Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
| ||
Relator: | ANA BACELAR | ||
Descritores: | CARTA DE CONDUÇÃO CIDADÃOS DA CPLP CADUCIDADE CONTRAORDENAÇÃO | ||
Data do Acordão: | 09/12/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Sumário: | I. A finalidade do Decreto-Lei n.º 46/2022, como expressamente se prevê no respetivo artigo 1.º, foi a de alterar o Código da Estrada com vista a conceder habilitação à condução de veículos a motor em território nacional aos detentores de títulos de condução emitidos por Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico. Introduzindo o Legislador no artigo 125.º do Código da Estrada modificações que não se limitam ao regime dos títulos emitidos pelos Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, não podendo deixar de concluir-se que tomou posição na querela jurisprudencial a que supra aludimos, impondo a nova opção do Legislador o afastamento da tipicidade de condutas com os contornos da praticada pelo arguido. II. Em face da nova redação do artigo 125.º do Código da Estrada, a condução de veículo a motor, de motociclo ou de automóvel pela via pública por quem é titular de carta de condução caducada e suscetível de revalidação deixa de poder subsumir-se na previsão do artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, antes constituindo a contraordenação prevista no n.º 8 do artigo 125.º do Código da Estrada. | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação do Évora I. RELATÓRIO No processo comum n.º 1184/19.0GBABF, do Juízo Local Criminal ... [Juiz ...] da Comarca ..., o Ministério Público acusou AA, divorciado, nascido a .../.../1989, no Brasil, filho de BB e de CC, residente na ..., n.º ..., ..., em ..., ..., pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de condução sem habilitação legal, previsto e punível pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro. Não foi apresentada contestação escrita. Realizado o julgamento, perante Tribunal Singular, por sentença proferida e depositada em 5 de janeiro de 2023, foi decidido: «a) Absolver AA pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. nos termos conjugados dos art.º 3.º, n.º 2 do DL 2/98 de 3.1, com referência aos arts. 121.º, n.º 1 e 122.º, n.º 1 do Código da Estrada. b) Condenar AA pela prática de uma contraordenação p. e p. pelos artigos 125.º, n.º 1, al d) e 130.º, n.º 7, todos do Código da Estrada, na coima de € 200,00 (duzentos euros). c) Condenar o arguido no pagamento das custas, que se fixam nos seguintes termos: 2 UC» Inconformado com tal decisão, o Ministério Público dela interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões [transcrição]: «1.ª AA foi acusado pela prática, no dia 26 de março de 2019, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido no artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro. 2.ª Conduziu no dia 26 de junho de 2019 fazendo uso de uma carta de condução emitida pela República Federativa do Brasil com prazo de validade até ao dia 18 de março de 2019. 3.ª Foi absolvido da prática do crime e condenado em coima por se considerar que a conduta de conduzir com uma carta de condução com o prazo de validade excedido integrou a prática de contraordenação ao abrigo do disposto no artigo 130.º, n.º 7 do Código da Estrada. 4.ª O seu título de condução emitido pelo Brasil habilitá-lo-ia para conduzir em Portugal de acordo com o artigo 41.º, n.º 2 da Convenção de Viena sobre a Circulação Rodoviária, celebrada em Viena em 8 de novembro de 1968, aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 107/2010 se no momento da condução estivesse válido. 5.ª Segundo a Convenção de Viena, o Acordo Bilateral existente entre Portugal e o Brasil e o Despacho n.º 10942/200 do Diretor-Geral da DGV, publicado no DR, 2.ª série de 27-5-2000 deve considerar-se que o reconhecimento tem como pressuposto a validade do título. 6.ª O título é válido se estiver dentro do prazo de validade aposta no próprio documento pela entidade emitente. A carta do arguido foi válida até ao dia 18 de março de 2019 como resulta de fls. 37. 7.ª A validade do título identifica-se com o prazo de validade nele aposto na data do exercício da condução – é o que ressalta do artigo 41.º, n.º 2 da Convenção de Viena, interpretação que encontra algum apoio no determinado no respetivo Anexo 6 ponto 4 referência 7, do artigo 13.º n.º 1 al. a), n.º 3 e n.º 6 do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir (aplicável por via do artigo 125.º, n.º 2 do Código da Estrada). 8.ª Por ter um título caducado desde 18 de março de 2019, quando conduziu no dia 26 de junho de 2019, não estava habilitada a conduzir em Portugal com a sua carteira de habilitação brasileira. 9.ª O artigo 130.º do Código da Estrada não se aplica ao título de condução do arguido porque não se verifica o pressuposto do reconhecimento: a sua validade, em consequência da caducidade. 10.ª A redação mais atual dada ao artigo 125.º do Código da Estrada pelo DL n.º 46/2022, de 12/07, no seu n.º 5 e n.º 8, confirma e reforça o requisito da validade do título de condução estrangeiro abrangido pelo n.º 1 para conduzir em Portugal. 11.ª A conduta do arguido ao ter conduzido com uso de título brasileiro caducado não se reconduz à prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 130.º, n.º 7 do Código da Estrada mas sim à previsão do artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro. 12.ª Ao absolver da prática de crime afastando a aplicação do artigo 3.º Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro o tribunal errou na concretização do elemento típico objetivo – falta de habilitação legal – violando tal norma e violou as normas jurídicas contidas nos artigos 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro e 125.º do Código da Estrada por não submissão ao seu âmbito de factos que estas abarcam. 13.ª Deve condenar-se pela prática um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido no artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro. Nestes termos, deverá ser dado provimento ao recurso e em consequência, condenar-se AA pela prática do crime previsto e punido no artigo 3.º, n.º 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98 de 3 de janeiro.» O recurso foi admitido. Não houve resposta. û Enviados os autos a este Tribunal da Relação, o Senhor Procurador Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer [transcrição]:«Nada obstando ao conhecimento do recurso, emite-se parecer no sentido da sua procedência, ciente dos diferentes entendimentos jurisprudenciais a propósito, com os aditamentos que seguem. O arguido foi acusado pela prática, no dia 26 de junho de 2019, de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido no artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, por conduzir nessa data fazendo uso de uma carta de condução emitida pela República Federativa do Brasil a 17.01.2015 e com data de validade até 18.03.2019. O arguido foi absolvido da prática do crime e condenado em coima por se considerar que a conduta de conduzir com uma carta de condução com o prazo de validade excedido integrou a prática de contraordenação ao abrigo do disposto no artigo 130.º, n.º 7 do Código da Estrada. A República Federativa do Brasil e a República Portuguesa subscreveram a Convenção de Viena de 8 de novembro de 1968 sobre circulação rodoviária. A Lei n.º 102-B/2020 de 9 de dezembro, alterou o Código da Estrada e legislação complementar transpondo a Diretiva (UE) 2020/612. No seu preâmbulo pode ler-se “É também alterado o regime de trocas de títulos de condução estrangeiros por forma a reforçar a qualidade da análise da equivalência das categorias de habilitação, estabelecendo -se um regime diferenciado para os condutores do Grupo 1 e do Grupo 2, com aumento das exigências de verificação de conhecimentos e aptidões para a condução relativamente aos condutores que vão exercer a condução enquanto profissão ou atividade de risco. Nessa sequência, e porque se pretende manter relações institucionais de reciprocidade, mantêm -se os acordos bilaterais de reconhecimento e troca de títulos de condução estrangeiros já celebrados. São introduzidas alterações ao regime de caducidade dos títulos de condução, não só quanto às regras que permitem que condutores que deixaram caducar os seus títulos possam reavê-los, ainda que condicionados à realização de provas de exame ou à frequência de ação de formação, como também a previsão da caducidade definitiva dos títulos de condução nas situações tipificadas na lei.” O artigo 2º do DL n.º 46/2022, de 12/07, alterou o artigo 125º do Código de Estrada (aprovado pelo DL nº114/94 de 3 de maio). Ora, quer Portugal, quer a República Federativa do Brasil, fazem parte da CPLP e ambos subscreveram as Convenções Internacionais a que alude a alínea d), do n.º 1, do artigo 125.º do CE. A Carteira Nacional de Habilitação de que o arguido é titular, integra os títulos de condução previstos nas alíneas c), d) e e), do n.º 1, do artigo 125.º, do CE, cuja validade é expressamente reconhecida, como tal, pelo Estado português – cfr. Despacho n.º 10942/2000, publicado em Diário da República, Série II, em 27/05/2000.Importa no caso considerar a Lei n.º 102-B/2020 de 9 de Dezembro, que alterou o Código da Estrada e legislação complementar transpondo a Diretiva (UE) 2020/612, o artigo 125.º do Código da Estrada e a norma constante do artigo 130.º do Código da Estrada. E da sua leitura conjugada, extrai-se que, a alteração legislativa operada pela Lei n.º 102-B/2020, de 24 de agosto, pôs termo às divergências existentes na interpretação do que era considerado título cancelado e título caducado. E hoje discutem-se as noções de título caducado por ter atingido o seu termo de validade, em que ainda é possível a sua revalidação, e de título caducado que, atingido o seu termo, já não permite a revalidação. No caso dos autos, o título de que era portador o arguido encontrava-se caducado, sendo que, sobre a data do termo da sua validade, ainda não decorreram dez anos, pelo que, pelo menos em teoria, era possível a sua “renovação” - artigo 130.º, n.3 alínea d) [a contrario] do Código da Estrada. Importando depois saber, se o citado artigo 130.º do Código da Estrada, se aplica, ou não, aos títulos estrangeiros, como o dos autos, ou, como há quem defenda, apenas se aplica a títulos portugueses. A carteira nacional de habilitação de que o arguido é titular, integra os títulos de condução previstos nas Convenções de Trânsito Rodoviário de 1949 e assim, é um dos títulos previstos na alínea d) do n.º1 do artigo 125.º do Código da Estrada. Posto isto, há quem entenda que o Código da Estrada não afasta a aplicação do disposto no artigo 130º aos títulos estrangeiros, atenta a inserção sistemática dos artigos 125.º e 130.º do Código da Estrada – cfr. Acórdão do TRE de 25.05.2021, processo n. 135/20.3GCABF.E1, in www.dgsi.pt. E, neste entendimento, é de aplicar o regime de caducidade e de cancelamento, legalmente consagrado no artigo 130.º, nºs 1 a 5, do CE, caindo-se na previsão do nº 8 do referido artigo 125º, (na redação do D.L. n.º 46/2022, de 12/07) e sendo o arguido titular de um título de condução emitido pela República Federal do Brasil, válido, mas caducado, a sua conduta configura uma contraordenação - cfr., neste sentido Acórdão TRE de 17-10-2017, proc. 316/14.9 GTABF.E1, in www.dgsi.pt. Em suma, a ser assim, a atual redação do nº 5 do artigo 125º do Código da Estrada, conjugada com o disposto no nº 8 do mesmo artigo, demonstra ter o legislador afastado a tipicidade da conduta praticada pelo arguido com referência ao artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, antes a subsumindo à contraordenação prevista no nº 8 do referido normativo, integrando a conduta da mesma, dessa forma, não a prática de um crime de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. artigo 3.º, nº1, da Lei 2/98, de 3 de janeiro, mas antes, a contraordenação prevista no número 7, do artigo 130.º do Código da Estrada. Por seu turno, entende o recorrente com respaldo legal que o título de condução do arguido emitido pelo Brasil habilitá-lo-ia para conduzir em Portugal de acordo com o artigo 41.º, n.º 2, da Convenção de Viena sobre a Circulação Rodoviária, se no momento da condução estivesse válido, devendo considerar-se que o reconhecimento tem como pressuposto a validade do título. O título é válido se estiver dentro do prazo de validade aposta no próprio documento pela entidade emitente, sendo que a carta do arguido foi válida até ao dia 18 de Março de 2019 e que a validade do título identifica-se com o prazo de validade nele aposto na data do exercício da condução, que é o que ressalta do artigo 41.º, n.º 2 da Convenção de Viena, interpretação que encontra apoio no determinado no respetivo Anexo 6 ponto 4 referência 7, do artigo 13.º n.º 1 al. a), n.º 3 e n.º 6 do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir (aplicável por via do artigo 125.º, n.º 2 do Código da Estrada). Por ter um título caducado desde 18 de março de 2019, quando conduziu no dia 26 de junho de 2019, o arguido não estava habilitado a conduzir em Portugal com a sua carteira de habilitação brasileira. E o artigo 130.º do Código da Estrada não se aplica ao título de condução do arguido porque não se verifica o pressuposto do reconhecimento: a sua validade, em consequência da caducidade, sendo que a redação mais atual dada ao artigo 125.º do Código da Estrada pelo DL n.º 46/2022, de 12/07, no seu n.º 5 e n.º 8, confirma e reforça o requisito da validade do título de condução estrangeiro abrangido pelo n.º 1 para conduzir em Portugal. Pelo que a conduta do arguido ao ter conduzido com uso de título brasileiro caducado não se reconduz à prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 130.º, n.º 7 do Código da Estrada mas sim à previsão do artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto- Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro. Ao absolver o arguido da prática de crime afastando a aplicação do art.º 3.º do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, o tribunal errou na concretização do elemento típico objetivo – falta de habilitação legal – violando tal norma e o art.º 125.º do Código da Estrada por não submissão ao seu âmbito de factos que estas abarcam. Termos em que somos de parecer que deve ser dado provimento ao recurso interposto e o arguido ser condenado pela prática um crime de condução de veículo sem habilitação legal, previsto e punido no artigo 3.º, n.ºs. 1 e n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro.» Observado o disposto no n.º 2 do artigo 417.º do Código de Processo Penal, nada mais se acrescentou. Efetuado o exame preliminar, determinou-se que o recurso fosse julgado em conferência. Colhidos os vistos legais e tendo o processo ido à conferência, cumpre apreciar e decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO De acordo com o disposto no artigo 412.º do Código de Processo Penal e com a jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça n.º 7/95, de 19 de outubro de 1995[[1]], o objeto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respetiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso. As possibilidades de conhecimento oficioso, por parte deste Tribunal da Relação, decorrem da necessidade de indagação da verificação de algum dos vícios da decisão recorrida, previstos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal, ou de alguma das causas de nulidade dessa decisão, consagradas no n.º 1 do artigo 379.º do mesmo diploma legal.[[2]] Posto isto, e vistas as conclusões dos recursos, a esta Instância é colocada a questão da incorreta subsunção dos factos ao direito – concretamente, se a conduta do Arguido integra um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal ou, apenas, uma contraordenação. û Na sentença recorrida foram considerados como provados os seguintes factos [transcrição]:«1. No dia 26.06.2019. pelas 16h15, o arguido AA conduziu o veículo automóvel ligeiro de passageiros, da marca ..., modelo ..., com a matrícula ..-..-IN, na Rua ..., em .... 2. O arguido era titular de carta de condução, emitida pelas autoridades brasileiras a 17.01.2015, com data de validade até 18.03.2019. 3. Não era titular de qualquer outro título válido que lhe permitisse conduzir o referido veículo. 4. Conhecia o arguido as características do veículo que conduzia, e bem assim da via em que circulava, bem sabendo que a referida condução não lhe era permitida por lei por não ser, à data dos factos, possuidor de qualquer título válido que o habilitasse à condução de veículos automóveis ou quaisquer outros veículos motorizados em território nacional. 5. Não obstante o arguido quis conduzir o veículo identificado, como o fez. 6. Ao praticar os factos que se deixam descritos, agiu o arguido sempre de forma voluntária, livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei. Mais se apurou que: 7. Do seu certificado de registo criminal nada consta.» Relativamente a factos não provados, consta da sentença que [transcrição]: «a) Agiu o arguido sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei penal.» A convicção do Tribunal recorrido, quanto à matéria de facto, encontra-se fundamentada nos seguintes termos [transcrição]: «A convicção do Tribunal em relação aos factos provados e não provados acima descritos fundou-se no conjunto da prova, apreciada criticamente, junta aos autos e a produzida em sede da audiência de julgamento, em especial na prova documental junta aos autos, designadamente o auto de notícia a fls. 3 a 5, fotocopia de carta de condução caducada a fls. 23 e 37, de cuja conjugação resulta que o arguido era titular de carta de condução brasileira que, à data dos factos, se encontrava caducada. Igualmente ponderou o Tribunal o depoimento prestado por DD, militar da GNR, a qual depôs ter, no âmbito da sua atividade profissional, procedido no dia e hora constante na acusação publica a uma ação de fiscalização rodoviária decorrente de um incorreto parqueamento do veiculo pertencente ao arguido, tendo nessa sequencia, abordado o arguido, o qual foi identificado mediante exibição de documento de identificação pessoal e verificado, à data, que este não seria detentor de qualquer titulo legal valido que o habilitasse a conduzir veículos motorizados na via publica. Por fim, teve o Tribunal em consideração o Certificado de Registo Criminal, no que se refere à (in) existência de antecedentes criminais.» û Conhecendo.(i) Dos vícios prevenidos no n.º 2 do artigo 410.º do Código de Processo Penal Restringida a cognição deste Tribunal da Relação à matéria de direito, importa desde já referir que do exame da sentença recorrida – do respetivo texto, por si só ou conjugado com as regras da experiência comum e sem recurso a quaisquer elementos externos ou exteriores ao mesmo – não se deteta a existência de qualquer um dos vícios referidos no artigo 410.º, nº 2, do Código de Processo Penal. Efetivamente, não ocorre qualquer falha na avaliação da prova feita pelo Tribunal “a quo”, sendo o texto da decisão em crise revelador de coerência e de respeito pelas regras da experiência comum e da prova produzida. E do texto da decisão recorrida decorre, ainda, que os factos nele considerados como provados constituem suporte bastante para a decisão a que se chegou e que nele não se deteta incompatibilidade entre os factos provados e os não provados ou entre a fundamentação e a decisão. Também não se verifica a inobservância de requisito cominado sob pena de nulidade que não deva considerar-se sanada – artigo 410.º, nº 3, do Código de Processo Penal. Assim sendo, considera-se definitivamente fixada a decisão proferida pela 1ª Instância sobre a matéria de facto. (ii) Da incorreta subsunção dos factos ao direito A decisão recorrida, no segmento em que aborda a subsunção dos factos ao direito, tem o seguinte teor: «Atento ao quadro factual determinado de acordo com o teor da acusação e, considerando o princípio da vinculação temática do Tribunal (consagrado nos arts. 339.º, n.º 4, 358.º e 359.º, todos do Código de Processo Penal), importa, neste momento, efetuar o respetivo enquadramento jurídico e, nesse âmbito, apurar se o arguido deve ser jurídico- penalmente responsabilizado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. nos termos conjugados dos n.ºs 1 e 2 do art.º 3.º do DL 2/98 de 3.1. É a seguinte a redação do art.º 3.º, n.º 1 e 2 do DL 2/98 de 3/01, na parte que interessa: 1. Quem conduzir veículo a motor na via pública ou equiparada sem para tal estar habilitado nos termos do Código da Estrada é punido com prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias. 2. Se o agente conduzir, nos termos do número anterior, motociclo ou automóvel a pena é de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias. Ao incriminar a condução por quem não esteja habilitado para o efeito, o legislador procurou prevenir condutas que, por colocarem em causa valores de particular relevo, como a vida, a integridade física, a liberdade e o património, se revestem de acentuada perigosidade, sendo o bem jurídico protegido a segurança da circulação rodoviária. São elementos objetivos do tipo de condução de veículo sem habilitação legal: a condução de veículo a motor ou motociclo, em via pública ou equiparada e a falta de título legal que habilite a condução do veículo a motor. Dispõe o n.º 1 do art.º 121.º, do Código da Estrada aprovado pelo D.L. n.º 114/94, de 03 de maio, atualizado pelo DL n.º 151/2017, de 07/12, redação legislativa vigente à data dos factos e ao qual pertencerão as disposições legais adiante citadas sem outra menção de origem – que “só pode conduzir um veículo a motor na via pública quem estiver legalmente habilitado para o efeito”. São títulos legais que habilitam a condução de veículos a motor os identificados nos arts. 122.º, n.ºs 1 e 2 e 125.º, n.º 1 do Código da Estrada, conforme adiante se analisam. O documento que titula a habilitação para conduzir automóveis e motociclos é a carta de condução, a qual é emitida pela entidade competente e válida para as categorias de veículos e períodos de tempo nela averbados (art.º 122.º, n.ºs 1 e 3, do Código da Estrada). Habilitam, também, à condução de veículos a motor - entre outros documentos que, no presente caso, não relevam - os seguintes títulos, enumerados nas seguintes alíneas do n.º 1 do art.º 125.º do Código da Estrada, sendo de especial pertinência a al. d) para o caso em apreço, de acordo com a redação legislativa em vigor à altura dos factos (DL n.º 102- B/2020, de 09/12): - Alínea d) - Licenças de condução emitidas por Estado estrangeiro que o Estado Português se tenha obrigado a reconhecer, por convenção ou tratado internacional; A atual redação do n.º 1 do art.º 125.º do Código da Estrada, introduzido pela Lei n.º 46/2022, de 12/07 é ainda mais inclusiva das cartas de condução dos países membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), atendendo que o legislador fez cair a obrigação de tais títulos serem obrigatoriamente sujeitos a troca por uma carta de condução portuguesa decorrido um período temporal estipulado (vide a atual e anterior redação do n.º 3 e 4 do supra referido dispositivo legal). Com efeito e de acordo com a anterior redação, os titulares das licenças referidas na al. d) apenas estavam autorizados a conduzir veículos a motor se não tivessem residência habitual em Portugal (n.º 4, do art.º 125.º do Código da Estrada), sendo que a infração dessa norma era punível com coima de € 300 a € 1.500 (n.º 8, da mesma norma). De acordo com a redução legislativa introduzida pelo DL n.º 46/2022, de 12/07, é necessário conjugar o n.º 5 e 8 do art.º 125.º do C.E., no qual consta: « Os títulos referidos no n.º 1 só permitem conduzir em território nacional se os seus titulares tiverem a idade mínima exigida pela lei portuguesa para a respetiva habilitação, encontrando-se válidos e não apreendidos, suspensos, caducados ou cassados por força de disposição legal, decisão administrativa ou sentença judicial aplicadas ao seu titular em Portugal ou no Estado emissor» (n.º 5) e «Quem infringir o disposto nos n.ºs 3 a 5, sendo titular de licença válida, é sancionado com coima de (euro) 300 a (euro) 1500.». Ora, no caso em apreço, tanto a República Federal do Brasil (emitente do título) como a República Portuguesa (onde o arguido exercia a condução) aderiram a um acordo bilateral que reconhece as respetivas licenças de condução – cf. Despacho n.º 10 942/2000 (2.ª série do DR de 27 de maio de 2000). Todavia, pressupõe-se, nesse caso, que o agente é titular de licença válida que o habilita a conduzir veículos com motor, emitida por Estado estrangeiro. Contudo, se tiver residência habitual em Portugal, não poderá conduzir ao abrigo daquela licença, de acordo com a redação legislativa em vigor à data dos factos. Isto é, residindo em Portugal, pode o titular de licença válida emitida no estrangeiro proceder à troca desta por idêntico título nacional, com dispensa do respetivo exame, desde que comprovados os demais requisitos do art.º 126.º, n.º 1 Código da Estrada (art.º 128.º, n.º 1 do citado diploma legal). Atualmente a troca da carta é dispensada, podendo conduzir na via publica desde que a carta seja valida. No caso em concreto resulta que a carta de condução do arguido se encontrava caducada desde 18.03.2019, ou seja, encontrava-se caducada aquando da ocorrência dos factos. Dispõe a redação vigente à data dos factos do art.º 130.º do C.E. com pertinência quanto à definição da caducidade das cartas de condução: 1- O título de condução caduca se: a) Não for revalidado, nos termos fixados no RHLC, quanto às categorias abrangidas pela necessidade de revalidação, salvo se o titular demonstrar ter sido titular de documento idêntico e válido durante esse período (…) 3 – O título de condução é cancelado quando: (…) d) Tenha caducado há mais de cinco anos sem que tenha sido revalidado e o titular não seja portador de idêntico documento de condução válido. (…) 5- Os titulares de título de condução cancelados consideram-se, para todos os efeitos legais, não habilitados a conduzir os veículos para os quais o título fora emitido. (…) 7 - Quem conduzir veículo com título caducado é sancionado com coima de € 120 a € 600. A questão está em saber se, face à redação vigente à data dos factos do art.º 130.º do C.E., estamos perante uma situação relevante para efeito do n. º7 (título apenas caducado, por não revalidado nos termos definidos na al. a) do n.º 1). Ou antes, de condutor não habilitado (n. º5) por cancelado, por caducado há mais de cinco anos. [a atual redação legislativa decorrente da entrada em vigor do DL n.º 102-B/2020, de 09/12, não menciona o termo cancelamento, apesar de se poder correlacionar tal ocorrência à al. d) do n.º 3 da atual redação do art. 130.º quando estipula a impossibilidade de renovação dos títulos de condução caducados há mais de dez anos. Ou seja, afigura-se-nos que o período para a ocorrência do “cancelamento” foi aumentado pelo legislador]. A Lei distinguia de acordo com essa redação) entre: - título caducado (n. º1); e – título cancelado (n. º3). O título caducado (n. º1) é punido como contraordenação (n. º7). Já o condutor com título cancelado (n. º3) é considerado não habilitado (n.5). E como tal, por efeito da remissão do art. 3º do DL nº 2/98 para o preenchimento da falta de habilitação, incorre na prática do crime.[3] Nos termos do n. º 5 do preceito, na redação então em vigor apenas eram considerados não habilitados os titulares de títulos de condução cancelados. Já a condução com títulos “meramente” caducados passou a ser previsto pelo n. º7 como mera contraordenação. Atualmente, de acordo com a redação introduzida pelo DL n.º 102-B/2020, de 09/12, o legislador já não se refere aos títulos cancelados e deixou de distinguir entre os títulos caducados e cancelados. Contudo, o legislador refere que os titulares de carta de condução caducada há mais de 10 anos não a podem renovar (al. c), n.º 3 do art. 130.º do C.E.), enquanto que os titulares de carta de condução caducada por um período inferior de 10 anos já não se encontram sujeitos a tal restrição. Embora a atual redação do n.º 5 do art. 130.º do C.E. não seja mais feliz («titulares de título de condução caducado consideram-se, para todos os efeitos legais, não habilitados a conduzir os veículos para os quais o título fora emitido, sendo-lhes aplicável o regime probatório previsto no artigo 122.º caso venham a obter novo título de condução»), ao manter a anterior redação do n.º 7 do mesmo preceito legal, a qual sanciona a condução com carta caducada com uma contraordenação e ao remeter para o regime probatório previsto na atual redação do art.º 122.º do C.E., afigura-se nos que a interpretação sistemática das normas rodoviárias, permitem inferir que o legislador ao indicar no atual n.º 5 do art.º 130.º do C.E. que os titulares de titulo de condução caducado não se consideram habilitados, não pressupõe que o mesmo não sejam titulares de carta de condução punida como ilícito criminal, mas sim como um ilícito contraordenacional, o que justifica a manutenção do n.º 7 dessa mesma norma e a remissão para o regime probatório. No caso em apreço, certo é que o título de condução não era válido – por ter caducado cerca de 3 meses antes da autuação. Por outro lado, fosse o título (carta) de condução emitida pela República Portuguesa ou país da União era evidente a subsunção ao nº 7 (de acordo com a redação legislativa anterior) – relevância como mera contraordenação, por se tratar de título meramente caducado. A questão é se o normativo distingue pelo facto de o título emitido ser por país estranho à União, não podendo revalidado em Portugal, nem sujeito a troca por já não ser valido. Ora os elementos do tipo de crime (condução sem habilitação) são definidos pelo DL 2/98 por remissão para a definição do título de habilitação para “os termos do Código da Estrada”. O Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir não releva para a definição/validade do título de habilitação (definidos no art.º 130º do CE) em si, mas apenas para os procedimentos administrativos com vista à sua obtenção/renovação/substituição. A definição do conceito de falta de habilitação com relevância criminal emerge diretamente do citado art.º 130º do C.E.: título cancelado por decorridos mais de 5 anos (atualmente dez anos) do prazo de renovação – crime. Passando o título caducado há menos de 5 anos (atualmente dez anos) a constituir mera contraordenação (n. º7). Salvo o devido respeito por entendimento contrário, afigura-se que o princípio da legalidade e da tipicidade da responsabilidade criminal, impõe o entendimento de que, sendo o título válido/reconhecido, em Portugal e estando caducado há menos de dez anos, deve ser subsumido ao nº 7, como impõe a letra, clara, do preceito. Independentemente da forma, requisitos, procedimento administrativo para a sua substituição. Se o título emitido pelo Brasil é reconhecido em Portugal por efeito de Acordo Bilateral Internacional vinculativo a ambos os Estados, daí têm que ser retiradas todas as consequências inerentes a tal reconhecimento. Aliás, ainda que o título não pudesse ser revalidado, em Portugal (por caducado) nada impedia que fosse revalidado no país de origem, conforme ocorreu no caso em apreço. Assim sendo, por força do disposto no nº 7 do artigo 130.º do C.E., a conduta do arguido deixou de ser vista como crime e passou a ser punida a título de contraordenação. Em suma, a falta dos elementos objetivos para o preenchimento do tipo legal em questão, tem como consequência a absolvição do arguido pela prática dos factos ilícitos em causa relativamente ao crime de condução sem habilitação legal. * Atento ao quadro factual determinado de acordo com o teor da acusação, e à competência do Tribunal de acordo com o disposto no art.º 77.º do RGCO, importa, neste momento, efetuar o respetivo enquadramento jurídico e, nesse âmbito, apurar se o arguido deve ser responsabilizado pela prática de uma contraordenação por condução com um titulo de condução caducado.Ora, conforme supra expusemos e defendemos, a conduta da arguida preenche o disposto no n.º 7 do art.º 130.º do C.E., o qual é sancionado com uma coima de € 120 a € 600. Com efeito, duvidas não subsistem quanto ao preenchimento dos elementos objetivos da presente contraordenação, dado que o arguido conduziu um veículo motorizado numa via pública com uma carta de condução caducada. O preenchimento do elemento subjetivo, por seu turno, poderá ter lugar a título doloso ou negligente (repare-se que o legislador utiliza a expressão “pelo menos por negligência…”). No caso em apreço, resultou provado que a arguida sabia que não podia conduzir aquele veículo em virtude de a carta de que era titular se encontrar caducada, mas não se absteve de o fazer, pelo que é forçoso concluir que o arguido praticou em autoria material e sob a forma de dolo direto (art.º 131.º e 132.º do Código de Estrada e 14.º, n.º 1 do Código Penal ex vi art. 41.º do RGCO), os factos que lhe são imputados na acusação publica. Na fixação do montante da coima deve ser tida em conta a gravidade da contraordenação, da culpa, tendo ainda em conta os seus antecedentes relativamente ao cumprimento das leis e regulamentos sobre o trânsito, bem como a situação económica do infrator (artigo 139º do C. da Estrada). Sopesando todos estes fatores, inclusive a ausência de elemento quanto à situação pessoal e financeira do arguido, mas igualmente o facto de não lhe haver sido concedida a possibilidade de proceder ao pagamento voluntário da coima, a ausência de registo criminal, mas igualmente o hiato temporal decorrido desde que ocorreu a caducidade do titulo de habilitação, configura-se estarmos perante uma ilicitude mediana, e porquanto decide-se fixar o montante da coima a aplicar em €200,00 (duzentos euros).» À data da prática dos factos em causa nos presentes autos – 26 de junho de 2019 – o artigo 125.º do Código da Estrada tinha a seguinte redação: «1 - Além dos títulos referidos nos n.ºs 4 e 5 do artigo 121.º são ainda títulos habilitantes para a condução de veículos a motor os seguintes: a) Títulos de condução emitidos pelos serviços competentes pela administração portuguesa do território de Macau; b) Títulos de condução emitidas por outros Estados membros da União Europeia ou do espaço económico europeu; c) Títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro em conformidade com o anexo n.º 9 da Convenção Internacional de Genebra, de 19 de setembro de 1949, sobre circulação rodoviária, ou com o anexo n.º 6 da Convenção Internacional de Viena, de 8 de novembro de 1968, sobre circulação rodoviária; d) Títulos de condução emitidas por Estado estrangeiro, desde que este reconheça idêntica validade aos títulos nacionais; e) Licenças internacionais de condução, desde que apresentadas com o título nacional que as suporta; f) (Revogado.) g) Licenças especiais de condução; h) Autorizações especiais de condução; i) Autorizações temporárias de condução. 2 - A emissão das licenças e das autorizações especiais de condução bem como as condições em que os títulos estrangeiros habilitam a conduzir em território nacional são fixadas no RHLC. 3 - Os titulares das licenças referidas nas alíneas c), d) e e) do n.º 1 estão autorizados a conduzir veículos a motor, em Portugal durante os primeiros 185 dias subsequentes à sua entrada no País, desde que não sejam residentes. 4 - Após fixação da residência em Portugal, o titular das licenças referidas no número anterior deve proceder à troca do título de condução, no prazo de 90 dias. 5 - Os títulos referidos no n.º 1 só permitem conduzir em território nacional se os seus titulares tiverem a idade mínima exigida pela lei portuguesa para a respetiva habilitação. 6 - (Revogado.) 7 - (Revogado.) 8 - Quem infringir o disposto nos n.ºs 3 e 5, sendo titular de licença válida, é sancionado com coima de (euro) 300 a (euro) 1 500.» O artigo 125.º do Código da Estrada foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 102-B/2020, de 9 de dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 46/2022, de 12 de julho. E tem, desde 1 de agosto de 2022, a seguinte redação «1 - Além da carta de condução são títulos habilitantes para a condução de veículos a motor os seguintes: a) Títulos de condução emitidos pelos serviços competentes pela administração portuguesa do território de Macau; b) Títulos de condução emitidas por outros Estados membros da União Europeia ou do espaço económico europeu; c) Títulos de condução emitidos por outros Estados-Membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) ou da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), desde que verificadas as seguintes condições cumulativas: i) O Estado emissor seja subscritor de uma das convenções referidas na alínea seguinte ou de um acordo bilateral com o Estado Português; ii) Não tenham decorrido mais de 15 anos desde a emissão ou última renovação do título; iii) O titular tenha menos de 60 anos de idade; d) Títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro em conformidade com o anexo n.º 9 da Convenção Internacional de Genebra, de 19 de setembro de 1949, sobre circulação rodoviária, ou com o anexo n.º 6 da Convenção Internacional de Viena, de 8 de novembro de 1968, sobre circulação rodoviária; e) Títulos de condução emitidos por Estado estrangeiro, desde que em condições de reciprocidade; f) [Revogada.] g) Licenças internacionais de condução, desde que apresentadas com o título nacional que as suporta; h) Licenças especiais de condução; i) Autorizações especiais de condução; j) Licença de aprendizagem. 2 - A emissão das licenças e das autorizações especiais de condução bem como as condições em que os títulos estrangeiros habilitam a conduzir em território nacional são fixadas no RHLC. 3 - Os titulares das licenças referidas nas alíneas d), e) e g) do n.º 1 estão autorizados a conduzir veículos a motor em Portugal durante os primeiros 185 dias subsequentes à sua entrada no País, desde que não sejam residentes. 4 - Após fixação da residência em Portugal, o titular das licenças referidas no número anterior deve proceder à troca do título de condução, no prazo de 90 dias. 5 - Os títulos referidos no n.º 1 só permitem conduzir em território nacional se os seus titulares tiverem a idade mínima exigida pela lei portuguesa para a respetiva habilitação, encontrando-se válidos e não apreendidos, suspensos, caducados ou cassados por força de disposição legal, decisão administrativa ou sentença judicial aplicadas ao seu titular em Portugal ou no Estado emissor. 6 - [Revogado.] 7 - [Revogado.] 8 - Quem infringir o disposto nos n.ºs 3 a 5, sendo titular de licença válida, é sancionado com coima de (euro) 300 a (euro) 1500.» A finalidade do Decreto-Lei n.º 46/2022, como expressamente se prevê no respetivo artigo 1.º, foi a de alterar o Código da Estrada com vista a conceder habilitação à condução de veículos a motor em território nacional aos detentores de títulos de condução emitidos por Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico. Atente-se no seu preâmbulo: «A liberdade de circulação é um elemento essencial para o exercício pleno da cidadania, para tal, Portugal tem procurado reforçar os direitos dos cidadãos estrangeiros que se deslocam para o nosso país, quer tratando-se de deslocações temporárias com finalidades turísticas quer tratando-se de deslocações para trabalhar ou investir no nosso país. O XXIII Governo Constitucional reiterando o seu compromisso por uma integração dos migrantes, que passe pelas melhorias da sua qualidade de vida, entende ser essencial simplificar a habilitação para a condução de veículos a motor, elemento fundamental para uma garantia de mobilidade em todo o território nacional. Face ao exposto e com vista a reforçar e a melhorar a mobilidade entre cidadãos de Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e de Estados-Membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, procede-se a uma alteração ao Código da Estrada. Em consequência promove-se a dispensa das trocas de cartas de condução, habilitando-se a condução no território nacional com títulos emitidos naqueles Estados, através do reconhecimento dos títulos de condução estrangeiros.» «Mas a extensão das alterações introduzidas não se limitou ao alargamento da dispensa da obrigação de troca do título estrangeiro por título nacional, agora também aplicada aos cidadãos que beneficiaram da emissão de títulos por Estados-membros da CPLP e Estados-membros da OCDE (desde que observadas as condições previstas nas alíneas i, ii e iii), tal como já antes sucedia com os cidadãos “encartados” pelos serviços competentes da administração portuguesa do território de Macau, dos outros Estados-membros da União Europeia ou do espaço económico europeu. O Legislador foi mais longe, introduzindo no artigo 125º do Código da Estrada modificações que não se limitam ao regime dos títulos emitidos pelos países da CPLP e da OCDE, não podendo deixar de concluir-se que tomou posição na querela jurisprudencial a que supra aludimos, impondo a nova opção do Legislador o afastamento da tipicidade de condutas com os contornos da praticada pelo arguido. Em face da nova redação do artigo 125º do Código da Estrada, tais condutas deixaram de poder subsumir-se na previsão do artigo 3.º, nºs. 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, subsumindo-se antes na contraordenação prevista no nº 8 do artigo 125º do Código da Estrada. Esse foi, aliás, o entendimento seguido no douto Acórdão da Relação de Évora de 15 de novembro de 2022, único aresto dos nossos Tribunais Superiores que encontramos com expressa referência à alteração legislativa em questão. Nessa decisão, depois de se referir a existência de prévias decisões em sentidos divergentes, argumentou-se que: “(…) com a entrada em vigor do DL n.º 46/2022, de 12/07 que alterou a redação do art.º Artigo 125.º do Cód. da Estrada condutas que, segundo uma corrente jurisprudencial, antes eram punidas criminalmente (como crime de condução de veículo sem habilitação legal), configuram agora uma mera contraordenação sancionada com coima de (euro) 300 a (euro)1500, assim, acreditamos nós, solucionando a referida divergência jurisprudencial”.»[[4]] Aderimos a este entendimento, que consideramos o ajustado às regras atualmente em vigor. Decorre da factualidade provada e do documento que consta de fls. 23 do processo, que (i) o Arguido AA tinha mais de 18 anos de idade quando foi fiscalizado na condução de veículo automóvel pela via pública, (ii) é o mesmo titular de Carteira Nacional de Habilitação com o n.º ...86, documento este emitido pela DETRAN – SP (são Paulo) Departamento Nacional de Trânsito, e (iii) e o documento que o habilita a conduzir veículos automóveis pela via Pública caducou em 18 de março de 2019. Isto posto, não resta senão concluir que o Arguido, não pode conduzir, em território nacional, veículos automóveis pela via pública, uma vez que o título que, para tanto, o habilita, embora suscetível de revalidação, está caducado. Pelo que ocorre a previsão do n.º 8 do artigo 125.º do Código da Estrada, na redação Decreto-Lei n.º 46/2022, de 12 de julho. «Em suma, a atual redação do n.º 5 do artigo 125.º do Código da Estrada, conjugado com o disposto no n.º 8 do mesmo artigo demonstra ter o legislador afastado a tipicidade da conduta praticada pela arguida com referência ao artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro, antes a subsumindo à contraordenação prevista no n.º 8 do referido normativo, razão pela qual não pode proceder a pretensão do Recorrente, (até por força do princípio da aplicação imediata da lei penal mais favorável consagrado no artigo 2.º, n.º 4 do Código Penal, para quem entenda que, no momento da prática dos factos a conduta da arguida era subsumível ao ilícito tipificado no artigo 3.º, n.º 1 e n.º 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de janeiro.»[[5]] E o recurso improcede. III. DECISÃO Em face do exposto e concluindo, decide-se negar provimento ao recurso e, em consequência, manter, na íntegra, a sentença recorrida. Sem custas, por o Ministério Público delas estar isento. û Évora, 2023 setembro 12Ana Luísa Teixeira Neves Bacelar Cruz
João Henrique Pinto Gomes de Sousa Fernando Paiva Gomes Monteiro Pina ______________________________ [1] ] Publicado no Diário da República de 28 de dezembro de 1995, na 1ª Série A. |