Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:03335/14.1BEPRT
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:04/27/2023
Tribunal:TAF do Porto
Relator:Carlos de Castro Fernandes
Descritores:REVERSÃO; INSUFICIÊNCIA DE BENS;
INSOLVÊNCIA; CULPA;
AUDIÊNCIA PRÉVIA:
Sumário:I – O conhecimento pelo órgão da execução fiscal da declaração de insolvência da sociedade originária devedora é fundamento bastante para que considere haver fundada insuficiência do património daquela, a justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda (art.23.º nºs 2 e 7 LGT).

II – No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo de pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou entrega do imposto (art. 24º, nº1, al. b) da LGT).

III- Assim, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto cabe demonstrar os factos concretos que demonstraram que exerceu de forma diligente o cargo e que não foi por sua culpa que surgiu a dívida tributária.

IV – Quando no n.º 4 do art. 23.º da LGT o legislador usa a expressão “extensão” da reversão, não tem em mente a dimensão da dívida, teve em mente quer o período a que respeitam as dívidas [intrinsecamente conexionado com a responsabilidade subsidiária] quer o seu montante [este ligado à questão da insuficiência patrimonial], sendo que apenas com estes dois elementos podemos aferir se estão preenchidos os pressupostos da reversão.*
* Sumário elaborado pelo relator
(art. 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil)
Votação:Unanimidade
Decisão:
Conceder provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – A Representação da Fazenda Pública – RFP (Recorrente) veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual se julgou procedente a oposição intentada por «AA», melhor identificado nos autos, no âmbito do PEF n.º ...70 e apensos.

No presente recurso, a Apelante formula as seguintes conclusões:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a oposição deduzida no âmbito do processo de execução fiscal (PEF) n.º...70 e apensos, instaurados pelo Serviço de Finanças ..., para cobrança de dívidas de IVA dos anos de 2006 e 2007, IRS e Imposto do Selo dos anos 2007 e IRS dos anos 2007 a 2009, no montante total de EUR 79.084,67, em que é executada a devedora originária "X, Lda.”, tendo sido efectuada a reversão contra o ora oponente.
B. Considerou o Tribunal a quo a respeito da (in)suficiência do património da sociedade devedora originária e da ilegitimidade do oponente que:
“Volvendo ao caso posto, e como supra se consignou a entidade exequente fundamentou a decisão de reversão contra o ora Oponente, no que tange à insuficiência de bens da devedora originária, na declaração de insolvência da devedora originária aludindo ademais à situação liquida negativa (SNL) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) (cfr. alínea E) dos factos provados) pelo que, a Administração Tributária, não procedeu à realização de quaisquer outras diligências instrutórias no sentido de averiguar da existência (e respetiva suficiência ou não) de património da devedora originária.”
C. E que: “Todavia – e como tem sido entendimento Jurisprudencial das Instâncias Superiores - da situação de insolvência da devedora originária não decorre uma presunção de inexistência de bens suficientes para pagar a dívida exequenda”
D. Concluindo que: “Aqui chegados, e aderindo integralmente e sem reservas à fundamentação do sobredito Acórdão do Venerando Tribunal Central Norte, em conjugação com a factualidade dada como provada, conclui-se pela não demonstração do pressuposto - fundada insuficiência de bens da devedora principal – invocado pela entidade exequente para fundamentar a decisão de reversão”
E. E que: “Com efeito, impera concluir pela ilegitimidade do Oponente, por não se ter demonstrado os pressupostos de que depende a efetivação da sua responsabilidade subsidiária prevista no artigo 24.º, n.º 1 da LGT”
F. Com o assim decidido não pode a Fazenda Pública, respeitosamente, conformar-se, padecendo a douta decisão de erro de julgamento de facto e de direito, já que a mesma valorou erroneamente a prova produzida nos presentes autos, em termos que afectam irremediavelmente a validade da sentença, pelas razões que passa a explanar.
G. No que respeita ao pressuposto legitimador da reversão que consiste na fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário para responder pela dívida exequenda, a jurisprudência é unânime no sentido (aqui exemplificado no recentíssimo Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 05.03.2020 no Processo n.º 00749/11.2BEPNF: “nos casos em que foi declarada a insolvência do devedor originário, o conhecimento dessa declaração, por si só, preenche aquele requisito. Tanto assim é que o legislador - no n.º 7 do art. 23.º da LGT, aditado pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de Dezembro (Lei do Orçamento do Estado para 2012) - veio impor que fosse efectuada a reversão contra os responsáveis subsidiários, desde que se verifiquem os demais requisitos, nas «situações em que seja solicitada a avocação de processos referida no n.º 2 do artigo 181.º do CPPT, só se procedendo ao envio dos mesmos a tribunal após despacho do órgão da execução fiscal, sem prejuízo da adopção das medidas cautelares aplicáveis». Nessas situações, «é presumível a insuficiência do património do sujeito passivo devedor originário para o pagamento da totalidade das suas dívidas» (Cfr. DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA, Lei Geral Tributária Anotada e Comentada, Encontro da Escrita, 4.ª edição, anotação 1 ao art. 23.º, pág. 223.)”
H. Concluindo o referido acórdão que “O conhecimento pelo órgão da execução fiscal da declaração de insolvência da sociedade originária devedora é fundamento bastante para que o órgão da execução fiscal considere haver “fundada insuficiência” do património da sociedade originária devedora, a justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda (cfr. artigo 23.º, n.ºs 2 e 7, da LGT).”
I. Ora, in casu, no momento em que se operou a reversão (2013) foi, portanto, suficiente a declaração de insolvência (proferida em 2010), por manifesta insuficiência patrimonial, para que se tivesse por preenchido o critério da fundada insuficiência de bens legitimador da reversão, uma vez que já estava suficientemente demonstrada a falta de bens para satisfação do passivo, e que, se assim não fosse, incumbiria ao oponente (revertido) a alegação e prova de que a devedora originária ainda tinha um acervo patrimonial suficiente para solver as concretas dívidas em execução. (vide Acórdão do STA, de 08/11/2017, prolatado no Processo n.º 0420/17).
J. Assim, não se compreende, com o devido respeito, que a douta sentença ora recorrida conclua que “a Administração Tributária, não procedeu à realização de quaisquer outras diligências instrutórias no sentido de averiguar da existência (e respetiva suficiência ou não) de património da devedora originária.”, uma vez que,
K. além do mais, resulta dos autos e é referido na PI (pontos 23 a 28) que, apesar de a AT ter penhorado créditos a clientes da devedora originária, no entanto o montante penhorado e entregue nos cofres do Estado não foi suficiente para extinguir a execução em crise, conforme se pode comprovar através da conta corrente extraída do sistema informático e referente aos processos em causa nos autos (vide doc.1 junto com as alegações de direito apresentadas pela Fazenda Pública).
L. Face ao exposto, incorreu o Tribunal a quo em erro de julgamento da matéria de facto por erro na valoração da prova, daí resultando, em consequência, erro de julgamento em matéria de direito.
M. Destarte, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO E DE DIREITO, pelo que deverá ser revogada.
Termina a Recorrente pedindo que seja dado provimento ao presente recurso, revogando-se a sentença recorrida.
O Recorrido («AA») apesar de regularmente notificado para o efeito, não apresentou contra-alegações.
*
Os autos foram com vista ao digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal, tendo este emitido parecer no sentido da procedência do presente recurso (cf. fls. 209 e segs. dos autos – paginação do SITAF).
*
Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.

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II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância:
A) Contra a sociedade "X, Lda.”, NIPC ..., foi instaurado pelo Serviço de Finanças ... - 2, o processo de execução fiscal n.º ...70 e apensos (...23; ...02; ...92; ...36; ...69; ...00; ...98; ...29 e ...60) para cobrança coerciva de dívidas de IVA, Imposto do Selo e IRS, no montante total de EUR 79.084,67 – (cfr. fls. 2/5, 30 e 41 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
B) Servem de base às execuções referidas no ponto anterior as certidões de dívida n.º 2007/63915, 2007/82..., 2007/12...., 2007/13...., 2007/51...., 2007/58...., 2007/64....., 2008/72....., 2009/34...., 2009/45...., 2009/048.... – (Cfr. fls. 8/30 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
C) Em 30/09/2009, foi pago por “Y, S.A”. a quantia de EUR 3.307,63, no âmbito do processo de execução n.º ...98 referido em A), ao qual corresponde a certidão de dívida n.º 2009/34.... no montante total de EUR 1.047,00 referida em B) – (Cfr. fls. 55/56 do SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
D) Na Conservatória do Registo Comercial ..., pela Ap. ...23, insc 1, foi registada a designação de «AA», ora Oponente, como gerente da sociedade comercial "X, Lda.”, contribuinte Fiscal nº ... (Cfr. certidão permanente de fls. 35/37 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
E) Em 31/05/2013, no âmbito do processo de execução fiscal em causa e respetivos apensos, foi proferido despacho de reversão do qual consta, entre o mais, o seguinte:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
– (cfr. fls. 143 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
F) Pelo ofício designado de “CITAÇÃO (Reversão)”, enviado por carta registada sob o n.º ... e com aviso de receção assinado pelo Oponente, em 11/06/2013, foi comunicado ao Oponente a reversão do processo de execução supra referida - (cfr. fls. 69/74 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
G) Em 20/08/2010, a sociedade "X, Lda.” foi declarada insolvente no processo n.º ....6/...TYVNG que correu termos no ... Juízo do Comércio de Vila Nova de Gaia (cfr. Anúncio .../2010, publicado no Diário da República, 2ª Série, n.º ... de ../.../2010 a fls. 88 do processo SITAF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
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Na sentença recorrida considerou-se que inexistiam factos não provados com relevância para a decisão da presente questão.
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No que diz respeito à motivação factual, escreveu-se na sentença recorrida que:
«O Tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos e informações oficiais juntos integrantes do processo judicial e do processo administrativo em apenso, não impugnados, conforme indicado em cada uma das alíneas do probatório e no depoimento sério e credível da testemunha «BB», contabilista da sociedade "X, Lda.”, no período compreendido entre 2005/2010, a qual referiu ter conhecimento no âmbito da sua profissão, de que houve várias penhoras que foram realizadas pela Autoridade Tributária nos clientes da empresa, da faturação que esta tinha a receber daqueles.»
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Ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 662.º do CPC ex vi art.º 281.º do CPPT, adita-se à matéria de facto o seguinte:
D1 – O Oponente (Recorrido) recebeu dos serviços da AT, um ofício datado de 16.11.2012, do qual se retira que:
“[…]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cf. doc. a fls. 51 dos autos – paginação do processo em suporte físico.
D2 – Na sequência do ofício referido na alínea anterior, o Oponente (Recorrido) enviou uma exposição escrita dirigida ao Sr. Chefe do Serviço de Finanças ..., da qual se retira que:
“[…]
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]

[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
- cf. docs. a fls. 52 a 53 dos autos – paginação do processo em suporte físico.
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Os dois factos supra enunciados, agora aditados pela presente instância, resultam da prova documental neles referida, sendo que aquela não foi objeto de qualquer infirmação pelas partes presentes no presente litígio.

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III – Questões a decidir.

No presente recurso, cabe analisar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, no que diz respeito ao erro de julgamento de facto e de direito, nomeadamente quanto à questão relativa à fundada insuficiência de bens da devedora originária.

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IV – Da apreciação do presente recurso.
Constitui objeto do presente recurso a sentença proferida nestes autos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual se concedeu provimento ao presente processo de oposição à execução fiscal.
Na sentença recorrida foram elencadas as seguintes questões apontadas pelo então Oponente (aqui Recorrido), como sendo as que caberia ao Tribunal conhecer:
- a preterição de formalidade em sede de audiência prévia no âmbito do procedimento que conduziu ao despacho de reversão;
- a falta de fundamentação formal do despacho de reversão, por falta de indicação da insuficiência de bens da devedora originária e por falta de elementos que constituam o exercício de facto da gerência;
- que a dívida do processo de execução fiscal n.º ...98 se encontra paga através da penhora de um crédito de valor superior ao da dívida exequenda;
- que as dívidas em causa resultaram do pagamento tardio por parte dos clientes da devedora originária;
- que o Oponente propôs o pagamento em prestações da dívida o que foi recusado pelos serviços executivos da AT;
- que o Oponente não dissipou o património da sociedade, reduziu os respetivos custos, dispensou trabalhadores e tudo fez para angariar novos clientes.
Ora, na decisão jurisdicional ora em apreço apreciou-se a questão da falta de fundamentação [formal] do despacho de reversão, concluindo-se pela sua não verificação. Já quanto à questão da (in)suficiência do património da sociedade devedora originária ou a ilegitimidade do Oponente considerou-se na sentença recorrida que aquela se verificava, uma vez que não se confirmara a fundada insuficiência dos bens da devedora originária. Quanto às demais questões suscitadas, o Tribunal de primeira instância considerou prejudicada a necessidade da sua apreciação, o que significa que não apreciou as questões da culpa na insuficiência patrimonial e do erróneo cumprimento do dever de audição do então revertido (aqui Recorrido).
IV.1 – Do alegado erro de julgamento.
A ora Recorrente elege como questão fundamental do presente recurso, a questão de um imputado erro de julgamento no que concerne à questão da não demonstração da insuficiência patrimonial da entidade que constava como a inicialmente executada (mais concretamente, a "X, Lda.”).
Assim, a propósito desta questão, na sentença recorrida considerou-se que:
“[…]
O Opoente invoca, ainda, a invalidade do ato de reversão e a sua consequente ilegitimidade, por a Autoridade Tributária não ter provado a insuficiência ou inexistência do património da devedora originária para satisfazer a dívida em causa.
Apreciando.
Como é sabido, o chamamento à execução dos responsáveis subsidiários depende da verificação da inexistência de bens penhoráveis do devedor ou da fundada insuficiência, de acordo com os elementos constantes do auto de penhora e outros que o órgão da execução fiscal disponha, do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido (cfr. artigos 153º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPPT e 23º, n.º 2, da Lei Geral Tributária [LGT]).
À Administração Tributária incumbirá o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento, previsto na lei, para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários e reverter contra eles o processo executivo, cabendo-lhe, por isso, demonstrar que não existiam, à data do despacho de reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes. Só no caso de a entidade Exequente fazer a prova do preenchimento desses pressupostos, passará a competir ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens, suficientes, no património da sociedade de que aquela não teve conhecimento, fazendo, assim, a prova da ilegalidade do acto de reversão (cfr. acórdão do STA, de 22/6/2011, rec.167/11 e de 16/5/2012, rec.123/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6a. edição, 2011, pág.65 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4a. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.223 e seg.).
Acresce que, a inexistência de bens da sociedade devedora originária, enquanto pressuposto da reversão da execução fiscal contra os responsáveis subsidiários, deve reportar-se, portanto, ao momento em que a reversão ocorre e não ao momento em que o administrador ou gerente/responsável subsidiário exerceu esse cargo societário – cfr. Acórdão do Colendo Supremo Tribunal Administrativo, de 16/03/2016, tirado no processo n.º 0647/15.
Do carácter subsidiário da responsabilidade tributária, imposto no nº 3 do artigo 22º da LGT, decorre que a execução fiscal só pode ser revertida contra o responsável subsidiário depois de excutidos os bens do devedor originário. Daqui resulta, por um lado, que o órgão de execução fiscal está obrigado a exigir a prestação tributária em primeiro lugar ao devedor originário ou aos eventuais responsáveis solidários, satisfazendo o crédito somente à custa dos seus bens, e apenas pode exigi-la do devedor subsidiário no caso de se provar a inexistência ou insuficiência de bens daqueles e, por outro, que o devedor subsidiário pode recusar o cumprimento da dívida tributária enquanto não tiver sido excutido todos os bens daqueles devedores.
O nº 2 do artigo 153º do CPPT, que tem que ser lido em conjugação com o artigo 23º da LGT, condiciona a reversão à verificação a uma das seguintes situações: (i) inexistência de bens penhoráveis na esfera patrimonial do devedor originário; (II) fundada insuficiência dos bens do devedor originário para satisfação da dívida exequenda.
Decorre destes preceitos que, para a adequação e legalidade do despacho de reversão, se mostra bastante a fundada insuficiência do património do devedor para a satisfação da dívida exequenda e acrescido sem que a Administração Tributária tenha de confirmar a inexistência de bens penhoráveis do devedor originário
Na verdade, e a título de exemplo, a referência à fundada insuficiência, resultante do auto de penhora ou de outros elementos de que o órgão de execução fiscal disponha, inculca a ideia de que, perante essa fundada insuficiência do património do originário devedor, ocorra a reversão (Vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 19/01/2006, 2ª Secção Contencioso Tributário, “1.Em face do preceituado no art. 23º nºs 1 e 2 da LGT não é necessária a prévia excussão do património do devedor originário para que seja possível a reversão, sendo bastante que se verifique a fundada insuficiência desse património, resultante do auto de penhora ou de outros elementos de que o órgão de execução fiscal disponha. 2. Porque cabe à A.Fiscal o ónus da prova de que se verificam os factos que integram o fundamento previsto na lei para que possa chamar à execução os responsáveis subsidiários pela dívida exequenda, revertendo a execução contra eles, cabe-lhe o ónus de provar que se verificam os pressupostos legais dos quais depende essa reversão, pela demonstração de que não existem bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles são fundadamente insuficientes para a satisfação da dívida exequenda e acrescido. 3. Daí que o ónus de averiguação e prova dos requisitos constitutivos do direito à reversão da execução, designadamente quanto à inexistência ou insuficiência dos bens do executado originário, não caiba ao responsável subsidiário mas, antes e em primeira linha, à A.Fiscal. E só ulteriormente, caso esta faça prova da verificação desses pressupostos, caberá ao responsável subsidiário demonstrar a existência de bens no património da devedora originária que aquela ignorou ou de que não havia conhecimento, fazendo, assim, prova da ilegitimidade do acto..” – no Processo nº 00032/05.2BEPNF).
Pois que, perante o carácter subsidiário da responsabilidade tributária (nº 3 do art.º 22º da LGT) e a natureza do benefício da excussão, decorre que a execução fiscal só pode reverter contra o responsável subsidiário depois de excutidos os bens do devedor originário.
Volvendo ao caso posto, e como supra se consignou a entidade exequente fundamentou a decisão de reversão contra o ora Oponente, no que tange à insuficiência de bens da devedora originária, na declaração de insolvência da devedora originária aludindo ademais à situação liquida negativa (SNL) declarada pela devedora originária na última declaração referente à Informação Empresarial Simplificada (IES) (cfr. alínea E) dos factos provados) pelo que, a Administração Tributária, não procedeu à realização de quaisquer outras diligências instrutórias no sentido de averiguar da existência (e respetiva suficiência ou não) de património da devedora originária.
Todavia – e como tem sido entendimento Jurisprudencial das Instâncias Superiores – da situação de insolvência da devedora originária não decorre uma presunção de inexistência de bens suficientes para pagar a dívida exequenda,
Neste sentido, vide o Acórdão do Venerando Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 21/12/2017, no processo n.º 00361/14BEVIS reza o seguinte: “I – É à administração tributária que cabe o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais de que depende a reversão. II – Face à insuficiência do património do originário devedor é possível fazer reverter a execução contra o responsável subsidiário. III – Há fundada insuficiência do património do originário devedor se for possível concluir que o valor dos seus bens (quantificado) é manifestamente insuficiente para satisfação da dívida exequenda e do acrescido. IV – Incumbe, portanto, à administração tributária, designadamente, a demonstração de que não existem bens penhoráveis do devedor originário ou, no caso de existirem, que eles são fundadamente insuficientes para a satisfação da dívida exequenda. V – Se, no despacho de reversão, apenas se invoca, como fundamento da alegada fundada insuficiência do património societário para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido, a situação líquida negativa da sociedade decorrente da última declaração fiscal e a declaração de insolvência da sociedade, esses elementos não permitem, sem mais, que se conclua pela insuficiência de património do devedor originário, uma vez que esse pressuposto de reversão não se basta com a mera afirmação da probabilidade da sua existência. (sublinhado nosso)
Acresce que, e como se sabe a execução fiscal não pode prosseguir contra o revertido enquanto não findar o processo de insolvência e se apurar se, e em que medida, os bens da sociedade originária devedora são insuficientes para o pagamento da dívida exequenda, assim se assegurando o benefício da excussão prévia (cfr. artigo 23.º, n.ºs 2 e 3, da LGT).
Ora, resulta desde logo do probatório que em 30/09/2009, foi pago por “Y, S.A”. a quantia de EUR 3.307,63, no âmbito do processo de execução n.º ...98 (apenso), ao qual corresponde a certidão de dívida n.º 2009/34.... no montante total de EUR 1.047,00, facto que veio a ser corroborado pela testemunha inquirida a qual referiu que houve várias penhoras que foram realizadas pela Autoridade Tributária nos clientes da devedora originária, da faturação que esta tinha a receber daqueles.
Aqui chegados, e aderindo integralmente e sem reservas à fundamentação do sobredito Acórdão do Venerando Tribunal Central Norte, em conjugação com a factualidade dada como provada, conclui-se pela não demonstração do pressuposto – fundada insuficiência de bens da devedora principal – invocado pela entidade exequente para fundamentar a decisão de reversão.
Com efeito, impera concluir pela ilegitimidade do Oponente, por não se ter demonstrado os pressupostos de que depende a efetivação da sua responsabilidade subsidiária prevista no artigo 24.º, n.º 1 da LGT.
[…]”
Na situação presente há que ter presente que a orientação jurisprudencial prosseguida pelo Tribunal de primeira instância quanto à presente questão, que resultava do acórdão desta instância citado na decisão recorrida, veio a ser objeto de distinto entendimento por parte do STA, conforme resulta do acórdão do Pleno de 08-07-2020, proferido no processo n.º 0484/15.2BESNT (vide www.dgsi.pt). Assim, quanto à questão aqui em causa, o colendo STA, na dita formação plenária, apontou no sentido que:
“[…]
2.2.2.1.A questão fundamental de direito supra enunciada foi apreciada e decidida em jurisprudência reiterada do Supremo Tribunal Administrativo-Secção de Contencioso Tributário, destilada nos acórdãos proferidos em 8 novembro 2017 (processo 0420/17), 12 julho 2018 (processo 0783/17), 12 fevereiro 2020 (processo 0105/15.3BESNT), 20. abril 2020 (processo 362/14.2BEVIS), 1 julho 2020 (processo 361/14.2BEVIS) no sentido da pronúncia emitida pelo acórdão fundamento, embora com fundamentação jurídica não coincidente.
O conflito de jurisprudência deve ser resolvido por adesão à doutrina do acórdão fundamento, convocando-se o seguinte
Argumentário
1º A responsabilidade subsidiária efectiva-se por reversão do processo de execução fiscal (art.23º nº1 LGT).
Sendo um acto administrativo tributário, o despacho de reversão está sujeito a fundamentação, como corolário do princípio constitucional da fundamentação expressa e acessível dos actos administrativos (art.268º nº3 CRP; arts.23º nº4 e 77º nº1 LGT).
2º São pressupostos da responsabilidade subsidiária (arts.23º nº4 e 24 nº1 LGT):
- a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores, sem prejuízo do benefício da excussão (art.23º nº2 LGT; art.153º nº2 CPPT);
-o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega, associado a culpa presumida ou provada do responsável subsidiário (art.24º nº1 LGT).
3º Enquanto acto administrativo tributário o despacho de reversão deve incluir igualmente a indicação das normais legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (art. 77 nº1 LGT).
4º A legalidade do despacho de reversão exige a declaração fundamentada os seus pressupostos e extensão temporal da responsabilidade subsidiária, a incluir na citação, embora com autonomia jurídica em relação a esta (art.23º nº4 LGT).
5º Verifica-se uma fundada insuficiência de bens do devedor principal quando ela radica na declaração judicial da sua insolvência, baseada em passivo manifestamente superior ao activo, avaliados segundo as normas contabilísticas aplicáveis (art.3º nº2 Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas).
6º O requisito da fundada insuficiência não exprime a exigência de uma prova definitiva e irrefutável, ou uma presunção inilidível, como demonstrado pelo facto de o benefício da excussão prévia não permitir o prosseguimento da execução contra o executado revertido sem completa excussão do património do devedor principal, por forma a determinar-se com precisão o montante da quantia exequenda a pagar pelo responsável subsidiário (art.23º nº2 último segmento LGT); antes uma presumível insuficiência do património do devedor originário, simétrica de uma dúvida residual sobre a sua capacidade para assegurar o pagamento da dívida (neste sentido Diogo Leite Campos/Benjamim Silva Rodrigues/Jorge Lopes de Sousa Lei Geral Tributária Anotada e comentada 4ª edição 2012 p.223).
7º No mesmo sentido aponta a solução legal do dever de reversão nas situações em que seja solicitada a avocação dos processos de execução fiscal para apensação ao processo de insolvência, procedendo-se ao seu envio após despacho do órgão da execução fiscal; claramente inculcando que a declaração judicial de insolvência preenche o requisito legal da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal (art.23º nº7 LGT; art.181º nº2 CPPT).

2.2.2.2. A análise crítica da fundamentação do acórdão recorrido permite identificar um erro de julgamento, ao imputar ao despacho de reversão controvertido a patologia do vício de forma, resultante de confusão conceptual entre fundamentação formal e fundamentação substancial do acto administrativo, exigindo comprovação de factos quando seria exigível apenas enunciação de motivos (no domínio restrito do vício de forma imputado).
A fundamentação formal cumpre-se com a enunciação expressa, clara, suficiente e congruente dos motivos determinantes da prática do acto administrativo, com o seu concreto conteúdo; a fundamentação material exige a correspondência dos motivos enunciados com a realidade, bem como a sua suficiência para legitimar a actuação administrativa no caso concreto, traduzida na real verificação dos pressupostos de facto invocados e na correcta interpretação e aplicação das normas invocadas como fundamento jurídico).
O conteúdo concreto do despacho de reversão sob apreciação, dotado das citadas características de clareza, suficiência e congruência, cumpre a dupla função endógena e exógena da fundamentação formal do acto administrativo:
- endógena, na medida em que exigiu ao decisor a expressão dos motivos determinantes da decisão, contribuindo para sua ponderação e transparência (no caso concreto demonstrada pela sua inequívoca compreensão pelo destinatário do acto, manifestada na discordância expressa na petição de oposição à execução);
- exógena, ao permitir ao destinatário do acto uma opção esclarecida entre a conformação e a impugnação graciosa ou contenciosa (no caso concreto demonstrada pela dedução de oposição à execução com fundamento na falta de verificação dos requisitos legais do despacho de reversão, subjacente à imputação de responsabilidade subsidiária).
A errada qualificação do vício de forma imputado ao despacho de reversão não prejudica a sua qualificação pelo tribunal de recurso como vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto (inexistente pelos motivos convocados para o antecedente argumentário), na exacta medida em que aquela errónea qualificação é irrelevante para a formulação da questão fundamental de direito que mereceu pronúncia antagónica nos acórdãos em confronto.
Uma referência final para salientar (contrariando o entendimento expresso no acórdão recorrido) que uma eventual ilegalidade do despacho de reversão (no caso concreto inexistente) não impediria o exercício da garantia da excussão prévia do património da devedora originária, na medida em que o responsável subsidiário revertido poderia opôr-se a qualquer acto de penhora incidente sobre o património pessoal, não precedido daquela excussão previa, mediante reclamação para o órgão da execução fiscal (arts.276º e 278º nº 3 al.b) CPPT).
[…]”.
Assim, aplicando-se a supra referida orientação jurisprudencial à presente situação, tendo em conta o teor do despacho de reversão, onde se faz alusão à declaração de insolvência do devedor originário, temos que concluir que tal menção é suficiente do ponto de vista fundamentador. Assim ter-se-á que concluir que o despacho de reversão se encontra devidamente fundamentado, ao contrário do que havia sido invocado pelo então Oponente nos artigos 12.º a 16.º do seu articulado inicial e ao invés do que veio a ser decidido na sentença apelada.
Por isso, neste ponto, terá que proceder o presente recurso.
IV.2 – Do conhecimento em substituição (art.º 665.º do CPC por remissão do disposto no art.º 281.º do CPC).
Deste modo, cabe agora conhecer das questões não apreciadas em primeira instância, por ter sido considerada prejudicada a respetiva análise, mais concretamente a questão da culpa do revertido pela insuficiência patrimonial da primitiva executada e a questão do invocado cumprimento defeituoso da audiência prévia no procedimento que conduziu ao despacho de reversão aqui enunciado.
Assim, o litígio aqui em causa tem um ponto de conexão com o acórdão proferido por este TCA no processo n.º 3333/14.5BEPRT, datado de 04.06.2020, designadamente no que tange à questão da culpa do Oponente. Assim, no aresto supra citado desta instância, a propósito da questão da culpa do Oponente (Recorrido) pela insuficiência patrimonial da devedora originária, relatou-se que:
“[…]
Ora, quanto à culpa importa referir que a reversão foi efectuada ao abrigo do disposto no art. 24º, nº 1, al. b) da LGT e que na al. b) se onera o responsável subsidiário com a prova de que não lhe foi imputável a falta de pagamento.
Como supra se disse, a alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT comporta uma presunção legal de culpa, recaindo sobre o administrador ou gerente o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária.
Demonstrada que seja a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora recai sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas colectivas ou ente fiscalmente equiparados “o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas” (art.º 32º da LGT).
Tem também a jurisprudência entendido que a culpa consiste na omissão da diligência exigível, e exprime sempre um juízo de censura em relação à actuação do agente (por este, pela sua capacidade e em face das circunstâncias concretas da situação, poder e dever ter agido de outro modo), tornava-se necessário que prove que administrou a empresa de molde a evitar que o seu património se tornasse insuficiente para a satisfação suas dívidas.
Sendo que, os deveres dos gerentes ou administradores que decorrem do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais " … é a de dirigir, administrar, conduzir a gestão social, o que se deve concretizar, particularmente, no exercício da actividade para que a sociedade se constituiu.”
Assim, quem assume as funções de administrador ou gerente deverá ter uma postura responsável e reflectida sem prejuízo da inerente discricionariedade técnica, no desempenho das suas funções, que se mostre adequado ao alcance dos objectivos para que a sociedade se constituiu.
Neste mesmo sentido, entre muitos outros, acórdão TCA Norte n.º 0086/01 de 07.12.2005, 0032/02 de 23.02.2006, 0002/03, de 16.03.2006 e 0021/12 de 06.04.2006, 00242/06.5 BECBR de 10.10.2013, 00333/11.0BEAVR de 16.10.2014 e 0589/06.0 BEPNL de 16.10.2014, disponíveis em www.dgsi.pt.
No caso dos autos, sendo a situação enquadrável na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, para que o Recorrido afastasse a sua responsabilidade subsidiária teria que demonstrar que a falta de entrega da prestação tributária não lhe era imputável.
De lembrar que estamos perante dívidas de IVA e de IRS, ou seja, de montantes que foram liquidados e cobrados a clientes (IVA) e montantes que foram retidos na fonte (IRS) pela entidade empregadora para serem entregues nos cofres do Estado, sendo que a sua não entrega ao Estado denota um comportamento censurável do oponente.
É certo que o oponente invocou que foram factores externos, alheios à sua vontade, que determinaram que a dívida exequenda não tivesse sido paga não lhe sendo imputável o não pagamento da dívida exequenda, no entanto e tal como é dito no Acd. deste TCAN proferido em 29/10/2009, processo nº 00228/07.2BEBRG “I -No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo de pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou entrega do imposto (art. 24º, nº1, al. b) da LGT). II- Assim, sendo as dívidas provenientes de IVA, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto não basta, em sede de oposição à execução fiscal, alegar que a empresa atravessava dificuldades económicas provocadas por motivos exógenos, que ele se esforçou por ultrapassar, e que foi um gestor diligente. III- Haverá, isso, sim, que demonstrar que a falta desse pagamento não lhe é imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor. IV- A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feita durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá que ser valorada contra o oponente”. Concluímos que no presente caso, sempre haveria que provar-se factualidade que permitisse a conclusão de que a sociedade não tinha os fundos necessários à entrega do imposto e que o Oponente nenhuma responsabilidade tinha nessa situação. Ora, a esse propósito nada ficou provado, nem o Oponente alegou o quer que fosse de concreto, antes se limitando, vaga e genericamente, a alegar factores externos alheios à sua vontade.
O oponente/Recorrido apesar de sustentar que tomou medidas como a redução de custos de funcionamento da devedora originária, com a dispensa de alguns trabalhadores, e que tudo fez para angariar novos contratos o certo é que nada provou nesse sentido.
Efectivamente limitou-se o oponente a invocar tal factualidade sem que a mesma tivesse qualquer reflexo probatório nos autos, pois não tratou de juntar qualquer documento probatório nesse sentido e a testemunha por si arrolada depôs de forma genérica e vaga e sem o adequado conhecimento de causa. Resuma do que vem dito, que não há nos autos prova alguma no sentido de que a falta de pagamento das dívidas de IVA e de IRS ora em cobrança coerciva não seja imputável ao Oponente. Nada se demonstrando no sentido de afastar a culpa do Oponente pela não entrega do IVA e do IRS, deve ele responder pelas mesmas ao abrigo da alínea b) do art. 24.º, n.º 1, da LGT.
[…]”
Ora, apropriando-nos dos fundamentos do acórdão supra mencionado, fazendo a sua transposição para o presente recurso, podemos aqui também concluir que não ficaram demonstrados factos que fossem subsumíveis a uma ausência de culpa por parte do Oponente (Recorrido) no que concerne à falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da executada originária.
Por isso, neste ponto, terá que improceder a presente oposição.
Em segundo lugar, cabe aferir da questão não conhecida em primeira instância, que se prende com o alegado cumprimento irregular da audiência prévia do interessado no procedimento que conduziu ao despacho de reversão aqui em causa.
A este propósito, citamos aqui o acórdão deste TCA, datado de 03-10-2018, proferido no processo n.º 00562/10.4BEPNF, no qual se relatou que:
“[…]
Como é sabido, resulta da lei e constitui jurisprudência pacífica e reiterada do Supremo Tribunal Administrativo que o exercício de facto das funções de administrador ou gerente constitui pressuposto da responsabilidade tributária destes, hoje prevista no artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT).
Nos termos do artigo 23.º n.º 4 da LGT a reversão, mesmo nos casos em que exista presunção de culpa, é precedida da audição do responsável subsidiário e da declaração fundamentada dos seu pressupostos e extensão a incluir na citação. Exige, assim, o legislador fiscal, que seja dado ao responsável subsidiário a possibilidade de se pronunciar sobre o ato que contra si ordena a reversão da execução fiscal.
Ora, a audição do responsável subsidiário concretiza o direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no n.º 4 do artigo 267.º da CRP.
No âmbito do exercício desse direito, é permitido ao particular a participação na decisão final, não só através da apresentação da sua perspectiva da situação, mas também através da sugestão da produção de novas provas que invalidem ou, pelo menos, ponham em causa as razões invocadas no projecto de decisão.
A audição prévia do sujeito passivo revertido permite-lhe pronunciar-se sobre o projeto de decisão, rebatendo os respectivos fundamentos e apresentando outros meios de prova com vista a alteração da proposta de decisão que vislumbra desfavorável, ou seja, permite-lhe questionar a sua legitimidade para a execução fiscal através da alegação e prova de factos que tendam a afastar a sua responsabilidade pelo pagamento das dívidas tributárias exigidas na execução fiscal.
[…]”.
Na presente situação não está em causa a efetiva ocorrência da fase procedimental da audição prévia do Oponente (Recorrido), que efetivamente teve lugar antes da emissão do despacho de reversão pelo qual se o responsabilizou. Assim, o que se pretende aferir, tal como alegado pelo Oponente, é se a forma como decorreu aquele momento procedimental correspondeu, ou não, ao que são os seus objetivos legais.
Ora, se atendermos no ofício recebido pelo ora Recorrido e no qual este foi convidado para se pronunciar em sede de audiência prévia (cf. alínea «D1» da factualidade aditada por esta instância), podemos constatar que efetivamente não é dito qual o montante da dívida em questão. Porém, também é verdade que são identificados os impostos em dívida, os respetivos períodos (anos), os processos de execução fiscal em questão e o quadro legal e motivador da projetada reversão. Ora, o que o Oponente referiu no seu articulado inicial é que a dita ausência de qualquer referência ao valor da dívida em questão, constituiria um incumprimento do disposto no n.º 4 do art. 23.º da LGT, quando neste se estatui que: “A reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação.” (sublinhado nosso). Assim, se bem interpretamos a posição do Oponente (Recorrido), a aludida referência normativa imporia, na sua visão, que se fizesse uma menção ao montante concreto da dívida exequenda. Assim, quando o legislador estatui o requisito da «extensão» da reversão, teve em mente quer o período a que respeitam as dívidas [intrinsecamente conexionado com a responsabilidade subsidiária] quer o seu montante [este francamente ligado à questão da insuficiência patrimonial], sendo que apenas com estes dois elementos podemos aferir se estão preenchidos os pressupostos da reversão. Ora, no caso presente, tal ditame legal não foi respeitado, verificando-se um inultrapassável vício de forma.
Por isso, quanto a esta última questão terá que proceder a presente oposição.

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Assim, nos termos do n.º 7 do art.º 663.º do CPC, apresenta-se o seguinte sumário:
I – O conhecimento pelo órgão da execução fiscal da declaração de insolvência da sociedade originária devedora é fundamento bastante para que considere haver fundada insuficiência do património daquela, a justificar a reversão contra o responsável subsidiário pela dívida exequenda (art.23.º nºs 2 e 7 LGT).
II – No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo de pagamento ou entrega terminou durante o período da sua administração, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou entrega do imposto (art. 24º, nº1, al. b) da LGT).
III- Assim, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido entregue o imposto cabe demonstrar os factos concretos que demonstraram que exerceu de forma diligente o cargo e que não foi por sua culpa que surgiu a dívida tributária.
IV – Quando no n.º 4 do art. 23.º da LGT o legislador usa a expressão “extensão” da reversão, não tem em mente a dimensão da dívida, teve em mente quer o período a que respeitam as dívidas [intrinsecamente conexionado com a responsabilidade subsidiária] quer o seu montante [este ligado à questão da insuficiência patrimonial], sendo que apenas com estes dois elementos podemos aferir se estão preenchidos os pressupostos da reversão.

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V – Dispositivo
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal em conceder provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida e, em substituição, considerando-se procedente a presente oposição.

Custas pela Recorrente (por vencida, em ambas as instâncias).


Porto, 27 de abril de 2023

Carlos A. M. de Castro Fernandes
Tiago A. Lopes de Miranda
Cristina da Nova