Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
4567/19.1T8STB.E1
Relator: EMÍLIA RAMOS COSTA
Descritores: ADMISSIBILIDADE DE RECONVENÇÃO
APELAÇÃO AUTÓNOMA
CASO JULGADO FORMAL
RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO
CADUCIDADE DO DIREITO À RESOLUÇÃO DO CONTRATO
ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA
JUSTA CAUSA
LOCAL DE TRABALHO
HORÁRIO DE TRABALHO
INDEMNIZAÇÃO POR DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 07/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I – Importa não confundir a não pronúncia do tribunal com o não atendimento de um facto que se mostra alegado, pois tal não atendimento não se reporta à não apreciação de uma questão, conforme a mesma se mostra definida no n.º 2 do art. 608.º do Código de Processo Civil.
II – O pedido reconvencional, ao não ser admitido, leva à absolvição do Réu desse pedido que, dada a sua especificidade, é o Autor da ação.
III – Daí que é de aplicar à não admissão do pedido reconvencional o disposto na al. b) do n.º 1 do art. 79.º-A do Código de Processo do Trabalho, e não o seu n.º 3, e, a ser assim, não sendo interposto recurso desse despacho no prazo indicado no art. 80.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, ou seja, no prazo de 30 dias, o despacho transita.
IV – A prova dos factos relativos à existência da caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho por justa causa, por se tratar de matéria de exceção, incumbe, nos termos do n.º 2 do art. 342.º do Código Civil, à entidade patronal.
V – O trabalhador só pode resolver o contrato de trabalho com fundamento em justa causa subjetiva se o comportamento da entidade empregadora for ilícito, culposo e tornar, pela sua gravidade e consequências, imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral.
VI – Considera-se lícita a resolução do contrato de trabalho com justa causa por parte da trabalhadora a quem a entidade empregadora, ao lhe mudar o local de trabalho, não lhe comunicou que tal mudança iria igualmente implicar a alteração do seu horário de trabalho, o qual deixaria de ser aquele que há mais de 8 anos praticava, e que era das 08h00 às 17h00, de 2.ª à 6.ª feira, para passar a ser de turnos contínuos, inclusive das 00h00 às 08h00 e aos fins-de-semanas, obrigando-a a confrontar-se com tal situação no seu primeiro dia de trabalho no novo local.
VII – A indemnização prevista no n.º 1 do art. 396.º do Código do Trabalho integra quer os danos patrimoniais quer os danos não patrimoniais sofridos pela trabalhadora.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 4567/19.1T8STB.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
AA (Autora) intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “Eurest (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda.”[2] (Ré), solicitando, a final, que a ação seja julgada procedente, e em consequência, seja reconhecido que a Autora teve fundamentos para a resolução do contrato com justa causa, sendo a Ré condenada a pagar à Autora as quantias discriminadas na ação, no valor de €16.700,00, acrescidas de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento.
Alegou, em síntese, que a Autora trabalhava para a Ré desde julho de 2009, numa situação de exploração de estabelecimento, sendo que em maio desse ano a Ré transferiu a Autora para o Refeitório da empresa “Tintas Hempel, Lda.”, em Palmela, que passou a ser o seu local de trabalho, tendo-lhe sido atribuído o horário de trabalho de 2.ª a 6.ª feira, das 08h00 às 17h00, possuindo a Autora nos últimos anos a categoria profissional de Empregada de Refeitório, auferindo a retribuição base de €580,00.
Mais mencionou que a Autora é filiada no Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul e a Ré está inscrita na ARESP, pelo que à relação entre ambas é aplicável o CCT Cantinas, Refeitórios e Fábricas de Refeições publicado no BTE n.º 36 de 29-09-1998 e sucessivas alterações.
Mais alegou que a Autora fez cessar o contrato de trabalho com justa causa, conforme carta que enviou à Ré, e que foi recebida por esta em 13-07-2018, em virtude de ter apresentado queixa contra uma colega que a incomodava no exercício da sua atividade profissional e que, em virtude da queixa apresentada, acabou por ser transferida para um novo posto de trabalho, com efeitos a partir de 04-06-2018, sendo ainda lhe instaurado um processo disciplinar, onde lhe foi aplicada uma sanção de um dia de suspensão.
Referiu ainda que fez consta em tal carta que a transferência lhe acarretava prejuízo sério, uma vez que é divorciada e vive sozinha com a filha de 16 anos de idade, e cumprir um horário por turnos rotativos, que inclui horário noturno das 00h00 às 8h00, implicava que a sua filha ficava sozinha em casa durante a noite, o que constituía um grande perigo para a sua segurança, sendo que no estado de ansiedade em que ficou devido aos problemas havidos com a tal colega a própria médica de família a encaminhou para um psiquiatra, razão pela qual os referidos horários noturnos seriam igualmente nefastos para a sua saúde.
Mais concluiu em tal carta que a resolução é com justa causa nos termos das als. b), c), d) e f) do n.º 2 do art. 394.º do Código do Trabalho.
Referiu ainda que a Ré violou a cláusula 34.ª do CCT aplicável, uma vez que não houve acordo prévio da Autora para tal transferência; e cláusula 24.ª do referido CCT, por ter alterado o horário de trabalho da Autora, causando-lhe prejuízo sério.
Esclareceu também que a transferência da Autora para um novo local de trabalho onde teria de cumprir um horário por turnos rotativos, que incluía turno noturno das 00h00 às 8h00, quando a Autora cumpria há anos um horário fixo das 8h00 às 17h00, significou um agravamento das condições laborais e uma ofensa à integridade física e moral da Autora, à sua liberdade, honra e dignidade enquanto trabalhadora.
Mais requereu que a indemnização prevista no art. 396.º, n.º 1, do Código do Trabalho, a que tem direito, deve ser arbitrada no seu máximo legal, ou seja, no valor de €11.700,00, em face do valor da sua retribuição e do elevado grau de ilicitude do comportamento da Ré.
Concluiu, por fim, que para além dos danos patrimoniais, a Autora sofreu danos morais, tendo-se sentido profundamente humilhada, angustiada, triste, com dificuldades em dormir e alimentar-se, tendo emagrecido bastante, pelo que a Ré deve ser condenada, a esse título, no montante de €5.000,00.
Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver o litígio por acordo.
A Ré “Eurest (Portugal), Lda.” apresentou contestação, invocando a caducidade do direito de resolução com justa causa, impugnando a ação e reconvindo, concluindo, a final, pela procedência da invocada exceção perentória ou, caso assim se não entenda, pela improcedência da ação, por não provada, e pela procedência da reconvenção deduzida pela Ré, devendo a Autora pagar à Ré o montante de €1.160,00.
Alegou, em súmula, que, tendo a Autora invocado como motivo para a resolução com justa causa do contrato de trabalho a ordem de transferência do local de trabalho e o novo horário de trabalho, nos termos do art. 395.º, n.º 1, do Código do Trabalho, quando a Autora os invocou já tal direito havia caducado, uma vez que a Autora foi notificada da ordem de transferência em 30-04-2018, com efeitos a partir de 04-06-2018, e em 29-05-2018 teve conhecimento de todas as condições da sua transferência, nomeadamente do seu novo horário de trabalho e procedimentos de transporte.
Mais alegou que, mesmo que não se considere tal, no limite, a Autora teve conhecimento do seu horário de trabalho no dia 06-06-2018, por ter sido o seu primeiro dia de trabalho no novo lugar, pelo que a 12-07-2018 já havia decorrido o prazo de 30 dias legalmente previsto.
Alegou igualmente que assim que a Ré foi informada da existência de uma situação de mal-estar e troca de ofensas entre a A. e outra trabalhadora, que incluía ataques verbais mútuos na unidade, promoveu, na pessoa da Gestora de Operações, BB, a resolução do conflito, tendo esta se deslocado ao local de trabalho de ambas, no dia 23-03-2018, para apurar factos, contudo, como não foi possível resolver o problema, foi instaurado um processo disciplinar a ambas as trabalhadoras, o qual culminou com a aplicação de uma sanção disciplinar de um dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade a ambas.
Referiu, de igual modo, que a trabalhadora CC também apresentou queixa contra a Autora em 19-04-2918.
Esclareceu ainda que também a trabalhadora CC foi transferida para outro local de trabalho, sendo que a Autora, após conhecimento do novo local de trabalho e dos respetivos horários, nunca veio alegar quaisquer prejuízos pessoais em face de tais mudanças, tendo apenas se oposto à prestação de trabalho no turno da noite e ao regime de folgas rotativas instituído na nova unidade, pelo que lhe foi esclarecido expressamente pelo Gestor de Operações, DD, que a Autora poderia prestar funções no turno da manhã, das 7h00 às 15h30, com folgas aos fins de semana, porém a Autora, no dia 04-06-2018, primeiro dia de trabalho, apesar de ter comparecido no local de trabalho, acompanhada de uma dirigente sindical, recusou-se a trabalhar, proferindo ameaças e informando que pretenderia manter o horário das 08h00 às 17h00, tendo-lhe sido reiterado pelo Referido DD que esse horário não existia naquela unidade, devendo, por isso, a Autora integrar o horário já existente no turno da manhã.
Alegou também que a Autora ainda trabalhou três dias das 07h00 às 15h30, vindo a por baixa médica entre o dia 11 e 14-06-2018 e faltando injustificadamente entre os dias 15-06-2018 e 13-07-2018.
Concluiu ainda que, ao lhe ter sido atribuído um horário quase igual ao que a Autora tinha, inexistiu qualquer prejuízo para esta, tendo-se de qualquer modo dado cumprimento ao disposto na cláusula 24.ª do CCT, inexistindo, assim, qualquer motivo que pudesse preencher o conceito de justa causa, a que acresce a Ré desconhecer quaisquer danos não patrimoniais sofridos pela Autora, sendo-lhe inexigível qualquer responsabilidade, não tendo, de qualquer modo, a Autora demonstrado quaisquer danos dignos da tutela do direito, devendo também este pedido improceder.
Relativamente ao pedido reconvencional, veio a Ré alegar que, inexistindo motivos para a Autora recorrer ao disposto no art. 394.º do Código do Trabalho, a carta de resolução que lhe enviou terá de valer como denúncia do contrato de trabalho, pelo que teria a Ré direito ao período de 60 dias de aviso prévio, o qual, ao não tendo sido prestado pela Autora, equivale ao direito da Ré a uma indemnização no valor de €1.160,00, o que peticionou.
A Autora veio responder à exceção e à reconvenção, pugnando, a final, pela improcedência da exceção de caducidade alegada pela Ré e pela declaração de prescrição do pedido reconvencional, devendo, o mesmo, em qualquer caso, improceder.
Para o efeito, alegou a Autora que o pedido reconvencional deduzido pela Autora foi apresentado em 20-09-2019, tendo o contrato cessado em 13-07-2018, pelo que, nos termos do art. 337.º do Código do Trabalho, tal pedido já se encontrava caducado.
Mais referiu que a infração praticada pela Ré se traduz numa infração continuada, pelo que o prazo previsto no art. 395.º do Código do Trabalho apenas se inicia quando terminar a situação ilícita, ou seja, ainda nem sequer se tinha iniciado.
Designada data para a audiência prévia, veio esta a ser realizada sem que fosse obtido acordo entre as partes.
Proferido despacho saneador em 06-07-2020, foi dispensada a fixação da base instrutória/enunciação dos temas da prova dada a simplicidade da matéria de facto e não foi admitido o pedido reconvencional nos seguintes termos:
Questão Prévia:
A R. veio no requerimento electrónico, com a ref.ª 33438976, além do mais, em sede pedido reconvencional, pugnar “Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 400.º do Código do Trabalho, tem a R., ora Reconvinte, direito a auferir da A, ora Reconvinda, o montante correspondente a 60 dias de retribuição base, isto é, € 1.160,00 (mil cento e sessenta euros) a título de aviso prévio em falta.(…) Nestes termos, a A., ora Reconvinda, deverá ser condenada no pagamento do montante total de € 1.160,00 (mil cento e sessenta euros) a título do aviso prévio em falta”.
A A., no requerimento eletrónico, com a ref.ª 33613775, além do mais, opôs-se nos seguintes termos:
- “o direito da R. à indemnização por incumprimento de aviso prévio, que deduz contra a A., em reconvenção estaria prescrito”.
Vejamos:
Da admissibilidade da reconvenção:
De acordo com o art. 30.º n.º 1 do CPTrabalho, «a reconvenção é admissível quando o pedido do réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção e no caso referido na alínea p) do art. 85.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro».
O art. 85.º do citado diploma (Lei da Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais), define a competência em matéria cível dos tribunais de trabalho, estabelecendo na sua al. p) que lhes compete conhecer das «questões reconvencionais que com a acção tenham as relações de conexão referidas na alínea anterior, salvo no caso de compensação, em que é dispensada a conexão.» Na alínea anterior – al. o) – referem-se as «questões (...) emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência.»
Em consequência, a reconvenção em processo laboral é admissível nas seguintes situações:
- quando o pedido do réu emerge de facto jurídico que serve de fundamento à acção – e não também à defesa, como consta da alínea a) do n.º 2 do art. 266.º (art.º 274.º CPC 1961) do NCPCivil;
- quando o réu se propõe obter a compensação;
- quando o pedido reconvencional está relacionado com o pedido do autor por acessoriedade, por complementaridade ou por dependência.
No que respeita a esta última hipótese, a relação de acessoriedade e a relação de dependência pressupõem que haja um pedido principal (uma relação principal). Tanto o pedido acessório como o dependente estão objectivamente subordinados a esse pedido (principal). A diferença está na intensidade do nexo de subordinação.
O pedido dependente não subsiste se desligado da relação principal.
A relação de complementaridade pressupõe que o pedido reconvencional seja um "complemento" do pedido formulado na acção. Não há subordinação, mas interligação. A discussão daquele pedido "completa", toca a relação jurídica (ou relações jurídicas) subjacente(s) à acção. Se estiverem em causa diferentes direitos de créditos - na acção e na reconvenção - é relativamente a tais relações de crédito, objectiva e subjectivamente consideradas, que se tem que aferir se existe a apontada complementaridade.
Analisando agora diretamente o caso dos autos, nota-se no que à reconvenção deduzida pela Ré respeita, sustenta que: - “Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 400.º do Código do Trabalho, tem a R., ora Reconvinte, direito a auferir da A, ora Reconvinda, o montante correspondente a 60 dias de retribuição base”.
Esta matéria é discutida nos arts. 116.º a 128.º da contestação, e fixa o pedido reconvencional no pagamento da quantia de € 1.160,00 (mil cento e sessenta euros) a título do aviso prévio em falta.
Este pedido reconvencional emerge efectivamente do facto jurídico que serviu de fundamento à acção (a rescisão da iniciativa do Autor), pelo que a sua admissibilidade não nos merece qualquer dúvida.
Subsiste, pois, a hipótese de estar em causa matéria de compensação – que é subliminarmente invocada pela Ré, nos arts. 116.º a 128 da contestação.
Ora bem.
Sendo a compensação um meio de extinção das obrigações para além do cumprimento, pressupõe sempre que ambas as partes sejam reciprocamente credor e devedor – art. 847.º n.º 1 do CCivil. De modo que a pessoa que pretenda liberar-se ou desobrigar-se pelo recurso à compensação, tem necessariamente de admitir a preexistência de um crédito por banda daquele a quem se acha juridicamente vinculado.
No caso dos autos, a Ré nega veementemente que o A. detenha sobre ela o crédito peticionado da p.i..: - “Ser a presente acção declarada improcedente por não provada, absolvendo-se a R. de todos os pedidos relativos à alegada resolução do contrato de trabalho com justa causa por parte da A.”.
Sendo assim, não pode a mesma pedir a compensação do seu eventual crédito por um contra-crédito que afirma inexistir, por assim não existir o requisito da reciprocidade, que é “conditio sine qua non” daquele instituto.
Neste sentido, vide o ac. do STJ de 10.02.83, publicado no BMJ 324, a págs. 513, onde também se diz que «o recurso à compensação, como excepção peremptória ou por via de pedido reconvencional, postula, como sucede no direito substantivo, o reconhecimento de um crédito, ao qual se opõe um contra-crédito, pelo que o reconvinte não pode pretender a compensação se nega a existência do crédito invocado pelo reconvindo.»
Neste mesmo sentido, vide ainda o Ac. da RL de 08.11.1990, com a n.º de referência RL199011080042192, relatado por Mora do Vale e disponível em www.dgsi.pt, ou ainda o Ac. da RP de 26.04.1993, publicado na CJ, tomo II, pág. 256.
Outra circunstância obsta à existência do requisito de compensação.
O art. 847.º n.º 1 al. a) do CCivil estabelece ainda que o crédito do compensante seja exigível judicialmente.
Ora, no caso dos autos, a Ré adopta uma atitude algo dúbia: por um lado, argumenta que não é devedora do crédito em discussão no processo , mas para o caso de ser condenada, pretende compensá-lo sobre a A.
Ora, também aqui inexiste o requisito da exigibilidade judicial. Não só a Ré argumenta não ser devedora desse crédito, tanto mais que o contestou (logo, como é que poderia invocar contra a trabalhadora um contra-crédito cuja existência não aceita?), como o mesmo está em discussão judicial, pelo que, até ao trânsito em julgado da decisão final, falha o requisito da sua exigibilidade judicial.
Neste sentido, cfr. o Ac. da RL de 21.10.1992, publicado no BTE, 2.ª Série, n.ºs 4-5-6/94, pág. 544.
Destarte, decido:
- não admitir o pedido reconvencional fundamentado nos arts. 116.º a 128.º da contestação, de pagamento da quantia de € 1.160,00 (mil cento e sessenta euros).
Custas do incidente pela Ré, com taxa de 1 UC’s, reduzida a metade.
Não foi interposto recurso do referido despacho.
Realizada a audiência de julgamento de acordo com as formalidades legais, foi proferida a sentença em 15-07-2022, com a seguinte decisão:
Pelos fundamentos expostos, julgo a presente ação procedente parcialmente quanto ao pedido de danos não patrimoniais pela A., e como procedentes a exceção de caducidade invocada pela R. e a reconvenção deduzida pela R.-reconvinte, e, em consequência:
a) Declaro a caducidade da resolução do contrato de trabalho por parte da A. AA;
b) Condeno a R. “EUREST (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda” no pagamento à A. AA a titulo de danos não patrimoniais a importância de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros).
c) Absolvo a R. “EUREST (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda” do restante pedido contra si deduzidos pela A. AA, declarando que, em virtude da ilicitude da resolução do contrato de trabalho por parte da A. AA, a R. “EUREST (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda” tem direito a uma indemnização da A. AA de € 1.160,00 (mil cento e sessenta euros).
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Custas, da ação e da reconvenção, a cargo de A. e R., na proporção do respetivo decaimento (Art. 527.º (art.º 466.º CPC 1961), n.os 1 e 2 do nCódigo de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no Art. 1º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho), estando a A. isenta do seu pagamento (Art. 4º, n..º 1, al. h) do Regulamento das Custas Processuais), fixando-se o valor da presente ação, nos termos do Art. 306.º (art.º 315.º CPC 1961), n.os 1 e 2 do nCódigo de Processo Civil, na soma dos valores indicado pelas partes para a ação e para a reconvenção, face ao disposto nos Arts. 296.º (art.º 305.º CPC 1961), 297.º (art.º 306.º CPC 1961), n.os 1 e 2 e 299.º (art.º 308.º CPC 1961) do nCódigo de Processo Civil.
Valor da ação:- 2.660,00 euros.
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Registe e notifique.
Não se conformando com a sentença, veio a Autora AA interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1-Com o presente recurso a Recorrente pretende:
a) Impugnar a decisão proferida na parte em que julgou improcedente a excepção de prescrição do pedido reconvencional, condenando a trabalhadora, ora Recorrente, a pagar à Recorrida a indemnização de €1.160,00 por falta de aviso prévio, pese embora, ter sido proferido despacho, transitado em julgado, que decidiu não admitir o pedido reconvencional, e a R. condenada no incidente.
b) Impugnar a decisão proferida que declarou a caducidade da resolução do contrato de trabalho com justa causa a que a trabalhadora procedeu, com as legais consequências.
c) Impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto dada como provada por confronto com a prova gravada (Art. 640º nº 1 do CPC aplicável por força do Art 1º, nº 2 do CPT) e por confronto com elementos constantes dos autos que impunham decisão diversa, uma vez que dos factos dados como provados e não provados que se pretendem impugnar, pode resultar, em caso de ser revogada a decisão na parte que decidiu a caducidade da resolução, conforme, convictamente, esperamos, que não assistiu à trabalhadora justa causa para resolver o contrato de trabalho.
d) – Impugnar a decisão proferida na parte que lhe reconheceu o direito à indemnização por danos morais no valor de €1.500,00, tendo a A. formulado o pedido de €5.000,00, que se peca, é manifestamente, por defeito.
Seguindo a mesma sequência da sentença):
As questões que aqui se colocam à douta apreciação desse Venerando Tribunal, resumem-se a saber:
a) Se se verificou a caducidade da resolução do contrato de trabalho a que a Recorrente procedeu invocando justa causa;
b) Se tendo sido decidido por despacho transitado em julgado que o pedido reconvencional não era admitido, pode o Mmo. Juíz na sentença proferida julgar procedente o pedido reconvencional e condenar a trabalhadora a pagar à entidade patronal o valor que aquela havia pedido em reconvenção.
c) A ser possível a decisão no sentido que se sintetizou na alínea anterior, julgou bem o Mmo. Juíz ao decidir pela improcedência da excepção de prescrição do pedido reconvencional invocada pela Autora, aqui Recorrente?
d) Se a matéria de Facto dada como provada que a Recorrente impugna deve ser alterada nos termos que propõe;
e) Se o valor da indemnização por danos morais arbitrada no valor de 1.500,00€ não está consentânea com os danos sofridos, devendo a Recorrida ser condenada no valor que a trabalhadora entende adequado de €5.000,00.
3 – Começando pela questão da caducidade, verificamos na carta em que comunicou a resolução (Doc. 4 junto com a p.i.), parcialmente transcrito no ponto 10 dos factos provados, a trabalhadora descreveu toda a situação que no início de Março de 2018 a levou a apresentar queixa contra uma colega que “infernizava” o seu dia a dia detrabalho, (conforme consta das alíneas a) b) e c) do ponto 10 dos factos provados), que teve como consequência logo no mês seguinte ser-lhe comunicada a transferência de local de trabalho e instaurado um processo disciplinar.
4 - Quando a empresa lhe comunicou a transferência em 30/04/2018 com efeito a 4/6/2018, apenas referiu o local de trabalho para onde era transferida, omitindo o motivo e NADA REFERINDO QUANTO A ALTERAÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO.
5 – Apenas por carta datada de 7 de Junho de 2018 a R. comunicou à trabalhadora (Doc. 8 junto com a p.i.) que se passa a transcrever:

Assunto: Transferência Unidade – AA
Exma. Sra.
Chegou ao conhecimento da Eurest que V. Exa. teria dúvidas sobre o seu horário de trabalho.
Cumpre reiterar que, como é do S/ conhecimento, V. Exa. foi transferida de local de trabalho em 4 de Junho de 2018, por manifesta falta de compatibilidade nas relações de trabalho com colegas.
Na verdade, a gravidade da referida incompatibilidade levou, inclusivamente, à abertura de um processo disciplinar o qual ainda se encontra a decorrer.
Ora, o ingresso num novo local de trabalho obriga, obviamente, ao cumprimento do horário de trabalho que esteja em vigor no respectivo estabelecimento, não sendo possível o estabelecimento de horários individualizados.
Face ao exposto, a partir do momento em que V. Exa. passou a integrar a unidade Volkswagen AutoEuropa, deverá cumprir a escala de turnos que esteja em vigor em cada momento, conforme já lhe foi expressamente referido.
Assim, alertamos V. Exa. para a necessidade de cumprimento do referido horário de trabalho sob pena da Eurest se ver forçada a tomar medidas disciplinares legalmente previstas.
6 - ESTA COMUNICAÇÃO É CRUCIAL PARA SE APURAR SE SE VERIFICOU A CADUCIDADE DO DIREITO DE RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO COM JUSTA CAUSA, A QUE A TRABALHADORA PROCEDEU, CONFORME FOI DECIDIDO.
7 - Foi com esta carta datada de 7 de Junho de 2018 que a entidade empregadora comunicou à trabalhadora, e consequentemente, com a recepção da mesma, que a A. ficou a saber, SOB AMEAÇAS DE PROCEDIMENTO DISCIPLINAR CASO NÃO CUMPRISSE, que iria cumprir o horário de turnos rotativos em vigor no local de trabalho para onde foi transferida.
8 - O Documento 8, como já se disse, é FULCRAL para analisar se a invocada caducidade do direito de resolução, julgada procedente, foi bem ou mal decidida. Claramente mal decidida, a nosso ver. Na verdade,
9 - Esta é a comunicação que a R. remeteu à A. a dar-lhe informações imprescindíveis, que lhe deveriam ter sido fornecidas, OBRIGATORIAMENTE, AQUANDO DA ORDEM DE TRANSFERÊNCIA. Só com esta informação é que a A. tomou conhecimento das circunstâncias em que a transferência se traduzia e das consequências pessoais e familiares que essa radical alteração de horário implicava.
10 - A análise que consta da douta sentença a este respeito, mormente, desde o início de fls. 43 até 45, evidencia as premissas erradas de que parte o Mmo. Juíz para concluir pela verificação da caducidade.
Na verdade, dizendo logo no 1º § de fls. 43, que se transcreve
“Ora, o comportamento da R., que a A. considerou violador do seu direito - ocorreu a partir de março de 2018, ou no dia 29 de Maio de 2018, ou nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 2018 (A A. chegou a prestar funções no referido horário das 7h00 às 15h30) [facto provado 29 a 31)] a A. teve conhecimento de todos os factos que lhe permitiam ajuizar da dimensão da lesão dos seus direitos e poderia, nos trinta dias subsequentes a esse conhecimento, exercer o respetivo direito de resolver o contrato de trabalho. (Fim de transcrição).
Como é que se utilizam estes argumentos depois de se ter dado como provado que
40) A A. recebeu todas as informações da R., em 25 de Julho de 2018 (cfr. doc. 5)
11 - Está assente que a aludida comunicação está datada de 7 de Junho e sabemos também que a carta de resolução foi datada e remetida em 12 de Julho e recebida em 13 de Julho.
12 - Desconhecemos a data em que a A. recebeu a comunicação, pelo que dispondo o nº 1 do art. 395º do CT que o trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos, sendo, a nosso ver, indiscutível, que esse prazo só se iniciaria depois da data dessa carta, sem se saber em que data a trabalhadora a recebeu, nunca poderia ter sido dada como provada a invocada caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho a que a Autora, aqui Recorrente, procedeu.
13- Citamos a este propósito o eloquente Acordão do TRP de 04-04-2022 em que foi Relatora a Distintíssima Desembargadora Paula Leal de Carvalho, proferido no proc. 3191/20.0T8MTS-A.P1 de cujo sumário transcrevemos o seguinte:
II – O prazo de 30 dias previsto no nº 1 do citado artigo 395º, consubstancia um prazo de caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador, pelo que, nessa medida e uma vez que impeditiva de tal direito, integra matéria de excepção, competindo ao empregador a alegação e prova dos factos integradores dessa excepção – art. 342º, nº 2, do Cod. Civil.
14 - Afigurando-se imprescindível para a Recorrente, como para qualquer trabalhador, ponderar que atitude tomar perante uma ordem de transferência, saber que horário ia praticar no local de trabalho para onde era transferida, o que a Recorrida só lhe comunicou por carta datada de 7 de Junho, depois da interpelação do Sindicato em que a A. é filiada, com maus modos e ameaças, e já depois da data em que lhe comunicou que se devia apresentar no local de trabalho para onde foi transferida.
15 - A existir uma data a partir da qual se conta o prazo de 30 dias previsto no art. 395º nº 1 do CT, essa data nunca poderia ser anterior a 7 de Junho de 2018, mas sempre posterior, porquanto 7 de Junho é a data da carta. Quando foi recebida? Nem sequer se sabe quando foi enviada, quanto mais recebida!!
16- Incumbia à R. provar a data em que a trabalhadora recebeu esta comunicação, o que não fez, sendo de acrescentar que, quer a ordem de transferência, quer a alteração de horário de trabalho violam o disposto no CCT aplicável, tal como a A. alegou na p.i., e desenvolveu no corpo das alegações.
17 - A doutrina dominante é a explanada no douto Acordão da Relação do Porto, que se transcreveu nas alegações, bem como o Acordão da Relação de Coimbra cujo sumário acima transcrevemos, ou o da Relação de Évora que de igual modo acima transcrevemos, que se citam como exemplo de tantos outros, pelo que ao decidir no sentido da verificação da excepção de caducidade o Tribunal violou o disposto no art. 395º nº 1 do CT
Passando à condenação da Recorrente no pedido reconvencional, diremos:
18 - A condenação da trabalhadora no pagamento da indemnização correspondente ao aviso prévio em falta no valor de €1.160,00, está errada, à luz do que foi decidido, não curando sequer analisar à luz do que se defende com o presente recurso com vista a que seja julgada improcedente a excepção de caducidade do direito de resolução a que a trabalhadora procedeu, e o reconhecimento da existência de justa causa.
19 - Nunca podia ter decidido pela condenação da trabalhadora na indemnização correspondente ao aviso prévio em falta. Desde logo porque sobre o pedido reconvencional já havia recaído despacho, transitado em julgado, que não o admitiu.
20 - Mas mesmo que o pedido reconvencional tivesse sido admitido, sempre teria de improceder por estar prescrito, uma vez que quer os créditos do trabalhador quer do empregador prescrevem no prazo de 1 ano, contado a partir do dia seguinte à cessação do contrato, a qual ocorreu no dia 13 de Julho de 2018 (Facto provado sob o nº 10) e a contestação foi apresentada em 20/09/2019, não tendo a citação o efeito interruptivo da prescrição, conforme entendimento do Mmo. Juíz explanado na sentença, entendimento errado à luz da lei, da doutrina e da jurisprudência.
21 - Na parte em que se pronunciou sobre o pedido reconvencional, condenando a Recorrente a pagar à entidade patronal o valor de €1.160,00 de aviso prévio em falta, por ter sido julgada procedente a excepção de caducidade invocada pela Recorrida, a sentença está errada porque decidiu contra decisão anterior transitada em julgado que não admitiu o pedido reconvencional e, ainda que não tivesse decidido pela não admissão do pedido reconvencional sempre tal pedido estaria prescrito por não ter sido deduzido no prazo de 1 ano contado a partir do dia seguinte à cessação do contrato, tendo sido violado o disposto nos arts. 628º do C.P.C., 337 nº 1 do C.T. e
323º nº 1 do CC.
Passando à matéria de facto impugnada por confronto com a prova gravada e também por confronto por prova constante dos autos, diremos.
22 - Não se põe em causa os factos dados como provados de 1 a 9 , 10, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 37, 39, e 40
23 - No ponto 10º consta que
Sucede que, o contrato de trabalho celebrado entre A. e R. cessou, por iniciativa da A., que, por carta datada de 12 de Julho de 2018 (Doc. 4) recebida pela R. no dia seguinte, 13 de Julho (Doc. 5), comunicou à R. a resolução do seu contrato de trabalho com invocação de justa causa, pelos motivos que, sucintamente, invocou na aludida carta (Doc. nº 4) que para todos os efeitos legais se dá como integralmente reproduzido no essencial:
24 - Passando a partir daqui a transcrever o que a A. escreveu na carta de resolução, “no essencial”, conforme diz.
25 - Do que resulta deste ponto, é que apenas foi dado como provado a parte que consta, digamos assim, do corpo deste ponto 10º, pelos vistos nada tendo resultado provado do que a A. alegou na sua p.i., onde reproduziu e desenvolveu os factos que sucintamente invocou na carta de resolução. Sendo que também não constam dos factos não provados.
26 - Estamos assim no dilema de saber se os factos invocados pela trabalhadora como justa causa de resolução resultaram provados ou não provados, porquanto a douta sentença não se pronuncia a este respeito.
27 - E assim sendo, poderemos estar perante uma situação de nulidade de sentença por omissão de pronúncia, prevista no art. 615 nº 1 d) e nº 4 do C.P.C.,
28 - ou poderemos estar perante uma situação em que V. Exas. podem suprir esta falta e por confronto com a prova gravada, considerarem provados os factos alegados na p.i., nos arts. 10º, 11º, 12º, 13º, 14º, 15º, 17º, 18º, 19º, 20º, 21º22º, 23º, que defendemos deverem ser dados como provados, por confronto com a prova gravada mais concretamente, com as Declarações de Parte prestadas pela Autora de que no corpo das alegações se indicaram excertos, mas também no depoimento integral cuja transcrição se junta em ficheiro anexo, assim como os depoimentos gravados das testemunhas EE e FF, cujos depoimentos de igual modo se transcreveram integralmente e se juntam em ficheiros anexos.
30 - FACTOS ALEGADOS NA CONTESTAÇÃO DADOS COMO PROVADOS MAS QUE DEVERIAM TER SIDO DADOS COMO NÃO PROVADOS, OU PROVADOS COM DIFERENTE REDACÇÃO, POR CONFRONTO COM OS AUTOS, E TAMBÉM POR CONFRONTO COM A PROVA GRAVADA:
31 - FACTOS PROVADOS SOB OS PONTOS 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 29, 32, 33, 34, 35, 36, 38, DEVEM SER CONSIDERADOS NÃO PROVADOS, OU PROVADOS COM DIFERENTE REDACÇÃO, pelas seguintes razões:
32 - Lendo a apreciação da prova produzida, declarações de parte da A. e depoimentos das testemunhas cuja transcrição integral se anexa, afigura-se-nos ser evidente concluir que a decisão da matéria de facto indicada, merece censura.
Na verdade, o Mmo. Juíz diz na sentença (pág- 23), o seguinte:
33 - “Atenta a síntese supra exposta, com a devida adequação redaccional e como foi vivenciada por este intérprete-aplicador, de uma maneira geral, para além das declarações de parte, depuseram as testemunhas de forma calma, serena e esclarecedora, mereceram credibilidade quanto ao segmento da realidade que conheciam e estiveram na origem dos factos dados por provados e/ou não provados, com exceção de uma parte do depoimento da testemunha DD, Inspetor de Hotelaria (Gestor de Operações), cujo teor não se mostrou compatível com a posição escrita da R. transmitida à A., em momento posterior à entrada na AutoEuropa e a qual este não podia desconhecer.”
34 - O que resulta do excerto transcrito é que o Mmo. Juíz achou todas as testemunhas credíveis, com excepção do DD pelas razões que aduziu, (apesar de depois ter dado como provado o facto que acima abordamos aquando da análise da questão da caducidade, em total contradição com a apreciação feita, constante do ponto 35 que entendemos dever ser dado como não provado) e deu como provados todos os factos alegados pela A. (com as excepções que acima abordamos) e pela R.., alguns, para além do mais, porque são ilógicos.
35 - PONTOS 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 29, 32, 33, 34, 35, 36, 38, DEVEM SER CONSIDERADOS NÃO PROVADOS, OU PROVADOS COM DIFERENTE REDACÇÃO, conforme alegado no corpo das alegações, por confronto com a prova gravada ali indicada, mas também por confronto com os autos.
36 - Resulta dos factos provados – que foram aceites e dos impugnados na redacção que se entendeu pela qual deveriam ter sido dados como provados - que a acção deveria ter sido julgada inteiramente procedente, e a R. condenada no pedido.
37 - A resolução do contrato de trabalho com justa causa a que a A. procedeu, ao abrigo do disposto no art. 395º nº 1 do C.T., não padece de caducidade, mormente, porque, pese embora a transferência de local de trabalho tenha sido comunicada à A. em Maio de 2018, a qual se efectivava em 4 de Junho, verificou-se que a R. não comunicou à A. a radical mudança de horário de trabalho, de um horário fixo das 8h00 às 17h00 para um horário por turnos rotativos incluindo horário nocturno das 00h00 às 8h00, incluindo também fins-de-semana., apenas o tendo feito por carta data de 7 de Junho, após interpelação pelo Sindicato em representação da Autora, sendo que a R. não provou em que data a A. recebeu esta comunicação.
38 - O comportamento da R. para com a A., na sequência de queixa que esta apresentou devido ao comportamento de uma colega de trabalho que a maltratava, que teve como consequências a instauração de um processo disciplinar, uma ordem de transferência de local de trabalho e a alteração do horário de trabalho de horário diurno fixo para horário por turnos rotativos ininterruptos, incluindo horário nocturno das 00h00 às 8h00, e Sábados e Domingos configuram violação culposa de deveres impostos por Lei ao empregador, mormente, o dever de respeitar e tratar o trabalhador com urbanidade e probidade (art. 127º nº 1 a), do C.T., proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral (art. 127 nº 1 c) do CT),
39º - E ainda o previsto no nº 3: O empregador deve proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da actividade profissional com a actividade familiar e pessoal, tendo violado ainda o previsto nas cláusulas 24ª e 34ª contrato colectivo aplicável, pelo que o comportamento da R., constitui violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador, o que constitui justa causa de resolução do contrato, conforme consta do nº 2 a. b) do Art. 394º do CT.
40º - Assistiu à Autora, ora Recorrente o direito de resolver o contrato de trabalho com justa causa, o que fez nos termos e ao abrigo do disposto no art. 395º nº 1 do C.T., que lhe confere o direito à indemnização prevista no nº 1 do art. 396º do C.T., a qual pelas razões que se alegou e resultaram provadas deve ser arbitrada pelo máximo legal de 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade, a qual ascende a €11.310,00 (870,00 x 13 meses), tendo por lapso, alegado no art. 40º da sua p.i. €900,00, o que está incorrecto, porquanto , auferindo a A. €580,00 por mês , 45 dias de retribuição é €870,00 e não €900,00.
41 - Mais deve ser a R. condenada no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de €5.000,00, conforme peticionado, o qual, se peca é por defeito, sendo o valor de €1.500,00 arbitrado na sentença muito desajustado aos danos morais que a recorrida sofreu decorrente do comportamento altamente censurável da Recorrida, pecando o pedido que formulou no valor de €5.000,00 por defeito.
Valor atribuído à acção
Na parte final da douta sentença o Mmo. Juíz diz que o valor da acção corresponde à soma dos valores indicados pelas partes para a acção e para a reconvenção.
Sendo o valor da acção €16.700,00 e o da reconvenção €1.160,00, a soma dos dois valores é de 17.860,00€.
O valor da acção que consta da douta sentença é de 2.660,00€, afigurando-se-nos que se trata de lapso manifesto, o que constitui um erro material que deve ser rectificado nos termos do disposto no art. 614º nº 1 ou nº 2 do CPC.
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE V. EXAS. DOUTAMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO E REVOGADA A DOUTA DECISÃO PROFERIDA, E A MESMA SUBSTITUÍDA POR ACORDÃO QUE JULGUE A ACÇÃO INTEIRAMENTE PROCEDENTE, COM AS LEGAIS CONSEQUÊNCIAS, reduzindo-se o pedido ao valor de 14.810,00 pelas razões supra alegadas
ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA
A Ré “Eurest (Portugal), Lda.” apresentou contra-alegações, com a ampliação do âmbito do recurso, terminando com as seguintes conclusões:
1. Não merece qualquer censura a decisão do Tribunal a quo, na parte objecto do presente recurso.
2. A A., ora Recorrente, invoca que existiu um lapso manifesto por parte do Tribunal a quo na determinação do valor da acção, requerendo a correcção do mesmo.
3. Sucede que, salvo melhor entendimento, o Tribunal a quo terá utilizado a prerrogativa do n.º 4 do artigo 299.º do CPC, em conjunto com o poder de fixação do valor da causa, previsto no artigo 306.º do mesmo código.
4. E determinou o valor da causa de acordo com a utilidade económica do pedido, ou seja, os créditos que efectivamente foram reconhecidos.
5. Acaso a A. não tivesse concordado com tal determinação, poderia, e deveria, ter recorrido da respectiva decisão, ao invés de alegar um suposto “lapso”.
6. De acordo com o disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, por remissão directa do artigo 79.º do CPT, é sempre admissível recurso “[d]as decisões respeitantes ao valor da causa ou dos incidentes, com o fundamento de que o seu valor excede a alçada do tribunal de que se recorre”.
7. Não tendo existido recurso do valor da causa, o valor da presente acção é o indicado na sentença, ou seja, € 2.660,00 (dois mil seiscentos e sessenta euros).
8. É notório que o valor da acção fixado pelo Tribunal a quo (€ 2.660,00) é inferior à alçada do tribunal de que se recorre (€ 5.000,00).
9. De acordo com o disposto no artigo 629.º do CPC, tem de se concluir que, não tendo a A. previamente recorrido do valor da acção fixado pelo Tribunal a quo, o presente recurso é inadmissível, não podendo ser conhecido pelo tribunal da Relação.
10. De acordo com o disposto no n.º 4 do artigo 81.º do CPT, a R. impugna a admissibilidade do presente recurso tendo em conta o valor da acção.
11. Ainda que assim não se entendesse, a decisão recorrida ter-se-ia de manter inalterada no que se refere à caducidade do direito da A. de resolver o respectivo contrato de trabalho com justa causa.
12. A A. procura confundir o tribunal “misturando” factos dados como provados pelo Tribunal a quo que não têm qualquer relação com a matéria relativa à referida caducidade.
13. A A. refere-se ao facto provado 40. “A A. recebeu todas as informações da R., em 25 de Julho de 2018 (cfr. doc. 5)”, como se o mesmo tivesse algum encadeamento com os motivos invocados para a cessação do respectivo contrato de trabalho,
14. Mas não pode ignorar que as informações recebidas pela A. em 25 de Julho de 2018, data em que o contrato de trabalho já havia cessado, são unicamente relativas ao envio pela R. do certificado de trabalho e do modelo RP 5044,
15. Os quais a A. acusava a R. de ter enviado “só mais de um mês depois” (cfr. artigo 42.º da petição inicial).
16. Não só ficou provado que é totalmente falsa a acusação da A., já que o contrato de trabalho cessou no dia 13 de Julho de 2018 e no dia 20 de Julho a R. já havia enviado os referidos elementos (cfr. doc. 5 da contestação não impugnado pela A.),
17. Como também, a A. aproveita agora tais factos para tentar perpassar a ideia que o Tribunal a quo estaria “confundido” com as datas dos factos quando tomou a sua decisão, o que é totalmente absurdo.
18. Analisando-se os factos provados 10), 12), 21), 22), 31), 32), 34), 35), 36), 37), e 38), é notório que os factos elencados pela própria A. na respectiva carta de resolução do contato de trabalho, junto como Doc. 4 da petição inicial, já haviam ocorrido há mais de 30 dias face à data de recebimento de tal comunicação por parte da R., em 13 de Julho de 2018.
19. Todas as situações elencadas pela A. já eram do conhecimento da mesma, pelo menos, desde que iniciou funções no novo local de trabalho, nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 2018, tal como confessado pela própria, não só na respectiva carta de resolução, como também nas declarações de parte que prestou.
20. Todos os factos relativos ao suposto mal-estar com a colega CC e ao novo local de trabalho e horário de trabalho, já se haviam consolidado (ou mesmo terminado), quando a A. prestou funções no novo local de trabalho nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 2018.
21. Na referida data, já a A. se encontrava num novo local de trabalho, distinto do da colega CC, não sendo, assim, possível, manter-se qualquer situação de proximidade entre ambas.
22. A A. também já conhecia o novo local de trabalho e o horário que seria praticado.
23. Refere a A. em sede de alegações que não está provada a data em que a A. terá recebido a carta da R., datada de 7 de Junho.
24. Tal facto é perfeitamente irrelevante tendo em conta, não só os restantes factos que estão provados, como, principalmente, o teor da carta de resolução da A. e as respectivas declarações de parte.
25. Ficou provado que em 29 de Maio de 2018 foram explicados à A. os horários e os procedimentos de transporte do novo local de trabalho,
26. Como também, ficou provado que nos dias em que a A. prestou funções fê-lo num dos turnos existentes na unidade, o turno da manhã, tendo-lhe sido explicado que essa seria a única forma de usufruir dos transportes gratuitos do cliente.
27. É certo que a A. recebeu uma carta da R. datada de 7 de Junho de 2018, mas a mesma apenas vem referir a necessidade da A. cumprir a escala de turnos que estivesse em vigor, por contraposição à intenção da A. de manter o horário específico que teria no anterior local de trabalho, das 8h00 às 17h00 (cfr. Docs. 7 e 8 juntos com a petição inicial).
28. Se a A., ao receber a carta de 7 de Junho de 2018, ficou, como agora alega, com dúvidas sobre tal possibilidade, a verdade é que, tal terá ocorrido provavelmente no último dia em que prestou funções, o dia 8 de Junho 2018, razão pela qual não se terá apresentado para prestar mais funções posteriormente.
29. É a própria A. que afirma na carta de resolução que “[p]or tudo o que sucintamente exponho, encontro-me de baixa por doença desde 11 de Junho de 2018, e sem condições de regressar ao trabalho, pelo decidi resolver o meu contrato de trabalho com justa causa” (cfr. Doc. 4 da petição inicial).
30. A A. é perfeitamente expressa ao afirmar que, desde 11 de Junho de 2018, não tem condições para voltar para o trabalho pelos motivos que expôs, com precisão, na respectiva comunicação de cessação do contrato de trabalho.
31. Der por onde der, pelo menos desde o dia 11 de Junho de 2018, em que a A. entrou numa situação de baixa e não voltou a prestar qualquer função para a R., que a mesma tem perfeito conhecimento, nas suas próprias palavras, das situações que a levaram a vir fazer cessar o contrato de trabalho.
32. Atente-se igualmente às declarações da A. prestadas em julgamento e transcritas pela própria no respectivo recurso de apelação, quando refere que tomou conhecimento do seu horário quando iniciou funções no novo local de trabalho e que teria sido o facto de ter entendido que iria de ter de prestar funções em vários turnos que a fez não voltar mais e apresentar baixa.
33. Segundo a própria A., esta teria recebido todas as informações relativas ao horário de trabalho, verbalmente, aquando do início das funções no novo local de trabalho, no dia 6 de Junho de 2018.
34. Em conclusão, quer tenha sido porque, entretanto, recebeu a carta de 7 de Junho de 2018 que a R. lhe havia enviado, quer tenha sido porque não lhe agradou prestar funções no novo local de trabalho nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 2018 nas condições que lhe foram referidas, certo é que no dia 11 de Junho de 2018, indubitavelmente, a A. já tinha conhecimento dos motivos que a levaram a fazer cessar o contrato através da comunicação que foi recebida pela R., apenas, no dia 13 de Julho de 2018.
35. Assim, quer se conte o prazo de caducidade desde o primeiro dia de prestação de funções pela A. no novo local de trabalho, em 6 de Junho de 2018, quer se conte do último dia de trabalho, dia 8 de Junho de 2018, ou mesmo desde o dia em que a A. diz ter chegado a uma situação limite, ou seja, o dia 11 de Junho de 2018, o mesmo decorreu, forçosamente, antes do recebimento da comunicação de despedimento por parte da R.
36. Caso o prazo se iniciasse apenas em 11 de Junho 2018, o que apenas se aceita por mera hipótese de raciocínio, o mesmo terminaria no dia 10 de Julho de 2018.
37. Mesmo nesta hipótese em que se segue a versão vertida pela própria A., a comunicação desta, datada de 12 de Julho de 2018, e recebida pela R. em 13 de Julho de 2018, foi extemporânea e não permitiu evitar a caducidade do eventual direito da A.
38. Por verificação do prazo de caducidade previsto no n.º 1 do artigo 395.º do Código do Trabalho, deverá manter-se inalterada a decisão recorrida que julgou procedente a excepção peremptória de caducidade invocada, absolvendo-se a R. de todos os pedidos relativos à alegada resolução do contrato de trabalho com justa causa por parte da A., nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 576.º do CPC, aplicável ex vi do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 1.º do CPT.
39. A A. vem recorrer igualmente da decisão do Tribunal a quo relativamente ao pedido reconvencional.
40. Contrariamente ao referido pela A., o despacho que havia indeferido o pedido reconvencional não transitou em julgado, uma vez que apenas poderia ser objecto de recurso, pela ora R., juntamente com o recurso que viesse, eventualmente, a ser interposto da decisão final do Tribunal a quo (cfr. n.º 3 do artigo 79.º-A do CPT).
41. Até ao referido momento, poderia o Tribunal a quo alterar tal decisão, de acordo com o disposto no artigo 628.º do CPC a contrario.
42. Nada impedia que o Tribunal a quo viesse, afinal, conhecer o pedido reconvencional, tendo em conta que ainda não havia conhecido do mérito do mesmo, conforme referido.
43. Assim, deverá manter-se inalterada a decisão do Tribunal a quo nos seguintes termos: “dado que não foi considerada como lícita essa resolução, apenas poderá relevar, consequentemente, como uma denúncia do contrato de trabalho sem que fosse respeitado o prazo de aviso prévio necessário para o efeito, com as consequências legalmente previstas), o qual se computa em € 1.160,00 (mil cento e sessenta euros)”.
44. Relativamente à decisão sobre a matéria de facto, tão pouco poderá proceder o recurso da A.
45. Nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 607.º do CPC e do artigo 396.º do Código Civil, os depoimentos das testemunhas estão sujeitos à livre apreciação por parte do tribunal, cabendo-lhe tirar as suas conclusões, em conformidade com as imprecisões recém-colhidas e com a convicção se foi gerando de acordo com as regras de experiência comum.
46. Acresce que, A. refere expressamente que não irá dar cumprimento ao disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 640.º do CPC, optando por transcrever os depoimentos integralmente (!).
47. Terá de ser, forçosamente, rejeitado o recurso da A., na parte em que pretendeu impugnar a decisão sobre a matéria de facto sem indicar as passagens da gravação em que se fundou o seu recurso, que se verifica tanto no que se refere aos factos que pretende aditar, mas também, e principalmente, aos factos que pretende suprimir ou alterar a redacção.
48. É patente a dificuldade em sequer compreender qual a intenção da A., principalmente no que se refere aos factos que pretende suprimir/ alterar, tal é a falta de fundamentação e indicação de prova respectiva.
49. O presente recurso apenas poderá versar sobre matéria direito, uma vez que a Recorrente se conformou, ou não impugnou devidamente, a matéria de facto, incumprindo o ónus que lhe cabia nos termos do n.º 1 e alínea b) do n.º 2 do artigo 639.º do CPC.
50. Por mera cautela, refira-se que a sentença não poderia ser alterada como pretendido pela A.
51. Não só os factos indicados pela A. não podem ser alterados por falta de prova no sentido pretendido, como também, a A. pretende dar como provadas meras conclusões ou juízos de valor, não permitidos nos termos legais.
52. Só os factos materiais são susceptíveis de prova e, como tal, podem considerar-se provados.
53. As conclusões, envolvam elas juízos valorativos ou um juízo jurídico, devem decorrer dos factos provados, não podendo elas mesmas ser objecto de prova.
54. Analisando-se o teor dos “factos” invocados pela A. é notório que muitos deles consubstanciam verdadeiras conclusões relativas ao thema decidendum que não poderiam constar dos factos provados.
55. Tal como estão alegados, por serem, repita-se, perfeitamente conclusivos ou meros juízos de valor, jamais poderiam constar da matéria de facto provada os artigos 11.º, 12.º, 13.º, 14.º, 15.º, 19.º, 21.º, 22.º, 23.º e 24.º da petição inicial.
56. Os efectivos factos relativos a tais conclusões/ juízos de valor, que ficaram provados, já se encontram incluídos na decisão sobre a matéria de facto, não carecendo de qualquer inclusão adicional (cfr factos provados 16), 17), 18), 20) e 35)).
57. Também os artigos 17.º e 18.º da petição inicial que a A. pretende que sejam dados como provados com os documentos que refere, já se encontram incluídos nos factos provados com a redacção correcta, nos pontos 21), 22), 23), 24), 31), 32), 33) e 34) da matéria de facto provada.
58. Por todos estes motivos, não se pode aceitar o pretendido aditamento à matéria de facto provada, o qual deverá ser totalmente indeferido.
59. No que se refere à pretendida supressão/ alteração de redacção dos factos dados como provados, além de não se encontrar devidamente justificada, não se vislumbrando o seu fundamento,
60. Os únicos factos que a A. procura justificar (os factos 22) e 25)), têm por base, unicamente, as declarações da própria A. (!),
61. Ignorando por completo toda a restante prova que foi feita em audiência,
62. Nomeadamente, o depoimento das testemunhas BB e GG, as quais não corroboraram as pretendidas conclusões da A.
63. Quanto aos factos provados 23), 24), 26), 27), 29), 30), 31), 32), 33), 34), 35), 36) e 38), reitere-se, não invoca a A. um único motivo para a respectiva supressão/ alteração, pelo que, também por este motivo deverá ser totalmente improcedente o recurso nesta matéria.
64. Deverá manter-se inalterada a decisão de mérito que considerou procedente a excepção de caducidade, assim como, deverá manter-se inalterada a decisão sobre a matéria de facto.
65. Caso assim não se entenda, e à cautela, deverá alterar-se/ corrigir-se a decisão sobre a matéria de facto em pequenos pontos, o que se requer por meio da ampliação do objecto do recurso, nos termos do disposto no artigo 636.º do CPC.
66. Certamente por lapso, o Tribunal a quo manteve no facto provado 15): “A R. recebeu a carta de resolução no dia 13-07-2018, mas só mais de um mês depois enviou à A. a declaração de Situação de Desemprego, que a A. havia remetido com a carta de resolução, para se poder candidatar às prestações de desemprego, e, assinalou o motivo da cessação do contrato de trabalho, pondo a cruz na “ Denúncia do contrato de trabalho/demissão” (Doc. 5).
67. Quando também deu como provado nos factos 39) e 40) que o referido envio aconteceu no dia 20 de Julho 2018, ou seja, apenas 7 (sete) dias depois.
68. Assim, é notório que o referido envio não ocorreu mais de um mês depois.
69. Deverá eliminar-se o facto 15), por ser parcialmente falso e se encontrar em contradição com os factos 39) e 40), os quais estão provados por documento não impugnado pela A.
70. Existem também factos que poderiam ser recitificados por conterem algumas imprecisões ao nível dos tempos verbais, certamente também por mero lapso de escrita aquando da passagem da matéria constante dos articulados das partes para a matéria assente.
71. Tal sucede nos tempos verbais dos factos provados 26), 31) e 38).
72. Ainda no âmbito da ampliação do objecto do recurso, mas relativamente à matéria de direito, deverá concluir-se que dos factos dados como provado pelo Tribunal a quo, não se vislumbra qualquer motivo, de facto ou de direito, que pudesse justificar a cessação do contrato de trabalho por parte da A., com invocação de justa causa.
73. A justa causa subjectiva justificativa do despedimento por parte do trabalhador implica a verificação de diversos requisitos que, neste caso, não se verificaram.
74. É necessário que se verifique um comportamento do empregador violador dos direitos ou garantias do trabalhador; que esse comportamento seja atribuído ao empregador a título de culpa; e que torne “imediata e praticamente impossível” para o trabalhador a subsistência do vínculo laboral.
75. Um conflito entre a A. e outra trabalhadora não pode, obviamente, consubstanciar justa causa de resolução imediata do contrato de trabalho, com direito à respectiva indemnização, visto que, por um lado, não se trata de um comportamento que possa ser imputado à R., e, por outro, esta tomou todas as medidas ao seu alcance para resolver a situação logo que da mesma tomou conhecimento.
76. Não se demonstra qualquer ilegalidade no procedimento disciplinar levado a cabo pela R., o qual, conforme provado, nem sequer foi impugnado pela A.
77. Tanto a alteração de local de trabalho, como a respectiva adaptação do horário, foram legais e, principalmente, não se provou que tenham causado qualquer prejuízo sério à R.
78. A ordem de transferência foi justificada e cumpriu os trâmites legais, não tendo sido apresentada qualquer oposição por parte da A., que chegou a prestar funções durante três dias no novo local de trabalho com o horário que lhe fora atribuído.
79. É notória a inexistência de justa causa para a resolução do contrato de trabalho pela A., devendo, em qualquer caso, a presente acção ser julgada improcedente por não provada e a R. ser absolvida de todos os pedidos relativos à alegada resolução do contrato de trabalho com justa causa por parte da A.
80. Finalmente, a A. veio impugnar igualmente a decisão sobre a indemnização por danos não patrimoniais que lhe foi atribuída, no montante de € 1.500,00.
81. Entende a R. que, julgando-se procedente a excepção peremptória de caducidade, e consequentemente, não existindo justa causa para a A. vir cessar o respectivo contrato de trabalho, tão pouco poderia a mesma ter direito a qualquer indemnização por danos não patrimoniais, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 396.º do Código do Trabalho, a contrario.
82. Neste contexto, a R. irá apresentar um recurso subordinado, procurando demonstrar que não deveria ter sido atribuído qualquer valor a tal título.
83. No entanto, por mera cautela, diga-se que o valor atribuído pelo Tribunal a quo jamais poderia ser considerado “modesto”.
84. A própria A. confessou na petição inicial e nas respectivas declarações de parte que “sofria graves problemas de saúde causados por um casamento passado em que foi vítima de violência doméstica (…)” (cfr. artigo 23.º da petição inicial).
85. E que tardou em fazer queixa da colega CC.
86. A ter existido algum dano provocado pela referida colega da A. anteriormente à apresentação da queixa, apenas poderá ser imputado à mencionada colega, mas também à própria A. por não ter informado a R. anteriormente.
87. Não tendo a R. violado qualquer direito da A., tão pouco teria esta direito a uma qualquer indemnização a este título.
88. Tão pouco logrou a A. demonstrar quaisquer danos dignos da tutela do direito.
89. A simples tristeza ou preocupação com a situação carecem de gravidade suficiente para merecer a tutela do direito nestes termos.
90. E a quantia peticionada de € 5.000,00 sempre se demonstraria totalmente desproporcionada tendo em conta, nomeadamente, os valores geralmente aplicados pela jurisprudência em casos semelhantes.
Termos em que deverá ser julgado totalmente improcedente o presente recurso, mantendo-se a decisão recorrida do Tribunal a quo que absolveu a R. do pedido principal da A., ora Recorrente.
A Ré “Eurest (Portugal), Lda.” veio ainda apresentar recurso subordinado, terminando com as seguintes conclusões:
1. O presente recurso é estringido à parte da sentença em que o Tribunal a quo condenou a R. “no pagamento à A. AA a título de danos não patrimoniais a importância de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros)”.
2. Entende a R., ora Recorrente, que deveriam ser aditados alguns factos ao elenco de factos provados, os quais têm interesse para a decisão da presente questão.
3. Com base nos factos alegados na petição inicial, nas declarações da própria A. e nas restantes testemunhas deverão aditar-se os seguintes factos provados:
“- A A. foi adiando a vontade de apresentar queixa contra a colega CC”;
“- A A. já sofria de problemas de saúde causados por um casamento passado em que sofreu de violência doméstica”;
“A A. apenas apresentou queixa da colega CC em Março de 2018”.
4. Acresce que, em qualquer caso, entende a R. que, julgando-se procedente a excepção peremptória de caducidade, e, consequentemente, não existindo justa causa para a A. vir cessar o respectivo contrato de trabalho, tão pouco poderia a mesma ter direito a qualquer indemnização por danos não patrimoniais, nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo 396.º do Código do Trabalho, a contrario.
5. Os danos não patrimoniais apenas poderiam, eventualmente, ser devidos no caso de se ter verificado a justa causa na cessação do contrato de trabalho por parte da A.
6. No entanto, no presente caso, não se provando qualquer facto ilícito por parte da R., tão pouco existe direito a uma qualquer indemnização, seja a que título for.
7. A decisão recorrida que condenou a R. terá, necessariamente, de ser alterada, substituindo-se por outra que absolva a R. da totalidade do pedido, dando cumprimento ao disposto no já referido artigo 396.º do Código do Trabalho, a contrario.
8. Ainda que, por mera hipótese de raciocínio, assim não se entendesse, os factos dados como provados nesta matéria, aos quais deverão ser aditados os acima referidos, não permitem qualquer condenação da R., ora Recorrida, a este título.
9. Assim que a R. tomou conhecimento dos desentendimentos entre ambas as trabalhadoras, tratou de apurar, rapidamente, o que se passava, deslocando-se ao local de trabalho, e, igualmente, tratou de as separar de imediato.
10. Está provado que o mal-estar sentido pela A. advinha da situação vivida com a referida colega CC, num período anterior à apresentação da queixa à R.
11. A ter existido algum facto ilícito, o mesmo não foi certamente da R., a qual, até à queixa da A., desconhecia a situação por completo.
12. A própria A. confessou expressamente que a situação da angústia que teria sofrido advinha, por um lado, das acções da colega CC, mas também, das lembranças de um passado de sofrimento.
13. Ficou provado que a R. não violou qualquer direito da A., não tendo sustentação legal qualquer indemnização a este título.
14. E ainda que assim não se entendesse, tão pouco logrou a A. demonstrar quaisquer danos dignos da tutela do direito, que resultassem de alguma actuação da R.
15. Assim, por tão pouco se encontrarem demonstrados os restantes requisitos legais para a condenação numa indemnização por danos não patrimoniais, a decisão recorrida que condenou a R. teria, necessariamente, de ser alterada, substituindo-se por outra que absolvesse a R. da totalidade do pedido.
Termos em que deverá ser julgado totalmente procedente o presente recurso subordinado, alterando-se a decisão recorrida do Tribunal a quo que condenou a R., ora Recorrente, e substituindo-se por outra que a absolva totalmente do pedido.
A Autora veio responder, pugnando pela improcedência quer da ampliação do recurso quer do recurso subordinado.
Por despacho proferido em 16-01-2023, o tribunal a quo reconheceu a existência de lapso manifesto quanto à fixação do valor da ação e, em consequência, determinou a retificação do valor da ação para €17.860,00.
O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso interposto pela Autora como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, bem como admitiu a ampliação do objeto do recurso e o recurso subordinado interpostos pela Ré, sendo que, quanto a este último, o admitiu nos mesmos moldes que o recurso da Autora.
Em cumprimento do disposto no art. 87.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido de que deve:
- ser dado parcial provimento ao recurso interposto pela Autora, devendo, em consequência, a sentença ser revogada e substituída por acórdão que reconheça a resolução do contrato de trabalho com justa causa, condenando a Ré no pagamento da indemnização a que alude o art. 396.º do Código do Trabalho e que absolva a Autora do pagamento à Ré da quantia de €1.160,00; e
- ser dado provimento ao recurso subordinado da Ré, devendo, em consequência, a sentença ser revogada e substituída por acórdão que absolva a Ré do pagamento à Autora da indemnização por danos morais.
Não foi apresentada resposta a tal parecer.
Foram os autos aos vistos, pelo que cumpre agora apreciar e decidir.
II – Objeto do Recurso
Nos termos dos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das partes, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso (art. 662.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
No caso em apreço, as questões que importa decidir são:[3]
Recurso da Autora
- Nulidade da sentença por omissão de pronúncia;
- Existência de caso julgado quanto ao pedido reconvencional;
- Prescrição do pedido reconvencional;
- Inexistência de caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho por justa causa;
- Impugnação da matéria de facto;
- Licitude da resolução do contrato de trabalho com justa causa;
- Insuficiente quantum indemnizatório por danos morais;
Ampliação do recurso pela Ré
- Impugnação da matéria de facto
Recurso subordinado interposto pela Ré
- Impugnação da matéria de facto; e
- Inexistência dos requisitos para a atribuição de uma indemnização à Autora por danos morais.
III – Matéria de Facto
O tribunal de 1.ª instância deu como provados os seguintes factos:
1) A A. é sócia do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul, nele beneficiando de serviços jurídicos gratuitos, sendo a sua mandatária judicial, signatária, que subscreve a presente petição inicial na qualidade de advogada do contencioso do referido sindicato (Doc. 1);
2) Sendo que o rendimento anual da A. proveniente de trabalho subordinado foi inferior à multiplicação do valor de uma unidade de conta por 200, ou seja, foi inferior a €20.400,00 (Doc. 2).
3) A A. foi admitida em 24 de Fevereiro de 2005 pela empresa SERUNION – Restaurantes de Portugal, SA, para exercer no Refeitório da Portucel as funções de Empregada de Refeitório, sob sua autoridade, direcção e fiscalização da entidade empregadora, auferindo em contrapartida uma retribuição mensal;
4) Em 16 Novembro de 2005 o local de trabalho onde exercia funções foi transmitido à empresa GERTAL – Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação, SA, passando a A. a exercer a sua actividade ao serviço desta empresa;
5) Em Julho de 2009, passou a ser a EUREST (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda., ora R., a explorar o refeitório da Portucel onde a A. trabalhava desde a data em que aí foi admitida, passando assim a exercer, no mesmo local, a actividade inerente à categoria profissional com que estava classificada, agora sob autoridade, direcção e fiscalização da R. EUREST, para quem o seu contrato de trabalho foi transmitido;
6) Em Maio de 2009, a R. transferiu a A. para o Refeitório da empresa TINTAS HEMPEL, LDA., sita na Volta da Pedra, Palmela, que passou a ser, a partir dessa data, o seu local de trabalho, tendo-lhe sido atribuído o horário de 2ª a 6ª feira com entrada às 08h00 e saída às 17h00 (Doc. 3 cujo teor se dá aqui como integralmente reproduzido);
7) Ultimamente, a A. mantinha a categoria profissional de Empregada de Refeitório e auferia de retribuição base €580.00 por mês (Doc. 3);
8) A A. é filiada no Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul (Doc. 1), exercendo a actividade profissional de Empregada de Refeitório e a R. é uma empresa que se dedica à actividade de prestação de serviços de alimentação em Refeitórios e outros, CAE 56290, e está inscrita na ARESP – Associação da Restauração e Similares de Portugal;
9) À relação laboral estabelecida entre A. e R. é aplicável o CCT Cantinas, Refeitórios e Fábricas de Refeições publicado no BTE nº 36 de 29/09/1998 e sucessivas alterações.
10) Sucede que, o contrato de trabalho celebrado entre A. e R. cessou, por iniciativa da A., que, por carta datada de 12 de Julho de 2018 (Doc. 4) recebida pela R. no dia seguinte, 13 de Julho (Doc. 5), comunicou à R. a resolução do seu contrato de trabalho com invocação de justa causa, pelos motivos que, sucintamente, invocou na aludida carta (Doc. nº 4 que para todos os efeitos legais se dá como integralmente reproduzido no essencial:
a) (1)- A A., no início de Março (de 2018) apresentou queixa contra CC, uma colega de trabalho. Na verdade,
b) (2)Por razões que nunca consegui compreender, uma vez que não a conhecia até ter sido admitida, a aludida CC começou a implicar com a A. desde os primeiros dias de trabalho, tendo mesmo comportamentos provocatórios, como por ex.: dar-lhe encontrões quando se cruzava com ela, uma das vezes, quase a fazendo perder o equilíbrio.
c) (3)A A. apresentou queixa pelos comportamentos referidos, e ainda, porque a aludida funcionária só falava aos gritos, nunca em tom de voz normal, o que tornava o dia a dia de trabalho da A. ainda muito mais penoso do que já era em condições normais. Ouvir uma pessoa permanentemente aos gritos afectava psicologicamente a A. e causava-lhe dores de cabeça permanentes.
d) (4)Fui adiando a vontade de apresentar queixa até que, no início de Novembro a CC lhe disse o seguinte: “Hás-de ficar sem trabalho. Hás-de ir para a rua, porque eu não preciso disto para sobreviver. Tens a mania que tens o rei na barriga, mas hás-de ficar sem trabalho e sem dinheiro para dar de comer aos teus filhos. Eu posso ir para a rua, mas não preciso disto para sobreviver porque vou para a reforma”.
e) (5)Hesitei bastante apresentar queixa, como já referido, porque as pessoas que a iriam receber não lhe ofereciam confiança, para além do mais pela especial relação de amizade entre a CC e a chefe no local, GG, a quem a CC dava quase diariamente presentes.
f) (6)A verdade é que, infelizmente, o receio não era infundado. De facto, No dia 23-03, deslocou-se ao local de trabalho a GO BB, falou com a Superior hierárquica da A., GG, com a A. e com a CC e o resultado foi logo no mês seguinte, a R. comunicar à A. a sua transferência para outro local de trabalho, com efeito a 4 de Junho, conforme carta datada de 30.04.2018, que lhe enviou. (…).
g) (10)A tudo o exposto acresce que a transferência me acarreta sério prejuízo uma vez que é divorciada e vive sozinha com a filha de 16 anos de idade, e cumprir um horário por turnos rotativos que inclui horário nocturno das 00h00 às 8h00, implicava que a sua filha ficava sozinha em casa durante a noite, o que constituia um grande perigo para a sua segurança.
h) (11)Acresce que sofro de graves problemas de saúde causados por um casamento passado em que foi vítima de violência doméstica, situação que ultimamente se agravou devido ao ambiente de trabalho com que foi confrontada, na sequência da admissão da CC, o que foi causa do seu médico de família a ter encaminhado para a consulta de psiquiatria, sendo que o cumprimento de horário por turnos rotativos agravaria muito o estado de saúde em que se encontrava (…);
i) (12) (…) encontro-me de baixa por doença desde 11/06/2018 e sem condições de regressar ao trabalho”, pelo que decidiu resolver o seu contrato de trabalho com justa causa.
11) Para além da transferência de local de trabalho, ainda foi instaurado um processo disciplinar, vindo-lhe a ser aplicada uma sanção de 1 dia de suspensão, decisão de que foi notificada no dia 21 de Junho de 2018.
12) Após a sua transferência de local de trabalho por carta datada de 07 de junho de 2022, “(…) deverá cumprir a escala de turnos que esteja em vigor em cada momento (…)” . (Doc. nº 8 que para todos os efeitos legais se dá como integralmente reproduzido).
13) Setenta e cinco trabalhadores da Hempel que tomavam diariamente as suas refeições no refeitório quando souberam da ordem de transferência, fizeram um abaixo-assinado, que remeteram à R. por correio registado, a pedir o regresso da A. ao Refeitório, (Doc. 10 que para todos os efeitos se dá aqui como reproduzido).
14) A chefe da Unidade Hempel da R., que trabalhava diretamente com a A., considerou-a uma excelente trabalhadora e que se podia confiar no trabalho dela.
15) A R. recebeu a carta de resolução no dia 13-07-2018, mas só mais de um mês depois enviou à A. a declaração de Situação de Desemprego, que a A. havia remetido com a carta de resolução, para se poder candidatar às prestações de desemprego, e, assinalou o motivo da cessação do contrato de trabalho, pondo a cruz na “ Denúncia do contrato de trabalho/demissão” (Doc. 5).
16) No Refeitório da empresa TINTAS HEMPEL, LDA., decorrente da relação laboral conflituosa com a Colega CC, a A. ia trabalhar com grande ansiedade, todo o dia chorava, andava enervada e chegou a ir de baixa médica;
17) Quando estava lá sentia ansiedade, humilhada e perdeu a sua identidade;
18) Em casa nem lá estava, estava com ideia no trabalho, deixou de ser mãe, dormia mal e emagreceu bastante.
19) A A. iria cumprir um horário por turnos rotativos que inclui horário nocturno das 00h00 às 8h00 (Doc. 8).
(Da Contestação):
20) A R. foi informada da existência de uma situação de mal-estar e troca de ofensas entre a A. e a trabalhadora CC, apresentada pela A.;
21) A R. promoveu, na pessoa da Gestora de Operações BB, a resolução do conflito, tendo-se esta deslocado ao local de trabalho de ambas, no dia 23 de Março de 2018, para apurar factos. Contudo,
22) Não logrou aquela trabalhadora da R. resolver o assunto, uma vez que nem a A. nem a outra trabalhadora manifestaram interesse nesse sentido.
23) Tendo-se apurado que A., durante o período normal de trabalho, discutia com a referida colega, foi-lhe posteriormente instaurado um processo disciplinar, pelo incumprimento de regras a que, legal e contratualmente, a A. se encontrava obrigada.
24) Foi igualmente instaurado um processo disciplinar à trabalhadora que mantinha o mesmo tipo de comportamento com a A.;
25) Apesar da R., ter presente diariamente uma Gerente de Unidade, apenas, limitou-se a investigar os factos que chegaram ao seu conhecimento, sancionando da mesma forma todas as trabalhadares envolvidos, e não apenas a A. (doc. 2 e doc. 3 e dão por integralmente reproduzidos).
26) De acordo com os factos dados como provados pela R., nenhuma das trabalhadoras envolvidas tenha admitido a sua culpa exclusiva.
27) Ambas assumiram proferir ofensas mútuas e estar envolvidas em desacatos durante o período de trabalho e dentro do local de trabalho (cfr. doc. 1 e doc. 2).
28) A R. deu como provado no âmbito disciplinar que:
a) “A Gestora Operacional da R., BB, teve conhecimento de uma queixa da A. à Direcção dos Recursos Humanos da Eurest, referente à trabalhadora CC,
b) Tendo sido informada de que havia uma situação de mal-estar e troca de ofensas entre as mesmas há cerca de 2 (dois) meses, que incluía ataques verbais mútuos na Unidade.
c) A referida Gestora Operacional dirigiu-se, no dia 23 de Março, à Unidade, para falar com ambas na presença da Gerente de Unidade GG.
d) A A. transmitiu-lhe que fez queixa da colega porque a mesma a ameaçou de “correr com ela e tirar-lhe o sustento dos filhos”.
e) Inquirida sobre o que terá despoletado isso, a A. respondeu que não sabia, mas que “não é santa e lhe responde à letra”.
f) Chamada a trabalhadora CC na presença de todas, a mesma disse que não provocava a A. e que apenas se defendia, uma vez que esta punha em causa o seu trabalho e fazia comentários depreciativos a seu respeito.
g) Ademais, negou as ameaças que a A. a acusava de fazer,
h) Chegando a dizer que a A. a tinha queimado no braço, exibindo uma marca.
i) A Gerente da Unidade, GG, afirmou ter conhecimento de altercações entre as duas mas apenas por que lhe foram relatadas, sem as ter presenciado.
j) A trabalhadora CC apresentou queixa da A. na Direcção de Recursos Humanos da Eurest no dia 19 de Abril de 2018, pelas já referidas razões”.
29) A R, considerou proporcional e adequada aplicar a sanção disciplinar de 1 (um) dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, a ambas as trabalhadoras envolvidas (cfr. doc. 2 e doc 3).
30) Da decisão disciplinar a A. não recorreu.
31) Na primeira missiva, de 30 de Abril de 2018, a R. se tenha limitado a referir genericamente à reorganização do anterior local de trabalho da A. (cfr. Doc. 6 da petição inicial).
32) A referida reorganização deveu-se ao facto da A. e a colega CC se terem incompatibilizado, conforme explicitado pela R. na segunda missiva de 7 de Junho de 2018. (cfr. Doc. 8 da petição inicial)
33) A mesma opção de transferência foi tomada relativamente à trabalhadora envolvida nos conflitos com a A., tendo sido também transferida para outro local de trabalho (cfr. doc. 4 e dá por integralmente reproduzido).
34) A A. teve conhecimento da ordem de transferência desde o dia 3 de Maio de 2018, tendo-lhe sido ainda esclarecido, no dia 29 de Maio de 2018, os horários de trabalho e os procedimentos de transporte.
35) A A. opôs-se à prestação de trabalho no turno da noite e ao regime de folgas rotativas instituído na nova unidade, foi-lhe esclarecido expressamente pelo Gestor de Operações, DD, que a A. poderia prestar funções no turno da manhã, das 7h00 às 15h30, com folgas aos fins de semana, até para poder usufruir do sistema de transportes que se encontra instituído.
36) A A. chegou a prestar funções no referido horário das 7h00 às 15h30, nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 2018, conforme consta do respectivo registo de ponto (cfr. doc. 1).
37) A A. apresentou uma baixa médica entre o dia 11 e 14 de junho de 2018.
38) A R., por carta de 7 de junho de 2018, voltado a insistir para a necessidade da A. cumprir o horário estabelecido na nova unidade (cfr. Doc. 8 da petição inicial),
39) A R. recebeu a carta de resolução do contrato de trabalho da A. em 13 de julho de 2018 e em 20 de julho de 2018, enviou em anexo o certificado de trabalho e o modelo RP 5044 devidamente preenchido (cfr. doc. 5).
40) A A. recebeu todas as informações da R., em 25 de Julho de 2018 (cfr. doc. 5)
41) A, ora Reconvinda, não deu o aviso prévio de 60 dias, à a R., ora Reconvinte, a qual foi citada em 15 de julho de 2019 e vindo esta a exigi-lo em 20 de setembro de 2019.
E foram dados como não provados os seguintes factos:
a) A R. tivesse a intenção de castigar a A., fazendo-a passar de vítima a culpada;
b) A discussão entre a A. e a colega CC contribuiu objetivamente, não apenas para a degradação da imagem da R. junto do respectivo cliente, como, igualmente, para a deterioração do relacionamento entre colegas da mesma unidade e da mesma empresa;
c) Afectou, ainda, inevitavelmente, a produtividade no local de trabalho.
IV – Enquadramento jurídico
Conforme supra mencionámos, o que importa analisar no presente recurso é se[4] (i) a sentença recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia; (ii) existe uma situação de caso julgado quanto ao pedido reconvencional; (iii) o pedido reconvencional se encontra prescrito; (iv) a sentença errou na apreciação da matéria de facto de acordo com os entendimentos da Autora e da Ré;[5] (v) inexiste caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho por justa causa; (vi) é lícita a resolução do contrato de trabalho com justa causa; (vii) existem requisitos para a atribuição de uma indemnização à Autora por danos morais; e (viii) o quantum indemnizatório atribuído por danos morais é insuficiente.
1 – Nulidade da sentença por omissão de pronúncia
Considera a Autora que existe nulidade da sentença por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. d) e n.º 4, do Código de Processo Civil, uma vez que não foram dados como provados ou não provados os factos por si alegados nos arts. 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 22 e 23 da petição inicial.
Dispõe o art. 615.º do Código de Processo Civil que:
1 - É nula a sentença quando:
a) Não contenha a assinatura do juiz;
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) O juiz condene em quantidade superior ou em objeto diverso do pedido.
2 - A omissão prevista na alínea a) do número anterior é suprida oficiosamente, ou a requerimento de qualquer das partes, enquanto for possível colher a assinatura do juiz que proferiu a sentença, devendo este declarar no processo a data em que apôs a assinatura.
3 - Quando a assinatura seja aposta por meios eletrónicos, não há lugar à declaração prevista no número anterior.
4 - As nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades.

Dispõe, por sua vez, o art. 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que:
2 - O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

Esta nulidade, quando se reporta a uma situação de omissão de pronúncia, ocorre quando o juiz não se pronuncia sobre todas as questões que lhe tenham sido submetidas pelas partes, excluindo aquelas cuja decisão se mostre prejudicada pela solução já dada a outras.
Porém, não se deve confundir questões com considerações, argumentos ou razões.
Conforme bem referiu Alberto dos Reis:[6]
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.

E, a ser assim, a sentença não padece de nulidade quando não aborda todos os fundamentos invocados pela parte para justificar determinada opção jurídica, desde que aprecie a questão jurídica invocada, apresentando a sua própria fundamentação.
Por outro lado, não se pode confundir omissão de pronúncia, que se terá de entender como ausência de apreciação, com deficiente ou obscura fundamentação.
Cita-se a este propósito, o acórdão do STJ, proferido em 22-01-2015:[7]
(…) a nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixa de apreciar questões que tinha de conhecer, mas já não quando, no entender do recorrente, as razões da decisão resultam pouco explicitadas ou não se conhecem de argumentos invocados.

Transcreve-se ainda o que consta da obra O Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, de António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa:[8]
4. Acresce ainda uma frequente confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação insuficiente ou divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronúncia (relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso.

Por fim, importa não confundir a não pronúncia do tribunal com o não atendimento de um facto que se mostra alegado ou o não atendimento a meios de prova apresentados ou produzidos, pois tal não atendimento não se reporta à não apreciação de uma questão, conforme a mesma se mostra definida no n.º 2 do art. 608.º do Código de Processo Civil.
Daí que o vício resultante do não atendimento de um facto que se mostra alegado reflete-se a nível de erro de julgamento, e não a nível da nulidade da sentença.
Cita-se, pela sua relevância, o acórdão do STJ, proferido em 23-03-2017:[9]
Por outro lado, o não atendimento de um facto que se encontre provado ou a consideração de algum facto que não devesse ser atendido nos termos do artigo 5.º, n.º 1 e 2, do CPC, não se traduzem em vícios de omissão ou de excesso de pronúncia, dado que tais factos não constituem, por si, uma questão a resolver nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do CPC. Reconduzem-se antes a erros de julgamento passíveis de ser superados nos termos do artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, aplicável aos acórdãos dos tribunais superiores por via dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC.
Segundo o ensinamento de Alberto dos Reis[in Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, 1981, pp. 144-146]:
«(…) quando o juiz tome conhecimento de factos de que não pode servir-se, por não terem sido, por exemplo, articulados ou alegados pelas partes (art. 664.º), não comete necessariamente a nulidade da 2.ª parte do art. 668.º. Uma coisa é tomar em consideração determinado facto, outra conhecer de questão de facto de que não podia tomar conhecimento; o facto material é um elemento para a solução da questão, mas não é a própria questão.
(…) uma coisa é o erro de julgamento, por a sentença se ter socorrido de elementos de que não podia socorrer-se, outra a nulidade de conhecer questão de que o tribunal não podia tomar conhecimento. Por a sentença tomar em consideração factos não articulados, contra o disposto no art. 664.º, não se segue, como já foi observado, que tenha conhecido de questão de facto de que lhe era vedado conhecer.»
E, por argumento de maioria de razão, o mesmo se deve entender nos casos em que o tribunal considere meios de prova de que lhe não era lícito socorrer-se ou não atenda a meios de prova apresentados ou produzidos, admissíveis necessários e pertinentes. Qualquer dessas eventualidades não se traduz em excesso ou omissão de pronúncia que impliquem a nulidade da sentença, mas, quando muito, em erro de julgamento a considerar em sede de apreciação de mérito.

Pelo exposto, a não inclusão no acervo factual pelo tribunal a quo de determinados factos alegados, a confirmar-se, não configura nulidade do despacho recorrido por omissão de pronúncia, antes sim, erro de julgamento, a apreciar posteriormente.
Assim, improcede a invocada nulidade por omissão de pronúncia.

2 – Existência de caso julgado quanto ao pedido reconvencional
Entende a Autora que, uma vez que já tinha sido proferido despacho, transitado em julgado, a não admitir o pedido reconvencional, já não era possível, em sede da sentença, vir a Autora a ser condenada nesse pedido reconvencional.
Por sua vez, considera a Ré que o despacho proferido não transitou.
Apreciemos.
Conforme despacho judicial proferido em 06-07-2020, a 1.ª instância decidiu não admitir o pedido reconvencional de pagamento da quantia de €1.160,00, condenando a Ré nas custas do incidente.
Porém, na sentença recorrida a Autora veio a ser condenada no pagamento à Ré da quantia de €1.160,00, constando na fundamentação dessa sentença que tal pedido da Ré se mostra formulado em sede de pedido reconvencional.
Importa, assim apurar se era ou não lícito ao tribunal a quo alterar, em sede de sentença, o despacho judicial que anteriormente tinha proferido, ou, dito de outro modo, se tal despacho transitou ou não em julgado.
Dispõe o art. 79.º-A, nºs. 1, al. b) e 3, do Código de Processo do Trabalho, que:
1 - Cabe recurso de apelação:
[…]
b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou a alguns dos pedidos.
[…]
3 - As restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1.

O pedido reconvencional, ao não ser admitido, leva à absolvição do Réu desse pedido que, dada a sua especificidade, é o Autor da ação. Daí que é de aplicar à não admissão do pedido reconvencional o disposto na al. b) do n.º 1 do art. 79.º-A do Código de Processo do Trabalho, e não o seu n.º 3. E, a ser assim, não sendo interposto recurso desse despacho no prazo indicado no art. 80.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho, ou seja, no prazo de 30 dias, o despacho transita.
Cita-se, a este propósito, partes do acórdão e respetivo sumário do STJ, proferido em 11-07-2019:[10] [11] [12]
«Como refere Miguel Mesquita, “a reconvenção, uma vez notificada ao autor, gera uma relação processual que se sobrepõe à relação originária”, de tal modo que “concluindo-se pela inadmissibilidade do meio, o tribunal deve absolver o autor (reconvindo) da instância reconvencional” (Reconvenção e Excepção em Processo Civil, pág. 184).
[…]
Sumário:
O despacho de rejeição da reconvenção, enquadra-se na previsão do nº 1 al. b) do art,º 644º do CPC.

Nesta conformidade, ter-se-á de concluir que decorridos 30 dias após a notificação do despacho saneador à Ré sem que esta tenha recorrido, o referido despacho em que não foi admitido o pedido reconvencional transitou, já não sendo possível, por isso, alterá-lo.
No caso em apreço, a Ré foi notificada do despacho saneador em 10-07-2020, pelo que o despacho de não admissão do pedido reconvencional transitou em 25-09-2020.
A pretensão da Autora é, por isso, de atender, visto que tendo havido previamente um despacho judicial, transitado em julgado, que decidiu no sentido da não admissão do pedido reconvencional da Ré, não era possível, posteriormente, em sede de sentença, proferida em 15-07-2022, apreciar-se tal pedido, deferindo-o.
Pelo exposto, a sentença será revogada na parte em que condenou a Autora a pagar à Ré a quantia de €1.160,00.

3 – Prescrição do pedido reconvencional
Uma vez que o pedido reconvencional não foi admitido por despacho judicial transitado em julgado, esta questão mostra-se prejudicada, razão pela qual não será apreciada nos termos do art. 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

4 – Impugnação fáctica
Questão prévia:
Nos termos do art. 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável por força do disposto no art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho, em face dos factos tidos por assentes, impõe-se alterar, oficiosamente, a versão do facto provado 5.[13]
Consta dos factos provados 5 e 6 que:
5) Em Julho de 2009, passou a ser a EUREST (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda., ora R., a explorar o refeitório da Portucel onde a A. trabalhava desde a data em que aí foi admitida, passando assim a exercer, no mesmo local, a actividade inerente à categoria profissional com que estava classificada, agora sob autoridade, direcção e fiscalização da R. EUREST, para quem o seu contrato de trabalho foi transmitido;
6) Em Maio de 2009, a R. transferiu a A. para o Refeitório da empresa TINTAS HEMPEL, LDA., sita na Volta da Pedra, Palmela, que passou a ser, a partir dessa data, o seu local de trabalho, tendo-lhe sido atribuído o horário de 2ª a 6ª feira com entrada às 08h00 e saída às 17h00 (Doc. 3 cujo teor se dá aqui como integralmente reproduzido);

Na realidade, basta atentar à leitura destes dois factos para facilmente se compreender que tendo a Autora passado a exercer funções para a Ré apenas em julho de 2009, não era possível à Ré, já em maio de 2009, quando ainda não era entidade empregadora do Autora, tê-la transferido de local de trabalho. E, a ser assim, alguma destas datas estará errada.
A Ré juntou aos autos com a contestação o documento 5, no qual consta expressamente, no Certificado de Trabalho, que a Autora trabalhou para a Ré no período compreendido entre 01-07-2009 e 13-07-2018.
Assim, a data constante do facto provado 5 não se mostra errada, devendo, porém, nele ficar a constar a data exata, pelo que o facto provado 5 passará a ter a seguinte redação:
5) Em 1 Julho de 2009, passou a ser a EUREST (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda., ora R., a explorar o refeitório da Portucel onde a A. trabalhava desde a data em que aí foi admitida, passando assim a exercer, no mesmo local, a actividade inerente à categoria profissional com que estava classificada, agora sob autoridade, direcção e fiscalização da R. EUREST, para quem o seu contrato de trabalho foi transmitido;

O lapso resultará, então, do facto provado 6. Esta questão mostra-se solucionada no documento 7 junto com a petição inicial, onde expressamente consta, na carta enviada pelo Sindicato da Autora, em representação desta, para a Ré, que:
Transporte e Horário, tendo em atenção que o horário que lhe foi atribuído e que cumpre desde Maio de 2010 é das 8h00 às 17h00.

Deste modo, é de concluir que o horário de trabalho da Autora foi alterado, não em maio de 2009, mas sim, em maio de 2010, pelo que se procederá a tal alteração, retirando, porém, de tal facto a menção ao documento 3 junto com a petição inicial, visto que tal documento se refere ao recibo de vencimento da Autora em julho de 2018, nada tendo a ver com estes factos.
Assim, o facto provado 6, passa a ter a seguinte redação:
6) Em maio de 2010, a Ré transferiu a Autora para o Refeitório da empresa TINTAS HEMPEL, LDA., sita na Volta da Pedra, Palmela, que passou a ser, a partir dessa data, o seu local de trabalho, tendo-lhe sido atribuído o horário de 2ª a 6ª feira com entrada às 08h00 e saída às 17h00.
Seguidamente, apreciar-se-ão as impugnações fácticas pretendidas quer pela Autora quer pela Ré.
A) A Autora considera que o tribunal a quo deveria ter dado como provados os factos que constam nos arts. 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 22 e 23[14] da sua petição inicial, em face do depoimento de parte da Autora, dos depoimentos das testemunhas EE e FF e dos documentos 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial. Considera igualmente que os factos provados 20, 26, 27 e 35 deveriam ser dados como não provados e que os factos provados 21, 22, 23, 24, 25, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 36 e 38 deveriam ser dados como provados com uma redação diversa; tudo em face do depoimento de parte da Autora e dos depoimentos das testemunhas EE e FF.
B) No âmbito da ampliação do objeto do recurso, a Ré entende que, caso se não entenda como procedente a exceção da caducidade e se altere a matéria de facto nos termos propostos pela Autora, deverá proceder-se à correção à matéria de facto, nos termos do art. 636.º do Código de Processo Civil, dando-se como não provado o facto provado 15, por estar em contradição com os factos provados 39 e 40, e retificando-se os tempos verbais dos factos provados 26, 31 e 38.
C) Relativamente ao recurso subordinado, pretende a Ré que sejam aditados três novos factos, com base na confissão da Autora em sede de depoimento de parte e das declarações da testemunha BB.

Dispõe o art. 640.º do Código de Processo Civil que:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.

Relativamente à interpretação das obrigações que impendem sobre as recorrentes, nos termos do n.º 1 do art. 640.º do Código de Processo Civil, cita-se, entre muitos, o acórdão do STJ, proferido em 03-03-2016:[15]
I – No recurso de apelação em que seja impugnada a decisão da matéria de facto é exigido ao Recorrente que concretize os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, especifique os concretos meios probatórios que imponham uma decisão diversa, relativamente a esses factos, e enuncie a decisão alternativa que propõe.
II – Servindo as conclusões para delimitar o objecto do recurso, devem nelas ser identificados com precisão os pontos de facto que são objecto de impugnação; quanto aos demais requisitos, basta que constem de forma explícita na motivação do recurso.
III – O ónus a cargo do Recorrente consagrado no art. 640º, do Novo CPC, não pode ser exponenciado a um nível tal que praticamente determine a reprodução, ainda que sintética, nas conclusões do recurso, de tudo quanto a esse respeito já tenha sido alegado.
IV – Nem o cumprimento desse ónus pode redundar na adopção de entendimentos formais do processo por parte dos Tribunais da Relação, e que, na prática, se traduzem na recusa de reapreciação da matéria de facto, máxime da audição dos depoimentos prestados em audiência, coarctando à parte Recorrente o direito de ver apreciada e, quiçá, modificada a decisão da matéria de facto, com a eventual alteração da subsunção jurídica.

Relativamente à apreciação da matéria de facto em sede de recurso, importa acentuar que o disposto no art. 640.º do Código de Processo Civil consagra atualmente um duplo grau de jurisdição, persistindo, porém, em vigor o princípio da livre apreciação da prova por parte do juiz da 1.ª instância, previsto no art. 607.º, n.º 5, do mesmo Diploma Legal.
No entanto, tal princípio da livre apreciação da prova mostra-se condicionado por uma “prudente convicção”, competindo, assim, ao Tribunal da Relação aferir da razoabilidade dessa convicção, em face das regras da experiência comum e da normalidade da vida, da ciência e da lógica.
Veja-se sobre esta matéria o sumário do acórdão do STJ, proferido em 31-05-2016:[16]
I - O tribunal da Relação deve exercer um verdadeiro e efectivo 2.º grau de jurisdição da matéria de facto e não um simples controlo sobre a forma como a 1.ª instância respondeu à matéria factual, limitando-se a intervir nos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão, pois que só assim se assegurará o duplo grau de jurisdição, em matéria de facto, que a reforma processual de 1995 (DL n.º 329-A/95, de 12-12) visou assegurar e que o actual Código confirmou e reforçou.
II - Desde que o recorrente cumpra as determinações ínsitas no art. 640.º, o tribunal da Relação não poderá deixar de fazer a reapreciação da matéria de facto impugnada, podendo alterar o circunstancialismo dado como assente na 1.ª instância.

Cita-se ainda o sumário do acórdão do TRG, proferido em 04-02-2016:[17]
I- Para que a decisão da 1ª instância seja alterada, haverá que averiguar se algo de “anormal” se passou na formação dessa apontada “prudente convicção”, ou seja, ter-se-á que demonstrar que na formação da convicção, retratada na resposta que se deu à factualidade controvertida, foram violadas regras que lhe deviam ter estado subjacentes, nomeadamente aferir da razoabilidade da convicção formulada pelo juiz da 1.ª instância, face às regras da experiência, da ciência e da lógica, da sua conformidade com os meios probatórios produzidos, sem prejuízo do poder conferido à Relação de formular, nesse julgamento, com inteira autonomia, uma nova convicção, com renovação do princípio da livre apreciação da prova.

E, a ser assim, o Tribunal da Relação, aquando da reapreciação da matéria de facto, deve, não só recorrer a todos os meios probatórios que estejam à sua disposição e usar de presunções judiciais para, desse modo, obter congruência entre a verdade judicial e a verdade histórica, como também, sem incorrer em excesso de pronúncia, ao alterar a decisão de determinados pontos da matéria de facto, retirar dessa alteração as consequências lógicas inevitáveis que se repercutem noutros pontos concretos da matéria de facto, independentemente de tais pontos terem ou não sido objeto de impugnação nas alegações de recurso.
Cita-se a este propósito, o sumário do acórdão do STJ, proferido em 13-01-2015:[18]
XIII - Não ocorre excesso de pronúncia da decisão, se a Relação, ao alterar a decisão da matéria de facto relativamente a alguns pontos, retira dessa modificação as consequências devidas que se repercutem noutra matéria de facto, sendo irrelevante ter sido esta ou não objecto de impugnação nas alegações de recurso.

Por fim, importa ainda esclarecer que o Tribunal da Relação, na sua reapreciação da prova, terá sempre que atender à análise crítica de toda a prova e não apenas aos fragmentos de depoimentos que, por vezes, são indicados, e que retirados do seu contexto, podem dar uma ideia bem distinta daquilo que a testemunha efetivamente mencionou, bem como daquilo que resultou da globalidade do julgamento.
Decidamos.
A) Relativamente à Autora, inexistindo dúvidas de que a mesma indicou concretamente os pontos da matéria de facto que pretendia que fossem acrescentados aos factos provados, bem como os pontos da matéria de facto que pretendia que fossem alterados e em que sentido, cumpre verificar se deu cumprimento ao disposto na al. b) do n.º 1 do art. 640.º do Código de Processo Civil, mais precisamente à exigência constante da al. a) do n.º 2 desse artigo.
Quanto aos factos 17, 18, 19 e 20 da petição inicial que a Autora pretende que sejam acrescentados à matéria de facto dada como provada, foram indicados para a sua prova os documentos 6, 7 e 8 juntos com a petição inicial, pelo que foi dado integral cumprimento ao disposto na referida al. b) do n.º 1 do art. 640.º
Relativamente aos demais factos, esclareceu a Autora, em sede de alegações de recurso, que os mesmos devem ser dados como provados pela conjugação do depoimento de parte da Autora com os depoimentos das testemunhas EE e FF, sendo que apenas indicou com exatidão alguns dos excertos que considerou relevantes em relação ao depoimento de parte da Autora, já não o fazendo relativamente às testemunhas EE e FF, optando por transcrever tais depoimentos integralmente, por entender que, “tratando-se de depoimentos curtos só a leitura (melhor ainda a audição) dos seus depoimentos traria uma noção mais clara do sentido em que se pronunciaram, perdendo força probatória a indicação de excertos”. Em face de tal fundamentação, afigura-se-nos ser de considerar integralmente cumprido o disposto no art. 640.º, n.º 1, al. b) e n.º 2, al. a), do Código de Processo Civil.
Consigna-se que se procedeu à audição integral do julgamento.

a) Arts. 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 22 e 23 da Petição inicial
Consta de tais artigos o seguinte:
10º
A A., no início de Março (de 2018) apresentou queixa contra CC, uma colega de trabalho. Na verdade,
11º
Por razões que nunca conseguiu compreender, uma vez que não a conhecia até ter sido admitida, a aludida CC começou a implicar com a A. desde os primeiros dias de trabalho, tendo mesmo comportamentos provocatórios, como por ex.: dar-lhe encontrões quando se cruzava com ela, uma das vezes, quase a fazendo perder o equilíbrio.
12º
A A. apresentou queixa pelos comportamentos referidos, e ainda, porque a aludida funcionária só falava aos gritos, nunca em tom de voz normal, o que tornava o dia a dia de trabalho da A. ainda muito mais penoso do que já era em condições normais.
13º
Ouvir uma pessoa permanentemente aos gritos afectava psicologicamente a A. e causava-lhe dores de cabeça permanentes.
14º
A A. foi adiando a vontade de apresentar queixa até que, no início de Novembro a CC lhe disse o seguinte:
“Hás-de ficar sem trabalho. Hás-de ir para a rua, porque eu não preciso disto para sobreviver. Tens a mania que tens o rei na barriga, mas hás-de ficar sem trabalho e sem dinheiro para dar de comer aos teus filhos. Eu posso ir para a rua, mas não preciso disto para sobreviver porque vou para a reforma”.
15º
A A. hesitou bastante apresentar queixa, como já referido, porque as pessoas que a iriam receber não lhe ofereciam confiança, para além do mais pela especial relação de amizade entre a CC e a chefe no local, GG, a quem a CC dava quase diariamente presentes.
17º
No dia 23-03, deslocou-se ao local de trabalho a GO BB, falou com a Superior hierárquica da A., GG, com a A. e com a CC e o resultado foi logo no mês seguinte, a R. comunicar à A. a sua transferência para outro local de trabalho, com efeito a 4 de Junho, conforme carta datada de 30.04.2018, que lhe enviou.
18º
De início, a R. ainda disfarçou o verdadeiro motivo da transferência, dizendo que era por razões técnicas de modo a alocar os trabalhadores e optimizar os meios humanos e a satisfação do cliente (Doc. 6 cujo teor integral se dá aqui como reproduzido)
19º
mas quando o Sindicato em que a A. é filiada, para além do mais, interpelou a R. por causa do problema do horário , uma vez que no local de trabalho a que estava afecta, na refeitório da empresa EMPEL, cumpria um horário fixo e o refeitório da Autoeuropa para onde era transferida, funciona ininterruptamente, tendo implementado horário por turnos, incluindo turno nocturno (Doc. 7 que para todos os efeitos se dá aqui como reproduzido), a R.,
20º
na resposta que remeteu à A., revelou o verdadeiro motivo pelo qual transferiu a A., dizendo com clareza que era transferida “por manifesta falta de compatibilidade nas relações de trabalho com colegas”, aludindo a um processo disciplinar que havia sido instaurado à A.(Doc. 8 cujo teor se dá aqui como integralmente reproduzido). De facto,
21º
Para além da transferência de local de trabalho, ainda lhe foi instaurado um processo disciplinar, vindo-lhe a ser aplicada uma sanção de 1 dia de suspensão, decisão de que foi notificada no dia 21 de Junho de 2018, que a A. considerou manifestamente injusta e atentatória dos mais básicos direitos do trabalhador, designadamente, do direito de usufruir no local de trabalho de um ambiente que não atente/agrave, contra o seu estado de saúde.
22º
A A. invocou ainda que a transferência lhe acarretava prejuízo sério, dizendo na carta de resolução, que, a tudo o exposto acrescia que a transferência lhe acarretava prejuízo sério uma vez que é divorciada e vive sozinha com a filha de 16 anos de idade, e cumprir um horário por turnos rotativos que inclui horário nocturno das 00h00 às 8h00, implicava que a sua filha ficava sozinha em casa durante a noite, o que constituía um grande perigo para a sua segurança.
23º
Alegou ainda que sofria de graves problemas de saúde causados por um casamento passado em que foi vítima de violência doméstica, situação que ultimamente se agravou devido ao ambiente de trabalho com que foi confrontada, na sequência da admissão da CC, o que foi causa do seu médico de família a ter encaminhado para a consulta de psiquiatria, sendo que o cumprimento de horário por turnos rotativos agravaria muito o estado de saúde em que se encontrava, que se agravou, devido ao ambiente que lhe foi imposto no local de trabalho (Doc. 8 cujo teor se dá aqui como reproduzido).

Em primeiro lugar, importa referir que os factos constantes dos arts. 22 e 23 da petição inicial já constam do facto provado 10, als. g) e h), uma vez que a Autora refere expressamente que “invocou ainda que que a transferência lhe acarretava prejuízo sério, dizendo na carta de resolução, que, a tudo o exposto acrescia que a transferência lhe acarretava prejuízo sério uma vez que é divorciada e vive sozinha com a filha de 16 anos de idade, e cumprir um horário por turnos rotativos que inclui horário nocturno das 00h00 às 8h00, implicava que a sua filha ficava sozinha em casa durante a noite, o que constituía um grande perigo para a sua segurança” (art. 21); e que “Alegou ainda que sofria de graves problemas de saúde causados por um casamento passado em que foi vítima de violência doméstica, situação que ultimamente se agravou devido ao ambiente de trabalho com que foi confrontada, na sequência da admissão da CC, o que foi causa do seu médico de família a ter encaminhado para a consulta de psiquiatria, sendo que o cumprimento de horário por turnos rotativos agravaria muito o estado de saúde em que se encontrava, que se agravou, devido ao ambiente que lhe foi imposto no local de trabalho” (art. 22). Ora, ao se referir apenas às alegações que efetuou e não à ocorrência, no mundo real, desses factos, não pode pretender que se apure a existência real desses factos, mas tão somente a circunstância de os ter alegado ou não.
Pelo exposto, quanto a estes factos, por já constarem da matéria dada como provada, não nos pronunciaremos.
Acresce que os factos 10, 17, 19 e 20 da petição inicial são igualmente mencionados na versão que a Autora pretende que seja dada a factos que já se mostram provados, pelo que tais matérias serão apenas apreciadas quando analisarmos tais factos.
Por fim, o facto 18 da petição inicial, para além de, na sua primeira parte, ser manifestamente conclusivo, no restante alude a factos versados no facto provado 31, cuja versão a Autora pretende alterar, pelo que tal matéria será analisada posteriormente.
Assim, apenas iremos apreciar o que consta dos factos 11, 12, 13, 14, 15 e 21 (sendo que, quanto a este último, apenas a parte referente ao que a Autora sentiu com a transferência e a instauração do processo disciplinar, já não a sanção que lhe foi aplicada, por já constar do facto provado 29) da petição inicial, visto que efetivamente os mesmos não ficaram a constar do acervo factual da sentença.
Quanto ao facto 11 da petição inicial, para além da situação dos encontrões, tudo o mais é meramente conclusivo, desconhecendo-se, em concreto, em que se traduzia a implicância da referida CC para com a Autora.
Dos factos imputados à colega CC, a testemunha EE afirmou que viu a CC a dar encontrões à Autora (desconhecendo-se em que contexto isto acontecia, tanto mais que a referida testemunha também confirmou que o espaço onde trabalhava era exíguo) e dizer-lhe que queria que a Autora fosse despedida. Mais referiu esta testemunha que a CC estava sempre aos gritos. Por sua vez, a testemunha FF esclareceu que a CC gritava muito e que viu, uma vez, a CC dar um empurrão à Autora, ao mesmo tempo que gritava para que a Autora saísse da sua frente. Mais referiu que ouviu a AA a responder à CC, o que gerava discussão.
Mais nenhuma testemunha assistiu a estes factos e as versões apresentadas pelas referidas testemunhas mereceram a credibilidade do tribunal a quo,[19] não tendo o tribunal ad quem, na sua audição, ficado com convicção diversa.
Deste modo, entende-se dar como provado os factos 42 e 43, com a seguinte redação:
42) A colega CC falava, frequentemente, aos berros.
43) A colega CC deu, uma vez, um empurrão à Autora para que ela lhe saísse da frente e disse-lhe, uma vez, que queria que ela fosse despedida, existindo entre ambas, por vezes, discussões.

Em face do depoimento de parte da Autora, bem como dos depoimentos das testemunhas EE e FF, resulta que este mal-estar sentido pela Autora em relação à colega CC durou algum tempo, sendo que a referida CC tinha uma especial proximidade para com a gerente HH, a quem, às vezes, dava prendas. Atente-se que ambas as testemunhas referem ter visto a referida CC, muitas vezes, a falar com a gerente, no gabinete desta e a sair com ela às compras, bem como a lhe dar presentes, ainda que a testemunha HH apenas tenha confirmado ter recebido uma planta. A versão das testemunhas EE e FF afigura-se-nos, nesta parte, efetivamente mais credível, uma vez que o depoimento da testemunha HH, gerente daquela unidade, que se encontrava diariamente no local, revelou-se manifestamente menos autêntico, sobretudo quando referiu, mesmo após insistências, que não se recordava quem tinha, em primeiro lugar, apresentado queixa, se a Autora se a trabalhadora CC. Ora, sendo tal acontecimento – o da apresentação da queixa – um facto seguramente extraordinário, de tal forma que levou ao local a testemunha BB, na qualidade de inspetora daquela unidade, tendo a referida HH acompanhando todas as diligências realizadas pela testemunha BB, afigura-se-nos muito pouco credível que a gerente do local não consiga recorda-se quem despoletou tal situação.
Deste modo, dar-se-á como provado o facto 44, com a seguinte redação:
44) A Autora hesitou em apresentar queixa durante algum tempo contra a colega CC, dada a especial relação de proximidade que esta tinha com a gerente HH, a quem, às vezes, dava prendas.

A Autora afirmou que a transferência do local de trabalho e o processo disciplinar que lhe foi instaurado causou-lhe sentimentos de injustiça e de desrespeito, uma vez que, apesar de ter trabalhado tantos anos para a Ré e de se ter dedicado profundamente ao seu trabalho, não se sentiu protegida quando solicitou a proteção da Ré.
A circunstância de a Autora já trabalhar há bastantes anos para a Ré resulta do facto provado 5[20] e de ser uma excelente trabalhadora do facto provado 14. Acresce que, após estes factos, a Autora ficou de baixa médica e a testemunha EE, que a viu, nessa altura, confirmou o seu estado de prostração e de tristeza.
Assim, dar-se-á como provado o facto 45, com a seguinte redação:
45) Com a transferência do local de trabalho, o processo disciplinar que lhe foi instaurado e a sanção que lhe foi aplicada, a Autora sentiu-se injustiçada pela Ré.

b) Factos provados 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36 e 38
Consta de tais factos que:
20) A R. foi informada da existência de uma situação de mal-estar e troca de ofensas entre a A. e a trabalhadora CC, apresentada pela A.;
21) A R. promoveu, na pessoa da Gestora de Operações BB, a resolução do conflito, tendo-se esta deslocado ao local de trabalho de ambas, no dia 23 de Março de 2018, para apurar factos. Contudo,
22) Não logrou aquela trabalhadora da R. resolver o assunto, uma vez que nem a A. nem a outra trabalhadora manifestaram interesse nesse sentido.
23) Tendo-se apurado que A., durante o período normal de trabalho, discutia com a referida colega, foi-lhe posteriormente instaurado um processo disciplinar, pelo incumprimento de regras a que, legal e contratualmente, a A. se encontrava obrigada.
24) Foi igualmente instaurado um processo disciplinar à trabalhadora que mantinha o mesmo tipo de comportamento com a A.;
25) Apesar da R., ter presente diariamente uma Gerente de Unidade, apenas, limitou-se a investigar os factos que chegaram ao seu conhecimento, sancionando da mesma forma todas as trabalhadares envolvidos, e não apenas a A. (doc. 2 e doc. 3 e dão por integralmente reproduzidos).
26) De acordo com os factos dados como provados pela R., nenhuma das trabalhadoras envolvidas tenha admitido a sua culpa exclusiva.
27) Ambas assumiram proferir ofensas mútuas e estar envolvidas em desacatos durante o período de trabalho e dentro do local de trabalho (cfr. doc. 1 e doc. 2).
29) A R, considerou proporcional e adequada aplicar a sanção disciplinar de 1 (um) dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, a ambas as trabalhadoras envolvidas (cfr. doc. 2 e doc 3).
30) Da decisão disciplinar a A. não recorreu.
31) Na primeira missiva, de 30 de Abril de 2018, a R. se tenha limitado a referir genericamente à reorganização do anterior local de trabalho da A. (cfr. Doc. 6 da petição inicial).
32) A referida reorganização deveu-se ao facto da A. e a colega CC se terem incompatibilizado, conforme explicitado pela R. na segunda missiva de 7 de Junho de 2018. (cfr. Doc. 8 da petição inicial)
33) A mesma opção de transferência foi tomada relativamente à trabalhadora envolvida nos conflitos com a A., tendo sido também transferida para outro local de trabalho (cfr. doc. 4 e dá por integralmente reproduzido).
34) A A. teve conhecimento da ordem de transferência desde o dia 3 de Maio de 2018, tendo-lhe sido ainda esclarecido, no dia 29 de Maio de 2018, os horários de trabalho e os procedimentos de transporte.
35) A A. opôs-se à prestação de trabalho no turno da noite e ao regime de folgas rotativas instituído na nova unidade, foi-lhe esclarecido expressamente pelo Gestor de Operações, DD, que a A. poderia prestar funções no turno da manhã, das 7h00 às 15h30, com folgas aos fins de semana, até para poder usufruir do sistema de transportes que se encontra instituído.
36) A A. chegou a prestar funções no referido horário das 7h00 às 15h30, nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 2018, conforme consta do respectivo registo de ponto (cfr. doc. 1).
38) A R., por carta de 7 de junho de 2018, voltado a insistir para a necessidade da A. cumprir o horário estabelecido na nova unidade (cfr. Doc. 8 da petição inicial),

Pretende a Autora que os factos 20, 26, 27 e 35 sejam dados como não provados, o primeiro por ser, em si mesmo, contraditório e os restantes em face dos depoimentos das testemunhas EE e FF.
Quanto aos restantes factos, deverão os mesmos ser dados como provados com as seguintes redações:
21) Na sequência da queixa da A., no dia 23 de Março de 2018 deslocou-se ao local de trabalho da A. a Gestora de Operações BB, para apurar os factos.
22) Não logrou aquela trabalhadora resolver o assunto, porquanto aventou que a CC devia ser transferida ao que se opôs a Gerente da Unidade GG, unida por relação de amizade com a CC, dizendo que então eram transferidas as duas.
23) A R. instaurou um processo disciplinar à A.
24) A R. instaurou um processo disciplinar à CC.
25) A A Gerente da Unidade GG tinha conhecimento das queixas da A. que por diversas vezes lhas transmitiu.
29) A R. aplicou a sanção disciplinar de 1 dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade, à A. e à CC.
30) A A. não recorreu da decisão disciplinar, não constando da decisão disciplinar a data em que a decisão devia ser cumprida.
31) A R. invocou como motivo da transferência, razões técnicas de modo a alocar os trabalhadores e optimizar os meios humanos e a satisfação do cliente (Doc. 6)
32) Na sequência de interpelação do Sindicato, a R. por carta de 7 de Junho de 2018, remetida à A. alegou que a causa da transferência foi “por manifesta falta de compatibilidade nas relações de trabalho com colegas”, aludindo a um processo disciplinar que havia sido instaurado à A. (Doc. 8 junto com a p.i.).
33) A trabalhadora CC foi transferida de local de trabalho.
34) A A. teve conhecimento da ordem de transferência no dia 3 de maio.
36) A A. trabalhou no turno que estava em vigor naquela semana, das 7h00 às 15h30, nos dias 6, 7, e 8 de Junho de 2018, conforme consta do registo de ponto (cfr. doc. 1)
38) Por carta datada de 7 de Junho de 2018 a R. comunicou que o ingresso num novo local de trabalho obriga, ao cumprimento do horário de trabalho que esteja em vigor no respectivo estabelecimento, não sendo possível o estabelecimento de horários individualizados, e que a partir do momento que passou a integrar a unidade Volkswagen AutoEuropa, deveria cumprir a escala de turno que esteja em vigor em cada momento.

Os factos 21, 23, 24, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 36 e 38 em face dos depoimentos das testemunhas EE e FF e os factos 22 e 25 também pelo depoimento de parte da Autora.
Apreciemos.
Quanto aos factos provados 20, 21 e 22:
Os mesmos reportam-se à apresentação da queixa pela Autora e ao comportamento adotado pela Ré após tal apresentação, pelo que tem igualmente a ver com o facto 10 da petição inicial.
O facto provado 20 efetivamente não faz sentido, uma vez que é pouco provável que alguém tenha ido apresentar queixa contra uma colega referindo que existe um mal-estar entre si e a colega e uma troca de ofensas entre ambas, sendo certo que também não é isso o que a Autora menciona e nem o referem as testemunhas EE e FF. Mas o depoimento mais relevante é o da testemunha BB, que, na qualidade de gestora operacional da Ré e de inspetora da unidade, foi quem, em nome da Ré, procurar apurar os factos que constavam da queixa apresentada pela Autora, tendo, em sede de julgamento, referido expressamente que a Autora apresentou queixa contra a colega CC por bullying e que, ao se dirigir à unidade, se apercebeu que existia um clima de altercação entre as duas, pelo que, não tendo conseguido compreender de quem era a culpa, abriu um processo disciplinar às duas e promoveu a transferência das duas daquele local de trabalho, sendo que a sanção aplicada a ambas foi a mesma.
Quanto à data da apresentação da queixa pela Autora, ainda que não se saiba com exatidão tal data, apurou-se que a mesma foi apresentada em março de 2018 em data anterior a 23-03-2018, visto ter sido esta a data em que a inspetora BB se deslocou à unidade para tentar se aperceber do que é que se passava.
O facto provado 21 é de manter ainda que retirando-se o “Contudo” e o facto 22 deve ser dado como provado apenas que “Não logrou aquela trabalhadora da Ré resolver o assunto”, uma vez que não se tendo apurado, com rigor, o que se passava naquela unidade, também não é possível concluir que nenhuma daquelas duas trabalhadoras “manifestaram interesse” em resolver o conflito. A versão pretendida pela Autora para o facto 22 apenas se mostra confirmada por ela, sendo totalmente contraditada pela testemunha BB, sendo que esta testemunha mereceu inteira credibilidade.
Dir-se-á, por fim, que tudo aquilo que consta do art. 17 da petição inicial, e que ainda não consta do facto provado 21, é uma conclusão, pelo que não será acrescentado ao facto provado 21.
Assim, os factos provados 20, 21 e 22 passarão a ter a seguinte redação:
20) Em data não concretamente apurada do mês de março de 2018, mas anterior ao dia 23, a Autora apresentou queixa junto da Ré contra a colega CC, por, no seu entender, esta implicar consigo e ter para consigo comportamentos provocatórios.
21) A Ré promoveu, na pessoa da Gestora de Operações, BB, a resolução do conflito, tendo-se esta deslocado ao local de trabalho de ambas, no dia 23 de março de 2018, para apurar factos.
22) Contudo, não logrou aquela trabalhadora da Ré resolver o assunto.

Relativamente aos factos provados 23 e 24, parece dos mesmos fluir que, no âmbito deste processo, se apurou que Autora, durante o período normal de trabalho, discutia com a referida colega CC e que esta discutia com aquela. Na realidade, sobre esse assunto apurou-se, neste processo, o que consta dos novos factos 42 e 43, o que não coincide na íntegra com o que se apurou no processo disciplinar. Acresce que a última parte do facto 23 é de natureza jurídica, pelo que deverá ser eliminada. Assim, deverá ficar a constar destes factos que:
23) Por na investigação a que procedeu ter considerado que a Autora, durante o período normal de trabalho, discutia com a colega CC, a Ré instaurou-lhe o processo disciplinar mencionado no facto provado 11.
24) Tendo sido pelos mesmos motivos, instaurado um processo disciplinar à trabalhadora CC.

Relativamente aos factos provados 25, 26, 27 e 29:
O facto provado 25, na realidade, não se compreende, sendo a versão apresentada pela Autora, mais esclarecedora e confirmada pela própria testemunha HH, pelo que será dada como provada.
Na sentença recorrida consta do facto provado 28 os factos que a Ré deu como provados no âmbito do processo disciplinar que instaurou à Autora, bem como consta do facto provado 11 a sanção que a Ré aplicou à Autora no âmbito desse processo, pelo que não se compreende os comentários que o tribunal a quo fez consignar como se tratando de factos, quer sobre os alegados factos dados como provados no âmbito do processo disciplinar, quer sobre a sanção aplicada, nos factos provados 26, 27 e 29. Neste último facto, apenas releva que à trabalhadora CC foi aplicada a sanção disciplinar de um dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade,[21] sendo que a suspensão de um dia do trabalho aplicada à Autora também o foi com perda de retribuição e de antiguidade.
Nesta conformidade, determina-se a alteração dos factos 11, 25 e 29 e a eliminação dos factos provados 26 e 27.
Os factos 11, 25 e 29 passarão a ter a seguinte redação:
11) Para além da transferência de local de trabalho, ainda lhe foi instaurado um processo disciplinar, vindo-lhe a ser aplicada uma sanção de 1 (um) dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, decisão de que foi notificada no dia 21 de junho de 2018.
25) A A Gerente da Unidade GG tinha conhecimento das queixas da A. que por diversas vezes lhas transmitiu.
29) A Ré aplicou à trabalhadora CC a sanção disciplinar de 1 (um) dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade.

A alteração que a Autora pretende que venha a ser efetuada no facto provado 30 não possui qualquer influência nos presentes autos, pelo que se manterá tal facto nos seus precisos termos.
Quanto aos factos provados 31 e 32, os mesmos, em vez de reproduzirem os documentos a que se reportam, na parte que aqui releva, ou seja, a parte relevante dos documentos 6 e 8 juntos com a petição inicial, tecem comentários e conclusões sobre tais documentos, pelo que não é possível dar o teor desses factos como provado.
Assim, atentos os documentos 6 e 8 juntos com a petição inicial, os factos provados 31[22] e 32[23] passarão a ter a seguinte redação:
31) Em carta datada de 30-04-2018, a Ré comunicou à Autora que:
Na sequência da reorganização do serviço das TINTAS HEMPEL, foi necessário analisar as competências técnicas dos diversos colaboradores, de modo a alocar os trabalhadores e otimizar os meios humanos e a satisfação do cliente.
Neste sentido, consideramos que V. Exa. Reúne as competências técnicas e a categoria profissional adequada para integrar, a partir do dia 04 de junho de 2018, a equipa da VOLKSWAGEN AUTOEUROPA, sita Quinta da Marquesa – Quinta do Anjo – 2954-024 QUINTA DO ANJO.
Certos de que este novo desafio contribuirá para o seu desenvolvimento, e satisfação pessoais e profissionais, fazemos votos de sucesso.
32) Por carta datada de 07-06-2018, a Ré deu conhecimento à Autora que:
Cumpre reiterar que, como é do S/ conhecimento, V. Exa. foi transferida de local de trabalho em 4 de Junho de 2018, por manifesta falta de compatibilidade nas relações de trabalho com colegas.
Na verdade, a gravidade da referida incompatibilidade levou, inclusivamente, à abertura de um processo disciplinar, o qual ainda se encontra a decorrer.

Quanto ao facto provado 33, de forma a ficar mais claro, e em face do teor do documento 4 junto com a contestação, altera-se a sua versão nos seguintes termos:
33) Também a trabalhadora CC foi transferida de local de trabalho.

Quanto ao facto provado 34, importa mencionar que, se relativamente à receção pela Autora da carta mencionada no facto provado 31 em 03-05-2018, a Autora conforma-se com o mesmo; tal já não ocorre relativamente à segunda parte desse facto, a saber, que a Autora teve conhecimento no dia 29-05-2018, por parte da Ré, dos horários de trabalho e dos procedimentos de transporte.
Importa referir que sobre este segundo aspeto não existe qualquer documento a permitir tal prova.
Vejamos, então, a prova testemunhal.
A testemunha BB referiu que lhe comunicaram que alguém da Autoeuropa ligou à testemunha HH para lhe darem a conhecer as indicações dos horários dos transportes, para que esta os transmitisse à Autora. Porém, ouvida a testemunha HH, esta afirmou perentoriamente que nunca falou com a Autora sobre os novos horários e sobre os respetivos transportes, referindo que apenas a testemunha DD o poderia fazer. Inquirida esta testemunha, a mesma refere, sem conseguir concretizar datas, que, no primeiro dia em que falou com a Autora, que admite ter sido no primeiro dia de trabalho, lhe disse que ela tinha de fazer os horários por turnos e inclusive aos sábados e domingos, tendo esta, de forma exaltada, referido que não faria os turnos noturnos nem aos fins de semana, por ser mãe sozinha e ter uma menor a seu cargo. Mais referiu que, após a Autor ter saído, contactou os serviços dos recursos humanos da Ré que lhe disseram para que concedesse à Autora o horário que ela queria, pelo que, em data que não consegue precisar, mas que admite que possa ter sido num dos dias em que a Autora efetivamente esteve naquele local ao serviço da Ré, e em que se fez acompanhar por uma delegada sindical, transmitiu à Autora que ela podia fazer o horário das 7h00 às 15h30, horário esse para o qual ela teria transporte gratuito ou o horário que já tinha das 08h00 ás 17h00, ficando os transportes a seu encargo.
Por fim, a Autora referiu expressamente que não lhe indicaram os horários de trabalho nem os meios de transporte, razão pela qual, através do seu sindicato, foi remetida à Ré, por carta datada de 29-05-2018, que a mesma indicasse à Autora esses elementos. Mais referiu que, quando se deslocou ao local de trabalho e falou com a testemunha DD, esta lhe disse que teria de trabalhar por turnos, inclusive durante a noite e ao fim-de-semana, tendo a Autora se oposto a tal horário, por viver sozinha com os filhos e ter uma menor a seu cargo. Mais referiu que se deslocou uma segunda vez ao local de trabalho, tendo-lhe sido atribuído o turno da manhã, das 07h00 às 15h00, mas apenas a título provisório, e até que a Ré tomasse uma decisão definitiva e lhe a comunicasse. Referiu ainda que trabalhou durante três dias nesse horário e depois, devido ao seu estado de saúde, meteu baixa médica.
Deste modo, mesmo sem recurso ao depoimento de parte da Autora, inexiste qualquer prova que permita dar como provada a segunda parte do facto 34, sendo que o documento 7 junto com a petição (a carta do sindicato da Autora para a Ré) permite inclusive concluir o contrário.
Assim, o facto provado 34 passará a ter a seguinte redação:
34) A A. teve conhecimento da ordem de transferência desde o dia 3 de Maio de 2018.

Quanto ao facto provado 35, que vem na sequência do facto 34, não se compreende como foi possível ao juiz da 1.ª instância o ter dado como provado.
Para além de ter feito constar no facto provado 19 que a Autora iria cumprir um horário por turnos rotativos, que inclui horário noturno das 00h00 às 08h00, fazendo menção ao documento 8 junto com a petição inicial, consta igualmente desse documento, não impugnado, que a Ré comunicou à Autora, por carta datada de 07-06-2018, que:
Ora, o ingresso num novo local de trabalho obriga, obviamente, ao cumprimento do horário de trabalho que esteja em vigor no respectivo estabelecimento, não sendo possível o estabelecimento de horários individualizados.
Face ao exposto, a partir do momento em que V. Exa. passou a integrar a unidade Volkswagen AutoEuropa, deverá cumprir a escala de turnos que esteja em vigor em cada momento, conforme lhe foi expressamente referido.
Assim, alertamos V. Exa. para a necessidade de cumprimento do referido horário de trabalho sob pena da Eurest se ver forçada a tomar as medidas disciplinares legalmente previstas.

Essa foi a razão pela qual, em sede de apreciação da credibilidade do depoimento das testemunhas, o juiz da 1.ª instância não considerou a testemunha DD nos seguintes termos que se reproduzem:
Depuseram as testemunhas de forma calma, serena e esclarecedora, mereceram credibilidade quanto ao segmento da realidade que conheciam e estiveram na origem dos factos dados por provados e/ou não provados, com exceção de uma parte do depoimento da testemunha DD, Inspetor de Hotelaria (Gestor de Operações), cujo teor não se mostrou compatível com a posição escrita da R. transmitida à A., em momento posterior à entrada na AutoEuropa e a qual este não podia desconhecer.

Porém, pasme-se, mesmo não acreditando, e bem, na veracidade do depoimento da testemunha DD, quanto aos horários, visto ser o referido documento 8 a carta mencionada, escrita pela Ré à Autora após o iniciou da prestação de trabalho desta na AutoEuropa, foi dado esse facto, contraditório com tal carta, como provado.
Na realidade, mesmo que o facto 35 não tivesse sido impugnado, sempre teria, uma parte do mesmo, de ser eliminado, por manifesta contradição com o facto provado 19 e por o depoimento da testemunha DD, nessa parte, não merecer qualquer credibilidade, sendo credível, sim, em face da carta junto como documento 8 da petição inicial, a versão da Autora, segundo a qual, por especial favor e enquanto a Ré não comunicasse por escrito os horários à Autora, esta poderia fazer o horário do turno da manhã.
Assim, o facto provado 35 passa a ter a seguinte redação:
35) A Autora, quando lhe comunicaram, no dia do início da sua prestação de trabalho na AutoEuropa, o horário mencionado no facto provado 19, opôs-se à prestação de trabalho no turno da noite e ao regime de folgas rotativas instituído na nova unidade, pelo que, temporariamente, e até que a Ré tomasse uma decisão definitiva sobre a questão, foi-lhe autorizado prestar funções no turno da manhã, das 7h00 às 15h30, com folgas aos fins de semana.

Quanto ao facto provado 36, o mesmo corresponde ao que resultou provado e a explicação para esse facto já se mostra vertida na atual redação do facto 35, pelo que nada mais há a acrescentar.
Por fim, quanto ao facto provado 38, para além de também o mesmo, por se reportar ao documento 8 junto com a petição inicial, se encontrar em contradição com a anterior versão do facto provado 35, sempre se dirá que importa, para melhor compreensão da situação, fazer constar dos factos provados, não só a interpelação efetuada pelo Sindicato da Autora à Ré, e que consta da petição inicial, no seu art. 19, a qual está comprovada pelo documento 7 junto com a petição inicial,[24] como também parte do referido documento 8.
É verdade que o art. 19 da petição inicial se mostra impugnado pela Ré na sua contestação, porém, não só não impugnou o documento 7 junto com tal articulado, como este facto foi comprovado pela Autora, tendo, inclusive, a testemunha da Ré, DD, confirmado o acompanhamento da Autora pelo seu Sindicato, pelo que se dará tal facto como provado.
Acontece que a primeira menção ao documento 8 junto com a petição inicial consta do facto provado 12, que se mostra incompleto, não referindo quem comunicou o quê a quem. Entende-se, por isso, que se deverá, de molde a evitar repetições, fazer menção no facto 12, e não no facto 38, mas agora de forma completa, ao que consta do referido documento, bem como ao que consta do documento 7 junto com a petição inicial.
Deste modo, o facto provado 38 será eliminado e o facto provado 12, desdobrar-se em dois, no facto provado 12 e no facto provado 12-A.
Assim, os factos provados 12 e 12-A passarão a ter a seguinte redação:
12) Por carta datada de 29-05-2018, o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul, em representação da Autora, solicitou à Ré, uma vez que “até à data, quase na véspera de ter de se apresentar no novo local de trabalho, a trabalhadora não recebeu mais nenhuma comunicação da empresa, e a comunicação remetida omite em absoluto as informações indispensáveis à efectivação da transferência, designadamente no que se reporta a: Transporte e Horário, tendo em atenção que o horário que lhe foi atribuído e que cumpre desde Maio de 2010 é das 8h00 às 17h00”, que tais indicações fossem comunicadas à Autora.
12-A) Em resposta, a Ré, por carta datada de 07-06-2018, sobre a questão do horário de trabalho da Autora no novo local de trabalho, consignou que:
Ora, o ingresso num novo local de trabalho obriga, obviamente, ao cumprimento do horário de trabalho que esteja em vigor no respectivo estabelecimento, não sendo possível o estabelecimento de horários individualizados.
Face ao exposto, a partir do momento em que V. Exa. passou a integrar a unidade Volkswagen AutoEuropa, deverá cumprir a escala de turnos que esteja em vigor em cada momento, conforme lhe foi expressamente referido.
Assim, alertamos V. Exa. para a necessidade de cumprimento do referido horário de trabalho sob pena da Eurest se ver forçada a tomar as medidas disciplinares legalmente previstas.

Em conclusão, procede parcialmente a pretensão da Autora na impugnação fáctica requerida e em consequência acrescentam-se os factos provados 12-A, 42, 43, 44 e 45; eliminam-se os factos provados 26, 27 e 38 e alteram-se as versões dos factos provados 11, 12, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 29, 31, 32, 33, 34 e 35.

B) Relativamente à Ré, no âmbito da ampliação do objeto do recurso, uma vez que procedeu parcialmente a pretensão de alteração da matéria de facto proposta pela Autora, iremos igualmente apreciar a impugnação fáctica proposta pela Ré neste âmbito.
Pretende a Ré que se dê como não provado o facto provado 15, por estar em contradição com os factos provados 39 e 40, e que se retifique os tempos verbais dos factos provados 26, 31 e 38.
Consta dos factos provados 15, 39 e 40 que:
15) A R. recebeu a carta de resolução no dia 13-07-2018, mas só mais de um mês depois enviou à A. a declaração de Situação de Desemprego, que a A. havia remetido com a carta de resolução, para se poder candidatar às prestações de desemprego, e, assinalou o motivo da cessação do contrato de trabalho, pondo a cruz na “ Denúncia do contrato de trabalho/demissão” (Doc. 5).
39) A R. recebeu a carta de resolução do contrato de trabalho da A. em 13 de julho de 2018 e em 20 de julho de 2018, enviou em anexo o certificado de trabalho e o modelo RP 5044 devidamente preenchido (cfr. doc. 5).
40) A A. recebeu todas as informações da R., em 25 de Julho de 2018 (cfr. doc. 5)

Como facilmente se constata, uma vez mais temos três factos assentes no mesmo documento – o documento 5 junto com a contestação – e que, efetivamente, entre eles, dão como provados factos contraditórios.
Em face do documento 5 junto com a contestação, constatou-se que a Ré enviou à Autora o modelo RP 5044 devidamente preenchido (que é a declaração de Situação de Desemprego), em 20-07-2018, recebido pela Autora em 25-07-2018, onde fez constar que a cessação do contrato de trabalho ocorrera por iniciativa do trabalhador por denúncia do contrato de trabalho/demissão.
Assim, eliminar-se-ão os factos provados 39 e 40, alterando-se o facto provado 15 de forma a que fique a constar desse facto o que constava dos factos provados 39 e 40.
Assim, o facto provado 15 passará a ter a seguinte redação:
15) A R. recebeu a carta de resolução no dia 13-07-2018, e enviou à Autora o modelo RP 5044, devidamente preenchido, através de carta datada de 19-07-2018, remetida em 20-07-2018 e recebido pela Autora em 25-07-2018, onde fez constar que a cessação do contrato de trabalho ocorrera por iniciativa do trabalhador por denúncia do contrato de trabalho/demissão.

Relativamente à alteração dos tempos verbais dos factos provados 26, 31 e 38, uma vez que os factos 26 e 38 foram eliminados do elenco da matéria factual e o facto 31 possui uma nova redação, mostra-se prejudicada a alteração pretendida, pelo que nada há, nesta parte, a decidir.
Assim, procede parcialmente a impugnação fáctica requerida pela Ré.

C) A Ré pretende ainda, em sede de recurso subordinado, que sejam aditados três novos factos, com base na confissão da Autora em sede de depoimento de parte e das declarações da testemunha BB.
Os factos, cujo aditamento pretende são:
- A A. foi adiando a vontade de apresentar queixa contra a colega CC.
- A A. já sofria de problemas de saúde causados por um casamento passado em que sofreu de violência doméstica.
- A A. apenas apresentou queixa da colega CC em Março de 2018.

Conforme a própria Ré menciona, estes factos encontram-se mencionados pela Autora na sua petição, nos arts. 10, 14 e 23.
Na impugnação fáctica pretendida pela Autora, foi solicitado que estes três factos fossem aditados à matéria factual dada como provada, pelo que já houve apreciação dos mesmos, remetendo-nos para o que aí foi decidido.

Uma vez que a alteração da matéria de facto efetuada, quanto aos factos provados, é bastante significativa, procederemos à sua transcrição na íntegra, integrando nela as respetivas alterações.
Matéria de facto dada como assente:
1) A A. é sócia do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul, nele beneficiando de serviços jurídicos gratuitos, sendo a sua mandatária judicial, signatária, que subscreve a presente petição inicial na qualidade de advogada do contencioso do referido sindicato (Doc. 1);
2) Sendo que o rendimento anual da A. proveniente de trabalho subordinado foi inferior à multiplicação do valor de uma unidade de conta por 200, ou seja, foi inferior a €20.400,00 (Doc. 2).
3) A A. foi admitida em 24 de Fevereiro de 2005 pela empresa SERUNION – Restaurantes de Portugal, SA, para exercer no Refeitório da Portucel as funções de Empregada de Refeitório, sob sua autoridade, direcção e fiscalização da entidade empregadora, auferindo em contrapartida uma retribuição mensal;
4) Em 16 Novembro de 2005 o local de trabalho onde exercia funções foi transmitido à empresa GERTAL – Companhia Geral de Restaurantes e Alimentação, SA, passando a A. a exercer a sua actividade ao serviço desta empresa;
5) Em 1 Julho de 2009, passou a ser a EUREST (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda., ora R., a explorar o refeitório da Portucel onde a A. trabalhava desde a data em que aí foi admitida, passando assim a exercer, no mesmo local, a actividade inerente à categoria profissional com que estava classificada, agora sob autoridade, direcção e fiscalização da R. EUREST, para quem o seu contrato de trabalho foi transmitido.
6) Em maio de 2010, a Ré transferiu a Autora para o Refeitório da empresa TINTAS HEMPEL, LDA., sita na Volta da Pedra, Palmela, que passou a ser, a partir dessa data, o seu local de trabalho, tendo-lhe sido atribuído o horário de 2ª a 6ª feira com entrada às 08h00 e saída às 17h00.
7) Ultimamente, a A. mantinha a categoria profissional de Empregada de Refeitório e auferia de retribuição base €580.00 por mês (Doc. 3);
8) A A. é filiada no Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul (Doc. 1), exercendo a actividade profissional de Empregada de Refeitório e a R. é uma empresa que se dedica à actividade de prestação de serviços de alimentação em Refeitórios e outros, CAE 56290, e está inscrita na ARESP – Associação da Restauração e Similares de Portugal;
9) À relação laboral estabelecida entre A. e R. é aplicável o CCT Cantinas, Refeitórios e Fábricas de Refeições publicado no BTE nº 36 de 29/09/1998 e sucessivas alterações.
10) Sucede que, o contrato de trabalho celebrado entre A. e R. cessou, por iniciativa da A., que, por carta datada de 12 de Julho de 2018 (Doc. 4) recebida pela R. no dia seguinte, 13 de Julho (Doc. 5), comunicou à R. a resolução do seu contrato de trabalho com invocação de justa causa, pelos motivos que, sucintamente, invocou na aludida carta (Doc. nº 4 que para todos os efeitos legais se dá como integralmente reproduzido no essencial:
a) (1)- A A., no início de Março (de 2018) apresentou queixa contra CC, uma colega de trabalho. Na verdade,
b) (2)Por razões que nunca consegui compreender, uma vez que não a conhecia até ter sido admitida, a aludida CC começou a implicar com a A. desde os primeiros dias de trabalho, tendo mesmo comportamentos provocatórios, como por ex.: dar-lhe encontrões quando se cruzava com ela, uma das vezes, quase a fazendo perder o equilíbrio.
c) (3)A A. apresentou queixa pelos comportamentos referidos, e ainda, porque a aludida funcionária só falava aos gritos, nunca em tom de voz normal, o que tornava o dia a dia de trabalho da A. ainda muito mais penoso do que já era em condições normais. Ouvir uma pessoa permanentemente aos gritos afectava psicologicamente a A. e causava-lhe dores de cabeça permanentes.
d) (4)Fui adiando a vontade de apresentar queixa até que, no início de Novembro a CC lhe disse o seguinte: “Hás-de ficar sem trabalho. Hás-de ir para a rua, porque eu não preciso disto para sobreviver. Tens a mania que tens o rei na barriga, mas hás-de ficar sem trabalho e sem dinheiro para dar de comer aos teus filhos. Eu posso ir para a rua, mas não preciso disto para sobreviver porque vou para a reforma”.
e) (5)Hesitei bastante apresentar queixa, como já referido, porque as pessoas que a iriam receber não lhe ofereciam confiança, para além do mais pela especial relação de amizade entre a CC e a chefe no local, GG, a quem a CC dava quase diariamente presentes.
f) (6)A verdade é que, infelizmente, o receio não era infundado. De facto, No dia 23-03, deslocou-se ao local de trabalho a GO BB, falou com a Superior hierárquica da A., GG, com a A. e com a CC e o resultado foi logo no mês seguinte, a R. comunicar à A. a sua transferência para outro local de trabalho, com efeito a 4 de Junho, conforme carta datada de 30.04.2018, que lhe enviou. (…).
g) (10)A tudo o exposto acresce que a transferência me acarreta sério prejuízo uma vez que é divorciada e vive sozinha com a filha de 16 anos de idade, e cumprir um horário por turnos rotativos que inclui horário nocturno das 00h00 às 8h00, implicava que a sua filha ficava sozinha em casa durante a noite, o que constituia um grande perigo para a sua segurança.
h) (11)Acresce que sofro de graves problemas de saúde causados por um casamento passado em que foi vítima de violência doméstica, situação que ultimamente se agravou devido ao ambiente de trabalho com que foi confrontada, na sequência da admissão da CC, o que foi causa do seu médico de família a ter encaminhado para a consulta de psiquiatria, sendo que o cumprimento de horário por turnos rotativos agravaria muito o estado de saúde em que se encontrava (…);
i) (12) (…) encontro-me de baixa por doença desde 11/06/2018 e sem condições de regressar ao trabalho”, pelo que decidiu resolver o seu contrato de trabalho com justa causa.
11) Para além da transferência de local de trabalho, ainda lhe foi instaurado um processo disciplinar, vindo-lhe a ser aplicada uma sanção de 1 (um) dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade, decisão de que foi notificada no dia 21 de junho de 2018.
12) Por carta datada de 29-05-2018, o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Hotelaria, Turismo, Restaurantes e Similares do Sul, em representação da Autora, solicitou à Ré, uma vez que “até à data, quase na véspera de ter de se apresentar no novo local de trabalho, a trabalhadora não recebeu mais nenhuma comunicação da empresa, e a comunicação remetida omite em absoluto as informações indispensáveis à efectivação da transferência, designadamente no que se reporta a: Transporte e Horário, tendo em atenção que o horário que lhe foi atribuído e que cumpre desde Maio de 2010 é das 8h00 às 17h00”, que tais indicações fossem comunicadas à Autora.
12-A) Em resposta, a Ré, por carta datada de 07-06-2018, sobre a questão do horário de trabalho da Autora no novo local de trabalho, consignou que:
Ora, o ingresso num novo local de trabalho obriga, obviamente, ao cumprimento do horário de trabalho que esteja em vigor no respectivo estabelecimento, não sendo possível o estabelecimento de horários individualizados.
Face ao exposto, a partir do momento em que V. Exa. passou a integrar a unidade Volkswagen AutoEuropa, deverá cumprir a escala de turnos que esteja em vigor em cada momento, conforme lhe foi expressamente referido.
Assim, alertamos V. Exa. para a necessidade de cumprimento do referido horário de trabalho sob pena da Eurest se ver forçada a tomar as medidas disciplinares legalmente previstas.
13) Setenta e cinco trabalhadores da Hempel que tomavam diariamente as suas refeições no refeitório quando souberam da ordem de transferência, fizeram um abaixo-assinado, que remeteram à R. por correio registado, a pedir o regresso da A. ao Refeitório, (Doc. 10 que para todos os efeitos se dá aqui como reproduzido).
14) A chefe da Unidade Hempel da R., que trabalhava diretamente com a A., considerou-a uma excelente trabalhadora e que se podia confiar no trabalho dela.
15) A R. recebeu a carta de resolução no dia 13-07-2018, e enviou à Autora o modelo RP 5044, devidamente preenchido, através de carta datada de 19-07-2018, remetida em 20-07-2018 e recebido pela Autora em 25-07-2018, onde fez constar que a cessação do contrato de trabalho ocorrera por iniciativa do trabalhador por denúncia do contrato de trabalho/demissão.
16) No Refeitório da empresa TINTAS HEMPEL, LDA., decorrente da relação laboral conflituosa com a Colega CC, a A. ia trabalhar com grande ansiedade, todo o dia chorava, andava enervada e chegou a ir de baixa médica;
17) Quando estava lá sentia ansiedade, humilhada e perdeu a sua identidade;
18) Em casa nem lá estava, estava com ideia no trabalho, deixou de ser mãe, dormia mal e emagreceu bastante.
19) A A. iria cumprir um horário por turnos rotativos que inclui horário nocturno das 00h00 às 8h00 (Doc. 8).
(Da Contestação):
20) Em data não concretamente apurada do mês de março de 2018, mas anterior ao dia 23, a Autora apresentou queixa junto da Ré contra a colega CC, por, no seu entender, esta implicar consigo e ter para consigo comportamentos provocatórios.
21) A Ré promoveu, na pessoa da Gestora de Operações, BB, a resolução do conflito, tendo-se esta deslocado ao local de trabalho de ambas, no dia 23 de março de 2018, para apurar factos.
22) Contudo, não logrou aquela trabalhadora da Ré resolver o assunto.
23) Tendo-se apurado que A., durante o período normal de trabalho, discutia com a referida colega, foi-lhe posteriormente instaurado um processo disciplinar, pelo incumprimento de regras a que, legal e contratualmente, a A. se encontrava obrigada.
24) Foi igualmente instaurado um processo disciplinar à trabalhadora que mantinha o mesmo tipo de comportamento com a A.;
25) A A Gerente da Unidade GG tinha conhecimento das queixas da A. que por diversas vezes lhas transmitiu.
26) Eliminado.
27) Eliminado.
28) A R. deu como provado no âmbito disciplinar que:
a) “A Gestora Operacional da R., BB, teve conhecimento de uma queixa da A. à Direcção dos Recursos Humanos da Eurest, referente à trabalhadora CC,
b) Tendo sido informada de que havia uma situação de mal-estar e troca de ofensas entre as mesmas há cerca de 2 (dois) meses, que incluía ataques verbais mútuos na Unidade.
c) A referida Gestora Operacional dirigiu-se, no dia 23 de Março, à Unidade, para falar com ambas na presença da Gerente de Unidade GG.
d) A A. transmitiu-lhe que fez queixa da colega porque a mesma a ameaçou de “correr com ela e tirar-lhe o sustento dos filhos”.
e) Inquirida sobre o que terá despoletado isso, a A. respondeu que não sabia, mas que “não é santa e lhe responde à letra”.
f) Chamada a trabalhadora CC na presença de todas, a mesma disse que não provocava a A. e que apenas se defendia, uma vez que esta punha em causa o seu trabalho e fazia comentários depreciativos a seu respeito.
g) Ademais, negou as ameaças que a A. a acusava de fazer,
h) Chegando a dizer que a A. a tinha queimado no braço, exibindo uma marca.
i) A Gerente da Unidade, GG, afirmou ter conhecimento de altercações entre as duas mas apenas por que lhe foram relatadas, sem as ter presenciado.
j) A trabalhadora CC apresentou queixa da A. na Direcção de Recursos Humanos da Eurest no dia 19 de Abril de 2018, pelas já referidas razões”.
29) A Ré aplicou à trabalhadora CC a sanção disciplinar de 1 (um) dia de suspensão do trabalho com perda de retribuição e de antiguidade.
30) Da decisão disciplinar a A. não recorreu.
31) Em carta datada de 30-04-2018, a Ré comunicou à Autora que:
Na sequência da reorganização do serviço das TINTAS HEMPEL, foi necessário analisar as competências técnicas dos diversos colaboradores, de modo a alocar os trabalhadores e otimizar os meios humanos e a satisfação do cliente.
Neste sentido, consideramos que V. Exa. Reúne as competências técnicas e a categoria profissional adequada para integrar, a partir do dia 04 de junho de 2018, a equipa da VOLKSWAGEN AUTOEUROPA, sita Quinta da Marquesa – Quinta do Anjo – 2954-024 QUINTA DO ANJO.
Certos de que este novo desafio contribuirá para o seu desenvolvimento, e satisfação pessoais e profissionais, fazemos votos de sucesso.
32) Por carta datada de 07-06-2018, a Ré deu conhecimento à Autora que:
Cumpre reiterar que, como é do S/ conhecimento, V. Exa. foi transferida de local de trabalho em 4 de Junho de 2018, por manifesta falta de compatibilidade nas relações de trabalho com colegas.
Na verdade, a gravidade da referida incompatibilidade levou, inclusivamente, à abertura de um processo disciplinar, o qual ainda se encontra a decorrer.
33) Também a trabalhadora CC foi transferida de local de trabalho.
34) A A. teve conhecimento da ordem de transferência desde o dia 3 de Maio de 2018.
35) A Autora, quando lhe comunicaram, no dia do início da sua prestação de trabalho na AutoEuropa, o horário mencionado no facto provado 19, opôs-se à prestação de trabalho no turno da noite e ao regime de folgas rotativas instituído na nova unidade, pelo que, temporariamente, e até que a Ré tomasse uma decisão definitiva sobre a questão, foi-lhe autorizado prestar funções no turno da manhã, das 7h00 às 15h30, com folgas aos fins de semana.
36) A A. chegou a prestar funções no referido horário das 7h00 às 15h30, nos dias 6, 7 e 8 de Junho de 2018, conforme consta do respectivo registo de ponto (cfr. doc. 1).
37) A A. apresentou uma baixa médica entre o dia 11 e 14 de junho de 2018.
38) Eliminado.
39) Eliminado.
40) Eliminado.
41) A, ora Reconvinda, não deu o aviso prévio de 60 dias, à a R., ora Reconvinte, a qual foi citada em 15 de julho de 2019 e vindo esta a exigi-lo em 20 de setembro de 2019.
42) A colega CC falava, frequentemente, aos berros.
43) A colega CC deu, uma vez, um empurrão à Autora para que ela lhe saísse da frente e disse-lhe, uma vez, que queria que ela fosse despedida, existindo entre ambas, por vezes, discussões.
44) A Autora hesitou em apresentar queixa durante algum tempo contra a colega CC, dada a especial relação de proximidade que esta tinha com a gerente HH, a quem, às vezes, dava prendas.
45) Com a transferência do local de trabalho, o processo disciplinar que lhe foi instaurado e a sanção que lhe foi aplicada, a Autora sentiu-se injustiçada pela Ré.

5 – Inexistência de caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho por justa causa
Considera a Autora que apenas com a receção da carta datada de 07-06-2018 é que a Autora tomou conhecimento de que iria ter de cumprir o horário de turnos rotativos em vigor no local de trabalho para onde fora transferida, apercebendo-se das consequências pessoais e familiares que essa radical alteração de horário implicava para a sua vida.
Mais referiu que, desconhecendo-se nos autos a data em que a Autora recebeu tal carta, desconhece-se igualmente a data em que o prazo de 30 dias, previsto no n.º 1 do art. 395.º do Código do Trabalho, se iniciou, incumbindo o ónus da prova de tal facto à Ré, por se tratar de matéria de exceção, em face do disposto no art. 342.º, n.º 2, do Código Civil.
Dispõe o art. 395.º do Código do Trabalho que:
1 - O trabalhador deve comunicar a resolução do contrato ao empregador, por escrito, com indicação sucinta dos factos que a justificam, nos 30 dias subsequentes ao conhecimento dos factos.
2 - No caso a que se refere o n.º 5 do artigo anterior, o prazo para resolução conta-se a partir do termo do período de 60 dias ou da declaração do empregador.
3 - Se o fundamento da resolução for o referido na alínea a) do n.º 3 do artigo anterior, a comunicação deve ser feita logo que possível.
4 - O empregador pode exigir que a assinatura do trabalhador constante da declaração de resolução tenha reconhecimento notarial presencial, devendo, neste caso, mediar um período não superior a 60 dias entre a data do reconhecimento e a da cessação do contrato.

No caso em apreço, o tribunal a quo considerou que o direito a invocar os factos que constam da carta de resolução do contrato de trabalho com justa causa, em face do disposto no n.º 1 do art. 395.º do Código do Trabalho, aquando da receção de tal carta pela Ré, já tinha caducado.
Vejamos.
A Autora vem apenas invocar, em sede de conclusões recursivas, que, quanto à alteração do horário de trabalho, não foi ultrapassado o prazo previsto no disposto no n.º 1 do art. 395.º do Código do Trabalho, uma vez que se desconhece em que data foi rececionada pela Autora a carta datada de 07-06-2018, sendo tal ónus probatório da competência da Ré.
Sobre esta matéria resultou provado que a carta de resolução do contrato de trabalho com justa causa, enviada pela Autora à Ré, foi rececionada por esta em 13-07-2018, constando dessa carta invocado o motivo referente à alteração do horário (facto provado 10, als. g) e h)).
Mais resultou provado que, quando comunicaram à Autora, no dia do início da sua prestação de trabalho na AutoEuropa, que o seu horário seria por turnos rotativos, incluindo horário noturno das 00h00 às 8h00, esta opôs-se à prestação de trabalho no turno da noite e ao regime de folgas rotativas instituído na nova unidade, pelo que, temporariamente, e até que a Ré tomasse uma decisão definitiva sobre a questão, foi-lhe autorizado prestar funções no turno da manhã, das 7h00 às 15h30, com folgas aos fins de semana, tendo trabalhado nesse turno durante três dias (factos provados 35 e 36).
Resultou também provado que o Sindicato a que a Autora pertencia, em representação desta, enviou a carta datada de 29-05-2018 à Ré a solicitar que esta comunicasse à sua associada o horário de trabalho que lhe seria atribuído e os respetivos meios de transporte, tendo a Ré, em resposta, por carta datada de 07-06-2018, feito constar que a Autora teria de cumprir o horário que estivesse em vigor no referido local de trabalho, não sendo possível o estabelecimento de horários individualizados, pelo que, sob pena de adoção de medidas disciplinares legalmente previstas, a Autora teria de integrar a referida unidade da Volkswagen AutoEuropa, devendo cumprir a escala de turnos que estivessem em vigor em cada momento (factos provados 12 e 12-A).
Parece-nos, assim, evidente que até à receção pela Autora desta carta não é possível concluir que a Autora tivesse conhecimento que, efetivamente, tinha de passar a integrar os turnos rotativos com horários noturnos, tanto mais que a autorizaram a efetuar, durante os primeiros dias, apenas o turno da manhã.
Daí que para apurar se existiu, ou não, caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho por justa causa, referente à invocada alteração do horário de trabalho, se torna fundamental apurar qual foi a data em que a Autora rececionou a carta datada de 07-06-2018. Porém, tal facto não consta da matéria apurada. Nos termos do n.º 2 do art. 342.º do Código Civil, por a matéria de exceção, como é o caso da invocada caducidade, se reportar, na presente situação, a factos que pretendem declarar extinto o direito invocado pela Autora, a sua prova compete à Ré. Não tendo esta procedido a tal prova, não é possível concluir que o direito da Autora de invocar a mudança de horário como causa de resolução do seu contrato de trabalho com justa causa já se encontrava caducado quando a Ré rececionou, a 13-07-2018, a referida carta de resolução.
A título de curiosidade refira-se que a Ré enviou à Autora uma carta datada de 19-07-2018 que apenas veio a ser rececionada por esta em 25-07-2018, ou seja, seis dias depois (facto provado 15).
Pelo exposto, procede nesta parte a pretensão da Autora, sendo de concluir que relativamente aos factos relacionados com a mudança de horário inexiste caducidade do direito de os invocar na carta enviada pela Autora à Ré.

6 – Licitude da resolução do contrato de trabalho com justa causa
No entender da Autora, o comportamento da Ré para com aquela, na sequência de queixa que a Autora apresentou, devido ao comportamento de uma colega de trabalho que a maltratava, e que teve como consequências a instauração de um processo disciplinar, uma ordem de transferência de local de trabalho e a alteração do horário de trabalho, de horário diurno fixo para horário por turnos rotativos ininterruptos, incluindo horário noturno das 00h00 às 8h00, e sábados e domingos, configuram violação culposa de deveres impostos por Lei ao empregador, mormente, o dever de respeitar e tratar o trabalhador com urbanidade e probidade (art. 127.º, n.º 1, al. a), do Código do Trabalho), o dever de proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral (art. 127.º, n.º 1, al. c), do Código do Trabalho) e o dever de proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da atividade profissional com a atividade familiar e pessoal (art. 127.º, n.º 3, do Código do Trabalho).
Mais referiu que a Ré violou igualmente as cláusulas 24.ª e 34.ª do contrato coletivo aplicável, pelo que o comportamento da Ré representou uma violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador, o que constitui justa causa de resolução do contrato, nos termos do art. 394.º, n.º 2, al. b), do Código do Trabalho.
Por fim, concluiu que assistiu à Autora o direito de resolver o contrato de trabalho com justa causa, nos termos do art. 395.º, n.º 1, do Código do Trabalho, tendo direito à indemnização prevista no n.º 1 do art. 396.º do mesmo Diploma Legal, a qual deve ser arbitrada pelo máximo legal de 45 dias de retribuição por cada ano de antiguidade, ascendendo, por isso, a €11.310,00 (€870,00 x 13 meses).
Estatuía o art. 127.º, n.º 1, als. a) e c) e n.º 3, do Código do Trabalho[25] que:
1 - O empregador deve, nomeadamente:
a) Respeitar e tratar o trabalhador com urbanidade e probidade;
[…]
c) Proporcionar boas condições de trabalho, do ponto de vista físico e moral;
[…]
3 - O empregador deve proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da actividade profissional com a vida familiar e pessoal.

Determina o art. 394.º, nºs. 1 e 2, al. b), do Código do Trabalho
1 - Ocorrendo justa causa, o trabalhador pode fazer cessar imediatamente o contrato.
2 - Constituem justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador, nomeadamente, os seguintes comportamentos do empregador:
[…]
b) Violação culposa de garantias legais ou convencionais do trabalhador, designadamente a prática de assédio praticada pela entidade empregadora ou por outros trabalhadores;

Dispõe ainda o art. 351.º, nºs. 1 e 3, do Código do Trabalho, que:
1 - Constitui justa causa de despedimento o comportamento culposo do trabalhador que, pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho.
[…]
3 - Na apreciação da justa causa, deve atender-se, no quadro de gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses do empregador, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e os seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso sejam relevantes.

Conforme refere Maria do Rosário Palma Ramalho, em Tratado de Direito do Trabalho,[26] para que se verifique justa causa subjetiva de resolução do contrato de trabalho por parte do trabalhador torna-se necessário a verificação cumulativa de três requisitos:
i) Um requisito objectivo, que é o comportamento do empregador violador dos direitos ou garantias do trabalhador.
ii) Um requisito subjectivo, que é a atribuição desse comportamento ao empregador a título de culpa. Contudo, no que se refere ao requisito da culpa, é de presumir a sua verificação, uma vez que estamos no âmbito da responsabilidade contratual, ou seja, por aplicação da regra geral do art. 799.º do CC. Desta presunção decorre uma inversão do ónus da prova, cabendo ao empregador demonstrar que a situação subjectiva de justa causa alegada pelo trabalhador não procedeu de um comportamento culposo.
iii) Um terceiro requisito, que relaciona aquele comportamento com o vínculo laboral, no sentido de tornar «imediata e praticamente impossível» para o trabalhador a subsistência desse vínculo (ou seja, em termos comparáveis aos da justa causa subjacente ao despedimento disciplinar). Este requisito retira-se da exigência legal de que a resolução do contrato seja promovida num lapso de tempo muito curto sobre o conhecimento dos factos que a justificam (30 dias sobre o conhecimento desses factos pelo trabalhador, nos termos do art. 395º nº 1), mas não pode deixar de ser reconduzido à ideia de simples inexigibilidade da manutenção do vínculo pelo trabalhador.
Na esteira do que anteriormente se referiu, acentua-se a necessidade de não apreciar os elementos acima referidos em moldes tão estritos e exigentes como no caso da justa causa disciplinar, designadamente no que toca ao terceiro elemento. A fundamental dissemelhança entre as figuras do despedimento disciplinar e da resolução do contrato por iniciativa do trabalhador assim o impõe.

Relativamente a uma menor exigibilidade na apreciação do terceiro requisito, cita-se igualmente o acórdão do STJ, proferido em 16-03-2017:[27]
2. Em sede de resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador, apesar de reconduzidos ao núcleo essencial da noção de justa causa, tal como se encontra definida no art.º 351.º, n.º 1, do Código do Trabalho de 2009, para o despedimento promovido pelo empregador, temos de considerar a particularidade, derivada da ponderação dos diferentes valores e interesses em causa, de que a apreciação da justa causa de resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador não poder ser tão exigente como nos casos de apreciação da justa causa de despedimento promovido pelo empregador.

Cita-se também o acórdão proferido nesta Relação, em 25-10-2012:[28]
VI – Na apreciação de justa causa de resolução do contrato pelo trabalhador o grau de exigência tem de ser menor que o utilizado na apreciação da justa causa de despedimento – uma vez que o trabalhador perante o incumprimento contratual do empregador não tem formas de reacção alternativas à resolução, enquanto este perante o incumprimento contratual do trabalhador pode optar pela aplicação de uma sanção conservatória do vínculo laboral, em detrimento da mais gravosa de despedimento.

Posto isto, é de concluir que o trabalhador só pode resolver o contrato de trabalho com fundamento em justa causa subjetiva se o comportamento da entidade empregadora for ilícito, culposo e tornar, pela sua gravidade e consequências, imediata e praticamente impossível a subsistência da relação laboral, sendo a apreciação deste último requisito necessariamente menos exigente e rigorosa do que nos casos de despedimento disciplinar, por inexistir ao alcance do trabalhador qualquer outro tipo de solução alternativa como acontece com a entidade empregadora, que possui ao seu dispor um conjunto diversificado de sanções conservatórias.
Vejamos, então, a situação concreta.
Em face da matéria de facto apurada, constatou-se que a Ré, apesar de ter procedido à modificação do horário de trabalho que a Autora tinha há mais de 8 anos, não lhe comunicou essa mudança, a não ser quando a mesma já estava a laborar no novo local de trabalho. Na realidade, na situação em apreço verificaram-se duas alterações, a primeira, do local de trabalho; e a segunda, do horário de trabalho. Relativamente à alteração do local de trabalho, em si mesma, a Autora não levantou qualquer oposição. Apenas se sentiu prejudicada quando teve conhecimento que a mudança do local de trabalho implicava, segundo a informação prestada, por escrito, pela Ré, também a mudança do horário de trabalho. Portanto, o que se encontra aqui em questão não é a mudança do local de trabalho, mas sim, a mudança do horário de trabalho.
Dispõe a cláusula 24.ª do CCT, celebrado entre a ARESP e a FESHOT, publicado no BTE n.º 36 de 29-09-1998 e respetivas alterações:[29]
1 — No momento da admissão o horário a efectuar por cada profissional deve ser ajustado à possibilidade de transporte entre o seu domicílio e o local de trabalho.
2 — A entidade patronal só pode alterar o horário de trabalho quando haja necessidade imperiosa de mudança de horário geral do estabelecimento, ou haja solicitação escrita da maioria dos trabalhadores; em qualquer caso, porém, a alteração não poderá acarretar prejuízo sério para qualquer trabalhador.
3 — Nomeadamente, os acréscimos de despesas de transporte, que passem a verificar-se para o trabalhador, resultantes da alteração do horário, serão encargo da entidade patronal, excepto se a alteração tiver resultado de solicitação do trabalhador.
4 — O novo horário e os fundamentos da alteração, quando este seja da iniciativa da entidade patronal, serão afixados no painel da empresa com uma antecedência mínima de 30 dias, relativamente ao pedido de aprovação final.

Versa sobre tal matéria o art. 217.º do Código do Trabalho, que dispõe:
1- À alteração de horário de trabalho é aplicável o disposto sobre a sua elaboração, com as especificidades constantes dos números seguintes.
2 - A alteração de horário de trabalho deve ser precedida de consulta aos trabalhadores envolvidos e à comissão de trabalhadores ou, na sua falta, à comissão sindical ou intersindical ou aos delegados sindicais, bem como, ainda que vigore o regime de adaptabilidade, ser afixada na empresa com antecedência de sete dias relativamente ao início da sua aplicação, ou três dias em caso de microempresa.
3 - Exceptua-se do disposto no número anterior a alteração de horário de trabalho cuja duração não seja superior a uma semana, desde que seja registada em livro próprio, com a menção de que foi consultada a estrutura de representação colectiva dos trabalhadores referida no número anterior, e o empregador não recorra a este regime mais de três vezes por ano.
4 - Não pode ser unilateralmente alterado o horário individualmente acordado.
5 - A alteração que implique acréscimo de despesas para o trabalhador confere direito a compensação económica.
6 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto neste artigo.

Por sua vez, estabelece o art. 212.º do Código do Trabalho que:
1 - Compete ao empregador determinar o horário de trabalho do trabalhador, dentro dos limites da lei, designadamente do regime de período de funcionamento aplicável.
2 - Na elaboração do horário de trabalho, o empregador deve:
a) Ter em consideração prioritariamente as exigências de protecção da segurança e saúde do trabalhador;
b) Facilitar ao trabalhador a conciliação da actividade profissional com a vida familiar;
c) Facilitar ao trabalhador a frequência de curso escolar, bem como de formação técnica ou profissional.
3 - A comissão de trabalhadores ou, na sua falta, as comissões intersindicais, as comissões sindicais ou os delegados sindicais devem ser consultados previamente sobre a definição e a organização dos horários de trabalho.
4 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto nos n.os 2 ou 3.

No caso em apreço, tendo em atenção o disposto na citada cláusula 24.ª, a Ré não efetuou qualquer prova de que a alteração do local de trabalho da Autora tenha resultado de uma sua necessidade imperiosa ou que tenha havido solicitação escrita da maioria dos trabalhadores nesse sentido, e mesmo assim, o horário de trabalho apenas poderia ser alterado se não acarretasse prejuízo sério para a Autora.
Consigna-se, aliás, que setenta e cinco trabalhadores da empresa cliente da Ré, onde a Autora efetuava o seu trabalho há mais de oito anos, fizeram um abaixo-assinado, que remeteram à Ré, por correio registado, a pedir o regresso da Autora ao refeitório (facto provado 13).
Não existem, por isso, dúvidas, que a Ré, ao nem sequer comunicar à Autora o novo horário de trabalho, quanto mais fundamentar tal alteração, violou o disposto na referida cláusula 24.ª.
Mas mesmo que se aplicasse o que dispõe o Código do Trabalho sobre esta matéria, é manifesto que a Ré não comunicou, previamente, à Autora a mudança do seu horário de trabalho, nem esta teve a possibilidade de ter contacto com a afixação desse horário de trabalho no local de trabalho, visto que esse novo horário era aplicado num igualmente novo local de trabalho da Autora. Acresce que também não foi comunicada essa alteração do horário de trabalho ao sindicato da Autora. É, por isso, evidente que a Ré não deu cumprimento ao disposto nos nºs. 1 e 2 do art. 217.º do Código do Trabalho.
Acresce que, no Código de Trabalho também se prevê que na alteração do horário de trabalho deve ser tido em conta as exigências de proteção da segurança e saúde do trabalhador, bem como se deve facilitar ao trabalhador a conciliação da atividade profissional com a vida familiar. Ora, para além de nem sequer a Ré ter comunicado à trabalhadora que lhe iriam alterar o horário, deixando o mesmo de ser das 08h00 às 17h00, de 2.ª à 6.ª, como acontecia há mais de 8 anos, para passar a ser um horário por turnos contínuos, inclusive das 00h00 às 08h00 e aos fins-de-semanas, não consta também que tivesse tido qualquer preocupação em apurar da situação familiar da Autora, sendo que relativamente à situação de saúde não podia ignorar que a mesma tinha recentemente estado de baixa médica (facto provado 16).
Dir-se-á ainda que não se aplica à presente situação o disposto no n.º 4 do art. 217.º do Código do Trabalho, uma vez que o horário que a Autora vinha praticando há mais de 8 anos tinha-lhe sido atribuído pela Ré, não tendo, por isso, resultado de um acordo (facto provado 6).
É, assim, notório que a aplicação do novo horário de trabalho à Autora violou também o disposto nos arts. 217.º, nºs. 1 e 2 e 212.º, n.º 2, als. a) e b), do Código do Trabalho.
Deste modo, a Ré, com o comportamento adotado, para além de ter violado as normas convencionais e legais respeitantes à alteração do horário de trabalho, violou igualmente o dever que recai sobre o empregador de respeitar e tratar o trabalhador com probidade (não tendo denotado qualquer retidão, integridade e respeito para com a Autora, ao lhe omitir a alteração radical do seu horário de trabalho), de lhe proporcionar boas condições de trabalho do ponto de vista físico e moral (não podendo desconhecer que a situação de incerteza em que colocou a Autora relativamente ao seu horário de trabalho, não só a humilhava, como lhe afetava a saúde, do ponto de vista psicológico) e de proporcionar ao trabalhador condições de trabalho que favoreçam a conciliação da atividade profissional com a vida familiar e pessoal (não tendo tido qualquer preocupação em apurar as condições familiares e pessoais da Autora quando optou por lhe alterar o horário de trabalho, sem sequer a avisar), ou seja, violou os deveres do empregador previstos no art. 127.º, n.º 1, als. a) e c) e n.º 3, do Código do Trabalho.[30]
Deste modo, concluindo-se, como se concluiu, que a alteração do horário de trabalho da Autora, do modo como foi efetuada, é ilícita (essa terá sido, aliás, a razão pela qual a Ré, através das suas testemunhas, em julgamento, negou que tal alteração de horário tivesse existido, contrariando o que, de forma clara, constava da carta que enviou à Autora), presume-se, nos termos do art. 799.º, n.º 1, do Código Civil, o comportamento a Ré igualmente como culposo. Salienta-se, ainda, que nada nos factos dados como provados permite ilidir tal presunção.
Preenchidos, assim, os dois primeiros requisitos, importa apreciar se o terceiro também se mostra preenchido.
Afigura-se-nos que sim.
Na realidade, apesar de a Autor trabalhar para a Ré há cerca de 9 anos (facto provado 5), de ser considerada uma excelente trabalhadora e de confiança pela chefe da unidade onde trabalhava (facto provado 14) e de ser uma pessoa de quem os trabalhadores da cliente da Ré gostavam (em face do abaixo-assinado de setenta e cinco trabalhadores dessa cliente onde era solicitado que a Autora se mantivesse no seu local de trabalho – facto provado 13), esta, não só alterou o local de trabalho à Autora, como, numa atitude insensível e cruel, negou-lhe um dos seus mais básicos direitos, o direito à informação. Deste modo, a Ré não comunicou previamente à Autora a mudança radical do seu horário, levando-a a confrontar-se com tal facto apenas no dia em que se dirigiu ao seu novo local de trabalho e, ainda assim, a deixou, durante algum tempo, na dúvida se poderia, ou não, apenas ficar com o turno da manhã, de segunda a sexta-feira, para, finalmente, numa carta bastante agressiva, lhe comunicar que, como qualquer outro trabalhador, teria de integrar os turnos da Volkswagen AutoEuropa, sem qualquer consideração e respeito pelos anos de dedicação da Autora para com a Ré.
Efetivamente todo o comportamento da Ré, de manifesto desrespeito pela dedicação e empenho da Autora, torna inexigível à Autora a manutenção do contrato de trabalho, pelo que é lícita a resolução do contrato de trabalho, por existir justa causa, nos termos do art. 394.º, n.º 2, al. b), do Código do Trabalho, em face da violação do disposto na cláusula 24.ª do CCT e dos arts. 127.º, nºs. 1, als. a) e c) e 3, 212.º, n.º 2, al. a) e b) e 217.º, nºs. 1 e 2, do Código do Trabalho. Possui, assim, a Autora direito à indemnização prevista no art. 396.º do Código do Trabalho.
Dispõe tal artigo que:
1 - Em caso de resolução do contrato com fundamento em facto previsto no n.º 2 do artigo 394.º, o trabalhador tem direito a indemnização, a determinar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição e ao grau da ilicitude do comportamento do empregador, não podendo ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
2 - No caso de fracção de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente.
3 - O valor da indemnização pode ser superior ao que resultaria da aplicação do n.º 1 sempre que o trabalhador sofra danos patrimoniais e não patrimoniais de montante mais elevado.
4 - No caso de contrato a termo, a indemnização não pode ser inferior ao valor das retribuições vincendas.
5 - Em caso de resolução do contrato com o fundamento previsto na alínea d) do n.º 3 do artigo 394.º, o trabalhador tem direito a compensação calculada nos termos do artigo 366.º

Nos termos do citado art. 396.º, os critérios para fixação dos dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo são apenas dois:
a) o valor da retribuição; e
b) o grau de ilicitude do comportamento do empregador.
Quanto ao fator retribuição, importa atentar que o mesmo deve funcionar de forma a obter uma maior equidade, impedindo as naturais distorções em face dos diferentes graus de remuneração dos trabalhadores, de modo a que, na fixação dessa indemnização, se atente à situação económica do lesado, conforme determina o art. 494.º do Código Civil. Deste modo, quanto menor for a remuneração do lesado, maior deve ser o número de dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fração de antiguidade a fixar.
Por sua vez, encontrando-se igualmente a medida da indemnização dependente do grau de ilicitude do despedimento, terá de se atender na sua fixação ao índice de censurabilidade da conduta da entidade empregadora e no que tal conduta revela de desrespeito pela dignidade social e humana do trabalhador lesado.[31]
Apreciemos.
A Autora em 2018 auferia €580,00 (facto provado 7), ou seja, o correspondente ao ordenado mínimo nacional, pelo que estamos perante um salário de baixo valor. Acresce que o grau de ilicitude da Ré é bastante elevado, conforme temos vindo a fazer referência, pelo modo como tratou aquela sua trabalhadora, indiferente quer à sua antiguidade na empresa, quer à sua excelência enquanto profissional.
Assim, afigura-se-nos ser de fixar em 40 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade a indemnização a atribuir à Autora.
Não tendo sido impugnados os factos provados 3, 4 e 5, constata-se que a antiguidade da Autora iniciou-se em 24-02-2005, tendo a sua atividade profissional cessado em 13-07-2018. Estamos, assim, perante 13 anos, 4 meses e 18 dias, pelo que a indemnização devida é de €10.066,78.
Pelo exposto, procede parcialmente, nesta parte, a pretensão da Autora.

7 – Inexistência dos requisitos para a atribuição de uma indemnização à Autora por danos morais
Entende a Ré que, tendo sido julgada procedente a exceção perentória de caducidade, não existindo, por isso, justa causa para a Autora vir cessar o respetivo contrato de trabalho, não pode ter direito à indemnização prevista no art. 396.º do Código de Trabalho, por danos não patrimoniais.
Referiu ainda que não se tendo provado qualquer facto ilícito por parte da Ré, não pode a Autora ter direito a qualquer indemnização, pelo que a Ré deverá ser absolvida de tal pedido.
Mais referiu que os factos dados como assentes não permitem qualquer condenação da Ré, visto que a Autora confessou expressamente que a situação da angústia que teria sofrido advinha, por um lado, das ações da colega CC, e, por outro, das lembranças de um passado de sofrimento.
Por fim, referiu que a Autora não logrou demonstrar quaisquer danos dignos da tutela do direito que resultassem de alguma atuação da Ré.
Decidamos.
Quanto à primeira questão, uma vez que se decidiu pela improcedência da invocada exceção perentória de caducidade do direito do Autor, a mesma mostra-se prejudicada.
Passemos, então, às restantes questões.
Da sentença recorrida parece resultar que a indemnização por danos não patrimoniais em que a Ré foi condenada a pagar à Autora, no valor de €1.500,00, teve fundamento jurídico no disposto no art. 496.º do Código Civil, porém, tal indemnização mostrava-se peticionada nos termos do art. 396.º, n.º 3, do Código de Trabalho.
Basta atentar ao que consta dos nºs. 1 e 3 do art. 396.º do Código do Trabalho, para se verificar que a indemnização prevista no n.º 1 integra não só os danos patrimoniais sofridos pelo trabalhador, como os danos não patrimoniais, razão pela qual a indemnização prevista no n.º 1 pode ser superior à aritmética aí efetuada se se alegar e provar que os danos patrimoniais e não patrimoniais são de montante mais elevado do que o que resulta desse cálculo aritmético.[32]
Para melhor apreciar esta situação, importa atentar ao disposto no art. 566.º do Código Civil, que dispõe:
1 - A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor.
2. Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos.
3. Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados.

Assim, efetuando o tribunal um juízo de prognose, em face das regras constantes no art. 566.º do Código Civil, deverá apurar se, no caso, os danos não patrimoniais sofridos pela Autora se mostram, ou não, integralmente reparados com a indemnização que lhe foi arbitrada, nos termos do n.º 1 do art. 396.º do Código do Trabalho.
Da matéria dada como assente que fundamentou a resolução do contrato de trabalho com justa causa, sendo, nos termos do n.º 1 do citado art. 396.º, apenas tal fundamento aquilo que aqui releva, resultou, a título de danos morais, que a Autora se sentiu injustiçada pela Ré com a transferência do local de trabalho, a qual, implicou, como já se referiu, uma alteração drástica do seu horário de trabalho. Ora, tal sentimento de injustiça, não só foi ponderado, por justificável, em sede de apreciação do grau de ilicitude da Ré, como o mesmo se mostra inteiramente ressarcido com a indemnização que foi atribuída à Autora, inexistindo, por isso, qualquer fundamento para que a indemnização calculada nos termos do n.º 1 do art. 396.º venha a ser alterada para valor superior nos termos do n.º 3 desse artigo.
Pelo exposto, ainda que com fundamento distinto, procede na íntegra, nesta parte, a pretensão da Ré, devendo a mesma ser absolvida da condenação em €1.500,00 à Autora, por indemnização por danos não patrimoniais.

8 – Insuficiente quantum indemnizatório por danos morais
Pretende a Autora que o valor da indemnização por danos não patrimoniais em que a Ré foi condenada seja aumentado de €1.500,00 para €5.000,00, em face dos danos morais sofridos pela Autora, decorrentes do comportamento altamente censurável da Ré.
Uma vez que a Ré foi absolvida do pagamento de tal indemnização, encontrando-se os danos morais sofridos pela Autora devidamente ressarcidos, em face da indemnização que lhe foi arbitrada nos termos do n.º 1 do art. 396.º do Código do Trabalho, nada mais se decide sobre esta questão, por a mesma se encontrar prejudicada.
V – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso da Autora AA parcialmente procedente e o recurso da Ré “Eurest (Portugal) – Sociedade Europeia de Restaurantes, Lda.” totalmente procedente e, em consequência, determinar a revogação da sentença recorrida, a qual se substitui nos seguintes temos:
a) Julga-se verificada a exceção de caso julgado quanto ao pedido reconvencional, absolvendo-se a Autora do respetivo pedido;
b) Julga-se improcedente a exceção de caducidade da resolução do contrato de trabalho com justa causa por parte da Autora;
c) Julga-se válida a resolução do contrato de trabalho com justa causa por parte da Autora e, em consequência, determina-se a condenação da Ré a pagar à Autora:
- uma indemnização, nos termos do art. 396.º, n.º 1, do Código do Trabalho, no montante de €10.066,78 (dez mil e sessenta e seis euros e setenta e oito cêntimos), acrescida de juros de mora, vencidos e vincendos, desde a citação até efetivo e integral pagamento; e
d) Absolve-se a Ré do pedido relativo à indemnização por danos morais.
Custas do recurso da Autora na proporção do respetivo decaimento e custa do recurso da Ré pela Autora (art. 527.º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo da isenção da Autora (art. 4.º, n.º 1, al. h), do Regulamento das Custas Processuais).
Notifique.
Évora, 12 de julho de 2023
Emília Ramos Costa (relatora)
Mário Branco Coelho
Paula do Paço

__________________________________________________
[1] Relatora: Emília Ramos Costa; 1.º Adjunto: Mário Branco Coelho; 2.ª Adjunta: Paula do Paço.
[2] Doravante “Eurest (Portugal), Lda.”.
[3] Não é feita qualquer menção à questão relativa ao valor da ação, uma vez que tal valor foi retificado pelo tribunal da 1.ª instância, não tendo sido interposto qualquer recurso de tal retificação.
[4] Indicar-se-ão as questões pela ordem lógica em que serão apreciadas e não pela maneira como foram anteriormente apresentadas.
[5] Proceder-se-á em primeiro lugar à apreciação da impugnação fáctica, visto que a mesma, em face dos factos impugnados pela Autora, pode ter influência na apreciação da caducidade do direito de resolução do contrato de trabalho por justa causa.
[6] In Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, p. 143.
[7] No âmbito do Proc. 24/09.2TBMDA.C2.S2, consultável em www.dgsi.pt.
[8] Almedina, 2018, p.737.
[9] No âmbito do processo n.º 7095/10.7TBMTS.P1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[10] No âmbito do processo n.º 14561/16.9T8SNT-A.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[11] Apesar de este acórdão se reportar ao disposto no art. 644.º, n.º 1, al. b), do Código de Processo Civil, a sua redação é exatamente igual à redação do atual art. 79.º-A, n.º 1, al. b), do Código de Processo do Trabalho.
[12] Em idêntico sentido, o acórdão do TRE proferido em 22-09-2016 no âmbito do processo n.º 752/14.0TBSSB-A.E1, consultável em www.dgsi.pt.
[13] Existem outras contradições entre os factos provados, porém, como foram invocadas pelas partes, em sede própria, serão apreciadas.
[14] Não se apreciará o art. 24 da petição inicial, por o mesmo não constar das conclusões recursivas.
[15] No âmbito do processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[16] No âmbito do processo n.º 1572/12.2TBABT.E1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[17] No âmbito do processo n.º 283/08.8TBCHV-A.G1, consultável em www.dgsi.pt.
[18] No âmbito do processo n.º 219/11.9TVLSB.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[19] “Depuseram as testemunhas de forma calma, serena e esclarecedora, mereceram credibilidade quanto ao segmento da realidade que conheciam e estiveram na origem dos factos dados por provados e/ou não provados, com exceção de uma parte do depoimento da testemunha DD, Inspetor de Hotelaria (Gestor de Operações), cujo teor não se mostrou compatível com a posição escrita da R. transmitida à A., em momento posterior à entrada na AutoEuropa e a qual este não podia desconhecer.
[20] Desde julho de 2009.
[21] Vide documento 3 junto com a contestação.
[22] Que já se reporta ao art. 18 da petição inicial.
[23] Que já se reporta ao art. 20 da petição inicial.
[24] E referente à qual o tribunal a quo não tomou qualquer posição, sendo que consta do pedido de impugnação fáctica interposto pela Autora, conforme mencionámos supra.
[25] Na versão da Lei n.º 73/2017, de 16-08.
[26] Parte II, 6.ª edição, 2016, Almedina, pp. 942-943.
[27] No âmbito do processo n.º 244/14.8TTALM.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[28] No âmbito do processo n.º 196/11.6TTPTM.E1, consultável em www.dgsi.pt.
[29] BTE n.º 30 de 15-08-2000 e BTE n.º 5 de 08-02-2003.
[30] Na versão já citada.
[31] Veja-se, neste sentido, o acórdão do TRL, proferido em 06-07-2011, no âmbito do processo n.º 1584/07.8TTLSB.L1-4, consultável em www.dgsi.pt.
[32] Veja-se o acórdão do TRG proferido em 20-10-2016 no âmbito do processo n.º 466/14.1TTVNF.G1, consultável em www.dgsi.pt.