o que, com o doutro suprimento, se espeça, assim fazendo a acostumada Justiça».
A requerente apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.
Face às conclusões das alegações da recorrente e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre apreciar as questões seguintes:
- da invocação da falta de conhecimento pela requerida do procedimento especial de despejo;
- da reposição da vigência do contrato de arrendamento;
- do efeito pretendido com a apelação.
Corridos os vistos, cumpre decidir.


2. Fundamentos

2.1. Tramitação processual
Os elementos com relevo para a apreciação das questões suscitadas constam do relatório supra.

2.2. Apreciação do objeto do recurso

2.2.1. Invocação da falta de conhecimento pela requerida do procedimento especial de despejo
Vem posta em causa na apelação a decisão judicial, proferida no âmbito de procedimento especial de despejo intentado no Balcão Nacional do Arrendamento, de concessão de autorização para entrada imediata no domicílio, nos termos requeridos pelo agente de execução.
Nas alegações da apelação, a requerida sustenta que não teve conhecimento do procedimento especial de despejo intentado no BNA, requerendo a anulação do procedimento em curso.
O procedimento especial de despejo consiste num meio processual previsto no artigo 15.º do NRAU[1], o qual se destina a efetivar a cessação do arrendamento, independentemente do fim a que este se destina, quando o arrendatário não desocupe o locado na data prevista na lei ou na data fixada por convenção entre as partes.
A tramitação do procedimento de despejo compete ao BNA (artigo 15.º-A), sendo remetido a tribunal caso seja deduzida oposição ou se suscite outra questão sujeita a decisão judicial (artigo 15.º-H, n.ºs 1 e 4), como é o caso da apreciação de requerimento visando a autorização para entrada imediata no domicílio (artigo 15.º-L).
Compete ao BNA apreciar o requerimento de despejo apresentado, podendo recusá-lo nos casos previstos nas várias alíneas do n.º 1 do artigo 15.º-C. Sendo o requerimento recebido, o BNA procede à notificação do requerido, nos termos previstos no artigo 15.º-D, após o que, se não for deduzida oposição ou se verificar alguma das demais circunstâncias previstas no n.º 1 do artigo 15.º-E, converte o requerimento de despejo em título para desocupação do locado ou, sendo deduzida oposição, remete os autos ao Tribunal indicado pelo requerente, para distribuição, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 15.º-H.
No caso presente, conforme se extrai do relatório supra, o BNA recebeu o requerimento de despejo e notificou a requerida, que não apresentou oposição, tendo o BNA convertido o requerimento em título para desocupação do locado, na sequência do que o agente de execução se deslocou ao locado para tomar posse do imóvel, lavrando auto de diligência no qual consignou que a requerida se recusou, no dia 15-05-2023, a entregar voluntariamente o imóvel, motivo pelo qual apresentou requerimento visando seja conferida autorização judicial para a entrada imediata no domicílio, tendo os autos sido remetidos a Tribunal.
Notificada para se pronunciar quanto ao requerimento de autorização judicial para entrada imediata no domicílio, a requerida apresentou articulado, acompanhado por documentos e procuração. No articulado apresentado, a requerida pronuncia-se no sentido da recusa da autorização para entrada no domicílio – invocando a nulidade e a falsidade do contrato de arrendamento, o incumprimento do prazo de antecedência da comunicação da oposição à renovação do contrato deduzida pela requerente, o não recebimento das cartas contendo tal comunicação e a inexistência de rendas em dívida –, mas não invoca a omissão do ato de notificação pelo BNA ou que a destinatária não tenha tido conhecimento desse ato, questões que só suscita nas alegações do presente recurso.
Estando em causa a prática do ato de notificação a que alude o artigo 15.º-D do NRAU, através do qual é dado conhecimento ao requerido de que foi proposto contra ele o procedimento especial de despejo – para, no prazo de 15 dias, desocupar o locado ou deduzir oposição à pretensão e/ou requerer o diferimento da desocupação do locado –, é aplicável, nos termos do n.º 3 do preceito, com as necessárias adaptações, o disposto no artigo 228.º, nos n.ºs 3 a 5 do artigo 229.º e no n.º 2 do artigo 230.º do Código de Processo Civil, que regulam o ato de citação.
É sabido que a falta de citação do réu tem como efeito, nos termos do artigo 187.º, alínea a), do CPC, a anulação do processado posterior à petição inicial, salvando-se apenas esta, pelo que configura uma causa de nulidade.
O regime a que se encontra sujeita a nulidade por falta de citação, prevista no mencionado artigo 187.º, encontra-se regulado nos artigos 189.º, 196.º, 198.º, n.º 2, e 200.º, n.º 1, todos do CPC.
Tratando-se de nulidade decorrente da falta de citação do réu, extraem-se dos aludidos preceitos as regras seguintes: i) a nulidade considera-se sanada se o réu intervier no processo sem arguir logo a falta da sua citação (artigo 189.º); ii) o tribunal pode conhecer oficiosamente desta nulidade, a não ser que deva considerar-se sanada (o artigo 196.º); iii) a nulidade pode ser arguida em qualquer estado do processo, enquanto não deva considerar-se sanada (artigo 198.º, n.º 2); iv) o tribunal deve conhecer da nulidade logo que dela se aperceba, podendo suscitá-la em qualquer estado do processo, enquanto não deva considerar-se sanada (artigo 200.º, n.º 1).
No caso presente, a requerida interveio nos autos, juntando procuração e apresentando o supra mencionado articulado, acompanhado por documentos, sem suscitar a questão da falta de conhecimento do procedimento especial de despejo intentado no BNA, matéria que só invocou em sede de recurso.
Dúvidas não há de que a junção de procuração outorgada pela requerida a advogado e a apresentação de articulado configuram atos de intervenção no processo, os quais pressupõem que a requerida tem conhecimento da existência do procedimento, sendo certo que tal intervenção não foi acompanhada pela invocação da falta da sua notificação, pelo que é de considerar sanado o vício eventualmente decorrente da falta da notificação em apreciação, o que impede a apreciação da questão ora suscitada.
Nesta conformidade, decide-se não apreciar a questão da invocada falta de conhecimento pela requerida do procedimento especial de despejo intentado no BNA.

2.2.2. Reposição da vigência do contrato de arrendamento
Encontra-se impugnado no presente recurso o despacho que concedeu autorização para entrada imediata no domicílio, deferindo requerimento apresentado pelo agente de execução em procedimento especial de despejo intentado no BNA.
Conforme consta do relatório supra, recebido o requerimento de despejo e notificada a requerida, que não apresentou oposição, o BNA converteu o requerimento em título para desocupação do locado; de seguida, o agente de execução deslocou-se ao locado para tomar posse do imóvel, lavrando auto de diligência no qual consignou que a requerida se recusou, no dia 15-05-2023, a entregar voluntariamente o imóvel, motivo pelo qual requereu seja conferida autorização judicial para a entrada imediata no domicílio, requerimento que foi deferido pelo despacho posto em causa na presente apelação.
Entendeu a 1.ª instância que, não tendo a requerida deduzido oposição ao procedimento especial de despejo na sequência da notificação efetuada pelo BNA, a audição da mesma em fase processual subsequente, previamente à apreciação do pedido de autorização para entrada no domicílio, não constitui um novo meio para apresentação de oposição, motivo pelo qual se consignou o seguinte: nesta fase processual já não pode ser apreciada a questão de saber se o contrato é nulo, se a oposição à renovação não respeitou o prazo de antecedência, se a Requerida sempre pagou as rendas, se os problemas de saúde da Requerida podem constituir obstáculo à cessação do contrato de arrendamento, pois tais questões são fundamento de oposição ao requerimento de despejo e, como se viu, já decorreu o prazo de oposição.
Discordando da decisão proferida, a recorrente sustenta que lhe assiste o direito a permanecer no imóvel, invocando a falsidade e a nulidade do contrato de arrendamento apresentado pela requerente, a inexistência de rendas em dívida e a falta de comunicação da cessação do contrato, em consequência do que alega a inexistência de título válido para a desocupação do locado, pugnando pela revogação da decisão recorrida e respetiva substituição por decisão que reponha a vigência do contrato de arrendamento.
Não obstante manifestar discordância relativamente à decisão recorrida, a apelante não se reporta às consequências que a 1.ª instância extraiu da falta de dedução de oposição, não especificando os motivos pelos quais entende deverem ser apreciadas as questões cujo conhecimento foi rejeitado, não logrando demonstrar o desacerto da decisão proferida.
Analisadas as alegações de recurso, verifica-se que a recorrente não apresenta qualquer argumentação, jurídica ou fáctica, destinada a pôr em causa aludida apreciação efetuada pela 1.ª instância, no que toca às consequências decorrentes da falta da dedução de oposição. No que respeita a esta questão, a recorrente não tem em conta o conteúdo da decisão recorrida, designadamente os fundamentos pelos quais se decidiu não apreciar determinadas questões que suscitara, os quais permanecem intocados, considerando que não são indicados os motivos pelos quais defende a alteração desta parte da decisão, assim não deduzindo uma verdadeira oposição à decisão que impugna.
As questões a decidir serão, além das de conhecimento oficioso, apenas as que constarem das conclusões, cabendo ao recorrente o ónus de as formular e de nelas incluir as questões que pretenda ver reapreciadas. Não tendo a apelante especificado, nas conclusões ou no corpo da alegação, qualquer argumento, jurídico ou fáctico, que ponha em causa a decisão recorrida, na parte relativa às consequências decorrentes da falta de dedução de oposição, mostra-se o recurso, nesta parte, manifestamente infundado.
Porém, sempre se dirá que a decisão recorrida se mostra, nesta parte, acertada.
Extrai-se da tramitação do procedimento especial de despejo previsto nos artigos 15.º e seguintes do NRAU que o BNA, se não recusar o requerimento de despejo, procede à notificação do requerido nos termos previstos no n.º 1 do artigo 15.º-D, para, em 15 dias: a) Desocupar o locado e, sendo caso disso, pagar ao requerente a quantia pedida, acrescida da taxa por ele liquidada; b) Deduzir oposição à pretensão e ou requerer o diferimento da desocupação do locado, nos termos do disposto nos artigos 15.º-N e 15.º-O. Acrescenta o n.º 4 do preceito que o ato de notificação deve conter: a) Os elementos referidos nas alíneas a) a h) do n.º 2 do artigo 15.º-B e, se for caso disso, no n.º 3 do mesmo artigo; b) A indicação do prazo para a oposição e a respetiva forma de contagem; c) A indicação de que, na falta de desocupação do locado, de oposição dentro do prazo legal ou do pagamento ou depósito das rendas que se venceram na pendência do procedimento especial de despejo, será constituído título para desocupação do locado com a faculdade de o requerente a efetivar imediatamente; d) Nos casos de pedido de pagamento das rendas, encargos ou despesas em atraso, a indicação de que, na falta de pagamento da quantia pedida e da taxa liquidada pelo requerente, são ainda devidos juros de mora desde a data da apresentação do requerimento; e) A indicação de que a dedução de oposição cuja falta de fundamento o requerido não deva ignorar o responsabiliza pelos danos que causar ao requerente e determina a condenação em multa de valor não inferior a 10 vezes a taxa devida.
Dispõe o artigo 15.º-E que o BNA converte o requerimento de despejo em título para desocupação do locado nas situações elencadas nas várias alíneas do n.º 1, designadamente se, depois de notificado, o requerido não deduzir oposição no respetivo prazo, conforme alínea a).
Explica Jorge Pinto Furtado (Comentário ao Registe do Arrendamento Urbano, Coimbra, Almedina, 2019, pág. 770) que «a oposição, tal como ocorre no processo civil, em geral, serve para nela se apresentar a defesa do requerido e toda a sua defesa (artigo 573.º-1, CPC), nem poderia ser de outro modo, uma vez que (…) não dispõe o requerido de outra peça contestatória».
A falta de dedução de oposição pela requerida, com a consequente conversão pelo BNA do requerimento de despejo em título para a desocupação do locado, preclude a possibilidade de alegação em fase processual posterior de fundamentos que visem obstar à constituição de tal título.
Verificando que os fundamentos invocados pela apelante não foram apresentados em sede de oposição ao procedimento especial de despejo, apesar de se reportarem a factualidade anterior, mostra-se acertada a decisão recorrida, ao considerar precludida a possibilidade da respetiva alegação na fase de apreciação do requerimento de autorização judicial para a entrada imediata no domicílio.
Como tal, mostrando-se deslocada a argumentação apresentada, impõe-se julgar improcedente a pretensão deduzida pela apelante.

2.2.3. Efeito pretendido com a apelação
Nas alegações de recurso, a apelante pede se anule o procedimento especial de despejo e se substitua o despacho recorrido por decisão que reponha a vigência do contrato de arrendamento, o que foi rejeitado em 2.2.1. e 2.2.2., respetivamente, não formulando qualquer outra pretensão quanto à solução jurídica da causa.
Dispõe o artigo 639.º, n.º 1, do CPC, que o recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão, esclarecendo o n.º 2 do preceito as indicações que deverão constar das conclusões, nos casos em que o recurso versa sobre matéria de direito.
Explicam António Santos Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. I, Coimbra, Almedina, 2018, págs. 767-768) que “conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo”, acrescentando que deve ser incluído, na parte final, o resultado procurado.
No caso presente, limita-se a recorrente a pedir a anulação do procedimento especial de despejo e a substituição do despacho recorrido por decisão que reponha a vigência do contrato de arrendamento, não formulando, ainda que subsidiariamente, qualquer outra pretensão visando a alteração da decisão proferida.
Nesta conformidade, face à rejeição das pretensões deduzidas, improcede totalmente o recurso interposto.

Em conclusão: (…)

3. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.
Évora, 26-10-2023
(Acórdão assinado digitalmente)
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite (Relatora)
Vítor Sequinho dos Santos (1.º Adjunto)
José Manuel Barata (2.º Adjunto)

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[1] Pertencem ao Novo Regime do Arrendamento Urbano (NRAU) todas as normas legais que venham a ser indicadas sem outra menção.