Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1003/20.4T8LLE-B.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: DEPOSITÁRIO
ARRESTO
BENS PRÓPRIOS
Data do Acordão: 11/23/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1Se o depositário não apresentar os bens que tenha recebido dentro de cinco dias e não justificar a falta, é logo ordenado pelo juiz arresto em bens do depositário suficientes para garantir o valor do depósito e das custas e despesas acrescidas, sem prejuízo de procedimento criminal.
2 – A finalidade do arresto é a de exercer pressão sobre a vontade do depositário, de modo a levá-lo a cumprir a obrigação civil contraída pelo depósito: a obrigação de entregar o que recebeu ou o seu valor.
3 – São dois os meios ao alcance do arrestado para se opor a decisão que decretou o arresto: recorrer da mesma ou deduzir oposição. Com o primeiro pretende-se colocar em causa a legalidade da decisão por falta dos necessários requisitos de direito; no segundo, pretende-se invalidar os fundamentos de facto que serviram de suporte ao decretamento da providência ou obter a redução da mesma aos justos limites.
4 – Notificado após a sua efectivação, o depositário pode opor-se ao arresto nos termos do n.º 1 do artigo 372.º do Código de Processo Civil.
5 – O depositário disporá da oportunidade de discutir o acerto da ordem de arresto por via da oposição, designadamente para alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo Tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1003/20.4T8LLE-B.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Execução de Loulé – J1
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente acção executiva proposta por “(…), Unipessoal, Lda.” contra (…), este veio interpor recurso de despacho de indeferimento liminar proferido no incidente de oposição ao arresto.
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Em 10/07/2020 foi elaborado o auto de penhora junto aos autos de execução onde consta a penhora de diversos bens móveis (17 verbas), constado a menção que tais bens são pertença do executado (…), auto em cuja última página consta a menção de que foi constituído fiel depositário dos bens, (…) e que o mesmo aceitou o cargo.
Consta na mesma folha, logo de seguida, em dizeres manuscritos, o seguinte: «Os bens não foram removidos, contrariamente ao referido quanto ao depositário, passa a ser o Sr. (…), que assumirá solidariamente com o executado o pagamento da divida que ascende actualmente ao montante previsível de 25.000 euros, em pagamentos mensais e sucessivos de 3.000 euros a serem realizados até ao dia 10 de cada mês com início em 10/7/2020 para o IBAN (…)”;
Em seguida aos dizeres acima referidos constam diversas assinaturas, entre elas, a de (…).
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Por requerimento apresentado em 03/03/2021 e reiterado em 18/11/2021, (…) veio arguir a nulidade da sua constituição como fiel depositário, declarando que reiterava o alegado no requerimento de 02/03/2021, alegando, para tanto, que não tinha na sua posse os bens penhorados.
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Ouvidos o agente de execução e a exequente, foi proferido o despacho de 21/07/2022, que julgou improcedente a arguida nulidade de constituição de fiel depositário.
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Nesse mesmo despacho foi fixado o prazo de 5 dias para o fiel depositário, (…), apresentar ao agente de execução os bens penhorados de que havia sido constituído fiel depositário em 10/07/2020, sob pena de ser ordenado arresto em bens do depositário suficientes para garantir o valor do depósito e das custas e despesas acrescidas, sendo executado no próprio processo para o pagamento do valor do depósito e das custas e despesas acrescidas, tudo sem prejuízo de procedimento criminal, como previsto no artigo 771.º do Código de Processo Civil.
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O fiel depositário foi notificado e nada requereu no prazo que lhe foi fixado nem entregou os bens em causa.
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Por requerimento apresentado em 20/9/2022 o agente de execução comunicou que os bens não tinham sido entregues e requereu o arresto de bens do fiel depositário.
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Não resultando dos autos que os bens tivessem sido apresentados, por despacho datado de 23/11/2022, foi ordenado o arresto de bens do depositário de valor suficiente para garantir o valor do depósito, custas e despesas inerentes, prosseguindo a execução contra o depositário para pagamento do valor do depósito, custas e despesas inerentes. *
Foi igualmente ordenado que fosse extraída certidão de diversas peças processuais e a respectiva remessa ao Ministério Público para efeitos de instauração de procedimento criminal.
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Relativamente ao requerimento do fiel depositário em 13/10/2022, foi fixado o prazo de 10 dias para o exequente e o agente de execução se pronunciarem.
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Seguidamente, foi ordenado o arresto de bens do liquidatário.
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Na parte com relevo para a justa composição do incidente, o despacho recorrido tem a seguinte redacção:
«O Opoente, enquanto fiel depositário de bens penhorado e em face do arresto dos seus bens pela falta de apresentação dos bens penhorados, conforme determinado no despacho proferido em 23/11/2022 nos autos de execução, veio instaurar incidente de oposição à penhora nos termos previstos no art.º 784º do Código de Processo Civil.
No requerimento inicial discute o mérito da decisão que determinou o arresto dos seus bens, sustentando a inadmissibilidade desse arresto e bem assim da exigência de apresentação dos bens penhorados e que esteve na base do referido arresto.
Sucede que ao caso não tem cabimento o incidente de oposição à penhora, pois o acto praticado não foi a penhora de bens à ordem da execução, mas sim de arresto de bens do fiel depositário e determinado por despacho judicial (aliás, após audição desse fiel depositário).
Não é admissível igualmente a dedução de oposição ao abrigo do disposto no artigo 372º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil pois não estamos no âmbito do procedimento cautelar de arresto.
Em conclusão, perante o despacho proferido nos termos do artigo 771.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, não se conformando, dispõe o fiel depositário da faculdade de interpor recurso nos termos legais (o qual, aliás, já foi interposto pelo Requerente), estando vedada a dedução e oposição, seja ao abrigo do disposto no artigo 784.º ou do artigo 372.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.
Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12/1/2010, proc.º n.º 820/04.7TBCBR-C.C1., in www.dgsi.pt.
Por conseguinte, porque manifestamente improcedente, deverá ser liminarmente indeferido o requerimento inicial».
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O recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações de recurso continham as seguintes conclusões:
«A. A douta decisão de que se recorre é o despacho de 05/04/2023 (ref. Citius 127735133), que indefere por “manifestamente improcedente” o requerimento de oposição ao arresto – embora notificado para tal.
B. Nos autos está em causa a defesa, por parte do ora Recorrente de um arresto aos seus bens que considera manifestamente injusta e infundada.
C. A reclamação que o ora Recorrente fez sobre o ato do Agente de Execução não pode ser considerada – como o faz o Tribunal a quo – como uma defesa cabal e o pleno exercício ao contraditório.
D. O auto de penhora não faz qualquer prova da posse por parte do ora Recorrente de quaisquer bens penhorados à ordem do processo.
E. Está-se a tratar de uma execução onde o verdadeiro executado não tem oportunidade de se opor, (onde a maior prova é a falta de acesso aos autos).
F. O despacho liminar fundamenta a decisão de “manifestamente improcedente” com a oportunidade de recurso ao despacho de 13/11/2022.
G. Não foi dada oportunidade ao Recorrente para discutir o acerto da ordem de arresto, nem o mais elementar direito ao contraditório, onde nem sequer lhe é dado a conhecer todos os elementos processuais para uma defesa das mais elementares.
H. Tal decisão viola os mais elementares princípios do direito entre ele o acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva consagrada constitucionalmente nos artigos 2.º e 20.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser considerado procedente, e a douta decisão recorrida ser revogada nos termos expostos, com as consequências legais, com o que se fará a esperada Justiça!».
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Foi ordenada a notificação da exequente/oposta para os termos do incidente de oposição (cfr. n.º 2 do art.º 293º do Código de Processo Civil) e, bem assim, para os termos do recurso, tudo como previsto no nº7 do artigo 641º do Código de Processo Civil.
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Não houve lugar a resposta.
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Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do referido diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da possibilidade de apresentação deste tipo de defesa por parte do depositário e, em caso afirmativo, se a mesma deve ser julgada procedente.
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III – Dos factos apurados
Os factos com interesse para a justa resolução da causa são os que constam do relatório inicial.
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IV – Fundamentação:
No que respeita aos deveres do depositário de bens penhorados, além das obrigações gerais previstas no artigo 1187.º[1] do Código Civil e do dever de administrar os bens com a diligência e zelo de um bom pai de família, com a obrigação de prestar contas, estatuído no n.º 1 do artigo 760.º[2] do Código de Processo Civil, incumbe-lhe, ainda, o dever de apresentação dos bens imposto pelo artigo 771.º, n.º 1, deste código.
Se o depositário não apresentar os bens que tenha recebido dentro de cinco dias e não justificar a falta, é logo ordenado pelo juiz arresto em bens do depositário suficientes para garantir o valor do depósito e das custas e despesas acrescidas, sem prejuízo de procedimento criminal, tal como proclama o n.º 2 do artigo 771.º[3] do Código de Processo Civil.
Relativamente ao objecto do presente recurso verifica-se uma sobreposição quase total com a questão que deu origem ao recurso interposto do incidente de nulidade que foi decidido por decisão singular deste Tribunal da Relação de Évora prolatada no âmbito do processo registado sob o n.º 1003/20.4T8LLE-B.E1, datada de 17/07/2023 e que se mostra transitada em julgado.
Em ambas as impugnações recursais o mesmo recorrente coloca em questão a questão do acesso ao direito e da violação do princípio do contraditório, mas como ali se diz «não pode validamente deixar de considerar-se assente que o depositário foi notificado para, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 771.º do Código de Processo Civil, no prazo de 5 dias, apresentar bens penhorados no âmbito dos presentes autos, com a advertência das sanções decorrentes do incumprimento do determinado».
Também é indiscutível que o Apelante incumpriu a imposta obrigação de apresentação dos bens e, como tal, está igualmente abrangido pela eficácia do caso julgado a decisão de ordenar o arresto em bens do depositário suficientes para garantir o valor do depósito e das custas e despesas acrescidas.
Neste recurso, a exemplo do sucedeu com o outro despacho recorrido, foi suscitada a questão de os bens penhorados se tratarem de instrumentos de trabalho, a circunstância de nunca ter tido os bens na sua posse e de não ter tido noção dos deveres e responsabilidades inerentes à função de fiel depositário e, bem assim, a matéria da nulidade por falta de indicação do valor dos bens.
Porém, tal como evidencia a sobredita decisão imodificável deste Tribunal da Relação de Évora, relativamente à questão matricial em discussão, «nenhuma prova foi produzida de que os bens penhorados constituam instrumentos de trabalho, e menos ainda que sejam instrumentos de trabalho do ora Apelante, pois do auto de penhora consta que pertencem ao Executado, que não suscitou tal questão». E todas as demais questões acima enunciadas foram objecto de tratamento e solução na mencionada decisão sumária.
Efectivamente, na senda da anterior jurisprudência por nós emitida, «o caso julgado da decisão anterior releva como autoridade de caso julgado material no processo posterior quando o objecto processual anterior (pedido e causa de pedir) é condição para a apreciação do objecto processual posterior» e «essa imutabilidade ou indiscutibilidade da decisão judicial definitiva impede que a questão que foi objecto da decisão proferida e inimpugnável possa voltar a ser, ela própria, na sua essencial identidade, recolocada à apreciação do Tribunal»[4].
Importa ainda referir que a decisão que indeferiu os embargos de terceiro transitou em julgado e, assim, nesse espectro lógico-jurídico, a única questão sobrante é a da avaliação da possibilidade (ou não) do depositário poder utilizar os meios de oposição típicos do arresto.
Do ponto de vista substantivo, o arresto tem por efeito colocar os bens atingidos em situação de não poderem ser afectados pelo seu titular, em proveito do credor, por via da regra inscrita no artigo 622.º[5] do Código Civil.
A finalidade deste arresto é a de exercer pressão sobre a vontade do depositário, de modo a levá-lo a cumprir a obrigação civil contraída pelo depósito: a obrigação de entregar o que recebeu ou o seu valor.
Em sede geral, decretada a providência cautelar sem prévio contraditório, e uma vez executada ou materializada, o requerido é notificado para se defender nos termos definidos pelo n.º 6 do artigo 366.º[6] do Código de Processo Civil[7].
Na realidade, são dois os meios ao alcance do arrestado para se opor a decisão que decretou o arresto: recorrer da mesma ou deduzir oposição. Com o primeiro pretende-se colocar em causa a legalidade da decisão por falta dos necessários requisitos de direito; no segundo, pretende-se invalidar os fundamentos de facto que serviram de suporte ao decretamento da providência ou obter a redução da mesma aos justos limites[8].
Todavia, alerte-se que não existe uma escolha livre sobre a utilização dos dois meios, eles são alternativos e apenas admitem a invocação de fundamentos diversos. Tal como sublinha Lebre de Freitas se pretender alegar novos factos ou produzir novos meios de prova, o requerido deduzirá oposição (em que, acessoriamente, pode invocar fundamento que, a não haver oposição, constituiria fundamento de recurso)[9], actualmente nos termos previstos para os incidentes de instância, de harmonia com o disposto nos artigos 293.º, n.º 1[10] e 294.º[11], n.º 1, aplicando-se ainda a disciplina consagrada no artigo 367.º[12], todos do Código de Processo Civil. Se pretender impugnar a decisão da matéria de facto ou se a sua discordância se fundar em razões puramente jurídicas deve utilizar o recurso de apelação[13].
O Tribunal a quo manteve um entendimento restritivo desta possibilidade e concluiu que o fiel depositário apenas gozava da faculdade de interpor recurso nos termos legais e que lhe estava vedada a dedução de oposição, fosse ao abrigo do disposto nos artigos 784.º[14] ou do artigo 372.º, n.º 1, alínea b)[15], do Código de Processo Civil, esgrimindo com o acórdão referido no acto recorrido[16].
Neste particular, José Lebre de Freitas forja uma solução diferente, afirmando que «notificado após a sua efectivação, se pode opor ao arresto nos termos do artigo 372.º-1»[17]. Este entendimento é partilhado por Marco Gonçalves Carvalho que advoga que se seguem os termos normais do procedimento cautelar de arresto, para o que o depositário/arrestado deve ser notificado para, querendo, deduzir oposição ou recorrer dessa decisão[18].
Também Virgínio Ribeiro e Sérgio Rebelo avançam que devem ser tomadas cautelas especiais com a notificação, de modo a evitar que, mais tarde, em oposição ao arresto ou no âmbito do processo criminal, o depositário possa argumentar que só não apresentou os bens penhorados por não ter tomado conhecimento efectivo da notificação efectuada para esse efeito[19].
Aliás, a circunstância de, a par do arresto, o depositário ser executado, no próprio processo, para pagamento daquele valor e acréscimos, induz, igualmente, a possibilidade de este gozar de todas as garantias previstas no ordenamento jurídico nacional, não se podendo restringir o âmbito da sua defesa à possibilidade de recorrer, sendo-lhe deferida a hipótese de, nos termos gerais, deduzir oposição, caso ela esteja estruturada em fundamentos concretamente admissíveis.
Neste domínio existe jurisprudência que assevera que, ao ser notificado nos termos preditos, o depositário disporá da oportunidade de discutir o acerto da ordem de arresto, designadamente para alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo Tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução[20].
Sem embargo desta divergência quanto à existência da possibilidade abstracta de o fiel depositário apenas gozar da faculdade de interpor recurso nos termos legais, sendo-lhe vedada a possibilidade de deduzir de oposição, na situação concreta a solução jurídica é idêntica, pois o depositário replicou exactamente nos mesmos moldes jurídicos e fácticos a sua pretensão de reverter a ordem de arresto.
Com efeito, não existe nenhuma margem para a introdução do factor novidade, dado que aquilo que ficou factualmente decidido no pedido de nulidade[21], subsequentemente confirmado por sentença, é absolutamente idêntico àquilo que corresponde à argumentação dardejada para a pretensão de levantamento do arresto.
Por outras palavras, se pretendia impugnar a decisão da matéria de facto ou se a sua discordância se fundava em razões puramente jurídicas o depositário deveria ter utilizado o recurso de apelação e não empregado a faculdade prevista no n.º 1 do artigo 372.º do Código de Processo Civil.
E, assim, ainda que, em tese, haja uma diferente visão quanto à possibilidade de oposição por esta via, a eventual revogação da decisão que não admitiu a oposição ao arresto configuraria um acto inútil[22], dado que havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar, tal como impõe o artigo 625.º[23] do Código de Processo Civil. E, ainda antes disso, perante a identidade da factualidade de suporte, o caso julgado abrange a discórdia que versa sobre a mesma questão concreta da relação processual.
O depositário optou por utilizar simultaneamente a mesma argumentação, duplicando os meios de defesa com a mesma tese, o que não é autorizado. E, deste modo, julga-se improcedente o recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida, face à proibição de duplicação do mesmo argumentário em sede de recurso e de oposição ao arresto, a que acresce ainda a improcedência dos embargos de terceiro.
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V – Sumário: (…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso interposto, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas a cargo do recorrente, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
Notifique.
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Processei e revi
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Évora, 23/11/2023
José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite
Mário João Canelas Brás

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[1] Artigo 1187.º (Obrigações do depositário)
O depositário é obrigado:
a) A guardar a coisa depositada;
b) A avisar imediatamente o depositante, quando saiba que algum perigo ameaça a coisa ou que terceiro se arroga direitos em relação a ela, desde que o facto seja desconhecido do depositante;
c) A restituir a coisa com os seus frutos.
[2] Artigo 760.º (Administração dos bens depositados):
1 - Além dos deveres gerais do depositário, incumbe ao depositário judicial o dever de administrar os bens com a diligência e zelo de um bom pai de família e com a obrigação de prestar contas.
2 - Na falta de acordo entre o exequente e o executado sobre o modo de explorar os bens penhorados, o juiz decide, ouvido o depositário e feitas as diligências necessárias.
3 - O agente de execução pode socorrer-se, na administração dos bens, de colaboradores, que atuam sob sua responsabilidade.
[3] Artigo 771.º (Dever de apresentação dos bens):
1 - Quando solicitado pelo agente de execução, o depositário é obrigado a apresentar os bens que tenha recebido, salvo o disposto nos artigos anteriores.
2 - Se o depositário não apresentar os bens que tenha recebido dentro de cinco dias e não justificar a falta, é logo ordenado pelo juiz arresto em bens do depositário suficientes para garantir o valor do depósito e das custas e despesas acrescidas, sem prejuízo de procedimento criminal.
3 - No caso referido no número anterior, o depositário é, ao mesmo tempo, executado, no próprio processo, para o pagamento do valor do depósito e das custas e despesas acrescidas.
4 - O arresto é levantado logo que o pagamento esteja feito, ou os bens apresentados, acrescidos do depósito da quantia de custas e despesas, que é imediatamente calculada.
[4] Por todos consultar o acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28/09/2023 (Tomé de Carvalho), disponibilizado em www.dgsi.pt.
[5] Artigo 622.º (Efeitos):
1. Os actos de disposição dos bens arrestados são ineficazes em relação ao requerente do arresto, de acordo com as regras próprias da penhora.
2. Ao arresto são extensivos, na parte aplicável, os demais efeitos da penhora.
[6] Artigo 366.º (Contraditório do requerido):
1 - O tribunal ouve o requerido, exceto quando a audiência puser em risco sério o fim ou a eficácia da providência.
2 - Quando seja ouvido antes do decretamento da providência, o requerido é citado para deduzir oposição, sendo a citação substituída por notificação quando já tenha sido citado para a causa principal.
3 - A dilação, quando a ela haja lugar nos termos do artigo 245.º, nunca pode exceder a duração de 10 dias.
4 - Não tem lugar a citação edital, devendo o juiz dispensar a audiência do requerido, quando se certificar que a citação pessoal deste não é viável.
5 - A revelia do requerido que haja sido citado tem os efeitos previstos no processo comum de declaração.
6 - Quando o requerido não for ouvido e a providência vier a ser decretada, só após a sua realização é notificado da decisão que a ordenou, aplicando-se à notificação o preceituado quanto à citação.
7 - Se a ação for proposta depois de o réu ter sido citado no procedimento cautelar, a proposição produz efeitos contra ele desde a apresentação da petição inicial.
[7] Abrantes Geraldes, Temas da Reforma do Processo Civil, vol. III, 4.ª edição, págs. 273-289.
[8] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 07/02/2008, pesquisável em www.dgsi.pt.
[9] José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2017, pág. 56.
[10] Artigo 293.º (Indicação das provas e oposição):
1 - No requerimento em que se suscite o incidente e na oposição que lhe for deduzida, devem as partes oferecer o rol de testemunhas e requerer os outros meios de prova.
2 - A oposição é deduzida no prazo de 10 dias.
3 - A falta de oposição no prazo legal determina, quanto à matéria do incidente, a produção do efeito cominatório que vigore na causa em que o incidente se insere.
[11] Artigo 294.º (Limite do número de testemunhas e registo dos depoimentos):
1 - A parte não pode produzir mais de cinco testemunhas.
2 - Os depoimentos prestados antecipadamente ou por carta são gravados nos termos do artigo 422.º.
[12] Artigo 367.º (Audiência final):
1 - Findo o prazo da oposição, quando o requerido haja sido ouvido, procede-se, quando necessário, à produção das provas requeridas ou oficiosamente determinadas pelo juiz.
2 - A falta de alguma pessoa convocada e de cujo depoimento se não prescinda, bem como a necessidade de realizar qualquer diligência probatória no decurso da audiência, apenas determinam a suspensão desta na altura conveniente, designando-se logo data para a sua continuação.
[13] Neste sentido, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, vol. I (parte geral e processo de declaração. Artigos 1.º a 702.º), 3.ª edição, Almedina, Coimbra, 2023, pág. 478.
[14] Artigo 784.º (Fundamentos da oposição):
1 - Sendo penhorados bens pertencentes ao executado, pode este opor-se à penhora com algum dos seguintes fundamentos:
a) Inadmissibilidade da penhora dos bens concretamente apreendidos ou da extensão com que ela foi realizada;
b) Imediata penhora de bens que só subsidiariamente respondam pela dívida exequenda;
c) Incidência da penhora sobre bens que, não respondendo, nos termos do direito substantivo, pela dívida exequenda, não deviam ter sido atingidos pela diligência.
2 - Quando a oposição se funde na existência de patrimónios separados, deve o executado indicar logo os bens, integrados no património autónomo que responde pela dívida exequenda, que tenha em seu poder e estejam sujeitos à penhora.
[15] Artigo 372.º (Contraditório subsequente ao decretamento da providência):
1 - Quando o requerido não tiver sido ouvido antes do decretamento da providência, é-lhe lícito, em alternativa, na sequência da notificação prevista no n.º 6 do artigo 366.º:
a) Recorrer, nos termos gerais, do despacho que a decretou, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida;
b) Deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinem a sua redução, aplicando-se, com as adaptações necessárias, o disposto nos artigos 367.º e 368.º.
2 - O requerido pode impugnar, por qualquer dos meios referidos no número anterior, a decisão que tenha invertido o contencioso.
3 - No caso a que se refere a alínea b) do n.º 1, o juiz decide da manutenção, redução ou revogação da providência anteriormente decretada, cabendo recurso desta decisão, e, se for o caso, da manutenção ou revogação da inversão do contencioso; qualquer das decisões constitui complemento e parte integrante da inicialmente proferida.
[16] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12/01/2010, proc.º n.º 820/04.7TBCBR-C.C1., in www.dgsi.pt.
[17] José Lebre de Freitas, Armando Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, vol. III, 3.ª edição. Almedina, Coimbra, 2022, pág. 615.
[18] Marco Gonçalves Carvalho, Lições de Processo Civil Executivo, Almedina, Coimbra, 2016, pág. 293.
[19] Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, a Ação Executiva Comentada e Anotada, 2ª edição, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 359-360.
[20] Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 13/12/2007, consultável em www.dgsi.pt.
[21] A decisão de facto tinha o seguinte conteúdo:
«1º-Em 10/7/2020 foi elaborado o auto de penhora junto aos autos de execução onde consta a penhora de diversos bens móveis (17 verbas), constado a menção que tais bens são pertença do executado (…);
2º-Nesse auto, na última página consta a menção de que foi constituído fiel depositário dos bens, (…) e que o mesmo aceitou o cargo;
3º-Na mesma folha, logo de seguida, consta em dizeres manuscritos, o seguinte: «Os bens não foram removidos, contrariamente ao referido quanto ao depositário, passa a ser o Sr. (…), que assumirá solidariamente com o executado o pagamento da divida que ascende actualmente ao montante previsível de 25.000 euros, em pagamentos mensais e sucessivos de 3.000 euros a serem realizados até ao dia 10 de cada mês com inicio em 10/7/2020 para o IBAN (…)”;
4º-Em seguida aos dizeres acima referidos constam diversas assinaturas, entre elas, a de (…);
5º-Por apenso a esta execução, (…) instaurou os embargos de terceiro que correu sob a letra A, onde, na petição inicial, alegou que em 10 de Julho de 2020 o Agente de Execução, acompanhado pela Mandatária do Exequente e um representante desta, surgiram no local onde o arguente realizava uma obra e pretendiam remover os bens que lá se encontravam e eram propriedade do executado; na medida em que tais bens estavam a ser utilizados na obra e a sua remoção causaria prejuízo ao arguente, estabeleceu um acordo com o exequente que permitiu obstar à remoção dos bens (acordo explicitado nessa petição).
Não resultou provado:
1º-Que os bens que o Requerente pretendeu evitar que fossem removidos são distintos dos que ficaram a constar no auto de penhora».
[22] Artigo 130.º (Princípio da limitação dos atos):
Não é lícito realizar no processo atos inúteis.
[23] Artigo 625.º (Casos julgados contraditórios):
1 - Havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar.
2 - É aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual.