Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2295/21.7T8FAR.E1
Relator: MANUEL BARGADO
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA
ERRO SOBRE O OBJECTO DO NEGÓCIO
RESPONSABILIDADE CONTRATUAL
ÓNUS DE ALEGAÇÃO E PROVA
Data do Acordão: 10/26/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I – O erro sobre o objeto do negócio, também denominado erro vício, ou erro motivo, por atingir os motivos determinantes da vontade, que assim é viciada na sua formação, é um erro na formação de vontade, enquanto o erro obstáculo ou na declaração, previsto no art.º 247º do CC, é um erro na formulação da vontade.
II - Porém, ambos os erros, para que relevem, isto é, para que permitam a anulação do negócio em que ocorreram, supõem sempre que a contraparte conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade do erro.
III - O art. 251º do CC remete para o disposto no art. 247º do mesmo diploma, que condiciona a anulabilidade da declaração à circunstância do declaratário (neste caso a 1ª ré) conhecer ou não dever ignorar a essencialidade, para o declarante (neste caso os autores), do elemento sobre que incidiu o erro.
IV - O artigo 17º, nº 1, al. b), da Lei nº 15/2013, de 8 de fevereiro – no âmbito dos deveres para com os clientes e os destinatários - determina que a empresa de mediação deve certificar-se da correspondência entre as características do imóvel objeto do contrato de mediação e as fornecidas pelos clientes, pelo que, imputando os autores responsabilidade civil à 2ª ré por inobservância de tal dever, cabe-lhes, nomeadamente, o ónus de alegação e prova dos pressupostos da responsabilidade civil inerente.
(Sumário elaborado pelo Relator)
Decisão Texto Integral:
Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

RELATÓRIO
AA e BB instauraram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra Sabino Villas-Real Estate Service, Lda. e Besthomes-Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda., pedindo que seja declarada a nulidade total ou anulação da escritura pública de compra e venda celebrada em 22 de outubro de 2018 entre a 1ª ré e os autores e, em consequência:
a) as rés sejam condenadas solidariamente a pagar aos autores a quantia de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), correspondente ao valor da compra dos imóveis objeto da escritura pública, bem como todas restantes despesas invocadas no presente articulado, devendo ser restituído aos autores tudo aquilo que por estes foi prestado ou valor correspondente e que ascende, na presente data, ao montante total de € 184.042,09 (cento e oitenta e quatro mil e quarenta e dois euros e nove cêntimos);
b) devem os bens imóveis objeto da escritura pública de compra e venda regressar à esfera jurídica da 1ª ré;
c) ser ordenado o cancelamento dos registos de aquisição em nome dos autores;
d) serem as rés condenadas solidariamente a pagar aos autores a quantia de € 9.000,00 (nove mil euros) por danos não patrimoniais nos termos do art. 496º do Código Civil; e
e) serem as rés condenadas ao pagamento de quaisquer despesas ou outros danos que os autores venham a incorrer até à anulação do registo de aquisição a seu favor e por motivo decorrente da celebração do negócio jurídico aqui impugnado nos termos do art.º 569.º do Código Civil.
Alegam, em síntese, ter sido celebrado negócio de compra e venda com a 1ª ré e em que a 2ª ré interveio enquanto mediadora imobiliária, cujo objeto foi um terreno para construção e no qual pretendiam construir uma moradia, o que era do conhecimento das rés, mas esse terreno não possui viabilidade construtiva, verificando-se erro sobre o objeto do negócio, que o torna anulável, por verificação dos pressupostos legais, devendo as rés ressarcir os prejuízos que os autores tiveram com a celebração do negócio.
Contestaram ambas as rés.
A ré Sabino Villas (1ª ré) invocou desconhecer a essencialidade para o negócio invocada pelos autores, impugnando os factos alegados, e concluindo pela não verificação dos pressupostos para anulação do negócio e condenação no pedido.
A ré Besthomes (2ª ré) invocou a sua ilegitimidade e impugnou a generalidade dos factos alegados, requerendo ainda a intervenção principal da Ageas Portugal - Companhia de Seguros, S.A., em virtude de contrato de seguro celebrado, mediante o qual transferiu para a chamada a responsabilidade civil pelos riscos inerentes ao exercício da atividade de mediação imobiliária.
Os autores responderam à matéria de exceção invocada, concluindo pela sua improcedência.
Admitida a intervenção principal provocada, a interveniente veio invocar a sua ilegitimidade, por o contrato de seguro não se encontrar em vigor na data dos factos, impugnando os factos alegados.
Os autores vieram ampliar o pedido formulado a título de danos patrimoniais para o montante de € 191.222,33.
Foi realizada audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade da interveniente Ageas, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.
Realizou-se a audiência de julgamento e, a final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, ao abrigo das citadas disposições legais, decido julgar a ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência:
a) declaro a anulação do contrato de compra e venda celebrado em 22 de outubro de 2018 entre os autores e a primeira ré, identificado no ponto n.º 24 dos factos provados e, por conseguinte;
b) condeno a primeira ré a restituir aos autores o montante de €150.000,00, correspondente ao preço da compra e venda, acrescida de juros de mora, contados desde a citação até integral e efetivo pagamento;
c) determino a restituição à esfera jurídica da primeira ré dos bens imóveis objeto da compra e venda e, consequentemente, ordeno o cancelamento do registo de aquisição realizado a favor dos autores;
d) condeno as rés, solidariamente, a pagar aos autores o montante de € 7.348,84, acrescido de juros de mora, contados desde a citação até integral e efetivo pagamento;
e) condeno as rés, solidariamente, a pagar aos autores os montantes por estes pagos relativos aos juros e às despesas com o empréstimo contraído para a compra e venda, ao pagamento antecipado do empréstimo e ao IMI referente ao ano de 2021 e subsequentes, a liquidar em execução de sentença, com o limite do pedido;
f) absolvo as rés e interveniente do demais peticionado.
*
Custas da ação pelos autores e pelas rés, na proporção do decaimento (art.º 527.º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil).»

Inconformadas, as rés apelaram do assim decidido, finalizando a respetiva alegação com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem.
No recurso da 1ª ré:
«A. Vem a Recorrente apresentar o presente recurso visto que, salvo o devido respeito, discorda da decisão tomada pelo Tribunal a quo, a qual vai no sentido de imputar a responsabilidade por um alegado erro na formação da vontade negocial dos autores à ora Recorrente.
B. Importa apreciar os Factos Dados Como Provados e os Factos Dados Como Não Provados, o que, seguindo esta linha de raciocínio se tem como certo que se chegará, necessariamente, a uma conclusão diversa daquela a que o Tribunal a quo chegou, sendo inevitável alterar-se o sentido da decisão tomada, sendo indeferido o pedido apresentado pelos AA.
C. O Tribunal a quo dá como provado que os autores queriam adquirir um terreno “a fim de nele edificarem uma moradia para passar férias com os filhos (…)”
D. Contudo, a ora Recorrente não sabia dessa intenção visto que jamais foi comunicado à ora Recorrente, seja pelos autores, seja pela co-ré Besthomes, que essa seria a intenção dos autores, o que faz com que a ora Recorrente desconhecesse as intenções dos autores relativamente ao negócio.
E. Por essa razão, o Facto Dado como Provado 9 deve ser considerado como não provado mas acrescentando-se que a ora Recorrente desconhecia, em absoluto, essa intenção.
F. O Tribunal a quo insiste em que tudo foi feito pela ora Recorrente, havendo alturas em que tal foi feito através da segunda ré, o que, salvo melhor opinião, não corresponde à verdade visto que a participação da ora Recorrente no negócio em apreço nos presentes autos resume-se a ter colocado um terreno à venda, aceite um determinado preço de oferta e celebrado a escritura pública de compra e venda, não tendo tido outra intervenção, como aliás vem bem espelhado no Facto Dado como Provado 27.
G. A ora Recorrente nunca conheceu sequer os autores pelo que seria impossível transmitir-lhes seja o que for.
H. Nesse sentido, devia constar como Facto Provado o seguinte: “Os autores não tiveram acompanhamento de advogado, confiando nas informações transmitidas, apenas e só, pela segunda ré Besthomes.”.
I. Não ficou inequivocamente demonstrado que não era possível construir no lote de terreno em apreço nos autos, o que se alcança do depoimento das testemunhas que trabalham na Câmara Municipal de Loulé, sendo que nenhuma testemunha foi conclusiva relativamente a este tema concreto.
J. O que ficou perfeitamente demonstrado é que não havia certeza de que não se pudesse vir a construir naquele lote de terreno, sendo certo que ainda por cima não foi ouvida a pessoa (funcionária da Câmara Municipal) que transmitiu tal informação aos autores pelo que o Facto Dado como Provado 34 deveria constar como Facto Dado Como Não Provado.
K. A ora Recorrente nunca teve conhecimento de nenhum facto referente ao negócio, a não ser os que já foram mencionados em cima, devendo considerar-se que o conhecimento era, única e exclusivamente, da segunda ré Besthomes.
L. Salvo o devido respeito, o Tribunal a quo não pode dar como provado que não seria possível construir nos prédios vendidos e, mais à frente, referir que ficou provado que no alinhamento destes prédios existem outras construções, inclusive moradias, o que é inequívoco visto que são existências corpóreas.
M. E como uma das realidades é corpórea, incontornável, incontestável, então é a outra realidade que não pode existir, ou seja, se já há construções, inclusive moradias, no alinhamento dos prédios em causa, então o Facto “Não se pode construir nos prédios em apreço” tem de ser um Facto Dado Como Não Provado.
N. Ficou perfeitamente demonstrado que a ora Recorrente estava convencida de que se podia construir nos prédios ora em apreço.
O. E isto por duas razões: a ora Recorrente tinha na sua posse um PIP aprovado e não havia nenhuma indicação de que a realidade transcrita no PIP tivesse sido alterada, como foi testemunhado pelo Arq. CC e pelos funcionários da Câmara Municipal.
P. A acrescer, como o Tribunal a quo refere e bem, existem inúmeras construções no alinhamento dos prédios em questão, o que indicia a possibilidade de construção.
Q. Por todas estas razões, o Facto Não Provado c) deve ser considerado como Facto Provado.
R. Salvo melhor opinião, o Tribunal a quo andou mal quando interpreta os factos e as provas que foram carreados para os autos, o que condiciona a apreciação do ponto de vista fáctico, mas também da própria aplicação do Direito.
S. Salvo melhor opinião, parece que o Tribunal a quo ignora o facto de a ora Recorrente e os autores nunca se terem cruzado, o que faz com que a ora Recorrente pudesse saber quais eram as intenções dos autores.
T. Nem tão pouco, como ficou demonstrado, a ora Recorrente recebeu alguma indicação por parte da segunda ré Besthomes no sentido de informar das intenções ou expectativas dos autores.
U. A ora Recorrente apenas mandatou a segunda ré Besthomes para a venda dos prédios em questão nos autos, não existindo qualquer poder de representação.
V. Os autores foram, antes da assinatura do contrato, devidamente informados por um arquitecto do que se podia e não podia fazer no terreno.
W. Como se alcança do depoimento do Arq. CC, os autores foram informados de todas as contingências dos prédios que estavam a comprar, ou seja, além de a ora Recorrente não ter tido qualquer contacto com os autores, a verdade é que foi o Arq. CC que informou os autores da viabilidade de construção naqueles prédios.
X. A haver algum erro, este foi fomentado pelo Arq. CC, o qual foi contratado directamente pelos autores.
Y. Cumpre também mencionar que nunca foi a ora Recorrente a anunciar os prédios como “prédios para construção” – os anúncios estão nas páginas online da segunda ré ou foram da criação da segunda ré, a quem a ora Recorrente incumbiu de vender os terrenos.
Z. E assim sendo, como foi, o facto de, eventualmente, os anúncios serem “enganadores”, a verdade é que não tiveram qualquer interferência no momento da tomada de decisão dos autores.
AA. Aquilo que, objectivamente, fez os autores decidirem pela compra dos terrenos foi a reunião havida com o Arq. CC.
BB. Repete-se…a ora Recorrente não conheceu os autores; a ora Recorrente não veiculou qualquer informação aos autores; a ora Recorrente não publicou qualquer anúncio referente aos imóveis; a ora Recorrente não indicou sequer o Arquitecto com quem os autores reuniram.
CC. Em relação ao pedido de indemnização formulado pelos autores, a ora Recorrente adere ao que foi aduzido pela Recorrente Besthomes.
DD. A ora Recorrente, em momento algum, pediu que os autores recorressem ao crédito bancário – essa foi uma decisão da sua exclusiva responsabilidade.
EE. Os autores não poderiam cumprir o prazo estipulado pelo Banco, o qual se fixava em dois anos.
FF.A escritura de compra e venda foi outorgada em 22 de Outubro de 2018, tendo o projecto dado entrada na Câmara Municipal de Loulé em 26 de Agosto de 2019, tendo sido indeferido no dia 26 de Maio de 2020.
GG. Perante estas datas conclui-se que os dois anos estipulados pelo Banco jamais poderiam ser cumpridos, isto é, foram os próprios autores que causaram o incumprimento contratual com o Banco.
HH. É que mesmo que o projecto tivesse sido aprovado, a verdade é que ainda faltavam alguns passos a serem dados, designadamente, projectos de especialidade, entre outros que a Câmara Municipal entendesse por pertinentes.
II. E não sendo a ora Recorrente quem deu azo a esse incumprimento, é o mesmo que dizer que não é responsável pelo referido incumprimento, nem tão pouco responsável por qualquer indemnização.
JJ. Os autores nunca contestaram o indeferimento da Câmara Municipal, pelo que não se pode afirmar com toda a certeza que não se possa construir ou que, à data da escritura, não se pudesse construir.
KK. Aliás, conforme se pode alcançar das fotografias actuais que se juntam como Doc. n.º 1, e que aqui se dá por integralmente reproduzido, todos os terrenos à volta estão já construídos e estão a decorrer obras nos terrenos adjacentes.
LL. Desde logo, como já foi referido em cima, os autores não foram aliciados a comprar os terrenos – estavam de passagem e viram uma placa da segunda ré Besthomes e entraram em contacto com a agência.
MM. Antes mesmo de celebrarem qualquer contrato, os autores tiveram a oportunidade de esclarecerem todas as dúvidas relativamente à possibilidade de construção com o Arquitecto CC, o qual não trabalha, nem é funcionário de nenhuma das rés.
NN. Foi com as indicações e esclarecimentos deste Arquitecto que os autores formaram a sua vontade negocial – não foi com as informações prestadas pela segunda ré, nem tão pouco por informações prestadas pela ora Recorrente, a qual nunca conheceu os autores.
OO. Não se pode alegar um erro na formação da vontade negocial quando foram os próprios autores que não cuidaram de fazer todas as pesquisas no sentido de averiguar se havia, ou não, a possibilidade de construção.
PP. Refere o Tribunal a quo “que caso soubesse que era inviável construir nos prédios adquiridos não teriam realizado a compra e venda (…)” (itálico nosso) mas o certo é que os autores nem apresentaram um novo PIP, nem contestaram o indeferimento da Câmara Municipal.
QQ. O erro na formação da vontade ora em causa depende da reunião de três requisitos:
a) Que a vontade declarada esteja viciada por erro sobre o objecto do negócio ou as suas qualidades e, por isso, seja divergente da vontade que o declarante teria tido sem tal erro;
b) Que, para o declarante, seja essencial o elemento sobre o qual incidiu o erro, de tal forma que não teria celebrado o negócio jurídico se se tivesse apercebido do erro, e;
c) Que o declaratário conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o erro para o declarante.
RR. Estes três requisitos não se verificam cumulativamente, nem tão pouco se verifica qualquer um deles considerados em separado.
SS. Relativamente à alínea a) supra, cumpre referir que os autores não fizeram o que estava ao seu alcance para minimizar os riscos ou para garantirem a possibilidade de construção nos terrenos – contrataram um arquitecto mas não apresentaram um novo PIP, nem tão pouco contestaram o indeferimento da Câmara Municipal.
TT. Em relação à alínea b) supra, sempre se dirá que os autores não indicaram no contrato-promessa de compra e venda, ou na escritura pública, a essencialidade do negócio, ou seja, caso a possibilidade de construção fosse um elemento essencial, os autores teriam indicado isso mesmo nos documentos supra mencionado.
UU. Em relação à alínea c) supra, cumpre mencionar que a ora Recorrente nunca sequer conheceu os autores, pelo que é impossível que conhecesse a essencialidade do elemento sobre o qual incidiu o eventual erro.
VV. O contrato de mediação imobiliária é um contrato-tarefa, ou seja, através deste contrato a ré Besthomes ficou habilitada a vender os terrenos, não tendo ficado habilitada a representar a ora Recorrente.
WW. As consequências das informações prestadas pela ré Besthomes jamais poderão recair na esfera jurídica da ora Recorrente.
XX. E a falta de poderes de representação é tão clara nos presentes autos que foi a ora Recorrente que foi assinar o contrato promessa de compra e venda e que foi assinar a escritura pública de compra e venda.
YY. Cumpre mencionar que a ora Recorrente nunca foi informada pela ré Besthomes desse essencialidade, tal como ficou demonstrado nos presentes autos.
ZZ. Assim, não estando verificados os requisitos dos artigos 247º e 251º, do Código Civil, seja singularmente, seja cumulativamente, conclui-se que o erro na formação da vontade dos autores não se verifica.
Nestes termos,
E nos demais de direito aplicável, deve a sentença em crise ser revogada e substituída por outra que declare improcedente o pedido apresentado pelos AA.
Assim se fazendo a costumeira JUSTIÇA».

No recurso da 2ª ré:
A. Os Recorridos AA e BB intentaram ação declarativa de condenação contra a ora Recorrente e a sociedade Sabino Villas-Real Estate Service, Lda., peticionando a declaração de nulidade total ou anulação da escritura pública de compra e venda celebrada em 22 de outubro de 2018 entre os Recorridos e a sociedade Sabino Villas- Real Estate Service, Lda
B. A ora Recorrente não concorda com a factualidade dada como provada nos pontos 8.º a 11.º, 15.º, 17.º e 37.º dos factos provados.
C. No que concerne ao ponto 8.º dos factos provados, resultou apenas provado que a ora recorrente anunciou para venda os prédios identificados em 3.º e 4.º, não tendo sido feita prova da forma como os mesmos estavam anunciados, pois que, os Autores tomaram eles próprios conhecimento direto dos prédios ao passarem pelos mesmos e visualizarem a placa publicitária com os dados da ora Recorrente e após dirigiram-se às instalações da Recorrente a fim de obterem informações. - Vide neste sentido as declarações prestadas pela Autora/Recorrida AA – prestadas no dia 27/09/2022 (ficheiro áudio n.º 20220927145405_4213290_2870816.wma), minuto 00:06:42 a minuto 00:08:05; e declarações da Testemunha DD – prestadas no dia 27/09/2022 (ficheiro áudio n.º 20220927103047_4213290_2870816.wma) minuto 00:00:04 a minuto 00:00:41.
D. Pelo que, apenas se deveria ter dado como provado que a Segunda Ré anunciou para venda os prédios identificados em 3.º e 4.º.
E. Assim, e quanto ao ponto 8 resultou provado que: “Para esse efeito a primeira Ré facultou à Segunda Ré as cadernetas prediais e as certidões prediais relativas aos prédios e este foram anunciados para venda pela Segunda Outorgante.”
F. No que concerne aos pontos 9 a 11 dos factos provados, e conforme já supra referido não foi a Segunda Ré quem deu a conhecer aos Autores, ora Recorridos, os prédios identificados em 8, foram sim os Recorridos que passaram pelos Prédios viram a placa publicitária da Recorrente e dirigiram-se às suas instalações para obter mais informações, tendo sido atendidos pela testemunha DD.
G. Não obstante os recorridos terem gostado da localização dos prédios, como o valor dos mesmos era superior ao valor que pretendiam despender a comercial DD apresentou-lhes outros prédios tendo inclusive os Recorridos chegado a efetuar reserva de um dos prédios, não tendo o negócio concretizado porquanto os Recorrentes não transferiram o valor do sinal no devido tempo.
H. Após a frustração do outro negócio, foram os Recorridos que voltaram a demonstrar interesse nos prédios da Primeira Ré uma vez que a Recorrida mulher havia ficado “apaixonada” pelos mesmos.
I. Os prédios da Primeira Ré nunca foram apresentados aos Recorridos pela ora Recorrente.
J. Veja-se neste sentido as declarações da Autora/Recorrida AA – prestadas no dia 27/09/2022 (ficheiro áudio n.º 20220927145405_4213290_2870816.wma), minuto 00:06:42 a minuto 00:08:05 e minuto 00:10:56 a minuto 00:14:19, e da Testemunha DD – prestadas no dia 27/09/2022 (ficheiro áudio n.º 20220927103047_4213290_2870816.wma), minuto 00:00:04 a minuto 00:00:41, minuto 00:02:18 a minuto 00:04:19, minuto 00:04:46 a minuto 00:08:53 e minuto 00:13:19 a minuto 00:13:47.
K. Pelo que, quanto aos factos 9 a 11, resultou efetivamente provado que:
Facto 9: “Os autores residem em França e decidiram, no ano de 2017, adquirir um terreno para construção no concelho de Loulé a fim de nele edificarem uma moradia para passar férias com os filhos.”
Facto 10:“Os Autores passaram pelos prédios identificados nos pontos 3.º e 4.º e visualizaram a placa publicitária da segunda Ré, pelo que, dirigiram-se às instalações da mesma para obterem informações sobre os prédios, tendo sido informados que o valor de venda era de €170.000,00.
Facto 11: “Após visitarem vários terrenos e frustrada a aquisição de outro terreno, os Autores uma vez que continuavam interessados na localização e características dos prédios identificados em 3.º e 4.º e apresentaram proposta de aquisição pelo valor de 150.000,00€ que foi aceite pela Primeira Ré/vendedora.”
L. Não pode, igualmente, a Recorrente concordar com o facto 15 dos factos provados, pois que e conforme resulta do facto 14, os Recorridos reuniram com um arquiteto, tendo a referida reunião tido lugar antes da assinatura do contrato promessa de compra e venda.
M. Foi no decurso da referida reunião, que o Arquitecto CC assegurou aos Recorridos as características construtivas dos prédios, ou seja, foi o arquiteto e não a ora Recorrente quem assegurou aos Recorridos que podiam construir no terreno ou que o terreno tinha viabilidade construtiva atendendo a que se inseria numa área de expansão urbana e que existia um pedido de informação prévia favorável. – Vide neste sentido as declarações da testemunha CC (ficheiro áudio n.º 20220705143602_4213290_2870816.wma) prestadas no dia 05/07/2022, minuto 00:08:09 a minuto 00:14:22 e minuto 00:14:51 a minuto 00:15:20:
N. Quanto ao ponto 15, da prova produzida, resultou provado que: “Nessa reunião os Autores foram informados pelo Arquitecto CC que podiam construir no terreno atendendo a que se inseria numa área de expansão e existia pedido de informação prévia favorável.”
O. E o mesmo se diga quanto ao facto 17 dos factos provados, pois que, os recorridos reuniram com um arquitecto, o qual possuí conhecimentos específicos e, como tal, a informação sobre a viabilidade construtiva foi fornecida pelo Arquitecto e não pela ora recorrente. Veja-se neste sentido as declarações supra referidas da testemunha CC prestadas no dia 05/07/2022 (ficheiro áudio n.º 20220705143602_4213290_2870816.wma), minuto 00:08:09 a minuto 00:14:22 e minuto 00:14:51 a minuto 00:15:20, bem como, as declarações prestadas pela testemunha DD no dia 27/09/2022 (Ficheiro áudio n.º 20220927103047_4213290_2870816.wma - minuto 00:37:47 a minuto 00:38:14 a minuto 00:40:06 a minuto 00:40:56 e ficheiro áudio n.º 20220927111523_4213290_2870816.wma – minuto 00:01:00 a minuto 00:01:28), das quais resulta que os Recorridos reuniram com o Arquitecto CC antes da assinatura do contrato promessa.
P. Assim, resultou efetivamente provado quanto ao ponto 17 que: “Os Autores não colocaram em causa a informação transmitida pelo Arquitecto, garantindo que podiam construir, celebrando, no dia 11 de Agosto de 2018, o contrato-promessa de compra e venda.”
Q. Não pode a Recorrente concordar com o facto provado no artigo 37.º, pois que, nos prédios vendidos era possível construir, pois que, caso assim não fosse a Câmara Municipal de Loulé não teria emitido parecer favorável (facto 6 dos factos provados).
R. Da produzida apenas resultou provado que em 26/05/2020 não era permitida a construção por o prédio estar localizado em “espaço canal”, mas não resultou provado que à data da aquisição dos prédios pelos Autores, ora Recorridos, não era permitida a construção!!!
S. Tanto mais que, resultou provado que “No alinhamento onde foi projectada a construção da moradia existem outras construções, inclusive moradias.” – facto 45 dos factos provados.
T. Das declarações das testemunhas EE, FF, GG e HH, resultou que “até determinada data, foi permitida a realização de construções nesse “espaço canal” (…) embora se mantivesse desde 1995 a mesma legislação em vigor, mormente do regulamento do PD, que não permitia a realização da construção.”
U. Não ficou assim provado que à data da aquisição não era possível a construção!!!!
V. Veja-se neste sentido as declarações das testemunhas EE prestadas no dia 27/09/2022 (ficheiro áudio n.º 20220927121357_4213290_2870816.wma) minuto 00:05:03 a minuto 00:07:29, FF prestadas no dia 27/09/2022 (ficheiro áudio n.º 20220927140844_4213290_2870816.wma), minuto 00:15:35 a minuto 00:17:02; da testemunha GG (ficheiro áudio n.º 20221025101008_4213290_2870816.wma ) prestadas no dia 25/10/2022, minuto 00:08:05 a minuto 00:08:41 e minuto 00:11:05 a minuto 00:12:44; e da testemunha HH prestadas no dia 25/10/2022 (ficheiro áudio 20221025103405_4213290_2870816.wma) minuto 00:04:16 a minuto 00:08:07 e minuto 00:09:54 a minuto 00:13:02.
W. Todas as referidas testemunhas confirmaram que não obstante o Regulamento do PDM de 95 considerar a área onde os prédios objecto dos autos se localizam como área “non-edificandi”, a verdade é que a Câmara Municipal de Loulé permitia a construção no espaço canal, tanto que o pedido de informação prévia para construção obteve despacho favorável.
X. Pelo que, quanto ao referido facto 37, da prova produzida resultou provado que:
“Nos prédios vendidos à data de 26/05/2020 não era possível construir uma moradia unifamiliar por se localizarem “em espaço canal”, que corresponde a corredor de protecção.”
Y. Data em que foi proferida a intenção de indeferimento do projecto dos Recorridos. – (Artigo 32 dos factos provados)
Z. Atento ao supra exposto e em face da prova produzida deverão ser alterados os factos dados como provados nos artigos 8.º a 11.º, 15.º, 17.º e 37.º.
AA. Em face da alteração aos factos provados ora considerada, somos em crer que não se verificam os pressupostos do erro sobre o objecto do negócio.
BB. Da prova produzida em Tribunal, nomeadamente, as declarações das testemunhas CC, EE, FF, GG e HH resulta claro que, não obstante o regulamento do PDM de 1995 manter-se em vigore e sem alterações, existia um entendimento na Câmara Municipal de Loulé em que era permitida a construção no “espaço canal”.
CC. Não foi feita prova que à data da celebração da escritura de compra e venda já não era permitida/admissível a construção no “espaço canal”, e, consequentemente, que à data da celebração da escritura de compra e venda não fosse possível construir nos prédios objecto do negócio.
DD. Não podemos deixar de referir que a descrição de um terreno como talhão de terreno para construção não resulta de declaração do proprietário nesse sentido, sendo necessário, ao invés, declaração da Autoridade Administrativa, neste caso, da Câmara Municipal, a qual no caso “sub iudice” ocorreu com o pedido de informação prévia, a qual emitiu parecer favorável à construção, pelo que, foi em face da resposta ao pedido de informação prévia que a Primeira Ré logrou alterar a afectação do prédio rústico para “talhão de terreno para construção”, sendo que, não tendo o regulamento do PDM do Concelho de Loulé sofrido qualquer alteração desde o ano de 1995 não havia motivo ou razão para duvidar da viabilidade construtiva do prédio.
EE. Em face da documentação existente e mantendo-se o PDM sem alterações, não havia razões ou motivos para colocar em causa a viabilidade construtiva dos prédios.
FF. Não se mostram preenchidos os pressupostos para que seja anulado o contrato de compra e venda celebrado entre os Recorridos e a primeira Ré.
Mas caso V. Exas. considerem que se mostram preenchidos os pressuposta da anulação do contrato de compra e venda, o que por mera hipótese se admite, sempre se dirá que:
GG. A ora Recorrente não violou quaisquer deveres ou regras resultantes da sua atividade, nomeadamente, não violou a Recorrente o artigo 17.º da Lei 15/2013.
HH. A Recorrente informou os Recorridos das características dos prédios tal e qual as mesmas constavam dos documentos entregues pela vendedora, ora Primeira Ré, não tendo razões para duvidar das referidas características.
II. Dos documentos entregues pela Primeira Ré era e é possível comprovar que um dos prédios consubstanciava um talhão de terreno para construção urbana, com área de implantação de 194,50m2 – Vide descrição predial de fls. 85/85v e documento n.º 7 junta à PI.
JJ. Foi a Recorrente quem aconselhou os Recorridos a recorrerem aos serviços de um arquiteto de modo a que pudessem verificar a viabilidade construtiva dos prédios ainda antes da assinatura do contrato promessa e de compra e venda, e foi isso que os Recorridos fizeram, pois que, reuniram com o Arquiteto CC antes da assinatura do contrato promessa de compra e venda e o referido arquiteto assegurou-lhes a viabilidade construtiva e foi esta segurança criada pelo Arquiteto e não pela ora Recorrente, que fez com que os recorridos avançassem com o negócio. – Vide factos 15 e 17 dos factos provados em face da alteração ora Requerida.
KK. Foi o arquiteto quem confirmou a viabilidade construtiva dos prédios quem criou nos recorridos a confiança que poderiam construir nos prédios.
LL. Constando dos documentos entregues pela Primeira Ré à Recorrente que um dos prédios era um talhão de terreno para construção, não tinha a ora recorrente razões ou motivos para colocar em causa a viabilidade construtiva do terreno, tanto que, o terreno já possuía essa característica à data em foi celebrado o contrato de mediação. (Vide contratos de mediação imobiliária de fls. 133v a 135).
MM. Assim, não verificou a violação de quaisquer deveres por parte da ora Recorrente, a qual sempre atuou de boa-fé.
NN. Ainda no que concerne aos prejuízos sofridos pelos Recorridos, a circunstância dos mesmos terem recorrido a empréstimo bancário é alheia à ora Recorrente, não foi por causa da ora recorrente que os mesmos recorreram ao crédito bancário, tendo ainda resultado demonstrado que os recorridos tinham como condição a realização de construção no prazo de dois anos (facto 23 dos factos provados).
OO. A escritura de compra e venda foi outorgada a 22/10/2018, o projecto deu entrada a 26/08/2019, sendo que, a intenção de indeferido do projecto é datada de 26/05/2020, o que significa que os recorridos, ainda quem, o projecto fosse aprovado em 26/05/2020, não tinham lograriam cumprir com o prazo de 2 anos para a construção, pois que, ainda teriam que apresentar os projectos de especialidades e só após poderiam obter a licença de construção, pelo que, incumpririam sempre com o contrato de financiamento.
PP. Não pode assim ser a recorrente responsabilizada pelo incumprimento dos Recorridos.
QQ. Atento ao supra exposto, deverá o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, serem alterados os factos 8.º a 11º, 15.º, 17 e 37.º dos factos provados e ser a Segunda Ré, ora Recorrente, absolvida do Pedido.»

Não foram apresentadas contra-alegações.

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões a decidir consubstanciam-se em saber:
- se deve ser alterada a decisão sobre a matéria de facto nos pontos impugnados pelas recorrentes;
- se existiu erro sobre o objeto do negócio de compra e venda realizado entre os autores e a 1ª ré que o torna anulável, e, em caso afirmativo, quais as consequências;
- Se a ré mediadora imobiliária (2ª ré) violou deveres e causou danos aos autores que lhe cabe ressarcir.

III – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
1- A primeira ré Sabino Villas- Real Estate Service, Lda. foi constituída em 25 de setembro de 2001 e tinha por objeto a mediação imobiliária, administração de imóveis por conta de outrem, serviços de administração, manutenção, limpeza, reparações, substituições, obras interiores ou exteriores, em bens móveis ou bens imóveis incluindo jardins e piscinas; arrendamento de imóveis e aluguer de bens moveis e equipamentos de lazer e desporto; exploração e gestão de estabelecimentos hoteleiros ou complexos urbanísticos e atividades de turismo relacionadas com tais complexos ou estabelecimentos; gestão, exploração, administração e manutenção de estabelecimentos de restauração e bebidas, compra e venda de imóveis e a revenda dos adquiridos para o mesmo fim; manutenção, limpeza e administração de campos de golfe e ténis (cf. doc. de fls.91/94, cujo teor se dá por reproduzido).
2- A segunda ré Besthomes-Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda. foi constituída em 09 de setembro de 2008 e tem por objeto a mediação imobiliária e atividade de intermediação crédito (cf. doc. de fls.131vº/133, cujo teor se dá por reproduzido).
3- A primeira ré tinha inscrito a seu favor o direito de propriedade sobre o prédio rústico, composto por terra de cultura e amendoeiras, sito em ..., freguesia de Almancil, inscrito na matriz predial rústica sob o art.º ...07, com a área de 640,82m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sob o n.º ...09 (cf. doc. De fls.84/84vº, cujo teor se dá por reproduzido).
4- E sobre o prédio urbano, composto por talhão de terreno destinado a construção urbana, sito em ..., freguesia de Almancil, inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...25, com a área de 389,18m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sob o n.º ...26, o qual foi desanexado do prédio identificado em 3. (cf. doc. de fls.85/85vº, cujo teor se dá por reproduzido).
5- No dia 21 de agosto de 2006 a primeira ré deu entrada nos serviços administrativos da Câmara Municipal de Loulé de um pedido de informação prévia relativo à viabilidade de realização de obras de construção num terreno inscrito na matriz sob o art.º rústico n.º ...07, sito em ..., freguesia de Almancil, que veio a correr os seus termos sob o n.º 7370/06 (cf. doc. de fls.116vº/117, cujo teor se dá por reproduzido).
6- Através de notificação datada de 06 de agosto de 2007, o departamento de administração do território da Câmara Municipal de Loulé notificou o legal representante da primeira ré de que:
«Relativamente ao assunto indicado em epígrafe, cumpre-me informar V. Exª que o mesmo foi deferido por despacho do Sr. Presidente de 2007/07/27, com os seguintes condicionamentos:
· Caso pretenda dar continuidade à actual pretensão, procedendo ao Licenciamento Administrativo nesta edilidade, deverá ter em consideração a Rede Viária proposta no Plano de Urbanização de Almancil (em anexo encontra-se uma fotocópia de uma parte do Plano de Urbanização de Almancil, à escala 1.25000, onde é possível localizar o terreno proposto). Mais se informa, que deverão ser cedidas a esta Câmara Municipal, gratuitamente, as áreas de terreno necessárias para a futura estruturação viária do Plano de Urbanização em questão, pelo que essa cedência deverá estar em conformidade com o trajecto das vias propostas;
· Para além da situação anteriormente referida, a dita proposta também deverá ter em atenção as edificações já existentes, devendo respeitar os alinhamentos principalmente com o edifício situado imediatamente a Norte com o limite do terreno;
· Sabendo que o terreno da actual pretensão está inserido em Espaços Urbanos, Espaços Urbanizáveis Tipo A, numa situação de aglomerado urbano, a futura proposta deverá garantir a continuidade do tecido urbano como também uma adequada relação com o espaço da envolvente. Desta forma, a futura proposta a licenciar nesta câmara municipal deverá ter em atenção a rede de arruamentos (previstos no Plano de Urbanização de Alamncil), volumetrias, alinhamentos e profundidade das construções existentes como também os elementos construtivos, garantindo assim a higiene e salubridade.
De acordo com o disposto no n.º 3, do artifo16.º, do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16 de dezembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 177/2001 de 4 de Junho, a aprovação urbanística projectada encontra-se sujeita à forma de procedimento de controlo prévio prevista na Subsecção III (Licença), da Secção II, do Capítulo II, do referido diploma;
O respectivo processo de licenciamento deverá ser instruído de acordo com a legislação aplicável e o Projecto de Arquitectura e deverá cumprir as demais normas regulamentares, bem como o já referido Regulamento do PDM de Loulé; (cf. doc. de fls.116vº/117, cujo teor se dá por reproduzido)».
7- No âmbito da sua atividade, a segunda ré foi contratada pela primeira ré para mediar a venda dos prédios identificados em 3. e 4. (cf. doc. de fls.133vº/135, cujo teor se dá por reproduzido).
8- Para esse efeito a primeira ré facultou à segunda ré as cadernetas prediais e as certidões prediais relativas aos prédios e estes foram anunciados como “terreno para construção”.
9- Os autores residem em França e decidiram adquirir um terreno para construção no concelho de Loulé a fim de nele edificarem uma moradia para passar férias com os filhos, recorrendo no ano de 2017 aos serviços prestados pela segunda ré Besthomes.
10- Após visitarem vários terrenos e frustrada a aquisição de outro terreno, a segunda ré deu-lhes a conhecer o terreno para construção referido em 8., em venda pelo preço de €170.000,00.
11- Os autores ficaram interessados na localização e caraterísticas deste terreno e apresentaram uma proposta de aquisição pelo valor de €150.000,00 que foi aceite pela primeira ré/vendedora.
12- A segunda ré foi informada que os autores iriam adquirir o terreno para construir uma moradia com recurso a financiamento bancário.
13- Os autores não tiveram acompanhamento de advogado, confiando nas informações transmitidas pela ré vendedora, através da ré mediadora imobiliária.
14- A segunda ré, a pedido dos autores, aconselhou a escolha de um arquiteto, o qual reuniu com estes na agência imobiliária.
15- Nessa reunião os autores foram informados pela segunda ré que podiam construir no terreno atendendo a que se inseria numa área de expansão urbana e existia um pedido de informação prévia favorável.
16- Foram-lhes mostradas as plantas de localização do terreno, um diploma legal relativo à edificabilidade nos espaços urbanizáveis de expansão e o parecer favorável ao pedido de informação prévia.
17- Os autores não colocaram em causa a informação transmitida pela segunda ré, garantindo que podiam construir, celebrando, no dia 11 de agosto de 2018, o contrato-promessa de compra e venda.
18- No qual o terreno ficou identificado como um prédio rústico, sito em ..., Almancil, inscrito na matriz sob o n.º ...07 da freguesia de Almancil, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.º...09 e um prédio urbano composto por talhão de terreno para construção urbana, sito em ..., Almancil, inscrito na matriz urbana sob o artigo ...25 da freguesia de Almancil, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.º...26 (cf. doc. de fls.30vº/32vº cujo teor se dá por reproduzido).
19- Foi realizada nova reunião com o arquiteto na qual os autores informaram das características da moradia que pretendiam construir.
20- No dia 17 de agosto de 2018 o arquiteto apresentou a sua proposta de serviços para assessoria no projeto de licenciamento para construção da moradia unifamiliar.
21- A partir de final de agosto este arquiteto e uma funcionária da segunda ré enviaram aos autores orçamentos de empresas de construção.
22- No dia 07 de setembro de 2018 o arquiteto apresentou um estudo prévio relativo ao projeto de construção pretendido pelos autores.
23- Os autores solicitaram um empréstimo bancário ao “Banque BCP”, sediado em França, para a aquisição do terreno e para a construção da moradia, o qual foi aprovado para um montante de € 290.000,00 com a condição de a construção se realizar no prazo de dois anos.
24- Após aprovação do empréstimo foi agendada pela segunda ré a escritura de compra e venda, a qual se realizou no dia 22 de outubro de 2018, no Cartório Notarial .... P..., em Loulé (cf. doc. de fls.58/60, cujo teor se dá por reproduzido).
25- Os autores foram representados por funcionária da segunda ré, à qual outorgaram procuração por não poderem comparecer e que colaborou realização dos pagamentos de impostos e de despesas (cf. doc. de fls.58/60, cujo teor se dá por reproduzido).
26- Os autores procederam ao pagamento do preço no montante de €150.000,00, do IMT no montante de €9.450,00, do imposto de selo no montante de €1.200,00, dos honorários da notária no montante de €357,17 e do registo no montante de €270,00.
27- Os autores nunca conheceram a primeira ré ou o seu legal representante, nem com ele trocaram, diretamente, qualquer impressão ou dúvida sobre o negócio em causa.
28- A negociação do preço, obtenção de documentação, elaboração e celebração do contrato promessa e marcação da escritura de compra e venda foram efetuadas por intermédio da segunda ré.
29- No dia 06 de agosto de 2019 os autores outorgaram procuração a favor do arquiteto para os representar no processo de licenciamento para construção de moradia unifamiliar (cf. doc. de fls.64/65, cujo teor se dá por reproduzido).
30- No dia 26 de agosto de 2019 o projeto de licenciamento para construção deu entrada junto dos serviços da Câmara Municipal de Loulé e os autores liquidaram uma taxa no montante de €34,42.
31- Decorridos meses e após insistência dos autores o arquiteto informou-os que o processo de licenciamento estava parado no Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Loulé.
32- Através de ofício do Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Loulé, datado de 26 de maio de 2020, foi comunicada ao arquiteto a intenção de indeferir o projeto de licenciamento, por (…) “o prédio em causa incidir no espaço-canal que corresponde a corredor de proteção e constitui área non-aedificandi (artºs 56.º e 57.º do Regulamento do PDM Loulé)” (cf. doc. de fls.81/83vº, cujo teor se dá por reproduzido).
33- Em agosto de 2020 os autores regressaram a Portugal e deslocaram-se ao gabinete do arquiteto onde este informou-os que o projeto de licenciamento estava suspenso e que iria agendar reunião com a técnica da Câmara Municipal de Loulé.
34- Os autores ficaram preocupados e no dia 19 de agosto de 2020 deslocaram-se à Câmara Municipal de Loulé, onde foram informados que não era possível construir nos prédios adquiridos por se localizarem em “espaço-canal”.
35- Confrontado o arquiteto aconselhou os autores a recorrer aos serviços de advogado para reverter a intenção de indeferimento do pedido de licenciamento.
36- Os autores celebraram o negócio convencidos que poderiam construir uma moradia unifamiliar nos prédios adquiridos, o que era do conhecimento das rés.
37- Nos prédios vendidos não era, nem é possível, construir uma moradia unifamiliar por se localizarem em “espaço-canal”, que corresponde a corredor de proteção (zona “non-aedificandi”) (cf. doc. de fls.232, cujo teor se dá por reproduzido).
38- Se os autores tivessem conhecimento desta circunstância não teriam realizado a compra e venda.
39- Os autores pagaram a título de empréstimo bancário contraído para a aquisição dos prédios, até 28 de abril de 2022, um total de €18.315,34, nos quais se incluem capital, juros e despesas.
40- E pagaram Imposto Municipal sobre Imóveis relativos aos anos de 2018 a 2020 no montante global de €455,84.
41- Pelos serviços prestados pelo arquiteto os autores pagaram o montante de €5.129,10.
42- Pela procuração outorgada a favor da representante na escritura e certificação os autores pagaram o montante de €92,25 e pela procuração outorgada a favor do arquiteto o montante de €61,50.
43- Pelas viagens a Portugal, em agosto de 2020, para se inteirarem do andamento do processo de licenciamento os autores pagaram o montante total de €948,56.
44- Devido a toda a situação os autores sofreram transtorno psicológico.
45- No alinhamento onde foi projetada a construção da moradia existem outras construções, inclusive moradias.
46- A segunda ré havia celebrado com a interveniente Ageas Portugal-Companhia de Seguro, S.A. contrato de seguro, a que corresponde a apólice n.º ...19 (cf. doc. de fls181/188, cujo teor se dá por reproduzido).
47- Através do qual transferiu a responsabilidade decorrentes do exercício da atividade de mediação imobiliária, mediante o pagamento de um prémio, com cobertura de capital até €200.000,00, sem franquia, com período de vigência de 01.04.2021 a 31.03.2022 (cf. doc. de fls181/188, cujo teor se dá por reproduzido).
48- Caso os autores procedessem ao pagamento antecipado do empréstimo contraído, em 03 de maio de 2022, teriam de desembolsar a quantia de €154.783,15.

E foram considerados não provados os seguintes factos:
a) foi garantido aos autores que o terreno para construção tinha projeto de construção aprovado pela Câmara Municipal de Loulé;
b) os autores despenderam € 125,00 com despesas de alojamento;
c) a primeira ré estava convencida de que se poderia construir nos prédios vendidos.

Da impugnação da matéria de facto
Como resulta do artigo 662º, nº 1, do CPC, a decisão do tribunal de 1ª instância sobre a matéria de facto pode ser alterada pela Relação se os factos tidos como assentes e a prova produzida impuserem decisão diversa.
Do processo constam os elementos em que se baseou a decisão do tribunal de primeira instância sobre a matéria de facto: prova documental, declarações de parte da autora e depoimentos das testemunhas registados em suporte digital.
Considerando o corpo das alegações e as suas conclusões, pode dizer-se que a recorrente cumpriu formalmente os ónus impostos pelo artigo 640º, nº 1, do CPC, pelo que nada obsta ao conhecimento do recurso na parte atinente à impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
No que respeita à questão da alteração da matéria de facto face à incorreta avaliação da prova produzida, cabe a esta Relação, ao abrigo dos poderes conferidos pelo artigo 662º do CPC, e enquanto tribunal de 2ª instância, avaliar e valorar (de acordo com o princípio da livre convicção) toda a prova produzida nos autos em termos de formar a sua própria convicção relativamente aos concretos pontos da matéria de facto objeto de impugnação, modificando a decisão de facto se, relativamente aos mesmos, tiver formado uma convicção segura da existência de erro de julgamento da matéria de facto.
Foi auditado o suporte áudio e, concomitantemente, ponderada a convicção criada no espírito da Sr.ª Juíza a quo, a qual tem a seu favor o importante princípio da imediação da prova, que não pode ser descurado, sendo esse contacto direto com a prova testemunhal que melhor possibilita ao julgador a perceção da frontalidade, da lucidez, do rigor da informação transmitida e da firmeza dos depoimentos prestados, levando-o ao convencimento quanto à veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recaíram as provas.
Infere-se das conclusões da recorrente 1ª ré, que esta discorda da decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal a quo relativamente aos pontos 9, 13, 34, 36 e 37 dos factos provados e à alínea c) dos factos não provados, e das conclusões da recorrente 2ª ré infere-se que esta discorda da decisão proferida quanto aos pontos 8 a 11, 15, 17 e 37.
Vejamos, pois, cada um dos pontos da matéria de facto impugnados pelas rés/recorrentes.
Deu-se como provado no ponto 8 que a 1ª ré facultou à 2ª ré «as cadernetas prediais e as certidões prediais relativas aos prédios e estes foram anunciados como “terreno para construção”».
Este facto surge na sequência do que foi dado como provado no ponto 7, ou seja, que «[n]o âmbito da sua atividade, a segunda ré foi contratada pela primeira ré para mediar a venda dos prédios identificados em 3. e 4.».
Por sua vez, deu-se como provado nos pontos 9, 10 e 11, o seguinte:
«9- Os autores residem em França e decidiram adquirir um terreno para construção no concelho de Loulé a fim de nele edificarem uma moradia para passar férias com os filhos, recorrendo no ano de 2017 aos serviços prestados pela segunda ré Besthomes.
10- Após visitarem vários terrenos e frustrada a aquisição de outro terreno, a segunda ré deu-lhes a conhecer o terreno para construção referido em 8., em venda pelo preço de €170.000,00.
11- Os autores ficaram interessados na localização e caraterísticas deste terreno e apresentaram uma proposta de aquisição pelo valor de €150.000,00 que foi aceite pela primeira ré/vendedora.»
Diz a recorrente 2ª ré, no que respeita ao ponto 8, que apenas resultou provado que a mesma anunciou para venda os prédios identificados em 3 e 4, «não tendo sido feita prova da forma como os mesmos estavam anunciados, pois que, os Autores tomaram eles próprios conhecimento direto dos prédios ao passarem pelos mesmos e visualizarem a placa publicitária com os dados da ora Recorrente e após dirigiram-se às instalações da Recorrente a fim de obterem informações».
A recorrente assenta o seu entendimento nas declarações de parte da autora e nas declarações da testemunha DD, concluindo que apenas se devia ter dado como provado que a 2ª ré anunciou para venda os prédios identificados em 3 e 4.
Na sentença recorrida fundamentou-se a decisão do ponto 8 – e de outros –, nos seguintes termos:
«Evidenciando-se, ainda, dos depoimentos das testemunhas II, DD e CC e declarações de parte dos autores e do legal representante da segunda ré que, pela sua qualidade técnica, esta última testemunha foi convocada a participar nas reuniões com os autores não só para elaborar e acompanhar o projeto de licenciamento da moradia a edificar mas também para asseverar precisamente a viabilidade construtiva, chegando até a mostrar documentação legal para reforçar essa viabilidade (cf. fls.27/30).
Donde, da conjugação destes depoimentos e declarações de parte, em conjunto com as regras de experiência, resultou que, pela intenção manifestada, anúncio dos imóveis como terreno para construção, bem como documentos apresentados e explicados pela segunda ré e arquiteto, os autores estavam convencidos que podiam construir, o que era do conhecimento das rés (o próprio anúncio dessa construção atrai compradores que visam essa viabilidade construtiva, o que, só por si também faz com que o preço seja diferente de um terreno com destino agrícola).
Levando, deste modo, a considerar provada a factualidade vertida nos pontos nºs 8. a 17., 19., 27., 28., 36. e 38., dos factos provados, com a alteração da redação dos correspondentes artigos em que a mesma vem alegada relativa à prestação das informações e da garantia de construção através da intermediação da segunda ré.
Na verdade, foi através da segunda ré, e não diretamente pela primeira ré, que a garantia de construção da moradia foi prestada aos autores, pelo que se procedeu ao aditamento da correspondente factualidade nos factos provados (pontos n.ºs 13.2ª parte e 17.).»
Ouvidos todos os referidos depoimentos e declarações, resulta de forma clara que o terreno[1] em causa foi anunciado como sendo para construção, sendo isso que resulta inequívoco do depoimento da testemunha DD, que trabalhou para a 2ª ré de fevereiro de 2016 a fevereiro de 2019, e acompanhou todo o processo relativo à aquisição dos imóveis em causa, e das declarações de parte da autora, nem de outra forma poderia ter sido, considerando, ademais, que aos autores só interessava a aquisição de um terreno para construção.
Mal se compreenderia, aliás, que se o terreno não estivesse anunciado como sendo para construção, os autores tivessem contatado a 2ª ré, sendo que as transcrições parciais dos aludidos depoimento e declarações no corpo das alegações da 2ª ré, em nada contrariam aquele entendimento considerado na sua globalidade.
O mesmo se diga, aliás, quanto aos pontos 9, 10 e 11, porquanto a factualidade neles dada como provada reproduz fielmente a prova produzida a esse respeito, nomeadamente as declarações de parte da autora e o depoimento da testemunha DD.
Assim, não há a menor dúvida que os autores recorreram no ano de 2017 aos serviços prestados pela 2ª ré, que nas palavras da referida testemunha, era um serviço completo, isto é, até a casa estar construída, pelo que não faz o menor sentido eliminar do ponto 9 a expressão «recorrendo no ano de 2017 aos serviços prestados pela segunda ré Besthomes», como sustenta esta ré, nem tão pouco há que acrescenta a tal ponto que a 1ª ré «desconhecia, em absoluto, essa intenção», como esta defende, por tal estar manifestamente fora do âmbito do facto em causa.
Quanto ao ponto 10, a matéria nele vertida está em consonância com a prova produzida, não suscitando dúvidas que foi a 2ª ré que deu a conhecer aos autores o terreno para construção em discussão nos autos, como resulta claro do depoimento da testemunha DD e das declarações da autora, os quais devem ser apreciados de forma crítica e conjugada, sabendo-se, ademais, que dar a conhecer significa divulgar, revelar, ainda que a referida testemunha o tenha feito a solicitação dos autores, o que se afigura de todo verosímil.
O ponto 11 traduz fielmente o que resultou provado a respeito da matéria em causa, ou seja, que autores ficaram interessados na localização e caraterísticas do terreno, e apresentaram uma proposta de aquisição pelo valor de €150.000,00, que foi aceite pela 1ª ré/vendedora, e é isso que importa à boa decisão da causa, sem necessidade de aludir a visitas a outros terrenos e a uma frustrada aquisição de outro terreno.
Em suma, mantêm-se intocados os pontos 8, 9, 10 e 11 dos factos provados.

No ponto 13, impugnado pela 1ª ré, deu-se como provado que «[o]s autores não tiveram acompanhamento de advogado, confiando nas informações transmitidas pela ré vendedora, através da ré mediadora imobiliária».
Defende a recorrente 1ª ré que a sua participação no negócio se resumiu «a ter colocado um terreno à venda, aceite um determinado preço de oferta e celebrado a escritura pública de compra e venda», não tendo tido «mais nenhuma intervenção na celebração do presente negócio, nem a montante, nem a jusante, como aliás vem bem espelhado no Facto Dado como Provado 27».
Propõe, assim, a recorrente que no ponto 13 passe a constar o seguinte: «[o]s autores não tiveram acompanhamento de advogado, confiando nas informações transmitidas, apenas e só, pela segunda ré Besthomes».
Escreveu-se na sentença recorrida:
«(…), em relação ao processo de aquisição dos imóveis em discussão, foram valorados os depoimentos das testemunhas funcionárias da 2ª ré, II e DD, do arquiteto CC, as declarações dos próprios autores e do legal representante da 2ª ré, dos quais, resultou que não existiu contato direto entre os autores e a primeira ré, que foi através da segunda ré que se estabeleceu a negociação entre a vendedora e os compradores, como aliás decorre das regras da mediação imobiliária e por força do contrato que havia celebrado com a proprietária dos bens/primeira ré.»
Entendemos que a prova produzida, não evidencia a existência de qualquer contato direto entre a 1ª ré/vendedora e os autores/compradores, sendo esse contato mantido com a 2ª ré /mediadora imobiliária, o que, aliás, não deixou de se ponderar na sentença recorrida, onde a propósito se escreveu:
«(…), em relação ao processo de aquisição dos imóveis em discussão, foram valorados os depoimentos das testemunhas funcionárias da segunda autora, II e DD, do arquiteto, CC, as declarações dos próprios autores e do legal representante da segunda ré, dos quais resultou que não existiu contato direto entre os autores e a primeira ré, que foi através da segunda ré que se estabeleceu a negociação entre a vendedora e os compradores (…)
Ademais, está provado, que «[o]s autores nunca conheceram a primeira ré ou o seu legal representante, nem com ele trocaram, diretamente, qualquer impressão ou dúvida sobre o negócio em causa» - ponto 27.
E mais se provou que «[a] negociação do preço, obtenção de documentação, elaboração e celebração do contrato promessa e marcação da escritura de compra e venda foram efetuadas por intermédio da segunda ré» - ponto 28.
Tudo o que se provou foi que «[n]o âmbito da sua atividade, a segunda ré foi contratada pela primeira ré para mediar a venda dos prédios identificados em 3. e 4. (cf. doc. de fls.133vº/135, cujo teor se dá por reproduzido)», e que «[p]ara esse efeito a primeira ré facultou à segunda ré as cadernetas prediais e as certidões prediais relativas aos prédios …» - pontos 7 e 8.
Não pode, pois, em rigor, concluir-se que os autores confiaram em informações fornecidas pela 1ª ré.
Assim, altera-se o ponto 13, cuja redação passa a ser a seguinte:
«Os autores não tiveram acompanhamento de advogado, confiando nas informações transmitidas pela 2ª ré/mediadora imobiliária».

Insurge-se a 2ª ré contra a decisão de dar como provada a factualidade do ponto 15: «Nessa reunião[2] os autores foram informados pela segunda ré que podiam construir no terreno atendendo a que se inseria numa área de expansão urbana e existia um pedido de informação prévia favorável».
Diz a recorrente que o que se provou neste âmbito, foi que «[n]essa reunião os Autores foram informados pelo Arquitecto CC que podiam construir no terreno atendendo a que se inseria numa área de expansão e existia pedido de informação prévia favorável».
Segundo a recorrente, foi no decurso de tal reunião, que o arquiteto CC assegurou aos autores as características construtivas dos prédios, ou seja, foi esse arquiteto e não a recorrente quem assegurou «que podiam construir no terreno ou que o terreno tinha viabilidade construtiva atendendo a que se inseria numa área de expansão urbana e que existia um pedido de informação prévia favorável».
A prova produzida corrobora este entendimento da recorrente.
É certo que na referida reunião esteve também presente não apenas o arquiteto CC, como também o legal representante da 2ª ré, JJ, como resulta claro dos depoimentos das testemunhas DD, CC, mas não há dúvida que foi o referido arquiteto que asseverou a viabilidade construtiva do terreno, destinando-se aquela reunião precisamente a assegurar aos autores que era viável construir e a esclarecer as dúvidas dos mesmos sobre o que poderiam construir, o que resulta da apreciação crítica e conjugada daqueles depoimentos.
Assim, altera-se o ponto 15 dos factos provados, cuja redação passa a ser a seguinte: «Nessa reunião os Autores foram informados pelo arquiteto CC que podiam construir no terreno atendendo a que se inseria numa área de expansão e existia pedido de informação prévia favorável».

O mesmo se diga relativamente ao ponto 17, também objeto de impugnação pela 2ª ré/recorrente: «Os Autores não colocaram em causa a informação transmitida pela segunda ré, garantindo que podiam construir, celebrando, no dia 11 de agosto de 2018, o contrato-promessa de compra e venda».
Vale aqui mutatis mutandis o que se deixou dito a propósito do ponto 15, salientando-se que o arquiteto em causa, à semelhança do ocorrido em outras situações, foi contatado pela 2ª ré para esclarecer e informar os autores sobre a aptidão construtiva do terreno em causa.
Assim, altera-se o ponto 17 dos factos provados, cuja redação passa a ser a seguinte: «Os Autores não colocaram em causa a informação transmitida pelo referido arquiteto, garantindo que podiam construir, celebrando, no dia 11 de agosto de 2018, o contrato-promessa de compra e venda».

Discorda a 1ª ré/recorrente que se tenha dado como provada a factualidade vertida no ponto 34, do seguinte teor: «Os autores ficaram preocupados e no dia 19 de agosto de 2020 deslocaram-se à Câmara Municipal de Loulé, onde foram informados que não era possível construir nos prédios adquiridos por se localizarem em “espaço-canal”.
Segundo a recorrente, não ficou demonstrado de forma inequívoca que não era possível construir no lote de terreno em apreço nos autos, não tendo nenhuma testemunha sido conclusiva a este respeito, ficando apenas provado que não havia certeza de que não se pudesse vir a construir naquele lote de terreno, pelo que a factualidade em causa deveria constar dos factos não provados.
Ao invés do que diz a recorrente, a factualidade em causa encontra o devido respaldo nas declarações de parte dos autores, conjugadas com o depoimento da testemunha CC, o qual confirmou não ter dado imediato conhecimento aos autores quando notificado pela edilidade camarária da intenção de indeferir o pedido de licenciamento,e os documentos de fls. 71vº/72vº e 80.
Mantém-se assim intocado o ponto 34 dos factos provados.

Relativamente ao ponto 36 dos factos provados, no qual se deu como provado que «[o]s autores celebraram o negócio convencidos que poderiam construir uma moradia unifamiliar nos prédios adquiridos, o que era do conhecimento das rés», sustenta a 1ª ré/recorrente «que nunca teve conhecimento de nenhum facto referente ao negócio, a não ser os que já foram mencionados em cima, devendo considerar-se que o conhecimento era, única e exclusivamente, da segunda ré Besthomes».
Ora, analisando quer o contrato promessa quer a escritura de compra e venda (respetivamente docs. 5 e 23 juntos com a p.i.), dos mesmos não consta qualquer referência ao tipo de construção, não podendo por isso dizer-se com rigor que a 1ª ré tinha conhecimento «que os autores celebraram o negócio convencidos que poderiam construir uma moradia unifamiliar nos prédios adquiridos».
Porém, o que ao caso importa, é se a 1ª ré (vendedora) sabia que os autores celebraram o negócio convencidos que poderiam construir nos prédios adquiridos.
E a resposta é afirmativa. Senão vejamos.
Esse conhecimento decorre, desde logo, do próprio teor da escritura de compra e venda, onde consta, preto no branco, que aquela ré vende aos autores, «por cento e trinta mil euros o prédio urbano correspondente a talhão de terreno destinado a construção urbana, (…)», e «por vinte mil euros o prédio rústico, (…)» (destaque e sublinhado nosso).
Aliás, o preço pelo qual foram vendidos os imóveis, é revelador de que a 1ª ré não podia ignorar que estava a vender um terreno destinado a construção e que quem o comprava, por aquele preço, lhe pretendia dar esse destino.
E só assim se explica, também, que os prédios tenham sido anunciados como “terreno para construção” [ponto 8 dos factos provados].
Assim, altera-se o ponto 36 dos factos provados, cuja redação passa a ser a seguinte: «Os autores celebraram o negócio convencidos que poderiam construir nos prédios adquiridos, o que era do conhecimento das rés».

Impugnam ambas as rés o ponto 37, no qual se deu como provado que «[n]os prédios vendidos não era, nem é possível, construir uma moradia unifamiliar por se localizarem em “espaço-canal”, que corresponde a corredor de proteção (zona “non-aedificandi”)».
Diz a 2ª ré/recorrente que não ficou provado que à data da aquisição não era possível a construção, convocando para o efeito os depoimentos das testemunhas EE, FF, GG e HH, que segundo a recorrente, «confirmaram que não obstante o Regulamento do PDM de 95 considerar a área onde os prédios objecto dos autos se localizam como área “non-edificandi”, a verdade é que a Câmara Municipal de Loulé permitia a construção no espaço canal, tanto que o pedido de informação prévia para construção obteve despacho favorável».
Diz ainda aquela recorrente que aquilo que se provou a este respeito, foi que «[n]os prédios vendidos à data de 26/05/2020 não era possível construir uma moradia unifamiliar por se localizarem “em espaço canal”, que corresponde a corredor de protecção.»
Na sentença recorrida fundamentou-se a decisão quanto a esta factualidade nos seguintes termos:
«A viabilidade construtiva dos prédios e o parecer desfavorável ao pedido de licenciamento resultaram provadas em face das declarações de parte, em conjugação com os depoimentos das testemunhas CC, KK, arquiteta na Câmara Municipal de Loulé e uma das subscritoras do documento junto a fls.81/83vº, a qual explicou ter sido a localização dos imóveis, face ao Regulamento do PDM de Loulé, a determinar a decisão que subscreveu, em depoimento que não foi contraditado por qualquer meio de prova, encontrando suporte no ofício de fls.232, bem como nos depoimentos das testemunhas EE, FF, GG e HH, os quais desempenham(ram) funções na Câmara Municipal de Loulé, ligadas à área do urbanismo ou planeamento/administração do território.
Na verdade, quer a testemunha KK, quer as testemunhas EE, FF, GG e HH, explicaram existir desde 1995 um Regulamento do PDM de Loulé que não permite a construção no chamado “espaço- canal”, onde se localizam os prédios vendidos aos autores, para além do PUA (Plano de Urbanização de Almancil), que não se encontra aprovado mas que prevê a construção de uma estrada (Circular de Almancil), cujo traçado passa junto daqueles prédios, mas que não será relevante, para o caso, pois para além de não se encontrar em vigor, regendo então o Regulamento do PDM de Loulé.
Como também explicaram, corroborando o que se evidencia nas fotografias juntas pela segunda ré a fls.142vº/144, bem como no ofício de fls.245/248, até determinada data, foi permitida a realização de construções nesse “espaço-canal”, porque a construção daquela Circular não avançava e assim se protegia as expetativas dos proprietários de determinados prédios, embora se mantivesse desde 1995 a mesma legislação em vigor, mormente do Regulamento do PDM, que não permitia a realização de construção.
Assim sendo, da conjugação destes meios de prova, que não foram contraditados, foi considerada provada a factualidade vertida nos pontos nºs 32., 37. e 45., dos factos provados.»
Afigura-se correta a apreciação da prova efetuada pelo tribunal a quo, sendo que o ofício da Câmara Municipal de Loulé de fls. 232, datado de 06.06.2022, subscrito pelo Diretor do Departamento Jurídico-Administrativo, é assaz claro:
«(…) de acordo com a planta de localização apresentada, o terreno localiza-se em Solo Urbano – Espaços Urbanizáveis – Áreas de Expansão do Tipo A, contudo também se constatou, que o mesmo é abrangido pela categoria de Espaços Canais, onde de acordo com o disposto no art.º 57.º do regulamento do PDM, são zonas “non aedificandi”, ou seja, são corredores de proteção onde é proibido qualquer tipo de construção.
Mais se informa que não obstante deste corredor de proteção poder vir a ser alterado em sede de revisão de PDM, pode-se concluir que, à presente data, não existe viabilidade construtiva para a propriedade assinalada».
Trata-se de uma informação prestada pela entidade com competência para autorizar ou não a construção do terreno em causa, e não há a menor dúvida que tal construção não se mostrava viável à data de 06.06.2022, pelas razões explicitadas no ofício.
É certo que em 21.08.2006, a 1ª ré deu entrada nos serviços administrativos da Câmara Municipal de Loulé de um pedido de informação prévia (PIP) relativo à viabilidade de realização de obras de construção no prédio rústico a que se alude no ponto 3, e através de notificação datada de 06.08.2007, o departamento de administração do território da Câmara Municipal de Loulé notificou o legal representante daquela ré de que «[r]elativamente ao assunto indicado em epígrafe, cumpre-me informar V. Exª que o mesmo foi deferido por despacho do Sr. Presidente de 2007/07/27, com os seguintes condicionamentos: (…).» - pontos 6 e 7 dos factos provados.
E também está dado como provado que «n[o] alinhamento onde foi projetada a construção da moradia existem outras construções, inclusive moradias» - ponto 45.
Ora, quanto ao PIP, é sabido que a sua validade é de um ano (art. 17º do RJUE), pelo que há muito havia caducado.
E o facto de existirem outras moradias no alinhamento onde foi projetada a construção da moradia dos autores, não põe em causa a informação constante do aludido ofício camarário relativa ao terreno em discussão e não a um qualquer outro terreno, e, ademais, não se sabe as razões por que existem tais construções no referido alinhamento.
Temos assim como seguro que nos prédios dos autos, por se localizarem em “espaço-canal”, que corresponde a corredor de proteção (zona “non-aedificandi”), não era nem é possível construir uma moradia unifamiliar, sendo que essa possibilidade a existir no futuro, dependerá sempre da revisão do PDM.
Mantém-se assim intocado o ponto 37 dos factos provados.

Resta, por último, a impugnação da 1ª ré/recorrente relativamente à alínea c) dos factos não provados: «[a] 1ª ré estava convencida de que se poderia construir nos prédios vendidos».
Segundo a recorrente, ficou demonstrado que a mesma estava convencida de que se podia construir nos prédios em apreço, por duas ordens de razões: i) tinha na sua posse um PIP aprovado e não havia nenhuma indicação de que a realidade transcrita no PIP tivesse sido alterada; ii) existem inúmeras construções no alinhamento dos prédios em questão, o que indicia a possibilidade de construção.
Conclui dizendo que devia ter sido dada como provada a factualidade em causa.
Entendemos que neste ponto assiste razão à recorrente, o que encontra suporte na factualidade constante dos pontos 5, 6 e 45, que não foram objeto de impugnação, para além de tudo o que se disse supra a propósito do ponto 36.
Assim, elimina-se a alínea c) dos factos não provados, passando a respetiva factualidade a constar do elenco dos factos provados sob o nº 28-A.

MATÉRIA DE FACTO FINALMENTE FIXADA POR ESTA RELAÇÃO[3]
Uma vez alterada por esta Relação a decisão sobre a matéria de facto proferida na 1ª instância, os factos finalmente julgados provados e não provados são os seguintes:
Factos provados:
1- A primeira ré Sabino Villas- Real Estate Service, Lda. foi constituída em 25 de setembro de 2001 e tinha por objeto a mediação imobiliária, administração de imóveis por conta de outrem, serviços de administração, manutenção, limpeza, reparações, substituições, obras interiores ou exteriores, em bens móveis ou bens imóveis incluindo jardins e piscinas; arrendamento de imóveis e aluguer de bens moveis e equipamentos de lazer e desporto; exploração e gestão de estabelecimentos hoteleiros ou complexos urbanísticos e atividades de turismo relacionadas com tais complexos ou estabelecimentos; gestão, exploração, administração e manutenção de estabelecimentos de restauração e bebidas, compra e venda de imóveis e a revenda dos adquiridos para o mesmo fim; manutenção, limpeza e administração de campos de golfe e ténis (cf. doc. de fls.91/94, cujo teor se dá por reproduzido).
2- A segunda ré Besthomes-Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda. foi constituída em 09 de setembro de 2008 e tem por objeto a mediação imobiliária e atividade de intermediação crédito (cf. doc. de fls.131vº/133, cujo teor se dá por reproduzido).
3- A primeira ré tinha inscrito a seu favor o direito de propriedade sobre o prédio rústico, composto por terra de cultura e amendoeiras, sito em ..., freguesia de Almancil, inscrito na matriz predial rústica sob o art.º ...07, com a área de 640,82m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sob o n.º ...09 (cf. doc. De fls.84/84vº, cujo teor se dá por reproduzido).
4- E sobre o prédio urbano, composto por talhão de terreno destinado a construção urbana, sito em ..., freguesia de Almancil, inscrito na matriz predial urbana sob o art.º ...25, com a área de 389,18m2, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé, sob o n.º ...26, o qual foi desanexado do prédio identificado em 3. (cf. doc. de fls.85/85vº, cujo teor se dá por reproduzido).
5- No dia 21 de agosto de 2006 a primeira ré deu entrada nos serviços administrativos da Câmara Municipal de Loulé de um pedido de informação prévia relativo à viabilidade de realização de obras de construção num terreno inscrito na matriz sob o art.º rústico n.º ...07, sito em ..., freguesia de Almancil, que veio a correr os seus termos sob o n.º 7370/06 (cf. doc. de fls.116vº/117, cujo teor se dá por reproduzido).
6- Através de notificação datada de 06 de agosto de 2007, o departamento de administração do território da Câmara Municipal de Loulé notificou o legal representante da primeira ré de que:
«Relativamente ao assunto indicado em epígrafe, cumpre-me informar V. Exª que o mesmo foi deferido por despacho do Sr. Presidente de 2007/07/27, com os seguintes condicionamentos:
· Caso pretenda dar continuidade à actual pretensão, procedendo ao Licenciamento Administrativo nesta edilidade, deverá ter em consideração a Rede Viária proposta no Plano de Urbanização de Almancil (em anexo encontra-se uma fotocópia de uma parte do Plano de Urbanização de Almancil, à escala 1.25000, onde é possível localizar o terreno proposto). Mais se informa, que deverão ser cedidas a esta Câmara Municipal, gratuitamente, as áreas de terreno necessárias para a futura estruturação viária do Plano de Urbanização em questão, pelo que essa cedência deverá estar em conformidade com o trajecto das vias propostas;
· Para além da situação anteriormente referida, a dita proposta também deverá ter em atenção as edificações já existentes, devendo respeitar os alinhamentos principalmente com o edifício situado imediatamente a Norte com o limite do terreno;
· Sabendo que o terreno da actual pretensão está inserido em Espaços Urbanos, Espaços Urbanizáveis Tipo A, numa situação de aglomerado urbano, a futura proposta deverá garantir a continuidade do tecido urbano como também uma adequada relação com o espaço da envolvente. Desta forma, a futura proposta a licenciar nesta câmara municipal deverá ter em atenção a rede de arruamentos (previstos no Plano de Urbanização de Alamncil), volumetrias, alinhamentos e profundidade das construções existentes como também os elementos construtivos, garantindo assim a higiene e salubridade.
De acordo com o disposto no n.º 3, do artifo16.º, do Decreto-Lei n.º 555/99 de 16 de dezembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 177/2001 de 4 de Junho, a aprovação urbanística projectada encontra-se sujeita à forma de procedimento de controlo prévio prevista na Subsecção III (Licença), da Secção II, do Capítulo II, do referido diploma;
O respectivo processo de licenciamento deverá ser instruído de acordo com a legislação aplicável e o Projecto de Arquitectura e deverá cumprir as demais normas regulamentares, bem como o já referido Regulamento do PDM de Loulé; (cf. doc. de fls.116vº/117, cujo teor se dá por reproduzido)».
7- No âmbito da sua atividade, a segunda ré foi contratada pela primeira ré para mediar a venda dos prédios identificados em 3. e 4. (cf. doc. de fls.133vº/135, cujo teor se dá por reproduzido).
8- Para esse efeito a primeira ré facultou à segunda ré as cadernetas prediais e as certidões prediais relativas aos prédios e estes foram anunciados como “terreno para construção”.
9- Os autores residem em França e decidiram adquirir um terreno para construção no concelho de Loulé a fim de nele edificarem uma moradia para passar férias com os filhos, recorrendo no ano de 2017 aos serviços prestados pela segunda ré Besthomes.
10- Após visitarem vários terrenos e frustrada a aquisição de outro terreno, a segunda ré deu-lhes a conhecer o terreno para construção referido em 8., em venda pelo preço de €170.000,00.
11- Os autores ficaram interessados na localização e caraterísticas deste terreno e apresentaram uma proposta de aquisição pelo valor de €150.000,00 que foi aceite pela primeira ré/vendedora.
12- A segunda ré foi informada que os autores iriam adquirir o terreno para construir uma moradia com recurso a financiamento bancário.
13- Os autores não tiveram acompanhamento de advogado, confiando nas informações transmitidas pela 2ª ré/mediadora imobiliária.
14- A segunda ré, a pedido dos autores, aconselhou a escolha de um arquiteto, o qual reuniu com estes na agência imobiliária.
15- Nessa reunião os Autores foram informados pelo arquiteto CC que podiam construir no terreno atendendo a que se inseria numa área de expansão e existia pedido de informação prévia favorável.
16- Foram-lhes mostradas as plantas de localização do terreno, um diploma legal relativo à edificabilidade nos espaços urbanizáveis de expansão e o parecer favorável ao pedido de informação prévia.
17- Os Autores não colocaram em causa a informação transmitida pelo referido arquiteto, garantindo que podiam construir, celebrando, no dia 11 de agosto de 2018, o contrato-promessa de compra e venda.
18- No qual o terreno ficou identificado como um prédio rústico, sito em ..., Almancil, inscrito na matriz sob o n.º ...07 da freguesia de Almancil, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.º...09 e um prédio urbano composto por talhão de terreno para construção urbana, sito em ..., Almancil, inscrito na matriz urbana sob o artigo ...25 da freguesia de Almancil, concelho de Loulé, descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.º...26 (cf. doc. de fls.30vº/32vº cujo teor se dá por reproduzido).
19- Foi realizada nova reunião com o arquiteto na qual os autores informaram das características da moradia que pretendiam construir.
20- No dia 17 de agosto de 2018 o arquiteto apresentou a sua proposta de serviços para assessoria no projeto de licenciamento para construção da moradia unifamiliar.
21- A partir de final de agosto este arquiteto e uma funcionária da segunda ré enviaram aos autores orçamentos de empresas de construção.
22- No dia 07 de setembro de 2018 o arquiteto apresentou um estudo prévio relativo ao projeto de construção pretendido pelos autores.
23- Os autores solicitaram um empréstimo bancário ao “Banque BCP”, sediado em França, para a aquisição do terreno e para a construção da moradia, o qual foi aprovado para um montante de € 290.000,00 com a condição de a construção se realizar no prazo de dois anos.
24- Após aprovação do empréstimo foi agendada pela segunda ré a escritura de compra e venda, a qual se realizou no dia 22 de outubro de 2018, no Cartório Notarial .... P..., em Loulé (cf. doc. de fls.58/60, cujo teor se dá por reproduzido).
25- Os autores foram representados por funcionária da segunda ré, à qual outorgaram procuração por não poderem comparecer e que colaborou realização dos pagamentos de impostos e de despesas (cf. doc. de fls.58/60, cujo teor se dá por reproduzido).
26- Os autores procederam ao pagamento do preço no montante de €150.000,00, do IMT no montante de €9.450,00, do imposto de selo no montante de €1.200,00, dos honorários da notária no montante de €357,17 e do registo no montante de €270,00.
27- Os autores nunca conheceram a primeira ré ou o seu legal representante, nem com ele trocaram, diretamente, qualquer impressão ou dúvida sobre o negócio em causa.
28- A negociação do preço, obtenção de documentação, elaboração e celebração do contrato promessa e marcação da escritura de compra e venda foram efetuadas por intermédio da segunda ré.
28-a) - A 1ª ré estava convencida de que se poderia construir nos prédios vendidos.
29- No dia 06 de agosto de 2019 os autores outorgaram procuração a favor do arquiteto para os representar no processo de licenciamento para construção de moradia unifamiliar (cf. doc. de fls.64/65, cujo teor se dá por reproduzido).
30- No dia 26 de agosto de 2019 o projeto de licenciamento para construção deu entrada junto dos serviços da Câmara Municipal de Loulé e os autores liquidaram uma taxa no montante de €34,42.
31- Decorridos meses e após insistência dos autores o arquiteto informou-os que o processo de licenciamento estava parado no Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Loulé.
32- Através de ofício do Departamento de Urbanismo da Câmara Municipal de Loulé, datado de 26 de maio de 2020, foi comunicada ao arquiteto a intenção de indeferir o projeto de licenciamento, por (…) “o prédio em causa incidir no espaço-canal que corresponde a corredor de proteção e constitui área non-aedificandi (artºs 56.º e 57.º do Regulamento do PDM Loulé)” (cf. doc. de fls.81/83vº, cujo teor se dá por reproduzido).
33- Em agosto de 2020 os autores regressaram a Portugal e deslocaram-se ao gabinete do arquiteto onde este informou-os que o projeto de licenciamento estava suspenso e que iria agendar reunião com a técnica da Câmara Municipal de Loulé.
34- Os autores ficaram preocupados e no dia 19 de agosto de 2020 deslocaram-se à Câmara Municipal de Loulé, onde foram informados que não era possível construir nos prédios adquiridos por se localizarem em “espaço-canal”.
35- Confrontado o arquiteto aconselhou os autores a recorrer aos serviços de advogado para reverter a intenção de indeferimento do pedido de licenciamento.
36- Os autores celebraram o negócio convencidos que poderiam construir nos prédios adquiridos, o que era do conhecimento das rés.
37- Nos prédios vendidos não era, nem é possível, construir uma moradia unifamiliar por se localizarem em “espaço-canal”, que corresponde a corredor de proteção (zona “non-aedificandi”) (cf. doc. de fls.232, cujo teor se dá por reproduzido).
38- Se os autores tivessem conhecimento desta circunstância não teriam realizado a compra e venda.
39- Os autores pagaram a título de empréstimo bancário contraído para a aquisição dos prédios, até 28 de abril de 2022, um total de €18.315,34, nos quais se incluem capital, juros e despesas.
40- E pagaram Imposto Municipal sobre Imóveis relativos aos anos de 2018 a 2020 no montante global de €455,84.
41- Pelos serviços prestados pelo arquiteto os autores pagaram o montante de €5.129,10.
42- Pela procuração outorgada a favor da representante na escritura e certificação os autores pagaram o montante de €92,25 e pela procuração outorgada a favor do arquiteto o montante de €61,50.
43- Pelas viagens a Portugal, em agosto de 2020, para se inteirarem do andamento do processo de licenciamento os autores pagaram o montante total de €948,56.
44- Devido a toda a situação os autores sofreram transtorno psicológico.
45- No alinhamento onde foi projetada a construção da moradia existem outras construções, inclusive moradias.
46- A segunda ré havia celebrado com a interveniente Ageas Portugal-Companhia de Seguro, S.A. contrato de seguro, a que corresponde a apólice n.º ...19 (cf. doc. de fls181/188, cujo teor se dá por reproduzido).
47- Através do qual transferiu a responsabilidade decorrentes do exercício da atividade de mediação imobiliária, mediante o pagamento de um prémio, com cobertura de capital até €200.000,00, sem franquia, com período de vigência de 01.04.2021 a 31.03.2022 (cf. doc. de fls181/188, cujo teor se dá por reproduzido).
48- Caso os autores procedessem ao pagamento antecipado do empréstimo contraído, em 03 de maio de 2022, teriam de desembolsar a quantia de €154.783,15.

Factos não provados:
a) foi garantido aos autores que o terreno para construção tinha projeto de construção aprovado pela Câmara Municipal de Loulé;
b) os autores despenderam € 125,00 com despesas de alojamento;

Da responsabilidade das rés/recorrentes: a anulação do contrato de compra e venda e a obrigação de indemnizar os autores
Escreveu-se na sentença recorrida:
«Fazendo uso de uns e outros ensinamentos e revertendo para o caso dos autos, temos que a viabilidade construtiva foi um elemento determinante para a celebração do contrato de compra e venda por parte dos autores e que sem essa viabilidade estes jamais aceitariam realizar o negócio.
Ou seja, como se deixou escrito, em sede de fundamentação da matéria de facto, os autores lograram provar que não teria comprado os prédios objeto da compra e venda se soubesse que os prédios, mais precisamente o prédio urbano, não possuía viabilidade de construção.
Na verdade, pese embora no anúncio efetuado pela segunda ré os prédios surjam identificados como “terreno para construção”, como se referiu bem a propósito no Ac. do STJ de 14.10.2007, in www.dgsi.pt “Não é, porém, a mera declaração do dono do prédio que determina a classificação deste, a sua natureza rústica ou urbana, nem opera, como num passe de mágica, a transformação da sua fisionomia”.
Por outro lado, o terreno urbano ou terreno para construção é uma coisa que se define não só pela sua identidade física, mas principalmente pela sua aptidão juridicamente reconhecida, i.e., objeto de um direito de construir, nunca originário, mas sempre adquirido, por força da iniciativa da Administração Pública, ou por licença desta, perante a pretensão formulada pelo respetivo proprietário, nos limites topográficos e normativos dum plano de urbanização ou dum loteamento (ainda no referido Ac. do STJ citando referiu o Prof. Carlos Ferreira de Almeida, in “Direito Económico”, p. 431, já que a possibilidade de afetação de um terreno rústico a fim diferente depende de uma decisão administrativa, tomada em função dos interesses gerais da coletividade, de acordo com os planos de ordenamento do território).
E como resulta dos autos, pese embora aquela denominação de “terreno para construção”, coincidente com a descrição predial referente ao prédio urbano, em que se identifica como “talhão de terreno destinado a construção urbana”, face ao Regulamento do PDM de Loulé, o terreno em apreço situava-se em área Solo Urbano- Espaço Urbanizável- Área de Expansão do Tipo A, mas abrangido pela Categoria de espaço-canal, que de acordo com o art.º 57.º do Regulamento do PDM de Loulé constitui zona non aedificandi.
Logo, em princípio, o terreno não poderia ser anunciado como terreno para construção, sendo precisamente esta a questão dos autos, ou seja, a classificação do terreno relativamente à sua implantação/localização em face do respetivo Regulamento do PDM.
Será irrelevante apurar e, consequentemente, valorar o momento em que foi comunicada aos autores a intenção de não aprovação do pedido de licenciamento que apresentaram, na justa medida em que esse processo de licenciamento prosseguiu os seus termos sem que tenha sido comunicada aos autores, pelo arquiteto responsável, qualquer inviabilidade construtiva, ou seja, manteve-se o seu erro.
Mas esse erro já se verificava aquando da celebração do contrato de compra e venda, na medida em que os autores foram informados pela primeira ré, através da intermediária, da viabilidade construtiva e, salvo melhor opinião, o que releva para os efeitos pretendidos pelos autores é a convicção que tinham quando o negócio foi celebrado e a essencialidade daquela viabilidade para a decisão de contratar.
Comprovando-se, como se referiu, que caso soubesse que era inviável construir nos prédios adquiridos não teriam realizado a compra e venda, pois que destinavam os bens imóveis à construção de uma moradia para passarem férias com os filhos.
Perante esta factualidade não se suscitam dúvidas que os autores provaram a essencialidade do erro e que a ré vendedora tinha conhecimento dessa essencialidade ou, seguramente, tinha o dever de conhecer essa essencialidade, desde logo pela atividade desenvolvida e pelo preço acordado, no pressuposto que o terreno estava apto para construção, sem quaisquer limitações ou condicionantes como aquelas que se vieram a apurar e que persistem.
E contra não se argumente que a negociação foi realizada pela segunda ré e que aquela não contatou com os autores, pois que, para além daquela ter atuado através da intermediária, é evidente o interesse da vendedora no desfecho do negócio conforme o anúncio que foi realizado e o preço que propôs.
Entender em sentido contrário, ou seja, que por não ter contatado diretamente, mas através da intermediária, com os compradores não tinha o dever de conhecer a essencialidade daquela caraterística anunciada (para construção) e levar a considerar verificado o erro vício em discussão, atenta contra os princípios da confiança e boa-fé que devem presidir à celebração dos negócios jurídicos.
É, pois, de concluir que atenta a factualidade julgada provada que os autores lograram provar os requisitos para a anulação do contrato de compra e venda, por erro sobre o objeto, exigidos pelos arts. 247.º, n.º 1 e 251.º, ou seja, essencialidade para eles do elemento sobre que recaiu o erro (viabilidade construtiva dos prédios adquiridos) e conhecimento dessa essencialidade pela ré vendedora.
Como consequência da anulação do contrato de compra e venda os autores têm direito à restituição do que foi prestado, nos termos do art.º 289.º, n.º 1, do Código Civil.»
Não nos merece reparo o enquadramento jurídico feito na sentença, que encontra o devido respaldo na matéria de facto provada, sendo certo, como se deixou demonstrado supra, que a 1ª ré (vendedora) sabia que os autores celebraram a escritura de compra e venda dos imóveis em causa convencidos que neles poderiam construir.
No erro sobre o objeto do negócio, previsto no art. 251º do Código Civil[4], há conformidade entre a vontade real e a vontade declarada, só que a vontade real formou-se em consequência de um erro em que o declarante incorreu, e, não fora esse erro, o declarante não teria pretendido realizar o negócio, pelo menos nos termos em que o fez[5].
Assim, o erro sobre o objeto do negócio, também denominado erro vício, ou erro motivo, por atingir os motivos determinantes da vontade, que assim é viciada na sua formação, é um erro na formação de vontade, enquanto o erro obstáculo ou na declaração, previsto no art.º 247º do CC, é um erro na formulação da vontade[6].
Porém, ambos os erros, para que relevem, isto é, para que permitam a anulação do negócio em que ocorreram, supõem sempre que a contraparte conhecesse ou não devesse ignorar a essencialidade do erro.
Em suma, o art. 251º do CC remete para o disposto no art. 247º do mesmo diploma, que condiciona a anulabilidade da declaração à circunstância do declaratário (neste caso a 1ª ré) conhecer ou não dever ignorar a essencialidade, para o declarante (neste caso os autores), do elemento sobre que incidiu o erro.
Ora, como se vê dos factos provados e acima referidos, lograram os autores/recorridos demonstrar que a vendedora conhecia a essencialidade do elemento sobre que recaiu o erro de que os autores só se aperceberam quando, no dia 19 de agosto de 2020 se deslocaram à Câmara Municipal de Loulé, e aí foram informados que não era possível construir nos prédios adquiridos por se localizarem em “espaço-canal” [ponto 34 dos factos provados], o que implica o êxito da pretensão anulatória do contrato de compra e venda e a consequente restituição do preço e demais despesas reclamadas.

Embora no recurso da 2ª ré esta defenda que não se mostram preenchidos os requisitos para anulação do contrato de compra e venda celebrado entre os autores/recorridos e a 1ª ré/recorrente, sustenta a ré que no caso de assim não se entender – como efetivamente não se entendeu -, que não violou quaisquer deveres ou regras resultantes da sua atividade, nomeadamente, não violou o disposto no artigo 17º da Lei 15/2013, pelo que não pode ser condenada solidariamente no pagamento dos danos alegadamente sofridos.
O artigo 17º, nº 1, al. b), da Lei n.º 15/2013, de 8 de fevereiro – no âmbito dos deveres para com os clientes e os destinatários - determina que a empresa de mediação deve certificar-se da correspondência entre as características do imóvel objeto do contrato de mediação e as fornecidas pelos clientes, pelo que, imputando os autores responsabilidade civil à 2ª ré por inobservância de tal dever, cabe-lhes, nomeadamente, o ónus de alegação e prova dos pressupostos da responsabilidade civil inerente, entre os quais a ilicitude imputada – no sentido da demonstração do incumprimento de tal dever - por se tratar de facto constitutivo da pretensão que deduziram - quer em face do disposto no artigo 483º do CC, quer em vista do disposto no artigo 486º do mesmo Código (inexistindo presunção legal que transfira tal ónus para a contraparte) - , em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 342.º do CC[7].
Sobre esta matéria escreveu-se na sentença recorrida.
«(…) tendo resultado provado que a ré/imobiliária violou os deveres resultantes da sua atividade, não tendo informado devidamente os autores acerca da viabilidade construtiva dos prédios que constituíam objeto da atividade de mediação, o que deu azo ao erro em que os autores incorreram e, consequentemente, à aquisição com recurso a crédito e despesas que não teriam caso não tivessem adquirido esses bens imóveis, constituiu-se na obrigação de indemnizar tais danos
Não podemos acompanhar a sentença neste segmento, porquanto o quadro fáctico existente não permite concluir pela violação de quaisquer deveres por banda da 2ª ré.
Na verdade, esta informou os autores das características dos prédios nos exatos termos constantes dos documentos entregues pela vendedora (1ª ré), inexistindo razões para duvidar de tais características, dado estarem em causa documentos autênticos [pontos 7 e 8 dos factos provados].
Desses documentos resulta que um dos prédios respeitava a um talhão de terreno para construção urbana, com área de implantação de 194,50 m2 [vd. descrição predial de fls. 85/85v e documento nº 7 junta com a p.i.].
Foi também a 2ª ré quem aconselhou os autores a recorrerem aos serviços de um arquiteto de modo a que pudessem aferir da viabilidade construtiva dos prédios ainda antes da assinatura do contrato promessa e de compra e venda, e foi isso que os autores fizeram, vindo a reunir com o arquiteto ainda antes da assinatura do contrato promessa de compra e venda, o qual lhes assegurou a viabilidade construtiva e foi esta segurança criada pelo arquiteto e não pela 2ª ré, que fez com que os recorridos celebrassem o negócio [pontos15 e 17 dos factos provados com as alterações efetuadas por esta Relação].
Ora, constando dos documentos entregues pela 1ª ré à 2ª ré que um dos prédios era um talhão de terreno para construção, não havia razões para a 2ª ré colocar em causa a viabilidade construtiva do terreno assegurada pelo arquiteto contratado pelos autores, até porque o terreno já possuía essa característica à data em foi celebrado o contrato de mediação [cfr. fls. 133 v a 135].
Não se demonstra, pois, a imputada violação relevante de dever de obtenção e transmissão de informação a cargo da 2ª ré imobiliária interveniente no negócio que fosse geradora do seu dever de indemnizar
Não pode assim subsistir a condenação solidária desta ré nos termos constantes da sentença recorrida, devendo a mesma ser absolvida dos correspondentes pedidos [alíneas d) e e) do dispositivo da sentença].
Por conseguinte, improcede a apelação da 1ª ré e procede a apelação da 2ª ré.

IV - DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação da ré Sabino Villas-Real Estate Service, Lda., e procedente a apelação da ré Besthomes-Sociedade de Mediação Imobiliária, Lda., e, em consequência, revoga-se a sentença recorrida na parte em que condenou solidariamente esta última ré, absolvendo-se a mesma dos pedidos contra si formulados, no mais confirmando o decidido na sentença.
Custas aqui e na 1ª instância a cargo dos autores e da 1ª ré, na proporção do decaimento.
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Évora, 26 de outubro de 2023
Manuel Bargado (relator)
Ana Isabel Pessoa (1ª Adjunta)
Adelaide Domingos (2ª Adjunta)
(documento com assinaturas eletrónicas)

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[1] Trata-se efetivamente de dois prédios, identificados nos pontos 3 e 4 dos factos provados, a que aqui, por comodidade de exposição, nos referiremos como “terreno”.
[2] Trata-se da reunião a que se alude no ponto 14 dos factos provados, onde se deu como provado que «[a] segunda ré, a pedido dos autores, aconselhou a escolha de um arquiteto, o qual reuniu com estes na agência imobiliária».
[3] Destacam-se a itálico as alterações efetuadas.
[4] Doravante CC.
[5] Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Vol. I, 3ª ed., revista e atualizada, Coimbra Editora, p. 234.
[6] Mota Pinto, in Teoria Geral do Direito Civil, 2ª., ed., Coimbra Editora, p. 504.
[7] Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa de 28.04.2022, proc. 9338/21.2T8LSB.L1-2, in www.dgsi.pt.