Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
230/10.7GAACB.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: MARIA JOSÉ NOGUEIRA
Descritores: CONCURSO DE CRIMES
CONHECIMENTO SUPERVENIENTE
CÚMULO JURÍDICO
PENA UNITÁRIA
Data do Acordão: 12/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: ALCOBAÇA (1.º JUÍZO)
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO CRIMINAL
Decisão: CONFIRMADA, PARCIALMENTE
Legislação Nacional: ARTIGOS 77.º E 78.º DO CP
Sumário: I - Em caso de concurso superveniente de crimes, a operação tendente a encontrar a pena conjunta, na qual se incluam penas parcelares que, por seu turno, já anteriormente hajam dado origem a uma pena de igual natureza, apenas se tem de ater às ditas penas parcelares, desconsiderando, por isso, as eventuais penas conjuntas antes fixadas.

II - Consequentemente, a medida da pena única anteriormente determinada não pode condicionar os limites da moldura a atender para a fixação da nova pena conjunta, a qual, naturalmente, no seio dos parâmetros ditados pela lei quanto ao respectivo limite mínimo e máximo do concurso [sempre ditado pelas penas parcelares], há-de ser encontrada atendendo, em conjunto, aos factos e à personalidade do agente.

III - Assim, a pena do anterior cúmulo não pode ter qualquer efeito limitativo da fixação de uma pena conjunta nova inferior àquela.

Decisão Texto Integral:
Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra

I. Relatório

1. No âmbito do P.C.C. n.º 230/10.7GAACB, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, por acórdão de 23.06.2014 deliberou o Colectivo [transcrição parcial]:

«Nos termos e com os fundamentos expostos, relativamente ao arguido A..., acordam os Juízes que compõem o Tribunal Colectivo:

a) Condenar o arguido em cúmulo jurídico das penas parcelares em que foi condenado nos processos judiciais identificados sob os pontos 2, 3, 4, 6 e 12 dos factos provados, nas penas únicas de 2 (dois) anos de prisão e de 260 (duzentos e sessenta) dias de multa à taxa diária de € 5,00 (cinco euros), no total de € 1.300,00 (mil e trezentos) euros.

b) Julgar prescrita, pelo decurso do prazo prescricional, a coima aplicada ao arguido no âmbito do processo identificado sob o ponto 6 dos factos provados, com o n.º 157/10.2PAACB.

c) Condenar o arguido, em cúmulo das penas parcelares em que foi condenado nos processos judiciais identificados sob os pontos 1, 5, 7, 9 (em relação apenas a um crime) e 10 dos factos provados, na pena única de 2 anos e 6 meses (dois anos e seis meses) de prisão, a que acresce a pena acessória de proibição de conduzir pelo período de 4 (quatro) meses.

d) Condenar o arguido, em cúmulo jurídico das penas parcelares em que foi condenado nos processos judiciais identificados sob os pontos 8, 9 (em relação apenas a um crime) e 13 dos factos provados, na pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão.

e) As penas únicas de prisão devem ser cumpridas sucessivamente pelo arguido, a que acrescerá a pena de prisão aplicada ao arguido no processo n.º 335/11.7GBPMS não englobada em qualquer dos referidos cúmulos jurídicos.

f) Para efeitos de desconto, dever-se-á ter em consideração o tempo de prisão já cumprido pelo arguido relativamente a cada uma das penas parcelares aplicadas nos processos judiciais englobados nos cúmulos jurídicos realizados, bem assim os dias de detenção/prisão que tenha sofrido no âmbito dos processos judiciais cujas penas forma englobadas nos cúmulos jurídicos efectuados e, relativamente à pena única de multa, o pagamento efectuado pelo arguido no processo identificado sob o ponto 4) dos factos provados.

g) Após trânsito em julgado do presente Acórdão:

- Remeta certidão aos processos judiciais identificados sob os pontos 2 a 13 dos factos provados;

- Remeta certidão ao Tribunal de Execução de Penas;

- Remeta boletim ao registo criminal;

- Solicite ao processo identificado sob o ponto 11) dos factos provados que sejam emitidos mandados de desligamento/ligamento do arguido aos presentes autos de modo a que este cumpra as penas que lhe foram aplicadas no âmbito destes autos;

- Abra vista ao Ministério Público tendo em vista a liquidação das penas do arguido.

(…)».

2. Do acórdão recorreu o Digno Procurador da República, extraindo da respectiva motivação as seguintes conclusões:

1 – O arguido A... foi condenado (no âmbito de três cúmulos jurídicos efectuados), em três penas conjuntas, a cumprir sucessivamente, de 2 anos de prisão e 260 dias de multa; 2 anos e 6 meses de prisão, a que acresce a pena acessória de proibição de conduzir por 4 meses; 2 anos e 2 meses de prisão.

2 – Resulta do ponto identificado como 13 dos factos provados, nomeadamente, que a pena conjunta de 2 anos e 3 meses de prisão que lhe foi aplicada no âmbito do processo n.º 247/11.4GAACB, cujas penas parcelares foram englobadas no terceiro cúmulo jurídico, não se mostra cumprida ou extinta.

3 – Porém, o arguido cumpriu, e integralmente, a pena que, em cúmulo jurídico, lhe foi aplicada no âmbito do citado processo.

4 – O arguido esteve preso entre 13/10/2011 e 12/1/2014 à ordem de tal processo.

5 – Os elementos documentais necessários a tal conclusão fáctica constavam dos presentes autos antes da audiência de julgamento.

6 – Assim, o segmento do ponto 13 da matéria de facto em apreço deverá passar a ter a seguinte redacção: “A pena aplicada ao arguido foi integralmente cumprida entre 13/10/2011 e 12/1/2014”.

7 – No terceiro cúmulo jurídico foram englobadas as penas de 9 meses de prisão, 10 meses de prisão, 1 ano e 9 meses de prisão e 1 ano de prisão (as duas últimas aplicadas no âmbito de um só processo, o 247/11.4GAACB).

8 – Nestes autos, o tribunal aplicou ao arguido, no âmbito de tal cúmulo jurídico, a pena conjunta de 2 anos e 2 meses de prisão.

9 – As penas referidas em 7 respeitam a três crimes de condução sem habilitação legal e um crime de furto simples.

10 – No âmbito do processo 247/11.4GAACB, o arguido foi condenado, em cúmulo jurídico, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão.

11 – Nestes autos, o terceiro cúmulo jurídico, em que o tribunal teve de considerar mais duas penas (num total) de 19 meses de prisão) que as consideradas no processo 247/11.4GAACB, o tribunal aplicou ao arguido uma pena conjunta inferior à que, em cúmulo também, havia sido aplicada ao arguido, “apenas” no âmbito do citado processo.

12 – Na fundamentação da sua convicção, o tribunal evidenciou que “ … os actos em apreço [nomeadamente de âmbito estradal] revelam também uma carreira criminosa constante mostrando-se o arguido incapaz de pautar a sua conduta segundo a norma, como acima referimos”.

13 – Ao aplicar ao arguido, no terceiro cúmulo jurídico, a pena de 2 anos e 2 meses de prisão, apesar das considerações transcritas, o tribunal premiou o arguido com uma “diminuição” da pena conjunta anterior.

14 – Só circunstâncias excecionais, não ocorridas e não referidas pelo tribunal, poderiam justificar tal “benevolência”.

15 – O tribunal deveria ter aplicado ao arguido, no âmbito do terceiro cúmulo jurídico, uma pena conjunta não francamente superior à que aplicou, porque, apesar de tudo, os crimes em apreço não eram graves e a reclusão foi “favorável” ao arguido.

16 – Mas tal pena deveria ter sido ligeiramente superior, tendo em conta a moldura penal do referido cúmulo (entre 1 ano e 9 meses e 4 anos e 4 meses de prisão) e porque o arguido ainda “revela sinais de imaturidade pessoal e escassa responsabilidade social, revelando fraca capacidade de racionalização crítica em relação ao seu impacto junto de potenciais vítimas.”

17 – O tribunal deveria ter aplicado ao arguido pelo menos a pena de 2 anos e 5 meses de prisão.

18 – Ao aplicar ao arguido, no terceiro cúmulo jurídico, a pena de 2 anos e 2 meses de prisão o tribunal violou o disposto no art. 77.1 do C. Penal.

19 – Pelo exposto, o tribunal ad quem deverá:

- alterar, nos termos referidos em 6, o segmento, impugnado, do ponto 13 da matéria fáctica;

- aplicar ao arguido, no âmbito do terceiro cúmulo jurídico, a pena conjunta de 2 anos e 5 meses de prisão.

3. Por despacho de 09.07.2014 foi o recurso admitido, fixado o respectivo regime de subida e efeito.

4. Ao recurso respondeu o arguido, o que fez nos seguintes termos:

A) No que respeita ao facto identificado sob o artigo 13.º, no seu segmento final onde consta: “A pena não se mostra cumprida ou extinta …” (ponto 19 das Conclusões),

1 – O arguido concorda com a posição manifestada pelo Digníssimo Ministério Público, uma vez que, efectivamente, o arguido cumpriu, na íntegra, a pena a que foi condenado no âmbito do processo n.º 247/11.4GAACB do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça.

2 – Pelo que pugna pela rectificação do ponto 13 da matéria fáctica nos termos requeridos no âmbito do presente recurso.

B) No que respeita à aplicação ao arguido, no âmbito do terceiro cúmulo jurídico, da pena conjunta de 2 anos e 5 meses de prisão (ponto 19 das Conclusões),

3 – Já não poderá o arguido concordar com a posição defendida pelo Digno Ministério Público.

4 – De facto, a aplicação da pena, em cúmulo, de 2 anos e 2 meses de prisão apresenta-se acima do mínimo legal, o qual se consubstancia na pena de 1 ano e 9 meses de prisão como pena concreta mais elevada aplicada ao arguido no âmbito do processo n.º 247/11.4GAACB.

5 – Pelo que se considera a pena aplicada em terceiro cúmulo como adequada à globalidade dos factos e personalidade do arguido.

6 – Pugnando-se pela manutenção da fixação de 2 anos e 2 meses como pena única do terceiro cúmulo, no âmbito do presente processo.

Pelo exposto, considera o arguido que deverá ser dado provimento parcial ao presente recurso, sendo alterado o artigo 13.º da matéria fáctica, mas negado provimento no que respeita ao agravamento da pena aplicada ao terceiro cúmulo de 2 anos e 2 meses para 2 anos e 5 meses.

5. Na Relação o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu o parecer que se mostra junto a fls. 1460, no qual, acompanhando a motivação do recurso interposto pelo Ministério Público, se pronuncia no sentido de dever ser o mesmo julgado procedente.

6. Cumprido o artigo 417.º, n.º 1 do CPP, o arguido não reagiu.

7. Realizado o exame preliminar e colhidos os vistos foram os autos à conferência, cumprindo, agora, apreciar.

II. Fundamentação

1. Delimitação do objecto do recurso

      De harmonia com o disposto no n.º 1 do artigo 412.º do CPP e conforme jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça o âmbito do recurso é delimitado em função do teor das conclusões extraídas da respectiva motivação, sem prejuízo das que importe conhecer oficiosamente mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito – [cf. acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ de 19.10.1995, DR, I Série – A, de 28.12.1995].

No presente caso insurge-se o recorrente contra o que consignado ficou no ponto 13. dos factos provados, o qual pretende ver alterado e, ainda, contra a pena conjunta aplicada no âmbito do terceiro cúmulo jurídico que, diz, violar o artigo 77.º, n.º 1 do Código Penal.

2. A decisão recorrida

Ficou a constar do acórdão [transcrição parcial]:

I. Factos Provados:

1) No âmbito dos presentes autos o arguido foi condenado pela prática, em data não concretamente apurada, mas situada no período compreendido entre o dia 31 de Maio e o dia 1 de Junho de 2010:

- de um crime de receptação, p. e p. pelo art.º 231.º, n.º 1, do Código Penal, na pena unitária de 12 meses de prisão; e

- de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, al. a), com referência ao art.º 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na pena unitária de 15 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico das penas foi condenado na pena única de 18 (dezoito) meses de prisão.

O acórdão foi proferido em 30 de Maio de 2013 e transitou em julgado em 1 de Julho de 2013.

Factos:

Em data não concretamente apurada, mas situada no período compreendido entre o dia 31 de Maio e o dia 1 de Junho de 2010, o arguido recebeu de B... um computador portátil e um televisor, que haviam sido furtados. Como contrapartida da entrega que B...fez ao arguido de tais bens, o arguido entregou àquele 2 (dois) gramas de heroína, a que atribuiu o valor de €50,00. O arguido sabia que o computador portátil e o televisor que recebeu de B...não pertenciam a este e aceitou adquiri-los por um valor manifestamente inferior ao seu valor real, o qual bem conhecia.

Ao adquirir tais objectos, o arguido fê-lo com o propósito, concretizado, de obter lucro indevido.

Sabia ainda não se encontrava autorizado a deter e a ceder produto estupefaciente, do qual bem conhecia as características estupefacientes, todavia, tal conhecimento não o coibiu de adoptar a conduta supra descrita.

Ao actuar do modo descrito, o arguido agiu de forma voluntária, livre e consciente e sabia que as suas condutas eram proibidas e puníveis por lei penal.

O arguido não sofreu qualquer período de privação da liberdade à ordem destes autos.

A pena não se mostra cumprida ou extinta.

2) No âmbito do processo abreviado n.º 134/07.0GTLRA, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 26.01.2007, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 5 meses de prisão, substituída por 150 dias de multa à taxa diária de €5,00.

A sentença foi proferida em 07.12.2007 e transitou em julgado em 10.11.2009.

Factos:

No dia 26.01.2007, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)PF, pela EN n.º 556, no lugar de Lagoa do Cão, Alcobaça, sem ser titular de carta de condução que o habilitasse ao exercício da condução. O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era punível por lei penal.

O arguido sofreu um dia de detenção à ordem destes autos – cfr. fls. 1225.

Por despacho proferido em 22.10.2011, transitado em julgado em 21.12.2011, foi determinado o cumprimento efectivo da pena de prisão aplicada.

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

3) No âmbito do processo comum singular n.º 316/06.2GTALQ, do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Vila Franca de Xira, foi condenado pela prática, em 30.05.2006, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €5,00.

A sentença foi proferida em 23.01.2009 e transitou em julgado em 13.01.2011.

Factos:

No dia 30.05.2006, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)EB, no IC2, km 25, Rotunda de Povos, em Vila Franca de Xira, sem ser titular de carta de condução que o habilitasse ao exercício da condução. O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, bem sabendo que a sua conduta era punível por lei penal.

Por despacho proferido em 28.11.2013, transitado em julgado em 28.01.2014, foi convertida a pena de multa aplicada ao arguido em 80 dias de prisão subsidiária.

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

4) No âmbito do processo sumário n.º 51/09.0GBACB, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 09.03.2009, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.º 203.º e 204.º, n.º 1, al. e) do Código Penal, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de €6,00.

A sentença foi proferida em 27.03.2009 e transitou em julgado em 26.11.2009.

Factos:

No dia 09.03.2009, cerca das 00:15h o arguido e outro indivíduo, em conjugação de esforços e no seguimento do acordado entre si, deslocaram-se às bombas de combustível “Galp”, em Pataias, e aí chegados, partiram os cadeados das grades de protecção das garrafas de gás e dali retiraram e fizeram suas 4 garrafas de 13kg de gás butano, no valor de €155,60 e duas garrafas de 12kg de gás butano, no valor de €78,60, bem sabendo que não lhes pertenciam, tendo agido livre e conscientemente bem sabendo que as suas condutas eram puníveis pela lei penal.

Por despacho proferido em 02.11.2010, transitado em julgado em 29.11.2010, foi declarada extinta pelo cumprimento a pena de multa aplicada ao arguido.

5) No âmbito do processo sumário n.º 174/10.2PAACB, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 07.08.2010:

- de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.º 291.º, n.º 1 e 69.º, n.º 1, al. a), do Código Penal, na pena de 4 meses de prisão;

- de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 10 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico das penas foi condenado na pena única de 12 (doze) meses de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período e subordinada à obrigação do arguido proceder à entrega da quantia de €500,00 aos Bombeiros Voluntários de Alcobaça e ainda na pena acessória de proibição e conduzir veículos motorizados pelo período de 4 meses.

A sentença foi proferida em 21.09.2010 e transitou em julgado em 13.01.2011.

Factos:

No dia 07.08.2010, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula HV, no entroncamento entre a Rua D. Pedro V e a Rua Silvério Raposo, em Alcobaça, sem ser titular de qualquer documento que o habilitasse ao exercício da condução. Nestas circunstâncias de tempo e de lugar o arguido conduzia com uma TAS de 1,58 g/l, tendo agido sempre de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que o seu comportamento era proibido por lei.

Por despacho proferido em 09.01.2014, transitado em julgado em 03.02.2014 foi determinada a revogação a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido.

O arguido sofreu um dia de detenção à ordem dos presentes autos (cfr. fls. 966).

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

6) No âmbito do processo comum colectivo n.º 157/08.2PAACB, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 09.08.2008:

- de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 8 meses de prisão;

- de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, al. a), do DL n.º 15/93, de 22/1, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico das penas foi condenado na pena única de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por idêntico período, mediante regime de prova, através de plano a elaborar pela DGRS.

Foi ainda condenado pela prática de uma contra-ordenação, p. e p. pelo art.º 4.º, n.ºs 1 e 3 do Código da Estrada, na coima de €500,00.

O acórdão foi proferido em 11.11.2010 e transitou em julgado em 06.01.2011.

Factos:

No dia 09.08.2008, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)IA, no entroncamento entre a Rua Miguel Bombarda e a Avenida Maria Oliveira, em Alcobaça, sem ser titular de qualquer documento que o habilitasse ao exercício da condução, bem sabendo que só podia conduzir na via pública munido de carta de condução.

No mesmo dia, o arguido trazia consigo uma embalagem no interior da qual encontravam-se quatro pacotes de heroína com o peso líquido de 0,460 gramas e ainda diversas notas do BCE, divididas em dois conjuntos, um contendo duas notas de €10,00 e três de €5,00 e outro contendo uma nota de €20,00 e cinco de €5,00, provenientes da venda de heroína, cujas características bem conhecia e que a detenção, cedência e comercialização não eram permitidos por lei, tendo agido sempre de forma livre e consciente.

Por despacho proferido em 09.01.2014, transitado em julgado em 03.02.2014 foi determinada a revogação a suspensão da execução da pena de prisão aplicada ao arguido.

O arguido não sofreu qualquer dia de detenção à ordem dos presentes autos.

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

7) No âmbito do processo sumário n.º 4/11.8GEACB, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 04.01.2011:

- de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 9 meses de prisão a cumprir por dias livres, durante 54 períodos de 40 horas.

A sentença foi proferida em 28.01.2011 e transitou em julgado em 01.07.2011.

Factos:

No dia 04.01.2011, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)EI, na EN8, em Vale Maceira, Alfeizerão, sem ser titular de qualquer título que o habilitasse ao exercício da condução, tendo agido de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que o seu comportamento era proibido por lei.

O arguido foi detido e libertado no dia 04.01.2011 e já cumpriu 12 dos 54 períodos da pena de prisão por dias livres em que foi condenado (cfr. fls. 898).

A pena não se mostra totalmente cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

8) No âmbito do processo abreviado n.º 24/11.2GTLRA, do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 02.02.2011:

- de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 9 meses de prisão a ser cumprida em 54 períodos correspondentes a fins de semana, cada um deles com a duração mínima de 36 horas.

A sentença foi proferida em 13.04.2011 e transitou em julgado em 06.06.2011.

Factos:

No dia 02.02.2011, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)GD, na EN8, na rotunda da Maxmat, em Caldas da Rainha, sem que fosse titular de carta de condução, nem qualquer outro título que o habilitasse ao exercício da condução, tendo agido de forma livre, voluntária e consciente bem sabendo que o seu comportamento era proibido por lei.

O arguido não sofreu qualquer dia de detenção à ordem dos presentes autos (cfr. fls. 1280).

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

9) No âmbito do processo abreviado n.º 578/10.0GAACB, do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática:

- em 28.12.2010 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 10 meses de prisão;

- em 24.01.2011 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 10 meses de prisão.

Em cúmulo jurídico das penas foi condenado na pena única de 1 ano e 3 meses de prisão.

A sentença foi proferida em 10.10.2011 e transitou em julgado em 09.11.2011.

Factos:

No dia 28.12.2010, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)EI, pela Rua Joaquim dos Santos, em Prazeres, Aljubarrota.

No dia 24.01.2011, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)GD, pela Rua da Volta das Mós, em direcção à EN8.

De ambas as vezes, o arguido não possuía qualquer autorização ou licença que o habilitasse a conduzir os referidos veículos, e não se absteve dos comportamentos referidos, exercidos de forma livre e consciente, sabendo que as suas condutas eram proibidas por lei.

O arguido não sofreu qualquer dia de detenção à ordem dos presentes autos (cfr. fls. 922).

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

10) No âmbito do processo comum colectivo n.º 227/10.7PAACB, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 14.10.2010 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 1 ano de prisão.

O acórdão foi proferido em 03.05.2012 e transitou em julgado em 04.06.2012.

Factos:

No dia 14.10.2010, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula (...)TA, pela Rua Cidade de Leiria, em Alcobaça sem ser possuidor de carta de condução ou qualquer outro documento que o habilitasse a conduzir, tendo agido de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida por lei.

O arguido foi detido no dia 14.10.2010 e libertado no dia 15.10.2010 (cfr. fls. 1182 a 1189).

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

11) No âmbito do processo comum singular n.º 335/11.7GBPMS, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Porto de Mós, foi condenado pela prática, em 20.06.2011, de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos art.º 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), por referência à al. d) do art.º 202.º do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão.

A sentença foi proferida em 21.06.2012 e transitou em julgado em 03.09.2012.

Factos:

No dia 20.06.2011, cerca das 19:00h o arguido e outro indivíduo, em conjugação de esforços e no seguimento do acordado entre si, introduziram-se no interior de uma fábrica, no Juncal, Porto de Mós, depois de terem dobrado e levantado a chapa de um portão que se encontrava fechado a cadeado e dali retiraram vários objectos, que colocaram numa viatura, levando-os consigo, tendo o arguido agido livre e conscientemente bem sabendo que a sua conduta era punível por lei penal.

O arguido sofreu um dia de privação da liberdade à ordem destes autos e encontra-se a cumprir pena à ordem dos mesmos desde 12.01.2013.

12) No âmbito do processo comum singular n.º 354/08.0GTLRA, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Porto de Mós, foi condenado pela prática, em 12.05.2008 de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 1 ano e 4 meses de prisão.

A sentença foi proferida em 05.11.2012 e transitou em julgado em 10.12.2012.

Factos:

No dia 12.05.2008, o arguido conduziu o veículo automóvel de matrícula JS (...), na EN1, em Chão da Feira, Porto de Mós, sem ser possuidor de carta de condução ou qualquer outro documento que o habilitasse a conduzir, tendo agido de forma livre, deliberada e consciente, sabendo que a sua conduta era proibida por lei.

O arguido não sofreu qualquer dia de detenção à ordem dos presentes autos (cfr. fls. 1125).

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

13) No âmbito do processo sumário n.º 247/11.4GAACB, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado pela prática, em 01.06.2011:

- de um crime de furto simples, p. e p. pelo art.º 203.º do Código Penal, na pena de 1 ano e 9 meses de prisão;

- de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, na pena de 1 ano de prisão.

Em cúmulo jurídico das penas foi condenado na pena única de 2 anos e 3 meses de prisão.

A sentença foi proferida em 07.07.2011 e transitou em julgado em 22.08.2011.

Factos:

No dia 01.06.2011, cerca das 13:30h o arguido juntamente com outros indivíduos dirigiram-se ao estaleiro da Novopca – Construtores Associados, SA, em Aljubarrota, tendo-se introduzido no estaleiro de onde retiraram e levaram consigo vários objectos que colocaram num veículo automóvel de matrícula (...)EJ, que o arguido conduziu apesar de não se encontrar habilitado para o efeito com carta de condução ou outro documento. O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente bem sabendo que as suas descritas condutas eram puníveis por lei penal.

A pena não se mostra cumprida ou extinta e ainda não decorreu o prazo de prescrição da mesma.

Resulta, ainda, dos autos que:

14) O arguido foi condenado pela prática dos seguintes crimes, a acrescer aos previamente referidos:

a) Por sentença proferida em 08.06.2005, transitada em julgado em 24.06.2005, no âmbito do processo abreviado n.º 03/05.9PAACB, que correu termos pelo 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado na pena de 60 dias de multa à taxa diária de €3,00, pela prática, em 04.01.2005, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro e de uma contra-ordenação rodoviária, p. e p. pelo art.º 131.º, n.º 1 e 2, do Código da Estrada. A pena foi declarada extinta por despacho proferido em 04.02.2010, transitado em julgado.

b) Por sentença proferida em 21.06.2006, transitada em julgado em 20.11.2009, no âmbito do processo abreviado n.º 376/05.3GCACB, que correu termos pelo 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado nas penas de 7 meses de prisão e 3 meses de prisão, respectivamente, pela prática, em 28.08.2005, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro, e de um crime de desobediência, p. e p. pelo art.º 348.º, n.º 1, do Código Penal. Por despacho proferido em 14.05.2008, foram declarados cessados os efeitos penais da condenação do arguido pela prática do crime de desobediência, restando a pena referente ao outro crime, suspensa na sua execução pelo período de um ano. A pena foi declarada extinta por despacho proferido em 11.01.2013, transitado em julgado em 01.02.2013.

c) Por sentença proferida em 21.01.2011, transitada em julgado em 25.02.2011, no âmbito do processo comum singular n.º 254/09.7PAACB, que correu termos pelo 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado na pena de 1 ano de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano com regras de conduta, pela prática, em 22.10.2009, de um crime de tráfico de quantidades diminutas e de menor gravidade, p. e p. pelo art.º 25.º, al. a), do DL n.º 15/93, de 22.01. A pena foi declarada extinta por despacho proferido em 16.04.2012, transitado em julgado em 16.05.2012.

d) Por sentença proferida em 17.03.2009, transitada em julgado em 11.11.2009, no âmbito do processo sumário n.º 52/09.8GBACB, que correu termos pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado na pena de 100 dias de multa à taxa diária de €6,00, pela prática, em 09.03.2009, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro;

e) Por sentença proferida em 29.10.2009, transitada em julgado em 30.11.2009, no âmbito do processo sumário n.º 237/09.7PAACB, que correu termos pelo 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, foi condenado na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €6,00, pela prática, em 11.10.2009, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.º 3.º, n.ºs 1 e 2, do DL n.º 2/98, de 03 de Janeiro.

Mais se provou em relação à situação pessoal e condições sócio-económicas do arguido que:

15) O arguido descende de uma família de cultura cigana de modesta condição socioeconómica. Frequentou o sistema de ensino até à conclusão do 5.º ano de escolaridade, altura em que a reclusão dos pais teve impactos emocionais conducentes à desistência dos estudos. Aos 17 anos estabeleceu relação marital com a companheira, da qual resultou o nascimento de 4 filhos, com idades actuais aproximadamente compreendidas entre os 9 anos e 2 anos.

16) O arguido iniciou o consumo de estupefacientes com cerca de 18 anos de idade.

17) O seu percurso laboral resume-se à participação em campanhas agrícolas sazonais, ao apoio a familiares na venda ambulante e à recolha de sucata, sendo-lhe atribuídas fracas competências profissionais.

18) Durante a execução da pena de prisão que se iniciou em 13 de Outubro de 2011 o arguido tem vindo a registar um comportamento tendencialmente adequado às regras institucionais, mantendo-se abstinente de estupefacientes, situação regularmente confirmada através dos resultados negativos nos testes de despistagem que lhe vêm sendo efectuados.

19) Tem vindo a demonstrar motivação para a ocupação construtiva e valorizadora do período de reclusão tendo para o efeito frequentado e concluído o programa de sensibilização e consciencialização dos crimes estradais e frequenta o 2.º ciclo do ensino básico, com avaliação positiva.

20) Beneficia de um enquadramento familiar que funciona como um importante elemento de apoio em termos de reinserção social.

21) Revela sinais de imaturidade pessoal e escassa responsabilidade social, revelando fraca capacidade de racionalização crítica em relação ao seu impacto junto de potenciais vítimas.

II. Factos não provados:

Não se provaram quaisquer outros factos que, com interesse para a decisão da causa, se mostrem em contradição com a factualidade provada.

III. Fundamentação da matéria de facto:

A convicção do tribunal relativamente aos factos que resultaram provados resultou da apreciação crítica de toda a documentação constante dos autos e da consideração pelas regras gerais da experiência.

Assim, tomaram-se em consideração as decisões e documentos de fls. 898 a 911, 912 a 921, 922 a 937, 966 a 981, 983 a 995, 1010 a 1036, 1125 a 1139, 1140, 1144 a 1149, 1150 a 1160, 1162 a 1179, 1180 a 1212, 1213 a 1224, 1225 a 1237, 1249 a 1272, 1273 a 1279, 1280 a 1286, 1287 a 1297, 1373 a 1376, 1378 a 1387, 1389 a 1392 e 1393 a 1409.

Considerou-se ainda o teor da certidão de fls. 1065 a 1086 respeitante à decisão proferida nos autos de processo comum singular n.º 494/08.6PBLRA, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Pombal, bem como o teor da informação de fls. 1124.

O Tribunal considerou igualmente o certificado de registo criminal constante de fls. 1325 a 1352 e, bem assim, o acórdão proferido nos presentes autos, que consta de fls. 801 a 831.

Os factos atinentes à situação pessoal, familiar e profissional do arguido decorreram das declarações por si prestadas em audiência e ainda do teor do relatório social junto a fls. 1353 a 1356.

IV. Fundamentação de Direito:

Assentes os factos relevantes, importa, agora, proceder ao cúmulo jurídico das penas aplicadas ao arguido e que se mostram em concurso.

Dispõe o artigo 77.º, n.º 1, do Código Penal, que “Quando alguém tiver praticado vários crimes antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena”.

Tal pena única tem como limite máximo a soma das penas parcelares, não podendo ultrapassar 25 anos, tratando-se de pena de prisão, e 900 dias, tratando-se de pena de multa, e como limite mínimo a pena mais elevada daquelas que integram o concurso – n.º 2 do art.º 77.º.

O pressuposto essencial para a efectuação do cúmulo jurídico de duas ou mais penas parcelares é a prática de diversas infracções pelo mesmo arguido antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles.

Diversamente, em todos os casos de uma pluralidade de crimes praticados pelo mesmo agente, se cada um deles tiver sido praticado depois do trânsito em julgado da condenação pelo anterior, verifica-se uma sucessão de penas.

Rege o art.º 78.º, n.º 1, do Código Penal, que “Se, depois de uma condenação transitada em julgado, se mostrar que o agente praticou, anteriormente àquela condenação, outro ou outros crimes, são aplicáveis as regras do artigo anterior, sendo a pena que já tiver sido cumprida descontada no cumprimento da pena única aplicada ao concurso de crimes”.

Estipula o n.º 2 do citado normativo que “O disposto no número anterior só é aplicável relativamente aos crimes cuja condenação transitou em julgado”.

A data que estabelece o limite até ao qual será possível realizar o cúmulo das penas aplicadas por cada um dos crimes é a correspondente ao trânsito em julgado da primeira condenação por um deles.

Assim, apenas os crimes que forem cometidos até essa primeira data estarão em concurso e será possível realizar um cúmulo das penas aplicadas aos mesmos.

Actualmente, a corrente dominante dos nossos Tribunais Superiores, maxime do Supremo Tribunal de Justiça, vai no sentido de que, para a verificação de uma situação de concurso de infracções a punir por uma única pena, se exige desde logo, que as várias infracções tenham, todas elas, sido cometidas antes de haver transitado em julgado a condenação imposta por qualquer uma delas, isto é, o transito em julgado da condenação imposta por uma dada infracção obsta a que, com essa infracção, ou com outras cometidas até esse trânsito, se cumulem infracções que venham a ser praticadas em momento posterior a esse transito.

Na verdade, conforme é referido no Acórdão do STJ de 14.01.2009 in www.dgsi.pt, “I - Uma pluralidade de infracções/crimes cometidas pelo mesmo arguido/agente pode dar lugar ou a um concurso de penas (quando os vários crimes/infracções tiverem sido cometidos antes do trânsito em julgado da condenação por qualquer deles) ou a uma sucessão de penas (nos demais casos de pluralidade de crimes/infracções cometidos pelo mesmo arguido/agente).

II - Elemento relevante e fundamental para determinar a possibilidade de efectivação de cúmulo jurídico das penas é o trânsito em julgado da condenação pelo primeiro crime.

III - Na verdade, a jurisprudência mais recente e dominante deste STJ vai no sentido de que não poderá haver cúmulo jurídico de penas respeitantes a crimes praticados uns antes e outros depois da primeira condenação transitada em julgado. Depois daquele trânsito haverá sucessão de crimes e de penas”.

Conforme vem expendido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Maio de 2009, (disponível na internet em www.dgsi.pt, processo n.º 6/03.8TPLSB.S1), «o limite determinante e intransponível da consideração da pluralidade de crimes para o efeito de aplicação de uma pena de concurso é, pois, o trânsito em julgado da condenação que primeiramente teve lugar por qualquer crime praticado anteriormente; no caso de conhecimento superveniente de infracções aplicam-se as mesmas regras, devendo a última decisão que condene por um crime anterior ser considerada como se fosse tomada ao tempo do trânsito da primeira, se o tribunal, a esse tempo, tivesse tido conhecimento da prática do facto – cfr. Ac. deste STJ, de 17.3.2004, in CJ, STJ, I, 2004, 229 e segs. e de 15.3.2007, in Rec.º n.º 4796 /06, da 5.ª Sec., de 11.10.2001, P.º n.º 1934/01 e de 17.1.2002, P.º n.º 2739/01 – como se, por ficção de contemporaneidade, todos os factos que posteriormente foram conhecidos tivessem sido tivessem sido julgados conjuntamente no momento da decisão primeiramente transitada.

Se os crimes agora conhecidos forem vários, tendo uns ocorrido antes de condenação anterior e outros depois dela, o tribunal proferirá duas penas conjuntas, uma a corrigir a condenação anterior e outra relativa aos factos praticados depois daquela condenação; a ideia de que o tribunal devia proferir aqui uma só pena conjunta, contraria expressamente a lei e não se adequaria ao sistema legal de distinção entre punição do concurso de crimes e da reincidência, é a doutrina do Prof. Figueiredo Dias, in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, § 425, dando lugar a cúmulos separados e a pena executada separada e sucessivamente, neste sentido, também, Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário ao Código Penal, pág. 247.

Orientação diversa é a que se verte no chamado “cúmulo por arrastamento”, seguida em data anterior a 1997, mas postergada por este STJ desde logo pelo Acórdão de 4.12.97, in CJ, STJ, III, 246, assinalando-se que “aniquila a teleologia e a coerência interna do ordenamento jurídico-penal, ao dissolver a diferença entre as figuras do concurso de crimes e da reincidência (Comentário de Vera Lúcia Raposo, RPCC, Ano 13.º, n.º 4 , pág. 592)”.

Esta posição não atenta contra princípios fundamentais do Estado de direito, particularmente do respeito pela dignidade humana, da tipicidade, culpa, legalidade e existência de prisão perpétua, sendo, por isso, credenciada pelo TC no seu Ac. n.º 212/02, de 22/5/2002, P.º n.º 243/2002, DR II Série n.º 147, de 28.6.2002, em ponderação da conformidade constitucional do decidido no Ac. deste STJ, de 17.1.2002, in CJ STJ, 2002, I, 180, repudiando interpretação favorável ao cúmulo por arrastamento» (fim de citação).

Quanto à questão de saber se se devem incluir, ou não, no cúmulo jurídico as penas cuja execução foi suspensa na sua execução, o Supremo Tribunal de Justiça, no seguimento da jurisprudência vinda de citar, vem-se pronunciando maioritariamente pela afirmativa, «sob alegação de que o caso julgado se forma sobre a medida da pena e não sobre a sua execução, ficando a suspensão da execução da pena resolutivamente sujeita à condição da ocorrência de condenação que aquela revogue, neste sentido se pronunciando este STJ no seu Ac. de 26.11.2008, in P.º n.º 3175/2008, destacando-se do extensíssimo leque jurisprudencial os acórdãos publicados nos BMJ 354/345, 360/340, 424/410, 465/319, 404/178, 467/356, 468/79, 485/121 e os recentes de 3.10.2007, P.º n.º 2576/07, 31.1.2008, P.º n.º 4081/07, 27.3.2008, P.º n.º 411/08 (com voto de vencido), 25.9.2008, P.º n.º 2818”» (fim de citação).

Esta posição dominante foi sustentada pelo Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 3/2006, de 3.1.2006, DR II Série, que vai no sentido da perfeita conformidade constitucional da interpretação no sentido de que em caso de conhecimento superveniente de infracções em caso de concurso delas pode não manter-se a suspensão da execução de penas parcelares.

É nosso entender, no entanto, e no seguimento do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25 de Setembro de 2008 (na internet em www.dgsi.pt, processo n.º 08P2918) que as penas suspensas que já tiverem sido declaradas extintas nos termos do art. 57.º do Código Penal não são de considerar na formulação da pena única, sem prejuízo do desconto da prisão preventiva, ou outros tempos de privação de liberdade, neles eventualmente sofrida; e que não são de considerar no cúmulo superveniente de penas as que tenham sido suspensas e cujo período de suspensão já tenha decorrido, salvo se a suspensão já tiver sido revogada – sem prejuízo de vir a ser reformulado o cúmulo jurídico, com inclusão das penas em questão, caso após a decisão cumulatória a pena suspensa inicialmente não incluída venha a ser, no processo onde foi aplicada, objecto de revogação da suspensão da execução da pena de prisão.

No sentido apontado, cfr. ainda Dá Mesquita (em O Concurso de Penas, Coimbra Editora, 1997, págs. 90-91): “… se findo o período da suspensão o agente não tiver praticado factos susceptíveis de provocarem a sua revogação, nem se encontrar pendente processo por crime que possa determinar a sua revogação ou incidente processual por falta de cumprimento dos deveres impostos, a pena é declarada extinta. Nestas situações, a paz jurídica do indivíduo derivada do trânsito em julgado de despacho que declarou a pena extinta, não pode ser prejudicada pelo facto de se ter conhecimento de que aquela pena está em concurso com outra(s)… E, mesmo nas situações em que o agente foi condenado na outra pena em concurso antes de decorrido o período da suspensão, caso em que a pena foi indevidamente declarada extinta, a força do caso julgado do despacho impede que a situação seja revista”.

Em suma, a pena suspensa ainda não declarada extinta e relativamente à qual ainda não tenha decorrido o prazo da suspensão pode e deve ser englobada num concurso de infracções com outras penas de prisão, suspensas ou efectivas.

Em virtude do que se acaba de expor, e por já terem sido objecto de decisão, com trânsito em julgado, a declarar extintas as penas, não serão incluídas no cúmulo jurídico a efectuar nestes autos as penas aplicadas ao arguido nos processos n.ºs 376/05.3GCACB, do 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça e 254/09.7PAACB do 2.º Juízo do mesmo Tribunal, por terem decorrido os prazos da suspensão da execução das penas, sem que tivessem sido revogadas.

No caso em apreço, verifica-se que os crimes cometidos pelo arguido no âmbito dos processos acima identificados no relatório desta decisão se encontram numa relação de concurso, nos termos do citado artigo 77º, n.º 1, do Código Penal, a demandar a realização de três cúmulos jurídicos autónomos.

No que tange à pena aplicada no processo n.º 335/11.7GBPMS, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Porto de Mós, a mesma fica fora de qualquer cúmulo uma vez que não está em concurso com quaisquer outras penas. 

Tendo em conta as considerações que acima se teceram, verifica-se que o momento temporal a atender em primeiro lugar é o correspondente ao dia 10.11.2009, data do trânsito em julgado da sentença proferida no processo n.º 134/07.0GTLRA, do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, por se tratar do primeiro trânsito em julgado verificado – na medida em que os ilícitos pelos quais o arguido foi condenado foram, em parte, praticados em data anterior àquela.

Correspondem estes ilícitos aos praticados no âmbito dos seguintes processos, a acrescer àquele:

- No processo n.º 316/06.2 (factos praticados em 30 de Maio de 2006);

- No processo n.º 51/09.0GBACB (factos praticados no dia 9 de Março de 2009);

- No processo n.º 157/08.2PAACB (factos praticados em 9 de Agosto de 2008);

- No processo n.º 354/08.0GTLRA (factos praticados em 12 de Maio de 2008).

Embora as penas aplicadas nos processos n.ºs 52/09.8GBACB e 237/09.7PAACB, todas em penas de multa e já convertidas, por despacho judicial, em pena de prisão subsidiária, devessem integrar este primeiro cúmulo tal não deverá suceder uma vez que as penas de multa (principais) já se encontram prescritas.

O prazo de prescrição é de 4 anos (cfr. art.º 122.º, n.º 1, al. d), do Código Penal, contado desde o trânsito em julgado das sentenças, que ocorreu, respectivamente, em 11.11.2009 e em 30.11.2009.

Assim, porque já decorreram mais de 4 anos desde o trânsito em julgado de qualquer das sentenças proferidas nestes processos, não tendo as penas sido executadas, como multa ou prisão subsidiária, sendo que a prisão subsidiária não é em sentido formal uma pena de substituição, e visa tão-só conferir consistência e eficácia à pena de multa, sendo irrelevante para a contagem do prazo de prescrição a sua conversão em prisão subsidiária uma vez que o início do prazo de prescrição da pena conta-se do trânsito em julgado da sentença e não do trânsito em julgado da decisão que converteu a pena de multa em prisão subsidiária, tais penas encontram-se prescritas e não deverão integrar o cúmulo (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 30.04.2014, processo 143/06.7GAPRD-A.P1 disponível em www.dgsi.pt).

Poderia colocar-se a hipótese de também a pena de 5 meses de prisão, substituída por 150 dias de multa, aplicada ao arguido no âmbito do processo n.º 134/07.0GTLRA já ter prescrito, uma vez que o prazo prescricional também é aqui de 4 anos (art.º 122.º, n.º 1, al. d) do Código Penal). Sucede que a pena de prisão era a pena principal e por despacho de 20.10.2011, transitado em 21.12.2011, foi determinado o cumprimento da pena de prisão em virtude de o arguido não ter pago a multa de substituição. O prazo de prescrição da pena de prisão da pena de prisão só pode contar-se desde o trânsito da decisão que determinou o seu cumprimento pelo que não tendo desde então decorrido 4 anos tal pena não prescreveu e pode englobar o primeiro cúmulo.

Embora a pena de multa aplicada ao arguido no âmbito do processo n.º 51/09.0GBACB já tenha sido julgada extinta pelo pagamento, conforme despacho proferido em 2.11.2010 (cfr. fls. 1387), a mesma deve integrar a pena única do cúmulo jurídico, por força da alteração introduzida pela Reforma de 2007 na redacção do artigo 78.º, n.º 1, do Código Penal (anteriormente as penas extintas pelo cumprimento não eram consideradas na pena única) – alteração que teve como razão de ser a circunstância de que, sofrendo as penas parcelares uma compressão da sua grandeza na operação da formação da pena única, o desconto do seu cumprimento integral beneficia sempre o condenado - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 29 de Abril de 2010, disponível em www.dgsi.pt.

Acresce salientar que relativamente à coima de €500,00 em que o arguido foi condenado pela prática de uma contra-ordenação, p. e p. pelo art.º 4.º, n.ºs 1 e 3 do Código da Estrada, no âmbito do processo n.º 157/08.2PAACB, a mesma já se encontra prescrita ao abrigo do que dispõe o art.º 189.º do referido Código que prescreve um prazo prescricional de dois anos. Assim, não se registando qualquer facto interruptivo da prescrição, julga-se a mesma prescrita.

Já depois da data da verificação daquele primeiro trânsito em julgado, referente ao processo n.º 134/07.0 – 10 de Novembro de 2009, o arguido voltou a praticar outros crimes.

No processo n.º 174/10.2PAACB a sentença condenatória transitou em julgado em 13 de Janeiro de 2011, sendo este o momento temporal a considerar para a realização do segundo cúmulo, sendo que anteriormente a essa data o arguido já havia praticado outros ilícitos.

Assim, a acrescer à pena aplicada ao arguido no âmbito do processo n.º 174/10.2PAACB, encontram-se numa situação de concurso as penas aplicadas no âmbito dos seguintes processos judiciais, que, assim, integrarão o segundo cúmulo jurídico a realizar:

- Processo n.º 4/11.8GEACB (factos praticados em 4 de Janeiro de 2011);

- Processo n.º 578/10.0GAACB (factos praticados em 28 de Dezembro de 2010);

- Processo n.º 227/10.7PAACB (factos praticados em 14 de Outubro de 2010);

- Processo n.º 230/10.7GAACB (factos praticados em data não concretamente apurada mas situada entre 31 de Maio e 1 de Junho de 2010).

Já depois da data da verificação daquele segundo trânsito em julgado, referente ao processo n.º 174/10.2PAACB – 13 de Janeiro de 2010, o arguido voltou a praticar outros crimes.

No processo n.º 24/11.2GTLRA a sentença condenatória transitou em julgado em 6 de Junho de 2011, sendo este o momento temporal a considerar para a realização do terceiro cúmulo, verificando-se que anteriormente a essa data o arguido já havia praticado outros ilícitos.

Assim, a acrescer à pena aplicada ao arguido no âmbito do processo n.º 24/11.2GTLRA encontram-se numa situação de concurso as penas aplicadas no âmbito dos seguintes processos judiciais, que, assim, integrarão o terceiro cúmulo jurídico a realizar:

- Processo n.º 578/10.0GAACB (factos praticados em 24 de Janeiro de 2011);

- Processo n.º 247/11.4GAACB (factos praticados em 1 de Junho de 2011).

Assim, encontram-se numa situação de concurso as penas aplicadas no âmbito destes processos judiciais, que, assim, integrarão o terceiro cúmulo jurídico a realizar.

Isto posto, urge unificar as penas aplicadas ao arguido no âmbito daqueles processos judiciais e determinar, em concreto, a pena única que ao mesmo deverá ser imposta em cada um dos cúmulos, penas únicas que, depois, serão sucessivamente cumpridas pelo arguido, a que acrescerá a pena aplicada no processo n.º 335/11.7GBPMS que, como se referiu, não está em concurso com quaisquer outras penas.

Conforme se referiu e vem estatuído no artigo 77.º, n.º 2, do Código Penal, a pena única a aplicar tem como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes (não podendo, porém, ultrapassar os 25 anos de prisão nem os 900 dias de multa).

(…)

No que respeita ao terceiro cúmulo, o limite mínimo da moldura penal corresponde à pena de 1 (um) ano de 9 (nove) meses de prisão (correspondente à pena aplicada no âmbito do processo n.º 247/11.4GAACB).

O limite máximo, resultado da soma de todas as penas aplicadas ao arguido no âmbito dos processos judiciais que integram este cúmulo cifra-se em 52 (cinquenta e dois) meses, ou seja, 4 (quatro) anos e 4 (quatro) meses.

Na determinação da medida concreta será ponderado o conjunto dos factos praticados e descritos nas decisões referenciadas, bem como a personalidade do arguido decorrente de tais decisões, assim como a natureza dos crimes praticados – é, assim, uma visão conjunta, não tida em consideração nas condenações parcelares que emerge nessa personalidade a considerar, pelo que, por essa razão, a pena de cúmulo é decidida ex novo.

Essencial é considerar que na fixação da pena única se deve ponderar que na “avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou mesmo a uma “carreira”) criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, só no primeiro caso sendo cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. De grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização)” - Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, § 521.

Devem, pois, considerar-se como critérios ou factores a ponderar na determinação da pena única os seguintes:

a. Apreciação da globalidade dos factos em interligação com a personalidade do arguido;

b. Avaliação da gravidade da ilicitude global dos factos;

c. Valoração do conjunto dos factos, que fornece a imagem global do facto, o grau de contrariedade à lei e a grandeza da ilicitude;

d. Apreciação da personalidade do agente, revelando esta se o facto exprime uma tendência ou mesmo uma carreira criminosa ou é antes uma mera emanação de pluriocasionalidade;

e. Avaliação do conjunto dos factos, permitindo-se aferir se existem conexões entre os diversos comportamentos objecto de um juízo condenatório, bem como determinar qual o fio unificador ou condutor na repetição criminosa.

Aplicando tais critérios ao caso em apreço, podemos verificar que, relativamente aos factos julgados nos processos judiciais que integram o primeiro cúmulo jurídico a realizar:

a. Os factos praticados pelo arguido evidenciam, individualmente, uma gravidade reduzida, tendo em atenção as respectivas molduras legais (pena de prisão até 2 anos no caso do crime previsto no artigo 3º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro; de 2 a 8 anos no caso do crime previsto no artigo 204.º, n.º 2, do Código Penal) e até 5 anos no caso do crime previsto no art.º 25.º al. a) do DL n.º 15/93;

b. A globalidade dos ilícitos praticados revela homogeneidade na perspectiva dos bens jurídicos violados: o arguido, para além da prática de um crime de furto qualificado e de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, praticou quatro crimes de condução sem habilitação legal revelando, na prática destes últimos factos, uma personalidade tendencialmente desrespeitadora da norma incriminatória;

A circunstância de o período de tempo durante o qual se verificou a prática dos ilícitos criminais (quase três anos) se tratar de um período relativamente curto, associada ao facto de o arguido já ter sido condenado anteriormente, também pela prática do crime de condução sem habilitação legal, evidencia que a factualidade em apreciação não se reconduz a um mero reflexo de pluriocasionalidade, antes revelando uma carreira criminosa constante no que toca a este crime, reveladora da incapacidade de o arguido pautar a sua conduta segundo a norma;

c. A circunstância de o arguido ter desempenhado apenas trabalhos precários e esporádicos evidencia dificuldade clara de integração social do arguido;

d. As perspectivas de integração social do arguido aquando da cessação da sua privação da liberdade afiguram-se pouco prometedoras embora não se possa descurar a sua integração familiar já que o seu núcleo familiar continua a apoiá-lo. Por outro lado, e não se descurando a idade do arguido, actualmente com 28 anos, observa-se ainda algum esforço do arguido por continuar os estudos em meio prisional, o que importa enfatizar.

Considerando as circunstâncias acima descritas, atinentes, em conjunto, aos factos e à personalidade do agente, a natureza da grande maioria dos crimes em apreço (com ênfase para o crime de condução sem habilitação legal) conclui-se que o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelos crimes, a recuperação do delinquente para a sociedade e a personalidade do arguido manifestada nos factos, exigem que a pena única a aplicar seja fixada em 2 (dois) anos de prisão e em 260 (duzentos e sessenta) dias de multa à taxa diária de €5,00 (cinco euros), taxa essa que se reputa de adequada tendo em atenção a globalidade dos factos.

(…)

Relativamente ao terceiro cúmulo, repetem-se aqui as mesmas considerações já evidenciadas relativamente aos primeiro e segundo cúmulos sendo de referir que no que toca aos crimes praticados, todos punidos com pena de prisão, são na esmagadora maioria crimes associados à condução rodoviária. Assim, para além dos três crimes de condução sem habilitação legal está ainda em cúmulo um crime de furto simples, revelando homogeneidade na perspectiva dos bens jurídicos violados. O período de tempo no qual se verificou a prática dos ilícitos criminais corresponde a cerca de 5 meses mas os actos em apreço revelam também uma carreira criminosa constante mostrando-se o arguido incapaz de pautar a sua conduta segundo a norma, como acima referimos.

Considerando as circunstâncias acima descritas, atinentes, em conjunto, aos factos e à personalidade do agente, aqui arguido, julga-se que o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelos crimes, a recuperação do delinquente para a sociedade e a personalidade do arguido manifestada nos factos exigem que a pena única a aplicar seja fixada em 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão.

A qualquer das penas únicas aplicadas (de prisão ou multa) deverá ser descontado o período correspondente a eventual cumprimento total ou parcial de pena de prisão englobada nos cúmulos jurídicos realizados, bem assim os dias de detenção/prisão que o arguido tenha cumprido nos processos judiciais respectivos – cfr. artigos 80º, n.º 1, e 81º, n.º 1, do Código Penal – e ainda o eventual pagamento da(s) multa(s) englobadas no cúmulo.

O artigo 50.º, n.º 1, do Código Penal, na redacção que foi introduzida pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, prescreve a possibilidade de suspensão da execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.

 (…)

Pelo exposto, o Tribunal não suspenderá a execução das penas únicas de prisão aplicadas ao arguido.

3. Apreciação

a.

Insurge-se o recorrente contra o que consignado ficou no ponto 13. dos factos provados, no segmento «A pena não se mostra cumprida ou extinta », aduzindo para tanto ter o arguido cumprido e integralmente a pena de 2 [dois] anos e 3 [três] meses de prisão, que, em cúmulo jurídico, lhe foi aplicada no âmbito do identificado processo [n.º 247/11.4GAACB], pois que esteve preso à ordem do mesmo entre 13.10.2011 e 12.1.2014, circunstância que já resultava dos elementos documentais juntos aos autos antes da audiência de julgamento para efectivação dos cúmulos, concretamente de fls. 858, 864, 910, 911 e 1109 e v., pugnando, em consequência, pela alteração do aludido ponto por forma a do mesmo passar a constar: «A pena aplicada ao arguido foi integralmente cumprida entre 13.10.2011 e 12.1.2014».

Muito singelamente, porque à luz dos elementos documentais convocados – sem necessidade, portanto, de se fazer uso da certidão junta pelo Ministério Público após a prolação do acórdão – resulta suficientemente esclarecido ter o arguido/condenado cumprido integralmente, entre as datas indicadas pelo recorrente, a pena de prisão que, em cúmulo jurídico, lhe foi aplicada no âmbito do proc. n.º 247/11.4GAACB do 1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Alcobaça, impõe-se proceder à preconizada modificação da matéria de facto, passando, assim, em substituição, a constar do referido segmento do ponto 13. dos factos provados:

«A pena aplicada ao arguido foi integralmente cumprida entre 13.10.2011 e 12.1.2014».

b.

Manifesta ainda o recorrente a sua discordância relativamente à pena conjunta de 2 [dois] anos e 2 [dois] meses de prisão, aplicada no terceiro cúmulo jurídico, por entender que nunca a mesma deveria ter sido fixada em patamar inferior a 2 anos e 5 meses de prisão, indicando como disposição violada o n.º 1 do artigo 77.º do Código Penal.

Fundamenta a sua pretensão nos seguintes termos:

«No terceiro cúmulo jurídico foram englobadas as penas de 9 meses de prisão, 10 meses de prisão, 1 ano e 9 meses de prisão e 1 ano de prisão (as duas últimas aplicadas no âmbito de um só processo, o 247/11.4GAACB).

 Nestes autos, o tribunal aplicou ao arguido, no âmbito de tal cúmulo jurídico, a pena conjunta de 2 anos e 2 meses de prisão.

As penas referidas em 7. respeitam a três crimes de condução sem habilitação legal e um crime de furto simples.

No âmbito do processo 247/11.4GAACB, o arguido foi condenado, em cúmulo jurídico, na pena de 2 anos e 3 meses de prisão.

Nestes autos, o terceiro cúmulo jurídico, em que o tribunal teve de considerar mais duas penas (num total de 19 meses de prisão) que as consideradas no processo 247/11.4GAACB, o tribunal aplicou ao arguido uma pena conjunta inferior à que, em cúmulo também, havia sido aplicada ao arguido, “apenas” no âmbito do citado processo.

Na fundamentação da sua convicção, o tribunal evidenciou que “ … os actos em apreço [nomeadamente de âmbito estradal] revelam também uma carreira criminosa constante mostrando-se o arguido incapaz de pautar a sua conduta segundo a norma, como acima referimos”

Ao aplicar ao arguido, no terceiro cúmulo, a pena de 2 anos e 2 meses de prisão, apesar das considerações transcritas, o tribunal premiou o arguido com uma “diminuição” da pena conjunta anterior.

Só circunstâncias excecionais, não ocorridas e não referidas pelo tribunal, poderiam justificar tal “benevolência”.

Vejamos.

Na concretização da regra estabelecida no nº 1 in fine, do artigo 77º do Código Penal, de acordo com o qual na medida da pena - no que à punição do concurso concerne - são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, tem sido pacífico, designadamente ao nível da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, que essencial na formação da pena conjunta é a visão de conjunto, a eventual conexão dos factos entre si e a relação desse bocado de vida criminosa com a personalidade, de tal forma que a pena conjunta deve formar-se mediante uma valoração completa da pessoa do autor e das diversas penas parcelares [cf. Ac. STJ de 05.07.2012, Proc. n.º 145/06.SPBBRG.S1], o que, contudo, não dispensa o recurso às exigências de prevenção geral e especial, encontrando, também, a pena conjunta o seu limite na medida da culpa.

Por outro lado, como refere o Ac. do STJ de 27.06.2012 [proc. n.º 70/07.0JBLSB – D.S1], em caso de conhecimento superveniente, a reformulação de um cúmulo jurídico anteriormente fixado, considerando a nova realidade relativa à situação do arguido anteriormente conhecida processualmente, deve ter lugar em dois segmentos distintos: no primeiro, estando em causa a condenação em pena singular, o tribunal em função da condenação proferida e do crime anterior, conclui sobre a pena conjunta do concurso; se a condenação anterior tiver já sido em pena conjunta perante uma pluralidade de crimes, o tribunal desconsidera-a e, em função das penas parcelares concretas, anteriormente aplicadas, determina uma nova pena de conjunto que abranja todas as penas que integram o concurso e que devam ser consideradas. E isto mesmo quando tenha havido antes, por circunstâncias processuais, a aplicação de mais de uma pena única, devido à consideração em separado de conjuntos de crimes entre si em concurso, mas que posteriormente se verifica estarem afinal todos numa mesma relação de concurso por aplicação dos critérios do artigo 77º, nº 1 e 78º nº 1 do CP.

(…)

Sempre que houver que reformular o cúmulo jurídico por terem sido aplicadas novas penas parcelares, o tribunal procede às respectivas operações como se o anterior cúmulo não existisse, sem atender às penas que foram então fixadas, o que significa que, quando houver que fazer novo cálculo, a nova pena não pode ser obtida pela acumulação com a pena única anterior (cf., v.g., acórdão do STJ de 06-03-2008, processo 2428/07, CJSTJ 2008, tomo 1, pág. 248, e acórdãos de 26/11/2008, proc. n.º 3377/08; de 19/3/2009, proc. n.º 3063/09), nem a medida da pena única anterior … condiciona os limites da moldura a considerar para a (nova) fixação da pena única - [destaques nossos].

No mesmo sentido discorre o acórdão do STJ de 15.01.2104 [proc. n.º 73/10.8PAVFC.L2.S1], em cujo sumário se lê:

«I. O caso julgado relativo à formulação do cúmulo jurídico entre as penas de um processo vale rebus sic stantibus, ou seja, nas circunstâncias que estiveram na base da sua formulação.

II. Se as circunstâncias se alterarem por, afinal, do concurso fazer parte outro crime e outra pena, há uma modificação que altera a substância do concurso e a respectiva moldura penal, com a subsequente alteração da pena conjunta. Daí que, não subsistindo as mesmas circunstâncias, tem de ficar sem efeito o caso julgado em que se traduziu a primitiva pena única, adquirindo as penas parcelares toda a sua autonomia para a determinação da nova moldura penal do concurso.

(…)» - [destaques nossos].

Traçadas, no essencial, as coordenadas relevantes na matéria, apreciemos, então, o caso concreto.

A pena unitária – da qual dissente o recorrente – englobou as seguintes penas parcelares:

- A pena de 9 [nove] meses de prisão pela prática, em 02.02.2011, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do D.L. n.º 2/98, de 03.01;

- A pena 10 [dez] meses de prisão pela prática, em 24.01.2011, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do D.L. n.º 2/98, de 03.01;

- A pena de 1 [um] ano e 9 [nove] meses de prisão pela prática, em 01.06.2011, de um crime de furto simples, p.e p. pelo artigo 203.º do C. Penal;

- A pena de 1 [um] ano de prisão pela prática, em 01.06.2011, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.ºs 1 e 2 do D.L. n.º 2/98, de 03.01.

Significa, pois, à luz do n.º 2 do artigo 77.º do Código Penal [aplicável, de acordo com o artigo 78.º do CP, ao concurso superveniente], que a moldura penal abstracta a atender para efeitos do concurso de crimes, no seio da qual há-de ser encontrada a pena conjunta, se situa entre um limite mínimo de 1 [um] ano e 9 [nove] meses de prisão [correspondente à mais elevada das penas parcelares aplicadas aos vários crimes em concurso] e um limite máximo de 4 [quatro] anos e 4 [quatro] meses de prisão [correspondente à soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes].

Dentro de tal moldura considerou o tribunal a quo ajustada a pena conjunta de 2 [dois] anos e 2 [dois] meses de prisão, a qual merece a indignação do recorrente, já porque se revela inferior à pena conjunta aplicada no identificado proc. n.º 247/11.4GAACB [de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão], cujas penas parcelares integraram o terceiro cúmulo jurídico - sendo que para este último entraram, ainda,  as penas de 9 [nove] e 10 [dez] meses de prisão -, já porque não ocorreriam – nem teriam sido referidas pelo tribunal – circunstâncias excepcionais capazes de «justificar tal “benevolência”».

A propósito da natureza rebus sic stantibus do caso julgado relativo à formulação do cúmulo jurídico em caso de concurso superveniente e, bem assim, sobre a desconsideração a que é votada uma anterior pena conjunta em função das novas penas parcelares que o vão integrar já acima demos conta do sentido da jurisprudência, no essencial, concordante do Supremo Tribunal de Justiça.

Concretamente no que respeita à questão que mais parece suscitar a reacção do recorrente, qual seja a da pena conjunta encontrada ficar aquém da pena aplicada por ocasião de um anterior cúmulo jurídico, sendo que na determinação daquela para além das penas parcelares neste consideradas outras [penas parcelares] se vieram a «juntar», afigura-se-nos, com efeito, relevante o Estudo – a que se reporta o recorrente - do Conselheiro Rodrigues da Costa, disponível em http://www.stj.pt/documentacao/estudos/penal], do qual, quanto aos designados «Cúmulos anteriores transitados», se extracta:

«Por vezes sucede que o tribunal tem conhecimento da existência de um ou vários crimes que estão em concurso efectivo com outros que já foram objecto de um cúmulo anterior, que, por não ter sido impugnado em recurso, se considera transitado em julgado.

O problema que se coloca é o de saber se, no novo cúmulo a efectuar para inclusão da(s) pena(s) aplicadas pelo(s) crimes que posteriormente se descobriu estarem em concurso com os que já foram objecto de cúmulo anterior, a pena conjunta não pode ser inferior à deste.

(…)».

Indica a Autor decisões do Supremo Tribunal de Justiça nem sempre integralmente convergentes na solução, tais como os acórdãos do STJ de 22.04.2004 [proc. n.º 132-04, da 5.ª Secção], de 15.12.2007 [proc. n.º 4456/06], de 12.07.2007 [Proc. n.º 2283/07], de 06.03/2008 [proc. n.º 2428-07], de 31.10.2007 [proc. n.º 3268/07], de 10.01.2008 [proc. n.º 3184/07], acrescentando: «Em alguns casos, argumentou-se que, tendo sido fixada, em anterior cúmulo, uma determinada pena única, que não foi impugnada pelo arguido em recurso, «não faria sentido e causaria uma enorme quebra do sistema jurídico se, condenado novamente num outro processo por crimes diversos cometidos antes de transitar a primeira condenação, devesse ser condenado em nova pena conjunta inferior àquela que, de modo pacífico para a ordem jurídica, já cumpria, o que significava que o arguido iria beneficiar com uma nova condenação».

Noutras situações, embora se admitisse a possibilidade de a pena conjunta fixada em novo cúmulo ser inferior à do anterior, dito transitado em julgado, referiu-se tal solução como uma antinomia do sistema.

«Assim, nada na lei impede que a pena única conjunta a encontrar possa ser inferior a uma outra pena idêntica anteriormente fixada para parte das penas parcelares, embora esse resultado se apresente como uma antinomia do sistema, uma vez que tendo a anterior pena única conjunta transitado em julgado e começado a ser executada, se vê reduzida, aquando da consideração de mais pena(s).

Mas seguramente não sofrerá da mesma crítica a manutenção do mesmo valor da pena única anteriormente fixada, apesar da consideração de mais uma pena, se dado o tempo decorrido desde a prática do facto e o desenvolvimento da personalidade do agente se mostrar desnecessária a agravação da pena anterior … ».

(…)

A possibilidade de se determinar uma pena conjunta abaixo da medida fixada em anterior cúmulo só pode assentar nas regras e princípios próprios que enformam a disciplina do cúmulo jurídico, nomeadamente em caso de conhecimento superveniente de concurso de crimes».

Concluindo o Estudo: «Claro que a regra não pode ser (mas isso por uma questão de lógica, implicada na natureza das próprias coisas) a fixação de uma pena conjunta inferior à do cúmulo anterior, pois se há uma maior acervo de crimes, do que os que foram apreciados anteriormente e, em consequência, se alteram os limites da moldura penal abstracta, nomeadamente o limite máximo, que passa a ser mais elevado, em princípio, haverá de corresponder-lhe uma pena também mais elevada. Mas nada impede que se faça uma outra leitura da globalidade dos factos, em conjugação com a personalidade unitária do agente, da qual resulte uma pena conjunta mais «benévola». Como tal pode acontecer se a pena anterior tiver sido estabelecida em medida francamente desajustada e desproporcionada.» - [destaque nosso].

A respeito da temática em questão escreve o Prof. Paulo Pinto de Albuquerque: «No caso de a anterior condenação transitada em julgado ter por objecto um concurso efectivo de crimes, o tribunal deve “desfazer” (rectius, anular) o anterior concurso e formar um novo concurso com as penas singulares do anterior concurso e a pena do crime novo. A pena do anterior cúmulo não tem qualquer efeito bloqueador da fixação de uma pena conjunta nova inferior à anterior pena conjunta, que só poderia resultar de lei expressa (…). Não há qualquer “caso julgado” da anterior pena conjunta, pois o tribunal é chamado a fazer uma nova valoração dos factos e da personalidade do agente, podendo concluir uma pena conjunta inferior à anterior pena conjunta desde que superior à pena concreta mais grave. Atenta a sua natureza contra reum, o referido efeito bloqueador só poderia ser fixado pelo legislador, não podendo ser estabelecido pelo intérprete.» - [cf. “Comentário do Código Penal”, Universidade Católica Editora, pág. 247] – [destaques nossos].

Idêntica orientação – crê-se – decorre das palavras do Prof. Figueiredo Dias quando, reportando-se ao regime do «concurso superveniente», refere: «Se a condenação anterior tiver sido já em pena conjunta, o tribunal anula-a e, em função das penas concretas constantes daquela e da que considere cabida ao crime agora conhecido, determina uma nova pena conjunta que abranja todo o concurso» - [cf. “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas, Editorial Notícias, pág. 295].

Isto dito, com o respeito devido pelas diferentes sensibilidades, temos para nós que em caso de «concurso superveniente», a operação tendente a encontrar a pena conjunta, na qual se incluam penas parcelares que, por seu turno, já anteriormente hajam dado origem a uma pena conjunta, apenas se tem de ater às ditas penas parcelares, desconsiderando, por isso, as eventuais penas conjuntas, antes fixadas, ou seja encarando-as como se nunca tivessem existido, pois só assim se dá corpo às asserções - que não parecem suscitar controvérsia - no sentido de que não há qualquer caso julgado da anterior pena conjunta, procedendo o tribunal às respectivas operações como se o anterior cúmulo não existisse, sem atender, portanto, às penas [conjuntas] que foram então fixadas, não condicionando, em consequência, a medida da pena única anterior os limites da moldura a considerar para a (nova) fixação da pena única, a qual, naturalmente, no seio dos parâmetros ditados pela lei quanto ao respectivo limite mínimo e máximo do concurso [sempre ditado pelas penas parcelares], há-de ser encontrada atendendo aos factos e à personalidade do agente, considerados no seu conjunto como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpretado, «interpretação», esta, que se nos apresenta fiel aos princípios.

Não podemos, assim, deixar de expressar a nossa divergência com a posição que vem defendida pelo recorrente, não encarando a circunstância de o tribunal ter fixado a nova pena conjunta numa pena de prisão situada aquém de uma anterior pena conjunta, entretanto – como não nos parece poder ter sido de outro modo – desconsiderada, qualquer violação da norma jurídica indicada, não merecendo, com tal fundamento, censura o acórdão recorrido.

Donde, em caso de concurso superveniente – como sucede nos autos –, a adequação da pena conjunta tem de ser aferida dentro dos critérios colocados pelo legislador, sendo na respectiva concretização que se há-de concluir se a pena conjunta encontrada se mostra adequada e proporcional à gravidade do ilícito global perpretado.

Ora, aqui chegados recuperando a argumentação expendida no acórdão recorrido [Relativamente ao terceiro cúmulo, repetem-se aqui as mesmas considerações já evidenciadas relativamente aos primeiro e segundo cúmulos sendo de referir que no que toca aos crimes praticados, todos punidos com pena de prisão, são na esmagadora maioria crimes associados à condução rodoviária. Assim, para além dos três crimes de condução sem habilitação legal está ainda em cúmulo um crime de furto simples, revelando homogeneidade na perspectiva dos bens jurídicos violados. O período de tempo no qual se verificou a prática dos ilícitos criminais corresponde a cerca de 5 meses mas os actos em apreço revelam também uma carreira criminosa constante mostrando-se o arguido incapaz de pautar a sua conduta segundo a norma, como acima referimos], com referência aos vectores orientadores da fixação da pena conjunta, onde se destaca a identidade, no essencial, dos tipos de ilícito em questão [estamo-nos a reportar aos três crimes de condução sem habilitação legal, sendo o outro de furto simples], bem como o curto período temporal que mediou entre os mesmos, sem olvidar a dificuldade demonstrada pelo arguido na interiorização do desvalor das suas condutas – no que respeita à condução sem habilitação legal - não temos, no seio da moldura penal abstracta correspondente ao concurso, por desajustada a pena conjunta de 2 [dois] anos e 2 [meses] de prisão.

Bem vistas as coisas a preconizada – pelo recorrente - pena de 2 [dois] anos e 5 [cinco] meses de prisão, traduzir-se-ia num acréscimo de fraco alcançe, circunstância que não deixa de denunciar o reconhecimento, no essencial, da observância pelo Colectivo dos princípios e normas que norteiam a matéria.

                   Acresce que, como vem referido no acórdão do STJ de 29.05.2008 [disponível em www.dgsi.pt] – cuja doutrina se nos afigura obter, também, acolhimento no caso da pena conjunta - citando o Prof. Figueiredo Dias “pode sindicar-se a decisão de determinação da medida da pena, quer quanto à correcção das operações de determinação ou do procedimento, à indicação dos factores que devem considerar-se irrelevantes ou inadmissíveis, à falta de indicação de factores relevantes, ao desconhecimento pelo tribunal ou à errada aplicação dos princípios gerais de determinação, quer quanto à questão do limite da moldura da culpa, bem como à forma de actuação dos fins das penas no quadro da prevenção, mas já não a determinação dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto da pena, salvo perante a violação das regras da experiência ou a sua desproporção da quantificação efectuada” [sublinhado nosso], o que manifestamente não transparece ocorrer na situação em apreço.

                        É, pois, de manter, nesta parte, o acórdão recorrido, o qual não viola o preceito legal invocado.

III. Decisão

Termos em que, acordam os juízes que compõem este tribunal, na parcial procedência do recurso, em:

a. Proceder à alteração do ponto 13. dos factos provados, passando, assim, em substituição, a constar do referido segmento: «A pena aplicada ao arguido foi integralmente cumprida entre 13.10.2011 e 12.1.2014»;

b. No mais manter o acórdão recorrido.

Sem tributação

Coimbra, 3 de Dezembro de 2014  

(Maria José Nogueira - relatora)

(Isabel Valongo - adjunta)