Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRC | ||
Relator: | MOREIRA DO CARMO | ||
Descritores: | EXPROPRIAÇÃO EXPROPRIAÇÃO TOTAL INCIDENTE MEIOS DE PROVA | ||
Data do Acordão: | 02/23/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | LOUSÃ | ||
Texto Integral: | S | ||
Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | REVOGADA | ||
Legislação Nacional: | ARTS.3º Nº2 B), 55, 56, 57, 58 CEXP., 302, 303, 304, 668 Nº1 D) CPC | ||
Sumário: | 1. - O pedido de expropriação total desenvolve um incidente autónomo, como tal previsto na lei (vide os artigos 55º a 57º do CE), que corre nos próprios autos. 2. - Nesse incidente, devem ser indicadas e produzidas as suas próprias provas, como ocorre, aliás, com todos os incidentes processuais, nos termos dos artigos 302º a 304º do Código de Processo Civil. 3. - Se o expropriado oferece três meios de prova (pericial, documental e testemunhal) e o tribunal nada diz relativamente a dois deles (pericial e documental), apenas se pronunciando quanto ao outro (testemunhal), tal despacho é parcialmente nulo, por omissão de pronúncia, nos termos dos arts. 666º, nº 3 e 668º, nº 1, d), do CPC. 4. - Qualquer parte em processo judicial, para defesa dos seus direitos, tem direito à prova, corolário de um processo equitativo, por sua vez consequência do direito de acção judicial - este um importante significante do direito de acesso aos tribunais, direitos todos eles reconhecidos pelo art. 20º, nº1 e 4, da Constituição da República Portuguesa - e, consequentemente, à admissão das provas requeridas. 5. - Apesar de estarmos no âmbito de um processo de expropriação, e uma vez que o regime geral dos incidentes processuais o permite, não deve ser arredada, sem mais, sem a devida justificação/fundamentação, a produção de prova testemunhal. | ||
Decisão Texto Integral: | I – Relatório
1. Nos presentes autos em que é expropriante o Município de Miranda do Corvo e expropriado A (…), residente nesse concelho, veio este requerer a expropriação total do prédio onde se insere a parcela expropriada, em 2006. Alegou, em suma que, após a expropriação da parcela com a área de 1.725m2, resta ao prédio objecto da expropriação uma área de 4.375 m2 subdividida em duas parcelas, uma situada a Este, outra a Oeste da parcela expropriada; a nova rua passa a cota superior à do terreno, quer em relação a uma, quer à outra das duas subparcelas, em mais de um a dois metros; nas bordas das parcelas ficarão passeios e, adiante dos passeios, lugares de estacionamento, prevendo-se que haja pistas, separadas da plataforma da estrada, para peões e velocípedes; qualquer eventual edificação nas parcelas sobrantes esbarra com a necessidade de respeitar afastamentos em relação à plataforma da nova rua; a parcela sobrante, composta pelas duas referidas subparcelas não poderá ter qualquer aproveitamento agrícola ou florestal, dada a sua configuração e dimensão; pelo que nenhum interesse económico, determinado objectivamente, tem para o expropriado os cómodos assegurados pela parcela sobrante, nos termos do art. 3º, nº 2, b), do Código das Expropriações. Terminou o expropriado requerendo a prova pericial da parcela sobrante, tendo apresentado quesitos para o efeito e indicado perito, bem como arrolou testemunhas e requereu a gravação da audiência final do incidente, e requereu, ainda, a produção de prova documental. A expropriante respondeu dizendo que o pedido devia ser indeferido por não estarem preenchidos os pressupostos legalmente exigidos, tendo apresentado quesitos e indicado perito. Após foi feita inspecção judicial, com redução a auto do escrito. Ordenou-se a notificação do Município para junção aos autos de documento comprovativo da qualidade de parque urbano atribuída às duas parcelas sobrantes, o que a dita autarquia satisfez. De seguida, foi considerado que face à especificidade da matéria em causa não se mostrava necessária a audição de quaisquer testemunhas, contendo já os relatórios periciais os elementos essenciais à decisão do presente incidente, e de enfiada, no mesmo momento (e mesmas páginas), foi proferida decisão que julgou improcedente a pretensão do expropriado. 2. O expropriado interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões que se sintetizam: a) O incidente aberto com o pedido do expropriado segue o regime previsto nos arts. 302º a 304º, do CPC, e tendo sido requerida a produção de diversos meios legais de prova, não tem o Tribunal a possibilidade legal de prescindir das provas propostas; b) A decisão recorrida omitiu o dever de pronúncia sobre os pedidos de produção de prova pericial e prova documental, apresentados pelo expropriado, pelo que é nula nos termos do art. 668º, nº 1, d), do CPC; c) Também na parte em que decidiu que, face à especificidade da causa não se mostra necessária a audição de quaisquer testemunhas, contendo os relatórios periciais já necessários à decisão do incidente, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento; d) Tendo considerado que lhe era possível conhecer do pedido de expropriação total sem a apreciação das provas propostas pelo expropriado, a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, por errónea aplicação do direito de acesso aos tribunais, do direito de acção judicial, e do regime jurídico dos incidentes processuais; e) Não pode o Tribunal, sob pena de afronta às garantias do cidadão expropriado utilizar exclusivamente os relatórios periciais produzidos em sede de recurso interposto da decisão arbitral, para decisão do incidente de expropriação total; f) A decisão recorrida também não cumpriu o dever legal de fundamentação a que estava obrigada, pois em relação a nenhum dos 6 pontos que considerou provados a decisão enuncia qual o concreto meio de prova que esteve na base da convicção do julgador, pelo que está inquinada por violação do art. 653º, nº 2, do CPC, devendo assim ser determinado que o tribunal a quo supra as deficiências de fundamentação, nos termos do art. 712º, nº 5, do CPC; g) No seu segmento em que enuncia como fundamento da decisão recorrida a própria decisão arbitral, a decisão recorrida considerou tal decisão como meio de prova, o que configura erro de julgamento por violação dos arts. 49º, do C. Expropriações, 511º e 1525º, do CPC e 342º, do CC; h) A decisão de facto, no que respeita aos pontos 4. a 6., contém matéria meramente conclusiva, envolvendo o ponto 6. matéria de direito, no seu segmento “continuam a ser permitidos todos os usos possíveis anteriores à DUP”, tudo em infracção aos arts. 511º e 655º, nº 1, do CPC, e 342º, do CPC, razão pela qual deve ser anulada a decisão da matéria de facto, ou o referido segmento ser dado como não escrito; i) A matéria de facto apurada na decisão recorrida é insuficiente para decisão do incidente, devendo, por isso, ser anulado o julgamento do incidente e determinado que os autos voltem à 1ª instância para ampliação da matéria de facto indispensável à decisão da causa, concretamente: a configuração, confrontações, composição e áreas das 2 parcelas sobrantes; em relação a cada uma delas qual o modo por que se faz o acesso; a que cota se situam, à da nova via ou outra; qual o desnível entre cada uma das 2 parcelas sobrantes e os seus acessos, mormente o arruamento novo que foi construído e que determinou a expropriação parcial; quais as obras necessárias para permitir a acessibilidade às parcelas e quais os custos de tais obras; qual o reflexo de tais obras sobre a área que fica disponível para aproveitamento, em relação a cada uma das parcelas sobrantes; de que tipo de aproveitamento ou aproveitamentos cada uma delas é passível, e em caso afirmativo se tal tem interesse económico, determinado objectivamente, para um cidadão médio; e qual seja esse interesse económico, caso exista; e qual o valor de cada uma das 2 parcelas sobrantes; j) A decisão recorrida violou, entre outras as disposições dos arts. 55º, 3º, nº 2, e 29º, do C. Expro., com referência aos arts. 302º a 304º, do CPC e aos 20º e 62º, nº 2, da Constituição; dos arts. 668º, nº 1, d), 653º, nº 2, 511º, 655º, nº 1, 1525º, do CPC, 342º, do CC, 49º do C. Expro., pelo que deve ser revogada, e ser substituída por outra que conheça do requerimento de prova constante do pedido de expropriação total, admitindo os quesitos para fixação do objecto da perícia, e deferido o requerimento de prova documental e de prova testemunhal dele constante, mandando-se seguir à produção de prova pericial os demais termos dos arts. 302º a 304º, do CPC, ou, quando assim não se entenda, declarando não escritas ou anulando a decisão da matéria de facto vertida nos pontos 5. e 6. da decisão recorrida, com as legais consequências, determinando-se a ampliação da base de facto da decisão de modo a apurar a matéria atrás indicada. 3.
II – Factos Provados
Com relevância para a causa, a decisão recorrida considerou estar demonstrado que: 1) Foi expropriada uma parcela com 1.725 m2, pertencente ao prédio inscrito na matriz predial rústica sob o art.º ..., sito em freguesia da ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de Miranda do Corvo sob o nº ..., por a mesma ser necessária à execução da obra “Rua de Ligação entre a Avª do Padre Américo e a Rua 25 de Abril. 2) A área total do prédio objecto da expropriação tinha uma área total de 6.100 m2, pelo que a parte sobrante do prédio tem a área de 4.375 m2. 3) A expropriação dividiu o prédio em três partes, a parcela expropriada, uma sub parcela a poente e outra a nascente, sendo que estas duas últimas possuem formatação adequada e frente para a via pública, e as condições de acesso e de circulação rodoviária foram claramente melhoradas. 4) Antes da obra que motivou a expropriação, o acesso fazia-se por caminho fazendeiro estreito em terra batida. O único aspecto que prejudica o acesso é o desnível entre as sub-parcelas da parte sobrante e o novo arruamento, que pode ser resolvido com pequenas rampas de acesso aptas ao trânsito de viaturas. 5) Antes da expropriação já o prédio apresentava sinais de grande abandono (estava em pousio e cheio de plantas infestantes) e de ausência de aproveitamento económico (as espécies arbóreas fruteiras estavam abandonadas e improdutivas). 6) As parcelas sobrantes podem ser utilizadas a culturas agrícolas, e continuam a ser permitidos todos os usos possíveis anteriores à DUP, estando melhoradas as condições de acesso à via pública. * Para tanto exarou-se na mesma decisão que: “Por razões de imparcialidade e independência, foi valorado de forma preferencial o parecer unânime dos peritos do Tribunal igualmente subscrito pelo Sr. perito da entidade expropriante, sendo que não se vislumbram razões para por em causa os fundamentos em que sustentam o seu relatório e subsequentes esclarecimentos. Teve-se ainda em consideração o acórdão arbitral e o auto de vistoria de “ad perpetuam rei memoriam”. *
III- Do Direito
1. Uma vez que o âmbito objectivo dos recursos é balizado pelas conclusões apresentadas pelos recorrentes, apreciaremos, apenas, as questões que ali foram enunciadas (arts. 684º, nº 3 e 685º-A, do CPC). Nesta conformidade as questões a decidir são as seguintes. - Nulidade por omissão de pronúncia. - Admissibilidade da prova testemunhal. - Impugnação da matéria de facto. - Ampliação da matéria de facto.
2.1. O Código da Expropriações, no seu artigo 3º, dispõe que: 1 - A expropriação deve limitar-se ao necessário para a realização do seu fim … 2 - Quando seja necessário expropriar apenas parte de um prédio, pode o proprietário requerer a expropriação total: a) Se a parte restante não assegurar, proporcionalmente, os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio; b) Se os cómodos assegurados pela parte restante não tiverem interesse económico para o expropriado, determinado objectivamente. 3 - O disposto no presente Código sobre expropriação total é igualmente aplicável a parte da área não abrangida pela declaração de utilidade pública relativamente à qual se verifique qualquer dos requisitos fixados no número anterior. Assim, recaindo sobre o expropriado o ónus da prova dos factos constitutivos do seu direito à expropriação total, incumbe ao mesmo provar factos de onde se possa concluir que a parte restante não assegura, proporcionalmente, os mesmos cómodos que oferecia todo o prédio ou que os cómodos assegurados pela parte restante não têm interesse económico para si, determinado objectivamente. Para esse efeito, desenvolve-se um incidente autónomo, como tal previsto na lei (vide os artigos 55º a 57º do CE), que corre nos próprios autos. A lei estabelece os trâmites próprios deste incidente, e sem que tenha a sua decisão qualquer dependência da junção ao processo de expropriação parcial da avaliação levada a cabo pelos peritos (diligência instrutória obrigatória na expropriação propriamente dita), sendo o âmbito dessa avaliação naturalmente outro, que se situa no domínio do recurso da arbitragem, quando no aludido incidente se decide, diversamente, a questão da expropriação total do bem. No incidente, que ora nos ocupa, devem ser indicadas e produzidas as suas próprias provas, como ocorre, aliás, com todos os incidentes processuais, nos termos dos artigos 302º a 304º do Código de Processo Civil. Assim, deve o interessado oferecer o rol de testemunhas, e requerer a respectiva gravação, querendo, e requerer os outros meios de prova, o mesmo devendo fazer a contra-parte. Finda a produção de prova, o juiz declara quais os factos provados e não provados, observando o que resulta do disposto no art. 653º, nº 2 e 3, do CPC (análise crítica da prova e especificação dos fundamentos decisivos para a sua convicção) – vide neste entendimento o Cons. Salvador da Costa, C. Expropriações Anotado, 2010, págs. 340 /343, e Ac. Rel. Porto, de 20.1.2009, Proc.0820748, in www.dgsi.pt. Foi o que o requerente/apelante fez, tendo apresentado os seus meios de prova, como acima relatado, concretamente requereu prova pericial em relação às parcelas sobrantes, com apresentação de quesitos para o efeito, e indicou perito, bem como arrolou testemunhas e requereu a gravação da audiência final do incidente, e requereu, ainda, a produção de prova documental. No processamento do incidente, o tribunal decidiu efectuar inspecção judicial e solicitar documentos à entidade expropriante, todavia nada mais disse sobre os meios de prova oferecidos pelo expropriado, com excepção do que se refere à prova testemunhal que arredou com a consideração que “face à especificidade da matéria em causa não se mostra necessária a audição de quaisquer testemunhas, contendo já os relatórios periciais os elementos essenciais à decisão do presente incidente”, e de enfiada, no mesmo momento, proferiu decisão que julgou improcedente a pretensão do expropriado. Não é assim totalmente acertada a conclusão d) das alegações do apelante, pois através de tal despacho o que o tribunal expressamente afastou foi a necessidade de produção de prova testemunhal, tão-só. Quanto aos demais meios de prova requeridos pelo expropriado nada se disse em tal despacho. Nem a referência a “relatórios periciais” tem o valor que aparenta, pois o tribunal reportava-se, nessa referência, aos relatórios de avaliação apresentados no âmbito da expropriação parcial, após recurso do expropriado da decisão arbitral. Ou seja, o tribunal omitiu qualquer pronúncia sobre parte dos meios de prova oferecidos pelo expropriado, concretamente prova pericial e documental. Esta omissão de pronúncia, não é, porém, da sentença, como o apelante pugna, nos termos do art. 668º, nº 1, d), do CPC, pois a mesma pronunciou-se sobre a questão posta pelo expropriado – pedido de expropriação total, mas sim do despacho que o tribunal proferiu no mesmo momento e imediatamente antes de proferir a sentença recorrida. Esse despacho é, por isso, nulo, nos termos da citada disposição legal, combinada com o art. 666º, nº 3, do CPC. Consequentemente, deve ser substituído por outro, que aprecie e admita ou não os meios de prova oferecidos pelo expropriado, concretamente prova documental e pericial (sem prejuízo de quanto a esta, caso o tribunal a admita, se poder aproveitar as respostas aos quesitos, formulados pelas partes relativamente ao pedido de expropriação total, incluídas pelos peritos no seu relatório, na diligência de avaliação, como a julgadora disse quando referiu “contendo já os relatórios periciais os elementos essenciais à decisão do presente incidente”). 2.2. Relativamente à prova testemunhal o despacho rejeitou a mesma, limitando-se a dizer “face à especificidade da matéria em causa não se mostra necessária a audição de quaisquer testemunhas, contendo já os relatórios periciais os elementos essenciais à decisão do presente incidente”. Não podemos acompanhar este juízo. Primeiro, como atrás dito, os “relatórios periciais” reportam-se aos relatórios de avaliação apresentados no âmbito da expropriação parcial, após recurso do expropriado da decisão arbitral. Segundo, ainda que fosse possível utilizar tais relatórios, não se pode aceitar que os mesmos tivessem padrão de exclusividade, pois nem no processo de expropriação, propriamente dita, tais relatórios têm esse carácter, já que, na sequência de recurso da decisão arbitral, são admitidos outros meios de prova, designadamente a prova testemunhal (art. 58º, do CE). Depois, porque dizer-se que “face à especificidade da matéria em causa não se mostra necessária a audição de quaisquer testemunhas” é demasiado lacónico e pouco compreensível. Não se justifica, arredar, sem mais, sem considerações mais aprofundadas ou por modo mais bem justificado, a produção de prova testemunhal. Tanto mais, que qualquer parte em processo judicial, para defesa dos seus direitos, tem direito à prova, corolário de um processo equitativo, por sua vez consequência do direito de acção judicial - este um importante significante do direito de acesso aos tribunais, direitos todos eles reconhecidos pelo art. 20º, nº1 e 4, da Constituição da República Portuguesa - e, consequentemente, à admissão das provas requeridas (cfr. G. Canotilho e Vital Moreira, CRP Anotada, Vol. I, 4ª Ed., notas X. e XI ao referido artigo, págs. 414/416, e L. Freitas, Introdução ao Proc. Civil, 1ª Ed., pág. 77/79) De modo que as partes têm de ter a garantia de participação no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factuais, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que apareçam como potencialmente relevantes para a decisão. O escopo principal é, assim, a influência no sentido positivo do direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo, que no plano da prova passa pela faculdade de proposição de todos os meios probatórios potencialmente relevantes para o apuramento da realidade dos factos, principais ou instrumentais, da causa (vide L. Freitas, ob. cit., págs. 95/99). Do que resulta, no caso, que terão de ser analisadas as diligências de prova requeridas, no sentido de se verificar a possibilidade de adicionarem matéria de facto relevante à resolução das questões suscitadas pelas partes, a não ser que os elementos constantes do processo tornem desnecessárias as respectivas diligências, que tais diligências sejam consideradas inúteis, ou devido a se destinarem a provar factos compreendidos na função ou conhecimentos dos peritos (vide P. Elias da Costa, Guia das Expropriações por Utilidade Pública, 2ª Ed., pág. 192). Ora, se bem virmos, parte substancial da matéria factual alegada pelo expropriado, no seu requerimento de expropriação total, indicada acima no relatório, pode perfeitamente ser objecto de prova testemunhal, por se reportar a realidades e factos da vida apreensíveis, cognoscíveis e racionalizáveis por qualquer pessoa, que deles tendo conhecimento os podem transmitir, em depoimento, em tribunal. E nem tal matéria está compreendida unicamente na função ou conhecimentos dos peritos, não se podendo, também, dizer que os elementos constantes do processo tornam desnecessária a produção de prova testemunhal, sendo certo, até, que sobre a prova pericial e documental requerida pelo expropriado o tribunal omitiu pronúncia de necessidade ou desnecessidade da mesma. Conclui-se, pois, que a aludida prova testemunhal, requerida ao abrigo do regime geral dos incidentes processuais, deve ser admitida, ao invés do decidido, e consequentemente produzida. 3. Face ao ora decidido, fica prejudicado o conhecimento das outras duas questões acima enunciadas. 4. Sumariando (art. 713º, nº 7, do CPC): i) O pedido de expropriação total desenvolve um incidente autónomo, como tal previsto na lei (vide os artigos 55º a 57º do CE), que corre nos próprios autos; ii) Nesse incidente, devem ser indicadas e produzidas as suas próprias provas, como ocorre, aliás, com todos os incidentes processuais, nos termos dos artigos 302º a 304º do Código de Processo Civil. iii) Se o expropriado oferece três meios de prova (pericial, documental e testemunhal) e o tribunal nada diz relativamente a dois deles (pericial e documental), apenas se pronunciando quanto ao outro (testemunhal), tal despacho é parcialmente nulo, por omissão de pronúncia, nos termos dos arts. 666º, nº 3 e 668º, nº 1, d), do CPC; iv) Qualquer parte em processo judicial, para defesa dos seus direitos, tem direito à prova, corolário de um processo equitativo, por sua vez consequência do direito de acção judicial - este um importante significante do direito de acesso aos tribunais, direitos todos eles reconhecidos pelo art. 20º, nº1 e 4, da Constituição da República Portuguesa - e, consequentemente, à admissão das provas requeridas; v) Apesar de estarmos no âmbito de um processo de expropriação, e uma vez que o regime geral dos incidentes processuais o permite, não deve ser arredada, sem mais, sem a devida justificação/fundamentação, a produção de prova testemunhal.
IV – Decisão
Pelo exposto, julga-se procedente o presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, e em consequência: a) Deve a mesma ser substituída por outra que aprecie e admita ou não os meios de prova oferecidos pelo expropriado, concretamente prova documental e pericial; b) Ordena-se que os autos prossigam, com a produção da prova testemunhal oferecida pelo expropriado. * Sem custas. *
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