Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra
Processo:
3912/13.8YIPRT.C1
Nº Convencional: JTRC
Relator: LUIS CRAVO
Descritores: MAPA JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DA RELAÇÃO
COMPETÊNCIA TERRITORIAL
PROCESSO PENDENTE
Data do Acordão: 11/03/2014
Votação: DECISÃO SUMÁRIA
Tribunal Recurso: COMARCA DE AVEIRO - AVEIRO - INST. LOCAL - SECÇÃO CÍVEL - J2
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: DECLARAÇÃO DE INCOMPETÊNCIA
Legislação Nacional: LEI Nº 62/2013 DE 26/8, DL Nº 49/2014 DE 27/3
Sumário: 1.- O art.103 do ROFTJ ( DL nº 49/2014 de 27/3) dispõe que “ a competência dos actuais tribunais da Relação mantém-se para os processos neles pendentes”.

2.- Por força do argumento a contraio sensu, essa competência não se mantém ou existe para um recurso que dê entrada na secretaria do Tribunal da Relação a partir do dia 1 de Setembro de 2014.

Decisão Texto Integral:
A (…) Lda., com sede na Rua (...), em Aveiro, instaurou junto do Balcão Nacional de Injunções a presente acção declarativa para cumprimento de obrigações pecuniárias contra C (…), residente na Travessa (...), Aveiro, pedindo a condenação do requerido no pagamento da quantia de € 13.606,27, acrescida de juros de mora.

Regularmente citado veio o requerido apresentar oposição.

Face a tal, foram os autos distribuídos junto dos Juízos de Pequena e Média Instância Cível de Aveiro da Comarca do Baixo Vouga.

            Tendo seguido os autos nessa instância o seu normal processualismo, veio em 14.03.2014 a ser proferida sentença, no sentido da improcedência da acção, com a consequente absolvição do Requerido do pedido.

Desta sentença foi na sequência interposto recurso de apelação pela Requerente, admitido como tal em 24.06.2014, mais se determinando nesse mesmo despacho o correspondente envio para este Tribunal da Relação de Coimbra.

            Em cumprimento desta última decisão, e provindos já da “Comarca de Aveiro – Instância Local de Aveiro - Secção Cível - J2”, os autos deram entrada e foram distribuídos neste Tribunal da Relação de Coimbra em 30.10.2014.

            Acontece que como flui do exposto, tal veio a suceder já após o dia 1 de Setembro de 2014, isto é, já na vigência do novo “Mapa Judiciário” – decorrente da Lei da Organização do Sistema Judiciário (Lei nº 62/2013 de 26 de Agosto[1]), e da sua regulamentação e estabelecimento do regime aplicável à organização e funcionamento dos tribunais judiciais (DL nº 49/2014, de 27 de Março[2]).

            Ora, consabidamente com as regras e normas do dito novo “Mapa Judiciário”, foi criada a Comarca de Aveiro, a qual tem agora competência territorial, nomeadamente para a área do Município de Aveiro, sendo que, por sua vez, o Tribunal da Relação do Porto passou a ter competência territorial para a área da Comarca de Aveiro (cf. art. 64º e mapas II e III, anexos ao dito R.O.F.T.J.).

            Neste quadro, entendemos que o Tribunal territorialmente competente para a apreciação e decisão do presente recurso é inquestionavelmente o Tribunal da Relação do Porto.

            Na verdade, a remessa para este Tribunal da Relação de Coimbra apenas era e é concebível antes da vigência do dito novo “Mapa Judiciário”, isto é, enquanto o dito Tribunal da Relação de Coimbra tinha competência na área da circunscrição da anterior Comarca do Baixo Vouga.

            Note-se que o art. 103º do citado R.O.F.T.J. expressamente estatui que “a competência do atuais tribunais da Relação mantém-se para os processos neles pendentes”, donde, por argumento “a contrario sensu”, essa competência não se mantém ou existe para um recurso como o presente que apenas deu entrada na secretaria deste Tribunal da Relação de Coimbra em 30 de Outubro de 2014 (cf., ainda, o art. 259º do n.C.P.Civil)…

            Por outro lado, cremos que a este entendimento nem sequer obsta o disposto no art. 38º da supra citada L.O.S.J., norma na qual se encontrando consagrado o princípio da perpetuatio iurisditionis, não deixa ela própria de ressalvar o caso da atribuição de competência a um órgão (leia-se, o Tribunal da Relação do Porto) que inicialmente dela eventualmente carecia (cf. nº 2 dessa norma).

            Sendo certo que o legislador que empreendeu a reforma do dito novo “Mapa Judiciário”, expressamente entendeu estabelecer uma regra/disposição transitória especial através do dito art. 103º do citado R.O.F.T.J., com o objectivo muito claro e assumido de impor as novas regras de competência territorial com efeitos tão imediatos quanto possíveis, apenas ressalvando de tal os recursos já pendentes, o que não sucede no caso vertente em relação a este Tribunal da Relação de Coimbra.

            O que, aliás, bem se compreende em termos dogmáticos, na medida em que estando apenas em causa uma norma relativa à competência territorial/hierárquica para o julgamento do recurso, pode e deve ser de aplicação imediata.[3]

            Ademais outra interpretação não cobra sentido nem atende à realidade agora existente, com dimensionamento já implementado da composição ao nível dos quadros funcionais dos tribunais da Relação (número e composição das respectivas secções) em função da actual competência na área das respectivas circunscrições.

            Consabidamente é de conhecimento oficioso a incompetência relativa – como é o caso de um recurso dar entrada para uma Relação diferente daquela a que está hierarquicamente subordinado o tribunal recorrido (cf. arts. 83º e 104º, nº1, al.a) do n.C.P.Civil).

            Assim sendo e face a tudo o exposto, declara-se a incompetência territorial deste Tribunal da Relação de Coimbra, determinando-se que, após trânsito em julgado deste despacho, sejam os autos remetidos para superior decisão do recurso interposto, ao Tribunal da Relação do Porto.

                                                                       *

            Sem custas.

                                                                       *

            Notifique.

 Coimbra, 3 de Novembro de 2014

                                                     (Luís Filipe Cravo - Relator)


[1] doravante designada por L.O.S.J.
[2] doravante designada por R.O.F.T.J.
[3] Vide neste sentido, ANTUNES VARELA/J. MIGUEL BEZERRA/ SAMPAIO E NORA, in “Manual de Processo Civil”, 2ª ed., Coimbra Editora, 1985, a págs. 55.