Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
29/09.3GAAVZ-A.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: OLGA MAURÍCIO
Descritores: REVOGAÇÃO DA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA
Data do Acordão: 03/28/2012
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: TRIBUNAL JUDICIAL DE ALVAIÁZERE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: ALTERADA
Legislação Nacional: ARTIGOS 55º E 56º Nº 1 B) CP
Sumário: 1. - A condenação pela prática de um crime cometido no decurso do período de suspensão da execução de uma pena de prisão, não determina automaticamente a revogação da suspensão;

2.- Esta repetição só determinará a revogação da suspensão quando dela resulte que as finalidades que presidiram à suspensão se tornaram inalcançáveis;

3.- Se na última condenação foi de novo feito um juízo de prognose favorável e, por via disso, voltou a suspender-se a execução pena de prisão, é contraindicado proceder-se à revogação daquela suspensão.

Decisão Texto Integral: RELATÓRIO

1.
Por sentença de 26-2-2009 foi o arguido A... condenado pela prática, em 29-1-2009, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, na condição de se inscrever, durante o período da suspensão, em escola de condução com vista a obter a carta de condução, frequentando as respetivas aulas e submetendo-se aos exames necessários.

Por sentença de 9-12-2009, proferida no processo nº 221/09.0GAAVZ, o arguido foi condenado na pena de 10 meses de prisão pela prática de um crime de condução sem habilitação legal.
A execução da pena foi suspensa por 1 ano, com a condição de o arguido frequentar as aulas de código e condução assiduamente e de se submeter aos exames necessários.

2.
Conhecida que foi esta segunda condenação, e por haver a possibilidade de revogação da suspensão da execução da pena, procedeu-se à audição do arguido e foi solicitada a realização de inquérito social.

Junto o relatório social, o Ministério Público pronunciou-se pela revogação da suspensão da execução da pena aplicada nos autos.

Por despacho de 12-9-2011 foi proferida decisão revogando a suspensão da execução da pena aplicada nos autos.

3.
Inconformado, o arguido recorreu, retirando da motivação as seguintes conclusões:
«1 - Houve violação do princípio do contraditório por falta de notificação do relatório da DGRS junto aos autos e do Parecer do Ministério Público;
2 - Consequentemente, é nulo todo o processado posterior, inclusive a decisão de que se recorre.
Para além do que, e por mera cautela;
3 - O arguido está arrependido e pretende continuar o plano de reinserção social,
4 - Encontra-se inscrito na Escola de Condução, a frequentar as aulas teóricas, prevendo-se que faça exame no prazo de quinze dias.
5 - Ainda não conseguiu a obtenção da licença de condução por falta de meios económicos;
6 - A condição imposta mostra-se demasiado onerosa para o arguido atentas as dificuldades em que vive;
7 - Não se verifica nos autos a situação de violação grosseira dos deveres e regras de conduta impostas;
8 - Já decorreram cerca de dois anos sobre a prática dos crimes e não há notícia da prática de outros;
9 - Não poderá deixar de entender-se que o comportamento do arguido e as condições pessoais e actuais da vida do mesmo, impõem a manutenção da suspensão da pena, a sua prorrogação, sujeição a regime de prova ou, em última instância o cumprimento da pena em regime de semi-detenção;
10 - Assim, o douto despacho violou, além do mais, os seguintes dispositivos: artigos 55º e 57º do C. Penal, 77º, 78º, 495º, 111º, 113º do C.P.P.».

3.
O recurso foi admitido.

O Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu defendendo a manutenção do decidido, por o juízo de prognose favorável, formulado aquando da suspensão da execução da pena, estar irremediavelmente comprometido. Sobre a alegada nulidade, diz que a mesma não se verifica, pois que a lei não impõe nem a notificação do relatório social, nem da promoção do Ministério Público.

O Exmº P.G.A. junto desta relação defendeu o indeferimento da invocação da nulidade, por a lei não impor a notificação pretendida pelo arguido. Quanto à revogação da suspensão da execução da pena, entende que esta deve ser excluída se a nova condenação renovou o juízo de prognose favorável e aplicou ou pena de multa ou pena de substituição. Por isso entende que deve ser adotada uma solução menos drástica do que a revogação, como por exemplo uma qualquer das medidas do art. 55º do Código Penal.

4.
Proferido despacho preliminar foram colhidos os vistos legais.
Cumpre decidir.
*

FACTOS PROVADOS

6.
Dos autos resultam os seguintes factos, relevantes à decisão:
- por sentença de 26-2-2009 foi o arguido A... condenado pela prática, em 29-1-2009, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, na condição de «se inscrever, durante o período da suspensão, em escola de condução com vista a obter a carta de condução, frequentando as respetivas aulas assiduamente e submetendo-se aos exames necessários»;
- em 26-5-2009 o arguido juntou aos autos declaração comprovativa de estar inscrito na escola de condução …;
- no processo 221/09.0GAAVZ o arguido foi condenado, por sentença proferida em 9-12-2009 e transitada em 21-1-2010, na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, com a condição de «frequentar as aulas de código e de condução assiduamente e submetendo-se aos exames necessários»;
- a fls. 26 consta uma informação, oriunda da escola de condução “ …, Ldª”, e datada de 14-10-2010, da qual consta que no período entre 18-3-2009 e 18-3-2010 o arguido deslocou-se à escola de condução uma vez;
- o arguido e o seu defensor foram notificados para se pronunciarem sobre o incumprimento dos deveres que condicionaram a suspensão da pena aplicada neste processo e nada disseram;
- em 27-4-2011 foi proferido despacho solicitando a realização de inquérito social ao arguido, com vista à revogação da suspensão da execução da pena, e designando dia para inquirição do arguido sobre o facto de ter incumprido a condição que determinou a suspensão da execução da pena e de ter sofrido nova condenação durante o período de suspensão e solicitando;
- ouvido nos autos, o arguido disse que ainda não obteve a carta de condução por falta dos meios económicos necessários;
- do relatório social sobre o arguido, elaborado em 20-6-2011, consta, em síntese, que ele:
. vive com a mãe, com o padrasto e com a imã mais nova e contribui com cerca de 250 € para
as despesas da casa;
. trabalha junto do padrasto, na construção civil, auferindo rendimento pouco superior ao
salário mínimo;
. o relacionamento familiar é descrito como harmonioso e o arguido é bem referenciado a
nível familiar e comunitário;
. segundo ele nunca obteve a carta de condução por falta de possibilidades
económicas, mas segundo a família está a diligenciar no sentido de a tentar obter;
. no meio social não é alvo de quaisquer referências negativas, sendo descrito como um
indivíduo educado, prestável e socialmente bem integrado;
. o relatório conclui do seguinte modo: «o percurso de vida de A.... decorreu sem
problemas dignos de realce, tendo-se desenvolvido num ambiente normativo e de relações
afectivas próximas. Iniciou cedo o seu percurso laboral e manteve sempre, a este nível, uma
actividade regular, ainda que condicionada pelos circunstancialismos inerentes ao
desenvolvimento da própria actividade, nomeadamente os referentes à falta de trabalho.
Bem inserido do ponto de vista familiar e social, os factores de risco parecem-nos
associados à ausência de habilitação legal, aspecto que não tem devidamente valorizado».
- tendo vista dos autos o Ministério Público pronunciou-se pela revogação da suspensão da execução da pena;
- em 12-9-2011 foi proferido o despacho recorrido, revogando a suspensão da execução da pena, do seguinte teor:
«A... foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, por sentença transitada em julgada em 18 de Março de 2009, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, com a condição de o arguido se inscrever, durante o período da suspensão, em escola de condução com vista a obter a carta de condução, frequentando as respectivas aulas assiduamente e submetendo-se aos exames necessários.
Durante o período da suspensão, o arguido praticou um outro crime de condução sem habilitação legal, pelo qual foi condenado, no âmbito do processo n.º 221/09.0GAAVZ, deste tribunal, por sentença transitada em julgado em 21 de Janeiro de 2010, na pena de 10 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, condicionada à obrigação de o arguido frequentar as aulas de código assiduamente, submetendo-se aos exames necessários, reportando-se os factos a 16 de Novembro de 2009 (fls. 72).
A Exma Magistrada do Ministério Público pronunciou-se no sentido da revogação da suspensão e consequente cumprimento de pena de prisão (fls. 120 a 122).
A DGRS elaborou relatório social, no qual concluiu que o arguido ainda não valorizou devidamente os factores de risco associados à ausência de habilitação legal (fls. 116 a 119).
Cumpre decidir.
Conforme acima referido, A... foi condenado pela prática de um crime de condução sem habilitação legal, por sentença transitada em julgada em 18 de Março de 2009, na pena de 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano, com a condição de o arguido se inscrever, durante o período da suspensão, em escola de condução com vista a obter a carta de condução, frequentando as respectivas aulas assiduamente e submetendo-se aos exames necessários.
O artigo 56º, nº 1, als. a) e b), do Código Penal prescreve que “a suspensão da execução da pena de prisão é revogada sempre que, no seu decurso, o condenado infringir grosseira ou repetidamente os deveres ou regras de conduta impostos ou o plano de reinserção social ou cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas”.
Ora, de acordo com o que ficou exposto, durante o período da suspensão, o arguido praticou mais um crime de condução sem habilitação legal, o que revela que as finalidades que presidiram à suspensão não podem ser alcançadas através deste instituto. Vejamos.
Tanto nestes autos como no processo nº 221/09.0GAAVZ, deste tribunal, o arguido foi condenado pela prática do mesmo crime: condução de veículo sem habilitação legal, sendo que, com o processo nº 221/09.0GAAVZ, o arguido já conta com quatro condenações pela prática do mesmo crime.
Por outro lado, a proximidade temporal entre a condenação nestes autos, com a solene advertência que lhe está associada e bem assim com a tomada de consciência interior que se espera que todos os condenados apresentem, e a prática dos factos naquele processo também é indiciadora da tal ineficácia preventiva da suspensão da execução da pena de prisão, posto que a leitura da sentença deste processo teve lugar no dia 26 de Fevereiro de 2009 e o arguido praticou os factos naquele outro processo no dia 16 de Novembro de 2009
Face ao exposto, por força do concreto crime que o condenado praticou durante o período da suspensão, entendo que as finalidades que estiveram na base da suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido não foram alcançadas, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 56º, nos 1, al. b), e 2, do Código Penal revogo a suspensão da pena de prisão aplicada nos autos e, em consequência, determino que A... cumpra a pena de 6 (seis) meses de prisão em que foi condenado.
Notifique, sendo ao arguido pessoalmente …».
*
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DECISÃO

Como sabemos, o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente (art. 412º, nº 1, in fine, do C.P.P., Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, 2ª ed., III, 335 e jurisprudência uniforme do S.T.J. - cfr. acórdão do S.T.J. de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, pág. 196 e jurisprudência ali citada e Simas Santos / Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 5ª ed., pág. 74 e decisões ali referenciadas), sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios enumerados no art. 410º, nº 2, do mesmo Código.

Por via dessa delimitação resulta que as questões a decidir no presente recurso respeitam à nulidade derivada da falta de notificação do relatório social e da promoção do Ministério Público e à manutenção, ou não, da suspensão da execução da pena de prisão aplicada.
*

Nos termos do art. 119º do C.P.P. «constituem nulidades insanáveis, que devem ser oficiosamente declaradas em qualquer fase do procedimento, além das que como tal forem cominadas em outras disposições legais:
a) A falta do número de juízes ou de jurados que devam constituir o tribunal, ou a violação das regras legais relativas ao modo de determinar a respectiva composição;
b) A falta de promoção do processo pelo Ministério Público, nos termos do artigo 48.º, bem como a sua ausência a actos relativamente aos quais a lei exigir a respectiva comparência;
c) A ausência do arguido ou do seu defensor, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência;
d) A falta de inquérito ou de instrução, nos casos em que a lei determinar a sua obrigatoriedade;
e) A violação das regras de competência do tribunal, sem prejuízo do disposto no artigo 32.º, n.º 2;
f) O emprego de forma de processo especial fora dos casos previstos na lei».
Assim, temos que a omissão das notificações acima referidas não integra o elenco das nulidades insanáveis: não está aqui prevista e não há norma que a preveja.

Para além das nulidades insanáveis temos, ainda, as nulidades dependentes de arguição. Nos termos do nº 2 do art. 120 do C.P.P., integram o elenco destas nulidades, para além das que forem cominadas noutras disposições legais:
«a) O emprego de uma forma de processo quando a lei determinar a utilização de outra, sem prejuízo do disposto na alínea f) do artigo anterior;
b) A ausência, por falta de notificação, do assistente e das partes civis, nos casos em que a lei exigir a respectiva comparência;
c) A falta de nomeação de intérprete, nos casos em que a lei a considerar obrigatória;
d) A insuficiência do inquérito ou da instrução e a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade».
Aquela omissão também não está prevista nesta norma, nem em qualquer outra como nulidade dependente de arguição.

Portanto, a falta de notificação do relatório social e do parecer do Ministério Público não constitui nulidade.

A haver algum vício, ele consubstanciaria uma irregularidade, sujeita ao regime geral previsto no art. 123º do C.P.P., e que teria ficado sanada pela não arguição atempada.
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Quanto ao mais, dispõe o art. 50º do Código Penal, que trata dos pressupostos e duração da suspensão da execução da pena de prisão:
«1 - O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
2 - O tribunal, se o julgar conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, subordina a suspensão da execução da pena de prisão, nos termos dos artigos seguintes, ao cumprimento de deveres ou à observância de regras de conduta, ou determina que a suspensão seja acompanhada de regime de prova.
3 - Os deveres e as regras de conduta podem ser impostos cumulativamente.
4 - A decisão condenatória especifica sempre os fundamentos da suspensão e das suas condições.
5 - O período de suspensão tem duração igual à da pena de prisão determinada na sentença, mas nunca inferior a um ano, a contar do trânsito em julgado da decisão».
A suspensão da execução da pena, que pode ser simples ou condicionada, depende, pois, da verificação de dois requisitos: primeiro, que a pena de prisão aplicada não seja superior a 5 anos; depois, que o juiz conclua que a simples censura do facto e a ameaça da pena realizarão de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. É a chamada prognose favorável do comportamento futuro do arguido, que o tribunal retirará da personalidade manifestada e das circunstâncias do facto submetido a julgamento.
Simetricamente, como causas de revogação da suspensão temos, por um lado, a violação das condições impostas e, por outro, o cometimento de um crime durante o período de suspensão que revele que as finalidades subjacentes à suspensão não puderam, por essa via, ser alcançadas – art. 56º, nº 1, do Código Penal.

Vendo, de novo, a decisão recorrida, diz ela: «… durante o período da suspensão, o arguido praticou mais um crime de condução sem habilitação legal, o que revela que as finalidades que presidiram à suspensão não podem ser alcançadas através deste instituto. Vejamos.
Tanto nestes autos como no processo nº 221/09.0GAAVZ, deste tribunal, o arguido foi condenado pela prática do mesmo crime: condução de veículo sem habilitação legal, sendo que, com o processo nº 221/09.0GAAVZ, o arguido já conta com quatro condenações pela prática do mesmo crime.
Por outro lado, a proximidade temporal entre a condenação nestes autos, com a solene advertência que lhe está associada e bem assim com a tomada de consciência interior que se espera que todos os condenados apresentem, e a prática dos factos naquele processo também é indiciadora da tal ineficácia preventiva da suspensão da execução da pena de prisão, posto que a leitura da sentença deste processo teve lugar no dia 26 de Fevereiro de 2009 e o arguido praticou os factos naquele outro processo no dia 16 de Novembro de 2009
Face ao exposto, por força do concreto crime que o condenado praticou durante o período da suspensão, entendo que as finalidades que estiveram na base da suspensão da pena de prisão aplicada ao arguido não foram alcançadas, pelo que, ao abrigo do disposto no artigo 56º, nos 1, al. b), e 2, do Código Penal revogo a suspensão da pena de prisão aplicada nos autos e, em consequência, determino que A... cumpra a pena de 6 (seis) meses de prisão em que foi condenado».
Independentemente do cumprimento, pelo arguido, da condição a que a suspensão da execução da pena ficou subordinada, a verdade é que a decisão recorrida assentou no facto de ele ter voltado a delinquir no período da suspensão e, ainda, na circunstância de já ter sofrido quatro condenações pela prática do mesmo crime.

Efetivamente, e conforme resulta dos autos, para além das condenações sofridas neste processo e no processo nº 221/09.0GAAVZ, o arguido foi condenado em penas de multa em 11-8-2005 e 12-4-2006 pela prática de crimes de condução sem habilitação.
Mas a verdade é que estas condenações, de 2005 e 2006, não obstaram a que, em 2009, se tivesse decidido, de novo, pela suspensão da execução da pena aplicada.
Não é curial, pois, que estas condenação relevem, agora, para a decisão de revogar essa suspensão.

Resta, então, a condenação sofrida no processo nº 221/09.0GAAVZ, relativa a um crime de condução sem habilitação ocorrido em 16-11-2009.
No que a esta circunstância respeita diz a lei, no art. 56º, nº 1, al. b), do Código Penal que a suspensão da execução da pena é revogada sempre que o condenado «cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades que estavam na base da suspensão não puderam, por meio dela, ser alcançadas».
«Entre as condições da suspensão de execução da prisão avulta … a de o condenado não cometer qualquer crime durante o período de suspensão: se a finalidade precípua desta pena … é … a de afastar o delinquente da criminalidade … então o cometimento de um crime durante o período de suspensão é a circunstância que mais claramente pode pôr em causa o prognóstico favorável que a aplicação da pena de suspensão sempre supõe» Figueiredo Dias, in Direito Penal Português-As consequências jurídicas do Crime, 2005, pág. 355..
Não obstante, da letra da lei resulta que a revogação da suspensão da execução da pena nunca é uma consequência automática do incumprimento, nomeadamente da repetição do comportamento delitivo. Esta repetição só determinará a revogação da suspensão quando dela resulte que as finalidades que presidiram à suspensão se tornaram inalcançáveis.

Tendo o arguido, é certo, cometido novo crime durante o período de suspensão da execução da pena aplicada neste processo, entendemos que nas circunstâncias concretas esta situação não demonstra que as finalidades que presidiram à suspensão estão irremediavelmente afastadas.
É que o arguido, na nova condenação, voltou a ser condenado em pena de prisão cuja execução foi suspensa. Ou seja, apesar de o crime aqui sancionado e a respetiva condenação terem ocorrido durante o período de suspensão daquela outra pena, nem por isso o julgador daquele processo afastou a suspensão. Ao invés, fez novo juízo de prognose favorável e, por via disso, voltou a suspender a execução desta nova pena de prisão.
Não é, pois, lógico vir, agora e com base num crime cometido durante o período de suspensão que foi sancionado com pena de prisão suspensa, revogar uma suspensão prévia Vide, neste sentido, os acórdãos da Relação do Porto, de 2-12-2009, proferido no processo 425/06.8PTPRT.P1, e da Relação de Coimbra de 11-5-2011, proferido no processo 183/07.9GTCBR.C1..
Por isso mesmo, e citando o Sr. P.G.A., entendemos ser “contraindicada” a revogação.

Mas para além disso, relembrando o que consta do relatório social, temos que o arguido continua a ser bem referenciado pela comunidade, está socialmente bem integrado. Assim, o facto de nele se dizer que o arguido não tem valorizado devidamente a ausência de habilitação legal para conduzir não demonstra que as finalidades da suspensão da execução da pena está definitivamente comprometidas.

Aqui chegado concluímos, pois, pela revogação da decisão recorrida.
Mas há que encontrar uma alternativa e parece-nos que a alternativa mais adequada será a de prorrogar o período de suspensão por mais um ano e sujeito à condição inicialmente imposta quer neste nosso processo, quer na condenação posterior, sofrida no processo 221/09.0GAAVZ.
Ou seja, o arguido terá que demonstrar que, para além de estar inscrito em escola de condução, está ativamente empenhado em conseguir obter licença de condução, tudo conforme o disposto no art. 55º, al. d), do Código Penal. Terá, pois, que demonstrar que frequenta as aulas assiduamente visando a submissão aos exames subsequentes (caso cumpra, naturalmente, os respetivos requisitos).
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DISPOSITIVO

Pelos fundamentos expostos, e na procedência parcial do recurso, revoga-se a decisão recorrida e prorroga-se o período de suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido A... por mais um ano, devendo ele, no período de suspensão, demonstrar que, para além de estar inscrito em escola de condução, frequenta as aulas assiduamente.

Sem tributação.


Olga Maurício (Relatora)
Luís Teixeira