Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
8/22.5GECUB.E2
Relator: CARLOS DE CAMPOS LOBO
Descritores: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
PROVA
DEVER DO JUIZ DE INVESTIGAÇÃO OFICIOSA
ANTECEDENTES CRIMINAIS
RELATÓRIO SOCIAL
PENA
Data do Acordão: 09/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I – A nulidade prevenida no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do CPPenal, ao que se pensa, abrange todas aquelas situações de não realização / efetivação de atos processuais na fase de julgamento e de recurso, assumindo, por força da Lei nº 48/2007, de 29 de março, tal coloração, todas aquelas marcas probatórias de cariz essencial / indispensável / absolutamente indispensável / estritamente indispensável e, nessa medida, de maior intensidade e premência que a ideia de prova necessária / conveniente, sendo que nos termos do nº 3, alínea a) do referido inciso legal, operando alguma das deformidades ali tratadas, em momento / ato que o interessado assista ela deve ser apontada antes que este esteja terminado.
II – Por outro lado, considerando o disposto no artigo 340.º, n.º 1 do CPPenal recai sobre o juiz o dever de oficiosamente mandar / determinar / ordenar todas as provas que se lhe afigurem necessárias para esclarecer os factos em discussão e fixar a verdade judicial prática, sendo que a necessidade / pertinência / exigência da descoberta da verdade é o mote justificativo e delimitador deste ónus / encargo que impende sobre o juiz .
III – Assim estando o processo já dotado de relatório social, não sendo obrigatório tal elemento constar dos autos, nada se invocando a demonstrar a necessidade da junção de novo relatório social, não se configura situação de prova necessária.
IV - O mesmo se diga relativamente à audição do Técnico subscritor do relatório social pois, por força dos disposto nos normativos combinados dos artigos 371.º, n.ºs 1 e 2 e 369.º, n.º 2 do CPPenal, não se aponta qualquer obrigatoriedade de audição do técnico de reinserção social, cabendo ao juiz decidir se é ou não necessária a produção de prova suplementar para determinação da espécie e medida da pena, e na afirmativa qual, ou seja, ao tribunal incumbe avaliar / ponderar / pesar se está munido de apetrecho probatório bastante para tomar decisão neste segmento da pena.
V- Invocando-se quadro de inconstitucionalidade necessário se torna, pensa-se, que se siga uma precisa delimitação e enunciação da questão e uma fundamentação, minimamente concludente, com um suporte suficientemente argumentativo que inclua a indicação das razões justificativas do juízo de inconstitucionalidade que vem defender, não bastando a mera e pura alocução de genéricas afirmações.
VI – Tendo em conta a gravidade que encerra o crime de violência doméstica, as fortes e prementes exigências em termos de prevenção geral e o estar / atuar, do arguido cometendo novos ilícitos da mesma natureza, sobre a mesma vítima, em plena vigência de oportunidade que lhe havia sido concedida, impõe-se demanda de rigor e acerto na ponderação.
VII – Em quadro de passado criminal onde se desenha o cometimento, sobre a mesma vítima, do crime de violência doméstica, a circunstância dos factos em causa terem sido praticados em momento quase imediato ao início de período de suspensão da execução da pena relativa a outro processo relativo a condenação por violência doméstica, configuram-se sérias reservas na possibilidade de se voltar a elaborar em prognose favorável.
VIII - Reporte-se, também, que a mera ideia / pensamento de que constitui alguma justificação para a repetição dos comportamentos tidos – vários e verificados no tempo – a postura da vítima no relacionamento havido, é outro mote esclarecedor do modo ligeiro / frouxo / desprendido como encara o arguido recorrente todo o sucedido, impedindo pensar que a mera ameaça de uma pena é o bastante para realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Decisão Texto Integral:
Acordam em Conferência na Secção Criminal (2ª subsecção)

I – Relatório

1.No processo nº 8/22.5GECUB da Comarca ... – Juízo de Competência Genérica ..., e após Acórdão que anulou sentença proferida em 7 de novembro de 2022, na parte respeitante à escolha e determinação da medida da pena, foi prolatada nova sentença em que se decidiu condenar, o arguido AA, filho de BB e de CC, natural da freguesia e concelho ..., nascido a .../.../1966, divorciado, manobrador de máquinas, residente na Estrada ..., ..., ... ..., mantendo todo o anteriormente decidido, como autor material de:
- um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152º, nºs 1, alínea a) e 2, alínea a) do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão;
- um crime de violação de imposições, proibições ou interdições, previsto e punido pelo artigo 353º do Código Penal, na pena de 100 (cem) dias de multa;
- um crime de violação de domicílio, previsto e punido pelo artigo 190º, nº 1 do Código Penal, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa;
- em cúmulo jurídico, na pena única de 210 (duzentos e dez) dias de multa, à taxa diária de 5,00 € (cinco euros), o que perfaz um montante total de 1.050,00 € (mil e cinquenta euros).
Mais se decidiu em condenar o arguido:
- nas penas acessórias frequência de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção da violência doméstica e de proibição de contactos com a vítima DD, por qualquer meio, seja diretamente, seja por interposta pessoa, incluindo o afastamento da sua residência e do local de trabalho, pelo período de 3 (três) anos, nos termos do artigo 152.º, n.ºs 4 e 5 do Código Penal;
- no pagamento do montante de 2.000,00 € (dois mil euros) a DD, a título de reparação da vítima;

2.Inconformado com o decidido, recorreu o arguido questionando a decisão proferida, concluindo: (transcrição)[1]

I) Antes de mais, o presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Juízo de Competência Genérica ..., pertencente ao Tribunal Judicial da Comarca ..., datada de 11/05/2023, que decidiu condenar o Arguido pela prática de um crime de violência doméstica agravado, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, alínea a), do C.P., na pena de 3 (três) anos de prisão.
II) Neste sentido, entendeu o Tribunal a quo que não pode ser substituída a pena de prisão aplicada ao Arguido pela suspensão da sua execução, por alegadamente se poder concluir que a simples censura do facto e a ameaça de prisão não realizam de forma adequada e suficiente as finalidades de punição.
III) Por conseguinte, o presente recurso é interposto do despacho proferido no dia 11/05/2023, o qual determinou que a audiência realizada nos autos no dia 10/05/2023, não se tratou de uma diligência de prova suplementar, nos termos das disposições conjuntas dos artigos 369.º e 371.º, ambos do C.P.P., mas sim de uma reabertura da audiência, em virtude da anulação de parte da sentença anterior, determinada por este Tribunal da Relação de Évora.
IV) Por fim, o presente recurso é ainda interposto do despacho prolatado no dia 09/05/2023, o qual indeferiu a realização da elaboração de novo relatório social e a inquirição do técnico da D.G.R.S.P. que o elaborou, a título de realização de prova suplementar, por não se mostrarem alegadamente necessárias e por serem extemporâneas.
V) Porém, salvo o devido respeito por opinião contrária, por os entendimentos adoptados pelo Tribunal a quo vertidos na sentença de 11/05/2023 e nos despachos de 09/05/2023 e 11/05/2023, improcederem quer de facto, quer de Direito, não podem os mesmos merecerem qualquer acompanhamento por parte do Recorrente.
VI) Desde logo, a suspensão da execução da pena não depende de um qualquer modelo de discricionariedade, mas, antes, do exercício de um poder-dever vinculado, devendo ser decretada, na modalidade que se mostrar mais conveniente, sempre que se verifiquem os respectivos pressupostos.
VII) Nesta medida, tendo sido fixada a pena em que o Recorrente foi condenado em medida inferior a 5 (cinco) anos de prisão, resulta preenchido o pressuposto formal estabelecido pelo artigo 50.º, n.º 1, do C.P., para que o Tribunal deva equacionar a suspensão da respectiva execução.
VIII) Assim, verificado o pressuposto formal de que a pena de prisão fixada não seja superior a 5 anos, é necessário que o julgador possa fazer uma apreciação favorável relativamente ao comportamento futuro do arguido, no sentido de antecipar ou prever a ameaça da pena seja adequada e suficiente para realizar as finalidades da punição.
IX) Reportando-se, porém, ao momento da decisão e não ao da prática do crime e sopesando em conjunto as circunstâncias do facto e da personalidade, atendendo às condições de vida do agente e à sua conduta anterior e posterior aos factos que constituem o objecto do processo.
(…)
XII) No caso concreto, o Tribunal a quo, a este propósito, limitou-se a concluir de forma automática que o único modo de se realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição é o cumprimento pelo Arguido de pena de prisão efectiva, por o mesmo ter cometido o mesmo tipo de crime durante o período de suspensão de execução de outra pena e contra a mesma vítima.
XIII) Contudo, parece olvidar o Tribunal recorrido que nessa prognose deve atender-se à personalidade do arguido, às suas condições de vida, à conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, ou seja, devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornem possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido, atendendo somente às razões da prevenção especial, não sendo de excluir liminarmente do benefício da suspensão da execução da pena determinados grupos de crime.
XIV) In casu, ainda que o Tribunal recorrido se tenha pronunciado sobre a possibilidade de suspensão da execução da pena, fê-lo de forma ligeira e vaga, sem a justificação concreta e específica da situação sub judice na actualidade, sendo que a justificação que é dada é meramente automática e insuficiente.
XV) Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, conforme se verifica do texto da sentença recorrida, o Tribunal a quo não fundamentou devidamente a razão da denegação da suspensão da execução da pena, repetindo, inclusive, a pouca fundamentação existente, reportando-se única e exclusivamente ao passado e não ao presente, nem ao passado.
XVI) Em bom rigor, o Tribunal recorrido não formulou um juízo de prognose de onde resulte, de forma segura e inequívoca, as razões pelas quais a ameaça de prisão e a censura do facto não são bastantes para afastar o Arguido da prática de novos crimes, limitando-se apenas a assinalar o facto de o Recorrente ter sido condenado pela prática do mesmo crime e contra a mesma vítima, alheando-se completamente das circunstâncias actuais do caso concreto e das actuais condições de vida do Recorrente e da Ofendida.
XVII) Tendo, no entanto, todos os crimes pelos quais o Arguido foi anteriormente condenado em comum o facto de terem ocorrido durante o matrimónio que o mesmo manteve anteriormente com a Ofendida e que já se mostra dissolvido, bem como se encontram reguladas as responsabilidades parentais do filho menor de ambos, encontrando-se actualmente salvaguardado qualquer perigo de aproximação ou de contacto relativamente à Ofendida.
XVIII) Deste modo, o juízo de prognose favorável reporta-se ao momento em que a decisão é tomada e pressupõe a valoração conjunta de todos os elementos que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do Arguido, no sentido de que irá sentir a condenação como uma solene advertência, ficando o eventual cometimento de novos crimes prevenido com a ameaça de prisão, daí se extraindo, ou não, se a sua socialização em liberdade é viável.
(…)
XX) Bem vistas as coisas, na sua fundamentação para o afastamento do instituto da suspensão da execução da pena de prisão relativamente ao Recorrente, salvo o devido respeito, o Tribunal a quo fundou-se apenas em considerações ou juízos de culpa e nos antecedentes criminais do Arguido, não valorando devidamente as razões ou fundamentos que presidem à formulação de um juízo de prognose sobre o seu comportamento futuro.
(…)
XXII) Assim sendo, não são considerações de culpa que devem ser tomadas em conta, mas sim juízos prognósticos sobre o desempenho da personalidade do agente perante as suas condições de vida, o seu comportamento e as circunstâncias de facto, que permitem supor que as expectativas de confiança na prevenção da reincidência são fundadas.
XXIII) Ora, o Arguido apresentou em audiência um juízo crítico e de auto-censura, bem como mostrou arrependimento pelos factos que foram julgados como provados, não se podendo ainda descurar que a prática dos crimes pelos quais o Arguido foi condenado nos presentes autos ocorreram durante o período de tempo em que o Arguido e a Ofendida reataram a sua relação, como resulta do facto provado 53.
XXIV) Tendo, porém, os mesmos pernoitado por várias vezes, quer em casa da Ofendida, quer em casa do Arguido, como foi relatado com isenção e assertividade pelas testemunhas EE, FF, GG e HH, razão pela qual os crimes pelos quais o Recorrente foi condenado não puderam deixar ser facilitados pela própria Ofendida, a qual, apesar de separada de facto do Arguido, nunca rompeu em definitivo a sua relação com o mesmo, chegando a aliciá-lo por diversas vezes para pernoitarem juntos, o que aconteceu.
XXV) Por conseguinte, no decurso da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação que lhe foi aplicada, o Arguido tem desde então mantido um comportamento adequado e totalmente cumpridor das obrigações a que está vinculado, não tendo sido registada até ao presente qualquer situação anómala.
XXVI) Além disso, actualmente o Recorrente mantém-se social, familiar e profissionalmente inserido, beneficiando de várias ofertas de trabalho, como é o caso da promessa de contrato de trabalho assim que for restituído à liberdade, como resultado do facto provado 56.
XXVII) Além de não manifestar qualquer desejo de manter qualquer tipo de contacto ou proximidade no futuro com a Ofendida, a personalidade patenteada pelo Arguido, pela assunção da culpa e pela reflexão sobre o mal do crime, permitem sustentar um juízo de confiança no seu comportamento futuro, por forma a que não volte a delinquir.
XXVIII) Efectivamente, os crimes pelos quais o Arguido foi condenado anteriormente decorreram durante a relação matrimonial que o mesmo manteve com a Ofendida e os crimes que constituem o objecto dos presentes autos ocorreram num contexto de divórcio e de regulação do exercício das responsabilidades parentais do filho que têm em comum, nunca tendo o Arguido se visto envolvido em qualquer outro processo judicial por qualquer outro tipo de problema com qualquer outra pessoa.
XXIX) Porém, como resulta do facto provado 52., o casamento entre Arguido e Ofendida já se encontra dissolvido pelo seu divórcio, decretado por sentença transitada em julgado no dia 20/06/2022, proferida no âmbito do Proc. n.º 1537/21...., bem como já se encontram reguladas as responsabilidades parentais relativas ao filho comum de ambos, de conformidade com Doc. 4 junto aos autos pelo Arguido, no requerimento que cruzou nos autos para concessão de autorização judicial de exercício de actividade profissional.
XXX) Assim sendo, não se pode ainda descurar que todos os crimes pelos quais o Arguido foi julgado e condenado foram sempre praticados num contexto de proximidade com a Ofendida, o qual já não se verifica atenta a alteração da residência da Ofendida para outra localidade, afastada por uma distância de 19 km´s, revelando-se assim uma forte redução no perigo de reincidência.
XXXI) Por sua vez, resulta ainda do teor do relatório social elaborado pelos serviços da D.G.R.S.P. o seguinte: “(…) A intimidação que o arguido evidenciou perante a ação do sistema de justiça, resultou na desvinculação deste face à ofendida, cessando qualquer contacto e/ou aproximação da mesma desde que iniciou a medida de OPHVE, realidade que foi confirmada pela ofendida. (…).”
XXXII) Destarte, o perigo de reincidência, além de ser aferido no momento da prolação da sentença, não pode deixar de implicar uma previsão ou prognose do comportamento futuro do Arguido concreto, não podendo fundar-se em meras abstracções com a referência a um certo tipo de crime, como o fez o Tribunal recorrido.
XXXIII) Na realidade, com a substituição da pena de prisão efectiva pela suspensão da sua execução, mesmo que sujeita a condições ou acompanhada de regime de prova, as razões de prevenção geral positiva ou de integração como finalidade a prosseguir com as penas não ficarão afectadas, sendo respeitado o sentimento jurídico da comunidade na validade e na força de vigência da norma penal violada pelo Arguido.
XXXIV) Perante as condições sociais e pessoais do Arguido supra enunciadas, o relatório social para determinação da sanção, elaborado segundo o disposto no artigo 370.º do C.P.P., acabou por concluir que:
(…) O arguido dispõe de apoio da família de origem que se constitui como suporte emocional e material do mesmo. Identifica-se ainda como fator de proteção a intimidação que o arguido apresenta, face à intervenção judicial, que se traduz na adoção de um comportamento adequado às regras e obrigações inerentes à medida de coação em curso.”
XXXV) De facto, a reclusão (como decidido pelo Tribunal recorrido) não contribui para a reinserção do Recorrente, nem o vai reabilitar para o mundo laboral e para a convivência em sociedade, razão pela qual as exigências de prevenção geral e de prevenção especial são ainda asseguradas com a aplicação ao mesmo de uma pena não privativa da liberdade.
(…)
XXXVII) Bem vistas as coisas, as necessidades de prevenção especial positiva e de reintegração do agente na sociedade, por via de regra, são melhor servidas mediante a aplicação de uma pena não privativa da liberdade, salvo situações de extremo desenquadramento social, o que não sucede no caso concreto do Arguido.
(…)
XXXIX) Na realidade, no juízo de prognose deve o Tribunal atender, no momento da elaboração da sentença, à personalidade do agente (designadamente ao seu carácter e inteligência), às condições da sua vida (inserção social, profissional e familiar, por exemplo), à sua conduta anterior e posterior ao crime (ausência ou não de antecedentes criminais, confissão aberta e relevante, ao seu arrependimento, à reparação do dano ou à prática de factos que obstem ao cometimento futuro crime em causa, bem como às circunstâncias do crime (como as motivações e fins que levaram o arguido a agir).
XL) Exigindo a prognose a valoração conjunta de todas as circunstâncias que tornam possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido, pois a finalidade político-criminal visada com o instituto da suspensão da pena é o afastamento da prática pelo arguido, no futuro, de novos crimes.
XLI) Na verdade, interromper a actual situação de liberdade e de inserção na sociedade em que o Recorrente se encontra, com um projecto de vida totalmente estruturado, será quebrar um percurso que o mesmo está a seguir e a frustrar as vias abertas por um novo escolhido pelo mesmo, merecendo o Recorrente uma oportunidade, da qual tem consciência de que não deve nem pode perder.
XLII) Além do mais, salvo o devido respeito por melhor opinião, uma parte das exigências de prevenção geral e especial que se fazem sentir no caso concreto já se encontram realizadas ou salvaguardadas, uma vez que o Recorrente, mesmo sujeito inicialmente à medida de prisão preventiva e posteriormente à medida de O.P.H.V.E., já se encontra privado da liberdade e já cumpriu mais de um ano da pena de prisão em que foi condenado.
XLIII) Permitindo-se, assim, formular um juízo de prognose no sentido de que a pena em que o Recorrente foi condenado, de 3 (três) anos, suspensa na sua execução até por um período superior de 4 (anos), complementada com regime de prova e sujeita ao cumprimento de deveres e obrigações, seja adequada e suficiente para prevenir qualquer tipo de reincidência, assentando tal regime num plano individual de readaptação social a delinear e a ser fiscalizado pela Direcção Geral de Reinserção Social.
XLIV) Por outro lado, foi determinado que o Tribunal de 1.ª Instância anulasse a sentença na parte respeitante à escolha e determinação da pena e que procedesse às diligências que se reputassem necessárias e essenciais para superar os vícios naquela notados.
XLV) Todavia, o Tribunal recorrido, por despacho datado de 09/05/2023, indeferiu a realização das diligências de prova suplementar requeridas pelo Recorrente, ao abrigo das disposições conjuntas dos artigos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do C.P.P., concretamente a elaboração de novo relatório social e a audição do respectivo técnico da D.G.R.S.P., considerando tais diligências probatórias como desnecessárias e intempestivas.
XLVI) Como se não bastasse, por despacho proferido no dia 10/05/2023, violando as expectativas do Arguido e o princípio da confiança, o Tribunal recorrido, “dando o dito por não dito” e em sentido contrário do que havia determinado anteriormente no despacho de 09/05/2023, determinou que a audiência daquela data, não se tratava de uma diligência de prova suplementar, mas sim de uma reabertura da audiência.
XLVII) Contudo, como resulta do anterior Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, verifica-se que o que resulta do relatório social junto aos autos são uma série de considerações, juízos de valor e opiniões do técnico de reinserção social que o elaborou e referências aos antecedentes criminais do Arguido, nada resultando de tal relatório que seja relativo à situação económica e social deste.
XLVIII) Além disso, como foi salientado em tal Venerável Acórdão, tais referências constantes do relatório social não encerram, nem correspondem a quaisquer factos concretos atinentes à personalidade do Arguido e às suas condições pessoais, sociais e económicas.
XLIX) Deste modo, é de sublinhar que o teor do relatório social é insuficiente para fundamentar a escolha e determinação da medida da pena, muito menos para alicerçar a efectividade da pena de prisão aplicada ao Arguido.
L) Impondo-se ao Tribunal um dever de averiguação dos factos atinentes às condições pessoais e à personalidade do Arguido, independentemente da sua alegação pelos sujeitos processuais.
LI) Com efeito, à luz do disposto no artigo 340.º, n.º 1 do C.P.P., a realização de um novo relatório social, no qual sejam elencados factos concretos relativos à personalidade do Arguido e às suas condições pessoais, trata-se de um meio de prova ou diligência probatória necessário à descoberta da verdade material e à boa decisão da causa.
(…)
LIII) Dito isto, atenta a ausência ou omissão no relatório social de qualquer factualidade concreta relativa à personalidade do Arguido e às suas condições pessoais, sociais e económicas, segundo as disposições conjuntas dos artigos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do C.P.P., sempre se impunha a elaboração de novo relatório social, bem como a audição do respectivo técnico da D.G.R.S.P., enquanto diligências a título de prova suplementar.
LIV) Fica, assim, lançada a dúvida pertinente de saber se o Tribunal recorrido, caso tivesse apurado as reais condições pessoais, sociais e económicas teria decidido da mesma forma quanto à necessidade de cumprimento efectivo da pena de prisão aplicada.
LV) No entanto, o Tribunal de 1.ª Instância não curou de averiguar, com precisão e rigor, as condições pessoais, sociais e económicas do Arguido, sendo a ausência de investigação nessa matéria essencial para a decisão final no que toca à escolha e determinação da pena, revestindo-se assim a factualidade apurada como insuficiente para fundamentar a efectividade da pena de prisão.
LVI) Nem valorou em qualquer medida o arrependimento sincero e a confissão parcial dos factos manifestados pelo mesmo em audiência de julgamento, acabando apenas por valorar em demasia os antecedentes criminais do Recorrente.
(…)
LVIII) Assim sendo, uma vez que o Tribunal a quo não averiguou, nem teve em consideração toda a matéria de facto relevante para a decisão a proferir em termos de determinação da medida concreta da pena e quanto à suspensão da execução da pena de prisão, a sentença recorrida não pode deixar de padecer do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a que alude o artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do C.P.P.
(…)
LX) Posto isto, da factualidade vertida na sentença recorrida, verifica-se que continuam a faltar elementos que, podendo e devendo ser indagados, são necessários para que se possa formular um juízo seguro de condenação e da exacta medida dessa condenação, tendo a sentença recorrida sido proferida com alguma exiguidade de factos atinentes à vida, condições pessoais, sociais, profissionais, bem como à personalidade do Arguido,
LXI) Desta feita, a sentença recorrida não pode deixar de padecer do vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, a que alude o artigo 410.º, n.º 2, alínea a) do C.P.P., quando competia ao Tribunal de 1.ª Instância proceder às diligências de prova entendidas como necessárias e essenciais para que fosse suprida a nulidade prevista nos artigos 379.º, n.º 1, alínea a) e 374.º, n.º 2, ambos do C.P.P.,
LXII) Tendo o Tribunal recorrido se limitado a determinar a reabertura da audiência para cumprir uma “mera formalidade”, ignorando por completo a produção de qualquer prova suplementar e não acatando de forma efectiva o que foi determinado pelo anterior Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora.
LXIII) Além disso, ao determinar a medida concreta da pena e a não suspensão da execução da pena de prisão sem ter em conta as condições pessoais, sociais e económicas do Arguido, o arrependimento sinceiro e a confissão dos factos realizados pelo mesmo em sede de julgamento, o Tribunal de 1.ª Instância violou o disposto nos artigos 71.º, n.º 2, alíneas d) e e), 72.º, n.º 2, alínea c) e o artigo 50.º, n.º 1, todos do C.P.
LXIV) Por seu turno, nos despachos proferidos nos dias 09/05/2023 e 11/05/2023, o Tribunal recorrido não se pronunciou se as diligências probatórias requeridas a título de prova suplementar se tornavam ou não necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa ou, se pelo contrário, se se tratavam de prova irrelevante ou supérflua, de obtenção impossível ou duvidosa.
LXV) Efectivamente, tudo se processou para que a produção de prova suplementar requerida pelo Recorrente nunca viesse a ter lugar, limitando-se o Tribunal a quo a determinar a reabertura da audiência para confrontar aquele com o relatório social já elaborado e cumprir a seu bel-prazer um mero formalismo legal.,
LXVI) Ignorando por completo as diligências de prova suplementar requeridas pelo mesmo, as quais se revelam essenciais para a descoberta da verdade e para o verdadeiro apuramento das condições pessoais do Arguido e da sua personalidade, quando aquele relatório padece das imprecisões e omissões supra elencadas no anterior Acórdão deste Tribunal da Relação de Évora e quando havia anteriormente determinado que a reabertura da audiência se destinaria a produção de prova suplementar.
(…)
LXIX) Destarte, impunha-se a realização das diligências probatórias requeridas pelo Recorrente, tendo os despachos de 09/05/2023 e de 11/05/2023, violado o disposto nos artigos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do C.P.P., acarretando, por sua vez, a nulidade por omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade, prevista no artigo 120.º, n.º 2, alínea d), da Lei Processual Penal.
LXX) Neste sentido, tal nulidade tem como consequência a invalidade do acto em que se verificou e dos actos subsequentes, designadamente da sentença, à luz do disposto no artigo 122.º, n.º 1, do C.P.P., devendo a mesma ser reclamada, por via de recurso e em devido tempo, determinando a sua procedência, a repetição do julgamento no seu todo.
LXXI) Por conseguinte, o indeferimento da realização das diligências de prova suplementar requeridas pelo Arguido é impugnável por meio do presente recurso e não da arguição de nulidades.
(…)
LXXIII) Posto isto, ao indeferir a realização das diligências de prova suplementar supra indicadas, o Tribunal recorrido violou, por erro de aplicação e de interpretação, o disposto nos artigos 340.º, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do C.P.P., incorrendo na nulidade a que alude o artigo 120.º, n.º 2, alínea d), do mesmo diploma legal, por omissão de diligências essenciais para o apuramento e descoberta da verdade material.
LXXIV) Por outra banda, a realização das diligências de prova suplementar requeridas pelo Recorrente são imprescindíveis à salvaguarda dos seus direitos fundamentais, consagrados constitucionalmente nos artigos 20.º, n.º 1 e 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da Lei Fundamental, entre os quais se encontra o direito constitucional de defesa.
LXXV) Como tal, as decisões de não realizar a produção destas diligências probatórias e a realização da reabertura da audiência sem a produção de qualquer prova suplementar, atingem e violam, em concreto, o conteúdo essencial das garantias de defesa da Arguida, consagrados no artigo 32.º, n.º 1, da C.R.P.
LXXVI) Na verdade, a investigação autónoma conferida ao Juiz de Julgamento encontra-se balizada pelo princípio constitucional das garantias de defesa a que alude o n.º 1, do artigo 32.º, da Lei Fundamental, as quais englobam todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação.
LXXVII) Nesta senda, levar o princípio da investigação autónoma do juiz do caso submetido a julgamento ao extremo da livre discricionariedade sobre os actos de produção de prova a praticar é, em concreto, atingir o conteúdo essencial das garantias de defesa consagradas no n.º 1, do artigo 32.º, da C.R.P.
LXXVIII) Deste modo, a preterição da produção das diligências probatórias requeridas redunda num grave atentado aos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagradas ao Arguido, mormente numa denegação da garantia da via judiciária, assegurada no n.º 2, do artigo 20.º e no n.º 1, do artigo 32.º, ambos da Lei Fundamental.
LXXIX) Efectivamente, a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem entendido que o direito de acesso aos tribunais ou à tutela jurisdicional implica a garantia de uma proteção jurisdicional eficaz ou de uma tutela judicial efetiva, cujo âmbito normativo abrange, nomeadamente, o direito de agir em juízo através de um processo equitativo.
LXXX) A jurisprudência e a doutrina têm procurado densificar o conceito de processo equitativo essencialmente através da formulação de princípios, entre os quais se contam o direito à prova, isto é, à apresentação de provas destinadas a demonstrar os factos alegados, e o direito a um processo orientado para a justiça material, em que a descoberta da verdade, assume especial importância.
(…)
LXXXII) Daí que a limitação probatória resultante dos despachos prolatados pelo Tribunal de 1.ª instância se revele desproporcionada, sacrificando injustificadamente o direito à prova e o direito a um processo orientado para a justiça material, violando, assim o direito a um processo equitativo, consagrado no artigo 20.º, n.º 4, da Constituição, bem como as garantias constitucionais de defesa do Arguido e do seu princípio do contraditório, consagrados no artigo 32.º, n.º 1 e 5 da Lei Fundamental.
LXXXIII) Aqui chegados, a interpretação e aplicação normativa efectuada pelo Tribunal a quo, resultante da conjugação dos artigos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do C.P.P, no sentido de indeferir a realização da elaboração de novo relatório social, bem como a inquirição do técnico da D.G.R.S.P. que o elaborou, enquanto diligências de prova suplementar, viola as garantias constitucionais de defesa da Arguida, consagradas constitucionalmente no artigo 32.º, n.ºs 1 e 5 da Lei Fundamental.
LXXXIV) Sendo ainda violadora do direito à prova e do direito a um processo justo e equitativo, decorrentes do artigo 20.º, n.º 1 e 4 da C.R.P., padecendo assim de inconstitucionalidade material, a qual desde já se invoca e se suscita para todos os efeitos legais.

Nestes termos e nos demais de direito, que V. Exas doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente Recurso e, por via dele, ser revogada a sentença de 1.ª Instância, sendo substituída por outra que decrete a suspensão da execução da pena que foi aplicada ao Recorrente, sujeita a regime de prova e ao cumprimento de deveres e regras de conduta, assim e como sempre se fazendo a necessária e costumada JUSTIÇA!
Por conseguinte, a interpretação e aplicação normativa efectuada pelo Tribunal a quo, resultante da conjugação dos artigos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do C.P.P, no sentido de indeferir a realização da elaboração de novo relatório social, bem como a inquirição do técnico da D.G.R.S.P. que o elaborou, enquanto diligências de prova suplementar, viola as garantias constitucionais de defesa da Arguida,
consagradas constitucionalmente no artigo 32.º, n.ºs 1 e 5 da Lei Fundamental, sendo ainda violadora do direito à prova e do direito a um processo justo e equitativo, decorrentes do artigo 20.º, n.º 1 e 4 da C.R.P., padecendo assim de inconstitucionalidade material, a qual desde já se invoca e se suscita para todos os efeitos legais.

3.O Ministério Público respondeu ao recurso pronunciando-se no sentido da confirmação da sentença proferida, apresentando as seguintes conclusões: (transcrição)

1.O recurso a que ora se responde é sobre matéria de direito e tem por objecto a sentença proferida nestes autos, no dia 11/05/2023, pelo tribunal ad quo e que condenou o arguido pela prática, em autoria material e na forma consumada de um crime de violência doméstica agravado, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, al. a) e n.º 2, alínea a), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos de prisão.
2.Adicionalmente, tem por objecto o despacho também proferido nestes autos, no dia 11/05/2023, e no qual o Tribunal ad quo, determinou que a audiência realizada nos autos, no dia 10/05/2023, não se tratava de uma diligência de prova suplementar, nos termos das disposições conjuntas dos artigos 369.º e 371.º, ambos do Código de Processo Penal, mas sim de uma reabertura da audiência, em virtude da anulação de parte da sentença anterior, determinada por este Tribunal da Relação de Évora.
3.Tem, ainda, por objecto o despacho proferido nestes autos, no dia 09/05/2023, e que indeferiu a realização da elaboração de novo relatório social e a inquirição do técnico da D.G.R.S.P. que o elaborou, a título de realização de prova suplementar, por não se mostrarem alegadamente necessárias e por serem extemporâneas.
4.Considera o Ministério Público que a sentença e despachos recorridos não são passíveis de qualquer censura e não violam quaisquer disposições legais, concordando-se integralmente com os mesmos.
5.O recorrente não pode recorrer do despacho datado de 11/05/2023, visto que nada alegou em sede de audiência de julgamento, ónus que se lhe impunha nos termos dos artigos 120.º, n.º 3, al. a) e 123.º do Código de Processo Penal, já que esteve presente no acto processual.
6.Ademais, o despacho em causa assume a natureza de mero expediente, uma vez que não tem qualquer real impacto no desenrolar dos actos sendo, portanto, irrecorrível por aplicação do artigo 400.º, n.º 1, al. a) do Código de Processo Penal.
7.A suspensão da execução da pena de prisão não acautelaria de forma adequada e suficiente as finalidades de punição, já que, tendo em conta a gravidade dos factos e a personalidade do arguido, não é possível formular um juízo de prognose favorável de que a simples ameaça do cumprimento da pena de prisão incutisse neste um temor que levasse a que se inibisse de praticar novos ilícitos, não se mostrando, assim, como preenchidos os pressupostos do artigo 50.º do Código Penal.

8.Atendendo ao lapso temporal próximo em que ocorreu a prática dos crimes objectos dos presentes autos e os do processo n.º 1/20.... (tendo os primeiros sido, inclusive, praticados durante o período de suspensão da pena de prisão do processo n.º 1/20....), devem, neste caso concreto, os antecedentes criminais do arguido adquirirem uma particular relevância para efeitos de aferição da não suspensão da pena de prisão.
9.Nunca poderia o Tribunal ad quo deixar de valorar tais factores em desfavor do arguido, considerando-se que bem andou a MM.ª Juíza de Direito ao condenar numa pena de prisão efectiva, aplicando de forma correcta os artigos 40.º, 50.º, 70.º e 71.º, todos do Código Penal.
10.Acresce que os factos em apreciação são altamente gravosos e censuráveis, os quais revelam que o arguido tem uma personalidade pautada pela violência, possessividade, imponderação, propensão para o ciúme e de desejo de manter uma relação de dominância de terceiros que lhe são vulneráveis.
11.É também guiado por um absoluto sentimento desprezo pela dignidade, vida, saúde física, psíquica e emocional da vitima, pessoa que deveria proteger invés de sujeitar aos males descritos nos factos dados como provados.
12.É manifesto que a suspensão da execução da pena de prisão no processo anterior de pouco serviu para levar o arguido a abster-se da prática de novos ilícitos e em tudo semelhantes aos que havia praticado anteriormente, sendo altamente duvidoso de que a resposta adequada seja uma nova suspensão.
13.Os factos invocados pela defesa para atenuar as necessidades de prevenção especial são insuficientes para formular um juízo de prognose favorável e no qual se conclua que o mesmo não irá praticar ilícitos semelhantes caso a pena de prisão seja suspensa na sua execução.
14.O arguido estar socialmente, profissional e familiarmente inserido não pode, por si só, servir de fundamento para obstar à aplicação de prisão efectiva, uma vez que isso não o inibe de praticar crimes semelhantes.
15.A eventual destabilização socioeconómica causada pelo cumprimento da prisão efectiva, embora onerosa para o arguido, é uma consequência necessária e da responsabilidade exclusiva deste, não podendo, agora, escudar-se nela como forma de obstar a uma pena que se impõe cumprir e que tem a finalidade fazer cessar a prática criminosa em definitivo.
16.É irrelevante que o arguido tenha cumprido escrupulosamente a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, sendo tal conduta expectável, já que por um lado, o mesmo sabe o que lhe acontecerá caso incumpra como, por outro, sabe que tal incumprimento será rapidamente detectado pela DGRSP, sendo, essencialmente, essas circunstâncias que o demovem de voltar a incumprir com as medidas de coacção impostas.
17.A vítima não deverá ser tida como “culpada” por factos que são da inteira responsabilidade do arguido ou facilitadora dos mesmos, devendo tais considerações serem consideradas, no mínimo, arcaicas e obsoletas à luz dos valores civilizacionais actuais.
18.Seria incompreensível para a generalidade de população que o arguido beneficiasse de uma nova suspensão da sua pena de prisão, após praticar ilícitos da mesma natureza e no período de uma suspensão de execução da pena de prisão a que havia sido anteriormente condenado.
19.Deixar o arguido beneficiar de uma nova suspensão da execução da pena de prisão não incutirá no mesmo o altíssimo desvalor da suas acções, impedindo-o de entender as consequências que advirão da prática de actos semelhantes, pelo que tal decisão corresponderia a um risco temerário, inútil e suportado não em factos objectivos palpáveis, mas num desejo/esperança de que, desta vez, o arguido, por só, tenha interiorizado tal desvalor e actue no futuro conforme o Direito.
20.É manifesto que o mesmo continua a não se coibir de praticar actos relevantes que inviabilizam a suspensão da execução da pena de prisão, existindo notícias recentes nos autos de que o arguido terá dito ao seu filho, menor de idade, que pretendia matar a mãe (a ofendida) quando fosse autorizado a sair da habitação.
21.A pena de prisão efectiva, a cumprir em estabelecimento prisional, é a única pena que pode ser considerada justa, necessária, adequada e proporcional a assegurar as finalidades preventivas em causa nos presentes autos e compatível com a culpa do arguido, pelo que se concorda integralmente com a sentença recorrida.
22.Na douta sentença recorrida, constam os antecedentes pessoais e criminais do arguido, a escolaridade do mesmo, composição do seu agregado familiar e filiação, os seus rendimentos e despesas bem como as suas perspetivas de trabalho, pelo que se considera que o Tribunal deu como provado factos aptos e suficientes para fundamentar a decisão de direito, in casu, a condenação do arguido, inclusivamente para efeitos do afastamento da hipótese de suspensão da execução da pena de prisão.
23.Foram dados também como provados factos que evidenciam que não se tratou de uma “situação infeliz”, mas de uma continuação da actividade criminosa, que só foi interrompida pela condenação anterior do arguido e, mais recentemente, pela sua detenção à ordem dos presentes autos.
24.A não realização de relatório social poderá levar implicar indirectamente outras consequências legais como o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, previsto no artigo 410.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Penal.
25.Porém, nunca poderá implicar qualquer vício correspondente às nulidades previstas nos artigos 119.º ou 120.º do Código de Processo Penal, nomeadamente de omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade, ou mesmo de qualquer irregularidade previstas no artigo 123.º do mesmo diploma legal.
26.Não pode o Tribunal ad quo “forçar” o técnico da DGRSP a remover do relatório social considerações que o mesmo tenha por convenientes, sendo da exclusiva responsabilidade deste último as peças que elabora como bem entende. Questão diferente é de se o Tribunal depois aproveita ou não o que aí foi redigido.
27.O relatório social junto é dotado de alguma factualidade concreta relativa às condições socioeconómicas do arguido (dinâmica familiar em que cresceu, descendentes, formação escolar, rendimentos, inserção profissional, relacionamentos com a ofendida, hábitos de consumo de álcool, actividades praticadas durante os tempos livres, necessidade de interiorização do desvalor das suas acções, recusa em reconhecer problemas aditivos, etc), sendo que eventuais juízos de valor ou conclusões que constem nesse relatório tecidas pelo técnico da DGRSP que elaborou o documento em questão não colocam em causa os restantes elementos.
28.O próprio arguido prestou declarações tanto em audiência de julgamento como na sua reabertura de forma a elucidar o Tribunal ad quo de questões que se tinham como pertinentes, tendo a defesa tido oportunidade de trazer aos autos tudo o que tivesse por conveniente.
29.A elaboração de novo relatório social, tendo em conta os elementos já elencados no documento junto, complementados pelas declarações do arguido, seria desnecessária já que o técnico se limitaria a expurgar do relatório as suas “opiniões” e a entrevistar novamente o arguido, onde este voltaria a repetir o que já havia dito à MM.ª juíza.
30.Inexistia também qualquer fundamento para a audição do técnico da DGRSP, uma vez que o mesmo se limitaria a declarar o que já mencionou no relatório.
31.Desde que assegurado o contraditório, não deverá, pois, um exercício da magistratura de contacto directo e pessoal com os intervenientes processuais ser obrigatoriamente substituído ou subordinado à intervenção de entidades terceiras, já que se o Tribunal entendeu que deveria ser o próprio a apurar as condições socioeconómicas do arguido, nada há a obstar a que o apuramento da verdade material seja efectuado dessa forma.
32.Não ficaram por provar factos relativos às condições socioeconómicas do arguido.
33.O anterior acórdão já tomou posição quanto à questão da valoração do arrependimento do arguido, tendo entendido que o mesmo não teria que ser dado como provado. Não tendo sido dado como provado, não poderá ser valorado.
34.O arguido mais não fez do que, após finda a totalidade da produção de prova, alegar que estava arrependido, o que, salvo, melhor opinião não consubstancia qualquer confissão ou arrependimento relevante para efeitos do 72.º, n.º 2, a c) do Código Penal, uma vez que tal acto de alegada “contrição” foi desacompanhado de quaisquer actos materiais relevantes que colocassem em debate a hipótese de arrependimento para efeitos de atenuação especial da pena.

35.Da interpretação das normas previstas nos artigos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal, não resultou qualquer violação do princípio constitucional do contraditório, previsto no artigo 32.º, n.º 1 e 5 da Constituição da República Portuguesa, já que o arguido teve todas as oportunidades de se pronunciar em toda a duração do julgamento sobre os temas em apreciação, tendo sido dado integral cumprimento ao artigo 361.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
36.Inexiste igualmente qualquer violação do direito à prova ou de um processo justo e equitativo, previsto no artigo 20.º, nº 1 e 4 da Lei Fundamental, na medida em que o arguido teve possibilidade de fazer prova de tudo o que bem entendeu.
37.Não pode o arguido confundir o direito à prova com uma submissão obrigatória às suas pretensões probatórias, caso sejam consideradas pelo Tribunal ad quo, irrelevantes e supérfluas.
38.Se o arguido não alega nem impugna factos relativos às suas condições socioeconómicas, nada poderá requerer, já que nada tem a provar.
39.A interpretação efectuada pelo Tribunal ad quo ao aplicar as normas jurídicas previstas nos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do Código de Processo Penal, não padece de qualquer inconstitucionalidade.
Pelo que, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, devendo a douta sentença e os despachos datados de 09/05/2023 e 11/05/2023 serem integralmente confirmados, nos seus precisos termos, o que se requer aos Venerandos Desembargadores.
Assim sendo feita a costumada Justiça.

4. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Ex.ma Senhora Procuradora-Geral Adjunta, na intervenção a que alude o artigo 416.º do CPPenal, emitiu parecer pronunciando-se também no sentido da improcedência do recurso, referindo (s)ufraga-se, na íntegra, a posição defendida na resposta apresentada pelo Ministério Público na primeira instância, para cuja argumentação se remete.
Não se vislumbra que a douta sentença mereça censura, concordando-se com a pena aplicada, a qual foi fundamentada de forma consistente, em matéria de facto e de direito, ponderando todas as circunstâncias relevantes previstas nas normas legais aplicáveis (…) afigura-se-nos que o recurso interposto deve improceder, mantendo-se a decisão recorrida[2].

O arguido recorrente veio apresentar pronunciamento, em sequência, no qual reproduz toda a argumentação já expressa no articulado recursório.

5. Efetuado exame preliminar e colhidos que foram os vistos legais, cumpre agora, em conferência, apreciar e decidir.

II – Fundamentação

1.Questões a decidir

Sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, designadamente a verificação da existência, ou não, dos vícios indicados no artigo 410°, n° 2 do CPPenal, o âmbito do recurso é dado, nos termos do artigo 412º, nº 1 do citado complexo legal, pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respetiva motivação, nas quais sintetiza as razões do pedido - jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário das secções do STJ de 19/10/95 in D.R., I-A de 28/12/95.
Partindo de todo o elenco de fundamentos do recurso interposto pelo arguido – os quais, mais uma vez, nem sempre se mostram de clareza e congruência, considerando toda a motivação e as extensas conclusões apresentadas - e os poderes de cognição deste tribunal, importa apreciar e decidir as seguintes questões:
- modalidade da pena aplicada relativa ao crime de violência doméstica;
- vício da alínea a) do nº 2 do artigo 410º do CPPenal;
- violação do plasmado nos artigos 340º, 369º, nº 2 e 371º, nºs 1 e 2, todos do CPPenal, operando a nulidade inserta no artigo 120º, n.º 2, alínea d), do mesmo complexo legal;
- arrependimento do arguido recorrente;
-inconstitucionalidade da interpretação e aplicação normativa efetuada pelo tribunal recorrido respeitante à conjugação do estipulado nos artigos 340º, nº 1, 369º, nº 2 e 371º, nºs 1 e 2, todos do CPPenal.

2. Apreciação

2.1. O Tribunal recorrido considerou provados e não provados os seguintes factos: (transcrição)

A.Factos provados
Da produção de prova efectuada na audiência de julgamento resultaram provados os seguintes factos:
Da acusação pública
1.Em data não concretamente apurada do ano de 2008, o arguido AA e DD iniciaram um relacionamento amoroso, tendo contraído matrimónio entre si no dia 28 de Setembro de 2015.
2.Tal relacionamento amoroso perdurou até 08 de Janeiro de 2020, tendo nessa data terminado a relação entre ambos e DD abandonado a residência comum.
3.Fruto dessa relação amorosa entre o arguido e DD nasceu, em .../.../2014, II.
4.Fruto de um relacionamento anterior de DD, nasceu em .../.../2002, JJ, e em .../.../ de 2004 nasceu KK.
5.Entre, pelo menos, Abril de 2014 e 08 de Janeiro de 2020, o arguido e DD fixaram residência comum na habitação sita na Estrada ..., ..., em ....
6.Desde, pelo menos, Janeiro de 2018, o arguido passou a ingerir bebidas alcoólicas em excesso.
7.Por sentença, transitada em julgado em 15 de Março de 2021, no processo n.º 1/20...., foi o arguido condenado pela prática, em autoria material, na forma consumada e concurso efectivo, de um crime de ofensa à integridade física e de um crime de violência doméstica cometido contra DD, nas penas de 150 dias de multa, à taxa diária de 6,00 €, e de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa por igual período, condicionada tal suspensão a regime de prova.
8.Mais foi o arguido condenado, no âmbito da aludida decisão, na pena acessória de proibição de contactos com DD, por qualquer meio, pelo período de 2 anos e 8 meses, com a obrigação de o arguido não se aproximar da residência, nem do local de trabalho da mesma, nos termos do disposto nos artigos 152.º, n.ºs 4 e 5 do Código Penal.
9.O período da pena acessória de proibição de contactos e de aproximação com DD, iniciou-se em 15 de Março de 2021, tendo termo previsto para o dia 15 de Novembro de 2023.
10.Não obstante a condenação na pena acessória de proibição de contactos, em diversas ocasiões, situadas entre Março de 2021 e Março de 2022, o arguido continuou a contactar DD, deslocando-se inclusivamente à residência desta.
11.Por diversas ocasiões, em datas não concretamente apuradas, situadas entre Janeiro de 2022 e Março de 2022, o arguido efectuou diversas chamadas telefónicas a partir do seu telemóvel para o telemóvel de DD e enviou-lhe mensagens escritas, no âmbito das quais lhe disse “se não ficas comigo, não ficas com mais ninguém”.
12.Em data não concretamente apurada, mas após o dia 01 de Janeiro de 2022, na presença do filho em comum, II, o arguido efectuou uma chamada telefónica do seu telemóvel para o telemóvel de DD, questionando-a sobre qual o motivo para não estar em casa, onde estava e com quem estava.
13.Nessa sequência, o arguido iniciou uma discussão, motivada por ciúmes, com DD, no âmbito da qual lhe disse que “lhe ia dar um tiro na cabeça”.
14.Nessa data, na presença do filho em comum II, o arguido efectuou várias chamadas telefónicas a partir do seu telemóvel para o telemóvel de DD, no âmbito das quais lhe disse “onde andas?”, “o que andas a fazer?”, “andas a brincar comigo”, “se não ficas comigo, não ficas com mais ninguém”, “eu mato-te. Dou-te um tiro na cabeça”.
15.Nos dias seguintes, após regressar à casa da progenitora, DD, o filho comum II disse-lhe “mãe, o pai diz que te mata. Diz que te dá um tiro na cabeça”.
16.No dia 07 de Fevereiro de 2022, pelas 01h54, o arguido redigiu e enviou para o telemóvel de DD as seguintes mensagens “o meu filho esteve aí um dia enteiro nem os trabalhos de casa vez e uma vergonha e por isso que ele não gosta de estar ai ele já conta muito caixas que vem” e “era para ir dia 15 ao tribunal sobre o divorcio não vou vou tratar das coisas de outra maneira visto que tens a mania de esperta.”.
17.Nessa ocasião o arguido redigiu e enviou para o telemóvel de DD as seguintes mensagens com o teor “visto que tens dinheiro para pagar a um advogado sera”, “levas noites inteiras na NET”, “posso ir a merda mas tu também Vaz nao brinca comigo ti aproveitarem de mim para estares ca se nao fosse eu nao estavas ca agora a musica vai ser outra vamos ver quem ganha.” e “tens feito de mim um burro agora vamos ver nem o teu filho gosta de ti e uma vergonha um anjinho com 7 anos”.
18.No dia 27 de Março de 2022, pelas 20h00, o arguido deslocou-se, no seu veículo, ao restaurante denominado «A...», sito na Avenida ..., em ....
19.Nessa ocasião, o arguido, ao avistar que DD que se encontrava sentada na esplanada daquele estabelecimento, parou o seu carro e dirigiu-se a DD.
20.Temendo o que o arguido lhe pudesse fazer, DD entrou dentro daquele estabelecimento.
21.De seguida, DD, receando pela sua integridade física e pela sua vida, abandonou aquele espaço comercial.
22.Nessa ocasião, quando se encontrava na esplanada do referido estabelecimento, o arguido disse, em tom de voz elevado, “Puta. Eu mato-te”, dirigindo-se a DD, acreditando que a mesma se encontrava no interior do mencionado estabelecimento e que tinha ouvido aquelas expressões.
23.De seguida, o arguido deslocou-se até à entrada daquele estabelecimento, tentando entrar no mesmo com a finalidade de abordar e confrontar DD, pensando que a mesma se encontrava no interior do mesmo.
24.No dia 28 de Março de 2022, entre as 18h00 e as 19h00, o arguido efectuou diversas e constantes chamadas telefónicas a partir do seu telemóvel para o telemóvel de DD, as quais não foram atendidas pela mesma.
25.Pelas 19h00, DD atendeu uma chamada telefónica efectuada pelo arguido, no âmbito da qual o mesmo lhe disse: “se não ficas comigo, não ficas com mais ninguém” e “eu mato-te”.
26.Nesse dia, 28 de Março de 2022, pelas 20h50, o arguido deslocou-se à habitação de DD, sita na Rua ..., em ....
27.Nessa ocasião, o arguido aproximou-se da porta de entrada daquela habitação e desferiu vários murros e pontapés naquela porta, com vista a arrombá-la e a introduzir-se no interior da casa de DD, enquanto proferia contra a mesma, em tom de voz elevado, as seguintes expressões “abre a porta senão eu mato-te”, “eu mato-te”, “ou sais de ... ou eu mato-te”, “eu vou preso, mas tu vais para debaixo da terra” e “prefiro ver-te morta do que com outra pessoa”.
28.Nessa ocasião, DD, receando pela sua integridade física e pela sua vida, refugiou-se no interior do seu quarto e fechou a porta.
29.De seguida, o arguido agarrou num vaso de barro de DD e atirou-o contra a porta da casa daquela, tendo assim partido a fechadura e o vidro da porta, logrando abri-la.
30.Acto contínuo, o arguido entrou no interior da habitação de DD, apesar de saber que o fazia contra a sua vontade.
31.De seguida, o arguido desferiu diversas pancadas na televisão, candeeiros, cortinados e em vários objectos decorativos, que se encontravam na sala, no corredor e na casa de banho da casa de DD, cujos bens eram da propriedade desta.
32.Com tais actos, o arguido partiu a televisão, candeeiros, cortinados e vários objectos decorativos de DD.
33.Nessa ocasião, enquanto partia os objectos que se encontravam no interior da casa de DD, o arguido proferiu contra esta as expressões “eu mato-te, dormes com todos os homens de ...”.
34.Após, o arguido deslocou-se até à porta do quarto de DD e aí chegado, o mesmo desferiu várias pancadas naquela porta, tentando arrombá-la, enquanto proferia, contra a mesma, em tom de voz alto e agressivo, as expressões “eu mato-te”.
35.Nesse momento, o arguido, após se aperceber que DD tinha solicitado auxílio policial, abandonou de imediato a habitação da mesma, deslocando-se para parte incerta.
36.No dia 01 de Maio de 2022, pelas 20h30, o arguido, acompanhado do filho comum II, deslocou-se ao restaurante denominado «A...», sito na Avenida ..., em ....
37.Nessas circunstâncias de tempo e lugar, DD encontrava-se no interior daquele estabelecimento comercial.
38.Nessa ocasião, ao avistar DD, o arguido aproximou-se da mesma e disse-lhe as seguintes expressões “não brincas comigo”, “fui eu que te meti aqui” e “faço-te a folha”.
39.Tais expressões foram proferidas pelo arguido contra DD, na presença do filho comum II, que ali se encontrava.
40.Após escutar tais expressões, DD temeu pela sua vida e pela sua integridade física, tendo abandonado de imediato o local, dirigindo-se para a sua residência.
41.Em consequência do comportamento do arguido e das expressões por si proferidas, nesse dia e nos dias seguintes, DD sofreu ataques de ansiedade e viveu num profundo estado de ansiedade, temor e sobressalto, receando que o arguido pudesse penetrar na sua residência a qualquer momento e viesse a concretizar as palavras que lhe dirigiu, pondo termo à sua vida.
42.Em consequência dos actos supra referidos praticados pelo arguido, DD sentiu-se injuriada, humilhada, importunada e enxovalhada com as expressões proferidas por aquele.
43.Em virtude dos actos praticados e das expressões proferidas pelo arguido, supra referidas, DD sentiu medo e inquietação pela sua integridade física e pela sua vida.
44.O arguido sabia que a sua conduta e as expressões supra referidas que proferiu eram aptas a fazer DD recear pela sua integridade física e pela sua vida, o que quis e conseguiu.
45.Ainda ao proferir as supra citadas expressões previu e quis o arguido agir do modo acima descrito com o intuito concretizado de amedrontar DD, e de a perturbar no seu sentimento de segurança, e na sua liberdade de movimentação e actuação, bem sabendo que as palavras por si proferidas, alusivas a morte, revestiam carácter de seriedade e eram susceptíveis de causar temor e insegurança na visada, como efectivamente causaram.
46.O arguido agiu com o propósito de maltratar e molestar a saúde psíquica e emocional de DD, que sabia ser seu cônjuge, não se inibindo de o fazer e bem sabendo que o fazia, pelo menos em algumas das ocasiões supra referidas, na presença de II, filho comum e menor de idade, pretendendo com tais actos submeter DD aos seus desígnios, humilhá-la, molestar a sua integridade moral, diminuir a sua dignidade e consideração pessoal, coarctar a sua liberdade de decisão, acção e movimento, e assim, causar-lhe perturbação emocional, tristeza, receio, insegurança, intranquilidade, medo humilhação e angústia, querendo assim ofendê-la na sua dignidade de pessoa humana, com pleno conhecimento de que as suas condutas eram idóneas e adequadas a alcançar tais resultados, o que tudo quis e logrou concretizar.
47.Mais sabia o arguido que sobre o mesmo impediam especiais deveres de respeito e assistência em relação ao seu cônjuge, decorrentes do vínculo que os uniu.
48.O arguido agiu sempre no intuito concretizado de afectar e perturbar constantemente a sua esposa, através da prática dos referidos actos ofensivos e expressões que proferiu, pelo menos, desde Janeiro de 2022 até 01 de Maio de 2022, e estando ainda ciente de, pelo menos após 15 de Março de 2021, ter contactado e maltratado a mesma de forma reiterada e violando a regra de conduta e a pena acessória a que estava sujeito por força da condenação no âmbito do processo n.º 1/20...., revelando não possuir respeito pelo seu cônjuge, nem pela decisão judicial, o que logrou alcançar.
49.O arguido actuou ainda com o propósito concretizado de desferir pontapés e pancadas nos objectos e bens supra referidos de DD, existentes no interior da residência desta, e nas portas da casa da mesma e assim degradar as suas estruturas e revestimentos exteriores, que sabia não serem seus, o que logrou alcançar.
50.O arguido actuou com o propósito concretizado de entrar no interior da residência de DD, bem sabendo que o fazia sem autorização e contra a sua vontade, violando, deste modo, a privacidade de DD.
51.O arguido agiu de forma livre deliberada e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal.
Da contestação
52.Por sentença proferida no dia 16-05-2022, no processo n.º 1537/21...., transitada em julgado no dia .../.../2022, foi decretado o divórcio por mútuo consentimento entre o arguido e DD, tendo sido declarado dissolvido o seu casamento.
Dos factos trazidos pelo arguido
53.Após o trânsito em julgado da sentença referida em 7., o arguido e DD reataram, durante um período de tempo não concretamente apurado, a relação amorosa, não tendo, contudo, voltado a residir juntos.
Das condições pessoais e socioeconómicas
54.O arguido é manobrador de máquinas.
55.Exercia também o cargo de encarregado geral de obras.
56.Em virtude de estar a cumprir a medida de coacção de obrigação de permanência na habitação à ordem dos presentes autos, não se encontra a exercer a sua actividade laboral.
57.Antes de estar a cumprir medida de coacção privativa da liberdade auferia entre 950,00 € e 1.000,00 € mensais como manobrador agrícola na empresa “A B...”.
58.O arguido tem o 6.º ano de escolaridade.
59.Vive em casa própria sozinho, liquidando uma prestação mensal de 450,00 € ao Banco, a título de empréstimo.
60.Em virtude de não ter, de momento, ocupação laboral tem vivido de poupanças que tinha feito ao longo dos anos de trabalho.
61.Tem dois filhos, um deles com 25 anos e outro com 9 anos de idade, entregando, para o segundo, a quantia mensal de 150,00 € a título de pensão de alimentos.
62.O arguido celebrou, no dia 18 de Agosto de 2022, um acordo denominado “Promessa de contrato de trabalho sem termo”, com LL, para desempenhar a categoria profissional de pedreiro, sendo que este acordo entrará em vigor “logo que haja disponibilidade por parte do trabalhador”.
63.O arguido tem recebido, igualmente, outras propostas de trabalho para realizar algumas obras.
Dos antecedentes criminais
64.O arguido foi condenado:
a.No processo n.º 1/20...., por sentença transitada em julgado a 15-03-2021, pela prática, no mês 07-2018 e no dia 08-01-2020, em autoria material, na forma consumada, e em concurso efectivo, de um crime de ofensa à integridade física e de um crime de violência doméstica, nas penas de 150 dias de multa, à taxa diária de 6,00 €, o que perfaz o total de 900,00 €, e na pena de prisão de 2 anos e 8 meses, suspensa pelo mesmo período, com a obrigação de frequência de programas de prevenção de violência doméstica, e com a pena acessória de proibição de contactos com a vítima, pelo mesmo período.
b.No processo n.º 27/21...., por sentença transitada em julgado a 31-05-2021, pela prática, no dia 10-04-2021, em autoria material, na forma consumada, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de 5,50 €, o que perfaz o total de 330,00 €, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, pelo período de 3 meses e 15 dias.

*
B.Factos não provados
Da produção de prova efectuada na audiência de julgamento não resultaram provados os seguintes factos:
a.O facto 6. ocorria com frequência diária.
b.Na circunstância referida em 11., o arguido disse a DD “vou-te lixar a vida”.
c.Na circunstância descrita em 14., o arguido proferiu as seguintes expressões “vou-te lixar a vida” e “não me importo de ir preso, mas mato-te”.
d.Na circunstância referida em 21., DD saiu por uma porta lateral, sem que o arguido se tivesse apercebido.
e.Em 22., o arguido disse a seguinte expressão “é para isto que queres o divórcio?”.
f.Nesse momento, foi barrada a sua entrada no estabelecimento por MM, tendo nessa ocasião o arguido afirmado o seguinte “são só putas, que nunca viram uma preta, mas esta preta é minha, vou a casa buscar a espingarda e mato-te”, referindo-se a DD.
g.Posteriormente, o arguido após constatar que DD já não se encontrava naquele estabelecimento comercial, abandonou o local.
h.Em 31. e 34., o arguido desferiu diversos pontapés.
i.Em 33., o arguido proferiu a expressão “puta”.
j.Em 35., o arguido proferiu a expressão “não brincas comigo”.

2.2. Fundamentação da matéria de facto: (transcrição)

A decisão sobre o elenco dos factos dados como provados e não provados, resulta da análise crítica da prova produzida em audiência de julgamento (cfr. artigo 355.º, n.º 1 do Código de Processo Penal), tendo a mesma sido apreciada à luz das regras da lógica e da experiência comum, segundo o princípio da livre apreciação da prova, conforme o disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal.
Ora vejamos.
O arguido esteve presente na audiência de julgamento e quis prestar declarações que, apesar de estarem em consonância com as que prestou em sede de primeiro interrogatório judicial, se afiguraram pouco condizentes com as regras da experiência comum, não tendo sido, por isso, atribuída credibilidade às mesmas (à excepção das declarações acerca das suas condições socioeconómicas, conforme infra se verá, e do facto de ter reatado a relação com DD).
Para além disso, o discurso do arguido foi sempre voltado para a atribuição de culpas à ofendida, desresponsabilizando-se das suas atitudes.
Refira-se que o arguido admitiu a prática dos factos n.ºs 16 e 17, sendo certo que os mesmo sempre estariam provados através da prova documental junta aos autos, em concreto, os prints das mensagens a fls. 81 e 82.
Ademais, o arguido também admitiu ter ido estado no café «A...», nos dias 27 de Março de 2022 e 01 de Maio de 2022, embora tivesse negado a prática dos factos descritos no elenco dos factos provados.
Diga-se ainda, que o arguido admitiu, igualmente, a prática dos factos n.ºs 26, 29, 31, 32 (estes dois parcialmente), embora tenha justificado as mesmas, mais uma vez, com condutas de DD, referindo que a mesma lhe tinha dado com um ferro na cabeça e tinha ficado com a cabeça a sangrar.
Da mesma forma de foi arquivada a queixa do arguido, também aqui se consideram insuficientes as declarações do arguido, tanto mais que as testemunhas que estiveram no local não viram nenhum sangue no chão.
Por seu turno, as declarações para memória futura de DD consideram-se claras, objectivas, emocionadas, espontâneas, sem grandes hesitações e, por isso, credíveis.
Aliás, diga-se que DD até adoptou um discurso algo desculpabilizante da conduta do arguido, atribuindo ao álcool todos os motivos para este praticar os factos que acima se provaram, referindo que a relação tinha sido muito feliz em ..., e em parte quando viveram em Portugal.
Desta forma, considera-se que DD não empolou quaisquer factos, porquanto tanto declarou coisas más do arguido, como aspectos positivos do mesmo e da relação que perdurou entre ambos.
Assim, deram-se como provados os factos n.ºs 1 a 6, 10 a 15, 18 a 21, 24 a 43.
Refira-se ainda que também se atribuiu relevância às declarações para memória futura da criança II, filha do arguido e da ofendida, que se mostraram espontâneas, apesar da timidez habitual para a sua tenra idade.
O mesmo afirmou ter presenciado o episódio referido nos factos n.ºs 12 a 14, tendo, posteriormente, contado o mesmo à sua mãe (cfr. facto n.º 15).
Para além disso, o menino referiu ter também assistido, depois do Natal de 2021, quando estava no café com o pai (arguido), o mesmo a dizer à mãe (ofendida) que a matava.
Quanto às testemunhas NN e OO, ambos Militares da GNR, depuseram de forma clara e objectiva, e, por isso, credível, sendo que se deslocaram a casa de PP no dia 28 de Março de 2022.
Para além de terem relatado a destruição que ali presenciaram, tiraram as fotografias a fls. 211 e seguintes, sendo que as mesmas são, efectivamente, ilustrativas do estado em que ficou a casa da ofendida.
Ademais, os Militares também depuseram acerca do estado de ansiedade e de nervos em que se encontrava DD quando chegaram à sua habitação.
Diga-se, porém, que estas testemunhas não viram o arguido no local, tendo chegado apenas após a situação ter cessado, o que vai de acordo com as declarações de DD, que mencionou que o mesmo se ausentou quando percebeu que esta solicitou auxílio das forças policiais.
Ademais, considerou-se ainda o depoimento da testemunha KK, filha de DD, que, apesar dessa qualidade, depôs também de forma clara e objectiva, embora algo contida.
Contudo, a mesma mencionou que estava em casa com a sua mãe no dia 28 de Março de 2022, tendo presenciado toda a situação, descrevendo-a com pormenor.
KK afirmou ainda ter ouvido, nesse dia, através do telefone, o arguido a dizer à sua mãe que a matava.
À semelhança dos Militares da GNR, também esta testemunha apontou o estado de ansiedade em que a sua mãe se encontrava, após o ocorrido.
Refira-se que o depoimento desta testemunha foi coerente e coincidente com as declarações para memória futura prestadas por DD, o que conferiu ainda mais credibilidade a uma e a outra.
Quanto às testemunhas QQ RR, amiga de DD, e JJ, filho de DD, entende-se que as mesmas depuseram de forma clara, embora não se recordassem de alguns pormenores, o que é natural atento o lapso temporal decorrido.
Contudo, no essencial, os seus depoimentos foram coerentes e coincidentes entre si, tendo mencionado as expressões descritas no facto n.º 22, bem como presenciado os factos n.ºs 18 a 23.
No que diz respeito à testemunha MM, entende-se que o seu depoimento foi algo confuso e pouco objectivo, não se tendo, por isso, atribuído relevância ao seu teor.
Os factos n.ºs 7 a 9, deram-se como provados através do teor da certidão junta aos autos a fls. 103 a 155.
Quanto aos factos n.ºs 44 a 51, o Tribunal formou a sua convicção através das regras da experiência comum, conjugadas com os restantes factos que se deram como provados.
No que concerne ao facto n.º 52, deu-se o mesmo como provado através da certidão da sentença junta aos autos no dia 28-10-2022 (cfr. referência n.º ...89).
No que diz respeito aos factos n.ºs 53 a 63, os mesmos provaram-se através do teor das declarações do arguido, prestadas em audiência de julgamento, sendo que não existem, nesta parte, razões para crer que as mesmas não sejam verdadeiras, uma vez que foram claras e espontâneas.
O facto n.º 53, também se deu como provados através das declarações para memória futura de DD, que confirmou, igualmente, este facto.
Diga-se ainda que os factos n.ºs 54 a 63 também se encontram corroborados através do teor do relatório social junto aos autos no dia 13-10-2022 (cfr. ref.ª n.º ...66).
Refira-se que o facto n.º 62, também se provou através do documento intitulado por “promessa de contrato de trabalho sem termo”, junto pelo arguido no requerimento datado de 24-08-2022 (cfr. fls. 615 a 617).
O facto provado n.º 64 resulta da prova documental junta aos autos, mais concretamente, do teor do Certificado do Registo Criminal do arguido (junto no dia 10-10-2022).
Por fim, quanto às testemunhas SS e TT, companheira de JJ, as mesmas não demonstraram conhecimento directo dos factos da acusação pública, não se recordando dos pormenores que presenciaram, pelo que não foi dada relevância aos seus depoimentos.
E ainda, no que concerne aos depoimentos das testemunhas UU, EE, FF, GG, VV, WW e LL, todos amigos/conhecidos do arguido, refira-se que as mesmas não tinham conhecimento directo dos factos em discussão, não tendo presenciado nenhum dos factos que vinham descritos na acusação pública, razão pela qual foi atribuída reduzida relevância a estes depoimentos.
Acrescente-se, quanto ao arguido, o facto de alguém ser afável e simpático, não significa que, em determinado momento da sua vida, não possa praticar factos contrários à sua personalidade habitual.
Diga-se que algumas das testemunhas acima mencionadas, referiram que viram algumas vezes o carro do arguido à porta da casa de DD, dando a entender que os mesmos teriam, a certa altura, reatado a relação.
Porém, veja-se que a própria DD confirmou, conforme se referiu supra, que apesar de não mais terem vivido juntos após o processo que correu termos anteriormente, voltaram a reatar a relação amorosa, estando juntos em algumas ocasiões, pelo que também nesta parte o depoimento destas testemunhas não relevou.
Refira-se, contudo, que a testemunha LL confirmou a celebração do acordo referido no facto n.º 56, bem como o teor do documento junto a fls. 615 a 617 e a sua assinatura, pelo que esta parte do seu depoimento relevou também para a prova do facto referido.

*
Quanto aos factos não provados, veja-se o seguinte.
Os factos a) a j), deram-se os mesmos como não provados, atendendo à total ausência de prova sobre os mesmos, porquanto nem DD, nem as restantes testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento depuseram sobre os mesmos.
Refira-se, no que concerne ao facto f), que nenhuma das testemunhas relatou a exacta frase que ali vem descrita, sendo que também não foram coincidentes no teor da mesma, nem a quem foi dirigida.

2.3. Das questões a decidir

Em primeiro momento, e na linha do já afirmado no aresto datado de 28 de fevereiro de 2023, exubera alguma mescla argumentativa no requerimento do arguido recorrente, evidenciando por vezes pouca clareza e contradição no fito de questionamento.
Por seu turno, o arguido recorrente socorre-se de linha invocativa apresentando razões que, salvo melhor e mais avisada opinião, atendendo à lógica e tempo das mesmas, emergem em ordem e sequência diversa da que se explana no instrumento recursivo, pelo que a apreciação a levar a cabo seguirá modo de enfrentamento diferente da enunciação apresentada por aquele.
Como nota, ainda, introdutória, saliente-se que, mais uma vez, desponta que o arguido recorrente foca todo a sua insatisfação relativamente ao decidido na parte relativa ao crime de violência doméstica pelo qual foi condenado, omitindo por completo qualquer referência quanto aos restantes ilícitos apontados e que também determinaram a sua punição - crimes de violação de imposições, proibições ou interdições, p.e p. pelo artigo 353º do CPenal, e de violação de domicílio, p. e p. pelo artigo 190º, n.º 1 do mesmo diploma legal.
Na realidade, considerando este aparente detalhe, pode exuberar, ao que se pensa, alguma dificuldade relativamente a vários matizes do intento recursório, mormente os que se prendem com as aduzidas máculas - vício da alínea a) do nº 2 do artigo 410º do CPPenal, violação do plasmado nos artigos 340º, 369º, nº 2 e 371º, nºs 1 e 2, todos do CPPenal, operando a nulidade inserta no artigo 120º, n.º 2, alínea d), do mesmo complexo legal, inconstitucionalidade da interpretação e aplicação normativa efetuada pelo tribunal recorrido respeitante à conjugação do estipulado nos artigos 340º, nº 1, 369º, nº 2 e 371º, nºs 1 e 2, todos do CPPenal.
De facto, como se pode ler do Acórdão proferido por este tribunal e supra notado, foi decidido Anular a sentença proferida, na parte supra notada, respeitante à escolha e determinação da medida da pena, sendo que no texto se faz expressa referência ao momento escolha e determinação da medida pena, traçado então pelo tribunal recorrido.
Ante tal, ao que se pensa, pode surgir certa fragilidade e de alguma inconsistência todo o trajeto tomado pelo arguido recorrente. Existindo os assacados vícios e projetando-os o arguido recorrente, apenas e só para parte do decidido, fica por saber qual o raciocínio e as razões em que elaborou para os não estender / alargar / lançar sobre todos os crimes pelos quais foi condenado.
Faça-se também notar que o arguido recorrente a 10 de maio de 2023, em sede de audiência, e a respeito das deficiências que agora anota como ilustrativas de uma nulidade, invocou, em ata e no momento, a existência de mera irregularidade a coberto do disposto no artigo 123º do CPPenal, apresentando-se como algo dúbia a posição agora vertida em recurso.
Todavia, ainda que assim se não entenda, o que claramente se não concede, observem-se então os variados aspetos suscitados, seguindo-se a ponderação de acordo com o que se revela sequencialmente natural.

*
Opina o arguido recorrente que o tribunal ad quo, por força do que decidiu relativamente a peticionadas (…) diligências enquanto meios de prova suplementar necessários e adequados à correcta escolha e determinação da medida da sanção, segundo as disposições conjuntas dos artigos 340.º, n.º 1, 369.º, n.º 2 e 371.º, n.ºs 1 e 2, todos do C.P.P (…) nos despachos proferidos nos dias 09/05/2023 e 11/05/2023, o Tribunal recorrido não se pronunciou se as diligências probatórias requeridas se tornavam ou não necessárias à descoberta da verdade e à boa decisão da causa ou, se pelo contrário, se se tratavam de prova irrelevante ou supérflua, de obtenção impossível ou duvidosa (…) operando assim a nulidade prevenida no artigo 120º, nº 2, alínea d) do CPPenal[3].
A nulidade invocada, ao que se pensa, assume-se como o segundo patamar de modo de destruição de um ato processual, entendido como vício / mácula de gravidade intermédia, eventualmente com potencialidade para justificar / desencadear a anulação do processado na estrita dependência desse contaminado proceder[4].
Um debruce sobre este último preceito notado, parece indicar que abrange todas aquelas situações de não realização / efetivação de atos processuais na fase de julgamento e de recurso, sendo que por força da Lei nº 48/2007, de 29 de março, assumem tal coloração todas aquelas marcas probatórias de cariz essencial / indispensável / absolutamente indispensável / estritamente indispensável e, nessa medida, de maior intensidade e premência que a ideia de prova necessária / conveniente[5].
Exare-se, igualmente, que prescreve o dito inciso legal, no seu nº 3, alínea a) que operando alguma das deformidades ali tratadas, em momento / ato que o interessado assista ela deve ser apontada antes que este esteja terminado.
De outra banda, e agora discorrendo a propósito do que ensaia o citado artigo 340º, nº 1 do compêndio que se vem referindo, surge transparente, pensa-se, que recai sobre o juiz o dever de oficiosamente mandar / determinar / ordenar todas as provas que se lhe afigurem necessárias para esclarecer os factos em discussão e fixar a verdade judicial prática, sendo que a necessidade / pertinência / exigência da descoberta da verdade é o mote justificativo e delimitador deste ónus / encargo que impende sobre o juiz[6].
Aqui, o legislador apela à ideia de meio ou diligência de prova necessário, isto é, o juiz é chamado a formular / executar um juízo de necessidade com vista à boa decisão da causa, há um sentido apelo ao valor da verdade material, na linha do impresso na sistemática do progetto preliminare italiano de 1978.
Nesta senda, os sujeitos da dialética processual devem poder apresentar todo o manancial probatório que alicerçam os factos que se assumam como relevantes para o que se discute e, neste ensejo, se não houver um motivo fundado para recusar um meio de prova o mesmo deve ser aceite; por outro lado, se o dado probatório pretendido carece de valor ante o objeto do processo, se esse mecanismo de prova promove / executa ações sem valia para o objeto da prova, a iniciativa deve ser liminarmente recusada[7].
Sopesando todo supra entoado, elucubre-se sobre o caso em apreço.
Manuseando o processado, extrai-se que as diligências que o arguido recorrente reputa de essenciais / pertinentes / para o fim almejado, socorrendo-se em argumentação do decidido por este Tribunal ad quem, seriam a elaboração de novo relatório social, bem como a audição do respectivo técnico da D.G.R.S.P., e isto porque no Acórdão propalado em 28 de fevereiro de 2023 por este Tribunal da Relação, no seu entender, afirma que o que resulta do relatório social junto aos autos são uma série de considerações, juízos de valor e opiniões do técnico de reinserção social que o elaborou e referências aos antecedentes criminais do Arguido, nada resultando de tal relatório que seja relativo à situação económica e social deste.
Considerando este aspeto da junção de novo relatório social, primeiramente, salvo o devido respeito por entendimento diverso, o que se escreveu na dita decisão foi tão somente que, atentando às partes do relatório social que se transcreveram na sentença então em sindicância, o que emerge são uma série de considerações, juízos de valor, opiniões do técnico de reinserção social a respeito de medidas eventualmente a aplicar, referências aos antecedentes criminais e, absolutamente nada que ilustre sobre a situação económica e social do arguido recorrente.
Ou seja, em nenhum passo daquele se afirma que o relatório social apenas encerra o dito conteúdo. O que se diz é que se transcreveu na sentença determinado texto com certo teor, constante do relatório social, reproduzindo-o singelamente, o qual transmitia determinadas vicissitudes[8].
Diga-se, também, que em qualquer momento se determinou, no anteriormente decidido, que se solicitasse novo relatório social, que se realizasse esta ou aquela diligência de prova, mas unicamente que o tribunal recorrido procedesse às diligências que se reputem necessárias e essenciais. E esta ponderação a fazer, cabia ao tribunal de 1ª instância.
Acresce que tal como transparece do estatuído no artigo 370º, nº 1 do CPPenal, o relatório social, in casu, não é elemento obrigatório a observar, sendo que o tribunal pode ao mesmo recorrer se o considerar necessário à correcta determinação da sanção que eventualmente possa vir a ser aplicada, ou solicitar a respectiva actualização quando aqueles já constarem do processo, ou seja, a sua existência como meio de prova não é condição imprescindível, razão esta que nunca poderia necessariamente conduzir a que o tribunal de recurso ordenasse a junção de novo relatório social[9].
Consigne-se, também, que neste particular conspecto, parece soçobrar alguma inconsistência na tese do arguido pois, podendo intuir-se que no seu entendimento o relatório social existente não permitiria ao tribunal recorrido apetrechar-se de dados probatórios bastantes que o auxiliassem no vetor em causa – escolha e determinação da medida da pena -, a dado passo do seu articulado de recurso, visando sustentar que a pena efetiva de prisão imposta, no caso do crime de violência doméstica, se mostra inadequada, escreve de forma cristalina, que consta daquele “(…) o arguido dispõe de apoio da família de origem que se constitui como suporte emocional e material do mesmo. Identifica-se ainda como fator de proteção a intimidação que o arguido apresenta, face à intervenção judicial, que se traduz na adoção de um comportamento adequado às regras e obrigações inerentes à medida de coação em curso” (…) do teor do relatório social elaborado pelos serviços da D.G.R.S.P. o seguinte: “(…) A intimidação que o arguido evidenciou perante a ação do sistema de justiça, resultou na desvinculação deste face à ofendida, cessando qualquer contacto e/ou aproximação da mesma desde que iniciou a medida de OPHVE, realidade que foi confirmada pela ofendida.
Ora, não pode num momento defender-se que um dado elemento probatório não encerra qualidade bastante, para em passo imediato, se lhe atribuir valor na dimensão que pode revelar interesse para o mesmo fim.
Por último diga-se que o arguido recorrente não logra, em momento algum do recurso apontar razões / fundamentos que possam ilustrar, ainda que minimamente, a necessidade de elaboração de um novo relatório social e, bem assim, que só por esta via seria possível apurar materialidade suficiente e bastante a dimensionar sobre a sua personalidade e situação económica e social.
Assim, e neste particular, não se vislumbra desenhar-se quadro integrador da ideia de meio de prova necessário à descoberta da verdade material e, bem assim, a integração da figura da nulidade aventada, pelo que falece o propugnado pelo arguido recorrente.
No que concerne à pretendida audição do técnico de reinserção social, colhe chamar à colação o artigo 371º, nºs 1 e 2 do CPPenal, tal como o ensaia o arguido recorrente.
Este inciso legal, ao que se cogita, não aponta, igualmente, qualquer obrigatoriedade de audição do técnico de reinserção social, em termos de produção de prova suplementar, sendo que neste passo – reabertura da audiência para determinação da sanção – só há produção de prova suplementar se o tribunal o entender necessário, podendo haver a produção de novas provas ou repetição de provas anteriormente prestadas[10].
Ao que transparece deste dispositivo legal, conjugando-o com o que anuncia o artigo 369º, nº 2, cabe ao tribunal decidir se é ou não necessária a produção de prova suplementar para determinação da espécie e medida da pena, e na afirmativa qual, ou seja, ao tribunal incumbe avaliar / ponderar / pesar se está munido de apetrecho probatório bastante para tomar decisão neste segmento da pena.
Diga-se que, também aqui, não invoca o arguido recorrente argumentação sólida / consistente que demonstre a necessidade de audição do técnico de reinserção social para a aquisição de elementos, para além dos vertidos no relatório social, que pudessem contribuir para uma ponderação diferente relativa à factualidade em causa.
Com efeito, tal como o adiantado pelo Digno Mº Pº, sempre se poderia dizer que o técnico relator manifestaria um posicionamento condizente com o exposto no relatório[11].
Não se desconhece que o tribunal ad quo em modo revelador de alguma indecisão, imprecisão e de falta de rigor, ora foi assumindo uma determinada posição, ora outra, quanto à finalidade / objetivo da audiência - no despacho de 19/04/2023, apelidou /denominou a diligência (…) de prova suplementar, nos termos do artº 369 n. 2 e artº 371º , nº 1 ambos do CPP (…) no despacho de 03/05/2025, referiu-se a reabertura da audiência, não se fazendo nenhuma alusão à prova suplementar (…) no despacho de 09/05/2023, volta-se a denominar a diligência do dia de ontem de prova suplementar, justificando todo este suceder com lapsos tidos.
Todavia, isso por si só, ao que se entende, não acarreta a ideia de que o pretendido pelo arguido recorrente – elaboração de novo relatório social, audição do técnico de reinserção social -, ostenta a qualificativa de meios necessários à boa decisão da causa e que, inexistindo, configura a nulidade propalada.
E tanto assim é o tribunal recorrido, não teve qualquer óbice em assentar diversa factualidade neste enfoque, de modo que se entende até detalhado, recorrendo ao teor das declarações do arguido, prestadas em audiência de julgamento, sendo que não existem, nesta parte, razões para crer que as mesmas não sejam verdadeiras, uma vez que foram claras e espontâneas, considerando igualmente (…) que os factos n.ºs 54 a 63 também se encontram corroborados através do teor do relatório social junto aos autos no dia 13-10-2022 (cfr. ref.ª n.º ...66).
Mostra-se inquestionável, crê-se, que na indicação das finalidades visadas com a abertura da audiência, o tribunal recorrido não foi o mais assertivo / cuidadoso / preciso / específico que devia e poderia.
Conquanto tal não inculca a ideia de ausência de elementos de prova para tomada de decisão, tal como vem sugerir o arguido recorrente.
Face a tal, entende-se não assistir razão ao defendido, neste patamar recursivo.
No entanto, ainda que se discorde deste ponderado, o que se não concede, desponta um claro obstáculo à procedência desta invocação.
O arguido recorrente de modo que se apresenta claro / inequívoco / irrefutável defende em recurso a existência da nulidade precatada no artigo 120º, nº 1, alínea d) – parte final - do CPPenal, cujo regime de arguição se encontra regulado nas diversas alíneas do seu nº 3.
Exubera também cristalino que a tomada definitiva de decisão do tribunal recorrido neste vetor, como também o reconhece o arguido recorrente, operou em 11 de maio de 2023, em audiência onde aquele e o seu Ilustre mandatário estavam presentes, sendo que perante o decidido nada disseram.
Ante tal, e considerando o plasmado na alínea a) do aludido nº 3, não tendo sido tomada qualquer posição naquele momento e antes que a respetiva audiência tivesse terminado, eventual vício existente mostra-se sanado, sendo extemporânea a presente invocação.
Com efeito, nos casos em que o interessado esteja presente, os deveres de diligência, boa-fé e lealdade processual reclamam a arguição imediata do vício pois, quem não reage desde logo, não pode depois vir aduzir a existência de um vício qui tacet consentire videtur, esperando / aguardando para momento mais oportuno que, por algum modo, lhe possa vir a ser mais favorável.
E não se diga, a este propósito, que o arguido recorrente, como acima se deixou sublinhado, em 10 de maio de 2023, também em sede de audiência, suscitou a verificação de irregularidade o que, nesse momento o fez em tempo.
Realmente, em consequência dessa alegação, tendo havido o despacho de 11 de maio de 2023, proferido em audiência e na presença do arguido recorrente e seu Ilustre Mandatário, não houve qualquer reação ao caminho tomado pelo tribunal recorrido, aceitando-se o decidido, vindo a optar-se por arguir uma nulidade que, como se viu e pelas razões expostas, a existir, o que se não aceita, se mostra sanada.
Deste modo se conclui pela improcedência deste segmento do recurso interposto pelo arguido recorrente.
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Outra linha argumentativa do arguido recorrente estriba-se na verificação do vício da alínea a) do nº 2 do artigo 410º do CPPenal, ou seja, opera a insuficiência para a decisão da matéria de facto.
Calcorreando toda a peça recursiva, ao que transborda, o arrimo desta alegação é praticamente o mesmo acima tratado – (…) o Tribunal de 1.ª Instância não curou de averiguar, com precisão e rigor, as condições pessoais, sociais e económicas do Arguido, sendo a ausência de investigação nessa matéria essencial para a decisão final no que toca à escolha e determinação da pena, revestindo-se assim a factualidade apurada como insuficiente para fundamentar a efectividade da pena de prisão (…) Nem valorou em qualquer medida o arrependimento sincero e a confissão parcial dos factos manifestados pelo mesmo em audiência de julgamento, acabando apenas por valorar em demasia os antecedentes criminais do Recorrente.
Mais uma vez parece não colher a linha seguida pelo arguido recorrente.
Desta feita, vem insurgir-se o arguido recorrente, recorrendo da matéria de facto pela via mais restrita, ou seja, pelo modo que se convencionou chamar de “revista alargada” que, conforme resulta expressamente da normação constante do artigo 410º, nº 2, qualquer dos vícios aí mencionados, é de conhecimento oficioso.
Por seu turno estas vicissitudes têm que emergir da própria decisão recorrida, na sua globalidade, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum, estando, por conseguinte, vedado o recurso a elementos a ela estranhos para o fundamentar, como, por exemplo, quaisquer dados existentes nos autos, mesmo que provenientes do próprio julgamento[12].
Trata-se de vícios intrínsecos da sentença e, nessa medida, quanto a eles, esta terá que ser autossuficiente, não se podendo recorrer à prova documentada.
Acresce que no âmbito desta revista alargada, contrariamente ao que sucede com a impugnação ampla, o tribunal de recurso não conhece da matéria de facto no sentido da reapreciação da prova, bastando-se com o mero detetar de eventuais vícios que a sentença evidencia e, não podendo saná-los, a determinar o reenvio do processo para novo julgamento, tendo em vista a sua sanação – artigo 426º, nº 1 do CPPenal.
Como uniformemente vem sendo entendido pelo Supremo Tribunal de Justiça, o conceito de insuficiência da matéria de facto provada significa que os factos apurados e constantes da decisão recorrida são insuficientes para a decisão de direito, do ponto de vista das várias soluções que se perfilem - absolvição, condenação, existência de causa de exclusão da ilicitude, da culpa ou da pena, circunstâncias relevantes para a determinação desta última, etc. - e isto porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre factos relevantes alegados pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou ainda porque não investigou factos que deviam ter sido apurados na audiência, vista a sua importância para a decisão[13].
Aqui, o que está em causa é saber se a matéria de facto apurada, na sua globalidade (provada e não provada) é ou não capaz e bastante para sustentar a decisão tomada. De outro modo, o que se pretende saber através da verificação deste vício é se o tribunal, tendo em atenção o objeto processual em presença em cada caso, indagou ou não, os factos necessários ao esclarecimento daquele, independentemente do resultado dessa averiguação – confirmativo do objeto processual ou não[14].
Em suma, a insuficiência da matéria de facto para a decisão verifica-se quando há lacuna, deficiência ou omissão no seu apuramento e investigação, o que desencadeia efeitos na qualificação jurídica dos factos e / ou na medida da pena aplicada e / ou em qualquer outra consequência que, em sede de decisão, se tomou sobre o caso.
Conforme se adiantou, na invocação desse vício insurge-se o arguido recorrente contra o tribunal por este não ter acedido a solicitar novo relatório social, a ouvir o técnico de reinserção social e, ainda, face à circunstância de não ter considerado o arrependimento do arguido recorrente a sua confissão parcial.
Quanto a estas duas últimas notas, parece o arguido recorrente não só querer extravasar o móbil / fim que o anterior Acórdão desta Relação fixou, como esquecer totalmente o que, a este propósito ali se decidiu - Sopesando o processo decisório, mais uma vez aqui parece que não será de alinhar no entendimento do arguido recorrente (…) Quanto ao arrependimento e suposta confissão do arguido recorrente, remete-se para todo o supra analisado e já referido, sem necessidade de mais considerandos – cfr. fls. 791 a 794 -, mostrando-.se completamente ultrapassada esta vertente.
Além disso, como assola da decisão ora em presença, o tribunal recorrido a dado passo, faz alusão a estas notas, e com bastante detalhe e acuidade - Refira-se também que o arguido verbalizou, em sede de audiência de julgamento, o seu arrependimento pelas condutas que adoptou para com a ofendida (…) diga-se que a manifestação deste arrependimento é inócua vindo de alguém que cometeu, há pouquíssimo tempo, exactamente o mesmo crime, contra a mesma pessoa, crime pelo qual foi, aliás, condenado com sentença transitada em julgado antes da prática destes novos crimes (…) este crime foi cometido pelo arguido no decurso da suspensão da execução da pena de prisão aplicada no outro processo (…) o discurso do arguido foi sempre voltado para a atribuição de culpas à ofendida, desresponsabilizando-se das suas atitudes, pelo que o facto de ter admitido a prática de alguns factos acima mencionados, não revela que o mesmo esteja arrependido da conduta que assumiu (…) a admissão dos factos atribuindo responsabilidade dos mesmos às atitudes de outrem não é, verdadeiramente, uma confissão, muito menos o arrependimento da prática daqueles factos.
De outra banda, no que tange à questão do novo relatório social e audição do técnico de reinserção social, não desponta qualquer vício, mormente o denunciado.
Tal como já se deixou largamente expresso, o tribunal ad quo, elenca factualidade suficiente e detalhada sobre a matéria necessária para a escolha e determinação da medida da pena, sendo que atendeu ao relatório social existente e às declarações do arguido recorrente.
Com base na matéria considerada provada, é inteiramente verdade que o tribunal recorrido não retirou a conclusão que o arguido recorrente pretendia – a suspensão da execução da pena. Todavia isso não revela / desenha / ilustra a assacada mácula. Apenas e só que a leitura dos factos foi diversa da querida pelo arguido recorrente.
Ora, insuficiência para a decisão da matéria de facto provada é algo, como se viu, muito distinto da discordância relativa à ponderação dos factos e sua integração no direito, que o tribunal faz.
Em presença deste todo expendido, sucumbe igualmente esta variante recursória.
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Ainda em ligação a toda esta linha de argumentação, vem o arguido recorrente suscitar a inconstitucionalidade da interpretação e aplicação normativa efetuada pelo tribunal recorrido respeitante à conjugação do estipulado nos artigos 340º, nº 1, 369º, nº 2 e 371º, nºs 1 e 2, todos do CPPenal.
Percorrendo todo o articulado em exame, salvo mais avisada e atenta opinião, soçobram dúvidas quanto a esta variante, não se alcançando, efetivamente, quais os verdadeiros fundamentos em que se assenta este traço.
Brota de todo o descrito que aqui o arguido recorrente não segue uma precisa delimitação e enunciação da questão e uma fundamentação, minimamente concludente, com um suporte suficientemente argumentativo que inclua a indicação das razões justificativas do juízo de inconstitucionalidade que vem defender[15].
Na verdade, limita-se o arguido recorrente a majestáticas alocuções - a realização das diligências de prova suplementar requeridas pelo Recorrente são imprescindíveis à salvaguarda dos seus direitos fundamentais, consagrados constitucionalmente nos artigos 20.º, n.º 1 e 32.º, n.ºs 1, 2 e 5, da Lei Fundamental, entre os quais se encontra o direito constitucional de defesa (…) não realizar a produção destas diligências probatórias e a realização da reabertura da audiência sem a produção de qualquer prova suplementar, atingem e violam, em concreto, o conteúdo essencial das garantias de defesa da Arguida, consagrados no artigo 32.º, n.º 1, da C.R.P.(…) o n.º 1, do artigo 32.º, da Lei Fundamental, as quais englobam todos os direitos e instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e contrariar a acusação (…) a preterição da produção das diligências probatórias requeridas redunda num grave atentado aos direitos, liberdades e garantias constitucionalmente consagradas ao Arguido, mormente numa denegação da garantia da via judiciária, assegurada no n.º 2, do artigo 20.º e no n.º 1, do artigo 32.º, ambos da Lei Fundamental.
Em imediato passo, como já se deixou antever, as diligências que o arguido recorrente entende recursivamente como essenciais, determinantes do exercício do seu direito de defesa, imprescindíveis, não assumem essa coloração.
Aliás, o arguido recorrente não reagiu quando em audiência se decidiu como se decidiu, e como já se fez menção, não questiona nunca todo o decidido quanto aos outros crimes pelos quais também foi condenado, considerando por isso que afinal todo o probatório existente e produzido era suficiente e bastante.
Resulta pouco percetível / credível que numa parte decisória tenham sido observados todos os comandos constitucionais e noutra já não.
Soma que o arguido recorrente teve oportunidade de se pronunciar, de se defender, e tanto assim é que a factualidade relativa à sua personalidade e situação económica e social, desta feita, está clara e objetivamente descrita e foi considerada provada por força de relatório social já existente e, também como cristalinamente exubera da decisão em litígio, por força do por si declarado, momento em que teve toda a possibilidade de explicar / descrever / esclarecer este traço de materialidade.
Nesta esteira, não se descortina como foram cerceados os seus direitos de defesa e, nessa medida, como se violaram comandos constitucionais, mormente os declarados.
Assim, igualmente, sucumbe este momento recursivo.
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Por fim vem o arguido recorrente insurgir-se relativamente à pena imposta – modalidade da mesma -, considerando que deveria ter sido aquela suspensa na sua execução.
Como sustentáculo do seu excurso vem opinar que o Tribunal a quo, a este propósito, limitou-se a concluir de forma automática que o único modo de se realizarem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição é o cumprimento pelo Arguido de pena de prisão efectiva, por o mesmo ter cometido o mesmo tipo de crime durante o período de suspensão de execução de outra pena e contra a mesma vítima (…) parece olvidar o Tribunal recorrido que nessa prognose deve atender-se à personalidade do arguido, às suas condições de vida, à conduta anterior e posterior ao facto punível e às circunstâncias deste, ou seja, devem ser valoradas todas as circunstâncias que tornem possível uma conclusão sobre a conduta futura do arguido, atendendo somente às razões da prevenção especial, não sendo de excluir liminarmente do benefício da suspensão da execução da pena determinados grupos de crime (…) ainda que o Tribunal recorrido se tenha pronunciado sobre a possibilidade de suspensão da execução da pena, fê-lo de forma ligeira e vaga (…) conforme se verifica do texto da sentença recorrida, o Tribunal a quo não fundamentou devidamente a razão da denegação da suspensão da execução da pena (…) reportando-se única e exclusivamente ao passado e não ao presente, nem ao passado (…)limitando-se apenas a assinalar o facto de o Recorrente ter sido condenado pela prática do mesmo crime e contra a mesma vítima, alheando-se completamente das circunstâncias actuais do caso concreto e das actuais condições de vida do Recorrente e da Ofendida (…) todos os crimes pelos quais o Arguido foi anteriormente condenado em comum o facto de terem ocorrido durante o matrimónio que o mesmo manteve anteriormente com a Ofendida e que já se mostra dissolvido, bem como se encontram reguladas as responsabilidades parentais do filho menor de ambos, encontrando-se actualmente salvaguardado qualquer perigo de aproximação ou de contacto relativamente à Ofendida.
O artigo 50º do CPenal, mormente o seu nº 1, aponta para quais os critérios a seguir / observar para se poder recorrer ao instituto / mecanismo aí tratado.
E, nessa senda, parece pacífico que o primeiro se prende com a pena imposta – prisão aplicada em medida não superior a 5 anos, sendo que o segundo reclama que, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, o tribunal conclua pela formulação de um juízo de prognose favorável ao agente que se traduza no seguinte axioma: a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Por seu turno, assoma que a decisão de aplicação de tal pena de substituição reclama que a mesma não coloque irremediavelmente em causa a tutela da confiança e das expetativas da comunidade na validade da norma jurídica violada.
Haverá, pois, que ter sempre presente e premente as necessidades de prevenção manifestadas no sentimento jurídico da comunidade, pelo que uma pena de substituição da prisão, como o é a suspensão da execução da pena, (…) não poderá ser aplicada, se com ela sofrer inapelavelmente (…) o sentimento de reprovação social do crime (…) o sentimento jurídico da comunidade[16].
Importa igualmente referir que indica o artigo 40º, nº1 do CPenal que as finalidades da punição são a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, sendo que por força da revisão do Código Penal, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março e, bem assim, a resultante da Lei nº 59/2007, de 4 de setembro, houve um claro intento por parte do legislador em reforçar o princípio da ultima ratio da pena de prisão, valorizando-se o papel da multa como pena principal e alargando-se o tipo e o âmbito de aplicação das penas de substituição.
Por outra banda, certo é que dentre as penas de substituição exorbitam ainda as qualificativas de penas de substituição em sentido próprio – todas aquelas não privativas da liberdade, onde se insere a que ora se examina – e as penas de substituição em sentido impróprio – todas as que assumem caráter detentivo / cerceamento da liberdade.
Sopesando tais premissas, olhe-se ao quadro em presença, sendo por isso necessário revisitar a decisão recorrida neste segmento.
O tribunal recorrido, justificando a inadequação da aplicação do mecanismo em ponderação, aduz essencialmente, e olhando à temática da violência doméstica - relembre-se que o arguido já tem condenações transitadas em julgado pela prática de um crime de violência doméstica, um crime de ofensa à integridade física e um crime de condução de veículo em estado de embriaguez (…) foi condenado por sentença transitada em julgado no dia 15 de Março de 2021, no processo n.º 1/20...., pela prática, em autoria material, na forma consumada e concurso efectivo, de um crime de ofensa à integridade física e de um crime de violência doméstica cometido contra DD (…) no âmbito da aludida decisão, na pena acessória de proibição de contactos com DD, por qualquer meio, pelo período de 2 anos e 8 meses, com a obrigação de o arguido não se aproximar da residência, nem do local de trabalho da mesma, nos termos do disposto nos artigos 152.º, n.ºs 4 e 5 do Código Penal, sendo que o período da pena acessória se iniciou no dia 15 de Março de 2021, tendo termo previsto para o dia 15 de Novembro de 2023 (…) nesse processo, foi o arguido condenado numa pena de prisão suspensa na sua execução, quanto à prática do crime de violência doméstica, pelo que foi, naturalmente, feito um juízo de prognose favorável quanto ao mesmo (…)tendo em consideração que a sentença acima referida transitou em julgado no dia 15 de Março de 2021, e que o arguido praticou os factos, neste processo, no período situado entre Março de 2021 e Maio de 2022 (…) retira-se que este adoptou aquelas condutas, que consubstanciam a prática (novamente) do crime de violência doméstica, logo após ser condenado no processo n.º 1/20.... (…) entende-se que o facto de ficar provado que o arguido está inserido socialmente (…) não estando inserido profissionalmente em virtude estar a cumprir medida de coacção de obrigação de permanência na habitação, não assume relevo suficiente para evitar que ao mesmo não seja aplicada uma pena de prisão efectiva (…) considera-se que no caso em apreço, as condutas praticadas nestes autos conjugadas com o facto de, imediatamente antes da prática destes factos, o arguido ter sido condenado pela prática do mesmo crime (violência doméstica), contra a mesma vítima (sua ex-mulher), não é possível fazer um juízo de prognose favorável e afirmar que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (…) é certo que não existe notícia nos autos de que o arguido tenha contactado novamente a ofendida, ou praticado qualquer novo acto contra a mesma, também é certo que o mesmo se encontra privado da liberdade há quase um ano (primeiro em prisão preventiva e depois em obrigação de permanência na habitação), pelo que as hipóteses de cometer novos factos contra aquela estão, naturalmente, por si só, muito reduzidas (…) apenas quando foi privado da liberdade é que o arguido se absteve de praticar factos contra a ofendida, o que também revela que não é suficiente e adequada outra pena que não a prisão efectiva.
Este, o elenco argumentativo em que se ancora o tribunal recorrido para afastar a aplicação, in casu, da suspensão da execução da pena de prisão.
Importa, em pronto momento, não escamotear / branquear, como parece pretender o arguido recorrente, a gravidade do ilícito em presença, as fortes e prementes exigências em termos de prevenção geral e, bem assim, todo seu o estar / atuar, cometendo novos ilícitos da mesma natureza, sobre a mesma vítima, em plena vigência de oportunidade que lhe havia sido concedida. Tal seguramente demanda rigor e acerto na ponderação a fazer.
Nesse conspecto, o propugnado pelo arguido recorrente, alinhando em que o juízo de prognose deve ser feito ao momento da decisão, o que não se pretende questionar nem se questiona, a verdade é que o que assoma de favorável, é apenas e tão-só que terá uma possibilidade de trabalho – há apenas uma promessa – e que vive em casa própria tendo ligações familiares aos filhos, podendo isto conferir coloração de inserção social e familiar.
Conquanto, e ainda que se valore positivamente tal enquadramento, considerando todo o seu passado criminal onde se desenha o cometimento, sobre a mesma vítima aqui em causa, do crime de violência doméstica, a circunstância dos factos em presença nestes autos terem sido praticados em momento quase imediato ao início de período de suspensão da execução da pena daquele outro processo, configuram-se sérias reservas na possibilidade de agora se voltar a elaborar em prognose favorável.
Atente-se que a factualidade presente nestes autos, além de cometida em tempo de reflexão e observação de regras decorrente de medida suspensiva arbitrada, envolve, alguma dela, um registo de agressividade e de ausência de qualquer senso crítico no saber estar, saber controlar e saber redimensionar sentimentos e impulsos.
Opina-se recursivamente, em termos gerais, que não há notícia, nos últimos tempos, de qualquer comportamento tido pelo arguido recorrente em relação à aqui visada vítima - decurso da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação que lhe foi aplicada, o Arguido tem desde então mantido um comportamento adequado e totalmente cumpridor das obrigações a que está vinculado -, não tendo sido registada até ao presente qualquer situação anómala, passível de crítica e / ou censura, que tudo ocorreu em registo de relação atribulada entre os envolvidos, deixando antever que, em certa medida tudo aconteceu com algum contributo / participação de DD e que, um e outro, já estão em registos de vida diferente e até longe (19 km de distância).
Este tipo de posicionamento não só elucida uma notória incapacidade de compreender / assumir / enfrentar a dimensão / significado dos seus atos, como resvala para traço revelador de alheamento em termos de autocrítica e de capacidade de empatia pelo outro, retrato este que enforma uma real dificuldade em se concluir que ainda há uma réstia de esperança na possibilidade de a mera ameaça de pena de prisão alcançar os fins visados com uma pena.
Na realidade, estando sujeito a obrigação de permanência na habitação, cogitar a hipótese de uma eventual nova violação de deveres, e só por aí se poder afastar a possibilidade de aplicar a medida pretendida, seria subverter completamente toda a filosofia inerente ao uso de determinados caminhos preventivos.
O que se espera, como é natural, é que o visado por uma medida de coação a cumpra, sendo que o seu cumprimento não é mais do que um normal e expectável dever, e nada mais sendo que isso. Respeitar um dever.
Acresce que ante tal imposição, porque havendo maior, mais efetivo e presente controlo, o facto de o arguido recorrente nada mais ter feito, desde então, não é por si demonstrativo de que perante uma porta de possibilidade, conseguisse frear os seus ímpetos.
Reporte-se, também, que a mera ideia / pensamento de que constitui alguma justificação para os comportamentos tidos – vários e verificados no tempo – a postura da vítima no relacionamento havido entre ambos, é outro mote esclarecedor do modo ligeiro / frouxo / desprendido como encara o arguido recorrente todo o sucedido.
Importa também sublinhar que a tentativa de apagar / aliviar determinados comportamentos porque entretanto a vida supostamente mudou, porque os envolvidos estão algo distantes fisicamente, é mais uma nota desvaliosa, pensa-se, sobre a assunção dos atos cometidos, demonstrando falhas na capacidade de entender / compreender que há marcas que não se esfumam por força do tempo, da longura e da mudança de vida.
Seguir neste rumo, levaria a que tudo se considerasse leve / ligeiro / insignificante por força da distância, da mudança, e do tempo. E, nessa medida e por isso, fosse de afastar qualquer consequência mais efetiva.
Não parece ser esse o caminho a traçar nem o intento do ordenamento penal vigente, mormente no que concerne a determinada criminalidade.
Perante todo o espetro factual narrado, sendo sobejamente de monta as exigências de prevenção geral que se fazem sentir relativamente aos crimes por cuja prática o arguido foi condenado, e considerando o seu estar, evidenciando personalidade algo impulsiva / reativa, integrando tonalidades de agressividade e de incapacidade de se posicionar criticamente / sensatamente, afigura-se que para que não fiquem defraudadas as expectativas comunitárias relativamente à tutela dos bens jurídicos e a confiança comunitária na validade das normas jurídicas violadas, só a efetiva execução da pena de prisão aplicada pode responder cabalmente.
Face ao quadro em desenho, pese embora as supra ditas notas de algum alento, é claramente impossível afirmar que, no caso em apreço, a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
E, nessa senda, também neste matiz, é de rejeitar o pretendido.

III – Dispositivo

Nestes termos, acordam os Juízes Secção Criminal – 2ª Subsecção - desta Relação de Évora em negar provimento ao recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência, decidem manter a decisão recorrida.

Comunique de imediato ao tribunal recorrido, independentemente do trânsito em julgado da decisão.

Custas pelo arguido recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) UCs.

Notifique.


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Évora, 12 de setembro de 2023


(o presente acórdão foi elaborado e integralmente revisto pelo relator, seu primeiro signatário – artigo 94.º, n.º2, do CPPenal)
(Carlos de Campos Lobo - Relator)
(Ana Bacelar - 1.ª Adjunta)
(Renato Barroso – 2.º Adjunto)


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[1] Procede-se à transcrição parcial, expurgando todas as reproduções de textos de Acórdãos e de doutrina, por manifestamente desnecessárias na parte respeitante às conclusões.
[2] Cfr. fls.832.
[3] Basta consultar o despacho com a referência Citius ...83 para verificar que de forma cristalina o mesmo se pronunciou sobre a desnecessidade do peticionado.
[4] Neste sentido, GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS, Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, Comentário Judiciário de Código de Processo Penal, Tomo I Artigos 1º a 123º, 2ª edição, 2022, Almedina, p. 1290.
[5] Neste sentido, ALBUQUERQUE, Paulo Pinto de, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, 2009, 3ª edição atualizada, Universidade Católica Editora, p. 306.
Na mesma linha, GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS, Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, ibidem, p. 1297, onde se pode ler (…) o tribunal tem o poder/dever, seja na fase de julgamento, seja na fase de recurso (…) de esclarecer e instruir autonomamente – i. é, independentemente das contribuições da acusação e da defesa – o “facto” sujeito a julgamento, criando, ele próprio as bases necessárias à sua decisão /(…) (s)e não o fizer, o ato será inválido, podendo ser anulado.
[6] Neste sentido, MAGISTRADOS Do Ministério Público Do Distrito Judicial Do Porto, Código de Processo Penal, Comentários e notas práticas, 2009, Coimbra Editora, p. 851.
[7] Neste sentido, GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS, Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, Comentário Judiciário de Código de Processo Penal, Tomo IV Artigos 311º a 398º, 2022, Almedina, p. 413.
[8] Destaque este que já havia sido sublinhado e manifestamente explicitado no despacho proferido nos autos com a referência Citius ...83, quando ali se afirma (…) aquilo que aponta o acórdão supra citado não é que o “relatório social junto aos autos são uma série de considerações, juízos de valor e opiniões do técnico de reinserção social que o elaborou e referências aos antecedentes criminais do Arguido, nada resultando de tal relatório que seja relativo à situação económica e social deste” (cfr. menciona o arguido no requerimento em epígrafe), mas sim que as partes que foram transcritas são partes que têm considerações, juízos de valor, opiniões do técnico de reinserção social a respeito de medidas eventualmente a aplicar, referências aos antecedentes criminais e, absolutamente nada que ilustre sobre a situação económica e social do arguido recorrente (cfr. acórdão proferido nos presentes autos), o que é substancialmente diferente.
[9] Neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 10/07/2018, proferido no Processo nº 108/18.6GAEPS.G1, onde se pode ler Pese embora não seja obrigatória a solicitação de relatório social, este elemento constitui, muitas vezes, um elemento relevante para a averiguação das condições pessoais do arguido, importando avaliar, caso a caso, da pertinência e necessidade de se proceder à sua elaboração.
[10] Neste sentido, Neste sentido, GAMA, António, LATAS, António, CORREIA, João Conde, LOPES, José Mouraz, TRIUNFANTE, Luís Lemos, SILVA DIAS, Maria do Carmo, MESQUITA, Paulo Dá, ALBERGARIA, Pedro Soares de e MILHEIRO, Tiago Caiado, ibidem, nota 6, p. 737.
[11] Atente-se, igualmente, ao salientado no despacho com a referência Citius ...83 (…) Destarte, o conhecimento do Técnico acerca dos factos está, naturalmente, reflectido no relatório que elaborou, pelo que não se vislumbra qualquer necessidade, nem utilidade em ouvi-lo.
[12] Neste sentido, MAIA GONÇALVES, Manuel Lopes, Código de Processo Penal Anotado e comentado, 11ª edição, 1999, Almedina. p. 741, ainda SILVA, Germano Marques da, Curso de Processo Penal, Vol. III, 3ª Edição Revista e actualizada, 2009, Editorial Verbo, p. 334.
[13] Neste sentido, Acórdão do STJ, de 03/07/2002, proferido no Processo nº 1748/02-5ª, referido in RIBEIRO, Vinício A.P., Código de Processo Penal, Notas e Comentários, 3ª edição, 2020, Quid Juris, p.979.
[14] Neste sentido GASPAR, António da Silva Henriques, CABRAL, José António Henriques dos Santos, COSTA, Eduardo Maia Costa, MENDES, António Jorge de Oliveira, MADEIRA, António Pereira e GRAÇA, António Pires Henriques da, ibidem p. 1274.
[15] Neste sentido o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 630/2008, de 18/12/2008, proferido no Processo nº 854/08, onde se pode ler (…) não basta a referência a que um preceito legal ou determinada interpretação dele viola a Constituição. É necessário um módico de argumentação dirigida a colocar o juiz perante a necessidade de apreciar tal questão sob pena de incorrer em omissão de pronúncia, porque não é exigível que os tribunais decidam questões (designadamente questões de constitucionalidade) sem que as partes lhes indiquem as razões porque entendem que elas devem ser decididas num sentido e não noutro
[16] DIAS, Jorge de Figueiredo, Direito Penal Português- As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, Aequitas, Editorial Notícias, p. 334.