Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00408/21.8BEPNF
Secção:1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão:10/14/2022
Tribunal:TAF de Penafiel
Relator:Helena Ribeiro
Descritores:CONTRATO DE TRABALHO A TERMO RESOLUTIVO-AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO-POSICIONAMENTO REMUNERATÓRIO NA CARREIRA.
Sumário:
I-O SIADAP é aplicável a todos os trabalhadores ao serviço da Administração Pública, aplicando-se aos trabalhadores vinculados mediante contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo.
II-A avaliação do desempenho, assente em critérios que visam reconhecer o mérito do desempenho profissional de cada trabalhador, releva na carreira, designadamente para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório (art.52.º, n.º 1, al. e) da LVCR e 91.º da LGTFP).
III- A alteração de posicionamento remuneratório pressupõe a integração do trabalhador numa carreira, o que não ocorre na contratação a termo (Art.º 56.º, n.º 6 da LGTFP).
IV- Nas situações em que os trabalhadores contratados a termo venham a celebrar contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, apenas relevam para alteração do posicionamento remuneratório, as avaliações obtidas na situação jurídico-funcional de contratados por tempo indeterminado.
Sumário (elaborado pela relatora – artigo 663º, n.º 7 do Cód. Proc. Civil).
Recorrente:AA
Recorrido 1:ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO NORTE, I.P
Votação:Unanimidade
Meio Processual:Acção Administrativa Especial para Impugnação de Normas (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão:Negar provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:Não foi emitido parecer.
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo:
I. RELATÓRIO
1.1. AA, residente na Rua ..., moveu a presente ação administrativa contra a ADMINISTRAÇÃO REGIONAL DE SAÚDE DO NORTE, I.P., com sede na Rua de ...., na qual formulou os seguintes pedidos: “Nestes termos e nos mais de direito, recebida a petição, ordenada e feita as citações e observados os ulteriores trâmites, deve: A) ser anulada a decisão que está subjacente à notificação feita à Autora em 02-03-2021 e que a Ré melhor identificará e juntará aos autos; /B) reconhecer-se que a Autora tinha direito a ver contabilizados os pontos atribuídos pelo seu desempenho entre 2005 e 2016, num total de 15 pontos e, consequentemente, a ser posicionada na 2ª posição remuneratória da categoria de enfermeira, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018;/C)reconhecer-se que os pontos sobrantes não utilizados na alteração de posicionamento referida na alínea anterior, num total de cinco, devem ser mantidos e considerados em futura alteração de posicionamento remuneratório da Autora./D)condenar-se a Ré a pagar à Autora todos os créditos salariais resultantes da diferença entre as remunerações ou suplementos pagos a partir de janeiro de 2018 e as remunerações ou suplementos que eram efetivamente devidos a partir daquela data tendo em conta o posicionamento remuneratório referido em B), acrescidos de juros moratórios à taxa de 4%, contados desde a data de vencimento de cada prestação devida até efetivo e integral pagamento.»
Para tanto, alega, em síntese, que é enfermeira e que no período compreendido entre 01/09/2004 e a data em que celebrou contrato de trabalho por tempo indeterminado com a Ré - 31/12/2013 - exerceu funções no Centro de Saúde de Paredes e Rebordosa, em regime de contrato de trabalho a termo certo.
Desde o início do seu vínculo nunca progrediu na carreira, nem através de promoção nem através de alteração de posicionamento remuneratório, permanecendo sempre na primeira posição/escalão remuneratório a que corresponde atualmente a remuneração base mensal de €1.205,08, nível 15 da tabela remuneratória única.
Em 02/03/2021 a Ré entregou-lhe um ofício no qual lhe comunicou os pontos acumulados por avaliação de desempenho até 31/12/2017, sendo que aí não constava a contabilização dos pontos acumulados entre 2005 e 2013, sendo apenas considerados os pontos acumulados a contar de 2014.
Ao assim proceder, entende que a Ré violou o direito ao pleno desenvolvimento da sua carreira profissional, o que constitui uma enorme injustiça e discriminação injustificada em relação a outros trabalhadores da mesma carreira e uma ofensa aos princípios da confiança e da segurança jurídica ínsitos no princípio do Estado de Direito Democrático.
Está em causa a efetivação do direito ao desenvolvimento da sua carreira profissional através da alteração obrigatória do posicionamento remuneratório fundada na avaliação de desempenho, que não é exclusivo dos trabalhadores em funções públicas vinculados por tempo indeterminado ou por qualquer outra das modalidades de vínculo de emprego público.
Defende que a decisão em causa, na parte em que deixa de contabilizar a totalidade dos pontos atribuídos à Autora (11,5 pontos), deve ser anulada, por fazer errada aplicação das normas dos artigos 18.º da LOE e 156.º, n.º 7 da LTFP, bem como, por violação dos princípios constitucionais da confiança e da segurança.
1.2. Citada, a Ré contestou, defendendo-se por impugnação, alegando, em síntese, não terem acolhimento as pretensões da autora nas normas jurídicas aplicáveis, designadamente, do DL nº 122/2010, de 11/11 e Circular Informativa nº 2.... da ACSS, IP.
Conclui, pugnando pela improcedência da ação.
1.3. Dispensou-se a realização da audiência prévia.
1.4. Proferiu-se despacho saneador tabelar e fixou-se o valor da causa em € 9.692,37 (nove mil, seiscentos e noventa e dois euros e trinta e sete cêntimos).
1.5. Em 21/03/2022, proferiu-se decisão final contendo a mesma o julgamento de facto e de direito, onde se julgou improcedente a presente ação, a qual consta do seguinte dispositivo:
«Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se a ação improcedente e, em consequência, absolve-se a entidade demandada dos pedidos.
Custas a cargo da autora.
Registe e notifique.»
1.6. Inconformada com a decisão assim proferida que julgou a ação improcedente, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, formulando as seguintes Conclusões:
«1. A Recorrente é enfermeira e atualmente exerce funções por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado celebrado com a Recorrida em 31-12-2013.
2. Em 02-03-2021, foi notificada, ao abrigo e nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 18.º da Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, que aprovou Orçamento do Estado para o ano de 2018 (LOE 2018), dos pontos acumulados por avaliação de desempenho até 31 de dezembro de 2017 para efeitos de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório.
3. De acordo com essa notificação, seriam contabilizados à Recorrente, até 31.12.2017, apenas 3,5 pontos, correspondentes à soma dos pontos obtidos nos anos de 2014, 2015 e 2016, concluindo-se que não haveria lugar a alteração de posicionamento remuneratório por acumulação de pontos, mantendo-se a Recorrente posicionada, à data de 31-12-2017, na 1ª posição da categoria de enfermeira, nível 15, a que corresponde uma remuneração mensal de 1201,48€.
4. Por não se conformar com tal decisão, a Recorrente intentou a presente ação, alegando, em suma, que entre 01-09-2004 e 30-12-2013 se manteve vinculada à Recorrida em regime de contratos de trabalho a termo e contrato de trabalho em funções públicas a termo (a partir de 01-01-2009) e, por essa razão, tinha direito também à contabilização dos pontos pelo desempenho tido nos anos de 2005 a 2013, num total de 15 pontos.
5. O tribunal a quo não deu provimento à pretensão da Recorrente, argumentando, em suma, que a Recorrente só ingressou na carreira a partir de 30 de dezembro de 2013, data em que outorgou contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, e que só a partir daí “poderá progredir consoante a avaliação que lhe foi atribuída”. Defendeu o tribunal a quo que só com a celebração do contrato de trabalho por tempo indeterminado é que a Recorrente “passou a estar inserida no regime remuneratório, no modelo de avaliação de desempenho e nas regras de alteração de posicionamento remuneratório aplicável ao novo regime contratual” e que “inexiste norma legal que atribua, para efeitos de carreira, relevância ao tempo de serviço anteriormente prestado ao abrigo de um outro contrato de diferente natureza”, negando que seja aplicável ao caso concreto o princípio da continuidade do exercício de funções públicas, previsto atualmente no artigo 11.º da LTFP e antes no artigo 84.º da LVCR, dado que “resulta expressamente dos normativos invocados que tal princípio se reporta apenas e só à continuidade do exercício de funções no caso de haver mudança definitiva de órgão ou serviço”, o que não sucede no caso em apreço porque, alega o tribunal a quo, que a Recorrente sempre celebrou contrato para desenvolver a sua atividade profissional no Agrupamento de Centros de ... .
6. A Recorrente, com o devido respeito, não pode conformar-se com a decisão recorrida.
DA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO
7. São relevantes para a decisão da causa, os seguintes factos, demonstrados nos autos:
I) Em 01-09-2004, a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 3 e 4 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 53/98, de 11/03, com início em 01-09-2004 e pelo prazo de 3 meses, com a possibilidade de renovação por um único e igual período (cf. documentos de fls. 421-422, 174 e 177 do PA).
II) A Autora foi admitida com a categoria equiparada a enfermeira, para exercer funções na Unidade de P... do Centro de Saúde de ..., mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (cf. cláusulas 1.ª, 3.ª e 6.ª do contrato de fls. 421-422 e guia de apresentação de fls. 415 ou 430 do PA).
III) O motivo justificativo para a aposição do termo resolutivo foi a necessidade de “ocorrer a situações de necessidades de pessoal de enfermagem” (cf. cláusula 1.ª do contrato de fls. 421-422.
IV) O contrato referido em I) renovou-se por mais 3 meses em 01-12-2004, terminando 28¬02-2005 (cf. documentos 174, 177 e 371 do PA), renovação que foi justificada pela “carência de recursos ao nível de pessoal de enfermagem nesta Sub-região” e considerada como “imprescindível” para assegurar “a normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem aos utentes” (cf. documento de fls. 383 do PA).
V) Em 08-03-2005, a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 3 e 4 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 53/98, de 11/03, com início em 08-03-2005 e pelo prazo de 3 meses, com a possibilidade de renovação por um único e igual período (cf. documentos de fls. 364-365, 174 e 177 do PA);
VI) A Autora foi admitida com a categoria equiparada a enfermeira para exercer funções na Unidade de P... do Centro de Saúde de ..., mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (cf. cláusulas 1.ª, 3.ª e 6.ª do contrato de fls. 364-365 e guia de apresentação de fls. 363 do PA).
VII) No referido contrato, foi indicado como motivo para a aposição do termo resolutivo a necessidade de “ocorrer a situações de necessidades de pessoal de enfermagem”, sendo certo que no pedido de autorização para a respetiva celebração também foi invocada a “carência de recursos de enfermagem na Unidade de P....” (cf. documento de fls. 366 do PA).
VIII) O contrato referido em V) renovou-se por mais 3 meses em 08-06-2005, terminando 08-09-2005 (cf. documento 174, 177, 355, 356, 351-352 do PA), renovação que foi justificada pela “carência de recursos ao nível de pessoal de enfermagem nesta Sub-região” e considerada como “imprescindível” para assegurar “a normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem aos utentes” (cf. documento de fls. 349 do PA).
IX) Em 15-09-2005, a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 3 e 4 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 53/98, de 11/03, com início em 15-09-2004 e pelo prazo de 3 meses, com a possibilidade de renovação por um único e igual período (cf. documentos de fls. 320-321, 174 e 177 do PA);
X) A Autora foi admitida com a categoria equiparada a enfermeira, para exercer funções na Unidade de P... do Centro de Saúde de ..., mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (cf. cláusulas 3.ª e 6.ª do contrato de fls. 320¬321 e guia de apresentação de fls. 319 do PA).
XI) No referido contrato, foi indicado como motivo para a aposição do termo resolutivo a necessidade de “ocorrer a situações de necessidades de pessoal de enfermagem”, sendo certo que no pedido de autorização para a respetiva celebração também foi invocado que esta seria imprescindível para “garantir a qualidade na prestação dos cuidados de enfermagem aos utentes” (cf. documento de fls. 324 do PA).
XII) O contrato referido em IX) renovou-se por mais 3 meses em 15-12-2005, terminando 15-03-2006 (cf. documentos 174, 177, 301-302, 252 do PA), renovação que foi justificada pela “carência de recursos ao nível de pessoal de enfermagem nesta Sub-região” e considerada como “imprescindível” para assegurar “a normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem aos utentes” (cf. documento de fls. 359 do PA).
XIII) Em 22-03-2006, a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 3 e 4 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 53/98, de 11/03, com início em 22-03-2006 e pelo prazo de 3 meses, com a possibilidade de renovação por um único e igual período (cf. documentos de fls. 230-231, 174 e 177 do PA);
XIV) A Autora foi admitida com a categoria equiparada a enfermeira, para exercer funções na Unidade de P... do Centro de Saúde de ..., mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (cf. cláusulas 3.ª e 6.ª do contrato de fls. 230¬231 e guia de apresentação de fls. 249 do PA).
XV) No referido contrato, foi indicado como motivo para a aposição do termo resolutivo a necessidade de “ocorrer a situações de necessidades de pessoal de enfermagem”,, sendo certo que no pedido de autorização para a respetiva celebração foi invocada a imprescindibilidade do contrato “para garantir a qualidade na prestação dos cuidados de enfermagem” aos utentes na Unidade de P.... (cf. documento de fls. 232 do PA).
XVI) O contrato referido em XIII) renovou-se por mais 3 meses em 22-06-2006, terminando 22-09-2006 (cf. documentos 174, 177, 209 do PA), renovação que foi justificada pela “carência de recursos ao nível de pessoal de enfermagem nesta Sub-região” e considerada como “imprescindível” para assegurar “a normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem aos utentes” (cf. documento de fls. 209 do PA).
XVII) Em 29-09-2006, a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 3 e 4 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 53/98, de 11/03, com início em 29-09-2006 e pelo prazo de 3 meses, com a possibilidade de renovação por um único e igual período (cf. documentos de fls. 264-265, 174 e 177 do PA);
XVIII) A Autora foi admitida com a categoria equiparada a enfermeira, para exercer funções na Unidade de P... do Centro de Saúde de ..., mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (cf. cláusulas 1.ª, 3.ª e 6.ª do contrato de fls. 264-265 e guia de apresentação de fls. 222/211 do PA).
XIX) No referido contrato, foi indicado como motivo para a aposição do termo resolutivo a necessidade de “ocorrer a situações de necessidades de pessoal de enfermagem”, sendo certo que no pedido de autorização para a respetiva celebração foi invocada a imprescindibilidade do contrato “para garantir a qualidade na prestação dos cuidados de enfermagem aos utentes” na Unidade de P.... (cf. documento de fls. 266 do PA).
XX) O contrato referido em XVII) renovou-se por mais 3 meses em 29-12-2006, terminando 29-03-2007 (cf. documentos 174, 177 e 203 do PA).
XXI) Em 05-04-2007, a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 3 e 4 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 53/98, de 11/03, com início em 05-04-2007 e pelo prazo de 3 meses, com a possibilidade de renovação por um único e igual período (cf. documentos de fls. 196, 193, 192, 189, 174 e 177 do PA);
XXII) A Autora foi admitida com a categoria equiparada a enfermeira, para exercer funções enfermeira na Unidade de P... do Centro de Saúde de ..., mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (cf. cláusulas 1.ª, 3.ª e 6.ª do contrato de fls. 189 e guia de apresentação de fls. 186 do PA).
XXIII) No referido contrato, foi indicado como motivo para a aposição do termo resolutivo a necessidade de “ocorrer a situações de necessidades de pessoal de enfermagem”, sendo certo que no pedido de autorização para a respetiva celebração foi invocada a imprescindibilidade do contrato “para garantir a qualidade na prestação dos cuidados de enfermagem aos utentes” na Unidade de P.... (cf. documento de fls. 193 do PA).
XXIV) O contrato referido em XXI) renovou-se por mais 3 meses em 05-07-2007, terminando 05-10-2007 (cf. documentos 174, 177 e 183 e 182 do PA), renovação que foi considerada imprescindível “para garantia da qualidade dos cuidados de enfermagem” (cf. documento de fls. 184 do PA).
XXV) Em 08-10-2007, a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 3 e 4 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 53/98, de 11/03, com início em 08-10-2007 e pelo prazo de 3 meses, com a possibilidade de renovação por um único e igual período (cf. documentos de fls. 153-154, 174 e 177 do PA);
XXVI) A Autora foi admitida com a categoria equiparada a enfermeira, para exercer funções na Unidade de Saúde ... e Rebordosa, mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (cf. cláusulas 1.ª, 3.ª e 6.ª do contrato de fls. 153-154 do PA).
XXVII) No referido contrato, foi indicado como motivo para a aposição do termo resolutivo a necessidade de “ocorrer a situações de necessidades de pessoal de enfermagem”, sendo certo que no pedido/proposta para a respetiva celebração foi invocado o objetivo de garantir que “os cuidados de enfermagem a prestar à população utente não fiquem comprometidos” (cf. documento de fls. 145 do PA).
XXVIII) Em 27-12-2007, ainda antes de decorrido o prazo do contrato mencionado em XXV), a Autora celebrou com a Ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, ao abrigo do n.º 1 e 2 do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, aprovado pelo DL 11/93, de 15/01, na redação que lhe foi dada pelo DL 276-A/2007, de 31/07, com início em 21-12-2007 e pelo prazo de 1 ano (cf. documentos de fls.158-159 do PA).
XXIX) No referido contrato, foi indicado como motivo justificativo para a aposição do termo a necessidade de “ocorrer a situações de carência que colocam em causa a prestação de cuidados de saúde”.
XXX) A Autora foi admitida para exercer as funções correspondentes às da categoria de enfermeira na Unidade de Saúde ... e Rebordosa, mediante remuneração mensal igual à remuneração do 1.º escalão remuneratório da categoria de enfermeiro dos “funcionários e agentes” (documentos de fls. 138, 136 e 118 e cláusulas 1.ª e 6.ª do contrato de fls. 158-159 do PA).
XXXI) O contrato referido em XXVIII) foi sujeito a várias adendas e manteve os seus efeitos até 30-12-2013, data em que a Autora celebrou o contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado junto com a petição inicial sob o documento 1 (cf. facto alegado na petição inicial em 4-b/, não contestado pela Ré; cf. também os documentos de fls. 117, 108, 106 e 101 do PA).
XXXII) Por documento datado de 02-07-2009, a Administração Central do Sistema de Saúde, IP (ACSS) formulou uma “Proposta de superação das dificuldades gestionárias provocadas pela caducidade dos contratos celebrados ao abrigo do artigo 18.º A do estatuto do SNS” nos termos que constam do documento de fls. 110-112 do PA que aqui se dão por reproduzidos.
XXXIII) Nesse documento a ACSS, concluiu que:
H) “Os 6.560 contratados a atermos resolutivo certo, ao abrigo do Estatuto do SNS asseguram necessidades permanentes”;
I) A não manutenção destes contratos fará ruir a capacidade de resposta do SNS, com particular incidência na rede de cuidados de saúde primários;
J) Os contratos em questão converteram-se a 1/1/2009, em contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo certo;
K) O RCTFP passou a ser-lhes aplicável nos termos constantes do artigo 14.º da Lei Preambular, ou seja, a sua duração máxima será de 3 anos, renováveis até ao máximo de outros 3 anos, mediante autorização do MEF;
L) Porque a situação não pode perdurar nestes moldes, face à natureza de necessidade permanente das funções me questão, é necessário constituir relação jurídicas de emprego público por tempo indeterminado;
M) Considerando que não existem excedentes nos grupos profissionais aqui em causa, não é viável recrutar profissionais dentre os que já detêm vínculo de direito público por tempo indeterminado;
N) A solução definitiva da questão passa, então, por despoletar os procedimentos concursais de constituição de relações de emprego público por tempo indeterminado com os 6.560 profissionais que, presentemente, se encontram contratados a termo certo, o que pressupõe que os mesmos sejam precedidos de parecer favorável do MFAP.”
XXXIV) Na sequência, em 15-07-2009, o Gabinete da Senhora Ministra da Saúde também emitiu proposta sobre o mesmo assunto, nos termos que constam do documento de fls. 108-109 do PA que aqui se dão por reproduzidos.
XXXV) Nessa proposta, foi consignado, além do mais, que:
a. “As especiais características do Serviço Nacional de Saúde em matéria de recursos humanos têm justificado que, ao longo dos tempos, se tenha sentido a necessidade de se adoptar mecanismos próprios de recrutamento e contratação de profissionais com a flexibilidade adequada para evitar rupturas no funcionamento dos serviços que directamente prestam cuidados de saúde”.
b. “Neste sentido, o artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço nacional de Saúde (...) previa a possibilidade de, a título excecional, serem celebrados contrato de trabalho a termo resolutivo certo, obedecendo a um processo de seleção simplificado”.
c. “Nesse contexto, foram celebrados 6.560 contratos para providenciar a prestação de cuidados de saúde e apoio a essa prestação com carácter de regularidade e na primeira linha de intervenção, nomeadamente na rede de cuidados primários”, contratos cuja vigência, por força do n. 1 do artigo 2.º do DL 276-A/2007, de 31 de julho, “não poderia ultrapassar o último dia do prazo de dois anos a contar da data da entrada em vigor do referido decreto-lei, ou seja, 31 de julho de 2009”.
d. “Todavia, com a entrada em vigor do Regime do Contrato de Trabalho em funções Públicas (...), as disposições legais que admitiam e regulavam a celebração de contratos a termo resolutivo, ao abrigo e nos termos do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, encontram-se tacitamente revogadas desde 1 de janeiro de 2009, pelo que a contratação a termos de trabalhadores dos serviços da Administração Pública efetua-se doravante nos termos deste novo diploma”, devendo “observar agora o regime consignado no artigo 103.º do RCTFP4, por força do disposto no artigo 14.º da Lei Preambular que aprova o novo regime contratual da Administração Pública”.
4 Esta norma previa que “O contrato a termo certo dura pelo período acordado, não podendo exceder três anos, incluindo renovações, nem ser renovado mais de duas vezes, sem prejuízo do disposto em lei especial”.
XXXVI) Por tais razões, o Gabinete da Senhora Ministra da Saúde propôs que:
a) Fossem renovados os 6.560 contratos de trabalho a termos resolutivo desde 1 de janeiro de 2009 até 31 de julho de 2010;
b) O prazo de vigência dos contratos referidos no número anterior seria o estritamente necessário à conclusão dos procedimentos concursais conducentes ao preenchimento do posto de trabalho, previsto no mapa de pessoal de cada instituição, cujas necessidades os profissionais contratados satisfaziam.
XXXVII) Por despacho de 20-07-2009, o Senhor Secretário de Estado da Administração Pública manifestou concordância com as propostas formuladas pelo Gabinete da Senhora Ministrada Justiça e ACSS e autorizou a renovação dos 6560 contratos de trabalho a termos resolutivo desde 1 de janeiro de 1009 a 31 de julho de 2010 (cf. despacho manuscrito no documento de fls. 108-109 do PA).
XXXVIII) Por deliberação do Conselho Diretivo da Ré ARS Norte datada de 22.06.2010, foi autorizada a abertura de procedimento concursal comum para o preenchimento de 34 postos de trabalho da carreira especial de enfermagem e categoria de enfermeiro, a qual se consubstanciou através da publicação na 2.ª série do DR do aviso n.º 16...010, de 19 de agosto, destinado a trabalhadores já detentores de uma relação jurídica de emprego público titulada por contrato de trabalho por tempo indeterminado, determinado ou determinável, nos termos do n.º 2 e 6 da Lei 12-A/2008, de 27 de fevereiro (cf. documento de fls. 45-48 do PA).
XXXIX) O procedimento concursal referido na alínea anterior apenas veio a concluir-se em 23.11.2011, data em que foi proferido despacho de homologação da lista de classificação final pelo Senhor Presidente do Conselho Diretivo da Ré ARS Norte (cf. documento de fls. 45-48 do PA).
XL) A Autora candidatou-se e foi selecionada no concurso em causa, integrando a respetiva lista de classificação final (cf. documentos de fls. 45-48 e 31-38 do PA).
XLI) O despacho referido na alínea XXXIX. foi, no entanto, impugnado por recurso administrativo, o que fez com que só em 27-12-2013 a Ré ARS estivesse “em condições de dar continuidade aos procedimentos inerentes ao recrutamento dos candidatos selecionados” no referido concurso (cf. documento de fls. 45-48 do PA).
XLII) Na sequência, foi autorizada a celebração de contratos de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado com os candidatos selecionados, incluindo a Autora, por deliberação do Conselho Diretivo da Ré de 16-12-2013 e despacho do Vogal daquele Conselho Diretivo, Dr. Ponciano Oliveira, de 27.12.2013 (cf. documento de fls. 31-38 do PA).
XLIII) Contrato que, no caso da Autora, foi formalizado em 30-12-2013 e tem o conteúdo constante do documento 1 junto com a petição inicial.
8. Os factos acima elencados em 7., que dão maior concretização e correção aos factos dados como assentes na sentença recorrida nas alíneas B), C), F), G) e H), assumem relevância para a decisão da causa, tendo em conta o objeto da ação e os fundamentos e argumentos invocados na sentença recorrida e que determinaram a sua improcedência.
9. Permitem, além do mais, compreender as específicas razões que levaram a que a Recorrente estivesse vinculada à Recorrida em regime de contrato a termo durante mais de 9 anos, razões que, salva melhor opinião, não podem deixar de ser consideradas e relevadas na decisão desta causa, deles resultando, além do mais, que:
a. entre 01-09-2004 e 30-12-2013, data em que outorgou contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, a Recorrente manteve com a Recorrida vínculo ou relação jurídica de emprego público, através de sucessivos contratos de trabalho a termo, celebrados ao abrigo do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde.
b. Estes contratos não foram celebrados e renovados para a satisfação de qualquer necessidade excecional e transitória da Recorrida, mas sim para assegurar necessidades permanentes ou a “normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem” nos serviços onde a Recorrente esteve colocada.
c. O recurso à contratação a termo de enfermeiros (incluindo a Recorrente) visou apenas permitir o recrutamento através de um processo muito mais simplificado e, assim que deixou de ser legalmente possível este mecanismo (com a revogação do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde e conversão dos contratos a termo resolutivo em contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo a partir de 1 de janeiro de 2009, sujeitos às normas previstas no RCTFP), foram desencadeados os procedimentos tendentes à contratação por tempo indeterminado de todos os enfermeiros com vínculo estabelecido ao abrigo do citado artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, incluindo a Recorrente.
d. Os contratos a termo acima indicados foram celebrados com hiatos de apenas alguns dias, sendo certo que desde 08-10-2007 o vínculo ou relação jurídica de emprego público estabelecida entre Recorrente e Recorrida é ininterrupto.
e. Ao contrário do que é afirmado na fundamentação da sentença recorrida, a Recorrente não foi contratada para exercer a sua atividade sempre no mesmo local, tendo trabalhado primeiramente na Unidade de P.... e, posteriormente, na Unidade de Saúde Familiar de B.....
10. Acresce que o facto dado como assente na alínea B) da sentença recorrida não faz referência ao contrato mencionado em XXV a XXVII, celebrado em 08-10-2007, e o facto dado como assente na alínea F) contém um erro na indicação da data do concurso, que foi publicitado em 19-08-2010 e não em 19-08-2013.
11. Devem, por isso, os factos acima referidos nas alíneas I) a XLIII) da conclusão 7. ser aditados à matéria de facto assente, em substituição dos factos das alíneas B), C) F), G) e H).
Por outro lado,
12. Pese embora nas alíneas I) e J) da matéria de facto da sentença recorrida tenha sido dado como assente que foi enviado e recebido o ofício junto com a petição inicial sob o documento 8, parcialmente transcrito na sentença, importará também, salva melhor opinião, dar como assentes os factos propriamente ditos que esse ofício revela ou dá a conhecer, ou seja:
XLIV) Até 31.12.2017, foram contabilizados à Autora os seguintes pontos para efeitos de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório:
a) 2014 – 1,5 pontos, em função da avaliação que foi feita ao desempenho da Autora e que lhe valeu a menção qualitativa de “Satisfaz”;
b) 2015 – 1 ponto, por ausência de avaliação;
c) 2016 – 1 ponto, por ausência de avaliação;
Total: 3,5 pontos
XLV) Consequentemente, a Autora foi mantida na 1ª posição remuneratória da sua categoria, correspondente a uma remuneração de 1201,48€.
DO DIREITO
13. Não se ignoram as disposições invocadas na sentença recorrida que restringiam e restringem a aplicação normas que regem ou organizam as carreiras dos trabalhadores em funções públicas com vínculo definitivo ou por tempo indeterminado e que impossibilitam que um trabalhador contratado a termo, enquanto se mantiver nessa modalidade de vínculo, não possa progredir na carreira, designadamente através de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório.
14. Esta restrição tem, aliás, todo o sentido e razão de ser, estando relacionada com a própria natureza ou características do contrato a termo resolutivo.
15. De facto, tendo em conta que o contrato a termo é, por definição, aquele que é celebrado para satisfação de uma concreta necessidade temporária da empresa/serviço e pelo período de tempo estritamente necessário à satisfação dessa necessidade e tem, por isso, uma duração limitada, tendencialmente curta, pressupondo que o trabalhador seja dispensado e deixe o serviço após a satisfação da necessidade que levou à sua contratação, seria ilógico e até contraditório que este trabalhador, cujo percurso profissional será, a priori, limitado e curto, fosse admitido a entrar numa carreira profissional.
16. Compreende-se, por isso, que o legislador tenha consagrado as normas dos artigos 39.º, n. 1 da Lei 12-A/2008, de 27.02 (LVCR), e 56.º, n. 6 da LTFP, reservando a aplicação das disposições relativas a carreiras aos trabalhadores que, por já terem vínculo definitivo, permanecerão, em princípio, ao serviço da Administração Pública por um longo de tempo.
17. Mas estas normas têm de ser entendidas ou lidas com o alcance acima referido, ou seja: os trabalhadores da Administração Pública contratados em regime de contrato de trabalho a termo não beneficiam das normas relativas às carreiras da Administração Pública enquanto mantiverem essa modalidade de vínculo ou relação jurídica de emprego público, o que não significa que o tempo durante o qual mantiveram este vínculo de natureza precária não possa ser considerado ou relevado, caso venham, eventualmente, a estabelecer com a Administração Pública vínculo definitivo ou por tempo indeterminado.
18. Com o devido respeito, a leitura que a sentença recorrida faz das normas acima referidas vai além do que resulta da letra da lei e, como se referiu na petição inicial, contraria princípios fundamentais e normas legais expressas que vão em sentido contrário.
Com efeito,
19. Está em causa a efetivação do direito ao desenvolvimento da carreira profissional através de alteração obrigatória do posicionamento remuneratório fundada na avaliação de desempenho, direito que está consagrado nos artigos 82.º, n. 4, 91.º e 156.º, n. 7 da LTFP.
20. A avaliação do desempenho não é exclusiva dos trabalhadores em funções públicas vinculados por tempo indeterminado ou por qualquer outra das modalidades de vínculo de emprego público. Antes pelo contrário: resulta do artigo 89.º da LTFP que os trabalhadores – todos, sem distinção – estão sujeitos ao regime de avaliação do desempenho, cujos efeitos são os previstos nos diplomas de regulamentação e os previstos na LTFP em matéria de alteração de posicionamento remuneratório na carreira, atribuição de prémios de desempenho e efeitos disciplinares (art. 91.º da LTFP).
21. Também a Lei n.º 66-B/2007, de 28 de Dezembro, que veio estabelecer o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública, designado por SIADAP, no artigo 2.º, n. 4, al. c), estende o seu âmbito de aplicação aos “trabalhadores da Administração Pública, independentemente da modalidade de constituição da relação jurídica de emprego público”, prevendo como efeito da avaliação destes a “alteração de posicionamento remuneratório na carreira do trabalhador e atribuição de prémios de desempenho, nos termos da legislação aplicável” (art. 52.º, n. 1, al. e/ do SIADAP).
22. Mas, mais do que isso, vale no presente caso o artigo 11.º da LTFP que consagra o princípio da “continuidade do exercício de funções públicas”, determinando que “o exercício de funções ao abrigo de qualquer modalidade de vínculo de emprego público, em qualquer dos órgãos ou serviços a que a presente lei é aplicável, releva como exercício de funções públicas na carreira, na categoria ou na posição remuneratória, conforme os casos, quando os trabalhadores, mantendo aquele exercício de funções, mudem definitivamente de órgão ou serviço (sublinhado nosso)5.
5 O mesmo princípio já tinha, aliás, consagração expressa no artigo 84.º da Lei 12-A/2008, de 27 de fevereiro : “o exercício de funções ao abrigo de qualquer modalidade de constituição da relação jurídica de emprego público em qualquer dos órgãos ou serviços a que a presente lei é aplicável releva como exercício de funções públicas ou na carreira, na categoria e, ou, na posição remuneratória, conforme os casos, quando os trabalhadores, mantendo aquele exercício de funções, mudem definitivamente de órgão ou serviço”.
23. Deste princípio resulta claramente que o legislador quis assegurar que o exercício de funções públicas, independentemente da modalidade de vínculo de emprego público, releva como exercício de funções públicas na carreira, categoria ou posição remuneratória, mesmo que o trabalhador mude definitivamente de órgão ou serviço.
24. A decisão do tribunal a quo em não aplicar no caso concreto o princípio da continuidade do exercício de funções públicas é errada porque, não só não é verdade que a Recorrente tenha trabalhado sempre no mesmo serviço (trabalhou, primeiramente, na Unidade de P.... e, depois, na Unidade de Saúde Familiar de B.... – cf. factos acima alegados em I. a XXXI.), como a interpretação que o tribunal a quo defende para o artigo 11.º da LTFP não faz sentido e conduziria a resultados manifestamente injustos e que certamente o legislador não quis.
25. De facto, não existe nenhum motivo que possa justificar que se assegure a relevância do exercício de funções públicas ao trabalhador que estabelece vínculos de diferentes modalidades e muda definitivamente de órgão ou serviço e já não ao trabalhador que estabelece vínculos de diferente natureza mas se mantém a trabalhar no mesmo órgão ou serviço.
26. A única interpretação ou leitura da norma do artigo 11.º da LTFP que faz sentido é a de que, se a continuidade do exercício de funções públicas é reconhecida até ao trabalhador que muda definitivamente de órgão ou serviço, por maioria de razão, também essa continuidade deve ser reconhecida ao trabalhador que, apesar de detentor de vínculos de diferentes modalidades, se manteve a trabalhar sempre no mesmo serviço.
27. Só assim ficará realizado o princípio da igualdade e não discriminação, sobretudo tendo em conta todas as circunstâncias do caso concreto.
28. De facto, tal como resulta demonstrado nos autos, entre 01-09-2004 e 30-12-2013, data em que outorgou contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, a Recorrente manteve com a Recorrida vínculo ou relação jurídica de emprego público, através de sucessivos contratos de trabalho a termo, celebrados ao abrigo do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde. Estes contratos foram, até determinada altura, celebrados com hiatos de apenas alguns dias, sendo certo que desde 08-10-2007 o vínculo ou relação jurídica de emprego público estabelecida entre Recorrente e Recorrida, ainda em diferentes modalidades, é ininterrupto.
29. Resulta também que a Recorrente foi sempre contratada com a “categoria equiparada” à de enfermeira ou para exercer as funções correspondentes a essa categoria e recebeu uma remuneração igual à remuneração correspondente à do 1.º escalão da categoria de enfermeira da carreira especial de enfermagem.
30. E foi sucessivamente contratada, não para a satisfação de qualquer necessidade temporária ou transitória da Recorrida, mas para fazer face a necessidades permanentes ou à “normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem” nos serviços onde esteve colocada.
31. Significa, por isso, que a Recorrente esteve, durante mais de 9 anos, a exercer as mesmas funções, nas mesmas condições e com a mesma retribuição que qualquer outro enfermeiro ao serviço da Recorrida mediante vínculo ou relação jurídica de emprego público definitiva ou por tempo indeterminado, nada distinguindo a Recorrente destes seus colegas, alguns deles que com ela trabalharam e ainda trabalham, lado a lado, a não ser a modalidade ou natureza do vínculo estabelecido com a Recorrida.
32. Nem sequer existiram no caso concreto razões excecionais que pudessem justificar a contratação da Recorrente, pois, como resulta evidenciado dos autos, a contratação da Recorrente, assim como de outros enfermeiros, foi feita através de contrato a termo porque houve, até determinada altura, um mecanismo legal de recrutamento de profissionais de saúde que permitia um processo muito mais simplificado e, por isso, atrativo (o previsto no artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde), sendo certo que, a partir do momento que este mecanismo deixou de existir (com a revogação do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde e conversão dos contratos a termo resolutivo em contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo a partir de 1 de janeiro de 2009, sujeitos às normas previstas no RCTFP), foram logo desencadeados os procedimentos tendentes à contratação por tempo indeterminado de todos os enfermeiros com vínculo estabelecido ao abrigo do citado artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, incluindo a Recorrente.
33. Ou seja, a Recorrente só foi, sucessivamente e durante mais de 9 anos, contratada a termo porque a lei assim o permitia e enquanto permitiu.
34. Por tudo o exposto, ainda que estabelecido através de diferentes modalidades de constituição de relação jurídica de emprego público, o vínculo da Recorrente anterior a 2014 deve relevar como exercício de funções públicas na carreira, na categoria ou na posição remuneratória, e por conseguinte, determinar a contabilização dos pontos acumulados pela Recorrente entre 2005 e 2013 para efeitos de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório.
35. Uma decisão em sentido diferente, além de violar o referido princípio da continuidade do exercício de funções publicas do artigo 11.º da LTFP e o direito ao pleno desenvolvimento da carreira profissional, consagrado nos artigos 82.º, n. 4, 91.º e 156.º, n. 7 da LTFP, constitui uma enorme injustiça e discriminação injustificada em relação a outros trabalhadores, que desempenharam as mesmíssimas funções da Recorrente, alguns nos mesmos locais de trabalho, mas que tiveram a sorte de estar ou ficar vinculados por outra modalidade de vínculo.
36. Constitui também uma ofensa aos princípios da confiança e da segurança jurídicas ínsitos no princípio do Estado de Direito Democrático, previsto no artigo 2.º da CRP, dado que defrauda as expectativas da Recorrente que, tendo em conta todas as circunstâncias concretas do caso, devem ser consideradas absolutamente legítimas.
37. Assim, tendo em conta o decidido na sentença recorrida no sentido da irrelevância do pedido impugnatório formulado na alínea A) do petitório da petição inicial (ponto IV.2 da sentença recorrida), deverá decidir-se pela procedência dos restantes pedidos formulados pela Recorrente.
38. Deverá, pois, reconhecer-se que a Recorrente, na sequência de permissão contida no artigo 18.º, n. 1, alínea a) da LOE 2018, tinha direito a ver contabilizados os pontos atribuídos pelo seu desempenho entre 2005 e 2016, num total de 15 pontos - 1 ponto pelos desempenhos dos anos 2005 a 2008 e 2015 e 2016 por falta de avaliação e 1,5 pontos por 2009 a 2013 em função das avaliações feitas - e, consequentemente, a ser posicionada na 2ª posição remuneratória da categoria de enfermeira, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018, devendo os pontos sobrantes não utilizados nesta alteração de posicionamento (5 pontos), ser mantidos e considerados em futura alteração de posicionamento remuneratório da Autora, nos termos do n. 6, do citado artigo 18.º da LOE 2018.
39. Consequentemente, deverá a Recorrida ser condenada a pagar à Recorrente todos os créditos salariais resultantes da diferença entre as remunerações ou suplementos pagos a partir de janeiro de 2018 e as remunerações ou suplementos que eram efetivamente devidos a partir daquela data tendo em conta o novo posicionamento remuneratório acima referido, acrescidos de juros moratórios à taxa de 4%, contados desde a data de vencimento de cada prestação devida até efetivo e integral pagamento.
40. De facto, por força do art. 18.º, n. 6 e 8 da LOE 2018, em conjugação com o disposto no n. 7 do art. 156.º da LTFP, as alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório deveriam ser asseguradas pelas entidades administrativas, a partir de 1 de janeiro de 2018, a todos os trabalhadores que em 31 de dezembro de 2017 tinham acumulado 10 ou mais pontos nas avaliações de desempenho, devendo os acréscimos remuneratórios ser pagos de forma faseada, nas seguintes datas:
e. 25%, em a 1 de janeiro de 2018;
f. 50%, em 1 de setembro de 2018;
g. 75%, em 1 de maio de 2019;
h. 100%, em 1 de dezembro de 2019;
41. Ficou expressamente consignado naquela lei que tais valorizações remuneratórias produziam efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018 e que os trabalhadores que tivessem, à data de 31 de dezembro de 2017, mais de 10 pontos veriam os pontos em excesso contados em futura alteração do seu posicionamento remuneratório (n. 6 e 7 do art. 18.º da LOE).
42. Verifica-se, pois, que os acréscimos devidos à Recorrente já deveriam ter sido pagos a partir de janeiro de 2018, havendo mora por parte da Recorrida.
43. Nessa medida, acrescerão os juros moratórios à taxa de 4%, contados desde a data do vencimento de cada diferença remuneratória até integral pagamento.
Nestes termos e nos mais de direito, deve julgar-se procedente este recurso, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por outra que julgue procedentes os pedidos feitos nas alíneas B), C) e D) do petitório da petição inicial, tendo em conta a decisão da sentença recorrida quanto à relevância do pedido formulado na alínea A),
assim se fazendo
1.7. A Apelada contra-alegou, formulando as seguintes Conclusões:
«1ª
No emprego público não existe norma jurídica que permita fazer relevar o tempo de trabalho prestado sob título de contrato de trabalho a termos resolutivo, após o ingresso na carreira com celebração de um contrato de trabalho por tempo indeterminado em funções públicas;

E das normas conjugadas dos artigos 11º e 56º/6 da LGTFP, que se seguiram a normas de igual teor e sentido constante dos artigos 84º e 39º da LCVR, Lei nº 12­A/2008, de 27-02, o que se extrai é precisamente nesse sentido, de falta de norma;

Nem se verifica qualquer compressão do direito ao pleno desenvolvimento da carreira profissional, legalmente consagrado, nem ofensa intrínseca aos valores da confiança e da segurança jurídica do trabalhador.

Como acentua a doutrina, em matéria de remunerações, a norma do artigo 144º/1 da LGTFP consagra uma particular rigidez ao estabelecer que «as normas legais em matéria de remunerações não podem ser afastadas ou derrogadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, salvo quando previsto expressamente na presente lei»;

A douta sentença recorrida não é merecedora de qualquer censura.
Termos em que, e nos melhores de direito do douto suprimento do Venerando TCAN, deve recurso ser julgado improcedente, com as legais consequências,
Assim se fazendo Justiça!»
1.8. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público não emitiu parecer.
1.9. Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de acórdão aos senhores juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
*
II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.
2. Conforme jurisprudência firmada, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º 2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.
Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.
2.1. Assentes nas enunciadas premissas, as questões a decidir passam por saber se:
a- se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento sobre a matéria de facto por não ter incluído na matéria de facto a facticidade elencada nos pontos 7.º e 12.º das conclusões de recurso;
b- se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento em matéria de direito, por ter considerado que a pontuação relativa à avaliação do desempenho da Autora no período em que esta desenvolveu funções de enfermeira em regime de contrato de trabalho a termo resolutivo certo, não releva para efeitos do seu reposicionamento remuneratório na carreira, em que ingressou em termos definitivos, em 31/12/2013, na sequência de um procedimento concursal em que participou e em resultado do qual veio a celebrar contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado.
**
III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DE FACTO.
3.1. A 1.ª Instância julgou provados os seguintes factos:
A) A autora é enfermeira (carreia especial) com o número mecanográfico ... e em serviço no Agrupamento de Centros de ... . - cfr. doc. nº 1 junto com a petição inicial e fls. 39 do PA;
B) Nos períodos de 1.09.2004 a 28.02.2005; 08.03.2005 a 07.09.2005; 15.09.2005 a 14.03.2006; 22.03.2006 a 21.09.2006; 29.09.2006 a 28.03.2007; 05.04.2007 a 26.12.2007, foi celebrado entre a autora e a ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, de 35 horas semanais, para prestação de trabalho com a categoria de Enfermeira - cfr. declaração junca sob o doc. nº 2 da petição inicial e fls. 52, 421 e 422 do PA;
C) Entre 27.12.2007 a 28.02.2013, foi celebrado entre a autora e a ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, de 35 horas semanais, para prestação de trabalho com a categoria de Enfermeira - cfr. declaração junca sob o doc. nº 2 da petição inicial e fls. 55, 106, 158 e 159 do PA;
D) A autora no que respeita à avaliação do triénio de 2009, 2010, 2011 obteve a menção qualitativa “Satisfaz” – cfr. doc. nº 7 junto com a petição inicial e fls. 18 do PA;
E) A autora no que respeita à avaliação do triénio de 2012, 2013, 2014 obteve a menção qualitativa “Satisfaz” – cfr. doc. nº 6 junto com a petição inicial e fls. 16 do PA;
F) Em 19.08.2013, foi publicado, no Diário da República, 2ª série, dessa data, aviso nº 16527/2010, relativo à abertura de “procedimento concursal comum para o preenchimento de 34 postos de trabalho da carreira especial de enfermagem e categoria de enfermeiro”, destinado a trabalhadores detentores de uma relação jurídica de emprego público – cfr. fls. 45 do PA;
G) A autora foi admitida na sequência de seleção no âmbito do procedimento concursal referenciado em F) com vista à integração no mapa de pessoal da ARS Norte – cfr. fls. 45 a 48 do PA;
H) Em 30.12.2013 a autora celebrou “Contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado” com a Administração Regional de Saúde do Norte, I.P., do qual se extrai entre o mais, o seguinte:
“(...)
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
(...)
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
(...)”
– cfr. doc. nº 1 junto com a petição inicial e fls. 39 e 43 e seguintes do PA;
I) A Administração Regional de Saúde do Norte, através do ofício à com a referência “DRH-1228”, sob o assunto “Descongelamento de carreiras – comunicação dos pontos acumulados por avaliação de desempenho (Lei nº 114/2017, de 29 de dezembro”, informou à autora, entre o mais, o seguinte:
“(...)
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
(...)”
- cfr. documento nº 8 junto com a petição inicial e fls. 435 e 436 do PA;
J) A autora tomou conhecimento do ofício referenciado na alínea antecedente em 2.03.2021 - cfr. documento nº 8 junto com a petição inicial;
K) Em 09.03.2021 a autora em relação ao assunto mencionado em I) apresentou reclamação, via email, dirigida ao Presidente da ARS do Norte, no qual peticiona o seguinte:
“Nestes termos, impugna a decisão tomada e requer que:
A. na contagem dos pontos por avaliação de desempenho, sejam também considerados pontos relativos aos anos de 2005 a 2013, ou seja:
a. 2005 a 2008 – 4 pontos (por ausência de avaliação);
b. 2009 a 2013 – 7,5 pontos (1,5 pontos * 5 anos)
B. em consequência, se considere que:
a. em 31.12.2017, a Requerente tinha acumulados 15 pontos, o que lhe concede o direito a subir uma posição remuneratória, com efeitos a 01-01-2018;
b. são de manter e considerar em futura alteração de posicionamento remuneratório, os pontos em excesso acumulados até 31 de dezembro de 2018 (5 pontos), que devem acrescer aos pontos atribuídos depois dessa data.”
– cfr. documento nº 9 junto com a petição inicial;
L) A reclamação mencionada em k) não obteve decisão – facto não controvertido;
M) Em 04.02.2019 foi emitida pela Administração Central do Sistema de Saúde, I.P. (ACSS) Circular Informativa, sob o assunto “Processo de descongelamento de carreiras – carreira especial de enfermagem”, de cujo conteúdo se extrai, entre o mais, o seguinte:
“(...)
Data a partir da qual se inicia a contagem de pontos na carreira especial de enfermagem:
Nos termos do artigo 156º, n.ºs 2 e 7 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (LTFP), os pontos são contados a partir da última alteração de posicionamento remuneratório do trabalhador.
Assim, no caso de enfermeiros colocados na 1ª posição remuneratória nos termos do artigo 5.º do Decreto-Lei nº 122/2010, de 11 de novembro, é a partir da data da última alteração de posicionamento remuneratório, que ocorreu em 2011, 2012 ou 2013, que se inicia a contagem de pontos para ulterior alteração da posição remuneratória.
(...)”
- cfr. fls. 470 e seguintes do PA;
N) Em 15.06.2021 deu entrada a presente ação no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel – cfr. comprovativo de entrega da petição inicial a fls. 1 a 3 do SITAF;
iv. 1.2 - Factos não provados
Inexistem factos com interesse para a decisão da causa, que importe julgar como não provados.»
**
III . B. DE DIREITO
3.2. A presente apelação vem interposta pela Autora da decisão proferida pela 1.ª Instância que julgou improcedente a ação que propôs contra a Apelada, visando obter o reconhecimento judicial do direito à contagem dos pontos atribuídos pelo seu desempenho entre 2005 e 2016 num total de 15 pontos, com a consequente correção do posicionamento remuneratório, por forma a que fosse colocada na 2ª posição remuneratória da categoria de enfermeira, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018.
A Apelante não se conforma com a decisão recorrida e assaca-lhe erro de julgamento sobre a matéria de facto e erro de direito.
Apreciando.
b.1. da insuficiência da matéria de facto inscrita nas alíneas B,C,F,G,H,I e J) do elenco dos factos provados na sentença.
3.3. A Apelante, nos pontos 7 a 12.º das conclusões de recurso, suscita a questão da necessidade de ser aditada aos factos assentes, a facticidade que enumera nas várias alíneas do ponto 7 das respetivas conclusões de recurso e, bem assim, da que refere no ponto 12.º da mesma peça.
3.3.1. É consabido que a incorreção do julgamento da matéria de facto configura error in judicando e não um vício formal da sentença, a ser arguido em sede de impugnação da decisão de facto.
3.3.2. O princípio da utilidade, consagrado no artigo 130.º do Cód. Civil, de acordo com o qual toda a atividade processual está limitada àquilo que tem utilidade para a decisão do litígio e a só a isso, aplica-se também em matéria de impugnação da decisão de facto, pelo que o tribunal de recurso deve ater-se, na reapreciação a efetuar, apenas àquilo que for útil e relevante, ignorando ou desconsiderando aquilo que extravasar o campo da utilidade para a causa e dispensando-se de conhecer da impugnação de factos que se mostrem irrelevantes ou insuscetíveis de qualquer repercussão na decisão da causa.
Ao julgador impõe-se apenas que selecione os factos que considera relevantes para a boa decisão da causa, e não que selecione todo e qualquer facto que, eventualmente, se mostrasse comprovado pelos documentos constantes dos autos, não havendo «lugar à reapreciação da matéria de facto quando o facto concreto objeto da impugnação for insuscetível de, face às circunstância próprias do caso em apreciação, ter relevância jurídica para a solução da causa ou mérito do recurso, sob pena de se levar a cabo uma atividade processual que se sabe, de antemão, ser inconsequente» Cfr. Ac. do TR..., de 15/09/2015, Proc....4, acessível in base de dados da DGSI..
O exercício dos poderes de controlo do tribunal ad quem sobre a decisão da matéria de facto pela 1.ª Instância só se justifica, por conseguinte, se recair sobre factos com interesse para a decisão da causa, segundo os vários enquadramentos jurídicos do seu objeto Cfr. Ac. TCA... de 05/03/2021, Proc. 00173/14...-B;Ac. do TR..., de 27/05/2014, Proc. nº 024/12....; Ac.TRL, de 28/04/2015, Proc.2776/10....; Ac. TRC, de 19/05/2015, Proc....9; Ac. TR..., de 25/02/2016, Proc....8, acessíveis in base de dados da DGSI..
Como tivemos oportunidade de sustentar em Acórdão deste TCAN, de 05/03/2021, proferido no Proc. 00173/14.5BECBR-A: «III- Ao julgador impõe-se apenas que selecione os factos que considera relevantes para a boa decisão da causa, e não que selecione todo e qualquer facto que, eventualmente, se mostrasse comprovado pelos documentos constantes dos autos.»
3.3.3. Partindo destas premissas, vejamos se assiste razão à Apelante na imputação dos apontados erros de julgamento sobre a decisão da matéria de facto proferida pela 1.ª Instância.
(i) da substituição da matéria de facto inscrita nas alíneas B, C, F, G e H da fundamentação de facto da sentença recorrida pelos factos enunciados no ponto 7. das conclusões de recurso.
3.4. No que concerne aos factos que indica nos vários itens do ponto 7.º, a Apelante defende que a necessidade da sua consideração resulta de os mesmos darem uma maior concretização e correção aos factos dados como assentes nas alíneas B), C), F), G) e H) da fundamentação de facto da sentença recorrida, permitindo compreender as específicas razões que levaram a que a mesma estivesse vinculada à Apelada em regime de contrato a termo durante mais de 9 anos, razões que, salva melhor opinião, não podem deixar de ser consideradas e relevadas na decisão desta causa, tendo em conta o objeto da ação e os fundamentos e argumentos invocados na sentença recorrida e que determinaram a sua improcedência.
Acrescenta que o facto dado como assente na alínea B) da sentença recorrida não faz referência ao contrato mencionado em XXV a XXVII, celebrado em 08-10-2007, e o facto dado como assente na alínea F) contém um erro na indicação da data do concurso, que foi publicitado em 19-08-2010 e não em 19-08-2013.
Defende que os factos referidos nas alíneas I) a XLIII) da conclusão 7. devem ser aditados à matéria de facto assente, em substituição dos factos das alíneas B), C) F), G) e H).
Mas sem razão.
3.4.1. Prima facie, não é despiciendo sublinhar que apesar de a Apelante reputar a factualidade que enuncia nos vários itens do ponto 7. das conclusões de recurso como relevante para o objeto da ação, a mesma não cuidou de demonstrar ou de explicar em que moldes é que essa pormenorização dos factos assentes pode influir na decisão da causa, segundo os vários enquadramentos jurídicos do seu objeto.
Nas alíneas B,C,F,G,H da fundamentação de facto da sentença recorrida, o Tribunal a quo deu como provada a seguinte matéria:
«B) Nos períodos de 1.09.2004 a 28.02.2005; 08.03.2005 a 07.09.2005; 15.09.2005 a 14.03.2006; 22.03.2006 a 21.09.2006; 29.09.2006 a 28.03.2007; 05.04.2007 a 26.12.2007, foi celebrado entre a autora e a ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, de 35 horas semanais, para prestação de trabalho com a categoria de Enfermeira - cfr. declaração junca sob o doc. nº 2 da petição inicial e fls. 52, 421 e 422 do PA;
C) Entre 27.12.2007 a 28.02.2013, foi celebrado entre a autora e a ré contrato de trabalho a termo resolutivo certo, de 35 horas semanais, para prestação de trabalho com a categoria de Enfermeira - cfr. declaração junca sob o doc. nº 2 da petição inicial e fls. 55, 106, 158 e 159 do PA;
F) Em 19.08.2013, foi publicado, no Diário da República, 2ª série, dessa data, aviso nº 16527/2010, relativo à abertura de “procedimento concursal comum para o preenchimento de 34 postos de trabalho da carreira especial de enfermagem e categoria de enfermeiro”, destinado a trabalhadores detentores de uma relação jurídica de emprego público – cfr. fls. 45 do PA;
G) A autora foi admitida na sequência de seleção no âmbito do procedimento concursal referenciado em F) com vista à integração no mapa de pessoal da ARS Norte – cfr. fls. 45 a 48 do PA;
H) Em 30.12.2013 a autora celebrou “Contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado” com a Administração Regional de Saúde do Norte, I.P., do qual se extrai entre o mais, o seguinte:».
Na ação que a Autora, aqui Apelante, propôs contra o Apelado, a mesma visava obter o reconhecimento judicial do direito à contagem dos pontos pelo seu desempenho entre 2005 e 2016, num total de 15 pontos, com a consequente correção do posicionamento remuneratório, por forma a que fosse colocada na 2ª posição remuneratória da categoria de enfermeira, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018.
3.4.2. Assim, questão que se colocava ao Tribunal a quo passava por saber se tendo a Autora permanecido vinculada por contrato a termo entre 01/09/2004 e 30/12/2013, e passando a mesma a estar vinculada definitivamente através de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado a partir do dia 31/12/2013, a avaliação do seu desempenho durante os anos em que esteve contratada a termo, e por conseguinte, os pontos que lhe foram/deviam ser atribuídos, careciam de ser contabilizados para efeitos do pretendido posicionamento remuneratório na carreira, ao contrário do que foi considerado pela sua entidade empregadora.
Em bom rigor, a Apelante pretende ver enunciado nos factos assentes que: (i) os contratos a termo não foram celebrados e renovados para a satisfação de qualquer necessidade excecional e transitória da Apelada, mas sim para assegurar necessidades permanentes ou a “normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem” nos serviços onde a Apelante esteve colocada;(ii) que o recurso à contratação a termo de enfermeiros (incluindo a Apelante) visou apenas permitir o recrutamento através de um processo muito mais simplificado e, assim que deixou de ser legalmente possível este mecanismo (com a revogação do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde e conversão dos contratos a termo resolutivo em contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo a partir de 1 de janeiro de 2009, sujeitos às normas previstas no RCTFP), foram desencadeados os procedimentos tendentes à contratação por tempo indeterminado de todos os enfermeiros com vínculo estabelecido ao abrigo do citado artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde, incluindo a Recorrente; (iii)que os referidos contratos a termo foram celebrados com hiatos de apenas alguns dias, sendo certo que desde 08-10-2007 o vínculo ou relação jurídica de emprego público estabelecida entre Apelante e Apelada é ininterrupto;(iv) que a mesma não foi contratada para exercer a sua atividade sempre no mesmo local, tendo trabalhado primeiramente na Unidade de P.... e, posteriormente, na Unidade de Saúde Familiar de B.... e (V) que a autora integrava o leque de contratados a termo que preenchiam necessidades permanentes do serviço.
Acontece que, perante a questão decidenda, afigura-se-nos, salvo o devido respeito, ser insofismável que os pormenores e os detalhes inerentes a cada um dos contratos a termo que a Apelante celebrou até se vincular em termos definitivos -tais como os concretos motivos que determinaram a necessidade de recorrer à celebração de cada um dos contratos de trabalho, a respetiva duração, a ocorrência de renovações, as razões subjacentes à abertura do procedimento de contratação de enfermeiros para a celebração de contratos de trabalho por tempo indeterminado, as vicissitudes que ocorreram na tramitação desse procedimento e que se seguiram à homologação da lista de classificação final e, bem assim, que determinaram que a Apelante apenas tivesse iniciado funções com vínculo definitivo, em 31/12/2013-, embora traduzam uma maior concretização da matéria de facto dada como provada na fundamentação de facto da sentença recorrida, não são factos essenciais suscetíveis de influir no mérito da decisão a proferir considerando os vários enquadramentos jurídicos possíveis do objeto da ação.
Tenha-se presente que, pese embora seja jurisprudência pacifica que «I- As exigências de interesse público e a conformação com o direito constitucional de acesso à função pública (artigo 47.º, n.º2 da Constituição), impedem a conversão do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado»- conforme se sumariou em Acórdão deste TCAN, de 05/02/2021, que proferimos no Proc.00691/14.5BEPNF, a verdade é que nestes autos não se discute uma tal questão, para a qual, independentemente da referida jurisprudência, a facticidade que a Apelante elenca nos vários itens da conclusão 7.ª poderia assumir relevância, tendo em conta as várias soluções de direito plausíveis.
Na situação vertente, pese embora não se ignore que o tempo de serviço prestado em funções públicas ao abrigo de contrato a termo resolutivo não é irrelevante, é seguro que os factos assentes pelo Tribunal a quo na fundamentação de facto da sentença recorrida são os factos essenciais para conhecer da questão decidenda de acordo com os vários enquadramentos jurídicos possíveis, inclusivamente, daquele que é perfilhado pela Apelante e, como tal, tudo o mais é pura excrescência sem utilidade.
Como se extrai dos factos provados, está plenamente adquirido nos autos que a Autora, ora Apelante, no período compreendido entre 01/09/2004 e 30/12/2013 exerceu as funções de enfermagem ao abrigo de sucessivos contratos de trabalho a termo, que celebrou/renovou, e que por via do exercício dessas funções, o seu desempenho foi avaliado. Por outra banda, é incontroverso que a partir de 31/12/2013 a mesma se vinculou definitivamente, por via da celebração de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, na sequência de procedimento concursal aberto para a contratação pública de enfermeiros por tempo indeterminado.
Tanto basta, para que seja conhecido o mérito da ação, e aferir da consistência ou inconsistência da decisão proferida e da posição jurídica defendida pela Apelante.
Ademais, sempre se dirá, que se trata de facticidade que está implícita nos factos assentes e nos documentos para que os factos assentes remetem.
Como tal, indefere-se o pretendido aditamento aos factos assentes dessa matéria, improcedendo qualquer erro de julgamento sobre a matéria de facto.
(ii)o aditamento aos factos assentes, da facticidade referida nas alíneas XLIV e XLV do ponto 12. das conclusões de recurso.
3.5. A Apelante sustenta que pese embora nas alíneas I) e J) da matéria de facto da sentença recorrida tenha sido dada como assente que foi enviado e recebido o ofício junto com a petição inicial sob o documento 8, parcialmente transcrito na sentença, importará também, dar como assentes os factos propriamente ditos que esse ofício revela ou dá a conhecer, ou seja, « que até 31.12.2017, foram contabilizados à Autora os seguintes pontos para efeitos de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório: a)2014 – 1,5 pontos, em função da avaliação que foi feita ao desempenho da Autora e que lhe valeu a menção qualitativa de “Satisfaz”; b) 2015 – 1 ponto, por ausência de avaliação; c) 2016 – 1 ponto, por ausência de avaliação, tudo num total de 3,5 pontos. E ainda, que, consequentemente, a Autora foi mantida na 1ª posição remuneratória da sua categoria, correspondente a uma remuneração de 1201,48€.»
Efetivamente, nas alíneas I) e J) do elenco dos factos assentes, o Tribunal a quo dá como assente que o documento n.º8 junto à p.i., cujo teor transcreve parcialmente, foi enviado à Autora.
Acontece que, os documentos não são factos, e como tal, o que deve ser levado aos factos assentes não é o teor dos documentos mas os factos que os mesmos demonstram ou revelam e nessa conformidade, em bom rigor, assiste razão à Apelante.
Assim sendo, adita-se aos factos assentes uma nova alínea “ I.I.) contendo a seguinte matéria:
«Até 31.12.2017, foram contabilizados à Autora os seguintes pontos para efeitos de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório: a)2014 – 1,5 pontos, em função da avaliação que foi feita ao desempenho da Autora e que lhe valeu a menção qualitativa de “Satisfaz”; b) 2015 – 1 ponto, por ausência de avaliação; c) 2016 – 1 ponto, por ausência de avaliação.
No mais, indefere-se a pretensão da Apelante, por não inutilidade da matéria no elenco dos factos provados.
**
b.2 dos erros de julgamento sobre a matéria de direito.
3.6. O Tribunal a quo não deu provimento à pretensão da Apelante, considerando que a mesma só ingressou na carreira de enfermagem a partir de 30 de dezembro de 2013, data em que outorgou contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, pelo que só a partir daí “poderá progredir consoante a avaliação que lhe foi atribuída”.
Defendeu o tribunal a quo que só com a celebração do contrato de trabalho por tempo indeterminado é que a Apelante “passou a estar inserida no regime remuneratório, no modelo de avaliação de desempenho e nas regras de alteração de posicionamento remuneratório aplicável ao novo regime contratual” e que “inexiste norma legal que atribua, para efeitos de carreira, relevância ao tempo de serviço anteriormente prestado ao abrigo de um outro contrato de diferente natureza”, negando que seja aplicável ao caso concreto o princípio da continuidade do exercício de funções públicas, previsto atualmente no artigo 11.º da LTFP e antes no artigo 84.º da LVCR, dado que “resulta expressamente dos normativos invocados que tal princípio se reporta apenas e só à continuidade do exercício de funções no caso de haver mudança definitiva de órgão ou serviço”, o que não sucede no caso em apreço porque, alega o tribunal a quo, que a Apelante sempre celebrou contrato para desenvolver a sua atividade profissional no Agrupamento de Centros de ... .
A apelante discorda do assim decidido e assaca à decisão recorrida erros de julgamento.
Vejamos.
O litigio que se desenvolve nos presentes autos, surge na sequência da entrada em vigor da Lei nº 114/2017, de 29 de dezembro, que aprovou o Orçamento de Estado de 2018, e na qual se estabeleceu um descongelamento das carreiras e as respetivas valorizações remuneratórias, impondo a salvaguarda de direitos adquiridos a 1 de janeiro de 2018.
No artigo 18.º da LOE/2018 estabeleceu-se o seguinte regime legal:
1 - Para os titulares dos cargos e demais pessoal identificado no n.º 9 do artigo 2.º da Lei n.º 75/2014, de 12 de setembro, são permitidas, nos termos dos números seguintes, a partir do dia 1 de janeiro de 2018 e não podendo produzir efeitos em data anterior, as valorizações e acréscimos remuneratórios resultantes dos seguintes atos:
a) Alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório, progressões e mudanças de nível ou escalão;
b) Promoções, nomeações ou graduações em categoria ou posto superiores aos detidos, incluindo nos casos em que dependam da abertura de procedimentos concursais para categorias superiores de carreiras pluricategoriais, gerais ou especiais, ou, no caso das carreiras não revistas e subsistentes, incluindo carreiras e corpos especiais, para as respetivas categorias de acesso.
2 - Aos trabalhadores cujo desempenho não tenha sido avaliado, designadamente por não aplicabilidade ou não aplicação efetiva da legislação em matéria de avaliação do desempenho, e sem prejuízo do disposto no artigo 42.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro, nas situações por este abrangidas, é atribuído um ponto por cada ano não avaliado, ou menção qualitativa equivalente, nos casos em que este seja o tipo de menção aplicável, sem prejuízo de outro regime legal vigente à data.
3.(...)
4- O número de pontos atribuído ao abrigo dos números anteriores é comunicado pelo órgão ou serviço a cada trabalhador, com a discriminação anual e respetiva fundamentação
(…)
6 - Nas alterações obrigatórias do posicionamento remuneratório a efetuar após a entrada em vigor da presente lei, quando o trabalhador tenha acumulado até 31 de dezembro de 2017 mais do que os pontos legalmente exigidos para aquele efeito, os pontos em excesso relevam para efeitos de futura alteração do seu posicionamento remuneratório.
7 - As valorizações remuneratórias resultantes dos atos a que se refere a alínea a) do n.º 1 produzem efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018, sendo reconhecidos todos os direitos que o trabalhador detenha, nos termos das regras próprias da sua carreira, que retoma o seu desenvolvimento.
8 - O pagamento dos acréscimos remuneratórios a que o trabalhador tenha direito nos termos do número anterior, é faseado nos seguintes termos:
a) Em 2018, 25 /prct. a 1 de janeiro e 50 /prct. a 1 de setembro;
b) Em 2019, 75 /prct. a 1 de maio e 100 /prct. a 1 de dezembro.

(…)»
Nos termos do disposto nos n.ºs 6 e 8 do artigo 18.º da LOE/2018, as alterações obrigatórias de posicionamento remuneratório deveriam ser asseguradas pelas entidades administrativas, a partir de 1 de janeiro de 2018, a todos os trabalhadores que em 31 de dezembro de 2017 tinham acumulado 10 ou mais pontos nas avaliações de desempenho, devendo os acréscimos remuneratórios ser pagos de forma faseada e que os trabalhadores que tivessem, à data de 31 de dezembro de 2017, mais de 10 pontos veriam os pontos em excesso contados em futura alteração do seu posicionamento remuneratório (n. 6 e 7 do art. 18.º da LOE).
No caso, na sequência da entrada em vigor deste regime legal, a Apelada, em 02/03/2021, dando cumprimento ao disposto no n.º4 do artigo 18.º da citada Lei, entregou à Apelante um ofício no qual lhe comunicou os pontos acumulados por avaliação de desempenho até 31/12/2017, sendo que aí não constava a contabilização dos pontos acumulados entre 2005 e 2013, tendo sido considerados apenas os pontos acumulados a contar da última alteração de posicionamento remuneratório, sendo entendimento da entidade empregadora que não assistia á autora o direito a ver alterado o seu posicionamento remuneratório.
Irresignada com esse entendimento, a autora propôs a competente ação, visando a revogação dessa decisão - de não contabilização dos pontos relativos à sua avaliação do desempenho durante o tempo em que esteve contratada a termo resolutivo certo, para efeitos de reposicionamento remuneratório na sua carreira de enfermagem, em que ingressou por contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, em 31/12/2013-, mas, como vimos, o Tribunal a quo, julgou a ação movida pela Autora improcedente, considerando não lhe assistir o direito a mudar de posicionamento remuneratório por entender que a mesma não reunia os pontos necessários a esse desiderato.
Analisando as conclusões de recurso apresentadas pela Apelante, a mesma começa por afirmar que não ignora as disposições legais invocadas na sentença recorrida que restringiam e restringem a aplicação das normas que regem ou organizam as carreiras dos trabalhadores em funções públicas com vínculo definitivo ou por tempo indeterminado e que impossibilitam que um trabalhador contratado a termo, enquanto se mantiver nessa modalidade de vínculo, não possa progredir na carreira, designadamente através de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório. Ademais, a Apelante defende que essa restrição tem todo o sentido e razão de ser, estando relacionada com a própria natureza ou características do contrato a termo resolutivo, pelo que, nesse contexto, se compreende que o legislador tenha consagrado as normas dos artigos 39.º, n. 1 da Lei 12-A/2008, de 27.02 (LVCR), e 56.º, n. 6 da LTFP, reservando a aplicação das disposições relativas a carreiras aos trabalhadores que, por já terem vínculo definitivo, permanecerão, em princípio, ao serviço da Administração Pública por um longo de tempo.
O pomo da discórdia está em que, para a Apelante, essas restrições deixam de valer quando o trabalhador contratado a termo passa a deter um vinculo definitivo. A seu ver, as referidas normas apenas mantêm o alcance referido enquanto o trabalhador permanecer nessa modalidade de vínculo ou relação jurídica de emprego público, o que não significa que o tempo durante o qual mantiveram este vínculo de natureza precária não possa ser considerado ou relevado, caso venham, eventualmente, a estabelecer com a Administração Pública vínculo definitivo ou por tempo indeterminado.
Nesse enquadramento, sustenta que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quando considerou que o facto de a mesma ter passado a ser titular de um vínculo definitivo, essa nova situação, ainda assim, não consentia que a avaliação de desempenho relativa ao período de tempo em que exerceu funções em regime de contrato a termo resolutivo relevasse para efeitos de reposicionamento remuneratório na respetiva carreira, entendimento que na sua ótica contraria princípios fundamentais e normas legais expressas que vão em sentido contrário.
Nesse conspecto, alvitra que está em causa a efetivação do direito ao desenvolvimento da sua carreira profissional através de alteração obrigatória do posicionamento remuneratório fundada na avaliação de desempenho, direito que está consagrado nos artigos 82.º, n.º 4, 91.º e 156.º, n. 7 da LTFP, e que o Tribunal a quo colocou em crise ao decidir como decidiu.
Para tanto, refere que a avaliação do desempenho não é exclusiva dos trabalhadores em funções públicas vinculados por tempo indeterminado ou por qualquer outra das modalidades de vínculo de emprego público, decorrendo do artigo 89.º da LTFP que os trabalhadores – todos, sem distinção – estão sujeitos ao regime de avaliação do desempenho, cujos efeitos são os previstos nos diplomas de regulamentação e os previstos na LTFP em matéria de alteração de posicionamento remuneratório na carreira, atribuição de prémios de desempenho e efeitos disciplinares (art. 91.º da LTFP).
Acrescenta, que também a Lei n.º 66-B/2007, de 28 de dezembro, que veio estabelecer o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública, designado por SIADAP, no artigo 2.º, n. 4, al. c), estende o seu âmbito de aplicação aos “trabalhadores da Administração Pública, independentemente da modalidade de constituição da relação jurídica de emprego público”, prevendo como efeito da avaliação destes a “alteração de posicionamento remuneratório na carreira do trabalhador e atribuição de prémios de desempenho, nos termos da legislação aplicável” (art. 52.º, n. 1, al. e/ do SIADAP).
Quid iuris?
A carreira de enfermagem constitui uma carreira especial, cujo novo regime foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 248/2009, de 22 de setembro, que revogou o Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de novembro (cfr. art. 28º daquele diploma), tendo a sentença recorrida, a este respeito, traçado o seguinte enquadramento da carreira, que entendemos útil considerar, e que ora transcrevemos:
«O Decreto-Lei nº 248/2009 de 22 de setembro estabeleceu “o regime da carreira especial de enfermagem, bem como os respetivos requisitos de habilitação profissional.”
Anteriormente a este diploma, à carreira de enfermagem aplicava-se o Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de outubro com as especificidades previstas no Decreto-Lei n.º 437/91, de 8 de novembro.
Resulta do preâmbulo do Diploma que estabeleceu o regime de carreira especial de enfermagem, a necessidade reconhecida pelo legislador de instituir uma carreira especial dado que “a natureza da prestação de cuidados de enfermagem, pela sua especificidade, conteúdo funcional e independência técnica, não permite a sua absorção em carreira geral e impõe a criação de uma carreira especial”.
Resulta igualmente do mesmo preâmbulo, que a necessidade da criação de uma carreira especial de enfermagem surge na sequência da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, e o novo regime aí estabelecido para a vinculação, carreiras e remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas.
O regime da carreira especial de enfermagem aplicável aos enfermeiros com relação jurídica de emprego constituída por contrato de trabalho em funções públicas, entrou em vigor em 23.09.2009 (artigo 29.º) e determinou a existência de apenas duas categorias profissionais dentro da carreira especial de enfermagem, enfermeiro e enfermeiro principal, conforme se extrai do artigo do artigo 7.º, nº 1, alíneas a) e b).
A transição para a nova carreira foi determinada, em função do previsto nos n´s 3 e 4 do artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 248/2009, de 22 de setembro, que determinam o seguinte:
“3 - Transitam para a categoria de enfermeiro da carreira especial de enfermagem os trabalhadores que sejam titulares da categoria de enfermeiro, de enfermeiro graduado e de enfermeiro especialista.
4 - Transitam para a categoria de enfermeiro principal os trabalhadores que sejam titulares das categorias de enfermeiro-chefe e de enfermeiro-supervisor, desde que o montante pecuniário correspondente à remuneração base a que tenham direito não seja inferior ao montante pecuniário correspondente ao nível remuneratório da primeira posição da categoria de enfermeiro principal.”
O Decreto-Lei n.º 248/2009, de 22 de setembro é complementado pelo Decreto-Lei nº 122/2010 de 11 de novembro que estabelece, por categoria, o número de posições remuneratórias da carreira especial de enfermagem, identifica os respectivos níveis da tabela remuneratória única, pois nos termos dos artigos 14.º e 15.º do Decreto-Lei nº 248/2009, de 22 de setembro, os níveis remuneratórios correspondentes às posições remuneratórias das categorias que integram a carreira especial de enfermagem são identificados por diploma próprio.
Assim, de acordo com o anexo do Decreto-Lei nº 122/2010, de 11 de novembro, a carreira especial de enfermeiro apresenta as seguintes posições e níveis remuneratórios:
[dá-se por reproduzido o documento/imagem constante do original]
Nos termos do artigo 5.º do mencionado Diploma, sob a epígrafe “Reposicionamento remuneratório”:
“1 - Na transição para a carreira especial de enfermagem, os trabalhadores são reposicionados nos termos do artigo 104.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro.
2 - Sem prejuízo do disposto no número anterior, os enfermeiros posicionados nos escalões 1 e 2 da categoria de enfermeiro, bem como os posicionados no escalão 1 da categoria e enfermeiro graduado, mantêm o direito à remuneração base que vêm auferindo, sendo reposicionados na primeira posição remuneratória da tabela remuneratória constante do anexo ao presente diploma, nos seguintes termos:
a) A 1 de Janeiro de 2011, os enfermeiros graduados com avaliação positiva que, pelo menos, desde 2004, se encontrassem posicionados no escalão 1 daquela categoria;
b) A 1 de Janeiro de 2012, os restantes enfermeiros graduados com avaliação positiva;
c) A 1 de Janeiro de 2013, os enfermeiros posicionados nos escalões 1 e 2 da categoria de enfermeiro, bem como os enfermeiros graduados que não tenham sido abrangidos pelas alíneas anteriores.
(...)”»
Conforme se expendeu no Acórdão de fixação de jurisprudência do Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do STA, de 16/11/2011, a alteração do posicionamento remuneratório dos trabalhadores da função pública passou a fazer-se, no período posterior a 1 de janeiro de 2008 de acordo com o estabelecido nos artigos 46º a 48.º e 113.º, n.º 1, da Lei n.º 12-4/2008, de 27 de Fevereiro, em virtude do artigo 119.º, n.º 1, da Lei n.º 67-A/2007, de 31 de dezembro, ter determinado a aplicação do regime estabelecido na LVCR.
Assim, independentemente da estruturação da carreira de enfermagem, com definição das respetivas categorias e escalões dentro de cada categoria, a progressão nestas carreiras passou a fazer-se nos termos que vieram a ser definidos na Lei n.º 12-A/2008, designadamente nos termos definidos nos seus artigos 46º a 48º), e não, como até então, com progressão automática por antiguidade no escalão.
No caso da carreira de enfermagem, o artigo 5.º do Decreto-Lei nº 122/2010, de 11 de novembro, como supra se viu, veio estabelecer expressamente, que a alteração de posição remuneratória na categoria se efetua nos termos previstos nos artigos 46.º a 48.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro (artigo 2.º, nº 2), e que na transição para a carreira especial de enfermagem, os trabalhadores são reposicionados nos termos do artigo 104.º da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro.
E sendo assim, como bem se frisou na sentença recorrida importa «chamar à colação a respetiva Lei, que aprovou os Regimes de Vinculação, de Carreiras e de Remunerações – Funções Públicas, doravante designada LVCR, por aqui ser relevante atento ao momento temporal resultante da factualidade assente, entretanto já revogada pela Lei n.º 35/2014, de 20/06, que aprovou a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, doravante LGTFP.»
Antes porém, importa sublinhar que atento o disposto na alínea c) do art.º 2.º da Lei n.º 66-B/2007, de 28/11, na sua atual redação, o SIADAP aplica-se ao desempenho dos trabalhadores da administração pública independentemente da modalidade de constituição da relação jurídica de emprego público, sendo que para efeitos deste sistema o conceito de “trabalhador” abrange todos os que não exercem cargos dirigentes ou equiparados, desde que a respetiva vinculação, seja por prazo igual ou superior a seis meses- cfr. alínea h) do artigo 4.º.
Analisados conjugadamente os referidos preceitos, decorre que o SIADAP é aplicável aos trabalhadores vinculados mediante contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo, aplicando -se a todos os trabalhadores ao serviço da Administração Pública.
Ademais, em consonância com o disposto naquele preceito da LVCR, também o artigo 89.º da LGTFP determina que os trabalhadores estão sujeitos ao regime de avaliação do desempenho constante de diploma próprio.
No caso em análise, tendo em conta que a relação de emprego da Apelante perdurou por muito mais de seis meses, a mesma tinha o direito a ser avaliada em relação a todo o período de tempo em que prestou serviço ao abrigo dos vários contratos de trabalho a termo resolutivo certo que outorgou com a Apelada, não sendo esta uma questão controvertida.
É inegável que todo o trabalhador público tem direito ao normal desenvolvimento da sua carreira. Nesse sentido, o n.º4 do artigo 82.º da LTFP é expresso ao consagrar que «Todos os trabalhadores têm direito ao pleno desenvolvimento da respetiva carreira profissional, que pode ser feito por alteração de posicionamento remuneratório ou por promoção».
Também é inquestionável que todos os trabalhadores estão sujeitos à avaliação do seu desempenho e que essa avaliação, assente em critérios que visam reconhecer o mérito do desempenho profissional de cada um, não pode deixar de relevar na carreira, designadamente para efeitos de alteração do posicionamento remuneratório na carreira do trabalhador (art.52.º, n.º1, al. e) da LVCR).
Daí que também no artigo 91.º da LGTFP o legislador tenha mantido a previsão legal nos termos da qual «Para além dos efeitos previstos no diploma que a regulamenta, a avaliação do desempenho dos trabalhadores tem os efeitos previstos na presente lei em matéria de alteração de posicionamento remuneratório na carreira, de atribuição de prémios de desempenho e efeitos disciplinares».
Quanto aos pontos que o trabalhador necessita de reunir em sede de avaliação do desempenho para que possa beneficiar de uma progressão remuneratória, reza o n.º 7 do artigo 156.º da LTFP que:
«Há lugar a alteração obrigatória para a posição remuneratória imediatamente seguinte àquela em que o trabalhador se encontra, quando a haja, independentemente dos universos definidos nos termos do artigo 158.º, quando aquele, na falta de lei especial em contrário, tenha acumulado 10 pontos nas avaliações do desempenho referido às funções exercidas durante o posicionamento remuneratório em que se encontra, contados nos seguintes termos:
a) Seis pontos por cada menção máxima;
b) Quatro pontos por cada menção imediatamente inferior à máxima;
c) Dois pontos por cada menção imediatamente inferior à referida na alínea anterior, desde que consubstancie desempenho positivo;
d) Dois pontos negativos por cada menção correspondente ao mais baixo nível de avaliação.
8 - Na falta de lei especial em contrário, a alteração do posicionamento remuneratório reporta-se a 1 de janeiro do ano em que tiver lugar.»
Note-se que, já de acordo com a Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, o artigo 47.º, n.º 6, sob a epígrafe “Alteração do posicionamento remuneratório: regra” prescrevia o seguinte:
“6 - Há lugar a alteração obrigatória para a posição remuneratória imediatamente seguinte àquela em que o trabalhador se encontra, quando a haja, independentemente dos universos definidos nos termos do artigo anterior, quando aquele, na falta de lei especial em contrário, tenha acumulado 10 pontos nas avaliações do seu desempenho referido às funções exercidas durante o posicionamento remuneratório em que se encontra, contados nos seguintes termos:
a) Seis pontos por cada menção máxima;
b) Quatro pontos por cada menção imediatamente inferior à máxima;
c) Dois pontos por cada menção imediatamente inferior à referida na alínea anterior, desde que consubstancie desempenho positivo;
d) Dois pontos negativos por cada menção correspondente ao mais baixo nível de avaliação.»
Por sua vez, o artigo 117.º da LVCR dispunha do seguinte modo:
1 - Os regimes de vinculação, de carreiras e de remunerações definidos e regulados pela presente lei aplicam-se nos termos dos números seguintes.
2 - A partir da data de entrada em vigor da presente lei, as relações jurídicas de emprego público constituem-se:
a) Para o exercício de cargos abrangidos pela alínea a) do n.º 4 do artigo 9.º e de funções em carreiras cujo conteúdo funcional se insira nas actividades referidas no artigo 10.º, por comissão de serviço ou por nomeação, respectivamente, nos termos do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho e respectiva legislação complementar;
b) Para o exercício de cargos e funções não abrangidos pela alínea anterior, por contrato de trabalho, nos termos da Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho.
3 - Os contratos de trabalho são celebrados para as carreiras, categorias e posições remuneratórias de ingresso, previstas na lei, em regulamento ou em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho em vigor.
4 - A partir da data de entrada em vigor da presente lei, as alterações de posicionamento remuneratório processam-se nos termos previstos nos artigos 46.º a 48.º e 113.º da presente lei nas actuais carreiras e, ou, categorias, considerando-se que as referências legais feitas a escalão e mudança de escalão correspondem a posição remuneratória e a alteração de posicionamento remuneratório, respectivamente.
(...)”
Dito isto, tenha-se presente que de acordo com o disposto no art.º 6.º LGTFP ( Lei n.º 35/2014, de 20 de junho) o vínculo de emprego público pode revestir as modalidades de contrato de trabalho em funções públicas, nomeação e comissão de serviço, resultando do disposto no n.º4 deste normativo em conjugação com o artigo 7.º da mesma lei, que o vínculo de emprego público constitui-se, por regra, através da celebração do contrato de trabalho em funções públicas, ao qual pode ser aposto termo indeterminado ou termo resolutivo.
Naturalmente que a situação jurídica do trabalhador contratado a termo resolutivo ou por via de contrato de trabalho por tempo indeterminado não tem como única particularidade diferenciadora a questão do tempo de duração do respetivo vínculo, mas outras e significativas diferenças que decorrem da própria integração numa carreira do trabalhador vinculado definitivamente, o que não acontece com os trabalhadores contratados a termo resolutivo.
E daí que, o legislador tenha expressamente salvaguardado no n.º6 do artigo 56.º da LGTFP, que “não são aplicáveis ao vínculo de trabalho em funções públicas a termo resolutivo as normas relativas a carreiras, mobilidade e colocação em situação de requalificação” .
Ora, deste preceito resulta, desde logo, que não são aplicáveis aos trabalhadores vinculados por este tipo de contrato, ou seja, por contrato de trabalho a termo resolutivo, as normas referentes à alteração do posicionamento remuneratório, quando é consabido que a alteração de posicionamento remuneratório pressupõe a integração do trabalhador numa carreira, o que não ocorre na contratação a termo.
Este entendimento já resultava do disposto no artigo 39.º da LVCR, quando nele se estabelecia que:
«1 - Sem prejuízo do disposto no número seguinte e no artigo 58.º, o presente título é aplicável às relações jurídicas de emprego público constituídas por tempo indeterminado.
2 - Às nomeações transitórias e aos contratos a termo resolutivo, certo ou incerto, são aplicáveis, com as necessárias adaptações, os artigos 50.º e 51.º, os n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 53.º, os artigos 54.º e 55.º e o n.º 1 do artigo 57.º»
Se dúvidas houvesse de que somente em relação aos trabalhadores vinculados à Administração Pública através de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado é que o legislador consentia a sua integração numa carreira, as mesmas resultariam dissipadas em face do que então se dispunha no artigo 40.º da LVCR onde claramente se determinava que apenas Os trabalhadores nomeados definitivamente e contratados por tempo indeterminado exercem as suas funções integrados em carreiras».
Assim, já resultava da própria LVCR que a integração em carreiras estava prevista exclusivamente para os trabalhadores nomeados definitivamente e contratados por tempo indeterminado. Como tal, as alterações de posicionamento remuneratório com fundamento na avaliação estavam reservadas aos trabalhadores com vínculo por tempo indeterminado (cfr. artigo 47.º), excluindo-se a sua aplicação aos contratados a termo.
Trata-se de uma restrição que bem se compreende, uma vez que os trabalhadores contratados a termo, não se podem considerar integrados em carreiras, atendendo ao caráter temporário do exercício das respetivas funções.
Assim, em situações como a da Apelante, não pode haver lugar a uma alteração do posicionamento remuneratório ao abrigo do disposto nos artigos 156.º a 158.º da LTFP, as quais se aplicam apenas aos trabalhadores com vínculo de emprego público constituído por tempo indeterminado.
Acontece que, de acordo com a tese perfilhada pela Apelante, sempre se imporia a consideração da pontuação que obteve pelo seu desempenho profissional durante o tempo em que exerceu funções em situação de contratada a termo, para efeitos de reposicionamento remuneratório na carreira de enfermagem em que ingressou em 31/12/2013- em virtude do contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado que veio a celebrar com a Apelada-, por força do principio da continuidade do exercício de funções públicas consagrado no artigo 11.º da LGTFP.
Na perspetiva da Apelante, deste princípio resulta claramente que o legislador quis assegurar que o exercício de funções públicas, independentemente da modalidade de vínculo de emprego público, releva como exercício de funções públicas na carreira, categoria ou posição remuneratória, mesmo que o trabalhador mude definitivamente de órgão ou serviço.
Partindo deste entendimento, defende que a decisão do tribunal a quo em não aplicar no caso concreto o princípio da continuidade do exercício de funções públicas é errada porque, não só não é verdade que tenha trabalhado sempre no mesmo serviço (trabalhou, primeiramente, na Unidade de P.... e, depois, na Unidade de Saúde Familiar de B.... – cf. factos acima alegados em I. a XXXI.), como a interpretação que o tribunal a quo defende para o artigo 11.º da LGTFP não faz sentido e conduziria a resultados manifestamente injustos e que certamente o legislador não quis.
Advoga que a única interpretação ou leitura da norma do artigo 11.º da LTFP que faz sentido é a de que, se a continuidade do exercício de funções públicas é reconhecida até ao trabalhador que muda definitivamente de órgão ou serviço, por maioria de razão, também essa continuidade deve ser reconhecida ao trabalhador que, apesar de detentor de vínculos de diferentes modalidades, se manteve a trabalhar sempre no mesmo serviço.
Como tal, defende não existir nenhum motivo que possa justificar que se assegure a relevância do exercício de funções públicas ao trabalhador que estabelece vínculos de diferentes modalidades e muda definitivamente de órgão ou serviço e já não ao trabalhador que estabelece vínculos de diferente natureza mas se mantém a trabalhar no mesmo órgão ou serviço.
Conclui que só perfilhando este entendimento ficará realizado o princípio da igualdade e não discriminação, sobretudo tendo em conta todas as circunstâncias do caso concreto.
O que dizer?
O princípio da continuidade “do exercício em funções públicas” já colhia consagração expressa no artigo 84.º da LVCR, quando nele se dispunha que : «O exercício de funções ao abrigo de qualquer modalidade de constituição da relação jurídica de emprego público em qualquer dos órgãos ou serviços a que a presente lei é aplicável releva como exercício de funções públicas ou na carreira, na categoria e, ou, na posição remuneratória, conforme os casos, quando os trabalhadores, mantendo aquele exercício de funções, mudem definitivamente de órgão ou serviço”.
No âmbito da LGTP, o princípio em causa está consagrado no artigo 11.º, que se insere no título relativo às “Modalidades de vínculo e prestação de trabalho para o exercício de funções públicas”, e que sob a epígrafe “Continuidade do exercício de funções públicas” e à semelhança do artigo 84.º da LVCR dispõe: «O exercício de funções ao abrigo de qualquer modalidade de vínculo de emprego público, em qualquer dos órgãos ou serviços a que a presente lei é aplicável, releva como exercício de funções públicas na carreira, na categoria ou na posição remuneratória, conforme os casos, quando os trabalhadores, mantendo aquele exercício de funções, mudem definitivamente de órgão ou serviço».
A continuidade da prestação de serviço público significa que, sem interrupção, mas ainda que com vínculos de emprego público, carreira, categoria ou remuneração diferentes, os “trabalhadores” têm direito à contagem de todo o tempo de serviço prestado como tempo de serviço público.
Porém, a contagem desse mesmo tempo para efeitos de carreira ou categoria dependerá das carreiras e categorias que o trabalhador detiver ao longo desse tempo e das modalidades de vínculo de emprego público de que, durante esse tempo, for titular. Ou seja, o tempo de prestação de serviço público pode não coincidir para todos os efeitos mas, como tempo de prestação de serviço público, é contado todo o tempo de serviço prestado.
Como bem alega a Apelada o «sentido que pode extrair-se da norma, conjugando a interpretação sistemática com a formulação literal da mesma é a de que o exercício de funções ao abrigo de qualquer modalidade de vínculo de emprego público, em qualquer dos órgãos ou serviços a que a presente lei é aplicável, releva como exercício de funções públicas na carreira, na categoria ou na posição remuneratória, conforme os casos ( ou seja, releva na carreira, releva na categoria ou releva na posição remuneratória, conforme for a situação concreta do trabalhador que veja alterada a posição subjetiva do empregador público), quando os trabalhadores, mantendo aquele exercício de funções, mudem definitivamente de órgão ou serviço, em ordem a que o trabalhador, com a mudança de serviço, por qualquer das vicissitudes legais previstas, veja assegurada essa continuidade».
No que concerne ás situações dos trabalhadores contratados a termo, a referida norma, apenas vem permitir que um trabalhador detentor de vínculo de emprego público a termo resolutivo certo que entretanto passou a exercer funções de modo ininterrupto na modalidade de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, como é o caso da Apelante, possa contar todo o tempo de serviço para alguns efeitos como tempo de serviço público, desde que o exercício de funções tenha sido prestado continuadamente apesar de, naturalmente, sob diferentes vínculos de emprego público. Essa contagem para efeitos de “antiguidade ao serviço da administração pública”, estará assim, assegurada designadamente, para efeitos de aposentação, reforma ou aquisição de direito a férias.
No caso é inegável que a Apelante, entre 01/09/2004 e 30/12/2013, data em que outorgou contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, manteve com a Apelada vínculo ou relação jurídica de emprego público, através de sucessivos contratos de trabalho a termo, celebrados ao abrigo do artigo 18.º-A do Estatuto do Serviço Nacional de Saúde. Estes contratos foram, até determinada altura, celebrados com hiatos de apenas alguns dias, sendo certo que desde 08-10-2007 o vínculo ou relação jurídica de emprego público estabelecida entre as partes, ainda em diferentes modalidades, é ininterrupto.
Também é consensual que a Apelante foi sempre contratada com a “categoria equiparada” à de enfermeira ou para exercer as funções correspondentes a essa categoria e recebeu uma remuneração igual à remuneração correspondente à do 1.º escalão da categoria de enfermeira da carreira especial de enfermagem. E que foi sucessivamente contratada, não para a satisfação de qualquer necessidade temporária ou transitória da Apelada, mas para fazer face a necessidades permanentes ou à “normal prestação dos cuidados de saúde de enfermagem” nos serviços onde esteve colocada. Assim, é inquestionável que esteve, durante mais de 9 anos, a exercer as mesmas funções, nas mesmas condições e com a mesma retribuição que qualquer outro enfermeiro ao serviço da Apelada mediante vínculo ou relação jurídica de emprego público definitiva ou por tempo indeterminado.
Contudo, estamos em crer que para efeitos de alteração da posição remuneratória já não será legalmente admissível a contagem do tempo em que o trabalhador esteve vinculado a termo resolutivo, uma vez que, conforme referimos atrás, o exercício de funções a coberto de um contrato deste tipo não é considerado como tendo sido prestado em carreira/categoria, mas apenas transitoriamente.
Paulo Veiga Moura- in Comentários à LGTFP, 1.º Vol., Coimbra Editora, 2014, pá.131-em anotação a este preceito, escreve que: « Deverá, contudo, ter-se presente que o tempo de serviço relevará apenas se não tiver havido uma quebra ou interrupção de funções, conforme resulta desde logo da epígrafe do presente artigo, que se reporta à continuidade de funções.
Porem, esta continuidade de funções nem sempre será contabilizada para todos os efeitos legais, sendo nossa opinião que só será assegurada para efeitos de antiguidade ao serviço da Administração Pública, designadamente para efeitos de aposentação, aquisição de direito a férias, etc.
Pelo contrário, para efeitos de carreira, categoria ou posição remuneratória, o tempo prestado no mesmo ou em diferente órgão ou serviço e em qualquer modalidade de relação jurídica de emprego, só será contabilizado quando o trabalhador, apesar de serviço ou modalidade de vínculo jurídico, se mantiver na mesma carreira, categoria ou posição remuneratória».
O mesmo autor, em anotação ao artigo 6.º da LGTFP- pág.104- refere com acutilância para a questão em análise que « Os pressupostos do recurso à nomeação a termo são os mesmos que legitimam à contratação a termo ( ver n.º3 do artigo 8º), não sendo aplicável a qualquer uma das modalidades de vínculo precário as normas que disciplinam as carreiras, a mobilidade do pessoal e a colocação em situação de requalificação ( v. n.º6 do art.56º), o que é o mesmo que dizer que os arts 84.º a 100.º, 156º a 158º e 241º a 275º não são aplicáveis à situação de quem se encontre nomeado ou contratado a termo resolutivo, certo ou incerto».
Em consonância com o que se expendeu, entendemos que, no caso, para efeitos de posicionamento remuneratório, a constituição da relação jurídica de emprego público anterior a 31/12/2013 não pode relevar como exercício de funções públicas na carreira, na categoria ou na posição remuneratória, e por conseguinte, determinar a contabilização dos pontos acumulados pela Apelante entre 2005 e 2013 para efeitos de alteração obrigatória de posicionamento remuneratório.
No emprego público, como bem nota o Tribunal a quo, não existe norma jurídica que permita fazer relevar o tempo de trabalho prestado ao abrigo de contrato de trabalho a termo resolutivo para efeitos de reposicionamento remuneratório após o ingresso na carreira com celebração de um contrato de trabalho por tempo indeterminado em funções públicas.
Em suma, nas situações em que os trabalhadores contratados a termo venham a celebrar contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado, apenas relevam para alteração do posicionamento remuneratório, as avaliações obtidas na situação jurídico-funcional de contratados por tempo indeterminado, na ausência de norma legal que atribua, para efeitos de carreira, relevância ao tempo de serviço anteriormente prestado ao abrigo de um outro contrato de diferente natureza e atendendo a que, só a partir dessa data se podem os mesmos considerar integrados numa carreira, e, como tal, abrangidos pelas normas referentes à alteração do posicionamento remuneratório.
Como bem conclui a Apelada, das normas conjugadas dos artigos 11º e 56º/6 da LGTFP, que se seguiram a normas de igual teor e sentido constante dos artigos 84º e 39º da LCVR, Lei nº 12­A/2008, de 27-02, o que se extrai é precisamente nesse sentido, de falta de norma.
Ademais, em matéria de remunerações, a norma do artigo 144º/1 da LGTFP consagra uma particular rigidez ao estabelecer que «as normas legais em matéria de remunerações não podem ser afastadas ou derrogadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, salvo quando previsto expressamente na presente lei».
E dai não poder concluir-se que e o direito ao pleno desenvolvimento da carreira profissional, consagrado nos artigos 82.º, n. 4, 91.º e 156.º, n. 7 da LTFP, constitua uma enorme injustiça e discriminação injustificada em relação a outros trabalhadores, que desempenharam as mesmíssimas funções da Apelante, alguns nos mesmos locais de trabalho, mas que tiveram a sorte de estar ou ficar vinculados por outra modalidade de vínculo.
Por fim, a Apelante sustenta que a decisão recorrida constitui uma ofensa aos princípios da confiança e da segurança jurídicas ínsitos no princípio do Estado de Direito Democrático, previsto no artigo 2.º da CRP, dado que defrauda as expectativas da Apelante que, tendo em conta todas as circunstâncias concretas do caso, devem ser consideradas absolutamente legítimas, devendo reconhecer-se que, na sequência de permissão contida no artigo 18.º, n. 1, alínea a) da LOE 2018, tinha direito a ver contabilizados os pontos atribuídos pelo seu desempenho entre 2005 e 2016, num total de 15 pontos - 1 ponto pelos desempenhos dos anos 2005 a 2008 e 2015 e 2016 por falta de avaliação e 1,5 pontos por 2009 a 2013 em função das avaliações feitas - e, consequentemente, a ser posicionada na 2ª posição remuneratória da categoria de enfermeira, com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2018, devendo os pontos sobrantes não utilizados nesta alteração de posicionamento (5 pontos), ser mantidos e considerados em futura alteração de posicionamento remuneratório da Autora, nos termos do n. 6, do citado artigo 18.º da LOE 2018.
Não vemos qualquer razão para acolher a argumentação da Apelante, uma vez que, nos revemos na fundamentação avançada pelo Tribunal a quo, cuja decisão subscrevemos e na qual se escreveu que:
«O princípio do Estado de Direito encontra-se expressamente consagrado no artigo 2.º da CRP, concretizando-se, nomeadamente, através do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança dos cidadãos.
Os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança assumem-se como princípios classificadores do Estado de Direito Democrático, e que implicam um mínimo de certeza e segurança nos direitos das pessoas e nas expetativas juridicamente criadas a que está imanente uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado – cfr. neste sentido, o acórdão do STA, de 13.11.2007, proferido no âmbito do processo n.º ...4.
O princípio da tutela da confiança foi densificado pela jurisprudência constitucional através da definição dos respetivos pressupostos essenciais e da tradução destes numa sequência de requisitos ou testes, como se pode extrair do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 128/2009, de 12.03.2009:
“De acordo com esta jurisprudência sobre o princípio da segurança jurídica na vertente material da confiança, para que esta última seja tutelada é necessário que se reúnam dois pressupostos essenciais:
a) a afectação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda
b) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporcionalidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição).
Os dois critérios enunciados (e que são igualmente expressos noutra jurisprudência do Tribunal) são, no fundo, reconduzíveis a quatro diferentes requisitos ou "testes". Para que para haja lugar à tutela jurídico-constitucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspectiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda necessário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa.
Este princípio postula, pois, uma ideia de protecção da confiança dos cidadãos e da comunidade na estabilidade da ordem jurídica e na constância da actuação do Estado. Todavia, a confiança, aqui, não é uma confiança qualquer: se ela não reunir os quatro requisitos que acima ficaram formulados a Constituição não lhe atribui protecção”.
Em face do expendido, impõe-se concluir, com meridiana clareza, que não houve qualquer legítima expetativa que possa ter sido criada no sentido de que os contratos a termo celebrados pela autora relevariam para efeitos de progressão na carreira, pois como vimos, a legislação (artigos 39.º e 40.º da LVCR e artigo 56.º da LGTFP) é clara e no sentido oposto. Dito por outras palavras, de que não são aplicáveis ao vínculo de trabalho em funções públicas a termo resolutivo as normas relativas a carreiras.
Por fim, se bem se percebe pela alegação da autora pretende convocar os artigos 2.º, 13.º e 266.º da CRP ao invocar a que a não contabilização dos pontos acumulados entre 2005 e 2013 “constitui uma enorme injustiça e discriminação injustificada em relação a outros trabalhadores da mesma carreira (...) mas que tiveram a sorte de estar ou ficar vinculados por outra modalidade de vínculo” (artigo 27.º da petição inicial), ainda que não o faça de forma expressa e seja uma invocação genérica.
O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13º da CRP, é um princípio estruturante do Estado de direito democrático e proclama a máxima de tratamento igual para o que é essencialmente igual e tratamento diferenciado para o que é substancialmente diferente. Na verdade, o princípio desdobra-se em duas dimensões: proibição do arbítrio legislativo e proibição da discriminação.
Sobre o princípio da igualdade afirma o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 437/06, de 12.6.2006, entre o mais que “Na verdade, o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adopção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objectiva e racional. O princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio.”
A proibição da discriminação, não implica uma exigência de igualdade absoluta em todas as situações, nem impede as diferenciações de tratamento. O que a Lei Fundamental pretende é obviar a fatores de discriminação ilegítimos, como os que se encontram exemplificativamente elencados no n.º 2 do artigo 13.º da CRP. Assim, quando o legislador infraconstitucional impuser um tratamento desigual, deve existir uma justificação material para essa desigualdade.
Não se vislumbra em que medida é que a situação da autora configura uma discriminação injustificada, porquanto não só a situação da autora não é equiparável à dos demais colegas, como não se pode dizer que se trate de situação que mereça igual tratamento. Em rigor, estamos perante situações diversas com origens diversas.
Nestes moldes, improcede também o suscitado pela autora quanto a este ponto.»
Termos em que improcedem todos os fundamentos de recurso invocados.
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IV - DECISÃO
Nesta conformidade, acordam os Juízes Desembargadores deste Tribunal Central Administrativo do Norte em negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmam a decisão recorrida.
Custas pela Apelante (artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 CPC)
*
Notifique.
*
Porto, 14 de outubro de 2022
Helena Ribeiro
Nuno Coutinho
Ricardo de Oliveira e Sousa