Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
1600/08.6TBFIG.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: ARTUR DIAS
Descritores: PRINCÍPIO DA PLENITUDE DA ASSISTÊNCIA DOS JUÍZES
CONDOMÍNIO
BOA-FÉ
OBRAS DE INOVAÇÃO
Data do Acordão: 11/09/2010
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: FIGUEIRA DA FOZ – 1º JUÍZO
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PARCIALMENTE REVOGADA
Legislação Nacional: ARTºS 654º CPC; 762º, Nº 2, 1414º E 1425º DO CC.
Sumário: I – O princípio da plenitude da assistência dos juízes, consagrado no artº 654º do CPC, respeita apenas à decisão sobre a matéria de facto, não se estendendo à prolação da sentença.

II – A prolação da sentença por juiz que não interveio na audiência de discussão e julgamento não viola quaisquer normas ou princípios constitucionais ou legais, nomeadamente o princípio da equidade, a que se refere o artº 20º, nº 4, da Constituição, ou o princípio do contraditório, vertente daquele (artº 3º, nº 3, do CPC).

III – Em matéria de responsabilidade pelos encargos de conservação e fruição das partes comuns do edifício e pelo pagamento de serviços de interesse comum a regra é, de acordo com o artº 1424º do CC, cada condómino pagar em proporção do valor da(s) sua(s) fracção(ões).

IV – Não procede de boa fé, assim contrariando o disposto no artº 762º, nº 2, do CC, quem, sabendo que o tecto da loja danificada por humidade proveniente da sua fracção foi reparado pelos lesados, contrapõe ao pedido de indemnização pecuniária o direito de optar pela restauração natural.

V – Sendo a fracção autónoma destinada a comércio, de acordo com título constitutivo da propriedade horizontal, a utilização nessa actividade do logradouro afecto ao seu uso exclusivo não viola quaisquer regras legais ou o dito título.

VI – A colocação no logradouro comum afecto ao uso exclusivo de uma fracção autónoma de um telheiro ou toldo em lona, com seis “pernas” metálicas, fixado ao chão por porcas e parafusos, destinado a proteger da chuva e do sol, constitui verdadeira inovação para efeitos da previsão do nº 1 do artº 1425º do CC, a tal não obstando a circunstância de o mesmo ser constituído por material removível.

Decisão Texto Integral: Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra:

1. RELATÓRIO

A... e B... ambos residentes na ...., em representação da herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de C..., instauraram acção declarativa, com processo comum e forma sumária, contra D....e mulher E..., residentes na ...., pedindo que estes sejam condenados a pagar-lhes as quantias de € 179,46, € 78,50, € 4.892,39, € 50,00 e € 320,65, acrescidas dos juros legais desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

Alegaram, para tanto, em síntese, que pertencem à herança que representam quatro fracções do prédio urbano descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial da Figueira da Foz, sob o n.º ...., e aos réus as restantes duas; que, embora nunca tenha sido elaborado um regulamento de condomínio e tenham sido escassas as tentativas de promover reuniões do condomínio, as despesas geradas pela utilização das partes comuns eram suportadas por C..., nomeadamente de electricidade e de reparação da porta de entrada do prédio; que foi cedida aos réus pela Câmara Municipal uma faixa de terreno nas traseiras do prédio que, pela acumulação de detritos, provocou infiltrações de água que inundaram o chão da fracção “A” pertencente à herança, verificando-se ainda na mesma fracção infiltrações de humidade provenientes do quarto de banho da fracção dos réus; e que a quota-parte dos RR. nas despesas de electricidade das partes comuns ascendem a € 179,46, as da reparação da porta de entrada do prédio a € 157,00, as do arranjo do chão da fracção “A” a € 4.892,39, as do pedido de vistoria à Câmara Municipal da Figueira da Foz a € 50,00 e as da pintura do tecto da mesma fracção “A” a € 320,65.

Os réus contestaram por excepção e por impugnação, deduziram reconvenção e pediram a condenação dos AA. como litigantes de má fé.

Por excepção, arguiram a ilegitimidade activa.

Por impugnação, contrariaram os factos alegados pelos autores e esclareceram que nunca foram feitas diligências no sentido de convocar qualquer assembleia de condóminos nem houve qualquer deliberação; que sempre pagaram a sua parte das despesas comuns; que, em todo o caso, apenas seria devido o valor correspondente à proporção das suas fracções; e que desconhecem a existência de qualquer infiltração a qual, a existir, provém de um pátio comum a ambas as fracções onde existem dois tanques de lavar a roupa e um ralo, pertencendo a todos os condóminos a obrigação de o manter limpo.

Em reconvenção pediram a condenação dos autores a colocarem uma manilha para escoamento das águas e a refazerem a rampa de acesso à sua (dos RR.) garagem, alegando que aqueles, aquando da execução das obras na fracção “A” ordenaram ao empreiteiro que destruísse o passadiço de acesso a essa garagem, retirando a manilha existente por baixo do mesmo e cimentando uma valeta naquele local, impedindo o acesso de carro à referida garagem.

Como litigantes de má fé, pediram a condenação dos autores em multa e a pagarem-lhes uma indemnização de valor não inferior a € 500,00.

Os autores apresentaram resposta, pugnando pela improcedência da excepção, da reconvenção e do pedido de condenação por litigância de má fé e concluindo como na petição inicial.

Em fase de saneamento, foi a arguição da excepção julgada improcedente, o pedido reconvencional admitido e a instância considerada válida e regular por se verificarem todos os necessários pressupostos processuais.

Condensada e instruída a causa, entrou-se na fase de julgamento em cujo decurso foi ouvida antecipadamente uma testemunha (acta de fls. 193/194) e apresentado pelos réus/reconvintes um articulado superveniente (acta de fls. 217 a 225), pedindo a condenação dos autores/reconvindos a reporem o muro de vedação do prédio, recolocando o portão que nele estava inserido e a retirarem ou mandarem retirar o toldo que cobre parcialmente o logradouro do imóvel, bem como a desocupá-lo de imediato, e ainda a indemnizarem-nos, em quantia a liquidar posteriormente, caso os seus inqui ....s venham a largar o locado.

Os autores/reconvindos impugnaram os factos constantes do articulado superveniente, referindo que não deram autorização para a destruição do muro, tendo advertido a respectiva inquilina desse facto e que o toldo é de material removível e encontra-se no logradouro de utilização exclusiva dos autores/reconvindos.

Encerrada a discussão, foi proferido o despacho de fls. 257 a 263, respondendo aos quesitos da base instrutória e, assim, decidindo a matéria de facto controvertida.

Foi, depois, emitida a sentença de fls. 265 a 292, julgando:

a) A acção parcialmente procedente e condenando os RR. a pagar aos AA. a quantia de € 376,39, acrescida de juros legais desde a citação até efectivo pagamento;

b) A reconvenção improcedente e absolvendo os AA/reconvindos dos pedidos reconvencionais.

Inconformados, os AA. interpuseram recurso e na alegação logo apresentada formularam as conclusões seguintes:

[…]

Os RR. contra-alegaram e interpuseram recurso subordinado logo seguido da respectiva alegação, peça que encerraram com as conclusões seguintes:

[…]

Os AA. ainda responderam, defendendo a improcedência do recurso subordinado, com a consequente manutenção, nessa parte, do julgado.

Nada obstando a tal, cumpre apreciar e decidir.


***

Tendo em consideração que, de acordo com o disposto nos artºs 684º, nº 3 e 685º-A nº 1 do Cód. Proc. Civil[1], é pelas conclusões da alegação dos recorrentes que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, constata-se que à ponderação e decisão deste Tribunal foram colocadas as seguintes questões:

a) Alteração da decisão sobre a matéria de facto;

b) Se a circunstância de a sentença ter sido proferida por juiz diverso do que presidiu ao julgamento viola quaisquer princípios ou normas seja da Constituição, seja do Código de Processo Civil;

c) Quota-parte de AA. e RR. nas despesas com as partes comuns do prédio;

d) Obrigação dos RR. de pagamento da sua quota-parte das despesas de electricidade das partes comuns e do custo da reparação da porta do prédio;

d) Obrigação dos RR. relativamente aos danos ocorridos na fracção “A”;

e) Obrigação dos AA. de reporem o acesso à garagem dos RR., o muro de vedação do prédio e o portão que nele estava inserido e de retirarem o toldo que cobre parcialmente o logradouro.


***

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

2.1.1. Factualidade dada como assente pela 1ª instância

[…]


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2.1.2. Alteração da decisão sobre a matéria de facto

[…]


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2.2. De direito

2.2.1. Prolação da sentença por juiz que não interveio no julgamento

Baseando-se na circunstância de o juiz que proferiu a sentença recorrida (Dr. G ....) não ser o mesmo que realizou o julgamento (Dr. H ....), os AA. sustentam que tal consubstancia ou integra violação do princípio do efectivo contraditório, da garantia fundamental dos apelantes a um processo equitativo (artigo 20º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa) e do princípio da plenitude da assistência do juiz previsto no artigo 654º, nº 1 do Código de Processo Civil e que o indicado vício configura uma nulidade processual conducente à anulação de todo o processado após a resposta aos quesitos, com vista a ser a sentença proferida pelo Sr. Juiz H.....

Há que começar por esclarecer que, de acordo com as actas constantes do processo, para além duma diligência de produção antecipada de prova consistente na audição duma testemunha, cujo depoimento foi devidamente gravado, presidida pela Srª Juíza J...., o julgamento foi realizado pelo Sr. Juiz H.... (cfr. actas de fls. 193/194, 217/225, 249/254, 255/256 e 264).

O mesmo Sr. Juiz H.... proferiu, de acordo com a assinatura electrónica nele aposta, o despacho de fls. 257/263, o qual contém as respostas aos quesitos e respectiva motivação, integrando, pois, a decisão sobre a matéria de facto.

Contudo, a sentença, que faz fls. 265/292, é, de acordo com a assinatura electrónica que exibe, da autoria do Sr. Juiz G .....

Terão sido violados os princípios indicados pelos AA. e praticada a nulidade processual pelos mesmos referida?

A resposta só pode ser negativa.

Porque o juiz que preside à produção antecipada de prova pode não vir a ter intervenção no julgamento é que o artº 522º-A exige que os depoimentos das partes, testemunhas ou quaisquer outras pessoas prestados antecipadamente (ou por carta) sejam sempre gravados ou, sendo impossível a gravação, reduzidos a escrito. Fica assim assegurado que os mesmos estarão acessíveis ao juiz que profira a decisão sobre a matéria de facto, o qual lhes conferirá o valor probatório que tiver por adequado.

Nessa decisão só podem intervir, de acordo com o disposto no artº 654º, nº 1, os juízes que tenham assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final.

Trata-se, como a epígrafe do artigo evidencia, da consagração do princípio da plenitude da assistência dos juízes, o qual, no ensinamento do Prof. Lebre de Freitas[2], é um corolário dos princípios da oralidade e da livre apreciação da prova. Ou seja, para a formação da livre convicção do julgador, este terá de ser o mesmo ao longo de todos os actos de instrução e discussão da causa realizados em audiência.

Contudo, como alerta o mesmo Mestre[3], o princípio da plenitude da assistência dos juízes circunscreve-se no âmbito dos actos da audiência final, deixando de jogar relativamente à elaboração da sentença, a qual, no caso, designadamente, de transferência do juiz que haja presidido à audiência, cabe ao juiz que o substituir.

A decisão sobre a matéria de facto (artº 653º) insere-se na audiência de discussão e julgamento, sendo intuitivo que, vigorando o princípio da oralidade e nem sempre sendo os depoimentos gravados ou por outra forma registados, só podem intervir naquela decisão juízes que tenham assistido a todos os actos praticados na audiência em que a mesma possa assentar.

A sentença já não se insere na audiência de discussão e julgamento, constitui a fase processual seguinte, inexistindo qualquer obstáculo de ordem material ou formal a que possa ser proferida por juiz que não tenha intervindo no julgamento.

Com efeito, do ponto de vista substancial, um juiz que não tenha intervindo no julgamento tem à sua disposição, tal como se nele tivesse intervindo, todos os elementos necessários e suficientes para a prolação da sentença. A identificação das partes e do objecto do litígio, bem como a fixação das questões a solucionar (artº 659º, nº 1) colhem-se no processo, nomeadamente nos articulados das partes; a fundamentação de facto, com discriminação dos factos provados, assenta essencialmente na decisão sobre a matéria de facto, essa sim, proferida por quem interveio no julgamento, e/ou na admissão por acordo, em documentos ou em confissão reduzida a escrito, tudo material integrante dos autos (nºs 2 e 3); a fundamentação de direito encontra-se na lei e nos princípios jurídicos aplicáveis; e a decisão resultará da operação lógica de subsunção dos factos ao direito.

Do ponto de vista formal ou processual, a inexistência de obstáculos decorre de não haver qualquer norma legal que, à semelhança do que sucede com a decisão sobre a matéria de facto, exija que o autor da sentença tenha assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final.

É, portanto, absolutamente seguro que não foi, no caso, violado o princípio da plenitude da assistência dos juízes.

O princípio da equidade ou o direito a um processo equitativo integra-se na acepção ampla do direito à jurisdição e encontra consagração no artº 20º da Constituição, em cujo nº 4 se estatui que “todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo”.

Como ensina o Prof. Lebre de Freitas[4], trata-se da necessidade de observar um conjunto de regras fundamentais ao longo de todo o processo, nos vários planos em que este se desenvolve.

“No âmbito da jurisprudência formada na aplicação da Convenção Europeia dos Direitos do Homem tem sido entendido que o princípio da equidade postula, por um lado, a igualdade das partes (princípio do contraditório e princípio da igualdade de armas) e, por outro, os direitos à comparência pessoal das partes em certos casos ou circunstâncias, à licitude da prova (do meio de prova em si e do modo de o obter) e à fundamentação da decisão. Também o princípio da publicidade, como garantia da transparência do exercício da função jurisdicional, nos parece constituir emanação do princípio da equidade”[5].

Tendo os AA. alegado expressamente violação do princípio do contraditório, será tal alegação objecto de apreciação autónoma.

No que aos demais postulados do princípio da equidade respeita, afigura-se-nos notório e manifesto que a circunstância de o juiz autor da sentença não ter intervindo no julgamento em nada os belisca. Com efeito, a indicada ausência de intervenção não favorece nem desfavorece qualquer das partes, da mesma forma que não viola quaisquer direitos de comparência, à licitude da prova, à publicidade ou à fundamentação da decisão.

Os AA. defendem também que com a prolação da sentença por juiz que não interveio no julgamento foi violado o princípio do contraditório.

De acordo com o nº 3 do artº 3º do Cód. Proc. Civil, o juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.

O princípio do contraditório constitui, como atrás se viu, uma das vertentes do princípio da equidade e era tradicionalmente entendido como a imposição de que, formulado um pedido ou tomada uma posição por uma parte, devia à outra ser dada oportunidade de se pronunciar antes de qualquer decisão.

Consiste, pois, tal princípio na regra segundo a qual, sendo formulado um pedido ou oposto um argumento a certa pessoa, se deve dar a esta oportunidade de se pronunciar sobre o pedido ou argumento, não se decidindo antes de dar tal oportunidade.[6]

“A esta concepção, válida mas restritiva, substitui-se hoje uma noção mais lata de contraditoriedade, com origem na garantia constitucional do rechtliches Gehor germânico, entendida como garantia da participação efectiva das partes no desenvolvimento de todo o litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objecto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão. O escopo principal do princípio do contraditório deixou assim de ser a defesa, no sentido negativo de oposição ou resistência à actuação alheia, para passar a ser a influência, no sentido positivo de direito de incidir activamente no desenvolvimento e no êxito do processo”[7].

Como escreve também o mesmo autor[8], o nº 3 do artº 3º consagra o princípio do contraditório em geral e na vertente proibitiva da decisão-surpresa, isto é, da decisão baseada em fundamento que não tenha sido previamente considerado pelas partes.

“Esta vertente do princípio tem fundamentalmente aplicação às questões de conhecimento oficioso que as partes não tenham suscitado, pois as que estejam na disponibilidade exclusiva das partes, tal como as que sejam oficiosamente cognoscíveis mas na realidade tenham sido levantadas por uma das partes, são naturalmente objecto de discussão antes da decisão, sem que o facto de a parte que as não tenha levantado não ter exercido o direito de resposta (desde que este lhe tenha sido facultado) implique falta de contraditoriedade. Antes de decidir com base em questão (de direito material ou de direito processual) de conhecimento oficioso que as partes não tenham considerado, o juiz deve convidá-las a sobre ela se pronunciarem, seja qual for a fase do processo em que tal ocorra (despacho-saneador, sentença, instância de recurso)[9].

Assim desenhado, em traços largos, o princípio do contraditório, confessamos que não vislumbramos – e os AA. também não fazem luz sobre a questão – de que forma pode o mesmo resultar violado pelo facto de o juiz emissor da sentença não ter intervindo no julgamento.


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2.2.2. Quota-parte de AA. e RR. nas despesas com as partes comuns do prédio

         É seguro, face à factualidade provada, que relativamente ao prédio urbano, edifício de cave, rés-do-chão, 1º andar, sótão e logradouro sito ...., com área coberta de 130 m2 e descoberta de 118,5 m2, inscrito na matriz urbana respectiva sob o art.º .... e descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial da Figueira da Foz sob o n.º ...., se encontra constituída a propriedade horizontal e que os AA. e os RR. são os únicos condóminos, proprietários exclusivos, cada uns, das respectivas fracções e comproprietários das partes comuns (artº 1420º, nº 1 do Cód. Civil).

         É intuitivo que os encargos de conservação e fruição das fracções autónomas devem ser suportados pelos respectivos proprietários. Quanto aos das partes comuns, preceitua o artº 1424º do Cód. Civil:

         1. Salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções.

         2. Porém, as despesas relativas ao pagamento de serviços de interesse comum podem, mediante disposição do regulamento de condomínio, aprovada sem oposição por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio, ficar a cargo dos condóminos em partes iguais ou em proporção à respectiva fruição, desde que devidamente especificados os critérios que determinam a sua imputação.

         3. As despesas relativas aos diversos lanços de escadas ou às partes comuns do prédio que sirvam exclusivamente algum dos condóminos ficam a cargo dos que delas se servem.

         4. Nas despesas dos ascensores só participam os condóminos cujas fracções por eles possam ser servidas.

         No caso dos autos há que ter em consideração, por um lado, que nunca houve da parte dos AA. ou dos RR. qualquer diligência no sentido de elaborar ou mandar elaborar um regulamento de condomínio; por outro, que o falecido C... e mulher detinham a maioria das fracções do prédio, com uma permilagem de 645‰; e, finalmente, que por acordo entre AA. e RR. as despesas comuns de electricidade do prédio sempre foram calculadas na proporção de metade por cada proprietário.

         Atendendo à lei e à factualidade indicadas, há que concluir que, “in casu”, tem aplicação a regra geral, isto é, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do prédio e ao pagamento de serviços de interesse comum devem ser suportadas por AA. e RR. na proporção do valor das respectivas fracções.

         Com efeito, o acordo com base no qual as despesas comuns de electricidade do prédio sempre foram calculadas na proporção de metade por cada proprietário, para além de respeitar exclusivamente às despesas de electricidade, não reúne os requisitos exigidos pelo nº 2 do artº 1424º, nomeadamente, não se alicerça em qualquer disposição do (inexistente) regulamento de condomínio.

         A contribuição de AA. e RR. para  as mencionadas despesas comuns deve, portanto, ser proporcional ao valor das suas fracções, ou seja, 64,5% para os AA. e 35,5% para os RR.


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2.2.3. Obrigação dos RR. de pagamento da sua quota-parte das despesas de electricidade das partes comuns e do custo da reparação da porta do prédio

Abstractamente, não há dúvidas de que os RR. têm, face ao disposto no artº 1424º do Cód. Civil, a obrigação de pagamento da sua quota-parte – ou seja, 35,5% – de todas as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum.

O custo da reparação da porta do prédio integra-se nas despesas de conservação e fruição das partes comuns e as contas de electricidade das partes comuns nas despesas necessárias ao pagamento de serviços de interesse comum.

Portanto, abstractamente, os RR. têm obrigação de suportar a sua quota-parte em tais despesas.

Contudo, concretamente, os AA. pediam a condenação dos RR. a pagarem-lhes a quantia de € 179,46 referente à sua parte nas despesas da EDP das partes comuns e a quantia de € 78,50, referente à reparação da porta de entrada do prédio.

Ora, quanto às despesas de electricidade das partes comuns, os AA. não lograram provar que tenham suportado a indicada quantia da responsabilidade dos RR., pelo que não podiam estes ser condenados no respectivo pagamento; e quanto às despesas relativas à reparação da porta de entrada do prédio, tendo o total importado em € 157,00, a quota-parte da responsabilidade dos RR. é de apenas € 55,74 (€ 157,00 x 35,5%)[10].


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         2.2.4. Obrigação dos RR. relativamente aos danos ocorridos na fracção “A”

         Os AA. pediram também a condenação dos RR. a pagarem-lhes as quantias de € 4.892,39, referente ao arranjo do chão da loja – fracção “A” –, de € 50,00, relativa ao custo da vistoria pedida à Câmara Municipal da Figueira da Foz e de € 320,65 respeitante à pintura do tecto da dita loja.

         Sustentaram estes seus pedidos em alegada responsabilidade civil extra-contratual dos RR. que, por um lado, teriam descuidado a limpeza duma faixa de terreno de que são donos exclusivos, assim dando causa a que, de acordo com vistoria realizada pela Câmara Municipal da Figueira da Foz, cujo custo subiu a € 50,00, durante o inverno do ano de 2006 houvesse infiltrações de água na loja dos AA., provocando danos no respectivo chão, cuja reparação ascendeu a € 4.892,39; e, por outro, não evitaram que do quarto de banho da sua fracção houvesse infiltrações de humidade que provocaram no tecto da loja dos AA. danos cuja reparação montou a € 320,65.

         É sabido que são requisitos da responsabilidade civil extra-contratual o facto, a ilicitude, a culpa, o dano e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.  Ora, atendendo à factualidade assente, como muito bem se diz na sentença sob recurso, não lograram os autores demonstrar que os danos no chão da sua fracção por si invocados foram devidos a qualquer acção ou omissão dos réus, designadamente, não se provou que “em virtude de os réus jamais se preocuparem com a limpeza da faixa de terreno cedida pelo Município da Figueira da Foz (…) passou a haver infiltrações de água que, durante o Inverno do ano de 2006, inundaram o chão da garagem dos réus bem como o chão da loja dos autores arrendada à Imobiliária L...”.

         Ou seja, não ficou demonstrado que os danos sofridos pelo chão da loja dos AA. tenham sido causados por infiltrações de água provinda da faixa de terreno de que os RR. são donos exclusivos, nomeadamente devidas a falta de limpeza da mesma.

         Provou-se até – o relatório da vistoria realizada pela Câmara Municipal da Figueira da Foz abre essa hipótese – que as infiltrações de água no estabelecimento poderiam ter sido consequência da acumulação de águas das chuvas no pequeno logradouro contíguo ao estabelecimento, devido ao entupimento do ralo existente.

         Nestas circunstâncias não tem aplicação a inversão do ónus da prova decorrente do artº 493º, nº 1 do Cód. Civil, pois a mesma pressupõe que os danos tenham sido causados pela coisa móvel ou imóvel que o agente tinha o dever de vigiar.

         Concluímos, portanto, com a 1ª instância, que “no que respeita ao pedido de condenação dos réus no pagamento da quantia de € 4.892,39 pela reparação do chão da fracção “A” e de € 50,00 pela realização da vistoria da Câmara Municipal da Figueira da Foz, suportados pela autora A..., não se encontram preenchidos os requisitos da responsabilidade civil extracontratual, razão pela qual deve tal pedido improceder”.

         No tocante ao dano no tecto da loja dos AA. provou-se que a A. A... procedeu à reparação do tecto da mesma loja, que se encontrava com uma mancha de humidade proveniente do quarto de banho da fracção dos RR., no que despendeu a quantia de € 320,65.

         Neste caso está provado que a humidade que provocou a mancha no tecto e deu azo à necessidade de pintura do mesmo proveio do quarto de banho da fracção dos RR.

         Opera aqui a previsão do artº 493º, nº 1 referido, já que o dano em apreciação foi causado pela humidade provinda da casa de banho da fracção dos RR., a quem competia vigiar pelo seu bom estado de conservação, e estes não provaram que nenhuma culpa houve da sua parte ou que os danos se teriam igualmente produzido ainda que não houvesse culpa sua.

         É certo que da conjugação dos artºs 562º e 566º do Cód. Civil resulta que a nossa lei dá primazia à denominada reconstituição natural e acolhe a indemnização em dinheiro apenas como forma subsidiária de indemnização. Citando o Prof. Almeida Costa[11], “é no interesse de ambas as partes e como modo normal de indemnização que a restauração natural se encontra estabelecida”.

         No caso que nos ocupa os AA. pediram directamente a indemnização em dinheiro, uma vez que, como se encontra provado, a A. A... procedeu à reparação do tecto da loja, no que despendeu a quantia de € 320,65.

         Será aos RR. lícito, em tais circunstâncias, escusar-se à indemnização pecuniária a pretexto de preferirem indemnizar através da reconstituição natural?

         Parece-nos que não.

         É que, de acordo com o nº 2 do artº 762º do Cód. Civil, no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé. E não procede assim quem, sabendo que o tecto da loja que lhe competiria reparar já foi reparado pelos lesados, contrapõe ao pedido de indemnização pecuniária o direito de optar pela restauração natural.


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         2.2.5. Obrigação dos AA. de reporem o acesso à garagem dos RR., o muro de vedação do prédio e o portão que nele estava inserido e de retirarem o toldo que cobre parcialmente o logradouro

No seu articulado de defesa os RR., além do mais, deduziram reconvenção em que pediram a condenação dos AA. a colocarem uma manilha para escoamento das águas e a refazerem a rampa de acesso à sua garagem. E no articulado superveniente apresentado já na fase de julgamento ampliaram o pedido reconvencional pedindo a condenação dos AA. a reporem o muro de vedação do prédio, recolocando o portão que nele estava inserido e a retirarem ou mandarem retirar o toldo que cobre parcialmente o logradouro do imóvel, bem como a desocupá-lo imediatamente e ainda a indemnizarem-nos caso os seus inqui ....s venham a largar o locado.

Começando pelo pedido de condenação dos AA. a colocarem uma manilha para escoamento das águas e a refazerem a rampa de acesso à sua garagem, constata-se ter-se provado que a mando de A... o empreiteiro abriu uma vala junto à garagem dos RR., ficando inviabilizado o acesso de carro à mesma; que a R. mulher, quando tomou conhecimento da realização das obras, pediu ao empreiteiro responsável que não terminasse o trabalho, pois fazia questão de ser ela a escolher a grade que iria cobrir a vala; e que não foi colocada no local a referida grade.

Embora tal não conste expressamente da factualidade provada, sabe-se, pelo depoimento da testemunha F..., que a abertura da vala junto à garagem dos RR. visava impedir a entrada de água nessa garagem e na área de logradouro onde se situam os tanques de lavar roupa[12], estando prevista a colocação de uma grade sobre essa vala, restabelecendo o acesso de viaturas automóveis à garagem.

Não se pode olvidar também que aos AA. – e, portanto, à A... – competia, face à não constituição e funcionamento da assembleia de condóminos, o exercício da administração provisória do condomínio (artº 1435º-A do Cód. Civil), o que lhe conferia legitimidade para mandar executar a obra em discussão e fazer suportar aos condóminos a despesa correspondente.

A inviabilização do acesso de carro à garagem dos RR. era, pois, justificada, por um lado, e passageira, por outro, já que tal acesso seria retomado logo que sobre a vala fosse colocada a pertinente grade.

E, como se encontra provado, foi a R. mulher que pediu ao empreiteiro responsável que não terminasse o trabalho, pois fazia questão de ser ela a escolher a grade que iria cobrir a vala.

É claro, em tais circunstâncias, que não estão reunidos os requisitos da responsabilidade civil (nomeadamente a culpa) dos AA. relativamente ao alegado dano dos RR. traduzido na falta de acesso à sua garagem, faltando fundamento para a pretendida condenação.

No que tange ao pedido de condenação dos AA. a reporem o muro de vedação do prédio, recolocando o portão que nele estava inserido, provou-se que foi a inquilina da fracção que destruiu tal muro e retirou o portão nele existente, sem autorização dos AA.

Independentemente de saber se a alteração em causa estava ou não vedada aos condóminos (artº 1422º do Cód. Civil), o certo é que se provou que a mesma foi levada a efeito pela inquilina da fracção dos AA., sem autorização destes, pelo que não lhes pode a mesma ser imputada.

Com efeito, relativamente à destruição do muro e retirada do portão, não tendo tal sido autorizado pelos AA., a inquilina da fracção destes é um terceiro como qualquer outro, não se conhecendo fundamento para responsabilizar ou co-responsabilizar o senhorio pelas consequências da sua actuação.

Resta a questão do logradouro e do toldo nele colocado.

A tal respeito há que considerar a seguinte factualidade:

Os AA. são proprietários da fracção “A”, constituída por divisão na cave, com W.C., destinada a comércio, no lado poente com a área de 73,60 m2, e uso exclusivo do logradouro em frente, com a área de 42,00 m2 (nºs 2 e 3 do elenco dos factos provados e escritura de constituição da propriedade horizontal de fls. 13 a 17).

Tal zona de logradouro está a ser ocupada como estabelecimento comercial (nº 31 do elenco dos factos provados).

O telheiro é um toldo, de material removível, destinando-se a proteger a entrada da loja da chuva e do sol (nº 33 do elenco dos factos provados), é coberto por um toldo de lona (nº 29 dos elenco dos factos provados), o qual se encontra fixo ao chão por porcas e parafusos, tendo 6 (seis) “pernas” metálicas (nº 30 do elenco dos factos provados).

Discute-se, por um lado, se é ou não admissível que a zona do logradouro esteja a ser ocupada como estabelecimento comercial e, por outro, se os AA. podiam ou não colocar o telheiro ou toldo, com as características que o mesmo apresenta, sobre o logradouro.

Vejamos.

Não há dúvidas de que o logradouro em causa, apesar de ser parte comum, está afecto ao uso exclusivo da fracção “A”.

Relativamente a tal logradouro, o exercício de direitos por parte dos AA., enquanto proprietários da fracção “A”, tem de obedecer ao disposto no artº 1422º do Cód. Civil.

Estabelece essa norma:

1. Os condóminos, nas relações entre si, estão sujeitos, de um modo geral, quanto às fracções que exclusivamente lhes pertencem e quanto às partes comuns, às limitações impostas aos proprietários e aos comproprietários de coisas imóveis.

2. É especialmente vedado aos condóminos:

a) Prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício;

b) Destinar a sua fracção a usos ofensivos dos bons costumes;

c) Dar-lhe uso diverso do fim a que é destinada;

d) Praticar quaisquer actos ou actividades que tenham sido proibidos no título constitutivo ou, posteriormente, por deliberação da assembleia de condóminos aprovada sem oposição.

3. As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

4. Sempre que o título constitutivo não disponha sobre o fim de cada fracção autónoma. A alteração ao seu uso carece da autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio.

No caso que nos ocupa a fracção “A” era destinada, de acordo com o título constitutivo da propriedade horizontal, a comércio, não se vislumbrando impedimento a que ao logradouro afecto ao uso exclusivo da mesma fosse dado idêntico destino.

Com efeito, o termo logradouro tem habitualmente o significado de terreno contíguo a uma habitação, para serventia da mesma[13]. E são sinónimos de serventia, entre outros, préstimo, utilidade, uso, etc.[14].

Assim, servindo o logradouro para dar serventia à fracção “A”, para conferir préstimo ou utilidade a tal fracção, para ser usado pelos respectivos detentores, e destinando-se a fracção a comércio, não surpreende – nem viola quaisquer regras legais ou o título constitutivo – que o mesmo esteja a ser usado como prolongamento do estabelecimento comercial instalado na fracção.

         Quanto ao telheiro ou toldo, em lona, de material removível, destinado a proteger a entrada da loja da chuva e do sol, colocado no dito logradouro e fixado ao chão por porcas e parafusos, tendo seis “pernas” metálicas, a questão que se coloca é a de saber se pode ou não a implantação do mesmo ser considerada como obra de inovação.

         Com efeito, de acordo com o artº 1425º do Cód. Civil, as obras que constituam inovações dependem da aprovação da maioria dos condóminos, devendo essa maioria representar dois terços do valor total do prédio (nº 1), sendo que nas partes comuns não são permitidas inovações capazes de prejudicar a utilização, por parte de algum dos condóminos, tanto das coisas próprias como das comuns (nº 2).

         Em comentário ao preceito legal referido lê-se no Código Civil Anotado de Pires de lima – Antunes Varela[15]:

         “No conceito de inovação que corresponde ao pensamento da nossa disposição legal cabem tanto as alterações introduzidas na substância ou na forma da coisa (cfr.,especialmente, nº 1), como as modificações estabelecidas na afectação ou destino da coisa (cfr., especialmente, o nº 2).

         Tanto constitui inovação a construção de uma nova garagem ou a demolição dum terraço, como a instalação de um pára-raios, de um sistema de ar condicionado, de um ascensor, de uma piscina, ou a afectação de um pátio a lugar de acesso ao cinema instalado numa das fracções autónomas do prédio.”

Ora, se bem vemos, a colocação no logradouro afecto ao uso da fracção “A” do telheiro ou toldo com as características acima descritas constitui verdadeira inovação para efeitos da previsão do nº 1 do artº 1425º do Cód. Civil, a tal não obstando a circunstância de o mesmo ser constituído por material removível.

E, decorrendo dos autos que aquela inovação não foi aprovada por uma maioria dos condóminos representativa de dois terços do valor total do prédio, não poderá a mesma manter-se, devendo o toldo ou telheiro em causa ser removido e o logradouro reposto no estado anterior.

         Cumprindo o disposto no artº 713º, nº 7, elabora-se o seguinte sumário:

         I – O princípio da plenitude da assistência dos Juízes, consagrado no artigo 654º do Cód. Proc. Civil, respeita apenas à decisão sobre a matéria de facto, não se estendendo à prolação da sentença.

         II – A prolação da sentença por juiz que não interveio na audiência de discussão e julgamento não viola quaisquer normas ou princípios constitucionais ou legais, nomeadamente o princípio da equidade, a que se refere o artigo 20º, nº 4 da Constituição, ou o princípio do contraditório, vertente daquele (artigo 3º, nº 3 do Cód. Proc. Civil).

         III – Em matéria de responsabilidade pelos encargos de conservação e fruição das partes comuns do edifício e pelo pagamento de serviços de interesse comum a regra é, de acordo com o artigo 1424º do Cód. Civil, cada condómino pagar em proporção do valor da(s) sua(s) fracção(ões).

         IV – Não procede de boa fé, assim contrariando o disposto no artigo 762º, nº 2 do Cód. Civil, quem, sabendo que o tecto da loja danificado por humidade proveniente da sua fracção foi reparado pelos lesados, contrapõe ao pedido de indemnização pecuniária o direito de optar pela restauração natural.

         V – Sendo a fracção autónoma, de acordo com título constitutivo da propriedade horizontal, destinada a comércio, a utilização na mesma actividade do logradouro afecto ao seu uso exclusivo não viola quaisquer regras legais ou o dito título.

         VI – A colocação no logradouro comum afecto ao uso exclusivo de uma fracção autónoma de um telheiro ou toldo em lona, com seis “pernas” metálicas, fixado ao chão por porcas e parafusos, destinado a proteger da chuva e do sol, constitui verdadeira inovação para efeitos da previsão do nº 1 do artigo 1425º do Cód. Civil, a tal não obstando a circunstância de o mesmo ser constituído por material removível.


***

         3. DECISÃO

         Face ao exposto acorda-se em:

         a) Julgar improcedente a apelação principal, em que são recorrentes os AA.;

         b) Julgar parcialmente procedente a apelação subordinada, em que são recorrentes os RR.;

         c) Mantendo-a em tudo o mais, revogar a sentença recorrida na parte em que julgou totalmente improcedente a reconvenção e, consequentemente, julgando-a agora parcialmente procedente, condenar os AA. a retirar ou mandar retirar o toldo que cobre parcialmente o logradouro situado em frente á fracção “A”.

As custas da apelação principal são a cargo dos respectivos recorrentes e as da apelação subordinada são a cargo de RR. e AA., na proporção do decaimento, que fixo em ¾ para aqueles e ¼ para estes.


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Artur Dias (Relator)
Jaime Ferreira
Jorge Arcanjo


[1] Diploma a que pertencem todas as disposições legais adiante citadas sem menção da origem.
[2] Código de Processo Civil Anotado, Volume 2º, Coimbra Editora, 2001, pág. 633.
[3] Obra e volume citados, pág. 634.
[4] Introdução ao Processo Civil , Conceito e princípios Gerais à Luz do Código Revisto, Coimbra Editora, 1996, pág. 95.
[5] Idem, ibidem.
[6]   Prof. Castro Mendes, Direito Processual Civil, Apontamentos das Lições dadas ao 4º ano de 1973-1974, I vol. pág. 145.
[7]  José Lebre de Freitas, Introdução ao Processo Civil, Conceito e Princípios Gerais à Luz do Código Revisto, pág. 96.
[8] Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, pág. 7.
[9] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, pág. 9.
[10] Como foi explicado na sentença recorrida, ao falecido pai dos AA., primeiro, e a estes, depois, na qualidade de titulares de fracções com o valor de 64,5%, competia o exercício da administração provisória do condomínio (artº 1435º-A do Cód. Civil), uma vez que nunca reuniu a assembleia de condóminos nem foi eleito administrador. A ordem de reparação da porta de entrada do edifício e o pagamento da correspondente despesa inseriam-se, pois, no exercício dessa administração provisória, carecendo de fundamento que os RR. que, tal como os AA., nunca providenciaram pela constituição e funcionamento da assembleia de condóminos, pretendam assentar a recusa de pagamento da sua quota-parte na falta de aprovação da despesa pela dita assembleia.
[11] Direito das Obrigações, 3ª edição, pág. 526.
[12] De onde, segundo se provou, poderiam ser provenientes as infiltrações de água no estabelecimento instalado na loja dos AA.
[13] Dicionário da Língua Portuguesa, 5ª edição, Porto Editora, pág. 880.
[14] Obra citada, pág. 1305.
[15] Volume III, 2ª edição, pág. 434.