Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01866/07.9BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/18/2020
Tribunal:TAF do Porto
Relator:António Patkoczy
Descritores:IRS- RENDIMENTOS EMPRESARIAIS. AFECTAÇÃO DE BENS DO PATRIMÓNIO PARTICULAR A ACTIVIDADE EMPRESARIAL. DETERMINAÇÃO DO RENDIMENTO.
VALOR DE AQUISIÇÃO: VALOR DE MERCADO.
Sumário:Sumário:
I. No âmbito do apuramento de resultados de mais-valias considerados no âmbito de actividade comercial incluídos nos rendimentos da Categoria B do IRS, tratando-se de um caso de afectação de bens do património particular a actividade empresarial do s.p. e a que se refere o disposto na 2ª parte da alínea c), do nº2, do artº 3º do CIRS, o valor de aquisição a considerar é o do valor de mercado de tais bens á data da afectação, como resulta do disposto no nº2, do artº 29º, do mesmo Código.
II. Não releva nessas situações as regras aplicáveis ao apuramento dos rendimentos da categoria G, ínsitos nos artºs 43º e segs, do CIRS, que apenas dizem respeito aos rendimentos tidos como de incrementos patrimoniais ao abrigo do disposto nos artºs 9º e 10º, do mesmo Compêndio legal. *
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:Fazenda Pública.
Recorrido 1:M.
Votação:Unanimidade
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I Relatório

A F.P. vem recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial apresentada pela Impugnante M., contra a liquidação de IRS do ano de 2005.
O recorrente formula, para o efeito, as seguintes conclusões:
“A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que ditou a anulação da liquidação de IRS impugnada, no que respeita aos rendimentos da atividade empresarial, e a retificação da liquidação nos termos que resultam da declaração de substituição apresentada pela Impugnante, com a consequente restituição do imposto pago pela Impugnante, acima do valor que resultar da liquidação da declaração de IRS apresentada.
B. Nos presentes autos de Impugnação, a Autora questiona a legalidade da liquidação de IRS relativa ao ano de 2005, n° 2006.5004400545, que resultou da declaração de IRS que apresentou em 12-05-2006; pretende que sejam aceites os valores declarados na declaração de substituição, que apresentou em 30-11-2016, designadamente os rendimentos relativos à categoria B - rendimentos empresariais.
C. Alegou ter ocorrido errónea qualificação e quantificação dos rendimentos obtidos no ano de 2005, no que à sua atividade empresarial respeita, porquanto no apuramento dos rendimentos decorrentes da venda de 8 lotes de terreno não considerou inicialmente, como devia, o valor de mercado dos referidos lotes de terreno à data da sua afetação à atividade exercida, situação que veio a corrigir através da declaração de substituição entregue, mas que, de forma tácita, não veio a ser aceite pela AT.
D. A douta sentença considerou provados entre outros os seguintes factos:
1. Por escritura pública de 13/11/1961, a Impugnante declarou adquirir os seguintes prédios situados no Lugar do (...), freguesia de (...), do concelho de (...):
a) casa com terreno lavradio, descrita na 2.° Conservatória do Registo Predial sob os n.0s 13490 e inscrito na matriz predial sob o artigo 436 (urbano) e 212 (rustico);
b) terreno a mato e pinheiro, descrito na 2.° Conservatória do Registo Predial sob os n.0s 3428 e inscrito na matriz predial sob o artigo 511 - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
(...)
4. Em 14/10/1998, foi emitido em nome da Impugnante, o alvará de loteamento n.° 15/98, que licencia o loteamento, autorizando a constituição de 39 lotes de terreno e as obras de urbanização que incidem sobre os prédios rústicos e urbano sitos no Lugar do (...), freguesia de (...), do concelho de (...), descritos na 2.° conservatória do Registo Predial sob os n.ºs 00954/200189 e 00955/200189 e inscritos na respetiva matriz sob os n.0s 644, 687 e 436, respetivamente, da referida freguesia - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
5. Em 14/12/1998, a Impugnante declarou a inscrição na matriz de terrenos destinados a construção urbana, que constituem os lotes n.° 9, 10, 11, 12, 13, 25 e 27 do alvará de loteamento n.° 15/98, correspondente a parte dos artigos 644 e 687 rústicos e 436 urbano, com data de passagem a urbano de 14/10/1998, descritos na 2.° conservatória do Registo Predial sob os n.0s 00954/200189 e 00955/200189, os quais depois de anexados deram origem ao prédio misto descrito na 2.° Conservatória do Registo Predial sob o n.° 02668/210199 - cfr. o p.a. e o p.a. de reclamação graciosa apenso.
6. Aos terrenos indicados em 5), couberam os artigos matriciais n.°s 3288 (lote 9), 3289 (lote 10), 3737, com origem no artigo 3290 (lote 11), 3738 com origem no artigo 3291 (lote 12), 3292 (lote 13), 3304 (lote 25) e 3306 (lote 27) - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
7. Nesse ano, os bens imóveis referidos em 5) foram afetos à atividade comercial da Impugnante - facto confessado no artigo 5.0 da p.i..
(...) 
10. Em 28/05/1999, a Impugnante apresentou declaração de início da atividade de compra e venda de bens imobiliários, com efeitos a partir de 02/01/1999 - cfr. fls. 66-69 do processo físico.
(...)
11. Em 2005, a Impugnante alienou os artigos 3288 (lote 9), 3289 (lote 10), 3737 (lote 11), 3738 (lote 12), 3292 (lote 13), 3320 (prop. total), 3304 (lote 25) e 3306 (lote 27), no âmbito da sua atividade comercial - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
(...)
13. Em 12/05/2006, a Impugnante apresentou a sua declaração de rendimentos relativa a 2005, em que declara que auferiu nesse ano rendimentos da categoria H-pensões, no montante de €66.636,92 e rendimentos da categoria B-empresariais (regime da contabilidade organizada), pela sua atividade de compra e venda de imóveis de €249.516,84 - cfr. o doc. 1 junto com a p.i..
14. Com base na declaração referida em 12), a AT emitiu a liquidação n.° 2006 00801305859, no montante de € 88.306,90, com data limite de pagamento de 16/10/2006, que a Impugnante pagou nessa data - cfr. o doc. 2 junto com a p.i..
15. Por entender que a declaração referida em 12) não estava correta quanto aos proveitos da sua atividade empresarial, em 30/11/2006, a Impugnante entregou declaração de substituição, em que inscreveu no anexo C - categoria B (regime da contabilidade organizada) como resultado líquido do exercício o valor de € 45.936,94, resultando da diferença entre o total dos proveitos, no montante de €421.342,63 (correspondente ao valor de venda daqueles 8 lotes de terreno, no montante de € 419.524,00, acrescido de €1.818,63, a título de variação de produto) e o total de custos, no montante de €375.405,69 (constituído pelos valores de 351.421,97, sendo €349.603,34, o valor de custo/aquisição declarado dos mesmos à data em que foram afetados, 1999, à atividade comercial da Impugnante e €1.818,63, a título de custo de materiais consumidos, de €17.017,07, a título de fornecimentos e serviços externos e de €6.966,65, a título de impostos) - cfr. os docs. 3 e 4 juntos com a p.i..
E. A Fazenda Pública não se conforma com a sentença proferida, por entender que a mesma enferma de erro de julgamento de facto e de direito, por ter considerado provado que, no ano de 1998, a Impugnante afetou à sua atividade comercial os lotes de terreno para construção.
F. Diversamente, a Fazenda Pública entende que dos autos resulta que os prédios afetos à atividade da impugnante, foram os prédios que deram origem, após transformação, aos lotes de terreno, isto é, os prédios identificados no ponto 1) do Probatório, e nesse sentido requer a alteração da matéria dada como provada no ponto 7 do probatório, devendo passando a constar:
"6. (...) 7. Nesse ano, os bens imóveis referidos em 1) foram afetos à atividade comercial da Impugnante - facto confessado no art.° 5° da petição inicial."
G. Pois, os bens que a impugnante afetou à sua atividade foram ainda os prédios rústicos inscritos sob os artigos 644° e 687° e o prédio misto artigo 436°, todos da freguesia de (...), e não os lotes de terreno que surgiram após a operação de loteamento.
H. A Impugnante procedeu a todas as operações burocráticas tendentes ao loteamento dos prédios rústicos, 644° e 686° e urbano, 436°, tendo como objetivo a sua valorização.
I. De acordo com o Alvará de loteamento n° 15/98, emitido em 14 de outubro de 1998, foi requerido o licenciamento e respetivas obras de urbanização que incidem sobre os prédios rústicos 644 e 687 da freguesia de (...), concelho de (...) e urbano 436°, descritos na C.R. Predial sob a ficha n° 02668 de 21.01.99.
J. Ainda de acordo com aquele Alvará, o loteamento e as respetivas obras de urbanização foram aprovados respetivamente pelas deliberações de 14/07/1986, 12/06/1989 e 04/05/1992 e por despacho de 03/07/1993, para a constituição de trinta e nove lotes de terreno, tendo sido paga a taxa municipal de urbanização pela guia de receita n° 506/92 de 14 de setembro. Foi prestada caução através de garantia bancaria emitida em 27 de julho de 1998. 
K. A relevância desta informação advém, em nossa opinião, para entender que os atos tendentes à obtenção do Alvará de loteamento precederam a sua emissão que só veio a ocorrer em 14 de outubro de 1998.
L. Assim, em data anterior à emissão daquele Alvará, a Impugnante M., usando os prédios rústicos 644° e 686° e urbano 436°, desenvolveu uma atividade que o Código do IRS prevê como atividade de natureza comercial ou industrial, isto é a atividade urbanística e de exploração de loteamentos.
M. Nos artigos 5° e 6° da douta petição inicial, a Autora, acede que afetou à sua atividade os imóveis descritos na 2a Conservatória do Registo Predial de .. sob os n°s 00954/200189 e 00955/200189 inscritos na matriz predial urbana sob o art.° 644° e na matriz predial rústica sob os artigos 687° e 436°.
N. A reconversão urbanística que em si é uma atividade industrial não se confunde com o alvará que a autoriza, lhe fixa condicionantes, nomeadamente o prazo de execução.
O. Depois de implementado o loteamento, a Impugnante procedeu à inscrição dos lotes na matriz, que causaram a eliminação dos prédios anteriores, por transformação em vários prédios urbanos, constituídos por lotes de terreno destinados à construção urbana.
P. Ora a decisão recorrida, considera que os prédios que a Autora utilizou, para exercer a atividade, foram já os lotes de terreno, o que em nossa opinião e ressalvado o devido respeito, constitui um erro.
Q. Porque os lotes de terreno, são já o resultado do exercício de atividade de exploração de loteamento, prevista no art° 4° n° 1 alínea e) do CIRS na redação ao tempo dos factos. 
R. Na verdade, o que releva é, não apenas a decisão de lotear o terreno, mas a sua concretização mediante a realização no terreno de diversas infra-estruturas urbanísticas e a promoção do processo de loteamento, com o propósito objetivado de obter lucros mediante a venda dos lotes, pois esta atividade com vista à obtenção de lucro, mesmo que seja acidental ou isolada, é que é determinante para a qualificação dos ganhos.
S. Por isso, defendemos que o valor de aquisição a considerar não deverá ser o valor de mercado relativo aos lotes de terreno, que são já produto da atividade, como pretende a Impugnante com a entrega da declaração de substituição, mas o valor dos prédios (misto e rústicos) com que iniciou a atividade de loteamento, como advém da declaração de IRS inicialmente entregue e cuja liquidação constitui o objeto dos presentes autos.
T. Sendo a operação de loteamento considerada uma atividade comercial, dever-se-á efetuar o início de atividade reportada à data do início de operação de loteamento como sujeito passivo de IRS, titular de rendimentos da categoria B/C, e afetar os prédios utilizados para a operação de loteamento a essa mesma atividade.
U. O que a Impugnante acabou por fazer, com a entrega da declaração de substituição e pretendia que a AT aceitasse era, afinal, que se desprezasse a atividade que desenvolveu (de loteamento) antes da atividade de venda de bens imobiliários, mas que se admitisse todos os custos com a transformação dos prédios, em lotes, como se estes surgissem ad novo na atividade (de compra e venda) que deu início em 1999. O que, como alegamos supra, não corresponde à verdade. 
V. Com o devido respeito, que é muito, a douta decisão, errou desde logo ao considerar provado que os bens que a impugnante afetou à atividade foram os lotes de terreno descritos no ponto 5 do probatório.
W. Assim vem requerer, a alteração do ponto 7 do douto probatório, a fim de nele passar a constar o seguinte:
6. (...)
X. 7. Nesse ano, os bens imóveis referidos em 1) foram afetos à atividade comercial da Impugnante - facto confessado no art.0 5o da petição inicial."
Y. A douta sentença em recurso, ao determinar a anulação da liquidação de IRS impugnada, e a retificação da liquidação de IRS de 2005, no que tange aos rendimentos da atividade empresarial da Impugnante, nos termos que resultam da declaração de substituição apresentada, fez errado julgamento da matéria de facto, primeiro porque levou ao probatório factos que não resultam dos elementos tidos nos autos e valorou erradamente os mesmos, o que levou a que o tribunal a quo errasse na decisão tida a final, e incorrendo em erro de julgamento de direito, com referência nomeadamente do art° 4° n°1 alínea e) do CIRS.
Pelo exposto e pelo muito que V. Exas doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente, revogada a sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA.”
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A recorrida apresentou contra-alegações em que sustenta as seguintes conclusões:
1. O recurso é infundado, não havendo razão para alterar a decisão recorrida.
2. A Fazenda Pública reitera no erro.
3. O ponto axial a decidir era o de saber qual o valor a atribuir aos lotes de terreno que foram afectados pela Recorrida à sua actividade empresarial. 
4. Bem andou a decisão recorrida ao considerar que o valor a atribuir deve ser o valor de mercado à data da afectação, tal como preceitua o art.° 29.° do CIRS.
5. Ora o valor de mercado foi indicado pela Recorrida e não foi colocado em causa pela AT, que, pelo contrário, o aceitou.
Termos em que o recurso deve ser julgado improcedente, mantendo- se a sentença recorrida”.
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Foram os autos com vista do Magistrado do Ministério Publico que emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, tendo afirmado designadamente, o seguinte:
Conforme bem se explica na sentença: “Como resulta da matéria levada ao probatório, está em causa a tributação do resultado da venda, no ano de 2005, de 8 lotes de terreno abrangidos pelo alvará de loteamento n.° 15/98, emitido em 14/10/1998, pela Câmara Municipal de (...), em nome da Impugnante, através do qual foi autorizada a constituição de 39 lotes de terreno e as respectivas obras de urbanização do imóvel por esta adquirido em 1961 (cfr. os itens 1), 4) e 11) do probatório).
Ora, a exploração do loteamento do terreno efetuada a partir de 14/10/1998 pela Impugnante é considerada uma actividade comercial nos termos do disposto no artigo 4.°, n.° 1, alínea g) do Código do IRS (actividade «urbanística e exploração de loteamentos»), sendo os ganhos decorrentes da alineação onerosa dos lotes de terreno imputáveis a tal actividade (cfr. o artigo 3.°, n.° 2, alínea c)).
Por outro lado, como houve afetação à actividade empresarial exercida pela Impugnante de um bem do seu património particular, no momento da ulterior alienação dos bens em causa - os lotes de terreno há lugar ao apuramento de dois ganhos, conforme supra mencionado: um resultante da afetação do imóvel à actividade empresarial e profissional (tributado como rendimento da categoria G, nos termos do disposto no artigo 10.°, n.° 1, alínea a)) e outro decorrente da alienação dos lotes resultantes da actividade de exploração de loteamento exercida (tributado como rendimento da categoria B, nos termos do disposto no artigo 3.°, n.° 2, alínea c)).
Ora como os ganhos derivados da afetação do prédio a uma actividade empresarial de loteamento exercida pela Impugnante verificada em 1998 com a emissão do alvará de loteamento n.° 15/98, de 14 de Outubro, não eram passíveis de tributação em Imposto de Mais- Valias, porquanto o imóvel havia sido adquirido em 1961, logo antes da entrada em vigor do Código do IRS, aplica-se a estes a exclusão de tributação prevista no n.° 1, do art.° 5.° do Decreto-Lei n.° 442-A/88, de 30 de Novembro (note-se que, se não fosse de aplicar tal exclusão de tributação, o saldo entre as mais e menos valias seria tributado em 50% do seu valor, devendo para o efeito considerar-se, como valor de realização, o valor de mercado à data de afetação e, como valor de aquisição, o correspondente ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele - artigos 43.°, n.° 2, 44.°, n.° 1, c) e 46.°, n.° 3 do Código do IRS).
Diversamente, a venda dos lotes de terreno ocorrida em plena vigência do Código do IRS, precedida de uma operação de loteamento do terreno, sendo os bens alienados, jurídica e economicamente, distintos dos bens que estiveram na sua origem (recorde-se que o bem adquirido pela Impugnante foi dividido em 39 lotes autónomos, dos quais 8 foram objecto de alienação em 2005), o que pressupõe uma actividade desenvolvida para o efeito no sentido da sua valorização, retira aos ganhos assim obtidos a natureza fortuita caracterizadora dos ganhos de mais-valias, configurando-os como ganhos imputáveis a uma actividade geradora de rendimentos empresariais e profissionais, sujeitos a tributação em sede de IRS, no âmbito da categoria B, de acordo com o disposto nos artigos 3.°, n.° 2, alínea c) e 4.°, n.° 1, alínea g), ambos do Código do IRS.”
Face ao exposto, o recurso não merece provimento.”
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Com dispensa dos vistos legais e com a concordância dos Juízes- Adjuntos, cumpre apreciar e decidir. - cfr nº 4, do artº 657º do CPC
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A questão que importa apreciar é de saber, nos termos suscitados em sede recursiva que limitam as questões a ser apreciadas pela instância de recurso, se a sentença errou ao julgar que no apuramento da mais-valia geradora de rendimentos empresariais nos casos de afectação de determinados bens do património particular do recorrido á sua actividade empresarial se deveria reportar á data em que procedeu ás operações tendentes ao loteamento dos prédios na sequência do qual declarou o início da actividade comercial de compra e venda de imóveis, e de acordo com o valor de mercado da aquisição dos bens a essa data, ou ao invés se deveria ater á data de aquisição dos mesmos antes das ditas operações urbanísticas .
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II Fundamentação

Matéria de Facto
A decisão recorrida deu como provada a seguinte matéria de facto:
1. Por escritura pública de 13/11/1961, a Impugnante declarou adquirir os seguintes prédios situados no Lugar do (...), freguesia de (...), do concelho de (...):
a) casa com terreno lavradio, descrita na 2.° Conservatória do Registo Predial sob os n.°s 13490 e inscrito na matriz predial sob o artigo 436 (urbano) e 212 (rustico);
b) terreno a mato e pinheiro, descrito na 2.° Conservatória do Registo Predial sob os n.°s 3428 e inscrito na matriz predial sob o artigo 511 - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
2. O terreno referido em 1b) supra passou a corresponder ao descrito na 2.° Conservatória do Registo Predial sob o n.° 00954/300189 - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
3. O prédio misto referido em 1a) supra passou a corresponder ao descrito na 2.° Conservatória do Registo Predial sob o n.° 00955/300189 - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
4. Em 14/10/1998, foi emitido em nome da Impugnante, o alvará de loteamento n.° 15/98, que licencia o loteamento, autorizando a constituição de 39 lotes de terreno e as obras de urbanização que incidem sobre os prédios rústicos e urbano sitos no Lugar do (...), freguesia de (...), do concelho de (...), descritos na 2.° conservatória do Registo Predial sob os n.°s 00954/200189 e 00955/200189 e inscritos na respetiva matriz sob os n.°s 644, 687 e 436, respetivamente, da referida freguesia - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
5. Em 14/12/1998, a Impugnante declarou a inscrição na matriz de terrenos destinados a construção urbana, que constituem os lotes n.° 9, 10, 11, 12, 13, 25 e 27 do alvará de loteamento n.° 15/98, correspondente a parte dos artigos 644 e 687 rústicos e 436 urbano, com data de passagem a urbano de 14/10/1998, descritos na 2.° conservatória do Registo Predial sob os n.°s 00954/200189 e 00955/200189, os quais depois de anexados deram origem ao prédio misto descrito na 2.° Conservatória do Registo Predial sob o n.° 02668/210199 - cfr. o p.a. e o p.a. de reclamação graciosa apenso.
6. Aos terrenos indicados em 5), couberam os artigos matriciais n.°s 3288 (lote 9), 3289 (lote 10), 3737, com origem no artigo 3290 (lote 11), 3738 com origem no artigo 3291 (lote 12), 3292 (lote 13), 3304 (lote 25) e 3306 (lote 27) - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
7. Nesse ano, os bens imóveis referidos em 5) foram afetos à atividade comercial da Impugnante - facto confessado no artigo 5.° da p.i..
8. Ainda em 14/12/1998, a Impugnante declarou a alteração e ampliação do prédio inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 511 (parte) e em parte dos artigos 644 e 687 rústicos, que passou a ter a descrição de urbano, composto de casa de cave, rés-do-chão e andar, com quintal, destinada a habitação - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
9. Ao prédio indicado em 8), coube o artigo matricial 3320 com origem no artigo 3303 -cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
10. Em 28/05/1999, a Impugnante apresentou declaração de início da atividade de compra e venda de bens imobiliários, com efeitos a partir de 02/01/1999 - cfr. fls. 66-69 do processo físico.
11. Em 2005, a Impugnante alienou os artigos 3288 (lote 9), 3289 (lote 10), 3737 (lote 11), 3738 (lote 12), 3292 (lote 13), 3320 (prop. total), 3304 (lote 25) e 3306 (lote 27), no âmbito da sua atividade comercial - cfr. o p.a. de reclamação graciosa apenso.
12. A soma dos preços pagos pelos respetivos compradores ascendeu a €419.524,00 – facto não controvertido.
13. Em 12/05/2006, a Impugnante apresentou a sua declaração de rendimentos relativa a 2005, em que declara que auferiu nesse ano rendimentos da categoria H-pensões, no montante de €66.636,92 e rendimentos da categoria B-empresariais (regime da contabilidade organizada), pela sua atividade de compra e venda de imóveis de €249.516,84 - cfr. o doc. 1 junto com a p.i..
14. Com base na declaração referida em 12), a AT emitiu a liquidação n.° 2006 00801305859, no montante de € 88.306,90, com data limite de pagamento de 16/10/2006, que a Impugnante pagou nessa data - cfr. o doc. 2 junto com a p.i..
15. Por entender que a declaração referida em 12) não estava correta quanto aos proveitos da sua atividade empresarial, em 30/11/2006, a Impugnante entregou declaração de substituição, em que inscreveu no anexo C - categoria B (regime da contabilidade organizada) como resultado líquido do exercício o valor de €45.936,94, resultando da diferença entre o total dos proveitos, no montante de €421.342,63 (correspondente ao valor de venda daqueles 8 lotes de terreno, no montante de € 419.524,00, acrescido de €1.818,63, a título de variação de produto) e o total de custos, no montante de €375.405,69 (constituído pelos valores de €351.421,97, sendo €349.603,34, o valor de custo/aquisição declarado dos mesmos à data em que foram afetados, 1999, à atividade comercial da Impugnante e €1.818,63, a título de custo de materiais consumidos, de €17.017,07, a título de fornecimentos e serviços externos e de €6.966,65, a título de impostos) - cfr. os docs. 3 e 4 juntos com a p.i..
16. A declaração referida em 15) foi convolada em reclamação graciosa, sobre a qual não foi proferida qualquer decisão - cfr. o p.a. apenso.
17. A presente impugnação judicial foi deduzida em 04/09/2007 - cfr. a fls. 1 dos autos.
Mais se provou, com interesse para a decisão, o seguinte:
18. Pelo ofício n.º 60936/0505, de 16/09/2010, foi remetida carta-aviso à Impugnante, dando conhecimento do início, a curto prazo, de inspeção geral aos anos de 2007 e 2008 à Impugnante, tendo por base a ordem de serviço n.º OI201004012 - cfr. fls. 97 do processo físico.
19. Pelo ofício n.º 83958/0505, de 22/12/2010, foi a Impugnante notificada de que da ação de inspeção referida em 18) não resultaram atos tributários desfavoráveis à Impugnante - cfr. fls. 96 do processo físico.

Motivação

O Tribunal formou a sua convicção relativamente à factualidade assente, tendo por base os documentos supra identificados em cada um dos itens do probatório, que não foram impugnados, não tendo sido particularmente valorado o depoimento prestado pela testemunha arrolada pela Impugnante (o seu técnico oficial de contas responsável pela entrega da declaração de substituição e declarações de rendimentos subsequentes), por se entender que está em causa questão eminentemente de direito e porque o depoimento em causa apenas versou sobre factualidade que já se encontrava documentalmente provada.
Não existem outros factos provados ou não provados para além dos supra elencados”.
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III De Direito

Sendo sindicada a sentença proferida nos autos que julgou procedente a impugnação deduzida contra o acto de liquidação de IRS, constata-se que a decisão controvertida se fundamentou na seguinte argumentação:
“…. Nos termos do disposto no artigo 1. ° do Código do IRS, este imposto incide sobre o valor anual dos rendimentos entre outras categorias, da categoria B - Rendimentos empresariais e profissionais.
No que concerne a esta categoria de rendimentos, o artigo 3.°, n.º 1 do Código do IRS elenca as principais espécies de rendimentos nela enquadráveis, aí incluindo «os decorrentes do exercício de qualquer actividade comercial, industrial, agrícola, silvícola ou pecuária» (alínea a)), exemplificando o artigo 4.°, n.º 1 do mesmo Código as atividades comerciais e industriais cujos rendimentos integram a categoria B, considerando como tal, entre outras atividades, a «compra e venda» (alínea a)) e as atividades «urbanísticas e exploração de loteamentos» (alínea g)).
Por outro lado, o n.º 2 do mesmo artigo 3.° alarga os rendimentos enquadráveis na categoria B a outro tipo de rendimentos, em razão da sua conexão/acessoriedade com uma atividade geradora de rendimentos empresariais e profissionais, como é o caso de outros ganhos que decorram das operações referidas no n.º 1 do artigo 10.° do mesmo Código, quando imputáveis a tais atividades (alínea c) ), incluindo, ainda, na categoria B, os rendimentos provenientes da prática de atos isolados referentes, além do mais, a uma atividade comercial (alínea h)).
Este conceito de atividade comercial, diferente do de direito comercial, é próprio do direito tributário e é mais abrangente do que aquele, pois inclui, não só a compra e venda (sendo que a compra e venda comercial vem regulada no artigo 463.° do Código Comercial), mas também a actividade «urbanística e exploração de loteamentos», atividade esta que não vem especialmente regulada no Código Comercial e que, ao contrário da compra e venda, não tem de ser precedida de uma aquisição onerosa com intenção de posterior (re)venda.
Por seu turno, no que concerne à categoria G, o artigo 9.° do Código do IRS tipifica as espécies de rendimentos abrangidas, aí se incluindo, entre outras tipologias de rendimentos, as mais-valias adiante definidas, no artigo 10.° do mesmo Código, como os ganhos obtidos que não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem, designadamente, da «alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e da afectação de quaisquer bens do património particular à actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário» (alínea a)).
Assim, existindo afetação de quaisquer bens do património particular à atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário, no momento da ulterior alienação dos bens em causa ou facto equivalente, haverá lugar ao apuramento de dois ganhos: um resultante da afetação do bem à atividade empresarial e profissional (tributado como rendimento da categoria G, nos termos do disposto no artigo 10.°, n.° 1, alínea a)) e outro decorrente da alienação do bem que se encontrava afeto à referida atividade (tributado como rendimento da categoria B, nos termos do disposto no artigo 3.°, n.º 2, alínea c)).
De salientar que, no que concerne aos bens imóveis, o preceito vertente é bastante mais amplo do que o antecedente n.º 1 do artigo 1.° do Código do Imposto de Mais-Valias que apenas se reportava aos terrenos para construção, passando a ser tributadas em IRS as mais-valias provenientes da transmissão onerosa de qualquer forma de propriedade imóvel.
Daí que o legislador do Código do IRS tenha estabelecido, no artigo 5.°, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de Novembro, um regime transitório para os rendimentos da categoria G, estabelecendo que «Os ganhos que não eram sujeitos ao imposto de mais- valias, criado pelo Código aprovado pelo Decreto-Lei n.º 46 373, de 9 de Julho de 1965, bem como os derivados da alienação a título oneroso de prédios rústicos afectos ao exercício de uma actividade agrícola ou da afectação destes a uma actividade comercial ou industrial exercida pelo respectivo proprietário só ficam sujeitos ao IRS se a aquisição dos bens ou direitos de cuja transmissão provêm se houver efectuado depois da entrada em vigor deste Código» [sublinhado nosso].
Mais se refira que, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 3 do mesmo artigo 10.°, o ganho decorrente da afetação de bens do património particular à atividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário só se considera obtido no momento da ulterior alienação dos bens em causa ou facto equivalente.
Como resulta da matéria levada ao probatório, está em causa a tributação do resultado da venda, no ano de 2005, de 8 lotes de terreno abrangidos pelo alvará de loteamento n.º 15/98, emitido em 14/10/1998, pela Câmara Municipal de (...), em nome da Impugnante, através do qual foi autorizada a constituição de 39 lotes de terreno e as respetivas obras de urbanização do imóvel por esta adquirido em 1961 (cfr. os itens 1), 4) e 11) do probatório).
Ora, a exploração do loteamento do terreno efetuada a partir de 14/10/1998 pela Impugnante é considerada uma atividade comercial nos termos do disposto no artigo 4. °, n.º 1, alínea g) do Código do IRS (atividade «urbanística e exploração de loteamentos»), sendo os ganhos decorrentes da alineação onerosa dos lotes de terreno imputáveis a tal atividade (cfr. o artigo 3.°, n.º 2, alínea c)).
Por outro lado, como houve afetação à atividade empresarial exercida pela Impugnante de um bem do seu património particular, no momento da ulterior alienação dos bens em causa - os lotes de terreno -, há lugar ao apuramento de dois ganhos, conforme supra mencionado: um resultante da afetação do imóvel à atividade empresarial e profissional (tributado como rendimento da categoria G, nos termos do disposto no artigo 10.°, n.º 1, alínea a)) e outro decorrente da alienação dos lotes resultantes da atividade de exploração de loteamento exercida (tributado como rendimento da categoria B, nos termos do disposto no artigo 3.°, n.º 2, alínea c)).
Ora, como os ganhos derivados da afetação do prédio a uma atividade empresarial de loteamento exercida pela Impugnante verificada em 1998 com a emissão do alvará de loteamento n.º 15/98, de 14 de outubro, não eram passíveis de tributação em Imposto de Mais-Valias, porquanto o imóvel havia sido adquirido em 1961, logo antes da entrada em vigor do Código do IRS, aplica-se a estes a exclusão de tributação prevista no n.º 1, do art.° 5.° do Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro (note-se que, se não fosse de aplicar tal exclusão de tributação, o saldo entre as mais e menos valias seria tributado em 50% do seu valor, devendo para o efeito considerar-se, como valor de realização, o valor de mercado à data de afetação e, como valor de aquisição, o correspondente ao valor patrimonial inscrito na matriz ou ao valor do terreno, acrescido dos custos de construção devidamente comprovados, se superior àquele - artigos 43.°, n.º 2, 44.°, n.º 1, c) e 46.°, n.º 3 do Código do IRS).
Diversamente, a venda dos lotes de terreno ocorrida em plena vigência do Código do IRS, precedida de uma operação de loteamento do terreno, sendo os bens alienados, jurídica e economicamente, distintos dos bens que estiveram na sua origem (recorde-se que o bem adquirido pela Impugnante foi dividido em 39 lotes autónomos, dos quais 8 foram objeto de alienação em 2005), o que pressupõe uma atividade desenvolvida para o efeito no sentido da sua valorização, retira aos ganhos assim obtidos a natureza fortuita caracterizadora dos ganhos de mais-valias, configurando-os como ganhos imputáveis a uma atividade geradora de rendimentos empresariais e profissionais, sujeitos a tributação em sede de IRS, no âmbito da categoria B, de acordo com o disposto nos artigos 3.°, n.° 2, alínea c) e 4.°, n.° 1, alínea g), ambos do Código do IRS.
Nesse mesmo sentido, cfr. os Acórdãos do TCA Sul de 11/11/2008, proc. n.° 02228/08, de 17/12/2002, processo n° 6804/02 e de 05/07/2005, proc. n.° 00573/03 e do TCA Norte de 20/12/2006, proc. n.° 00085/01 e de 01/07/2004, proc. n.° 00019/04, cuja fundamentação aqui seguimos de perto, de onde resulta que, para excluir os ganhos obtidos com a venda dos lotes de terreno do seu campo de incidência (de rendimentos da categoria B), e enquadrá-los na categoria G, teriam tais ganhos que ter um carácter meramente ocasional ou fortuito, o que não se verifica quando a venda é precedida de uma operação de loteamento levada a cabo pelo alienante.
Ora, a determinação dos rendimentos empresariais e profissionais (categoria B) faz- se, nos temos do disposto no artigo 28. °, n.° 1 do Código do IRS, com base na aplicação das regras decorrentes do regime simplificado ou com base na contabilidade, estando os sujeitos passivos não abrangidos pelo regime simplificado obrigados a possuir contabilidade organizada (cfr. o artigo 117. ° do mesmo Código).
Assim, na determinação do rendimento coletável segundo a contabilidade, só são considerados proveitos e custos os relativos a bens ou valores que estejam afetos às atividades profissionais e empresariais desenvolvidas pelo sujeito passivo e, no caso da afetação de bens do património particular ao exercício de uma atividade profissional o valor de aquisição desses bens, atribuído pelo sujeito passivo no momento da afetação, corresponde ao seu valor de mercado à data da transferência (cfr. o artigo 29.°, n.os 1 e 2 do Código do IRS).
Já o regime simplificado de tributação parte do valor das vendas e dos restantes rendimentos (componentes positivas do rendimento) obtidos pelos sujeitos passivos, para deles deduzir um rendimento normal, através da aplicação de indicadores objetivos de base técnico-científica para os diferentes setores da atividade económica, com a ressalva de que, até à aprovação de tais indicadores, ou na sua ausência, o rendimento colectável será o resultante da aplicação do coeficiente de 0,20 ao valor das vendas de mercadorias, sendo o rendimento coletável assim obtido objeto de englobamento e tributado nos termos gerais (cfr. o artigo 31.° do Código do IRS).
Nesta conformidade, numa situação como a dos autos, em que no ano em causa a Impugnante estava abrangida pelo regime da contabilidade organizada no exercício da sua atividade empresarial e profissional (categoria B) [cfr. os itens 13) e 15) do probatório], a determinação do seu rendimento tributável deverá ser efetuada de acordo com as regras previstas no artigo 29.° do Código do IRS, o que significa que o valor de aquisição do imóvel será o correspondente ao seu valor de mercado à data da transferência e não, como erradamente sustenta a AT, o valor patrimonial inscrito na matriz acrescido dos custos de construção do loteamento efetivamente comprovados.
De resto, prevendo o loteamento a constituição de 39 lotes, dos quais, em 2005, apenas 8 foram vendidos e tendo a Impugnante sido sujeita a inspeções tributárias de âmbito geral nos anos de 2007 e 2008, em que certamente terão ocorrido vendas de lotes em moldes semelhantes e terá sido seguido idêntico critério, a AT não procedeu a qualquer correção nesses anos (cfr. os itens 18) e 19) do probatório), sendo de realçar que, chamada a pronunciar-se a esse respeito, a AT também não alega que nesses anos não ocorreu o mesmo facto tributário ou que não foi adotado o mesmo critério.
Aqui chegados, e sendo certo que, como a própria Fazenda Pública reconhece na sua contestação, o que aqui se discutia era a questão de índole eminentemente jurídica de saber qual o critério de valorização do custo de aquisição dos lotes de terreno - se o valor de mercado dos lotes de terreno à data da transferência, como defende a Impugnante ou o valor patrimonial inscrito na matriz acrescido dos custos de construção do loteamento efetivamente comprovados, como sustenta a AT - tanto mais que, em momento algum, a AT questiona o exato valor numérico do custo de aquisição dos lotes de terreno considerado pela Impugnante na declaração de substituição entregue, resta-nos concluir que não tendo a AT apontado qualquer erro de facto à declaração de substituição entregue, designadamente, quanto ao cômputo do valor de aquisição aí indicado, terá esta declaração de substituição de ser aceite como válida e emitida nova liquidação em conformidade com os valores aí declarados.
Termos em que se julga procedente a presente impugnação, determinando-se a anulação da liquidação de IRS impugnada, no que aos rendimentos da atividade empresarial diz respeito, bem como a correspondente retificação da liquidação, nos termos que resultem da declaração de substituição apresentada, com a restituição da parte do imposto liquidado que, após as devidas operações de retificação, se mostrar devido à Impugnante.

IV. DECISÃO

Termos em que se julga procedente a presente impugnação, determinando-se a anulação da liquidação de IRS impugnada, no que aos rendimentos da atividade empresarial diz respeito, bem como a correspondente retificação da liquidação, nos termos que resultem da declaração de substituição apresentada, com a restituição à Impugnante da parte do imposto liquidado que, após as devidas operações de retificação, se mostrar devido à Impugnante”.
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Compulsados os autos constata-se que a recorrente na 1ª Instância sustentava que as regras de determinação do lucro tributável do recorrido se deveria pautar pelas normas de apuramento de resultados de mais-valias vertidos nos artºs 43º e segs, do CIRS, e mais concretamente na consideração do valor de aquisição onerosa dos ditos bens imóveis com base no V.P. inscrito na matriz , acrescido dos custos de construção a que se refere o nº 3, do artº 46º, do mesmo Código e não pelo valor de aquisição aferido pelo respectivo valor de mercado, a que se refere a regra de imputação especifica de tais rendimentos á categoria “B” ínsito no nº 2, do artº 29º do IRS, sendo que em sede recursiva a F.P. apenas vem questionar a data da afectação de tais bens do património particular do recorrido à sua actividade empresarial, em que pretende ser considerado á data anterior ás ditas operações urbanísticas.
O que dizer sobre tal perspetiva por banda da recorrente?
Em 1º lugar que se julga insustentável a pretensa consideração do valor de aquisição de tais bens alienados no exercício controvertido , quando efectuada com base no V.P. acrescido dos custos de construção, atento aquelas regras próprias de determinação de tais mais-valias em resultado da alienação de bens do activo no âmbito da categoria “B”, nos casos daquela anterior afectação ao seu património empresarial dos ditos bens imóveis, conforme resulta daquela regra de imputação especifica quando aferida pelo respectivo valor de mercado para determinação do respectivo valor de aquisição, como bem refere a Mª Juiz do Tribunal “A Quo” – cfr nesse sentido a 2ª parte da alínea c), do nº2, do artº 3º , conjugado com o disposto no referido nº 2, do artº 29º, todos do CIRS.
Quanto ao momento a que se deve atender para o apuramento daquele valor de aquisição de tais rendimentos empresariais, em tese e em abstrato nada obstaria a que se considerasse que tal afectação a uma actividade empresarial de tais bens imóveis se pudesse aferir pela data em que os mesmos foram adquiridos pelo recorrido caso se considere que toda a actividade de urbanização e exploração de loteamentos que se veio a desenvolver nos mesmos seriam susceptíveis de se enquadrar em tais actividades dessa categoria, nos termos do disposto na alínea g), do nº 1, do artº 4º do IRS. Mas, para o efeito teria a ATA que ter considerado o s.p. como enquadrado nessa actividade comercial desde essa data e teria que determinar os resultados assim apurados, o que significaria um anterior apuramento dos custos nesse(s) outro(s) exercício(s), e devida consideração do valor de mercado desses bens aquando dessa afectação, o que nunca foi exercido pela recorrente que, inclusive, como bem apurou a 1ª Instância, tendo efectuado uma acção inspectiva ao recorrido dela nada resultou ( aqui ter-se-ia de proceder a alteração dos rendimentos declarados ao abrigo do disposto no artº 65º do CIRS) ,e eventualmente determinando perdas a reportar ao exercício controvertido dos resultados líquidos negativos dessa categoria apurados em períodos anteriores, na medida da consideração dessas regras de imputação do referido valor de aquisição de tais bens e dos custos inerentes ás operações de loteamento assim incorridos. Não colhe assim a pretensão recursiva de ser levado ao probatório a alteração da matéria dada como provada no ponto 7, daquele segmento da sentença quanto ao momento da afectação dos bens imóveis á actividade comercial , no sentido de o mesmo se reportar á data de aquisição inicial dos prédios referidos em 1, do dito probatório. Mais,
Ao não ter assim procedido, não pode a recorrente pretender determinar o apuramento do lucro tributável do referido ano de 2005, com base na contabilidade, exclusivamente no valor dos custos incorridos naquele exercício com as obras de edificação comprovadamente realizados sem ter em conta o respectivo valor de aquisição de tais bens alienados nesse exercício devidamente aferido pelo seu valor de mercado, na justa medida em que não relevou tais encargos em diferentes exercícios do ora controvertido, pelo que tal inviabilizava a sua consideração no ano em causa nos autos, o que se traduz numa tributação ilegal e como tal insusceptivel de se manter por erro sobre os pressupostos de facto e de direito do imposto assim liquidado como bem decidiu a Mº Juiz da 1ª Instância, decisão a que se procede na parte dispositiva do presente Acórdão.
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III Dispositivo

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Norte em considerar improcedente o recurso, sendo mantida a sentença recorrida que anulou o acto tributário e com os fundamentos constantes da sentença, acrescidas das aduzidas por este Tribunal Superior.

Custas pela F.P.
Notifique.

António Patkoczy
Ana Patrocínio
Cristina Bento