Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
239/23.0T8PTG.E1
Relator: EMÍLIA RAMOS COSTA
Descritores: PENSÃO DE REFORMA
BANCÁRIO
CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURANÇA SOCIAL
Data do Acordão: 11/07/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I – A Cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário e posteriormente a Cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário não são omissas quanto ao cálculo a efetuar nas situações aí previstas, pelo que, inexistindo qualquer lacuna, não é de aplicar o disposto no art. 28.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10-05.
II – Interpretando a Cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário e a posterior Cláusula 94.º do atual ACT do Sector Bancário, é de concluir que no cálculo da pensão de reforma, nas situações aí previstas, apenas releva o fator relativo ao período de tempo contributivo (pro rata temporis), já não o valor das contribuições efetuadas em cada um dos momentos contributivos (pro rata contributum), uma vez que não consta dessas Cláusulas qualquer menção ao valor das contribuições efetuadas.
III – A não aplicação do fator valor das contribuições no cálculo previsto nas referidas cláusulas não viola o art. 63.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 239/23.0T8PTG.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
AA[2] (Autor) intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “Banco BPI, S.A.” (Réu), solicitando, a final, que a ação seja julgada procedente por provada e, em consequência, deva ser condenado o Réu:
a. a reconhecer ao A. o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 25 %, correspondente a 4 anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b. a pagar ao A. o valor € 5.942,79 Euros, acrescido de juros de mora legais no montante de € 188,29 Euros, num valor total global de €6.131,08 Euros, correspondente ao valor excessiva e ilegalmente descontado e respeitante aos meses de Fevereiro de 2021 até Dezembro de 2022, valor onde se encontram englobados os respectivos subsídios de férias e de Natal. acrescida dos juros vencidos até integral pagamento do valor em divida.
c. a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efectuados pelo A. para a Segurança Social, enquanto trabalhador bancário;
d. a pagar ao A. todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c) do pedido, desde Dezembro de 2022 até trânsito em julgado da mesma ou efectivo e real pagamento do devido, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença;
e. a suportar as custas processuais.
Alegou, em síntese, que o Autor ingressou na atividade bancária em 16-07-1981, tendo, por carta datada de 05-11-2014, o Réu informado o Autor da sua passagem à situação de reforma no sector bancário com início a 31-12-2014, tendo-lhe comunicado, posteriormente, a 02-06-2022, que lhe deduziria à pensão a seu cargo o equivalente a €356,86, com efeitos reportados a 07-02-2021, referindo, ainda, que lhe cobraria €6.328,32 de retroativos, o que sucedeu.
Alegou ainda que, através de nova carta datada de 04-08-2022, o Réu procedeu ao ajustamento do valor da pensão do CNP a deduzir, passando estes a €326,26.
Alegou também que o Réu pretende fazer sua, e sem ter direito a tal, em cada momento e independentemente das atualizações, 65,63 % correspondente a €366,52 do valor da pensão paga pelo Centro Nacional de Pensões ao Autor, quando, na realidade, só teria direito a 25 % da pensão que lhe foi atribuída pelo CNP, o que corresponde a €139,62, pelo que deve o Réu ao Autor o montante de €5.942,79, acrescido dos respetivos juros legais.
Alegou igualmente que dentro do sector bancário se aplica a regra pro rata temporis.
Alegou, por fim, que se aplica às partes o ACT para o sector bancário publicado no BTE n.º 29, de 08-08-2016, designadamente as cláusulas 92.ª e 94.ª
Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver o litígio por acordo.
O Réu veio apresentar contestação, pugnando, a final, que seja julgada a ação totalmente improcedente, absolvendo-se o Réu dos pedidos formulados.
Para o efeito, em súmula, alegou que, quanto ao cálculo do remanescente a que o Autor tem direito nos termos da cláusula 94.ª,[3] não é de aplicar o critério pro rata temporis, antes sim o critério pro rata contributum, ou seja, a operação de cálculo que consta no regime da segurança social, mais concretamente do art. 28.º do DL n.º 187/2007, de 10-05, por ser o que resulta do elemento literal, sistemático, histórico e teleológico da referida cláusula.
Mais referiu que ainda que se entendesse que estava em causa uma situação de omissão da cláusula 94.ª quanto ao cálculo a efetuar, por via da integração, teria de se aplicar igualmente o método constante da segurança social.
Por fim, alegou que o entendimento da cláusula 94.ª invocado pelo Autor é materialmente inconstitucional, por violar o disposto no art. 63.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa.
O Autor veio apresentar resposta ao parecer junto pelo Réu.
Tendo em audiência de julgamento chegado as partes a acordo sobre a matéria de facto provada, foi pelas partes prescindida a realização de produção de prova testemunhal.
Posteriormente, em 10-05-2023, foi proferida sentença, na qual foi fixado o valor da ação em €30.000,01, e cujo teor decisório foi o seguinte:
Pelo exposto, e nos termos das disposições legais supra mencionadas, o tribunal julga a acção totalmente procedente por provada e, em consequência, condena o Réu Banco BPI, S.A.:
a) a reconhecer ao A. o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 25 % (vinte e cinco porcento), correspondente a 4 (quatro) anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b) a pagar ao A. o valor correspondente a 5.942,79 € (cinco mil, novecentos e quarenta e dois euros e setenta e nove cêntimos) a título de capital, acrescido de 188,29 € (cento e oitenta e oito euros e vinte e nove cêntimos) a título de juros de mora, no total de 6.131,08 € (seis mil cento e trinta e um euros e oito cêntimos), valor onde se encontram englobados os respectivos subsídios de férias e de Natal acrescida dos juros vencidos e vincendos até integral pagamento do valor em dívida.
c) a aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos efectuados pelo A. para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
d) a pagar ao A. todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c), até trânsito em julgado da sentença ou efectivo e real pagamento do devido, acrescidas de juros de mora vincendos.
e) nas custas do processo.
*
Registe e Notifique.
Não se conformando com a sentença, veio o Réu “Banco BPI, S.A.” interpor recurso de apelação, terminando as suas alegações com as conclusões que se seguem:
1. A interpretação das cláusulas regulativas de convenção coletiva de trabalho deve fazer-se de acordo com as regras de interpretação da lei, em particular de acordo com o disposto no artigo 9.º do Código Civil, como vem sendo entendimento da Jurisprudência, como recentemente foi defendido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2019, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 55, de 19 de Março de 2019.
2. Na INTERPRETAÇÃO da cláusula 136.º do ACT do setor bancário deve, pois, atender-se aos seus elementos literal, sistemático, histórico e teleológico.
3.No que respeita ao elemento literal, a redação da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário (cláusula que veio a ser substituída pela Cláusula 94.ª do atual ACT do Setor Bancário) é clara nos dois aspetos que aqui relevam.
4. O primeiro, é que nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares – como sucede com o Recorrido, a partir de 1.1.2011, dado a sua integração no regime geral da segurança social por imposição do Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 3 de Janeiro – apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos no ACT – cfr. 2.ª parte do n.º 1 da cláusula 136.ª.
5. O segundo, é o de determinar que o benefício a “abater” é o que decorre de contribuições feitas no período de serviço contado pelo Banco para o cálculo da pensão a pagar por este, pois, como se refere no n.º 2 daquela cláusula estão em causa os benefícios decorrentes de contribuições.
6. A “pensão de abate” – assim a designamos por facilidade de exposição – é o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP.
7. As cláusulas aludem, literalmente, ao benefício decorrente das contribuições com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador.
8. Acresce ainda que, quando no Acordo Coletivo se pretendeu exprimir o critério pro rata temporis tal foi feito de modo particularmente claro e direto (n.º 3 da cláusula 98.ª) sem qualquer semelhança com a redação da analisada cláusula 94.ª.
9. O elemento sistemático é também conducente ao mesmo resultado interpretativo.
10. A norma em causa insere-se no sistema de previdência e, no caso concreto, na conjugação de dois regimes de reformas, a saber: o regime de segurança social do setor bancário e o regime geral de segurança social.
11. Para isso, por se tratar de um sistema previdencial, remete para as regras de cálculo utilizadas pelo regime geral da segurança social.
12. A fim de as utilizar e não de aproveitar os seus resultados.
13. A inserção sistemática da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário impõe a sua interpretação no sentido da aplicação das mesmas regras que servem o cálculo da pensão do CNP.
14. São essas as regras aplicadas pelo Recorrente, para apuramento da “pensão de abate”.
15. Este sentido sai reforçado, por um lado, por não haver dúvidas quanto à aplicação das regras de cálculo do regime geral da segurança social quando não há tempo “extra-banco” e, por outro lado, pela redação da cláusula 94.ª do atual ACT do Setor Bancário.
16. Naquela cláusula as Partes Outorgantes, acautelando o caso de o trabalhador não requerer a atribuição do benefício do CNP, expressamente previram como seria feito o “abate” daquele benefício à pensão a pagar pelo Banco, remetendo expressamente para as regras do regime geral de segurança social.
17. Caso o trabalhador não requeira o pagamento do benefício do CNP, o Banco estima qual o valor desse benefício e apenas garante o pagamento da diferença entre a pensão prevista no ACT e o benefício do CNP.
18. O que significa que as Partes sempre tiveram presente que o benefício a “abater” é apurado de acordo com as regras aplicáveis ao cálculo desse mesmo benefício e não de acordo com uma qualquer regra de repartição em “três simples” ou pro rata temporis.
19. Ao invés, não há qualquer elemento do sistema que aponte para a interpretação que defende o Recorrido, ou seja, não há qualquer norma no sistema em que se insere a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário que contenha norma para o cálculo de benefícios de pensão em razão de qualquer critério de pro rata temporis.
20. O montante da pensão do CNP é igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo fator de sustentabilidade, como resulta do disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio.
21. E a remuneração de referência é definida no artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, pela fórmula TR(nx14), em que TR representa o total das remunerações anuais revalorizadas de toda a carreira contributiva e n o número de anos civis com o registo de remunerações, até ao limite de 40.
22. São estas as regras do sistema a que apela a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e que, com apelo ao elemento sistemático, devem aplicar-se no apuramento da parte da pensão a pagar pelo CNP que há-de ser entregue pelo Recorrido ao Recorrente.
23. Também o elemento histórico está conforme com a interpretação proposta pelo Recorrente, pois a origem da atual cláusula 94.º do ACT do Setor Bancário remonta ao ano de 1980 e sempre teve o objetivo de articulação dos regimes de segurança social quando o trabalhador está abrangido por mais do que um regime, de forma a impor a duplicação de benefícios.
24. E tais benefícios não se limitam às pensões de reforma, pois incluem outros como prestações de parentalidade e morte, observando-se a regra de cálculo de cada um dos regimes que atribui o benefício que esteja em causa.
25. Por fim, o elemento teleológico é particularmente relevante na tarefa interpretativa, pois a norma da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário tem por fim coordenar o percebimento de benefícios por trabalhadores submetidos a diferentes regimes de forma a impedir que, por força do mesmo período contributivo, o trabalhador possa ver-lhe atribuídos benefícios cumulados.
26. É uma expressão clara do princípio da não acumulação de prestações plasmado no artigo 67.º, n.º 1 da Lei de Bases da Segurança Social (Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro).
27. A não acumulação de prestações não pode alcançar-se com recurso, para a repartição da pensão a pagar pelo CNP, a um critério de “regra de três simples pura”.
28. Tal conclusão ofende diretamente o fim a que se propõe a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e a cláusula 94.ª do atual ACT do setor bancário que é, precisamente, abater à pensão paga pelo Banco Recorrente, a pensão (ou parte de pensão) que for paga ao Recorrente pelo CNP que respeite ao tempo de serviço no Banco.
29. O entendimento do Recorrente é, de resto, o que conduz a um resultado mais equitativo.
30. É bom notar que a carreira extra-banco pode ser mais favorável ao trabalhador, o que sucede no caso de as remunerações registadas nesse período serem superiores às registadas na carreira ao serviço do Banco.
31. Por isso acrescenta-se, a este propósito, que o entendimento do Recorrente assegura, inclusivamente, que nesses casos, em que a pensão teórica extra-banco seja mais favorável ao pensionista (por as remunerações auferidas nesse período serem superiores), não veja este o seu benefício penalizado.
32. A questão não é meramente teórica, tendo sido objeto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22/11/2017, disponível em www.dgsi.pt.
33. Como sucedeu no caso julgado no referido douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22/11/2017, em que estava em causa uma pensão da Caixa Geral de Aposentações e em que o Banco ali Réu reconhecera parte da carreira na CGA, verificou-se que as remunerações auferidas pelo trabalhador no período extra-banco eram superiores àquelas que auferira no período que o Banco lhe contara, tendo o Tribunal concluído que não era aplicável a regra de pro rata temporis, que aquele Banco aplicara.
34. O Tribunal da Relação de Évora acolheu o entendimento aqui defendido pelo Recorrente que, naquele caso, era favorável ao pensionista.
35. Em suma, para dizer que a INTERPRETAÇÃO da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário, com recurso aos elementos de interpretação literal, sistemático e teleológico, conduz ao resultado oposto ao da douta Sentença recorrida.
36. A interpretação preconizada pela douta Sentença recorrida olvida que para o cálculo do benefício pago pelo CNP concorre, nos termos do disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, não só o tempo (por via da taxa de formação a pensão) mas também as remunerações (por via da remuneração de referência que é definida no artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio, pela fórmula TR(nx14), em que TR represente o total das remunerações anuais revalorizadas de toda a carreira contributiva e n o número de anos civis com registo de remunerações, até ao limite de 40).
37. Em suma: porque a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário (tal como a cláusula 94.ª do atual ACT do setor bancário) se refere expressamente a benefícios decorrentes de contribuições para o regime geral de segurança social e porque o benefício pago pelo regime geral de segurança social (através do CNP) é apurado, além do tempo de carreira contributiva (que determina a taxa de formação da pensão), de acordo com os montantes das contribuições feitas ao longo da carreira contributiva (por via da determinação da remuneração de referência) torna-se imperioso calcular as duas pensões teóricas respeitantes a cada um dos períodos em causa e, em função desses resultados, repartir o benefício pago pelo CNP, sob pena de subversão total da ratio da cláusula em análise.
38. Entendimento que foi sufragado pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10/10/2016, e pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 25/09/2017, que se juntaram aos autos.
39. Mais recentemente, foi também este o entendimento versado nas doutas sentenças proferidas pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto, Juiz 1 de 20/02/2020 e de 01/10/2020 e Juiz 2, de 25/04/2020, já juntas aos autos.
40. É também a douta opinião do SENHOR PROFESSOR DOUTOR BERNARDO LOBO XAVIER expressa no douto Parecer de Direito junto aos autos.
41. As remunerações registadas ao longo da carreira contributiva do Recorrido não são iguais, ocorrendo que as remunerações registadas na carreira ao serviço do Banco são de valores substancialmente superiores às que foram registadas no período da carreira fora do Banco, como se pode verificar da simples análise do Doc. 6 junto com a p.i., onde constam as seguintes remunerações registadas na carreira do Autor:

AnoValor revalorizados das

remunerações

1972
      549,58€
Carreira Extra-Banco
1973
      7.253,39€
Carreira Extra-Banco
1974
      10.965,38€
Carreira Extra-Banco
1975
      11.501,39€
Carreira Extra-Banco
1976
      12.074,53€
Carreira Extra-Banco
1977
      10.540,39€
Carreira Extra-Banco
1978
      10.559,72€
Carreira Extra-Banco
1979
      9.226,38€
Carreira Extra-Banco
1980
      9.581,96€
Carreira Extra-Banco
1981
      7.306,70€
Carreira Extra-Banco
1985
      3.978,11€
Carreira Extra-Banco
1986
      335,20€
Carreira Extra-Banco
2011
      53.936,19 €
Carreira no Banco
2012
      44.231,19 €
Carreira no Banco
2013
      43.930,39 €
Carreira no Banco
2014
      50.448,23 €
Carreira no Banco
Cfr. Doc. 6junto com a p.i.
49. Na interpretação do Recorrido o ano de 1986 em que tem registado o montante de remunerações revalorizadas de 335,20 € tem exatamente o mesmo peso que o ano de 2011 em que tem registadas remunerações revalorizadas de 53.936,19 €
50. A interpretação do Recorrido tem como efeito que, independentemente dos montantes das remunerações, cada ano da carreira contributiva tem igual peso, quando nos termos da lei, como se viu, não é assim pois o cálculo da pensão é feito em função do tempo (taxa de formação) e das remunerações (remuneração de referência), de tal forma que as remunerações mais elevadas (a que correspondem contribuições mais elevadas) significam pensão de valor mais elevado.
51. Ainda que se entendesse que não estaria em causa a interpretação da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário (atual cláusula 94.ª do ACT do Setor Bancário), por se verificar que a cláusula é omissa quanta à fórmula de cálculo no caso em que se torna necessário proceder à repartição da pensão do CNP, chegar-se-ia, por via da integração, ao mesmo resultado.
52. Nesse sentido, pronunciou-se a EXMA SENHORA PROFESSORA DOUTORA MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO em douto Parecer junto aos autos no processo que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Leiria, Juízo do Trabalho das Caldas da Rainha Proc. n.º 1718/19.0T8CLD, já junto aos autos.
53. No entendimento sufragado pela douta Sentença recorrida , as cláusulas 136.ª e 94.ª do ACT do Setor Bancário violam também o disposto no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
54. Ao remeter-se o cálculo da “pensão de abate” para uma “regra de três simples” está o Recorrente, inevitavelmente, a transferir para o pensionista parte do benefício que o Banco deve abater à mensalidade que está obrigado a pagar, potenciando, ilegalmente e em afronta àquele comando constitucional, o benefício que o pensionista teria a receber se isoladamente lhe fosse considerada apenas a carreira contributiva extra-banco.
55. O efeito de tal entendimento é, efetivamente, a violação do preceito constitucional vertido no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa que determina que “Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do setor de atividade em que tiver sido prestado”.
56. Na interpretação dada pelo Recorrido à cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e à cláusula 94.ª do atual ACT do setor bancário tais cláusulas são MATERIALMENTE INCONSTITUCIONAIS por violação do artigo 63.º, n.º 4 da Constituição.
57. A douta Sentença recorrida deve, pelos fundamentos expostos, ser revogado, concedendo-se provimento ao Recurso e absolvendo-se o Recorrente dos pedidos.
58. Ao decidir como decidiu, a douta Sentença recorrida violou o disposto na cláusula 136.º do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011 – data de distribuição: 24/01/2011) cláusula que veio a ser substituída, com redação similar, pela cláusula 94.º do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (BTE n.º 29 de 08/08/2016), os artigos 26.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio e, bem assim, violou também o disposto no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
Termos em que deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida nos termos supra expostos e absolvendo-se a Recorrente de todos os pedidos, fazendo-se assim JUSTIÇA!
O Autor apresentou contra-alegações, solicitando a improcedência do recurso, devendo ser mantida a sentença recorrida.
O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, e, após a subida dos autos ao Tribunal da Relação, foi dado cumprimento ao preceituado no n.º 3 do art. 87.º do Código de Processo do Trabalho, tendo a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitido parecer, pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida na íntegra a sentença recorrida.
Não houve resposta a tal parecer.
O recurso foi admitido nos seus precisos termos, e, após a ida dos autos aos vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – Objeto do Recurso
Nos termos dos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso (art. 662.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
No caso em apreço, as questões que importa decidir são:
1) Qual é a correta operação de cálculo para apuramento da pensão do Autor de acordo com o disposto na Cláusula 136.ª do ACT de Sector Bancário e posteriormente substituída pela cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário; e
2) A interpretação adotada pela sentença recorrida sobre a operação de cálculo a efetuar, nos termos da Cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário, e posteriormente substituída pela cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário, é inconstitucional.
III – Matéria de Facto
O tribunal de 1.ª instância deu como provados os seguintes factos:
1 - A Ré é uma instituição de crédito e exerce a actividade bancária.-
2 - Participou nas negociações e outorgou o A.C.T. para o Sector Bancário, cuja versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1ª Série, n.º 29, de 08/08/2016, pg. 2339 e ss., instrumento de regulamentação colectiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros ou que deles fizeram parte.-
3 - Autor encontra-se filiado no Mais Sindicato, que também usou Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, onde figura como o sócio n.º 38978.-
4 - O Autor ingressou na actividade bancária em 16 de Julho de 1981.-
5 – Por carta datada de 05-11-2014, a Ré informou o Autor da sua passagem à situação de reforma no sector bancário, com início a 31 de Dezembro de 2014.-
6 – Tendo-lhe comunicado, posteriormente, a 2 de Junho de 2022, que lhe deduzia à pensão a seu cargo o equivalente a 356,86 €, com efeitos reportados a 07/02/2021, referindo ainda que lhe cobraria 6.328,23 € de retroactivos, o que sucedeu.-
7 – Através de nova carta datada de 04/08/2022, o Réu procedeu ao ajustamento do valor da pensão do CNP a deduzir, passando estes a 326,26 €.-
8 – O valor a deduzir não foi rectificado nem foi devolvido o valor apurado, situação que a Ré se comprometeu a corrigir e que determinará a devolução ao Autor da quantia ilíquida de 908,12 €.-
9 - O Autor foi informado por carta do Centro Nacional de Pensões, datada de 17/03/2022, de que o requerimento de pensão oportunamente apresentado foi deferido, sendo que a pensão por velhice com início em 2/07/2021, se fixou em € 369,18 Euros, tendo aquele valor sido corrigido posteriormente para € 558,48 em resultado de novo cálculo.-
10 - O Autor passou à situação de reforma integrado no nível 13 do ACT para o Sector Bancário, passando a auferir uma pensão de reforma, pagável 14 vezes por ano, com a mensalidade base de €1.466,19, acrescida de diuturnidades no valor de 665,10 € e anuidades no valor de 74,82 €.-
11 – O Réu enviou carta ao Autor, que se juntou como documento 3, na qual pode ler-se o seguinte:
“Exm. Senhor,
Acusa-se a receção dos cálculos do Centro Nacional de Pensões (CNP) que remeteu com a comunicação do deferimento da sua pensão de reforma por reforma por velhice Unificada, com início em 07-02-2021, que se agradece.-
No seguimento dos anteriores contatos sobre o assunto informa-se que, nos termos da cláusula 94.º do ACT do setor bancário, ao montante da pensão de reforma paga pelo BPI passará a ser deduzido, a partir do processamento do mês de Junho e com efeitos reportados a 07-02-2021, o valor atual de 356,89€ (trezentos e cinquenta e seis euros e oitenta e nove cêntimos) decorrente das contribuições para a segurança social efetuadas pelo Banco no período compreendido entre 01-01-2022 e 31-12-2014, que lhe foi reconhecido na antiguidade para efeitos de reforma.-
Mais se informa que, no mesmo processamento, o Banco procederá à dedução dos retroactivos desde a data da atribuição da pensão do CNP, no valor de € 6.328,31 (seis mil trezentos e vinte e oito euros e trinta e um cêntimos) (...)”;-
12 - À data da propositura da acção o Réu havia retido ao Autor a quantia de € 9.675,30 Euros, de um total pago pelo C.N.P. de € 14.930,03 Euros, correspondente a 65,63% do valor pago a título de pensão pelo CNP.-
13 - Na presente data, o Réu deduz à pensão de reforma do Centro Nacional de Pensões o valor de € 366,52 (trezentos e sessenta e seis euros e cinquenta de dois cêntimos);-
14 - O Autor teve uma carreira contributiva com momentos distintos de descontos: de 12-1972 a 12-1981 e de 02-1985 a 01-1986 o Autor efectuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de actividade dependente remunerada a entidade não bancária;-
15 - De 16-07-1981 a 31-12-2010 o Autor, enquanto trabalhador bancário, efectuou descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB);-
16 - A partir de Janeiro de 2011 o Autor passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma.-
17 – As remunerações registadas ao longo da carreira contributiva do Autor não são iguais, ocorrendo que a remuneração registada na carreira ao serviço do Banco é de valor substancialmente superior às que foram registadas no período da carreira fora do Banco, conforme documento 6 junto com a petição inicial, que aqui se dá por integralmente reproduzido.-
18 - O cálculo do valor a deduzir na pensão atribuída pelo Banco, foi efectuado pelo Réu da seguinte forma:
1. Cálculo da pensão com a carreira total no valor de 558,48 €;
2. Cálculo da pensão autónoma da carreira no Banco – 279,96 €;
3. Cálculo da pensão autónoma da carreira fora do Banco – 199,26 €;
4. Apura-se o acréscimo que resulta da diferença entre o valor da pensão total e o valor resultante da soma das duas pensões autónomas = 1- (2+3) = 79,26 €;
5. Apura-se a % do peso de cada pensão autónoma no total da soma das duas;
6. Reparte-se o acréscimo de acordo com a % apurada;
7. Os valores encontrados somam-se às pensões calculadas autonomamente:;-
8. pensão Colaborador RGSS = 232,22 € (199,26 € pensão isolada + 32,96 € correspondente à % do acréscimo);-
9. pensão total RGSS a deduzir pelo Banco = 326,26 € (279,96 € pensão isolada + 46,30 € correspondente à % do acréscimo);-
IV – Enquadramento jurídico
Conforme supra mencionámos, o que importa analisar no presente recurso é apurar se (i) a operação de cálculo para apuramento da pensão do Autor, de acordo com o disposto na Cláusula 136.ª do ACT de Sector Bancário, e posteriormente substituída pela cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário, constante da sentença recorrida, é correta; e (ii) a interpretação adotada pela sentença recorrida sobre a operação de cálculo a efetuar, nos termos da Cláusula 136.ª do ACT de Sector Bancário, e posteriormente substituída pela cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário, é inconstitucional.
1 – Qual é a correta operação de cálculo para apuramento da pensão do Autor de acordo com o disposto na Cláusula 136.ª do ACT de Sector Bancário e posteriormente substituída pela cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário
Entende o recorrente que quer a Cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário quer a Cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário que, posteriormente, veio substituir aquela, bem interpretadas, em respeito pelos seus elementos de interpretação literal, sistemático, histórico e teleológico, determinam que na operação de cálculo para o apuramento da denominada “pensão de abate” deve atender-se ao disposto nos arts. 26.º e 28.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10-05, pelo que se deve ter em conta não só o tempo, mas também as remunerações.
Mais referiu que, mesmo que se entendesse que a simples interpretação das referidas cláusulas não permite apurar qual seja a operação de cálculo a efetuar, por tal operação se encontrar omissa, sempre teria tal lacuna de ser integrada com recurso ao DL. n.º 187/2007, de 10-05, concretamente aos seus arts. 26.º e 28.º, n.º 1.
Vejamos.
Dispunha a cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário,[4] celebrado entre várias instituições de crédito, entre as quais o Réu, e a Federação do Sector Financeiro – FEBASE, que:
1 — As instituições de crédito, por si ou por serviços sociais privativos já existentes, continuarão a garantir os benefícios constantes desta secção aos respectivos trabalhadores, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de segurança social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas será garantida, pelas instituições de crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos neste acordo.
2 — Para efeitos da 2.ª parte do número anterior, apenas serão considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de segurança social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos das cláusulas 17.ª e 143.ª
3 — As instituições adiantarão aos trabalhadores abrangidos pelo regime geral da segurança social as mensalidades a que por este acordo tiverem direito, entregando estes à instituição a totalidade das quantias que receberem dos serviços de segurança social a título de benefícios da mesma natureza.
E dispõe a cláusula 94.º do ACT do Sector Bancário atualmente em vigor,[5] celebrado entre várias instituições de crédito, entre as quais o Réu, e a Federação do Sector Financeiro – FEBASE, que:
1- As instituições de crédito garantem os benefícios constantes da presente secção aos trabalhadores referidos no número 3 da cláusula 92.ª, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas é garantida pelas instituições de crédito a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos nesta secção.
2- Para efeitos da segunda parte do número anterior, apenas são considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de Segurança Social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos da cláusula 103.ª
3- Os trabalhadores ou os seus familiares devem requerer o pagamento dos benefícios a que se refere o número 1 da presente cláusula junto das respectivas instituições ou serviços de Segurança Social a partir do momento em que reúnam condições para o efeito sem qualquer penalização e informar, de imediato, as instituições de crédito logo que lhes seja comunicada a sua atribuição, juntando cópia dessa comunicação.
4- O incumprimento do referido no número anterior, determina que:
a) No caso em que o benefício assuma a natureza de pensão e esta seja atribuída com penalização, as instituições de crédito considerem, para o apuramento da diferença a que se refere a segunda parte do número 1, o valor da referida pensão sem aplicação do factor de sustentabilidade e com uma taxa de penalização correspondente a 75 % da taxa efectivamente aplicada pela instituição ou serviço de Segurança Social.
b) No caso em que não seja requerido o pagamento dos benefícios logo que reúnam condições para o efeito, apenas é garantido pelas instituições de crédito, a partir dessa data, o pagamento da diferença entre os benefícios previstos neste acordo e o valor, por si estimado, dos benefícios a atribuir pelas instituições ou serviços de Segurança Social.
c) No caso em que não seja comunicada às instituições de crédito a atribuição dos benefícios ou não lhes seja enviada cópia da comunicação recebida das instituições ou serviços de Segurança Social, aplica-se o previsto na alínea b) deste número.
5- As correcções que se mostrem devidas em relação aos valores pagos pelas instituições de crédito nos termos da presente secção serão efectuadas logo que estas disponham dos elementos necessários para o seu processamento e serão aplicadas à data em que produzam ou devessem ter produzido efeitos.
6- No momento da passagem à situação de reforma as instituições de crédito informarão o trabalhador dos diplomas legais, em vigor nessa data e que lhe são aplicáveis, que regulam a atribuição de subsídios e pensões por parte dos regimes públicos de segurança social.

Como se pode verificar, a versão entre ambas as cláusulas para o critério de apuramento daquilo que deve ser deduzido – a denominada “pensão de abate” – é em tudo semelhante, existindo apenas uma diferença de tempo verbal, o qual deixa de ser “será” para passar a ser “é”.
Na realidade, a questão relativa ao apuramento de qual o critério a adotar no cálculo a efetuar nos termos da Cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário, num primeiro momento, e posteriormente nos termos da Cláusula 94.º do ACT do Sector Bancário, tem sido amplamente discutida nos tribunais portugueses, e também na seção social deste Tribunal, sendo de destacar nesta seção, os acórdãos de 10-02-2022 no âmbito do processo n.º 1240/20.1T8EVR.E1,[6] em 26-05-2022 no âmbito do processo n.º 3314/20.0T8FAR.E1[7] e em 13-07-2022 no âmbito do processo n.º 1039/21.8T8FAR.E1.[8] De igual modo, identificamos os acórdão mais recentes proferidos pelo STJ sobre esta questão, concretamente, os proferidos em 12-01-2023 no âmbito do processo n.º 422/21.3T8CSC.L1.S1; em 29-11-2022 no âmbito do processo n.º 629/21.3T8CSC.L1.S1; e em 11-05-2022 no âmbito do processo n.º 3798/20.6T8BRG.G1.S1.[9]
No seguimento de todos esses acórdãos, e da posição quase unânime na jurisprudência portuguesa, subscrevemos o entendimento de que no cálculo da pensão de reforma, nas situações previstas na anterior Cláusula 136.ª do ACT do sector bancário e atualmente na Cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário, apenas releva o fator relativo ao período de tempo contributivo, já não o valor das contribuições efetuadas em cada um desses momentos contributivos, sendo esta interpretação compatível com os elementos literal, sistemático, histórico e teleológico das referidas cláusulas.
Na realidade, resulta do teor das próprias Cláusulas 136.ª e 94.ª o critério a adotar, inexistindo, por isso, qualquer situação omissiva. Atente-se que nela se fez consignar expressamente que os beneficiários apenas têm direito pelas instituições de crédito “à diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos nesta seção”, sendo que “benefícios” se reporta a pensões, conforme resulta muito claramente do atual ACT, em face da conjugação da Cláusula 94.ª com o teor da Cláusula 92.ª desse ACT.
E, a ser assim, inexistindo qualquer situação omissiva, é da interpretação do teor das Cláusulas 136.ª e 94.ª que terá de resultar o critério a adotar no cálculo da diferença a que os beneficiários não têm direito, sendo que, em face do teor literal da última parte do n.º 1 dessas Cláusulas, e em conjugação com o seu n.º 2, é manifesto que apenas se atende às pensões e ao período de tempo em que os beneficiários exerceram a sua atividade bancária e em simultâneo fizeram descontos para a Segurança Social, e não ao valor das contribuições efetuadas em cada um dos momentos contributivos, inexistindo qualquer menção nessas Cláusulas a este novo fator de ponderação.
Na realidade, a interpretação defendida pelo Apelante não possui qualquer assento na letra das referidas Cláusulas, visto que nelas não consta qualquer menção ao valor das contribuições no cálculo a efetuar, sendo a letra dessas Cláusulas o seu limite interpretativo. Tal circunstância determina que, ultrapassando a interpretação proposta pelo Apelante o limite imposto pela letra das referidas Cláusulas, torna-se desnecessário recorrer a qualquer outro elemento, designadamente aos citados elementos sistemático, histórico e teológico.
Neste sentido, entre muitos, o já citado acórdão do STJ proferido em 12-01-2023:
I- A letra da convenção é não apenas o ponto de partida da interpretação, mas o limite da mesma;
II- Se uma interpretação proposta não tiver o mínimo de apoio no teor literal da cláusula torna-se desnecessário recorrer a outros elementos, já que o recurso aos mesmos não permite fazer vingar tal interpretação, carecendo a mesma do referido mínimo de apoio na letra da cláusula.

Dir-se-á, de qualquer modo, que, atento o elemento sistemático, é a interpretação adotada na sentença que impera, uma vez que nos referidos ACT sempre que se pretende remeter para o sistema da Segurança Social tal remissão é expressa, como, aliás, ocorre no próprio n.º 2 das Cláusulas 136.ª e 94.ª.
De igual modo, também os elementos histórico e teológico não permitem adotar a interpretação propugnada pelo Apelante.
Por fim, cita-se, pela sua relevância, o acórdão do STJ, proferido em 22-02-2018:[10] [11]
I. O número 3.º da cláusula n.º 136.ª do Acordo Colectivo de Trabalho para o sector bancário ao referir no seu segundo segmento “entregando estes (os trabalhadores que passem à reforma) à Instituição (de Crédito) a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua actividade bancária e que efectuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.
II. As expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respectivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um factor de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efectuadas”.

E ainda este acórdão refere, quanto à não aplicação do disposto no art. 28.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10-05, à situação prevista nas Cláusulas 136.ª e 94.ª dos ACT do Sector Bancário, o seguinte:
Na verdade, todos os fatores em causa já foram considerados no cálculo de valor da pensão por parte do Centro Nacional de Pensões, pelo que, independentemente do peso que as contribuições efetuadas pelo exercício da atividade bancária relativas ao período de 01/01/2011 até 2015 possam ter tido no cálculo do valor da pensão de reforma atribuída ao autor, afigura-se-nos que a ré só tem direito a compensar na pensão de reforma que lhe é paga nos termos do ACT a parte proporcional da pensão da segurança social que corresponde ao período em que o trabalhador exerceu funções no sector bancário com descontos para a Segurança Social, pois só aí existe uma sobreposição das prestações por serem da mesma natureza.

Pelo exposto, apenas nos resta concluir pela improcedência da pretensão do Apelante, sendo de manter, nesta parte, a sentença recorrida.

2 – A interpretação adotada pela sentença recorrida sobre a operação de cálculo a efetuar, nos termos da Cláusula 136.ª do ACT do Sector Bancário, e posteriormente substituída pela cláusula 94.ª do ACT do Sector Bancário, é inconstitucional
Considera o Apelante que a interpretação constante da sentença recorrida para a operação de cálculo da pensão de abate é inconstitucional, por violar o art. 63.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, uma vez que transfere para o pensionista parte do beneficio que o Banco deve abater à mensalidade que está obrigado a pagar, potenciando, ilegalmente, e em afronta àquele comando constitucional, o benefício que o pensionista teria a receber se isoladamente lhe fosse considerada apenas a carreira contributiva extra banco.
Dispõe o art. 63.º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, que:
4. Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de actividade em que tiver sido prestado.

Na realidade, tendo sido contado pela Segurança Social todo o tempo de trabalho do Autor, independentemente do setor de atividade em que este exerceu esse trabalho, nada referindo o dispositivo constitucional sobre o valor das contribuições, não se compreende como é que o Apelante possa pretender que a não integração do valor das contribuições no cálculo da “pensão de abate” viola o citado artigo.
Sobre esta matéria, o Tribunal Constitucional tem reiteradamente considerado legalmente inadmissível a inconstitucionalidade invocada.[12]
De igual modo, a seção social deste Tribunal tem também considerado inexistir qualquer inconstitucionalidade conforme os acórdãos já mencionados proferidos em 13-07-2022 e em 10-02-2022.
Pelo exposto, inexiste qualquer inconstitucionalidade na aplicação das cláusulas 136.ª e 94.ª dos diversos ACT do Sector Bancário, improcedendo, assim, também esta pretensão do Apelante.
V – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso totalmente improcedente, mantendo-se a sentença recorrida.
Custas pelo Apelante (art. 527.º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil).
Notifique.
Évora, 7 de novembro de 2023
Emília Ramos Costa (relatora)
Paula do Paço
Mário Branco Coelho

__________________________________________________
[1] Relatora: Emília Ramos Costa; 1.ª Adjunta: Paula do Paço; 2.º Adjunto: Mário Branco Coelho.
[2] Doravante AA.
[3] Correspondendo anteriormente à cláusula 136.º do ACT aplicável para o sector bancário.
[4] Republicado no BTE n.º 3 de 22-01-2011.
[5] Publicado do BTE n.º 29, de 08-08-2016.
[6] Consultável em www.dgsi.pt.
[7] Consultável em www.dgsi.pt.
[8] Consultável em www.dgsi.pt.
[9] Consultáveis em www.dgsi.pt.
[10] No âmbito do processo n.º 9637/16.5T8LSB.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt.
[11] Em igual sentido, vejam-se os acórdãos do STJ proferidos, 12-07-2018 no âmbito do processo n.º 3312/16.8T8PRT.P1.S1; em 08-06-2021 no âmbito do processo n.º 2276/20.8VCT.S1; em 23-06-2021 no âmbito do processo n.º 2115/20.0T8VFR.S1; em 14-07-2021 no âmbito do processo n.º 74/19.0T8MTS.P1.S1; em 14-07-2021 no âmbito do processo n.º 2084/20.6T8VLG.S1; em 14-07-2021 no âmbito do processo n.º 2457/20.4T8OAZ.P1.S1; em 15-09-2021 no âmbito do processo n.º 19922/19.9T8PRT.P1.S1; em 15-09-2021 no âmbito do processo n.º 2095/20.1T8BRR.S1; em 29-09-2021 no âmbito do processo n.º 23235/19.8T8LSB.L1.S1; em 19-10-2022 no âmbito do processo n.º 2314/21.7T8LSB.L1.S1; e em 29-11-2022 no âmbito do processo n.º 453/21.3T8CSC.L1.S1; todos consultáveis em www.dgsi.pt.
[12] Recentemente os acórdãos do TC nºs. 242/2022 e 375/2022.