Acórdãos TCAN

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte
Processo:00080/03-Coimbra
Secção:2ª Secção - Contencioso Tributário
Data do Acordão:06/07/2018
Tribunal:TAF de Coimbra
Relator:Mário Rebelo
Descritores:FUNDAMENTAÇÃO DO DESPACHO PROFERIDO PELO EXMO. DIRETOR DE FINANÇAS
Sumário:Não está devidamente fundamentado o despacho do Diretor de Finanças, proferido nos termos do n.º 6 do art. 92.º do LGT, que não esclarece os motivos do recurso aos métodos indiretos nem mesmo as razões porque, em face dos argumentos apresentados pela Recorrida, se optou pela alteração dos valores fixados no relatório de inspeção e se fixou outros valores, e os fundamentos em que sustentou essa alteração.*
* Sumário elaborado pelo Relator.
Recorrente:Fazenda Pública
Recorrido 1:M...
Decisão:Negado provimento ao recurso
Aditamento:
Parecer Ministério Publico:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

RECORRENTE: Exmo. Representante da Fazenda Pública.
RECORRIDO: M....
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pela MMª juiz do TAF de Coimbra que julgou procedente por falta de fundamentação do despacho do Exmo. Diretor de Finanças a impugnação deduzida contra as liquidações adicionais de IVA de 1997 a 2000.
CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:

1. A Meritíssima Juiz do Tribunal recorrido julgou a presente impugnação procedente por ter entendido haver vício de forma na parte relativa à fundamentação, mais concretamente, no despacho de fixação do Director de Finanças.

2. A Fazenda Pública não concorda, salvo o devido respeito, com a existência de tal vício.

3. Para se averiguar da falta ou insuficiência da fundamentação, tem que se ter em consideração o seu destinatário concreto, ou seja, aquele contribuinte a quem o procedimento se dirige ou, pelo menos, fazer apelo ao conceito de homem médio ou bonus pater familia mas colocado perante a situação concreta.

4. A jurisprudência tem entendido que a concordância com a fundamentação de anteriores pareceres ou informações, pode resultar de uma conexão inequívoca entre documentos, sustentada nos termos neles utilizados, no respectivo conteúdo, na sequência procedimental em que foram emitidos e nos restantes elementos do processo administrativo, pelo que não é imperativa a existência de uma declaração formal expressa.

5. Não pode aceitar-se que se considere que o impugnante, enquanto destinatário colocado perante a situação concreta, não tenha ficado esclarecido das razões da decisão.

6. Este já havia participado por várias vezes no procedimento e já tinha tido conhecimento do relatório de inspecção (o qual tinha sido sancionado favoravelmente pelo Director de Finanças).

7. O despacho em causa é exaustivo, individualizando os factos apurados e descritos no relatório de inspecção que levaram à conclusão de que o apuramento da matéria colectável não era susceptível de ser feito de forma directa.

8. Nele consta com clareza quais as razões porque não foi atendida a reclamação do contribuinte: as irregularidades detectadas em acção de inspecção não foram justificadas nem contrariadas, de forma objectiva e concreta, pelo contribuinte, nem no pedido de revisão, nem através do seu perito no debate contraditório.

9. Da sua leitura resulta, de forma inequívoca, também, a remissão expressa para o conteúdo do relatório de inspecção (cfr. § 3.º de fls. 3 e 1.º de fls. 4 do Despacho) – situação permitida por lei (art. 77.º n.º 1 da LGT).

10. E, por isso, apesar de não haver necessidade de repetir as situações detectadas, em ordem a uma maior clareza da exposição, as situações voltaram a ser indicadas, ainda que de forma sumária.

11. Muito respeitosamente, não se entende, por isso, porque razão a sentença recorrida acusa o despacho de fundamentação insuficiente e de não concretizar os factos apurados em sede de procedimento tributário.

12. Também não se compreende por que razão o acusa de não indicar aquilo que “efectivamente é erigido como facto fundamentante da conclusão a que chega”.

13. O despacho é muito claro: não há um só facto fundamentante, nem tinha que haver, mas vários – todos os nele indicados.

14. A própria sentença enumera vários factos, para concluir, sem qualquer explicação, não ser “esta uma razão só por si para justificar a aplicação do método indiciário”, i. é, aprecia apenas um dos factos e não se pronuncia, sequer, sobre os restantes indicados.

15. Como também não é explicado na douta sentença o porquê de ter sido entendido ser o relatório “também ele insuficiente quanto ao modo de eleger factos contributivos para justificar a aplicação do método indirecto (…)”, apesar do mesmo elencar e demonstrar vários factos (acima resumidos no art. 19.º destas alegações).

16. Ao contrário do que é referido na douta sentença os dois exemplos que foram indicados no relatório (A… e Mário…) serviram para demonstrar a ausência de facturação e não a facturação falsa, sendo que tais exemplos (juntamente com os restantes indicados) demonstram, claramente, a falta de credibilidade da escrita do contribuinte.

17. No que se refere à quantificação, não se percebe a crítica da douta sentença quanto ao facto do perito da Fazenda Nacional ter reduzido os valores de acordo com o estado de acabamento das obras e não ter aceite, por falta de prova, os valores indicados pelo impugnante em virtude das obras não terem sido alegadamente feitas por si na totalidade.

18. Não existe qualquer contradição em tal actuação: no primeiro caso, os valores foram reduzidos por se ter observado directamente que o estado de acabamento das obras demonstrava a sua não total conclusão; no segundo caso, e quanto às restantes obras, a não aceitação dos valores indicados pelo impugnante deveu-se à falta de prova da não realização das obras na totalidade.

19. A douta sentença, para além da existência do próprio relatório, das actas e laudos e do despacho de fixação (os quais transcreve), nada mais dá como provado e o único facto que dá como não provado é o das facturas não titularem serviços prestados, não tomando posição expressa sobre nenhum dos factos relatados em tais documentos, impedindo uma defesa eficaz da Fazenda Pública.

20. Não se concorda, igualmente, com o entendimento da douta sentença, baseado no testemunho de uma Egenheira Técnica, prestado para uma situação abstracta e ele próprio muito vago (e de duvidosa exactidão), de que o critério de quantificação encerrava relatividade, já que preteriu (sem sequer se pronunciar sobre eles) dois casos concretos, não contraditados pelo impugnante, em que os valores das estimativas e o das obras eram idênticos.

21. Depois, o facto de, na quantificação operada, o perito da Fazenda Pública ter considerado que o IVA já estava incluído no valor das obras, parece não necessitar de uma explicação expressa, já que, sendo sempre devido, o facto de assim ter sido considerado, foi para que se evitasse a acusação de excesso de quantificação.

22. No que se refere à acusação de não terem sido presumidos custos, a verdade é que tal questão é irrelevante em sede de IVA (poderia, eventualmente, relevar apenas em sede de IRS), não implicando qualquer excesso de quantificação.

23. O critério utilizado é objectivo e facilmente sindicável: foram os próprios donos das obras que declararam os valores, apurados por engengheiros, a uma entidade externa e foram utilizados por não ter sido possível o seu apuramento com base na escrita.

24. Nos termos do n.º 4 do art. 77.º da LGT, a lei apenas exige que se indiquem os critérios, competindo ao sujeito passivo vir demonstrar que os mesmos não são adequados em virtude de provocarem um excesso na quantificação operada (para desconsiderar o critério utilizado, o contribuinte tem que demonstrar que o mesmo é errado, o que não aconteceu).

25. E recorde-se que, no procedimento de revisão, na parte em que o contribuinte provou existir excesso, a matéria colectável foi corrigida em conformidade.

26. Finalmente, também não se concorda com a douta sentença quando acusa o despacho de fixação do Director de Finanças de contraditoriedade: analisado o mesmo, verifica-se que adere às conclusões do relatório de inspecção no que se refere aos pressupostos para o recurso a métodos indirectos e quanto à escolha do critério de quantificação. No entanto, porque o contribuinte demonstrou existir excesso nessa quantificação, adere à feita pelo perito da Fazenda Nacional, que teve em conta a prova feita.

27. Não existe, por isso, fundamentação implícita, nem, do mesmo passo, qualquer ambiguidade ou contraditoriedade no despacho em análise, nem qualquer vício de falta de fundamentação no que respeita ao critério de quantificação.

28. Ainda que se entenda que a decisão do Director de Finanças possa ter alguma falha, o que só por mera cautela se configura, não será qualquer falta de clareza, qualquer incongruência ou, em particular, qualquer insuficiência que poderá equivaler à falta radical da fundamentação. (...) Não bastará, pois, qualquer ambiguidade ou dificuldade de entendimento no conteúdo da declaração para se concluir que falta a fundamentação. Mesmo que a formulação suscite algumas dúvidas, só a obscuridade relativa aos traços decisivos da fundamentação deve relevar, quando não seja possível identificar as razões determinantes do acto ou, pelo menos, o seu núcleo significativo. (sublinhado nosso)

29. E, como já acima se referiu, a decisão do Director de Finanças não deixa dúvidas sobre as razões que a determinaram, razão pela qual, e salvo devido respeito, não se concorda com a acusação que lhe é feita de sofrer do vício de falta de fundamentação, pelo que existe erro de julgamento.

Nestes termos e com o douto suprimento de Vªs Exªs, deve a decisão recorrida ser revogada, com as legais consequências, assim se fazendo,
JUSTIÇA



CONTRA ALEGAÇÕES.
O Recorrido contra alegou e requereu ampliação do recurso nos seguintes termos:
1) Vem o presente recurso apresentado pela Fazenda Pública da douta decisão que julgou procedente por provada a impugnação judicial e decretou a anulação das liquidações impugnadas.
2) Não tem, todavia, razão a recorrente pois os actos de liquidação padecem efectivamente de falta/insuficiência de fundamentação.
3) A fundamentação é consubstanciada pelo discurso verbalizado pela administração como suporte constituinte da decisão administrativa. Nesta perspectiva, estamos perante uma externação formal das razões de facto e de direito que hão-de ser contemporâneas ou coetâneas da decisão administrativa e constituintes da mesma, não podendo considerar-se como legítimas aquelas que, ainda que porventura, com um sentido integrador do sentido da sua anterior declaração, apenas sejam produzidas e invocadas posteriormente. Numa formulação que traduz apenas a síntese do que a doutrina mais autorizada escreveu sobre a matéria, poderemos repetir que a fundamentação se consubstancia num discurso funcional externado pela administração, expresso, formal, explícito, contextual, com capacidade para dar a um destinatário normal, colocado na situação concreta do destinatário do acto as razões “justificantes” e “justificativas” (sob o ponto de vista formal) da concreta decisão administrativa, o que no caso não se verifica de todo.
4) Sendo certo que, a densidade ou capacidade significante do discurso fundamentador da administração tributária tem necessariamente subir de rigor sempre que o conteúdo do acto represente os termos da resolução de uma controvérsia que se haja instalado ou possa instalar entre a administração e o contribuinte, devendo ela variar na razão directa da complexidade substancial dessa divergência ou seja dos termos em que se exprime quer do ponto de vista factual, quer do ponto de vista jurídico a querela existente entre a administração e o contribuinte.
5) O discurso fundamentador tem assim de externar o momento cognitivo dos factos, o modo como estes foram conhecidos, o percurso endógeno da sua avaliação, segundo os mais variados critérios de validação racional (empíricos, técnicos, jurídicos ou outros), de cuja ponderação resulte como inteiramente justificada racionalmente a solução do apuramento do rendimento tributável apenas por um modo indirecto e na expressão quântica fixada, o que in casu, não acontece.
6) A própria jurisprudência é, também ela, clara no que se refere ao conteúdo da fundamentação: “A fundamentação há-de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao administrado ou contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do acto, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a actuar como actuou; e congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão.”, in Acórdão S.T.A. de 11-12-2002.
7) Não se esquecendo que a ideia de fundamentação, como legitimação concreta, impõe uma exteriorização das razões de facto, a cargo do seu autor, que deve constar do mesmo instrumento de externação, devendo ser-lhe contemporânea, “designadamente quando esteja em causa o exercício de poderes discricionários ou a Administração disponha de margens de apreciação ou de escolha, o dever formal (no sentido de representação externa e contextual) de fundamentação constitui uma exigência acrescida de legitimidade material do acto, na medida em que, impõe o comprometimento como sujeito do órgão competente” (cfr. Vieira de Andrade, O Dever de Fundamentação dos Actos Administrativos, p. 28).
8) Estribando-se a liquidação impugnada na decisão lavrada em sede de despacho nos termos do art.º 92º, n.º 6 da LGT é no respectivo despacho que importará procurar a sua fundamentação.
9) Para se aferir do cumprimento daquele dever, importa perscrutar se o acto tributário que imputou, em concreto, ao sujeito passivo a liquidação em crise se encontra devidamente fundamentado tendo como referência as exigências supra referidas.
10) O relatório da inspecção tributária não consubstancia nem se traduz, directa e imediatamente, a fundamentação do acto tributário de liquidação, entendido este como a decisão final administrativa do procedimento, pelo que, o facto deste se encontrar – ou não – fundamentado não substitui nem elimina o dever de fundamentação expressa da decisão final que determina apodicticamente o quantitativo do imposto a exigir ao sujeito passivo.
11) Essa decisão, no caso concreto, é materializada num acto de liquidação que define objectiva e subjectivamente a situação fiscal do sujeito passivo, pelo que não poderá deixar de exigir-se, nos termos da lei, que essa decisão, que afecta direitos e interesses legalmente protegidos, seja adequadamente fundamentada, dela devendo constar, sem margem para quaisquer dúvidas, a motivação fáctico-jurídica denunciadora do iter cognoscitivo e valorativo que conduziu à decisão final.
12) Ora, compulsado o teor do respectivo despacho, resulta claro que a mesmo não contém um discurso fundamentador apto a esclarecer o contribuinte, quanto à motivação do valor acordado, mormente, a indicação de forma clara, suficiente e congruente dos elementos e critérios utilizados na sua determinação.
13) A exigência de uma fundamentação expressa posterga uma “apropriação implícita dos fundamentos anteriores”, sendo inapropriado aferir o cumprimento daquele dever através da consideração de elementos constantes do procedimento administrativo para os quais não existiu expressa remissão.
14) É inconstitucional, por violação do disposto no artigo 268.º, n.º 3, da CRP, qualquer critério normativo, inferido do 77º da LGT, quando interpretado no sentido de admitir que a decisão final do procedimento seja “fundamentada” implicitamente por remissão não expressa para o processado anteriormente.
15) O mesmo se dizendo de uma dimensão normativa desse preceito no sentido de fazer equivaler a fundamentação do relatório de inspecção à fundamentação da liquidação tributária sem existência de qualquer remissão para aquela.
16) Aliás, quanto às correcções de natureza aritmética, verdadeira e exactamente inexiste qualquer fundamentação, pois factos desconhecidos, como aqueles acima descritos, são juridicamente inexistentes, pois no relatório da inspecção tributária não se vislumbram quaisquer razões de facto e/ou de direito que justifiquem a tributação efectuada.
17) Do invocado ponto III do relatório, convocado como “ descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável “, não constam quaisquer fundamentos que justifiquem as correcções de 6.390.000$00, 9.875.459$00, 7.640.000$00 e 6.956.000$00 que a fiscalização considerou, não se sabe porque razão ou razões, como facturas fictícias.
18) Efectivamente não pode o Fisco alegar contra o ora recorrido factos desconhecidos e insusceptíveis de controlo judicial, para a coberto deles a tributar, lesando-a, pois o impugnante, repete-se, desconhece a razão ou as razões porque é que aqueles valores foram considerados como facturas fictícias o que corresponde a privá-la do exercício do direito de defesa, ao arrepio do disposto nos artigos 20º e 268º, n.º 4 da CRP.
19) O acto tributário padece, pois, da ilegalidade de vício de forma por falta de fundamentação, violando o disposto nos art.ºs 77º da LGT e 1º, n.ºs 1 e 2 do D.L. n.º 256-A/77, de 17 de Junho, porquanto não permite a um destinatário normal, colocado na situação concreta do contribuinte, conhecer o iter cognoscitivo e valorativo prosseguido pelo autor do acto para o conformar nos termos em que o conformou.
20) EM AMPLIAÇÃO DO RECURSO: a liquidação é ainda ilegal que a Administração faz “tábua rasa“ dos critérios legais identificados na respectiva previsão legal aplicável, ou seja, o art.º 90º da LGT.
21) E quanto à taxatividade daqueles critérios, veja-se a anotação àquele artigo na Lei Geral Tributária, comentada e anotada por Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa: “ A lista de factores a atender tem carácter taxativo, como se depreende do não uso de qualquer expressão que indique que se está perante uma enumeração exemplificativa “.
22) Este carácter taxativo dos critérios utilizáveis na avaliação indirecta está em sintonia com a intenção legislativa de procurar objectividade na realização da avaliação de rendimentos (art.º 84º L.G.T.), bem como com o carácter subsidiário que o legislador atribui à avaliação indirecta (art.º 85º L.G.T.), uma vez que a enumeração taxativa dos pressupostos de aplicação desta avaliação (art.º 87º L.G.T.) leva obrigatoriamente à delimitação dos métodos de quantificação, caso contrário, a segurança jurídica e as garantias dos contribuintes que se visam defender com a taxatividade das situações susceptíveis de originarem uma tributação por métodos indirectos seriam facilmente postas em causa se a administração tributária pudesse utilizar um qualquer método de quantificação de que se lembrasse.
23) Esta é, aliás, uma solução que se impõe mesmo em termos de constitucionalidade, pois, nos casos em que não pode ser determinada directamente a matéria tributável, a relevante para efeitos de liquidação acaba por ser a ficcionada que resulta da aplicação dos métodos de avaliação indirecta, pelo que as normas que indicam os elementos que podem ser valorados para este efeito reconduzem-se a verdadeiras normas de incidência objectiva do tributo, que, por isso, estão sujeitas ao princípio da reserva de lei em sentido próprio (arts. 103.º, n.º 2, da C.R.P. e 8.º n.º 1 da L.G.T.) não podendo ser preenchidas por via não legislativa as hipotéticas lacunas (art. 11.º, n.º 4, da L.G.T.).
24) Por outro lado, este é também o entendimento imposto pelo princípio da legalidade, cuja definição, constante do art.º 3º do C.P.A., é aplicável subsidiariamente no procedimento tributário, em virtude da ausência de uma definição própria no art.º 55º da L.G.T., por força do preceituado no art.º 2º, alínea c) desta lei.
25) Na verdade, este princípio tem hoje uma formulação positiva, nos termos da qual a lei tem de ser o fundamento, o critério e o limite de toda a actuação administrativa.
26) Assim, a administração tributária só pode fixar a matéria tributável através de avaliação indirecta baseando-se nos elementos indicados na lei, constituindo vício de violação de lei a utilização de elementos sem cobertura legal.
27) EM AMPLIAÇÃO DO RECURSO: compete à Administração Fiscal o ónus da prova da verificação dos pressupostos da aplicação dos métodos indirectos (art.º 74º, n.º 3 da LGT e Vieira de Andrade, in Direito Administrativo e Fiscal, parte I, páginas 150-152: “ há-de caber à Administração o ónus da prova da verificação dos pressupostos legais da sua actuação, sobretudo se agressiva ( positiva e desfavorável )... “ ), o que inequivocamente não conseguiu fazer, sendo ainda certo, que tal ónus da prova da existência dos pressupostos de facto e de direito do acto de liquidação que tem por base a aplicação dos métodos indiciários cabe à Fazenda Pública, no recurso administrativo... (Ac. do TCA, Secção de Contencioso Tributário, de 22.5.2001, Proc. 4623/00).
28) As normas legais elegidas para se lançar mão do poder de tributar por métodos indirectos, são claramente inadequadas face à situação de facto efectivamente ocorrida, e por consequência, as conclusões retiradas estão inquinadas de falta de suporte legal.
29) Não se verificam os pressupostos de facto correspondentes aos abstractamente exigíveis e enunciados nos preceitos legais para que se possa considerar exercido legalmente o poder tributário de fixação do imposto por métodos indirectos, sendo ainda certo que, também não se indicam pressupostos de facto que sejam suficientes para sustentar a legalidade do exercício de tal poder, porque, os tomados em consideração não têm susceptibilidade causal, aferida pelos parâmetros de um juízo de causalidade adequada segundo a experiência comum, a ciência económica e a ciência fiscal para justificarem e levarem à aceitação dos factos inferidos ou porque os considerados não existem.
30) Acresce que, todas as situações invocadas pela fiscalização como legitimadoras da utilização do poder indirecto de tributação, foram infirmadas pelo contribuinte.
31) Assumindo particular relevância a facturação indiciada como falsa, pois que foi dado como não provado que: “As facturas não titulam serviços efectivamente prestados”.
32) Não tendo a recorrente atacado tal segmento decisório, não pode o mesmo ser prejudicado pela decisão do recurso nem pela anulação do processo, nos termos do n.º 4 do art.º 684º do CPC.
33) EM AMPLIAÇÃO DO RECURSO: o acto tributário padece de excesso na quantificação operada e bem assim o critério utilizado de falta de idoneidade.
34) O critério de quantificação utilizado no relatório foi o das obras licenciadas, mas não dá qualquer explicação para a utilização desta forma de quantificação, sendo certo que o que está na base deste elemento é uma estimativa de gastos ou custos para o dono da obra; elaborada por critérios aleatórios à própria obra, como explicou a Engenheira Técnica, Al…, na inquirição de testemunhas, é um elemento que em si encerra muita relatividade.
35) Depois o critério seguido é ainda errado, porque dá como adquirido que o impugnante efectuou as obras constantes das memórias justificativas quando na verdade aquele não efectuou todas as obras constantes das memórias justificativas, por várias razões: ou porque as obras ainda não estão concluídas, ou porque foram concluídas pelo dono da obra, ou porque pura e simplesmente não foram executadas.
36) A realidade das obras constantes do mapa 8 anexo ao relatório e que se encontra provada nos autos, quer por documentos quer pelos depoimentos das testemunhas acima referidos e que aqui se dão por inteiramente reproduzidos, tem de ser levada ao probatório, face ao não conhecimento desta causa de pedir por prejudicialidade.
37) Importando, finalmente, ainda referir que, a fiscalização errou ainda ao estribar-se num errado entendimento do que é o método de avaliação indirecta da matéria colectável, pois induziu apenas a existência de proveitos, mas já não a de custos. Ou seja, desconheceu que o método presuntivo exige que se estabeleça uma correspondência, de acordo com os critérios estabelecidos no art.º 90º da LGT, entre os proveitos e os custos, tendo de presumir-se tanto os proveitos como os custos que do ponto de vista desses critérios seriam necessários à sua obtenção.
38) O que quer dizer que, mesmo admitindo-se o critério seguido como sendo correcto, sempre o resultado encontrado teria de ser diminuído por força do aumento dos custos necessários à obtenção dos proveitos.

Termos em que e nos mais de direito, se requer a Vossas Excelências:
1) Que se dignem negar provimento ao recurso apresentado, com todas as legais consequências.
2) Subsidiariamente, que se dignem conceder provimento ao recurso apresentado, com todas as legais consequências.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu parecer concluindo pela procedência do recurso e revogação da sentença recorrida.


II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao decidir não estar fundamentado o despacho do Diretor de Finanças.

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.


III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:

1.Motivo, âmbito e incidência temporal: a acção inspectiva teve origem numa acção de fiscalização levada a efeito ao s.p. Ad…, Lda., NIPC 5…, com sede em Nogueira do Cravo, Oliveira do Hospital, dado que nos elementos de escrita deste s.p., no ano de 1997, foram registadas facturas, emitidas pelo s.p. agora fiscalizado, com indícios de que se trata de documentos fictícios. Esta acção incidiu sobre os exercícios de 1997 a 2000.

2.Actividade / Outras situações: Este s.p. exerce a sua actividade na área da construção civil, CAE 45.211, verificando-se que a maioria dos trabalhos que executou, são diversificados e de valor relativamente pequeno.

Possui Certificado de Classificação (Alvará) nº 7854, classe 1, emitido em 19-04-1990. Nos anos analisados, teve ao seu serviço na área da produção, em média, 5 trabalhadores (pedreiros e serventes). O diminuto imobilizado é composto, basicamente, por uma viatura ligeira, de mercadorias de caixa aberta (Ford Transit).

3.Para efeitos do IVA está enquadrado no regime normal, de periodicidade trimestral. Não possui contabilidade organizada, fazendo os registos dos elementos de escrita nos livros exigidos pelo artigo 50° do CIVA.

4.Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável.

Da verificação que efectuamos aos elementos de escrita, nomeadamente, a conferência das compras, constatou-se que, o registo nº 22 relativo a compras, efectuado em 31-01-2000, no valor de 750.000$00, acrescido de 127.500$00 de IVA à taxa normal, o qual foi deduzido na declaração do período 0003T, não possuía qualquer documento de suporte. Solicitado ao s.p. o referido documento de suporte, este disse que efectivamente tal não existia, devendo-se esta situação, provavelmente, a um mero lapso para o qual não encontrava explicação. Junta-se cópia do registo das compras do ano em causa, que constitui o mapa nº 1 anexo a este relatório. Notar que as aquisições unitárias feitas pelo s.p. são de valor relativamente baixo pelo que, o valor do registo em causa salienta-se dos restantes pela sua grandeza. Assim, as correcções que se mostram devidas são as seguintes: (…)

O valor de 127.500$00, vai ser acrescido ao período 003T, por ter sido deduzido indevidamente, nos termos do art.° 19°, nº 2 do CIVA.

Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos.

Valores declarados: Os valores registados pelo s.p. e declarados através do anexo B1, das declarações mod. 3 do IRS, são os que se mostram do quadro 1 seguinte:

Quadro 1

Observando estes valores, verificamos que a quase totalidade dos custos respeitam a matérias-primas e mão-de-obra. Também verificamos que, apesar da prestação de serviços apresentar um ligeiro crescimento contínuo, o mesmo não se verifica no resultado apurado (resultado fiscal), mesmo tendo em conta a variação de produção.

Relativamente ao IVA, os valores declarados são os que constam do mapa nº 2, anexo a relatório. Nele verificamos que, apenas no período 0003T existe uma situação de crédito de imposto de reduzido valor. Nos restantes períodos, tem pago IVA com regularidade.

Custos de produção.

Dados os valores registados pelo sistema de escrituração e respectivos documentos de suporte, a nossa análise incidiu essencialmente nas aquisições de matérias-primas e custos com mão-de-obra, por constituírem a quase totalidade dos custos de produção.

Custos com pessoal.

A fim de testar os valores declarados e registados pelo s.p., cruzamos a informação com os dados recolhidos no Centro Regional da Segurança Social de Coimbra, os quais originaram o mapa que constitui o anexo nº 1, do Processo de Evidência de Trabalho. As diferenças verificadas entre os valores registados e este mapa devem-se aos encargos com remunerações e não são significativas, pelo que considerámos correctos os valores registados.

Matérias-primas.

A prestação de serviços inclui, regra geral, o fornecimento de matérias-primas, tal como verificamos pelo registo das compras (e respectivos documentos de suporte, em arquivo). No entanto, o s.p. não possui stocks destes materiais, adquirindo-os à medida das necessidades, até porque, não possui estaleiro propriamente dito, embora tenha um pequeno armazém, de dimensões exíguas, que não permite o armazenamento de grandes quantidades, como observámos in loco. De facto, a análise aos registos das compras permitem verificar que estas se efectuam de forma regular, ao longo do tempo; juntamos cópia do registo das compras que constitui o anexo nº 2, do Processo de Evidência de Trabalho. Assim sendo, às entradas de materiais (inputs), estarão subjacentes as correspondentes saídas dos mesmos (outputs), através da facturação de serviços prestados. Para testar esta afirmação, procuramos conhecer o local de descarga dos materiais que consta dos documentos de transporte. Como em arquivo, apenas se encontram as facturas e vendas a dinheiro da aquisição (raramente existem guias de remessa arquivadas), analisámos junto dos principais fornecedores, as cópias das guias de remessa / transporte, subjacentes à referida facturação. Com os elementos recolhidos, elaboramos a listagem que constitui o anexo n°3, do Processo de Evidência de Trabalho.

Consequentemente, elaborámos o quadro 2 seguinte, que compara os valores das aquisições mensais resultantes do anexo nº3 antes referido com as compras registadas no mesmo período.

Quadro 2 Aquisições mensais de matérias-primas

Como verificamos, apenas numa pequena percentagem das aquisições é possível conhecer o seu destino efectivo, embora suficiente quanto ao conhecimento do local e periodicidade das obras que o s.p. executou.

Serviços prestados / facturação.

Nos anos em análise, o s.p. processou as facturas relativas aos serviços prestados que se resumem no mapa nº3, anexo a este relatório. As facturas emitidas não quantificam os trabalhos realizados, nem tão pouco as matérias-primas consumidas. Também não foram exibidos quaisquer outros documentos que façam tal quantificação ou discriminação, dado que, à excepção de dois casos, os orçamentos apresentados também são omissos quanto a este assunto.

Por este motivo, além da análise aos elementos de escrita, fizemos diversas diligências externas, tais como, o cruzamento de informação com clientes e com os licenciamentos de algumas das obras que o s.p. executou.

Licenciamento das obras.

Após a recolha de elementos junto das Câmaras Municipais dos concelhos de Tábua e Oliveira do Hospital, conhecemos todos os licenciamentos para obras de construção, nos quais consta o s.p. como responsável pelas mesmas obras, através do alvará de construção de que é titular. Com o resumo destes elementos, que constituem o anexo nº 4 do Processo de Evidência de Trabalho, que incluem o valor da estimativa orçamental declarada no processo camarário, construímos o mapa nº4, anexo a este relatório. Comparando a facturação (evidenciada no mapa nº 3 anexo) com este mapa, observa-se o seguinte:

_ A localização das obras licenciadas situa-se nas proximidades da sede do s.p.;

_ Os licenciamentos concedidos são regulares ao longo do período analisado;

_ Nalguns casos, verificamos a inexistência de facturação;
_Regra geral, quando existe facturação de serviços prestados, esta é bastante inferior aos valores declarados pelo dono da obra, na estimativa orçamental do processo de licenciamento camarário.

_Também se observa que nem todos os serviços prestados pelo s.p., foram objecto de licenciamento camarário, nos termos antes referidos (em que o s.p. tenha utilizado o seu Alvará).

Obras realizadas e não facturadas.

Pelo facto de existirem licenciamentos de obras para os quais não encontramos qualquer facturação de serviços prestados, procedemos a diligências junto de dois destes potenciais clientes.

Assim, pelo contacto directo com a Sra. A…, residente no Lugar…, concelho de Tábua, titular do licenciamento no 31/99 da Câmara Municipal de Tábua, tivemos conhecimento dos seguintes factos, conforme cópias dos documentos que constituem o anexo nº5, do Processo de Evidência de Trba1ho:

- Que a obra licenciada foi efectivamente realizada pelo s.p., tendo os trabalhos sido iniciados em Fevereiro de 1999;
- Estes trabalhos decorreram regularmente até Fevereiro de 2000, como se verifica pelo livro de obra arquivado no processo Camarário, data em que o sp. denunciou o contrato com esta sua cliente, como se comprova por requerimento do próprio, dirigido à Câmara Municipal de Tábua, datado de 15-02-2000 cfr. fls. 3 a 5 do referido anexo no 5.

- A denúncia do contrato já referida, verificou-se quando a fase estrutural da obra se encontrava concluída, tendo sido motivada por divergência de preço quanto aos acabamentos da mesma.
- O valor acordado para a execução destes trabalhos (Orçamento); ascendeu a 7.550.000$00, conforme documento as fls. 6 a 18 do anexo nº5
antes referido.

As facturas emitidas pelo s.p. em nome desta sua cliente são documentos timbrados em nome de R…, residente em Travanca de Lagos cfr. fls. 6 a 8 do anexo nº 5 antes referido. Face a este facto, contactamos pessoalmente o titular destes documentos, que acidentalmente se encontrava de férias na sua residência familiar, em Travanca de Lagos, Oliveira do Hospital. Disse que efectivamente trabalhou para o s.p. em 1988, como subcontratado, tendo emigrado para a Suíça em 1989, local onde ainda se encontra. Tais facturas terão sido adquiridas pelo Sr. M..., que com a sua anuência, tratou de toda a documentação relacionada com a área fiscal. Ressalvou, porém, que sempre desconheceu a utilização dada às facturas em causa, tendo agora contactado o referido Sr. M..., que lhe afirmou ser efectivamente o responsável por esta situação, e que utilizou tais facturas como apontamentos - cfr. Auto de declarações do Sr. R…, cuja cópia é a fls. 19 do anexo nº5, antes referido. Também contactámos pessoalmente o Sr. Mário…, residente no lugar e freguesia de Meruge, concelho de Oliveira do Hospital, que obteve o licenciamento nº 355/98, de 8-9-98, para a construção de uma varanda na sua residência. Questionado sobre este assunto cfr. Auto de declarações cuja cópia é a fls. 1 do anexo nº 6, do Processo de Evidência de Trabalho; disse o seguinte:

• Que tais obras foram efectivamente realizadas pelo Sr. M... (s.p.), no prazo estabelecido na licença Camarária — entre 8-9-98 e 7-10-98 — pelo preço total de 350.000$00.

• O preço acordado foi pago até ao termo dos trabalhos, em numerário, por partes, tendo sido a primeira no início dos trabalhos, no valor de 150.000$00 e o restante valor, em duas partes que supõe terem sido iguais.

• Não se recorda de ter recebido qualquer documento de quitação, dos pagamentos efectuados.

• Contudo, por referência do s.p. verificámos que este emitiu a factura no 112, datada de 20-07-2001, a titular este trabalho, pelo preço total de 350.000$00 cfr. fls. 4 do anexo 6 do Processo de Evidência de Trabalho.

Estes dois casos demonstram que o s.p. prestou serviços que omitiu aos seus elementos da escrita. Mostram também que o valor da estimativa orçamental elaborado pelo técnico responsável pela execução do projecto e declarada nos processos de licenciamento camarário, correspondem a valores não inferiores aos efectivamente pagos pela sua execução. Como já referimos no ponto Matérias-Primas, a listagem que o constitui comprova a execução destes trabalho. Por outro lado, através do local de destino das matérias-primas consumidas - cfr. anexo n.º3 Processo de Evidencia de Trabalho - é possível confirmar o volume de obras que o s.p. realmente executou. A título exemplificativo, extraímos do referido anexo nº 3, apenas as aquisições de materiais com destino a Vila Nova de Oliveirinha, que constituem o mapa nº5, anexo a este relatório. Verificamos que as obras licenciadas para esta localidade foram efectivamente realizadas pelo s.p., que ali executou trabalhos ao longo dos anos de 1999 e 2000, o que, corrobora o que se disse quanto à cliente Sra. A…, e estão de harmonia com o elementos recolhidos nos processos, quanto à dimensão das obras e consequente duração de execução das mesmas ver também as fls. 66 a 69 do anexo nº4 do Processo de Evidencia de Trabalho.

Orçamentos das obras.

Dado que as facturas emitidas não obedecem aos requisitos exigidos pelo art° 35° do CIVA, solicitámos a exibição de outros documentos capazes de suprir tal falta, nomeadamente, autos de medição, orçamentos ou quaisquer outros documentos que neste tipo de actividade são usuais, por não se encontrarem arquivados.
Consequentemente foram exibidos pelo s.p., um conjunto de orçamentos, cujas cópias são as fls. 5 a 15 parte do anexo nº7 do Processo de Evidência de Trabalho, que revelam o seguinte:
• São elaborados em folhas soltas de formato A4;
• Os restantes, não quantificam nem valorizam parcialmente os vários trabalhos a realizar, limitando-se à sua discrição sumária e valorização global;

• Nenhum deles respeita a obras executadas pelo s.p. em cujo processo de licenciamento tenha sido utilizado o seu Alvará;
• Somente, em dois casos os orçamentos discriminam as quantidades e sua valorização, respeitando aos seguintes clientes:
o
Fabrica da Igreja Paroquial de… (cfr. fls. 1 a 3 do anexo nº 7 do Processo de Evidência de Trabalho), a que corresponde a factura nº 245, datada de 31-03-97, no valor total de 759.634$00.

. C… S.A. (cfr. fls. 4 do anexo nº 7 do Processo de Evidência de Trabalho), a que corresponde a factura no 52, datada de 30-12-97, no valor global de 3.201.120$00. Também comprovamos pelo documento, cuja cópia é a fls. 16 do anexo nº7 do Processo de Evidência de Trabalho, que o s.p. é possuidor de livros de orçamentos, pelo menos a partir de Fevereiro de 1999. Porém, não exibiu qualquer destes documentos, alegando não os ter utilizado.

Facturação não enquadrada na dimensão da actividade
Como já observámos, em qualquer dos exercícios em análise, existem clientes que sobressaem pela grandeza dos valores que lhes foram facturados um só cliente é mais representativo que todos os outros juntos - os quais, suscitam dúvidas dadas as características da actividade desenvolvida por este s. p., uma vez que não se harmonizam coma capacidade de execução evidenciada, nem correspondem ao tipo de trabalhos realizados(licenciados ou não pelas respectivas Câmaras Municipais). O mapa nº 6, anexo a este relatório, evidencia os valores que estão nesta situação. Notamos também que o s.p. teve a preocupação de elaborar orçamentos para todos estes casos, embora nenhum discrimine e quantifique os trabalhos que se propõe realizar - tal como referimos anteriormente. Por outro lado, a regularidade das aquisições de matérias-primas (cfr. ponto IV — 2.2 supra), os licenciamentos das obras (cfr. mapa nº 4 anexo) e a localização e periodicidade dos trabalhos que executou, indiciam que estes valores não correspondem a gualquer prestação de serviços efectiva. Tanto assim é que questionado o s.p. sobre os trabalhos constantes das facturas emitidas no ano de 1997, em nome da firma Ad…, L.da, com sede em Nogueira do Cravo, conforme auto de declarações cuja cópia constitui o anexo nº7 deste relatório, resumidamente, disse o seguinte:

• Que para a execução de tais trabalhos, deslocou-se com todos os seus empregados para Matosinhos, à excepção de um deles.
• Que foi um dos executantes que iniciaram a obra em causa, tendo ali trabalhado desde Abril até Setembro, descansando, regra geral, apenas ao Domingo.

• Que os trabalhos que executou consistiram na construção de sapatas e viga de fundação, feita ao nível do solo, coincidente com o perímetro do prédio e sobre a qual assentam todas as paredes exteriores do edifício. Além destes trabalhos, executou igualmente, assentamento de tijolo prensado (vulgarmente conhecido por tijolo burro), em quantidades significativas, já que as paredes, lateral esquerda e posterior edifício foram feitas deste material que também serviu de acabamento. Todos os materiais foram fornecidos pelo cliente.

• Quanto aos recebimentos, apesar de ter tido dificuldade em obtê-los, foram feitos na totalidade, embora em tranches de 100 e 200 contos, sempre em numerário, ao longo do período de execução dos trabalhos realizados, de modo a que na data da emissão da última factura recebeu o restante em dívida, no montante de 70.000$00.

Analisando estas afirmações e confrontando-as com o quadro 2 do relatório, a serem verdadeiras, então as aquisições de matérias-primas seriam diminutas no período em que diz ter trabalhado em Matosinhos, dado ter apenas uma pessoa a trabalhar na área da sua residência habitual. Ora não verificamos, antes pelo contrário. Das diversas diligências que efectuamos, entre elas a solicitação à Câmara Municipal de Matosinhos de alguns elementos relacionados com esta obra, podemos verificar pela respectiva memória descritiva, que constitui o anexo nº 8 do Processo de Evidência de Trabalho, que as obras em causa, respeitaram à reconversão de uma antiga fábrica de conservas, sita na Rua Serpa Pinto, onde houve imposição da referida Câmara Municipal em preservar determinadas partes do prédio, designadamente as paredes exteriores (fachadas), pelo que, as obras de estrutura se limitaram ao interior e cobertura. Aliás, tivemos oportunidade de conhecer o prédio in loco. Assim, o s.p. nunca pode ter executado as obras que referiu nas suas declarações, tal como, a viga de fundação que suporta as paredes exteriores. Até porque, nunca referiu que se tratava de uma reconstrução, o que é estranho, para quem tivesse efectivamente trabalhado num imóvel com aquelas características. Por outro lado, referiu que teve dificuldade em receber da sua cliente, os valores facturados, embora toda a dívida tivesse sido saldada, em numerário, até ao termo do contrato. A ser verdade o que afirmou não se compreende tais dificuldades, pois, mesmo que as tranches recebidas fossem todas de 200 contos, teria recebido mais do que uma tranche por semana (+/- 7.400 cts/200= 37 tranches! De salientar que o orçamento dos trabalhos que nos exibiu — cfr. fls. 6 do anexo nº7 do Processo de Evidência de Trabalho - refere a execução de cofragem e escoramento da laje fungiforme, na zona dos armazéns e escritório, bem como a respectiva estrutura de pilares e sapatas, dizendo ainda que os pagamentos serão mensais e após medição. São evidentes as contradições entre este documento e os esclarecimentos prestados pelo s.p.

O recebimento em dinheiro vivo (tranches de 100 a 200 cts.) contraria o procedimento usado ao tempo por esta empresa sua cliente, que habitualmente utilizava o cheque bancário, para pagamento de importâncias muito inferiores. Pelo menos, em relação aos valores facturados e que constam do mapa 6 em anexo, o s.p. referiu que foram recebidos em numerário. Ora, no que respeita aos fluxos financeiros da actividade, os elementos contabilísticos não fazem o seu registo, pois, como já referimos no início deste relatório, o s.p. apenas é obrigado a possuir e registar os livros mencionados no art. 50º do C.I.V.A., o que fez. No entanto, sobre a possibilidade de verificação das possíveis entradas de dinheiro provenientes de recebimentos das referidas facturas na(s) sua(s) conta(s) bancária(s), o s.p. não mostrou qualquer interesse em esclarecer a situação por esta via. Aliás, as situações descritas no ponto IV obras realizadas e não facturadas, provam a existência de cheques recebidos e explicam o comportamento do s.p. nesta matéria - cfr. fls. 10 a 18 do anexo 5 do Processo de Evidência de Trabalho.

Resumo: como verificamos:

• As matérias-primas foram adquiridas de forma regular ao longo tempo, nos anos em análise — cfr. ponto IV-2.2.

• Existência de processos de licenciamento camarário de obras em que interveio como responsável (através do seu Alvará), sem que exista a facturação correspondente à execução da obra quando esta se verificou, ou existindo facturação, o seu valor é significativamente inferior ao valor estimado naquele processo — cfr. ponto IV — 3.1.

• A prestação de serviços a clientes, que não facturou e, consequentemente omitiu aos elementos de escrita — cfr. ponto IV-3.2.

• As facturas que emitiu não obedecem aos requisitos exigidos pelo art° 35° do CIVA, nem possui outros elementos de escrita que possam suprir tal omissão.

Também verificámos a existência de facturas que não titulam qualquer transacção comercial — facturas fictícias — como se relata no ponto IV — 3.4. Com este facto os intervenientes obtém uma vantagem patrimonial indevida, quantificada no mapa n°6 anexo a este relatório, motivado por:

Quanto ao utilizador - aumenta artificialmente os custos da sua actividade ou dissimula custos confidenciais, traduzindo-se numa diminuição do resultado apurado para efeitos de tributação nos Impostos sobre o Rendimento. Quanto ao IVA, esta operação é financeiramente inócua pois, apesar de pagar ao emitente, pelo menos um valor igual ao do imposto liquidado no documento, na realidade vai recuperar igual quantia ao exercer o direito à dedução do mesmo.

Quanto ao emitente — permitiu, sem qualquer esforço, equilibrar artificialmente e conforme as conveniências os proveitos com os custos que efectivamente suportou na sua actividade e consequente reflexo no resultado apurado para efeitos de tributação no Imposto sobre o Rendimento. No que respeita ao IVA, dado o método de apuramento do valor a entregar ao Estado - método subtractivo - o s.p. apropria-se sempre de parte do IVA que recebeu, uma que vez, deduziu imposto suportado em inputs que nada contribuíram para os supostos proveitos que registou.

Pelo exposto, existem indícios seguros de que os valores constantes dos livros de registos não reflectem a exacta situação patrimonial do s.p., pelo que o resultado vai ser apurado com recurso a métodos indirectos, por impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável (aI. b) do art° 87° e art° 88° da L.G.T.).

Critérios de cálculo dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos:

Da análise que ficou expressa no ponto anterior e dos indicadores recolhidos sobre a actividade efectiva deste s.p., concluímos que os processos de licenciamento de obras de construção em que o s.p. se responsabilizou através do seu Alvará, são o indicador mais exacto para o cálculo do volume de negócios que efectivamente realizou, nos anos em análise.

Com este objectivo, elaborámos o mapa nº8, que discrimina e quantifica os valores corrigidos - com base nos mapas nºs 3, 4 e 6 anexos a este relatório - e que servem de base ao apuramento de resultados que se evidencia no quadro 3 seguinte.

a) - valores apurados no mapa nº6 anexo a este relatório. Como ficou dito no ponto IV-3.4 anterior, o s.p. não teve qualquer custo para a formação destes proveitos que registou e declarou donde, são acrescidos para o apuramento dos proveitos estimados.

3. Não se conformando com o mesmo (relatório) o impugnante reclamou para a Comissão de revisão, da qual resultou, a acta nº 059-C/02/LGT, tendo cada perito redigido o respectivo laudo e foi proferido o competente despacho do Sr. Director, em virtude da falta de acordo, nos termos que a seguir se transcreve:

Notificado o contribuinte em 07 de Junho de 2002, do conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a tributação, bem como do IVA fixado, veio a reclamar nos termos do artigo 91.° da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n° 398/98, de 17 de Dezembro. O debate contraditório entre os peritos, do contribuinte e da Administração Fiscal, concluiu-se em 19 de Setembro de 2002, com início pelas dez horas, conforme Acta nº 059-C/LGT, resulta daquele que, embora o perito da administração tributária haja procurado o estabelecimento de um acordo, tal não foi viável, uma vez que o perito do contribuinte não concordou com aquele, na qualificação dada aos factos, descritos no relatório de inspecção e reveladores da existência de irregularidades e omissões na escrituração do sujeito passivo, e que sejam motivo suficiente de recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria tributável deste. Não concordou, ainda, com a fundamentação do critério operado na quantificação e, por consequência, com o valor, assim determinado, nem veio, outra vez, a aceitar os valores propostos pelo perito da fazenda, que ponderou factos provados ao longo do debate, vindo, então, cada um deles, a lavrar o seu laudo, que se encontram juntos àquela acta, dela fazendo parte integrante. Nos termos do nº 6 do artigo 92º da Lei Geral Tributária, na falta de acordo, o órgão competente para a fixação da matéria tributável resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos. O nº 15 do artigo 91º da Lei Geral Tributária determina que é autuado um único procedimento de revisão, ainda que respeite a mais de um exercício ou tributo. Assim, compete-nos decidir. Analisados o relatório dos serviços de inspecção, a reclamação do contribuinte e considerando as posições tomadas pelos peritos, concluímos:

Pela existência, na contabilidade do contribuinte, de aquisições de matérias-primas que não encontraram correspondência na facturação de serviços a clientes; pela execução de obras a clientes, correspondentes a licenciamentos camarários, que não foram facturadas, e consequentemente, omitidas aos registos da escrituração; pela incongruência, não justificada, entre os valores facturados e as estimativas do custo da obra declaradas nas licenças das mesmas. Destas situações, se extrai que a contabilidade do sujeito passivo inspeccionado não releva todos os factos quantitativos que alteram os seus resultados dos exercícios e património necessários a uma revelação da “ exacta situação patrimonial, bem como os resultados efectivamente obtidos pelo sujeito passivo” de harmonia com a alínea b), do nº3, do art. 17° d C.J.R.C., o art. 29° do C. Comercial e as regras do POC. Para além das irregularidades dos preceitos acima referidos, o mesmo não é cumprido no que concerne às disposições relativas às facturas emitidas, estabelecidas no art. 35° do C.I.V.A, nomeadamente, a quantidade e denominação usual dos bens ou serviços prestados, e a emissão de facturas dentro do prazo estabelecido no n°1 deste artigo. Tais factos, apurados e comprovados no relatório que, nos termos do nº 1, do art. 76°, da LGT “fazem fé, quando fundamentados e se basearem em critérios objectivos - o que é a situação presente, não foram afastados, objectiva e concretamente, ao longo do procedimento, pelo sujeito passivo e seu perito. Que torna-se impossível, dada a natureza das omissões e irregularidades contabilísticas referidas, a quantificação, de uma forma directa e exacta, o real montante de matéria tributável em falta. Justificada a avaliação indirecta da matéria tributável, recai, por sua vez, no contribuinte, o ónus da prova do excesso da respectiva quantificação, de acordo com o disposto no nº 3 do art. 74°, da LGT. Viria, contudo, a provar, em parte, haver excesso no valor calculado pela inspecção tributária, que foi ponderada e acolhida pelo perito da fazenda em face de factos provados (obras não realizadas na totalidade pelo sujeito passivo), propondo outro montante, que, também, não foi aceite pelo seu perito. Pela legalidade do uso do critério operada na quantificação, porquanto se fundamenta nos corpos do art.s 52° do CIRC e do 90° da LGT, ao permitir liberdade na adopção do critério a operar na composição da matéria tributável, desde que adequados e fundamentados a mostrar a real capacidade contributiva do sujeito passivo, - o que é o caso presente -, através da estimativa do valor da obra, efectuada 6 por técnicos de construção civil. Por fim: justifica-se, deste modo, a nossa aderência às conclusões expressas no relatório dos serviços de inspecção, considerando, porém, a quantificação da matéria tributável proposta pelo perito da Fazenda, cujos cálculos e fundamentos aqui damos por reproduzidos, por se apresentarem adequados. Nestes termos, e tendo em conta todos os elementos referenciados, determino que o conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a I.R.S., sejam de 40.245,47 € Quarenta mil duzentos e quarenta e cinco Euros e quarenta e sete cêntimos), para o ano de 1997, de 64.399,49 € (Sessenta e quatro mil trezentos e noventa e nove Euros e quarenta e nove cêntimos), para o ano de 1998, de 66.747,99€ (Sessenta e seis mil setecentos e quarenta e sete Euros e noventa e nove cêntimos), para o ano de 1999, e de 3l.301,73 € (Trinta e um mil trezentos e um Euros e setenta e três cêntimos), para o ano de 2000, e os valores de IVA, que se consideram em falta, de 5.653,04 € (Cinco mil seiscentos e cinquenta e três Euros e quatro cêntimos), em 1997, de 8.83559 € (Oito mil oitocentos e trinta e cinco Euros e cinquenta e nove cêntimos), em 1998, de 10709,56€ (Dez mil setecentos e nove Euros e cinquenta e seis cêntimos), em 1999, e de 1.605,01 € (Mil seiscentos e cinco Euros e um cêntimo) em 2000».

_A fundamentação da quantificação e cálculos da matéria tributável do perito da Fazenda é a seguinte:

Conforme estava previsto na última acta, os peritos no dia 17 último, das 15 às 17,30 horas, visitaram as obras em que na petição do pedido de revisão é alegado que não chegaram a ser concluídas de conformidade com as licenças camarárias concedidas, acompanhados do sujeito passivo que nos guiou aos locais onde entendeu e ai fez os contactos com os donos das obras (que se encontravam presentes e mostraram as obras por dentro, em dois casos) e mostrou as obras por fora nos três casos em que os donos das obras não se encontravam presentes. As obras visitadas situam-se no lugar de Travanca de Lagos, em Oliveira do Hospital. O perito da Fazenda fez-se acompanhar pelo Inspector Tributário da Direcção de Finanças de Coimbra J…. O resultado dessas visitas, resume-se no seguinte:

1.1. Obra de Maria…. Esta obra consiste na reformulação de uma edificação contígua à habitação, conforme memória descritiva e outros documentos que se juntam a esta acta em anexo 1 e que constam do processo individual do contribuinte. Concluiu-se que a estrutura da obra foi feita, incluindo a cobertura com terraço mas a conclusão com telha de barro vermelho do tipo Marselhesa não está feita. A dona da obra não estava no local pelo que não foi possível ouvi-la sobre a execução da obra e as condições do contrato;

1.2. Obra de Am…. Como se pode ver pelos documentos em anexo 2 a esta acta, esta obra consiste na reformulação de uma edificação. E afirmado na petição de revisão que a obra foi interrompida e que só agora está em fase de acabamento, apesar de não ter sido revalidada a licença. Presencialmente constatamos que a obra está praticamente pronta, está habitada pelos proprietários, encontrando-se na altura dois profissionais a fazer acabamentos na garagem. O dono da obra antes referenciado encontrava-se no local, mostrou a casa e, conforme termo de declarações que se junta em anexo 2, afirmou que a obra tinha sido executada em duas fases, a primeira correspondeu ao ‘tosco”, iniciada por volta de 1997 e a segunda aos interiores, água electricidade e acabamentos, iniciada em 2000. Tendo-lhe sido perguntado sobre o valor da adjudicação da obra e sobre os pagamentos efectuados, alegou não ter elementos em seu poder nem se lembrar de montantes, apenas que pagou por duas vezes com cheques sacados sobre a agência de Oliveira do Hospital da Caixa Geral de Depósitos. Disse também que os alumínios não foram da responsabilidade empreiteiro, tendo sido colocados pelo fornecedor A…, Alumínios, Lda. Esta última afirmação não está desconforme com a memória descrita em anexo 2, que no seu ponto 11.4.- refere Caixilharia — Será recuperada a actual. Em caso de se verificar que tal não é possível proceder-se-á à sua substituição por outra de igual material.

1.3. Obra de António…. O dono da obra não estava no local circunscrevendo-se a visita ao exterior do edifício. Reconheceu-se o edifício como o que consta das fotografias que se juntam à petição do pedido de revisão. Verificou-se também que o telhado é ainda de quatro águas, tendo sinais de pequena reparação recente efectuada junto aos beirais, e portanto tudo indica que a obra de alteração do telhado a que se refere a memória descritiva em anexo 3 ainda não foi feita. Constatou-se também que perto do edifício foi recentemente feito um telheiro em vigas de cimento telhado de duas águas, não tendo havido oportunidade de ouvir o proprietário sobre o construtor desse bem, mas em primeira análise terá de se concluir que se trata de obra distinta da que está em apreciação no processo.

1.4. Obra de Manuel…. Conforme documento em anexo 4 esta obra consistiu numa reformulação de uma cobertura. Vista no local, verifica-se que a obra consistiu na cobertura de um anexo remodelado, com piso térreo, um piso elevado e no acesso por escadas interiores. O piso térreo é amplo e foi aí feita uma banca de cozinha e uma lareira de sala e colocados azulejos no chão e nas paredes e pedra de granito polida nas escadas. O piso superior está por acabar, é também ampla e as paredes não foram ainda rebocadas nem colocado forro no telhado.

Perguntado sobre as condições do contrata o dono da obra disse que o mesmo foi feito por 300 contos e que só incluiu o trabalho, pois que o material foi de sua conta. Tendo-lhe sido pedidos os documentos em seu poder sobre a obra, apenas apresentou a factura nº 111, de 20/07/2001, do fornecedor M.... Tendo-lhe sido pedidos os documentos de aquisição dos materiais, designadamente cimento, ferro, azulejos, tijolos, pedras de granito, disse que nada tinha. Perguntado sobre os pagamentos disse que os mesmos foram feitos através de cheques da conta da Caixa Geral de Depósitos de que exibiu a última caderneta, que se reporta à conta nº 0567011432700. As declarações proferidas encontram-se em termo que se junta no anexo 4 a esta acta.


1.5. Obra de Ag... Esta obra respeita à remodelação de parte da cobertura de uma moradia, conforme memória descritiva em anexo 5 a esta acta e que consta do processo individual do contribuinte. O dono da obra não se encontrava no local pelo que apenas foi possível ver o exterior do edifício. Confirmou-se que as fotografias juntas ao pedido de revisão correspondem ao estado do prédio actual. Confirmou-se também que apenas se encontra remodelada a parte do prédio com cobertura do terraço, faltando a parte que será coberta com telha e corresponde a 2 quartos/salas.

2.O perito da Fazenda Nacional faz os seguintes comentários ao que observou: 2.1. Sobre a obra descrita no ponto 1.1 anterior a mesma está inacabada relativamente ao previsto, mas a percentagem de acabamento nunca estará abaixo dos 50%. O valor de 500 000$ da estimativa orçamental apresentada na Câmara de Oliveira do Hospital para efeitos de licenciamento, afigura-se correcta já que se trata de uma obra que embora pequena está feita em vigas de betão armado, tijolos e placa de cimento, não se afigurando com credibilidade a adjudicação por 120 000$, conforme consta da declaração do empreiteiro.

2.2. A obra descrita em 1.2 está agora a ser acabada pelo que há falta de elementos sobre a percentagem de acabamento que foi efectuada na fase de validade da licença, sendo aceitável, com vista a um acordo, que a mesma se situou em 50%. Pela razoável dimensão da obra, como até e pode observar pelas fotografias juntas na petição do pedido de revisão e qualidade dos acabamentos, não se poderá considerar exagerada a estimativa orçamental de 2 350 000$ apresentada pelo técnico responsável da obra para fins de licenciamento, afigurando-se como ridículo o valor de 442 000$ constante da declaração em que o empreiteiro diz que a obra lhe foi adjudicada.

2.3. A obra descrita em 1.3 não tem sinais de ter sido efectuada pelo que aceita retirá-la dos cálculos da quantificação da matéria tributável;

2.4. A obra referida em 1.4, embora se encontre inacabada quanto ao reboco das paredes e chão do 1° piso, foi totalmente acabada no piso térreo, com chão a ladrilhos, paredes a azulejo, escada de granito polido para o piso superior, banca de cozinha e lareira de sala. O dono da obra disse que os materiais tinham sido de sua conta mas não comprovou documentalmente, nem com facturas nem com a identificação de cheques com que fez o pagamento. Não foram exibidos quaisquer sinais ou provas de que a obra tivesse sido efectuada para além do prazo de validade da licença camarária. Assim, entende-se que não é de alterar o valor constante da estimativa orçamental de 1 250 000$ apresentada na Câmara Municipal e assinada pelo técnico responsável da obra para concessão da respectiva licença.

2.5. A obra descrita em 1.5 poderá aceitar-se que foi concluída em 1/3 da sua totalidade. Também se considera razoável o valor da estimativa orçamental para a obra de 2 925 000$ e nunca o valor de 300 000$ declarado pelo empreiteiro como o de adjudicação.

3. Sobre o documento que o perito do contribuinte apresentou na última reunião e se juntou em anexo à acta nº 59-B/LGT, em resposta ao memorando que lhe havia sido entregue em reunião anterior (anexo à acta n.° 59-A/LGT) no qual se pediam esclarecimentos, informações e documentos por questões suscitadas na petição do pedido de revisão, o perito da fazenda nacional faz as seguintes considerações:

3.1.Contrariamente ao que se afirma na petição do pedido de revisão o relatório de exame à escrita apresenta factos que enquadram inequivocamente a escrita do contribuinte na tributação por avaliação indirecta. E o memorando citado faz eco disso, sobretudo nos seus pontos 1 e 2, em que no primeiro caso houve reconhecidamente obras que não excederam Fevereiro de 2000, cheques que foram recebidos em 1999 como pagamento dos trabalhos efectuados sendo emitida factura apenas em 3 de Agosto de 2001, após o inicio da inspecção e no dia seguinte aquele em que foi ouvido R… (auto de declarações junto ao processo) sobre o facto de o contribuinte ter usado impressos de facturas com o seu timbre, e as ter emitido em nome de A… e as entregar a essa cliente, indicando ai os cheques recebidos e alguns materiais aplicados na obra (eventualmente considerados suplementares ao orçamento), conforme documentação que consta do processo individual do contribuinte, referenciada no relatório de inspecção e transcrita no ponto 1 do memorando referido. Como fica evidente no processo, neste caso a factura nº 115, com data de 3 de Agosto de 2001, de 7.505 000$, nunca teria sido emitida se o contribuinte não soubesse que este caso em concreto estava a ser investigado. E mesmo emitida essa factura, a situação fiscal não se pode considerar regularizada já que a mesma se reporta a cheques recebidos em 1999, cheques esses fotocopiados no processo do sujeito passivo.

3.2. O caso resumido no ponto 2 do memorando, relativamente à obra efectuada ao cliente Mário…, é paradigmático da justeza da aplicação da avaliação indirecta a este contribuinte (documentação em anexo 6 do PET, no processo individual do contribuinte) Assim, ouvido esse cliente, seguindo a pista da informação colhida através da licença camarária, o mesmo assumiu em auto de declarações que a obra em causa “construção de uma varanda” foi executada pelo empreiteiro Sr. M... durante o prazo de validade da licença, apresentou à inspecção um orçamento de 350 000$, apresentou a declaração de estimativa orçamental assinada pelo técnico habitual deste empreiteiro (Eng. J…), em que a estimativa é de 350.000$, afirmou que pagou essa importância e que não lhe foi entregue qualquer quitação pelo empreiteiro. Como se vê no processo o contribuinte com referência a este caso também emitiu a factura só em 20 de Julho de 2001, não ficando a situação fiscal regularizada já que a factura terá de ser reportada a 1998, ano em que se efectuou a obra. Parece não ser preciso mais para credibilizar as declarações das estimativas orçamentais apresentadas e que serviram de valor de referência para as obras licenciadas pelas Câmaras, bem como a execução das obras dentro do prazo de validade das licenças!

3.3. Como decorre da Lei, quer do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, quer do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, a facturação e a sua inclusão nas declarações fiscais tem regras próprias em cada tributo, mas em qualquer caso a emissão daquela não pode exceder 5 dias após o fim da execução do serviço (art° 35° do CIVA).

3.4. Dentro deste quadro, o perito da Fazenda disponibilizou-se, como é sua obrigação, para apreciar quaisquer factos que pusessem em causa os dados do relatório de inspecção que influenciaram a quantificação da matéria tributável, incluindo a deslocação às obras licenciadas e em que foi invocado na petição do pedido de revisão que as mesmas não tinham sido efectuadas no todo ou em parte. E assim foi feito, em concordância com o perito do contribuinte, conforme se relatou no ponto 1 desta acta;

3.5. No memorando que se anexou à acta 59-A pedia-se que nos casos em que é afirmado que parte da obra foi feita por conta do dono da obra (apesar do empreiteiro no processo camarário de licenciamento se ter responsabilizado pela sua execução e declarado que as mesmas lhe foram. adjudicadas), que fossem trazidos elementos de prova para o processo, tais como facturas do material adquirido pelo dono da obra, facturas de execução de trabalhos especializados de canalizações, electricidade, madeiras, etc. e meios de pagamento utilizados. Nada disso foi feito pelo que terá de prevalecer como fazendo fé a declaração assinada pelo empreiteiro e entregue num organismo oficial que tutela as obras _Câmaras Municipais_ de que a obra foi de sua execução. E no caso constante do processo em que isso não sucedeu (caso como o nº 1, no memorando) o próprio empreiteiro comunicou à Câmara que deixou de ser o responsável pela obra;

3.6. No alínea c) do documento em apreciação (junto à acta nº 59-B) é referido que não houve entrega de declarações de substituição, à excepção da obra de “A…”, afirmando que Administração Fiscal procedeu a liquidação adicional de IVA conforme documento que se junta. Entenda-se que a liquidação adicional desse documento, de 635,97 euros de IVA, não se reporta ao caso citado mas sim ao registo de compra nº 22 de Janeiro de 2000, de 750 000$ de base tributável e 127 500$ de IVA, que foi considerado indevidamente deduzido por inexistência do documento em arquivo, conforme se pode verificar do relatório de exame à escrita.
3.7. Sobre as restantes alíneas desse documento já foram anteriormente feitas considerações que respondem às questões suscitadas.

4. Como resultado do debate e diligências efectuadas, o perito da Fazenda Nacional com vista a um acordo propôs ao Perito do Contribuinte a redução da base tributável fixada, com base nos seguintes motivos: considerar que o valor das prestações de serviços baseado nas estimativas orçamentais apresentadas nas Câmaras seja considerado com o IVA incluído e ajustar os casos em que se comprovou por verificação directa que as obras previstas nas licenças camarárias não foram total ou parcialmente realizadas, conforme se explana no ponto 2 da acta. Em consequência, no mapa em anexo 6 a esta acta reformulam-se os cálculos, constantes do mapa 8 do relatório do exame à escrita, chegando-se aos valores de proveitos omitidos conforme quadro que a seguir se apresenta.
Ano/exercícioProveitos omitidos/ mapa 8 do relatórioProveitos omitidos/ mapa refeito em anexo 6
19978.050,000$6.666.667$
199813.083.445$10.419.868$
199910.599.380$12.629.842$
20004.181.575$1.892.799$

No quadro seguinte comparam-se os valores de proveitos omitidos da proposta de acordo com os do relatório
ANOProveitos omitidos / mapa 8 do relatórioProveitos omitidos / mapa anexo 6 à acta
em escudosem eurosem escudosem euros
19978.050,0040.153,236.666,66733.253,19
199813.083,44565.259,9510.419,86851.974,08
199916.599,38082.797,3612.629,84262.997,39
20004.181,57520.857,611.892,7999.441,24
O resultado líquido da categoria C que resultaria da proposta surge seguinte, comparado com o valor declarado e o que foi objecto de fixação
resultado líquido da categoria C que resultaria da proposta
AnodeclaradoFixadoproposto
19973.764,8243.918,0537.018,01
199810.639,5075.899,4562.613,58
19992.500,2185.297,5765.497,60
200017.994,8138.852,4127.436,05
E os valores do IVA da proposta de acordo seriam os que constam do quadro seguinte
Proposta de acordo em sede de IVA
anovalores fixadosvalores propostos
19976.826,055.653,04
199811.094,198.835,59
199914.075,5510.709,56
20003.545,791.605,01

5. O perito do contribuinte não aceitou a proposta de acordo constante do ponto anterior, não tendo feito proposta alternativa.

6. Ambos os pontos vão apresentar e anexar laudos a esta acta, ficando o laudo do perito do contribuinte como anexo 7 e o laudo do perito da Fazenda nacional como anexo 8.

FACTOS NÃO PROVADOS.

As facturas não titulam serviços efectivamente prestados.

*
FUNDAMENTAÇÃO.
Os factos basearam-se nos documentos juntos aos autos como: o relatório de inspecção e anexos; demais documentos constantes dos autos e a acta n°59-C/LGT de 19/9/02, acompanhada dos respectivos laudos e bem assim o despacho do Sr. Director de 1/10/02, os documentos de fls.50 a 91, 252 a 283 do processo principal respeitante, em conjugação com a prova testemunhal produzida, pessoas a quem o impugnante prestou serviços, mencionadas no relatório da inspecção que por vicissitudes várias de cada uma delas, os serviços inicialmente contratados e/ou orçamentados, não foram integralmente realizados pelo impugnante; bem como nos trabalhadores que prestaram serviços na obra do Intermaché de Matosinhos e mostraram ter conhecimento directo dos factos a que foram inquiridos.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
O Impugnante foi sujeito a fiscalização externa relativa aos períodos de 1997., 1998, 1999 e 2000, com incidência em IVA e IRS que culminou com a liquidação adicional de Impostos relativos àqueles períodos com recurso a avaliação indireta (e correções aritméticas referentes a 2000).
Requerido procedimento de revisão da matéria tributável, foram realizadas quatro reuniões e uma visita aos locais das obras não tendo sido alcançado acordo entre os peritos.
Notificado que foi das liquidações, deduziu impugnação judicial contra as liquidações de IVA alegando entre o mais, o vício de falta de fundamentação da decisão do Exmo. Diretor de Finanças, falta e erro de facto quanto pressupostos para recurso à avaliação indireta, excesso de quantificação da matéria tributável e falta de justificação na aplicação do critério de quantificação.
A MMª juiz julgou procedente a impugnação por procedência do vício de falta de fundamentação do despacho do Exmo. Diretor de Finanças.
O Exmo. Representante da Fazenda Pública não se conforma. Sustenta que o despacho está fundamentado. O despacho é exaustivo, individualizando os factos apurados e descritos no relatório que levaram à conclusão de que o apuramento da matéria colectável não era susceptível de ser feito de forma direta.
O Despacho remete expressamente para o conteúdo do relatório da inspeção.
A sentença não explica o porquê de ter sido entendido ser o relatório “também ele insuficiente quanto ao modo de eleger factos contributivos para justificar a aplicação do método indirecto (…)”, apesar do mesmo elencar e demonstrar vários factos.
Quanto à quantificação, é incompreensível a crítica da douta sentença quanto ao facto do perito da Fazenda Nacional ter reduzido os valores de acordo com o estado de acabamento das obras e não ter aceite, por falta de prova, os valores indicados pelo impugnante em virtude das obras não terem sido alegadamente feitas por si na totalidade, sendo certo que não existe qualquer contradição.

Este TCA pronunciou-se no acórdão n.º 81/03 proferido em 28/9/2017 sobre idêntica questão relativa a IRS, sendo o relatório o mesmo e bem assim o despacho do Exmo. Diretor de Finanças que encerrou o procedimento de revisão da matéria tributável, e no qual o interveio como primeiro adjunto o relator deste processo 80/2003.

Por semelhança ao caso sub judice (a diferença nas conclusões 22ª e segs. e o facto de o imposto ser diferente não altera a identidade da substancial da questão), aderindo integralmente ao seu discurso fundamentador e perfilhando a decisão ali adoptada, transcrevemos com a devida vénia o douto acórdão.

“A sentença recorrida, analisou a fundamentação da decisão do Diretor de Finanças e considerou que o despacho padecia de falta de fundamentação quer pela insuficiência intrínseca quer ainda por contraditoriedade.
Em sede de recurso, importa começar por analisar o erro de julgamento da sentença recorrida ao considerar não fundamentado o despacho do Diretor de Finanças, em sede procedimento de revisão, que sustentou a liquidação uma vez que este precede o conhecimento do erro de julgamento quanto aos critérios e quantificação da matéria coletável.
O ato de fixação dos valores que serviram de base às liquidações impugnadas teve por base a decisão do Sr. Diretor de Finanças proferida nos termos do n.º 6 do art.º 92.º da Lei Geral Tributária e consubstanciada no despacho n.º 25/02, proferido em 01.10.2002, cujo conteúdo se encontra transcrito no ponto 3 da matéria de facto.
Vejamos:
A fundamentação dos atos administrativos está consagrada no nº 3 do art.º 268.º, da CRP, que preceitua que: [o]s actos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos”.
Por sua vez o nº 1 do art.º 124.º do CPA estabelece que “[P] ara além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os actos administrativos que, total ou parcialmente:
a) Neguem, extingam, restrinjam ou afectem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
b)(…)”
Relativamente aos atos tributários preceitua o art.º 77.º da LGT que “1 - A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.
2 - A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo.”.
Da conjugação do n.º 3 do art.º 268 da CRP, n. 1 do art.º 124.º do CPA e art.º 77.º da LGT resulta que a fundamentação do ato tributário há de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão, clara/acessível, permitindo que, através dos seus termos, se compreendam os factos e o direito com base nos quais se decide, suficiente, possibilitando ao contribuinte um conhecimento concreto da motivação do acto; e congruente, de modo que a decisão constitua a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação.
Sendo essencial que dê a conhecer ao seu destinatário todo o percurso cognitivo e valorativo dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido.
As exigências de fundamentação variam de acordo com o tipo de ato e as circunstâncias concretas em que este foi proferido bastando-se, com a expressão clara das razões que levaram a determinada decisão, não tendo de reportar, a todos os factos considerados, vicissitudes ocorridas e a todas as ponderações feitas durante o procedimento que conduziu à decisão.
A fundamentação pressupõe, portanto, a busca de um conteúdo adequado, que há de ser, suficiente para sustentar formalmente a decisão administrativa.
Trata-se de permitir ao destinatário normal a reconstituição do itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão.
Baixando ao caso em recurso, está em questão o despacho proferido pelo Sr. Diretor de Finanças de 01.10.2002, na ata n.º 059-C/LGT no âmbito do processo de revisão nos termos do art.º 92.º do LGT, que se encontra transcrito na primeira parte do facto 3 da matéria provada.
Refira-se que as liquidações impugnadas assentam no ato emanado no procedimento de revisão, mais precisamente, na decisão do Diretor de Finanças. A fundamentação adotada pela Administração Fiscal, e os motivos pelos quais considerou legalmente justificado o recurso ao método indireto, ficaram explanados nesse despacho.
Como facilmente se percebe da leitura do mesmo, a fundamentação formal não permite aquilatar da validade substancial da fundamentação em matéria de quantificação do método indireto.
O Recorrido no pedido de revisão questiona os pressupostos de direito, que autorizam a administração ao recurso a métodos indiretos, erro nos pressupostos de facto, na medida em Administração não prova os pressupostos legais da sua atuação, erro nos pressupostos de facto na medida em que valorou mal os factos e excesso na quantificação operada bem como no critério utilizado.
Conforme preceitua o n.º 1 do art.º. 77.º, da LGT a decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.
Por sua vez, o n.º 6 do art.º 92.º da LGT preceitua que “Na falta de acordo no prazo estabelecido no n.º 2, o órgão competente para a fixação da matéria tributável, resolverá, de acordo com o seu prudente juízo, tendo em conta as posições de ambos os peritos.”
Tendo o procedimento de revisão culminado com uma decisão, a qual é o ato definitivo da Administração Fiscal, perante o sujeito passivo, e no qual assentaram as liquidações de IRS de 1997 e 1998, este deveria cumprir as exigências previstas no n.º4 do art.º 77.º da LGT e art.º 123.º do CPA.
No que concerne aos pressupostos do recurso aos métodos indiretos a sentença recorrida sustenta a sua decisão referindo queRegressando, agora, ao acto em questão, verifica-se que o despacho não concretiza os factos apurados em sede de procedimento tributário (desde a inspecção até aos contributos dados pelos peritos) que dão corpo ou forma ao modo pelo qual se chegou ao apuramento da matéria tributável.
O conteúdo do despacho impugnado não é bastante para explicar as razões pelas quais chegou àquele resultado ou decisão, o que significa que a sua fundamentação é insuficiente.
O teor da exposição feita no despacho é genérica e ambivalente, permitindo as mais diversas considerações sem contudo situar o que efectivamente é erigido como facto fundamentante da conclusão a que chega:
O despacho impugnado analisado com a minúcia necessária permite concluir que ele é vazio de conteúdo factual, qual é o recorte da actividade da impugnante que permite concluir a necessidade de recurso ao método indiciário?
Mas é assim porque o relatório onde assenta o despacho é ele também insuficiente quanto ao modo de eleger factos contributivos para justificar a aplicação do método indirecto de determinação da matéria colectável: elege dois exemplos para concluir pela total facturação falsa (A… e Sr. Mário…) e que uma factura foi emitida (112) em 20/7/01, muito depois da conclusão da obra. Estabelece um nexo de causalidade necessária entre as matérias-primas adquiridas e obras realizadas.
Elege como factor de impossibilidade de comprovação da matéria tributável: facturas emitidas sem obedecer aos requisitos do art. 35º do CIVA; regularidade das aquisições de matérias-primas, os licenciamentos das obras, a localização e periodicidade dos trabalhos que executou, indiciam que os valores constantes das facturas não correspondem a qualquer prestação de serviços efectiva, nomeadamente a obra em Matosinhos na construção do Intermaché; concluindo, ainda, que a facturação não enquadra na dimensão da actividade.
Ora se as facturas são fictícias há que fazer a operação aritmética de retirar o seu valor como rendimento, custo respectivo e cobrar o IVA deduzido.
Não é esta uma razão só por si para justificar a aplicação do método indiciário. (…).”
Nesta parte, a sentença recorrida não nos merece reparo. Como se depreende da leitura do despacho em causa, carece de fundamentação, pois não são explicados, os motivos e as irregularidades e omissões na escrituração do Recorrido, que motivaram o recurso aos métodos indiretos na determinação da matéria tributável.
O despacho refere vaga e genericamente que: “Pela existência, na contabilidade do contribuinte, de aquisições de matérias-primas que não encontraram correspondência na facturação de serviços a clientes; pela execução de obras a clientes, correspondentes a licenciamentos camarários, que não foram facturadas, e consequentemente, omitidas aos registos da escrituração; pela incongruência, não justificada, entre os valores facturados e as estimativas do custo da obra declaradas nas licenças das mesmas. Destas situações, se extrai que a contabilidade do sujeito passivo inspeccionado não releva todos os factos quantitativos que alteram os seus resultados dos exercícios e património necessários a uma revelação da “ exacta situação patrimonial, bem como os resultados efectivamente obtidos pelo sujeito passivo
E mais à frente aponta “(...) Para além das irregularidades dos preceitos acima referidos, o mesmo não é cumprido no que concerne às disposições relativas às facturas emitidas, estabelecidas no art. 35° do C.I.V.A, nomeadamente, a quantidade e denominação usual dos bens ou serviços prestados, e a emissão de facturas dentro do prazo estabelecido no n°1 deste artigo. Tais factos, apurados e comprovados no relatório que, nos termos do nº 1, do art. 76°, da LGT “fazem fé, quando fundamentados e se basearem em critérios objectivos - o que é a situação presente, não foram afastados, objectiva e concretamente, ao longo do procedimento, pelo sujeito passivo e seu perito.(…)”
Assim, são referidas, genericamente, aquisições de matérias-primas que não encontraram correspondência na faturação de serviços a clientes; execução de obras a clientes, que não foram faturadas, incongruência, não justificada, entre os valores faturados e as estimativas do custo da obra declaradas nas licenças das mesmas junto da Câmara Municipal.
E que além dessas irregularidades, não é cumprido as disposições relativas às faturas emitidas, estabelecidas no art.º 35° do CIVA.
Concluindo que “não foram afastados objectiva concretamente, ao longo do procedimento, pelo sujeito passivo quer pelo perito.”
Pese embora aparente uma fundamentação a mesma não refere concretamente a motivação que opõe o Diretor de Finanças aos argumentos apresentados pelo Recorrido, em sede de revisão.
No que concerne à quantificação a sentença recorrida refere queO critério de quantificação utilizado no relatório foi o das obras licenciadas, mas não dá qualquer explicação para a utilização desta forma de quantificação, sendo certo que o que está na base deste elemento é uma estimativa de gastos ou custos para o dono da obra; elaborada por critérios aleatórios à própria obra, como explicou a Engenheira Técnica, Al…, na inquirição de testemunhas, é um elemento que em si encerra muita relatividade.
Ora o despacho do Sr. Director adere, às conclusões expressas no relatório mas por outro lado já adere à quantificação da matéria tributável do perito da Fazenda no procedimento de revisão.
A quantificação do Sr. Perito também não é explicitada, não obstante o trabalho de observação no local, que deveria ter sido levada a efeito no âmbito da inspecção, não só porque elege mais uma vez o critério do orçamento camarário partindo do pressuposto, não explicado, de que já inclui IVA; reduz alguns valores tendo em consideração o estado de acabamento da obra; por outro lado, não se aceitam valores indicados pelo impugnante porque os donos da obra não provam os gastos feitos por sua conta.
Porque se presumem proveitos e já não os custos inerentes a eles, sabido que a lei impõe que os rendimentos presumidos se aproximem, neste método, o mais possível ao rendimento real ou efectivo do contribuinte?
Que razões levaram à utilização do critério definido no despacho impugnado? Porquê este e não outros?
Não há dúvida que o despacho de fixação da matéria tributável padece de falta de fundamentação quer pela sua insuficiência intrínseca quer ainda por contraditoriedade.(…)”
Refere o Sr. Diretor de Finanças, no seu despacho que “ Viria, contudo, a provar, em parte, haver excesso no valor calculado pela inspecção tributária, que foi ponderada e acolhida pelo perito da fazenda em face de factos provados (obras não realizadas na totalidade pelo sujeito passivo), propondo outro montante, que, também, não foi aceite pelo seu perito. Pela legalidade do uso do critério operada na quantificação, porquanto se fundamenta nos corpos do art.s 52° do CIRC e do 90° da LGT, ao permitir liberdade na adopção do critério a operar na composição da matéria tributável, desde que adequados e fundamentados a mostrar a real capacidade contributiva do sujeito passivo, - o que é o caso presente -, através da estimativa do valor da obra, efectuada 6 por técnicos de construção civil. Por fim: justifica-se, deste modo, a nossa aderência às conclusões expressas no relatório dos serviços de inspecção, considerando, porém, a quantificação da matéria tributável proposta pelo perito da Fazenda, cujos cálculos e fundamentos aqui damos por reproduzidos, por se apresentarem adequados. Nestes termos, e tendo em conta todos os elementos referenciados, determino que o conjunto dos rendimentos líquidos sujeitos a I.R.S., sejam de 40.245,47 € Quarenta mil duzentos e quarenta e cinco Euros e quarenta e sete cêntimos), para o ano de 1997, de 64.399,49 € (Sessenta e quatro mil trezentos e noventa e nove Euros e quarenta e nove cêntimos), para o ano de 1998, de 66.747,99€ (Sessenta e seis mil setecentos e quarenta e sete Euros e noventa e nove cêntimos), para o ano de 1999, e de 3l.301,73 € (Trinta e um mil trezentos e um Euros e setenta e três cêntimos), para o ano de 2000, e os valores de IVA, que se consideram em falta, de 5.653,04 € (Cinco mil seiscentos e cinquenta e três Euros e quatro cêntimos), em 1997, de 8.83559 € (Oito mil oitocentos e trinta e cinco Euros e cinquenta e nove cêntimos), em 1998, de 10709,56€ (Dez mil setecentos e nove Euros e cinquenta e seis cêntimos), em 1999, e de 1.605,01 € (Mil seiscentos e cinco Euros e um cêntimo) em 2000.
Do confronto da fundamentação para que remeteu o despacho do Sr. Diretor de Finanças, (parecer do perito das Finanças, constante na segunda parte do facto provado n.º 3 com o título “A fundamentação da quantificação e cálculos da matéria tributável do perito da Fazenda pública é o seguinte:) são elencadas as diligências efetuadas (visitas às obras realizadas do sujeito passivo) onde é referido o estado das obras e a posição do perito relativamente a esse facto aceitando ou não o argumento expendido pelo sujeito passivo.
E termina o despacho referindo que “Como resultado do debate e diligências efetuadas, o perito da Fazenda Nacional com vista a um acordo propôs ao Perito do Contribuinte a redução da base tributável fixada, com base nos seguintes motivos: considerar que o valor das prestações de serviços baseado nas estimativas orçamentais apresentadas nas Câmaras seja considerado com o IVA incluído e ajustar os casos em que se comprovou por verificação direta que as obras previstas nas licenças camarárias não foram total ou parcialmente realizadas, conforme se explana no ponto 2 da acta. Em consequência, no mapa em anexo 6 a esta acta reformulam-se os cálculos, constantes do mapa 8 do relatório do exame à escrita, chegando-se aos valores de proveitos omitidos conforme quadro que a seguir se apresenta.
Ano/exercícioProveitos omitidos/ mapa 8 do relatórioProveitos omitidos/ mapa refeito em anexo 6
19978.050,000$6.666.667$
199813.083.445$10.419.868$
199910.599.380$12.629.842$
20004.181.575$1.892.799$

No quadro seguinte comparam-se os valores de proveitos omitidos da proposta de acordo com os do relatório
ANOProveitos omitidos / mapa 8 do relatórioProveitos omitidos / mapa anexo 6 à acta
em escudosem eurosem escudosem euros
19978.050,0040.153,236.666,66733.253,19
199813.083,44565.259,9510.419,86851.974,08
199916.599,38082.797,3612.629,84262.997,39
20004.181,57520.857,611.892,7999.441,24
O resultado líquido da categoria C que resultaria da proposta surge seguinte, comparado com o valor declarado e o que foi objecto de fixação
resultado líquido da categoria C que resultaria da proposta
AnodeclaradoFixadoproposto
19973.764,8243.918,0537.018,01
199810.639,5075.899,4562.613,58
19992.500,2185.297,5765.497,60
200017.994,8138.852,4127.436,05
E os valores do IVA da proposta de acordo seriam os que constam do quadro seguinte
Proposta de acordo em sede de IVA
anovalores fixadosvalores propostos
19976.826,055.653,04
199811.094,198.835,59
199914.075,5510.709,56
20003.545,791.605,01
5. O perito do contribuinte não aceitou a proposta de acordo constante do ponto anterior, não tendo feito proposta alternativa.

6. Ambos os pontos vão apresentar e anexar laudos a esta acta, ficando o laudo do perito do contribuinte como anexo 7 e o laudo do perito da Fazenda nacional como anexo 8.

A sentença recorrida não nos merece qualquer reparo pois, pese embora se verifique um esforço de fundamentação não é suscetível de dar a conhecer ao seu destinatário o percurso cognitivo e valorativo dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido, ou seja, as razões pela quais foram alterados os valores fixados no relatórios de inspeção e fixados novos valores.
O despacho impugnado não deu a conhecer em concreto, nem mesmo por remissão para o relatório ou ata do perito, os motivos pelos quais alterou a matéria coletável. A“(…) decisão em apreço é um exemplo daquilo que uma fundamentação mais exigente não pode ser, pois que, limita-se a constatar a posição dos peritos, não procedendo a qualquer discussão da realidade em apreço no sentido de justificar a manutenção dos valores em causa, não existindo qualquer remissão para o RIT, nem sequer qualquer referência a este elemento, o que significa que a AT não deu a conhecer à Recorrente os elementos que enquadram a sua decisão nesta sede, impedindo assim a Recorrente de aceitar tal decisão, conformando-se com a mesma, ou de contra a mesma reagir, discutindo o seu alcance.” Cfr acórdão deste TCAN n.º 1206/07.7 BEVIS. do TCA Norte de 07.12.2016, e ainda acórdão 205/05.3BEVIS de 02.03.2017, ao que sabe ainda inéditos.
Daí que se conclua que está inquinado de vício de forma, por insuficiência de fundamentação, o despacho do diretor de Finanças, proferido nos termos do n.º 6 do art. 92.º do LGT, que não esclarece os motivos do recurso aos métodos indiretos nem mesmo as razões porque, em face dos argumentos apresentados pela Recorrida, se optou pela alteração dos valores fixados no relatório de inspeção e se fixou outros valores, e os fundamentos em que sustentou essa alteração.
Assim padecendo a decisão de fixação da matéria tributável de falta de fundamentação, ocorre vício que inquina a legalidade desse ato e de todos os atos consequentes.
Destarte, o despacho padece de falta de fundamentação factual, por conseguinte a sentença recorrida não incorreu em erro de julgamento improcedendo assim o recurso.

4.2. A Recorrida pugna pela improcedência do recurso e em ampliação de recurso subsidiariamente pede a revogação da liquidação, na medida em que a mesma estava eivada de vicio de lei, nomeadamente por falta de pressupostos para recurso a métodos indiretos e que o ato de liquidação padece de excesso de quantificação, no entanto, e perante a procedência do recurso, ficam prejudicadas as demais questões equacionadas nos termos do art.º. 608.º do CPC.”

Como referimos, este acórdão foi proferido num recurso em que estavam em causa liquidações adicionais de IRS, mas o seu conteúdo é transponível para os presentes autos, considerando a identidade das questões subjacentes, levando à total improcedência do recurso, inutilizando a apreciação das restantes questões.


V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCAN em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Sem custas, considerando a data da entrada do processo.
Porto, 7 de junho de 2018.
Ass. Mário Rebelo
Ass. Ana Paula Santos
Ass. Bárbara Tavares Teles