Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:01322/21.2BEBRG
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:01/14/2022
Tribunal:TAF de Braga
Relator:Hélder Vieira
Descritores:PROCESSO CAUTELAR, PERICULUM IN MORA, FACTOS
Sumário:I — No âmbito do disposto no artigo 120º do CPTA, na versão aprovada pelo Decreto-Lei nº 214-G/2015, de 02 de Outubro, constituem critérios cumulativos de decisão da tutela cautelar, independentemente da natureza antecipatória ou conservatória da providência requerida:
— (i) o periculum in mora, ou seja, o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e
— (ii) o fumus boni iuris, na sua formulação positiva, isto é, seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.

II — Não se verificando qualquer uma dessas duas situações, a providência cautelar não pode ser adoptada.

III — Todavia, confirmando-se a possibilidade de a providência requerida ser adoptada, pela verificação dos referidos critérios, pode a mesma ser ainda recusada — e é recusada — quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências — como dispõe o nº 2 do referido artigo 120º.

IV — Quanto ao periculum in mora, é ónus do requerente alegar e demonstrar os pertinentes factos que permitam a formulação de um juízo sobre o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.

V — Não é possível concluir pela verificação do pressuposto do periculum in mora se não foram alegados e provados factos que permitam concluir, de forma jus-relevante, que a privação da prestação em causa (subsídio de doença) diminuía drasticamente o nível de vida do Recorrente e/ou do seu agregado familiar, pondo em risco a satisfação das necessidades normais, correspondentes ao padrão de vida médio das famílias de idêntica condição social.*
* Sumário elaborado pelo relator
Recorrente:C,
Recorrido 1:Instituto da Segurança Social
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso.
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não emitiu parecer.
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Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

I – RELATÓRIO
Recorrente: C.
Recorrido: Instituto da Segurança Social, IP

Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que concluiu não poder ser decretada a providência cautelar requerida — suspensão da eficácia de actos que vieram determinaram a não subsistência de incapacidade para o trabalho e consequente cessação da atribuição do subsídio de doença —, julgando improcedente o processo cautelar, por inverificação do «periculum in mora».
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, do seguinte teor:
“A - Deve o despacho que dispensa a produção de prova se é revogado por violação das normas indicado e em sua substituição ser produzido um que decida pela produção da prova do requerente.
B- O tribunal ao ter decidido como decidiu julgaram o procedimento cautelar improcedente por não verificação de um dos pressupostos do artigo 120º do C.P.T.A., violou o próprio artigo 120º do diploma referido, devendo ser revogado e substituído por outro que declare que com matéria existente no processo este requisito se encontra verificado ou que para a verificação do mesmo é necessário a produção de prova conforme foi requerido novo requerimento inicial pelo requerente.
Devendo a sentença de que recorre ser revogada por errada interpretação da lei.
Nestes termos, nos melhores de direito e com mui douto suprimento de V.as Ex.as deve ser dado provimento ao presente recurso, e em consequência ser a sentença recorrida declarado nulo ou revogada por errada interpretação da lei.”.

O Recorrido não contra-alegou.

O Ministério Público foi notificado ao abrigo do disposto no artº 146º, nº 1, do CPTA, e não se pronunciou.

De harmonia com as conclusões da alegação de recurso, que balizam o objecto do recurso [(artigos 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi nº 3 do artigo 140º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA)], impõe-se determinar, se a tal nada obstar, se a decisão recorrida padece de erro de julgamento, de facto e de direito, nos aspectos adiante pontualmente indicados.

Sublinha-se que os recursos, sendo dirigidos contra a decisão do tribunal recorrido e respetivos fundamentos, têm, como vimos, o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso, a qual apenas pode incidir sobre as questões de facto e ou de direito que tenham sido apreciadas pelo tribunal «a quo» ou, no adequado contexto impugnatório, que aí devessem ser oficiosamente conhecidas.

II – FUNDAMENTAÇÃO
II.1 – OS FACTOS
Por não ter sido impugnada, nem haver lugar a qualquer alteração da matéria de facto, remete-se para os termos da decisão do TAF a quo sobre aquela matéria (artigo 663º, nº 6, do CPC), sublinhando-se que da mesma consta ainda que «Com interesse e relevância para a decisão a proferir, nada mais se julgou provado ou não provado.».

II.2 – O DIREITO
Como se sabe, o objecto do recurso jurisdicional é a sentença recorrida (artigo 627º do CPC) e não o acto administrativo sobre o qual esta se pronunciou, o que obriga o recorrente, na alegação de erro de julgamento, a demonstrá-lo nas alegações e conclusões do recurso, atacando os seus fundamentos com indicação das razões que levam a concluir pela sua alteração ou revogação, observando o disposto, designadamente, nos artigos 639º e 640º do CPC.
Se o não fizer e se se limitar a repetir os argumentos impugnatórios do acto recorrido, não se pode, nessa medida, tomar conhecimento do recurso nessa parte, precisamente pela ignorância das razões pelas quais devem os fundamentos da decisão recorrida ser afastados.
Tendo presente os termos da causa e os argumentos das partes, passamos a apreciar cada uma das questões a decidir no plano da impugnação da decisão sob recurso, tendo presente que «jura novit curia», o mesmo é dizer, de harmonia com o princípio do conhecimento oficioso do direito, que o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, tal como dispõe o nº 3 do artigo 5º do CPC.
Vejamos, em primeiro lugar e em síntese, o que vem peticionado e a situação de facto de que parte a sua pretensão cautelar.
O Requerente formulou o seguinte pedido:
“Termos em que deve o presente requerimento ser considerado provado e procedente e, em consequência, suspender-se as deliberações sindicadas ou adotar-se outra providência que o Tribunal considere mais adequada, tudo com as devidas e legais consequências.”.
E as referidas deliberações vêm identificadas no início do requerimento inicial, assim:
“…requerer a suspensão de eficácia da Decisão “constante do seu processo de atribuição de subsídio de doença que correu termos no Instituto da Segurança Social I.P. do Centro Distrital de Braga, relativa a decisão inicial de não concessão do subsídio de doença e da decisão da comissão de reavaliação e da reclamação da decisão desta comissão que foi comunicada por ofícios de 02-06-2021, do qual reclamou e veio a ser notificada da decisão da reclamação por ofício que foi comunicada por ofícios de 23-07-2021 que recebeu na mesma data em que fez o exame de reavaliação, sendo que da primeira notificação consta que pode apresentar requerimento de reavaliação no prazo de 10 dias úteis, não fazendo qualquer referência seja na notificação da primeira como na segunda ao direitos de reclamar, recorrer hierarquicamente ou para a impugnação contenciosa, sendo que de ambas as notificações, na primeira consta de relevante “Não subsiste a incapacidade temporária para o trabalho do beneficiário acima indicado a partir de 2021-06-02 (1)” e a referência à possibilidade de requerer a reavaliação, na segunda notificação a notificação só diz “Não subsiste a incapacidade temporária para o trabalho do beneficiário acima indicado a partir de 2021-06-02 ” do despacho proferido pela comissão de verificação e da reavaliação os fundamentos são “Não subsiste a incapacidade temporária para o trabalho do beneficiário acima indicado a partir de 2021-06-02.”, sendo a fundamentação da decisão inicial de cessação da subsídio de doença igual, sendo que em 29 de julho de 2021, com data de 27.07.2021, o aqui requerente recebeu uma notificação da decisão cujos fundamentos da cessação são “Ter sido declarada a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho pela comissão de reavaliação (alínea c) do n.º 2 do artigo 24.º)”, com remissão ora o decreto-lei na notificação acima indicado (…)”.
O Recorrente encontrava-se de baixa médica, portanto, com incapacidade para o trabalho até ao dia 09-08-2021 e a receber subsídio de doença.
E foi convocado para exame médico da Comissão de Verificação, por ofício de 24.05.2021, ao qual compareceu, tendo aquela comissão deliberado, em 02-06-2021, que “Não subsiste a incapacidade temporária para o trabalho do beneficiário acima indicado a partir de 2021-06-02 (1) Notifica-se V. Exª de que a não subsistência da incapacidade temporária determina a suspensão do subsídio de doença em curso, o qual cessará, nomeadamente, se não foi requerida a intervenção da Comissão de Reavaliação (…)”.
O ora Recorrente apresentou pedido de reavaliação, tenho sido convocado para exame médico, por ofício datado de 06-07-2021.
A Comissão de Reavaliação veio a deliberar, em 23-07-2021, que “Não subsiste a incapacidade temporária para o trabalho do beneficiário acima indicado a partir de 2021-06-02.”.
Assenta-se como facto provado indiciariamente, por se mostrar alegado e provado por acordo e pelo doc. 13 junto com o requerimento inicial, cujo integral teor se dá aqui por reproduzido, e por não integrar o acervo dos factos indiciariamente assentes, que o Recorrente veio a ser notificado, por ofícios de 02-06-2021 e, após reclamação sua visando a notificação dos fundamentos, de 23-07-2021 (doc. 13), de decisão do Instituto da Segurança Social, IP, referente ao “subsídio de doença” e subordinado ao “Assunto: Notificação da decisão”, sendo este último do seguinte teor, designadamente:
«Informa-se V. Exª de que haverá lugar à cessação do subsídio de doença se, no prazo de 10 dias úteis a contar da data de recepção deste ofício, não der entrada nestes serviços, resposta por escrito, da qual constem elementos que possam obstar à referida cessação, juntando meios de prova se for caso disso.
Os fundamentos para a cessão, previstos no Decreto-Lei acima citado, são os a seguir indicados:
Ter sido declarada a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho pela comissão de avaliação ( alínea c) do n.º 2 do art.º 24º).
Na falta de resposta, o despacho de cessação considera-se efectuado no primeiro dia útil seguinte ao termo do prazo acima referido (…).
Mais se informa que a referida cessação se efectiva a partir de 2021-06-03(1), podendo determinar a restituição das prestações que lhe tenham sido pagas indevidamente, a partir da referida data, sendo o montante a restituir oportunamente comunicado a V. Exª. (…)
(1) Dia seguinte à data da ocorrência dos factos que determinaram a cessação da prestação.”.
O conhecimento do mérito cautelar foi precedido de decisão do seguinte teor:
«Não obstante o Requerente ter requerido a produção de prova testemunhal, considera o Tribunal que a prova documental é suficiente para a decisão da causa, em sede cautelar, sendo dispensável a requerida diligência.
Assim, nos termos do artigo 118º, n.ºs 1 e 5 do C.P.T.A., decide-se não produzir a prova referida e passa a proferir-se sentença, de imediato.».
O Recorrente insurge-se contra a mesma, pretendo a sua revogação e substituição por outra que determine a produção de prova testemunhal no âmbito da matéria atinente ao «periculum in mora».
Eis a sua alegação no requerimento inicial:
“ii) Quanto ao periculum in mora
32. Caso os despachos não sejam objeto de suspensão, criará uma situação de facto consumado que perdurará durante muitos anos até que seja proferida uma sentença por parte deste tribunal, preenchendo, por isso, o pressuposto previsto no artigo 120º do CPTA.
33. Nos termos da alínea b) do n.º1 do artigo 120.º do C.P.T.A, o periculum in mora traduz-se no “fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar [ou ver reconhecidos] no processo principal”.
34. As providências cautelares visam impedir que, durante a pendência de qualquer ação, a situação de facto se altere de modo que a sentença nela proferida, sendo favorável ao requerente, perca toda a sua eficácia ou parte dela, o mesmo é dizer, obviar a que a sentença não se torne numa decisão para “encaixilhar” ou puramente “platónica”, da qual o seu destinatário retire apenas um ganho moral.
35. Nessa medida, o requisito do “periculum in mora” encontrar-se-á preenchido sempre que exista fundado receio que, quando o processo principal termine e sobre ele venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada ou cabal às situações jurídicas e pretensão objeto de litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja porque tal evolução gerou ou conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.
36. Para aferir da verificação ou não deste requisito, o juiz deve ponderar as circunstâncias concretas do caso em função da utilidade da sentença e não decidir com base em critérios abstratos, ponderando, designadamente, sobre as dificuldades que envolvem o restabelecimento da situação que deveria existir se a conduta ilegal não tivesse tido lugar- cfr. Acs. do STA de 09.06.2005 - Proc. n.º 0412/05, de 10.11.2005 - Proc. n.º 0862/05, de 01.02.2007 - Proc. n.º 027/07, de 14.07.2008 - Proc. n.º 0381/08, de 12.02.2012 - Proc. n.º 0857/11 e Ac. do TCAN de 14.09.2012 - Proc. n.º 03712/11.0BEPRT, disponíveis em «www.dgsi.pt/jtcn».
37. Nesse juízo de prognose, o juiz deve, por conseguinte, atender a todos os prejuízos que se mostrem relevantes para os interesses do requerente, quer o perigo respeite a interesses públicos, comunitários ou coletivos, quer estejam em causa apenas interesses individuais, sendo certo que o fundado receio na constituição de uma situação de facto consumado ou da verificação de prejuízos de difícil ou impossível reparação terá sempre de se alicerçar em circunstâncias factuais que revelem, de forma objetiva, a iminência da lesão e a necessidade imperiosa de serem tomadas providências que obstem à produção de tais prejuízos, não sendo apto para o efeito, as simples conjeturas ou receios subjetivos.
38. Note-se que nem todo o receio é digno de tutela, posto que um receio meramente eventual ou hipotético não é um “fundado receio”. No dizer de Abrantes Geraldes, in “Temas da Reforma do Processo Civil, vol. III, 3.ª ed., págs. 108, “o receio de ocorrência de lesão grave e dificilmente reparável deve ser fundado, ou seja, apoiado em factos que permitam afirmar com objectividade e distanciamento a seriedade e a actualidade da ameaça e a necessidade de serem adoptadas medidas tendentes a evitar o prejuízo.
39. Neste caso encontra-se o facto de o requerente que vais e operado à coluna e seguramente essa é uma das razões que devia ter sido mantida a baixa médica, o único meio de subsistência que tem, porque não pode trabalhar é o subsidio de doença, o mesmo toma várias medicações diárias que tem de comprar , tem de comparecer a consultas de especialidade, de fazer e pagar exames médicos, pagar que seja taxas moderadoras e como se transcreve no sumário do acórdão a seguir “será de reputar como irreparável ou de difícil reparação quando essa privação/redução puser em risco a satisfação de necessidades pessoais elementares, ou mesmo se determinar um drástico abaixamento do nível de vida do requerente e seu agregado familiar.” Docs 17 a 23
40. Com vista a justificar o fumus boni iuris e o periculum in mora bem como a superior necessidade da requerente relativamente ao “interesse público” que o requerido invocará ido e que os fundamentos das dificuldades enfrentadas pela mesma são de atender da forma que aqui se invoca se reproduz aqui parte do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte 2019/10.4BEPRT-B
Secção: 1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão: 08-06-2012
Tribunal: TCAN
Relator: Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Descritores: PROVIDÊNCIA CAUTELAR CONSERVATÓRIA, FUMUS BONI IURIS
PERICULUM IN MORA
Sumário: I. Nos procedimentos cautelares de natureza conservatória a prova bastante do requisito do fumus boni iuris é uma prova provisória, enquanto juízo de simples verosimilhança, que se carateriza no confronto com o exigido na ação principal por um menor grau de probabilidade (ainda que sério e fundado) da verificação da existência do facto e da violação do direito/interesse legalmente protegido.
II. O requisito do periculum in mora encontrar-se-á preenchido sempre que exista fundado receio que, quando o processo principal termine e sobre ele venha a ser proferida uma decisão, essa decisão já não venha a tempo de dar resposta adequada ou cabal às situações jurídicas e pretensão objeto de litígio, seja porque a evolução das circunstâncias durante a pendência do processo tornou a decisão totalmente inútil, seja porque tal evolução gerou ou conduziu à produção de danos dificilmente reparáveis.
III. Não é, todavia, um qualquer perigo de dano que justifica ou pode fundar a decretação duma providência cautelar porquanto se terá de exigir um perigo qualificado de dano, isto é, um perigo de dano que derive ou decorra da demora processual.
IV. Do facto de facilmente ser quantificável o prejuízo pecuniário resultante da privação/redução de vencimentos/subsídios/pensão não se pode sem mais concluir pela inexistência de «periculum in mora», pois, será de reputar como irreparável ou de difícil reparação quando essa privação/redução puser em risco a satisfação de necessidades pessoais elementares, ou mesmo se determinar um drástico abaixamento do nível de vida do requerente e seu agregado familiar.
41. V. Assim se da plena execução do ato, seus efeitos e suas consequências procedimentais derivar uma “taxa de esforço” alta que coloca em causa a possibilidade do requerente poder honrar os compromissos que havia assumido e que mensalmente se renovam, comportando e arrastando consigo necessárias e sérias dificuldades na difícil gestão e equilíbrio da sua vivência tem-se o requisito como verificado, tanto mais que inclusive a imediata execução obrigaria aquele “a viver a expensas” da pessoa com quem vive em união de facto passando esta a ter de suportar inteiramente, com seu rendimento, todos os encargos mensais daquele e aos quais acresceriam os encargos que a mesma também necessariamente suportará.”.
Fim da transcrição.
A sentença recorrida apreciou assim o pressuposto do «periculum in mora», designadamente:
«Vertendo sob o caso sub judice, e principiando pelo requisito do periculum in mora.
Traga-se, para aqui, novamente, a alegação do Requerente, neste domínio. Sustenta o Requerente que caso os despachos não sejam objeto de suspensão, criar-se-á uma situação de facto consumado que perdurará durante muitos anos até que seja proferida uma sentença por parte deste tribunal, preenchendo, por isso, o pressuposto previsto no artigo 120º do C.P.T.A.; mais alega que vais e operado à coluna e seguramente essa é uma das razões que devia ter sido mantida a baixa médica, o único meio de subsistência que tem, porque não pode trabalhar é o subsidio de doença, o mesmo toma várias medicações diárias que tem de comprar, tem de comparecer a consultas de especialidade, de fazer e pagar exames médicos, pagar que seja taxas moderadoras; e ainda que se da plena execução do ato, seus efeitos e suas consequências procedimentais derivar uma “taxa de esforço” alta que coloca em causa a possibilidade do requerente poder honrar os compromissos que havia assumido e que mensalmente se renovam, comportando e arrastando consigo necessárias e sérias dificuldades na difícil gestão e equilíbrio da sua vivência tem-se o requisito como verificado, tanto mais que inclusive a imediata execução obrigaria aquele “a viver a expensas” da pessoa com quem vive em união de facto passando esta a ter de suportar inteiramente, com seu rendimento, todos os encargos mensais daquele e aos quais acresceriam os encargos que a mesma também necessariamente suportará.
Ora, nesta sede, constata-se, desde logo, que a alegação do Requerente é meramente conclusiva. O Requerente basta-se com a alegação de que tem problemas de saúde e que o subsídio é a sua única fonte de rendimento e que a perda dessa receita coloca em causa o pagamento das diversas despesas que tem, referindo, ainda, que a não suspensão determinará que passe a viver a expensas da pessoa com quem vive em união de facto.
Em primeiro lugar, estas referências são, de tal modo, genéricas, que não permitem fazer um efetivo juízo sobre a necessidade do subsídio em causa. Note-se que nada é concretizado quanto a valores recebidos, nem quanto a valores gastos, não suprindo tal omissão a mera junção de documentos relativos a medicamentos e consultas, sem que se saiba exatamente qual o gasto mensal relativo a tal. O Requerente juntou um rol de documentos em que se verifica que há despesas várias, mas sem regularidade temporal ou reiteração, quanto a valores despendidos. A análise dos mesmos não permite assumir que há despesas frequentes e constantes com a qualidade de despesa (mais ou menos) fixa.
Além disso, e quanto à efetiva situação económica do Requerente, nada vem alegado que permita saber da necessidade da atribuição provisória do subsídio. O Requerente, como se disse já, refere algumas despesas avulsas, nada invocando quanto a despesas domésticas, correntes, de luz, água, gás, alimentação, vestuário; nada aduz quanto a despesas de empréstimos; nada refere quanto à composição do seu agregado familiar e despesas deste (fazendo uma breve alusão a pessoa com quem vive em união de facto); por outro lado, quanto a rendimentos, desconhece-se a sua situação financeira/patrimonial: se tem poupanças, bens, rendimentos (de qualquer natureza), entre outros, relativamente a si e ao agregado familiar.
Neste domínio, não basta alegar que não tem como pagar despesas; tem que se fornecer informação que permita ao Tribunal fazer as contas; é imperioso invocar e demonstrar quanto recebe e quanto gasta, de modo a que se avalie a efetiva necessidade da suspensão do ato de cessação do subsídio, com atribuição provisória do mesmo. O Tribunal tem que ser conhecedor do impacto que a perda do subsídio tem no nível de vida do Requerente; tem que perceber se há ou não alteração do nível de vida inicial.
A jurisprudência é unânime no sentido de que a redução do rendimento tem que contender com a subsistência do agregado familiar. Não é tanto uma questão de valores brutos, mas antes da diminuição drástica do nível de vida, ao ponto de colocar em crise a subsistência do agregado familiar ou alterar, por completo, o tipo de vida que tem.
A título de exemplo, veja-se o acórdão do TCA Norte de 20.02.2015, proferido no processo 00081/14.0BEAVR-A:
[…] 5 – Cabe ao Requerente da Providência alegar e provar a existência do periculum in mora, não bastando a mera invocação de considerações genéricas e conclusivas, de uma situação de facto consumado ou de produção de prejuízos de difícil reparação.
Impende sobre o Requerente o ónus de alegação de factos concretos que permitam ao Tribunal perspetivar a existência de prejuízos de difícil reparação ou de uma situação de facto consumado.
Ou, também, o acórdão, do mesmo Tribunal, de 11.09.2015, proferido no processo 00250/15.5BEAVR:
No que respeita à perda ou redução dos vencimentos, a jurisprudência assente é no sentido de que apesar de quantificável o prejuízo pecuniário resultante da privação de vencimentos, o mesmo é irreparável ou de difícil reparação se essa privação puser em risco a satisfação das necessidades pessoais elementares e se determinar um enorme abaixamento do nível de vida da Requerente e do seu agregado familiar (cfr., entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 27.02.2002, proferido no processo n.º 0174/02, disponível in www.dgsi.pt/jsta.nsf e o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 24.10.2013, proferido no processo n.º 10308/13, disponível in www.dgsi.pt/tca.nsf).”.
Nada vindo concretizado, em torno desta alegação, não pode o Tribunal emitir pronúncia, quanto aos eventuais danos, que aquela perda do subsídio de doença implica na vida do Requerente, não se tendo, por preenchido este requisito.
Neste sentido, e porque se reveste de todo o interesse, atente-se no acórdão do TCA Sul de 20.05.2021, proferido no acórdão 367/20.4BEBJA-A:
[…]
Todavia, não vem alegado nem demonstrado, desde logo, qual o agregado familiar do Requerente, qual as despesas deste e/ou do seu agregado familiar nem tão pouco se o seu salário é a única fonte de rendimento deste e/ou do seu agregado familiar.
Sem o apuramento de tais factos, as afirmações feitas em sede de fundamentação de direito são meras conjecturas. […]. [sublinhado próprio].
Mais ainda.
O Requerente alega, nesta sede, que há o risco de que o processo principal leve anos até ser decidido, estando, por isso, preenchido o pressuposto previsto no artigo 120º do C.P.T.A..
Ora, o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou a produção de prejuízos de difícil reparação implica que “o juiz deve, pois, fazer um juízo de prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença venha a ser inútil, por entretanto se terem produzido prejuízos de difícil reparação para quem dela deveria beneficiar, que obstam à reintegração específica da sua esfera jurídica.” – José Carlos Vieira de Andrade – A Justiça…, pág. 340.
Quanto à invocação de que o processo principal poderá demorar muitos anos até ser decidido, afirme-se, desde logo, que tal alegação é meramente eventual e hipotética.
Por um lado, sendo tal uma verdadeira preocupação, não se compreende como é que, até à data, a ação principal não foi intentada (sendo que se poderia aproveitar o ensejo e, até, antecipar o conhecimento do mérito nos termos do artigo 121º do C.P.T.A.).
Por outro lado, a demora processual não acarreta, em si mesma, uma situação de facto consumado. É que a mera demora processual, sem mais nenhuma situação de perigo (mormente a insuficiência económica que, como se viu acima, nem vem convenientemente alegada), não traz prejuízo irreparável ao Requerente. A demora processual não implica que, a final, o Requerente, tendo direito ao subsídio, não o receba. A demora processual, só por si, pode determinar que o Requerente, ao invés de receber, agora, um subsídio, a que tem (eventualmente) direito, só o receba em momento posterior; o problema do não pagamento não se coloca, mas apenas do momento em que é tal é efetuado.
Consequentemente, a dilação temporal do pagamento de um subsídio, sem mais, não preenche o requisito do periculum in mora – não é dano irreparável, nem facto consumado e irreversível.
Pelo que, igualmente, esta alegação não colhe.
Destarte, sendo as providências cautelares decretadas mediante o preenchimento, cumulativo, dos três pressupostos elencados no artigo 120º do C.P.T.A. – fumus boni iuris, periculum in mora e ponderação de interesses, falhando um, não pode o processo ser procedente, não podendo ser decretada a providência requerida.
Assim, julga-se improcedente o presente processo cautelar, por inverificação do periculum in mora, ficando prejudicada a análise dos demais pressupostos.».
Importa ter presente, sinteticamente embora, que no âmbito do disposto no artigo 120º do CPTA, na versão aprovada pelo Decreto-Lei nº 214-G/2015, de 02 de Outubro, constituem critérios cumulativos de decisão da tutela cautelar, independentemente da natureza antecipatória ou conservatória da providência requerida:
— (i) o periculum in mora, ou seja, o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal e
— (ii) o fumus boni iuris, na sua formulação positiva, isto é, seja provável que a pretensão formulada ou a formular nesse processo venha a ser julgada procedente.
Não se verificando qualquer uma dessas duas situações, a providência cautelar não pode ser adoptada.
Todavia, confirmando-se a possibilidade de a providência requerida ser adoptada, pela verificação dos referidos critérios, pode a mesma ser ainda recusada — e é recusada — quando, devidamente ponderados os interesses públicos e privados em presença, os danos que resultariam da sua concessão se mostrem superiores àqueles que podem resultar da sua recusa, sem que possam ser evitados ou atenuados pela adopção de outras providências — como dispõe o nº 2 do referido artigo 120º.
Quanto ao periculum in mora, é ónus do requerente alegar e demonstrar os pertinentes factos que permitam a formulação de um juízo sobre o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.
Quanto ao fumus boni iuris, tal como vertido no nº 1 do artigo 120º do CPTA, como critério de decisão na adopção de providências cautelares, apresenta uma formulação positiva, ou seja, pressupõe uma avaliação, em termos sumários, da existência do direito invocado pelo requerente ou das ilegalidades que o mesmo invoca e a provável procedência da acção principal (cfr. em jurisprudência válida para a versão actual do CPTA quanto ao fumus boni iuris na formulação positiva, entre outros, acórdãos do STA, de 28-10-2009, processo nº 0826/09; de 30-01-2013, processo nº 01081/12; acórdão do TCAN, de 14-03-2014, processo nº 01334/12.7BEPRT-A).
Como vertem Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 3ª ed., 2010, pág. 809, a propósito do critério do fumus boni iuris, na sua versão positiva, em redacção idêntica na alínea c) do nº 1 do artigo 120º do CPTA à que actualmente consta desse nº 1, são «no essencial, aplicáveis, neste caso, os critérios que, ao longo do tempo, foram elaborados pela jurisprudência e pela doutrina do processo civil sobre a apreciação perfunctória da aparência do bom direito, a que o juiz deve proceder no âmbito dos procedimentos cautelares», remetendo em nota de rodapé para «Miguel Teixeira de Sousa, Estudos…, pág. 233; Lebre de Freitas et alii, Código…, vol. II, pág. 35; e Acórdãos do STJ de 24 de Maio de 1983, in BMJ nº 327, pág. 613, e de 23 de Janeiro de 1986, in BMJ nº 353, pág. 376, referenciados naqueles locais».
Na verdade, já defendia Alberto dos Reis, A Figura do Processo Cautelar, BMJ nº 03, pág. 72 que o “tribunal, antes de emitir a providência, não se certifica, com segurança, da existência do direito que o requerente se arroga: limita-se (…) a formar um juízo de verosimilhança, a verificar a aparência do direito”.
E isto porque, como denota Alberto dos Reis, ob. Cit., pág. 38, «a garantia cautelar aparece, assim, posta ao serviço duma actividade jurisdicional posterior, que há-de restabelecer, de modo definitivo, a observância do direito; é destinada, não propriamente a fazer justiça, mas a dar tempo a que a justiça realize a sua obra».
Na verdade, o processo cautelar — artigos 112º, nº 1, e 113º do CPTA — tem por finalidade garantir que a decisão proferida no processo principal, de cognição plena, tenha aptidão para, aquando da sua prolação, produzir todos os efeitos para que tende, sendo necessário que “na altura da decisão exista uma situação de facto a que possa adaptar-se a situação jurídica apreciada ou constituída mediante o processo”, como verte Alberto dos Reis, ob. Cit., pág. 53.
Naturalmente, também neste caso os planos de apreciação envolvem os factos e o direito.
No plano factual, desde logo, é ónus do requerente alegar e demonstrar os pertinentes factos que permitam a formulação de um juízo de probabilidade de sucesso do seu pedido na acção principal, não sendo idónea a alegação de forma meramente conclusiva e de direito ou com utilização de expressões vagas e genéricas, devendo tornar credível a sua posição através do encadeamento lógico e verosímil de razões convincentes e objectivas nas quais sustenta a verificação dos requisitos de adopção da providência cautelar requerida.
No plano do direito, tal como a lei exige, deve avaliar-se, em exame perfunctório, segundo um juízo de verosimilhança e previsibilidade do resultado expectável, da probabilidade de procedência da pretensão formulada ou a formular no processo principal.
A apreciação do fumus boni iuris a que alude o nº 1 do artigo 120º do CPTA impõe, assim, um juízo cautelar que se satisfaz com a verosimilhança ou probabilidade, mas com subsistência bastante para fundar um juízo de probabilidade de procedência ou improcedência da pretensão impugnatória a deduzir no processo principal, estando excluída uma análise de tal forma detalhada que venha a desembocar na antecipação da decisão para a causa principal.
De resto, como refere Mário Aroso de Almeida, Medidas Cautelares no Ordenamento Contencioso – Breves Notas, Direito e Justiça, XI, 2, pág. 147, a propósito da necessidade da consagração deste critério do fumus boni iuris no âmbito da suspensão da eficácia de actos administrativos, «a consagração desde critério pressupõe o permanente respeito pela lógica da tutela cautelar, sendo, por isso, incompatível com a indagação exaustiva de questões cuja solução cabe no processo principal».
Por outro, são requisitos gerais do processo cautelar e, concludentemente, das providências que nele vierem a ser decretadas, a sua instrumentalidade (nº 1 do artigo 112º do CPTA), provisoriedade (artigos 112º, nº 1, e 123º do CPTA) e sumariedade (artigo 118º do CPTA).
Na verdade, visando a tutela cautelar, «prima facie», assegurar a utilidade da sentença a proferir no processo principal, apenas serão admissíveis providências cautelares de cariz provisório e que se revelem instrumentais em relação à acção principal, no assegurar da utilidade da sentença ali a proferir.
Donde, a inadmissibilidade de apreciação em sede cautelar de pedidos conducentes à resolução definitiva de um litígio, matéria que se encontra, ao invés, cometida ao processo principal, do qual a tutela cautelar é indissociável [cf., artigos 2.º, n.º 1 in fine e n.º 2 alínea q) e, bem assim, os artigos 112.º, n.º 1 e 113.º, n.º 1 todos do CPTA], sem prejuízo, naturalmente, da solução legal contida no artigo 121º do CPTA, de antecipação do juízo sobre a causa principal.
Vejamos o caso sub judice.
Como se disse, quanto ao periculum in mora, é ónus do requerente alegar e demonstrar os pertinentes factos que permitam a formulação de um juízo sobre o fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal.
Em causa está a cessação de um subsídio de doença por ter sido declarada a não subsistência da incapacidade temporária para o trabalho pela Comissão de Reavaliação médica.
O Autor, alega, embora conclusivamente e no que é despido das referências jurisprudenciais de direito, apenas isto no seu r.i. e transcreve-se:
No artigo 39º do r.i.: “39. Neste caso encontra-se o facto de o requerente que vais e operado à coluna e seguramente essa é uma das razões que devia ter sido mantida a baixa médica, o único meio de subsistência que tem, porque não pode trabalhar é o subsidio de doença, o mesmo toma várias medicações diárias que tem de comprar , tem de comparecer a consultas de especialidade, de fazer e pagar exames médicos, pagar que seja taxas moderadoras e como se transcreve no sumário do acórdão a seguir “será de reputar como irreparável ou de difícil reparação quando essa privação/redução puser em risco a satisfação de necessidades pessoais elementares, ou mesmo se determinar um drástico abaixamento do nível de vida do requerente e seu agregado familiar.” Docs 17 a 23”.
No artigo 41º do r.i.: “41. V. Assim se da plena execução do ato, seus efeitos e suas consequências procedimentais derivar uma “taxa de esforço” alta que coloca em causa a possibilidade do requerente poder honrar os compromissos que havia assumido e que mensalmente se renovam, comportando e arrastando consigo necessárias e sérias dificuldades na difícil gestão e equilíbrio da sua vivência tem-se o requisito como verificado, tanto mais que inclusive a imediata execução obrigaria aquele “a viver a expensas” da pessoa com quem vive em união de facto passando esta a ter de suportar inteiramente, com seu rendimento, todos os encargos mensais daquele e aos quais acresceriam os encargos que a mesma também necessariamente suportará.”.
Ora, a análise sobre a verificação dos enunciados pressupostos far-se-á sempre por referência a factos concretos a partir dos quais se possa fundamentar a existência de realidades subsumíveis aos critérios supra elencados, e não por meio de uma análise em abstrato sobre parcas alegações conclusivas.
E a testemunha arrolada não poderia depor sobre factos essenciais que não haviam sido alegados, precisamente porque se desconhecem, nem poderia, através do seu depoimento, «construir» em plena audiência uma causa de pedir atinente ao «periculum in mora», nem obviar ao que é um dever de especificação no requerimento cautelar.
Em princípio, tratando-se da cessação de um subsídio de doença, cessada esta deverá o interessado regressar ao trabalho e, portanto, a sua fonte de rendimento estará assegurada, não por via do subsídio, mas por via do vencimento.
No caso nada vem alegado, v.g., sobre a sua situação laboral, nem sobre os seus rendimentos, nem sobre os rendimentos e a composição do agregado familiar (para além da breve referência a uma união de facto), nem sobre a situação financeira e patrimonial, nem sobre as suas despesas domésticas.
O único argumento é este e é conclusivo: “, o único meio de subsistência que tem, porque não pode trabalhar é o subsidio de doença”.
Embora, logo a seguir, na invocação de que vive em união de facto, deixe expresso que a pessoa com quem vive em união de facto tem rendimentos, pois afirma que “a imediata execução obrigaria aquele “a viver a expensas” da pessoa com quem vive em união de facto passando esta a ter de suportar inteiramente, com seu rendimento, todos os encargos mensais daquele e aos quais acresceriam os encargos que a mesma também necessariamente suportará”.
O que, aparentemente e segundo o alegado, há-de conferir grau de protecção ao Recorrente no âmbito dessa união de facto, em face, designadamente do disposto nos artigos 3º e 5º da Lei nº 7/2001, de 11 de Maio, na versão actual, que adopta medidas de protecção das uniões de facto.
No caso presente, poder-se-ia concluir pela verificação do pressuposto do «periculum in mora» apenas no caso de terem sido alegados e provados factos que permitissem concluir, de forma jus-relevante, que tal privação diminuía drasticamente o nível de vida do Recorrente e/ou do seu agregado familiar, pondo em risco a satisfação das necessidades normais, correspondentes ao padrão de vida médio das famílias de idêntica condição social — o que não foi sequer alegado, sendo essa falta de alegação dos factos essenciais insuprível pelo mero depoimento de testemunha arrolada.
Como tal, não só o despacho que dispensa a produção de prova, como também a decisão sobre a inverificação do pressuposto do «periculum in mora», um e outro, não padecem da anti-juridicidade que o Recorrente lhes imputa.
Improcedem totalmente os fundamentos do recurso.
Em suma, à luz do alegado e sopesando os fundamentos do recurso, não se descortina qualquer erro substancial que contenda com a bondade e legalidade do considerado e decidido pelo Tribunal «a quo», pelo que é nosso entendimento que o recurso não pode proceder, o que se decide.

III. DECISÃO

Termos em que os juízes da Secção do Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte acordam em conferência, de harmonia com os poderes conferidos pelo artigo 202º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente (artigo 527º do CPC), sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que beneficie.
Notifique e D.N..

Porto, 14 de Janeiro de 2022


Helder Vieira
Alexandra Alendouro
Paulo Ferreira de Magalhães