Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
4859/15.9T8ENT.E1
Relator: ELISABETE VALENTE
Descritores: PERSI
PRAZO
COMUNICAÇÃO
Data do Acordão: 07/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: O artigo 17.º, n.º 1, alínea c), do CIRE, donde decorre que o PERSI se extingue no dia 91.º subsequente à data da integração do cliente bancário neste procedimento, implica a comunicação das concretas razões em que se baseou a inviabilidade da manutenção do procedimento, descrevendo os factos que determinaram a extinção ou que justificaram a decisão de pôr termo ao mesmo, no entender da entidade bancária, sendo insuficiente referir que, “o motivo foi terem decorrido mais de 91 dias desde o início do PERSI”.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora:

1 – Relatório.

Por requerimento executivo datado de 19-09-2015, a “Caixa Geral de Depósitos, S.A.” (em cuja posição viria a ser habilitada a sociedade “Hefesto STC, S.A.” – cfr. 1.ª parte do despacho proferido sob a ref.ª 90353582 de 14-06-2022) instaurou a presente execução para pagamento de quantia certa, sob a forma de processo comum sumário, contra … (relativamente ao qual a execução foi extinta por sentença proferida sob a ref.ª 80937543 de 23-04-2019) e …, apresentado como títulos executivos, cujos teores se consideram integralmente reproduzidos:
- Uma escritura pública de «MÚTUO COM HIPOTECA» outorgada em 12- 11-1998 e respectivo Documento Complementar (com alteração datada de 05-02- 2009);
- Uma escritura pública de «MÚTUO COM HIPOTECA» outorgada em 22- 04-2002 e respectivo Documento Complementar (com alteração datada de 20-01- 2009); e
- Uma escritura pública de «MÚTUO COM HIPOTECA» outorgada em 14-12-2006 e respectivo Documento Complementar (com alteração datada de 05-02- 2009).
No segmento destinado à enunciação dos factos a exequente originária alegou o seguinte:
«(…)
2 - A 12/11/1998 a exequente celebrou com (…) e mulher (…), casados no regime de Comunhão de Adquiridos, na qualidade de mutuários, um contrato de Mútuo com Hipoteca, ao qual a exequente atribuiu o n.º PT (…), no montante de € 74.819,68 (setenta e quatro mil e oitocentos e dezanove euros e sessenta e oito cêntimos) – vide docs. 1 e 2 em anexo;
3 - Em garantia do capital mutuado, juros e despesas, foi constituída hipoteca, a favor da exequente, sobre o prédio urbano aqui indicado à penhora, pertencente aos mutuários – vide docs. 1, 2 e 7 em anexo;
4 - O empréstimo destinou-se à construção do imóvel hipotecado para habitação própria permanente dos mutuários – vide docs. 1 e 2;
5 - Acresce que igualmente em 22/04/2002, a exequente celebrou com os mesmos executados, na qualidade de mutuários, um segundo contrato de Mútuo com Hipoteca, ao qual a exequente atribuiu o n.º PT (…), no montante de € 58.700,00 (cinquenta e oito mil e setecentos euros) – vide docs. 3 e 4 em anexo;
6 - Em garantia do capital mutuado, juros e despesas, foi constituída segunda hipoteca, a favor da exequente, sobre o prédio urbano aqui indicado à penhora, pertencente aos mutuários – vide docs. 3, 4 e 7 em anexo;
7 - O empréstimo destinou-se a facultar recursos para o financiamento de investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis, sendo o prédio urbano anteriormente mencionado, hipotecado em garantia do mútuo e aqui indicado à penhora, o qual constituía a habitação própria dos mutuários – vide docs. 3, 4;
8 - Também em 14/12/2006, a exequente celebrou com os mesmos executados, na qualidade de mutuários, um terceiro contrato de Mútuo com Hipoteca, ao qual a exequente atribuiu o n.º PT (…), no montante de € 122.000,00 (cento e vinte e dois mil euros) – vide docs. 5 e 6 em anexo;
9 - Em garantia do capital mutuado, juros e despesas, foi constituída terceira hipoteca, a favor da exequente, sobre o prédio urbano aqui indicado à penhora, pertencente aos mutuários – vide docs. 5, 6 e 7 em anexo;
10 - O empréstimo destinou-se a facultar recursos para o financiamento de investimentos múltiplos, não especificados, em bens imóveis, sendo o prédio urbano anteriormente mencionado, hipotecado em garantia do mútuo e aqui indicado à penhora, o qual constituía a habitação própria dos mutuários - vide pf.doc. 5 e 6;
11 - A partir de 12/04/2012 em relação ao primeiro contrato, de 22/04/2012 em relação ao segundo contrato e de 14/04/2012 em relação ao terceiro contrato, os devedores deixaram de cumprir com as obrigações assumidas perante a exequente no âmbito do clausulado do mesmo;
12 - O incumprimento das obrigações assumidas no âmbito dos contratos acima indicados, por parte dos mutuários, que deixaram de proceder ao pagamento das prestações mensais a que estavam obrigados, confere à exequente o direito de exigir judicialmente a totalidade do valor em dívida no âmbito dos empréstimos, tendo em conta que o incumprimento do prazo de pagamento das prestações mensais determina o vencimento de todas as prestações vincendas e, por isso, a sua exigibilidade por parte da exequente.
13- A exequente tem direito a receber o valor do capital em dívida, no âmbito dos três contratos de mútuo celebrados com os devedores, acrescido dos juros vencidos calculados nos termos legais e contratuais, os quais constam melhor reproduzidos na liquidação da obrigação, o que se peticiona».
Entretanto viria a ser proferido o despacho que consta da ref.ª 89433993 de 10-03-2022, por intermédio do qual, tendo em conta o disposto no artigo 734.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, se determinou a notificação do Sr. agente de execução para esclarecer se já tivera lugar algum acto de transmissão de bens penhorados, tendo o mesmo respondido negativamente (cfr. ref.ª 8548761 de 21-03-2022).
Seguiu-se o despacho vertido na ref.ª 89864248 de 28-04-2022 (2.ª parte): «Tomei conhecimento da informação prestada pelo Sr. agente de execução sob a ref.ª 8548761 de 21-03-2022, diante da qual, tendo presentes as disposições conjugadas dos artigos 551.º, n.º 3, e 734.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, importa aferir, face à natureza dos créditos exequendos, se a exequente deu cumprimento ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) estipulado no Decreto- Lei n.º 227/2012, de 25/10.
De facto, e na esteira do que tem jurisprudencialmente entendido de forma pacífica, entendemos que sendo o PERSI obrigatório, o seu cumprimento consubstancia uma condição objetiva de procedibilidade para a execução, impondo-se, por conseguinte, perante o seu eventual desrespeito, a absolvição do executado da instância por procedência de excepção dilatória inominada insanável, de conhecimento oficioso - artigos 573.º, n.º 2, e 578.º, do Código de Processo Civil.
Destarte, convido a exequente a demonstrar nos autos, no prazo de 10 (dez) dias, o cumprimento do PERSI relativamente à executada (…)».
Em resposta junta sob a 8709707 de 16-05-2022, veio a exequente requerer «a junção aos autos de cartas PERSI».
Juntou três documentos, a saber, e por ordem cronológica:
A) Missiva datada de 01-01-2013, tendo como destinatária a aqui executada (…) e o seguinte teor:
«(…) PERSI N.º (…)
(…) Por se registar incumprimento na(s) operação(ões) abaixo indicadas: (…) N.º Contrato (…), (…), (…) e (…), em que é interveniente, informa-se que, de acordo com o disposto no artigo 14.º do D.L. n.º 227/2012, de 25 de outubro, procedemos à sua integração, nesta data, no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), acima referenciado.
Assim, para a resolução da sua situação de incumprimento, e para beneficiar dos direitos consignados no referido Dec.-Lei, deverá dirigir-se a uma Agência da Caixa Geral de Depósitos, até ao dia 2013-01-11, apresentando os seguintes documentos comprovativos:
Última Declaração de IRS e respetiva Certidão de Liquidação; Documentos comprovativos de rendimentos auferidos, nomeadamente a título de salário, remuneração pela prestação de serviços ou prestações sociais. Para mais informações sobre o PERSI poderá dirigir-se a uma Agência da Caixa Geral de Depósitos, enviar uma mensagem de correio eletrónico para o endereço caixadirectagd.pt ou consultar www.cgd.pt.
Se dispõe do serviço Caixadirecta on-line, as próximas comunicações sobre este tema serão disponibilizadas no mesmo (…)»;
B) Missiva datada de 19-06-2013, tendo de igual modo como destinatária a aqui executada (…) e, neste caso, o seguinte teor:
«(…) PERSI N.º (…) Informa-se que ao abrigo do D.L. n.º 227/2012, de 25 de outubro, o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) foi extinto em 2013-06-19, por motivo de: DECORREU MAIS DE 91 DIAS DESDE O INICIO DO PERSI.
Com o fim deste procedimento a Caixa poderá resolver o contrato com fundamento no incumprimento e/ou intentar ações judiciais com vista à satisfação do seu crédito.
Caso reúna condições de acesso ao Regime Extraordinário previsto na Lei n.º 58/2012 deverá apresentar nesta Instituição um requerimento para efeitos de aplicação das medidas extraordinárias previstas neste diploma legal.
Caso tenha créditos noutra Instituição de Crédito poderá ainda recorrer a um mediador de crédito, no prazo de 5 dias, para se manter ao abrigo das garantias do PERSI (…)»;
C) Missiva datada de 18-11-2016, tendo como destinatária a aqui executada (…) e o seguinte teor: «(…) PERSI N.º (…) Incumprimento – Abertura de PERSI (…) Por se registar incumprimento na(s) operação(ões) abaixo indicadas: Cartões de Crédito SOMA (…) N.º Conta Cartão (…), (…) e (…) Informa-se que, de acordo com o disposto no artigo 14.º do D.L. n.º 227/2012, de 25 de outubro, procedemos à sua integração, nesta data, no Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), acima referenciado.
Assim, para a resolução da sua situação de incumprimento, e para beneficiar dos direitos consignados no referido Dec.-Lei, deverá dirigir-se a uma Agência da Caixa Geral de Depósitos, até ao dia 2016-11-28, apresentando os seguintes documentos comprovativos:
Última Declaração de IRS e respetiva Certidão de Liquidação; Documentos comprovativos de rendimentos auferidos, nomeadamente a título de salário, remuneração pela prestação de serviços ou prestações sociais.
Para mais informações sobre o PERSI poderá dirigir-se a uma Agência da Caixa Geral de Depósitos, enviar uma mensagem de correio eletrónico para o endereço caixadirectagd.pt ou consultar www.cgd.pt.
Poderá também utilizar a rede de apoio ao consumidor endividado, no Portal do Consumidor disponível em www.consumidor.pt (…) Se dispõe do serviço Caixadirecta on-line, as próximas comunicações sobre este tema serão disponibilizadas no mesmo (…)».
Seguiu-se o despacho plasmado na ref.ª 90353582 de 14-06-2022 (2.ª parte): «Não obstante o silêncio da executada, notificada que foi nos termos do artigo 221.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, analisados os teores dos documentos juntos pela exequente originária através da ref.ª 8709707 de 16-05-2022, faculto à exequente ora habilitada um prazo de 10 (dez) dias para exercer, querendo, o respectivo contraditório acerca da eventual adopção do entendimento de acordo com o qual a carta de comunicação de extinção do PERSI datada de 19-06-2013 não é susceptível de traduzir o cabal cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, por não indicar o concreto fundamento legal da extinção nem, de forma conveniente, as concretas razões pelas quais foi considerado inviável a manutenção do procedimento».
A resposta surgiu por intermédio da ref.ª 8878209 de 15-07-2022 em termos que se consideram reproduzidos.
Notificada nos termos do artigo 221.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a executada nada disse.
Foi proferida decisão que julgou oficiosamente verificada a excepção dilatória inominada insanável decorrente do desrespeito da válida demonstração do cumprimento do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento instituído pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, e, em consequência, absolver a executada (…) da instância executiva, determinando a extinção da execução movida contra a mesma – artigos 573.º, n.º 2, 576.º, n.ºs 1 e 2, 578.º, 726.º, n.º 2, alínea b), e 734.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil.
Desta decisão recorreu o exequente que formulou as seguintes conclusões (transcrição):
«A. O Tribunal a quo julgou oficiosamente verificada a exceção dilatória inominada decorrente do desrespeito da demonstração do cabal cumprimento do PERSI, e absolveu os executados da instância executiva, o que, ressalvando o devido respeito, não valora convenientemente os factos concretos, nem faz correta interpretação e aplicação da lei ao caso aplicável.
B. Fê-lo, por entender que as comunicações efetuadas não cumpriram cabalmente o PERSI, por falta de menção das razões pelas quais a instituição de crédito teria considerado inviável a manutenção do procedimento, com fundamento no disposto nos n.ºs 3 e 5 do artigo 17.º do PERSI e no Aviso de Banco de Portugal n.º 17/2012.
C. Posição que não se acompanha. Senão vejamos.
D. Os executados não deduziram embargos, nem suscitaram qualquer questão decorrente da falta de integração em PERSI.
E. Veio o Tribunal suscitar oficiosamente a questão do PERSI, determinando que a Exequente demonstrasse o seu cumprimento, o que fez, juntando as respetivas comunicações.
F. A comunicação enviada pela entidade bancária faz expressa menção ao facto que determinou a extinção do PERSI: “DECORREU MAIS DE 91 DIAS DESDE O INÍCIO DO PERSI”.
G. Esta causa ocorre “ope legis”, ou seja, opera por força do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º do PERSI, e não por iniciativa da instituição da bancária, sendo este o caso que poderia determinar a exigência da menção das razões para se ter considerado inviável a manutenção do procedimento.
H. Face a verificação deste facto – o decurso dos 90 dias – para a qual a lei faz cominar a extinção do PERSI, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º do PERSI, não cabe a aplicação da parte final do n.º 3 do artigo 17.º, pois esta implica que ainda esteja a decorrer o procedimento, o que, in casu, não ocorre.
I. Interpretação consonante com a redação da alínea a) do artigo 8.º do Aviso do BdP, que utiliza a conjunção “ou” para distinguir as situações em que o PERSI se extingue pela ocorrência de determinados factos, daquelas em que existe uma decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento.
J. E, em momento algum, os Executados vieram alegar que o banco não teve uma atuação diligente e conforme a lei, durante o período do PERSI, pelo que não parece justificável a atuação do Tribunal.
K. Parece-nos pertinente ser efetuado um juízo de proporcionalidade quanto à intervenção do Tribunal, e até atendendo ao princípio do dispositivo e à repartição do ónus da prova.
L. Podendo, inclusivamente, a pretexto de uma defesa acérrima do Tribunal, a situação redundar num prejuízo para os executados que pretendam ver resolvido o processo com a maior brevidade, e vêm os autos protelar-se no tempo, com crescente vencimento de juros de mora.
M. Está em causa um incumprimento de 2011, que é desde logo indiciador da inviabilidade e falta de interesse dos executados para a regularizar a situação de incumprimento.
N. A acrescer o facto do imóvel que serve de garantia estar onerado com penhoras de 3.ºs, facto invocado pela Exequente/Recorrente e que o Tribunal desconsiderou.
O. Nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 17.º do Decreto-Lei 227/12, de 25/10, o PERSI pode ser extinto pela instituição de crédito se existir penhora a favor de terceiros sobre bens do devedor, o que sucede, in casu, pelo que não se vislumbra pertinência num procedimento, cujo fundamento para a sua extinção se encontra, à partida, verificado.
P. Bem se compreendendo a ratio subjacente a tal norma, porquanto, não existem fundamentos para inviabilizara execução de uma dívida com garantia hipotecária, que se encontra onerada para pagamento de dívidas de terceiros.
Q. Se, por um lado, essas execuções sempre determinam a reclamação do crédito – o que até já ocorreu no processo de execução fiscal – também representam uma diminuição da garantia, o que determina a perda do benefício do prazo, nos termos do disposto no artigo 780.º do Código Civil.
R. O que se pretende concluir é que não se justifica a implementação de um procedimento para tentativa de regularização da mora, quando existem, desde logo, circunstâncias que determinam a exigibilidade da totalidade do crédito.
S. Em paralelo, cumpre acrescentar que, a implementação do PERSI está relacionada com a existência de mora no pagamento de prestações.
T. Sucede que, a incidência de penhoras sobre o imóvel dado como garantia, determina o incumprimento contratual, nos termos da cláusula 14.ª do Documento Complementar, não se concebendo a tentativa de regularização de um crédito vencido, com a implementação do PERSI, quando se verifica que o contrato sempre se manteria em incumprimento.
U. Para além da situação desvantajosa e desproporcionada em que se colocaria a Exequente / Recorrente em relação a credor terceiro, na medida em que a extinção da presente execução determinaria a perda da prioridade da garantia penhora – que garante o crédito que excede o garantido por hipoteca – relativamente à execução com penhora posterior, que existe.
V. Por último, parece-nos, de todo o modo, que o diploma que regulamenta o PERSI não teria aplicação in casu, porquanto entrou em vigor após de ter ocorrido o vencimento da dívida não estando em causa a mora no pagamento pontual de certas prestações.
W. Pelo que, também por esta razão, parece encontrar-se demonstrada a inexigibilidade da integração dos Executados no PERSI, face à inaplicabilidade do regime em causa.
X. Sendo que em relação aos fiadores, a sua integração em PERSI apenas ocorre a seu pedido, o que não se verificou, in casu.
Y. Em conclusão, e pelos fundamentos acima expostos, entende a Exequente/Recorrente não estar em causa a exceção dilatória inominada, pelo que não deverá ocorrer a absolvição da instância, devendo a execução seguir os seus termos.
Z. Por todo o supra exposto, concluiu-se, s.m.o., que não assiste razão ao entendimento do douto Tribunal, devendo ser revogada a decisão proferida pelo Tribunal a quo, determinando-se o prosseguimento dos autos de execução.
Termos em que, e nos mais de Direito que V. Exas., Venerandos Juízes Desembargadores, doutamente suprirão, deverá o presente Recurso ser julgado procedente, fazendo assim uma vez mais, a costumada JUSTIÇA!»
Não há contra-alegações.
Dispensados os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir.
Os factos com relevância para a decisão do recurso são os que constam deste relatório.


2 – Objecto do recurso.

Questão (única) a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC): Saber se, ressalvada a possibilidade de prorrogação por acordo escrito das partes, o simples decurso do prazo de 91 dias, desde a data da integração do cliente bancário em PERSI, extingue o mesmo, sem que a entidade bancária careça de indicar as razões que inviabilizaram a manutenção do procedimento, bastando-lhe comunicar ao cliente bancário a extinção pelo decurso do referido prazo ou se será necessário comunicar as concretas razões em que se terá baseado a inviabilidade da manutenção do procedimento, descrevendo os factos que determinaram a extinção do PERSI ou que justificaram a decisão de pôr termo ao mesmo.


3 - Análise do recurso.

Vem o presente recurso interposto da decisão que julgou oficiosamente verificada a excepção dilatória inominada insanável decorrente do desrespeito da demonstração – ainda que meramente perfunctória – das obrigações inerentes ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento instituído pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, e, em consequência, absolveu a executada da instância executiva, com a consequente extinção da execução.
O recorrente discorda desta decisão, argumentando que, a comunicação enviada pela entidade bancária faz expressa menção ao facto que determinou a extinção do PERSI: “DECORREU MAIS DE 91 DIAS DESDE O INÍCIO DO PERSI”.
E esta causa ocorre “ope legis”, ou seja, opera por força do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º do PERSI, e não por iniciativa da instituição da bancária, sendo este o caso que poderia determinar a exigência da menção das razões para se ter considerado inviável a manutenção do procedimento, pelo que, face a verificação deste facto – o decurso dos 90 dias – para a qual a lei faz cominar a extinção do PERSI, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º do PERSI, não cabe a aplicação da parte final do n.º 3 do artigo 17.º, pois esta implica que ainda esteja a decorrer o procedimento, o que, in casu, não ocorre (Interpretação consonante com a redação da alínea a) do artigo 8.º do Aviso do BdP, que utiliza a conjunção “ou” para distinguir as situações em que o PERSI se extingue pela ocorrência de determinados factos, daquelas em que existe uma decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento).
O recorrente defende uma interpretação diversa deste artigo, da que o tribunal a quo fez do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25-10, que entrou em vigor em 01-01-2013 e foi alterado pelo Decreto-Lei n.º 70-B/2021, de 06-08, tendo as alterações entrado em vigor em 07-08-2021 (artigo 9.º).
Vejamos:
O PERSI – Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento – tem por objectivo, de acordo com o preâmbulo do DL 227/2012, de 25 de Outubro, “aferir da natureza pontual ou duradoura do incumprimento registado, avaliar a capacidade financeira do consumidor e, sempre que tal seja viável, apresentar propostas de regularização adequadas à situação financeira, objectivos e necessidades do consumidor.”
Nos termos do artigo 17.º - Extinção do PERSI
1 - O PERSI extingue-se:
a) Com o pagamento integral dos montantes em mora ou com a extinção, por qualquer outra causa legalmente prevista, da obrigação em causa;
b) Com a obtenção de um acordo entre as partes com vista à regularização integral da situação de incumprimento;
c) No 91.º dia subsequente à data de integração do cliente bancário neste procedimento, salvo se as partes acordarem, por escrito, na respetiva prorrogação; ou
d) Com a declaração de insolvência do cliente bancário.
2 - A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que:
a) Seja realizada penhora ou decretado arresto a favor de terceiros sobre bens do devedor;
b) Seja proferido despacho de nomeação de administrador judicial provisório, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do n.º 3 do artigo 17.º-C do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas;
c) A instituição de crédito conclua, em resultado da avaliação desenvolvida nos termos do artigo 15.º, que o cliente bancário não dispõe de capacidade financeira para regularizar a situação de incumprimento, designadamente pela existência de ações executivas ou processos de execução fiscal instaurados contra o cliente bancário que afetem comprovada e significativamente a sua capacidade financeira e tornem inexigível a manutenção do PERSI;
d) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior;
e) O cliente bancário pratique atos suscetíveis de pôr em causa os direitos ou as garantias da instituição de crédito;
f) O cliente bancário recuse a proposta apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 1 do artigo anterior; ou
g) A instituição de crédito recuse as alterações sugeridas pelo cliente bancário a proposta anteriormente apresentada, sem prejuízo do disposto no n.º 2 do artigo anterior.
3 - A instituição de crédito informa o cliente bancário, através de comunicação em suporte duradouro, da extinção do PERSI, descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento.
4 - A extinção do PERSI só produz efeitos após a comunicação referida no número anterior, salvo quando o fundamento de extinção for o previsto na alínea b) do n.º 1.
5 - O Banco de Portugal define, mediante aviso, os elementos informativos que devem acompanhar a comunicação prevista no n.º 3.
Em cumprimento deste n.º 5, foi dado à estampa o Aviso do Banco de Portugal n.º 17/2012 (publicado no Diário da República, 2.ª série, Parte E, n.º 243, de 17-12-2012), de cujo artigo 8.º, sob a epígrafe «[c]omunicação de extinção do PERSI», decorre o que segue:
«A comunicação pela qual a instituição de crédito informa o cliente bancário da extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, as seguintes informações:
a) Descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento, com indicação do respetivo fundamento legal;
b) Consequências da extinção do PERSI, nos casos em que não tenha sido alcançado um acordo entre as partes, designadamente a possibilidade de resolução do contrato e de execução judicial dos créditos;
c) Quando esteja em causa um contrato de crédito à habitação, informação acerca do regime constante do Decreto-Lei n.º 349/98, de 11 de novembro, na redação da Lei n.º 59/2012, de 9 de novembro, relativamente à resolução e ao direito à retoma do contrato de crédito;
d) No caso de o cliente bancário estar abrangido pelo regime extraordinário de regularização do incumprimento de contratos de crédito à habitação, referência, quando tal decorra do referido diploma legal, ao direito do cliente bancário à aplicação de medidas substitutivas, bem como aos termos em que poderá solicitar a sua aplicação;
e) Identificação das situações em que o cliente bancário pode solicitar a intervenção do Mediador do Crédito mantendo as garantias associadas ao PERSI;
f) Indicação dos elementos de contacto da instituição de crédito através dos quais o cliente bancário pode obter informações adicionais ou negociar soluções para a regularização da situação de incumprimento». Revertendo à situação dos autos, e salvaguardando o devido respeito pelo esforço argumentativo da exequente/habilitada, estamos em crer que a acima citada comunicação dirigida à aqui executada dando-lhe conta da extinção do PERSI em que havia sido integrada não satisfaz os requisitos enunciados, mormente os que foram objecto de negrito e sublinhados nossos.

Ocorrendo incumprimento das obrigações decorrentes dos contratos de crédito abrangidos pelo diploma, as instituições de crédito têm de integrar o devedor obrigatoriamente no PERSI (artigo 12.º a 17.º do diploma) em ordem a regularizar e viabilizar um mútuo acordo, tendente a evitar o recurso à via judicial.
Assim, o início do procedimento é imposto obrigatoriamente, desde que se verifique uma de três situações: (i) manutenção do incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, entre o 31.º e 60.º dia subsequentes à data de vencimento da obrigação em causa – artigo 14.º, n.º 1; (ii) solicitação por parte do cliente bancário em mora, da sua integração no PERSI, considerando-se que essa integração ocorre na data em que a instituição de crédito recebe a referida comunicação – artigo 14.º, n.º 2, alínea a); e (iii) constituição em mora por parte do cliente bancário que antecipadamente alertou para o risco de incumprimento das obrigações decorrentes do contrato de crédito, considerando-se a integração no PERSI na data do referido incumprimento – artigo 14.º, n.º 2, alínea b).
Tal procedimento desenrola-se em três fases distintas: (i) uma fase inicial – artigo 14.º, alínea b); (ii) uma fase de avaliação e proposta – artigo 15.º, e (iii) uma fase de negociação – artigo 16.º.
Tem sido entendimento da jurisprudência que a validade e eficácia da integração do devedor bancário inadimplente no âmbito do PERSI, bem como a validade e eficácia da respetiva extinção, são condições de admissibilidade da ação declarativa ou executiva, que a instituição bancária pretender mover contra esse devedor, incidindo sobre a mesma o ónus de alegar e provar essas condições nos termos do artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil.
Acresce que, quer a omissão da informação, quer a falta de integração do devedor no PERSI pela instituição de crédito ou mesmo a ausência de comunicação da extinção do procedimento constituem violação de normas de carácter imperativo o que, a verificar-se, redunda numa excepção dilatória atípica ou inominada e insuprível.
No caso em apreço, está em causa a extinção do PERSI.
Relativamente à mesma deve o banco informar o cliente bancário da extinção do PERSI.
Está em causa a interpretação do artigo 17.º, n.º 1, alínea c), do CIRE, donde decorre que, o PERSI se extingue no 91.º subsequente à data da integração do cliente bancário neste procedimento.
Para tal comunicação bastará – como nos autos – referir que o procedimento se extinguiu por «terem decorrido 91 dias da integração (…) no PERSI - Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, sem mais? (transcrevendo o que em parte resulta da alínea c) do n.º 1 do artigo 17.º em apreço, omitindo por completo quaisquer «factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento);
Ou,
Será ainda necessário informar, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis das concretas razões se terá baseado a inviabilidade da manutenção do procedimento, descrevendo os factos que determinaram a extinção do PERSI ou que justificaram a decisão de pôr termo ao mesmo.
A resposta depende de como se entender o nº 1 alínea c) do artigo 17.º do PERSI:
- Ou, se entende que ainda que fundamento legal da extinção seja o decurso do referido prazo, a entidade bancária não fica dispensada de comunicar a razão que, no seu entender, torna inviável a manutenção do procedimento.
Neste sentido, por exemplo os Acórdãos desta Relação de 07.04.2022 (Proc. 451/21.7T8ENT.E1); de 07.04.2022 (Proc. 364/21.2T8ENT.E1) e de 25-11-2021, Proc. 17026/20.0T8PRT.E1, Relatora: Maria Adelaide Domingos (todos publicados em www.dgsi.pt), em cujo texto se argumenta o seguinte:
«Se é certo que da literalidade deste segmento da norma decorre que o decurso dos 91 dias subsequentes à data da integração do cliente bancário no PERSI faz extinguir este procedimento, também da letra e da inserção sistemática dos n.ºs 3 e 4 no mesmo preceito, resulta que a comunicação de extinção só produz efeitos após a entidade bancária informar o cliente bancário comunicando-lhe o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção do procedimento.
(…) Na verdade, os n.ºs 3 e 4 do artigo 17.º não excluem da sua previsão a alínea c) do n.º 1 do mesmo preceito.
Assim, do elemento literal e sistemático do normativo decorre que há que distinguir entre «fundamento legal» para a extinção e «razões» donde decorre a inviabilidade da persistência do procedimento que, aliás, poderia prosseguir após o 91.º, se as partes por escrito nisso acordassem.
Mas também pelo elemento racional ou teleológico da interpretação se chega a igual conclusão.
Como foi dito supra, o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25-10 visou criar uma série de medidas preventivas de incumprimento (Plano de Ação para o Risco de Incumprimento-PARI) e, caso já exista incumprimento, um procedimento de regularização do mesmo (Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento-PERSI) que passa pela identificação das razões do incumprimento das obrigações e pela adoção de medidas/propostas viáveis e suscetíveis de reverter o incumprimento. O que implica, por parte das entidades bancárias, todo um procedimento de avaliação da natureza pontual ou duradoura do incumprimento e da avaliação da capacidade financeira do cliente inadimplente.
Como decorre dos artigos 12.º a 16.º do PERSI, este procedimento tem várias fases (como acima já referido) que implicam, em suma, diligências tendentes à avaliação, negociação das propostas apresentadas pela instituição bancária (artigos 14.º a 16.º) e, finalmente, extinção do PERSI nas situações elencadas no artigo 17.º.
Estas normas têm caráter imperativo e todas as referidas fases estão cobertas pelos princípios gerais do artigo 4.º: diligência, lealdade, boa fé e adoção de medidas adequadas quer para evitar o incumprimento, quer para a obter a regularização das obrigações incumpridas.
A razão última do regime é, no fundo, evitar que o cliente bancário entre em incumprimento ou já se encontrando nessa situação, encontrar medidas que lhe permitam regularizar o incumprimento.
Esse ónus, na ótica do legislador recaí essencialmente sobre a instituição bancária, desde logo, porque o legislador reconhece que na relação negocial estabelecida existe uma «assimetria de informação» entre aquele tipo de instituições e os consumidores (como se refere no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 227/2012 - elemento histórico da interpretação), compreendendo-se que a eficácia da implementação de medidas preventivas ou de regularização esteja no domínio da instituição bancária, carecendo o cliente de um especial apoio de obtenção de informações, de aconselhamento e acompanhamento, ou seja, de uma rede de apoio a que se reporta o diploma, que lhe conceda uma especial proteção enquanto parte mais frágil da relação contratual incumprida[10] (cfr. artigos 23.º e seguintes).
Deste modo, a entidade que está em condições de explicar as razões para o insucesso do PERSI, decorrido o prazo de 91 dias após a integração do consumidor naquele procedimento, é, sem dúvida, a entidade bancária, pelo que é sobre a mesma que recaí o ónus de, para além de invocar o fundamento legal da extinção do procedimento, também explicar as razões da falta de viabilidade do mesmo (n.º 3 do artigo 17.º).
É o que igualmente está subjacente e decorre do Aviso do BdP n.º 17/2012 já antes citado.
Sendo que a falta da comunicação prevista no n.º 3 do artigo 17.º do PERSI nos termos sobreditos determina a ineficácia da comunicação da extinção do PERSI (n.º 4 do artigo 17.º).
Se a justificação, explícita ou implícita, da inviabilidade do procedimento passasse apenas pelo decurso do tempo, de pouco ou nada servia o diploma em causa. Bastava que nada fosse feito, bastando a comunicação formal da inclusão do devedor no âmbito do PERSI e a comunicação da extinção do mesmo decorrido o prazo previsto na lei. Corresponderia, assim, a uma espécie de moratória e não a um procedimento ativo a cargo das entidades bancárias com as finalidades que o legislador gizou para tal instituto.
No caso, o ora apelante indicou o fundamento legal (decurso do prazo), mas não indicou as razões da inviabilidade da manutenção do procedimento.
No fundo, o que comunicou aos ora apelados foi que continuavam em incumprimento decorrido o prazo do PERSI, logo considerava-o extinto.
Deste modo, fica-se sem saber quais as razões para a falta de viabilidade da regularização da dívida visada com o PERSI.
Foi devida a inação da entidade bancária? Falta de colaboração dos devedores? Total incapacidade financeira dos mesmos para regularizarem a dívida? Houve outras razões? Não se sabe!»

- Ou se entende que o n.º 1, alínea c) do artigo 17.º do PERSI prevê uma extinção legal e automática que se verifica apenas pelo decurso do tempo.
Neste sentido por exemplo o Ac. RE de 26-05-2022 Proc. 18/22.2T8ENT.E1, Relator Mário Coelho, onde se argumenta o seguinte:
«Pela nossa parte, respeitando naturalmente opinião contrária, notamos que o DL n.º 272/2012 prevê, nos respectivos artigos 14.º, 15 e 16.º, diversas fases procedimentais, com uma fase inicial, seguida de uma fase de avaliação e proposta, e outra de negociação. Estas fases exigem também a colaboração do cliente bancário – maxime, prestando certas informações sobre a sua capacidade financeira ou propondo alterações às propostas apresentadas pela instituição de crédito, como resulta do artigo 15.º, n.ºs 2 e 3 e do artigo 16.º, n.º 2 e 3 – não se podendo assim afirmar que o PERSI é um procedimento unilateral da instituição de crédito. E daí possa suceder que, sem a colaboração do cliente bancário, todo o procedimento fique votado ao insucesso, decorrendo os 91 dias apenas com a proposta inicial da instituição de crédito, sem qualquer resposta do cliente.
Por outro lado, os documentos apresentados devem ser interpretados no seu contexto, e certo é que foi remetida informação adicional aos executados, sobre vários temas do PERSI, esclarecendo que este se extinguia “no 91.º dia após o seu início, se não for prorrogado por acordo das partes, ou com a declaração de insolvência do cliente bancário.”
Neste quadro, ao enviar as cartas de extinção do PERSI invocando o decurso do prazo referido no artigo 17.º, n.º 1, alínea c), não se pode afirmar, sem mais, que os executados não estavam informados que o decurso do aludido prazo era causa de extinção do procedimento.
Ademais, interpretando o artigo 8.º, alínea a), do Aviso n.º 17/2012 do Banco de Portugal, a comunicação de extinção do PERSI deve conter, em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis, a descrição dos factos que determinam a extinção do PERSI ou que justificam a decisão da instituição de crédito de pôr termo ao referido procedimento, com indicação do respectivo fundamento legal, o que é compatível com os n.ºs 1 e 2 do artigo 17.º do DL n.º 272/2012, que incluem factos que automaticamente extinguem o procedimento – o pagamento, o acordo, o decurso do prazo legal ou a declaração de insolvência do cliente bancário – e outros que envolvem um processo decisório da instituição de crédito.
Nestes termos, não se pode dizer que as cartas que comunicaram a extinção do PERSI por decurso do prazo estipulado no artigo 17.º, n.º 1, alínea c), não sejam suficientemente claras, rigorosas e legíveis, em especial quando o cliente já estava devidamente informado das consequências do decurso do prazo de 91 dias.
Ponderando, finalmente, que nos encontramos perante um despacho liminar de indeferimento, que deve ser reservado para situações de manifesta e indiscutível improcedência do pedido, mesmo que subsistam dúvidas sobre a ocorrência de uma excepção dilatória inominada, a execução deve prosseguir, tanto mais que o processo admite aos executados a oportunidade de deduzir a sua oposição, podendo invocar todos os fundamentos que possam ser invocados como defesa no processo de declaração – artigo 731.º do Código de Processo Civil.»

Seguimos a primeira posição, que aliás cremos ser maioritária, atendendo em especial ao argumento de que, como decorre do preâmbulo do citado Decreto-Lei n.º 227/2012, «[a] concessão responsável de crédito constitui um dos importantes princípios de conduta para a atuação das instituições de crédito. A crise económica e financeira que afeta a maioria dos países europeus veio reforçar a importância de uma atuação prudente, correta e transparente das referidas entidades em todas as fases das relações de crédito estabelecidas com os seus clientes enquanto consumidores na aceção dada pela Lei de Defesa do Consumidor, aprovada pela Lei n.º 24/96, de 31 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de abril e assim sendo, o cliente deve ser informado de forma completa da sua situação, o que não se basta com a mera alusão ao “91º dia”, pois tal referência apenas corresponde à transmissão de que aqueles procedimentos se extinguiram «em virtude de EXPIRAÇÃO», mas não esclarece as concretas razões se terá baseado a inviabilidade da manutenção dos procedimentos, descrevendo os factos que determinaram a extinção ou que justificaram a decisão de pôr termo aos mesmos.
Concretizando, e em suma, dir-se-á o seguinte:
Além de não ser indicada a concreta base legal de suporte, à mesma foi transmitido que aquele procedimento se extinguiu «por motivo de: DECORREU MAIS DE 91 DIAS DESDE O INICIO DO PERSI», mas nenhuma palavra se acrescentou no sentido de, «em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis», informá-la em que concretas razões se terá baseado a inviabilidade da manutenção do procedimento, descrevendo os factos que determinaram a extinção ou que justificaram a decisão de pôr termo ao mesmo.
Em suma, no caso em apreço, a comunicação de extinção não produziu efeitos e, consequentemente, mantêm-se as garantias dos ora apelados previstas no artigo 18.º do PERSI, no caso, o impedimento da entidade bancária instaurar a presente ação executiva (alínea b) do n.º 1), por faltar uma condição de admissibilidade da sua instauração e, instaurada, como sucedeu, verifica-se uma exceção dilatória inominada insuprível, de conhecimento oficioso, que determina a extinção da instância executiva com a correspondente absolvição da instância dos executados.
Improcede, pois, a Apelação.

Sumário:
(…)

4 – Dispositivo.

Nos termos e pelas razões expostas, acordam em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.
Dado o decaimento, as custas ficam a cargo da apelante (artigo 527.º do CPC), sendo a taxa de justiça do recurso fixada pela tabela referida no n.º 2 do artigo 6.º do RCP.
Évora, 12.07.2023
Elisabete Valente
Ana Isabel Pessoa
José António Moita