Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:100/23.9 BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:10/04/2023
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:CITAÇÃO
PRESCRIÇÃO
Sumário:I - De acordo com o nº 2 do artigo 192º do CPPT, no caso de a citação pessoal ser efetuada mediante carta registada com aviso de receção (como aconteceu, no caso) e este vier devolvido ou não vier assinado o respetivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal (o que corresponde ao circunstancialismo de facto em análise), então há que convocar a 2ª parte do mencionado nº 2, repetindo-se a citação, através do envio de nova carta registada com aviso de receção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte.

II - A cominação em causa refere-se ao disposto no nº3 do artigo 192º do CPPT, ou seja, a advertência relativa a considerar-se a citação efetuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados.

III - A jurisprudência “reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art. 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art. 327.º do CC)”.

Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO


A........, com os demais sinais nos autos, invocando o disposto nos artigos 276º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), vem reclamar judicialmente da decisão do Chefe de Finanças de Pombal, datado 15/12/2022, nos termos da qual foi indeferido o pedido de que não reconheceu a prescrição das dívidas em cobrança nos processos executivos nºs …….59 e apensos (…….37, …..51, …….70, ……46, …43, …..43, ……51, -…..10, .......29, ........67, ........75, ........83, ........91, ........05, ........13, ........21, ........30, .......48, .......56, .......64, .......72 .......80, .......99, .......02,.......10,.......29, ........37, ........45, ........53, ........61, ........70, ........88, ........58, ........66, ........56, ........59, ........64, ........10, ........34, ........58, ........97, ........86, ........29, ........63, ........71, ........88, ........98 e ........87), instaurados contra a devedora originária, sociedade S......., LDA (em liquidação).

O Tribunal Tributário Administrativo (TAF) de Leiria, por sentença de 29/05/2023, julgou a presente reclamação judicial parcialmente procedente, declarando prescritas as dívidas subjacentes aos processos de execução nºs ........43, ........51, ........87, ........58, ........63, ........71, ........88, ........58, ........66, ........56, ........46 e ........98 e não prescritas nos processos nºs ........37, ........70, ........43, ........51, ........10, .......29, ........67, ........75, ........83, ........91, ........05, ........13, ........21, ........30, .......48, .......56, .......64, .......72 .......80, .......99, .......02,.......10,.......29, ........37, ........45, ........53, ........61, ........70, ........88, ........59, ........64, ........10, ........34, ........97, ........86 e ........29.

Inconformada com a decisão, na parte em que mesma lhe foi desfavorável, apelou o reclamante para Tribunal Central Administrativo Sul (TCA Sul), tendo na sua alegação formulado as seguintes conclusões:

«A) Vem o presente recurso interposto da douta Sentença proferida, nos presentes autos de Reclamação de acto do órgão de execução fiscal, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, em 29-05-2019, a qual incorre em erro de julgamento ao decidir julgar: “parcialmente procedente a presente reclamação e, nessa medida, – declarando prescritas as dívidas exigidas nos PEF ........43, ........51, ........87, ........58, ........63, ........71, ........88, ........58, ........66, ........56, ........46 e ........98; – mantendo o despacho reclamado, no mais.”

B) Com base nos fundamentos de factos direito alegados, não pode o Recorrente conformar-se com tal decisão que, suportando-se nos acima transcritos factos que deu como provados, entendeu que logrou a Reclamada, ora Recorrida, provar a citação nos identificados PEF em questão, e assim não declara a prescrição das dívidas em cobrança coerciva nos PEF ........51, ........37, ........74, ........43, ........59 e ........59 [e apensos], nos quais figura o Recorrente como executado por reversão.

C) Com efeito, o Recorrente deduziu Reclamação Judicial contra o despacho reclamado do Chede do Serviço de Finanças de Pombal de 15-12-2022, que indeferiu o pedido de prescrição das dívidas por prescrição, por laborar este em erro ao considerar aplicáveis às dívidas em apreciação várias causas de suspensão ali elencadas, nomeadamente as citações (presumidas) que refere em cada um dos processos de execução fiscal (PEF) como facto interruptivo da prescrição.

D) Reitera o Recorrente que, não tendo sido citado pessoalmente e repudiando a presunção de citação, se encontra verificada a falta de citação - nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 188.º do CPC – o que impede que ocorra qualquer interrupção do prazo prescricional, pelo que todas as dívidas em cobrança coerciva se encontram extintas, por prescrição.

Vejamos.

E) Conforme dispõem os artigos 191.º, n.º 3, b) e 192.º n.º 1 do CPPT, na efetivação da responsabilidade solidária e subsidiaria, a citação é pessoal, sendo efetuada nos termos do Código de Processo Civil, mediante “b) Entrega ao citando de carta registada com aviso de receção, seu depósito, nos termos do n.º 5 do artigo 229.º, ou certificação da recusa de recebimento, nos termos do n.º 3 do mesmo artigo; c) Contacto pessoal do agente de execução ou do funcionário judicial com o citando.” (cf. artigo 225.º n.º 2 do CPC).

F) Tratando-se de citação de pessoa singular por via postal, esta “faz-se por meio de carta registada com aviso de receção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho”, sendo que “Não sendo possível a entrega da carta, será deixado aviso ao destinatário, identificando-se o tribunal de onde provém e o processo a que respeita, averbando-se os motivos da impossibilidade de entrega e permanecendo a carta durante oito dias à sua disposição em estabelecimento postal devidamente identificado.” (cf. dispõe o artigo 228.º n.º 1 e 5 do CPC).

G) In casu e no âmbito dos PEF em questão, resultando do probatório que a “citação em reversão” do Recorrente, enquanto responsável subsidiário, foi efetuada por registado postal (“enviada ao Reclamante, para a Rua da R........ citação em reversão”) que foi devolvido por não ter sido reclamado, sem a assinatura do destinatário, tendo sido repetida a citação e “enviada ao Reclamante” nova carta com a menção “Citação postal 2ª tentativa” e no verso que foi depositada no recetáculo postal da morada por impossibilidade de entrega (cf. pontos 2) a 13) do probatório), verifica-se que não se mostram cumpridas as regras das citações pessoais que constam das normas legais acima referidas, pelo que não logram obter o desiderato que a Autoridade Tributária pretende almejar, ou seja, presumir “que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados” (cf. n.º 3 do artigo 192.º do CPPT), i.e., que a citação entrou na esfera de cognoscibilidade do Recorrente.

H) Ora, do probatório não conta que a morada para o qual foram remetidos os dois registos postais corresponda à sua residência ou local de trabalho (cf. n.º 1 do artigo 228.º do CPC), sequer ao seu domicílio fiscal (cf. artigo 192.º n.º 3 do CPPT).

I) Não obstante, ignorando todas as disposições legais ínsitas nos vários números do artigo 228.º do CPC (ex vi n.º 1 do artigo 192.º do CPPT) sobre como deve ser efetuada a citação pessoal de pessoa singular por via postal, presumiu o OEF que o Recorrente, se encontra citado, e que não teve conhecimento dos actos de citação por motivo que lhe é imputável (cf. artigos 190.º n.º 6 do CPPT e 188.º n.º 1 al. a) do CPC).

J) Aqui chegados, para a boa decisão da causa e aplicação do Direito, cumpre colocar a seguinte questão: “Mas haverá citação presumida se a carta não for recebida ou levantada pelo facto do citando ter mudado de residência habitual, sem que tal alteração tenha sido comunicada à administração tributária?”, obtendo a resposta seguindo toda a fundamentação colhida no Acórdão de 07/12/2012 do Supremo Tribunal Administrativo, proc. n.º 0116/12, disponível em www.dgsi.pt, que aqui pela sua pertinência se perfilha e segue, e em cujo sumário se pode ler:
“(...) II - A presunção de presença no domicílio fiscal em que se funda a cominação da inoponibilidade à administração fiscal da alteração do domicílio prevista no nº 2 do artigo 43º do CPPT, não é incindível da presunção de conhecimento do acto de citação.
III - Sendo devolvida a carta registada com aviso de recepção para citação do executado por reversão, com a indicação de “não reclamada”, o órgão de execução deve efectuar as diligências adequadas é efectivação regular da citação pessoal, não podendo presumir que a citação foi efectuada.
IV - A falta de citação prevista no nº 6 do art. 190º do CPPT pressupõe a que a citação se tenha concretizado, embora o seu destinatário, por razões que não são imputáveis, desconheça o conteúdo do acto de citação.” (destaque nosso).

K) Em suma, nos termos da lei, NEM pela falta de recebimento da comunicação por ausência temporária do interessado do seu domicílio se pode dar a presunção de conhecimento – (ao contrário do que ocorre nas situações de citação na pessoa de um terceiro (cf. artigos 225.º n.º 4 e 230.º n.º 1 do CPC) e nas situações de domicílio convencionado em contrato reduzido a escrito, o que não é o caso do domicílio fiscal (cf. artigos 229.º n.º 5 e 230.º n.º 2 do CPC) –, NEM a “inoponibilidade” da alteração do domicílio fiscal, verificada que sejam os respetivos requisitos, consubstancia uma presunção de comunicação.

L) Caso a inoponibilidade da alteração do domicílio conduzisse a uma situação de dispensa de citação pessoal ou constituísse uma presunção inilidível de citação, pondo em causa o princípio fundamental do contraditório, estaríamos perante uma norma inconstitucional.

M) Ora, no caso dos autos, sendo obrigatória a citação por via postal através de carta com aviso de receção e sendo a mesma frustrada, perante a inexistência de presunção do conhecimento do acto de citação, teria o órgão de execução de ter cumprido as diligências que a lei prescreve (artigo 228.º do CPC), ou seja, deveriam ter sido efetuadas diligências para encontrar o Recorrente, seja através do contacto pessoal do funcionário dos serviços (cf. artigos 231.º do CPC e 194.º do CPPT) ou, caso o paradeiro do citando seja incerto, da citação edital (cf. artigo 236.º do CPC e 192.º n.º 2 do CPPT) – (nesse sentido, o acórdão do STA de 27/1/2010, proc. n.º 1199/09).

N) Em conclusão, há falta de citação, porque frustrada que foi a expedição da carta registada com aviso de receção e porque se impunha tentar outras modalidades de citação, até à citação edital, se fosse caso disso.

O) Mais se diga que, não havendo uma citação efetiva e concretizada, mas apenas uma tentativa frustrada de citação, não se pode, por isso, presumir que o citando/Recorrente teria conhecimento do acto citando, por conseguinte, não interessará saber se o desconhecimento desse acto ocorreu por motivo que lhe foi ou não imputável, atenta a regra do n.º 6 do artigo 190.º do CPPT e do artigo 188.º, n.º 1, alínea e) do CPC (neste sentido, secundando Jorge de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Vol. III, 6.ª pág. 365).

P) Labora, por conseguinte, em erro a douta sentença recorrida que, invocando/remetendo para os n.ºs 2 e 3 do artigo 192.º do CPPT, dá cobertura ao despacho recorrido na presunção – errada – da citação do Recorrente.

Q) Face ao exposto, nos termos das disposições supramencionadas, dúvidas não restam que falece razão à douta sentença recorrida, que laborou em erro de julgamento ao julgar extintas, por prescrição, as dívidas exequendas nos PEF ........51, ........37, ........74, ........43, ........59 e ........59 (e apensos), pelo que deve a mesma ser revogada, concedendo-se ao presente recurso provimento.

Nestes termos e nos demais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso e revogada a sentença recorrida, com as devidas e legais consequências.
Assim decidindo, Vossas Excelências, com douto suprimento, hão-de julgar com a habitual prudência, legalidade e JUSTIÇA.»


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Não há registo de contra-alegações.

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Neste TCA, o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

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Com dispensa dos vistos legais, atento o carácter urgente dos autos, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO


- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«1. Pelo registo postal RQ….914PT foi enviada ao Reclamante, para Rua da M……., “citação em reversão” referente ao processo ........43, devolvido ao remetente em 21 de Agosto de 2014, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. citação, envelope, a págs. 223 e 224 do suporte digital dos autos;

2. Pelo registo postal RQ…557PT foi enviada ao Reclamante, para Rua da M….., “citação em reversão” referente ao processo ........51, devolvido ao remetente em 21 de Agosto de 2014, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. citação, envelope, a págs. 269 e 270 do suporte digital dos autos;

3. No dia 25 de Agosto de 2014 foi elaborada nova citação [“citação postal 2ª tentativa”] no processo ........51, enviada ao Reclamante pelo registo postal RQ…788PT, tendo sido aposta, no respectivo aviso, a menção “No dia 2-9-2014 às 10:00, Na impossibilidade de Entrega depositei no Receptáculo Postal Domiciliário da morada indicada a CITAÇÃO a ela referente” – cfr. citação e aviso, a págs. 271 e 272 do suporte digital dos autos;

4. Pelo registo postal RQ…003PT foi enviada ao Reclamante, para Rua da M……, “citação em reversão” referente ao processo ........37, devolvido ao remetente em 02 de Setembro de 2014, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. citação, envelope, a págs. 163 e 164 do suporte digital dos autos;

5. No dia 05 de Setembro de 2014 foi elaborada nova citação [“citação postal 2ª tentativa”] no processo ........37, enviada ao Reclamante pelo registo postal RQ…625PT, tendo sido aposta, no respectivo aviso, a menção “No dia 11-9-2014 às 10:00, Na impossibilidade de Entrega depositei no Receptáculo Postal Domiciliário da morada indicada a CITAÇÃO a ela referente” – cfr. citação e aviso, a págs. 165 e 166 do suporte digital dos autos;

6. Pelo registo postal RQ…966PT foi enviada ao Reclamante, para Rua da M........, “citação em reversão” referente ao processo ........74, devolvido ao remetente em 02 de Setembro de 2014, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. citação, envelope, a págs. 181 e 182 do suporte digital dos autos;

7. No dia 05 de Setembro de 2014 foi elaborada nova citação [“citação postal 2ª tentativa”] no processo ........74, enviada ao Reclamante pelo registo postal RQ…585PT, tendo sido aposta, no respectivo aviso, a menção “No dia 11-9-2014 às 10:00, Na impossibilidade de Entrega depositei no Receptáculo Postal Domiciliário da morada indicada a CITAÇÃO a ela referente” – cfr. citação e aviso, a págs. 183 e 184 do suporte digital dos autos;

8. Pelo registo postal RQ…911PT foi enviada ao Reclamante, para Rua da M........, “citação em reversão” referente ao processo ........43, devolvido ao remetente em 16 de Outubro de 2014, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. citação, envelope, a págs. 245 e 246 do suporte digital dos autos;

9. No dia 20 de Outubro de 2014 foi elaborada nova citação [“citação postal 2ª tentativa”] no processo ........43, enviada ao Reclamante pelo registo postal RQ…057PT, tendo sido aposta, no respectivo aviso, a menção “No dia 3-11-2014 às 10:00, Na impossibilidade de Entrega depositei no Receptáculo Postal Domiciliário da morada indicada a CITAÇÃO a ela referente” – cfr. citação e aviso, a págs. 247 e 248 do suporte digital dos autos;

10. Pelo registo postal RQ…805PT foi enviada ao Reclamante, para Rua da M........, “citação em reversão” referente ao processo ........59, devolvido ao remetente em 12 de Novembro de 2015, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. citação, envelope, a págs. 401 a 402 do suporte digital dos autos;

11. Foi elaborada nova citação [“citação postal 2ª tentativa”] no processo …….59, enviada ao Reclamante pelo registo postal RQ…807PT, tendo sido aposta, no respectivo aviso, a menção “No dia 2-3-2016 às 11:00, Na impossibilidade de Entrega depositei no Receptáculo Postal Domiciliário da morada indicada a CITAÇÃO a ela referente” – cfr. citação e aviso, a págs. 403 e 404 do suporte digital dos autos;

12. Pelo registo postal RF156927028PT foi enviada ao Reclamante, para Rua da M........, “citação (reversão)” referente ao processo ……….59 e apensos [........67, ........75, ........83, ........91, ........05, ........13, ........21, ........30, .......48, ………56, …….64, …..72, .......80, .......99, ........02, ........10, .......29, ........37, ........45, ........53, ........61, ........70 e ........88], devolvido ao remetente em 12 de Julho de 2016, com a menção de “objecto não reclamado” – cfr. citação, envelope, a págs. 298 a 304 do suporte digital dos autos;

13. Foi elaborada nova citação [“citação 2ª (reversão)”, ofício 1714-JT] no processo ........59 e apensos, enviada ao Reclamante pelo registo postal RF…592PT, tendo sido aposta, no respectivo aviso, a menção “No dia 15-07-2016 às 11:05, Na impossibilidade de Entrega depositei no Receptáculo Postal Domiciliário da morada indicada a CITAÇÃO a ela referente” – cfr. citação e aviso, a págs. 306 a 313 do suporte digital dos autos;

14. Consta do ofício 1714-JT a seguinte referência: “2ª Tentativa de Citação - repetida nos termos do art.° 192° n.° 2 e 3 do CPPT, por ter sido devolvida sem AR assinado: não foi reclamado o seu levantamento junto dos CTT no prazo legal e não foi comunicada nova morada. Advertência: A citação considera-se efetuada na data certificada pelo distribuidor ou, se for deixado aviso, no 8o dia posterior. Presume-se que o citando teve conhecimento dos elementos deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação de novo endereço” – cfr. ofício, a págs. 306 do suporte digital dos autos;

15. No dia 09 de Maio de 2022, o Reclamante apresentou, por intermédio da sua mandatária, requerimento de “EXTINÇÃO DOS PROCESSOS DE EXECUÇÃO FISCAL, POR PRESCRIÇÃO”, referente aos processos ........37, ........51, ........70, ........46, ........43, ........43, ........51, ........10, .......29, ........59, ........67, ........75, ........83, ........91, ........05, ........13, ........21, ........30, ........48, .......56, .......64, .......72 .......80, .......99, .......02,.......10,.......29, ........37, ........45, ........53, ........61, ........70, ........88, ........58, ........66, ........56, ........59, ........64, ........10, ........34, ........58, ........97, ........86, ........29, ........63, ........71, ........88, ........98 e ........87 – cfr. requerimento, a págs. 21 a 26 do suporte digital dos autos;

16. Por despacho de 15 de Dezembro de 2022 foi indeferido o requerimento de 09 de Maio de 2022 – cfr. informação e despacho, a págs. 41 a 45 do suporte digital dos autos;

17. Por mensagem de correio electrónico de 11 de Janeiro 2023, foi enviada à Autoridade Tributária a petição que deu origem ao presente processo – cfr. mensagem, a págs. 50 a 53 do suporte digital dos autos.


***


Factos não provados

Não se provou que tenha sido enviado ofício de citação ao Reclamante nos processos ........51, PEF ........87, ........58, ........58, ........63, ........71, ........88, ........58, ........66, ........56, ........46 e ........98.

Motivação da matéria de facto dada como provada

A convicção do Tribunal sobre a matéria de facto provada baseou-se na prova documental constante dos autos e indicada a seguir a cada um dos factos, dando-se por integralmente reproduzido o teor dos mesmos, bem como o do PEF apenso aos autos.

O facto não provado decorre da absoluta míngua de substrato probatório que o pudesse firmar.

Com efeito, e após instâncias do Tribunal, foram juntos aos autos os PEF abrangidos pela decisão reclamanda, sem que neles constassem os ofícios de citação dos aludidos processos. Assim sendo, nada mais restava que não dar como não provada tal circunstância.»


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- De Direito

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou parcialmente procedente a reclamação e, nessa medida,

– declarou prescritas as dívidas exigidas nos PEF ........43, ........51, ........87, ........58, ........63, ........71, ........88, ........58, ........66, ........56, ........46 e ........98;

– mantendo o despacho reclamado, no mais.

Inconformado com a decisão, na parte em que a mesma lhe foi desfavorável, veio o reclamante apresentar recurso da mesma, alegando erro de julgamento, e reiterando que não tendo sido citado pessoalmente e repudiando a presunção de citação, se encontra verificada a falta de citação – nos termos da alínea a) do nº 1 do art. 188º do CPC – o que impede que ocorra qualquer interrupção do prazo prescricional, pelo que todas as dívidas em cobrança coerciva se encontram extintas, por prescrição.

Mais alega que dispõem os artigos 191º, nº 3, b) e 192º, nº 1 do CPPT, na efectivação da responsabilidade solidária e subsidiária, a citação é pessoal, sendo efectuada nos termos do Código do Processo Civil.

A questão que separa o entendimento do Mmo. Juiz a quo e do Recorrente prende-se com a efectivação da citação, a qual, este último, diz não ter ocorrido de acordo com as regras legalmente exigidas.

Adianta-se, desde já, que não se concorda com o recorrente.

Antes de mais, importa referir que o art. 192º, nº 1 do CPPT, dispõe que as citações pessoais são efectivadas nos termos do Código de Processo Civil, mas tal norma terá de ser lida no sentido de se excepcionar o que está previsto no próprio CPPT, embora, ao tempo, a norma não o referisse expressamente.

A mesma interpretação faz Jorge Lopes de Sousa em anotação ao art. 192º do CPPT(1), que escreveu:

«2- Regime das citações em processo civil

Estabelece-se no nº 1 deste artigo a regra da efectivação das citações pessoais em conformidade com o preceituado no CPC, com excepção, naturalmente, do que está previsto no próprio CPPT, embora tal não se refira aí expressamente.»

Aliás, outra interpretação esvaziaria o conteúdo das normas referentes às citações no CPPT.

Diga-se, ainda, que no actual art. 192º nº 1 do CPPT, se dispõe expressamente que as citações pessoais são efectivadas nos termos do Código de Processo Civil, em tudo o que não for especialmente regulado no presente Código.

Assim, a actual norma veio dispor expressamente aquilo que anteriormente já se encontrava implícito.

Deste modo, as citações pessoais só seguirão os termos do CPC, em tudo o que não for regulado pelo CPPT.

Ora, acontece que as citações por via postal e as citações pessoal e edital encontram-se previstas nos arts. 191º e 192º do CPPT.

Pelo que nada se tem a censurar à sentença recorrida quando na mesma se escreveu o seguinte:

«Dos PEF ........51, ........37, ........74, ........43, ........59 e ........59 [e apensos].

Quanto a estes processos executivos, defende o Reclamante não ter sido citado.

No entanto, perscrutado o probatório, verifica-se que tal não corresponde à verdade.

Com efeito, em cada um destes processos foi enviada uma citação para o domicílio do Reclamante e, devolvida, foi expedida nova citação, tendo ficado averbada a data do seu depósito na caixa postal do Reclamante.

Ora, nos termos da alínea b) do número 3 do artigo 191.º do CPPT, a “A citação é pessoal: […] b) Na efetivação da responsabilidade solidária ou subsidiária”, postulando o seguinte artigo [na redacção à data] que 1 - As citações pessoais são efectuadas nos termos do Código de Processo Civil, sem prejuízo, no que respeita à citação por transmissão electrónica de dados, do disposto nos n.os 4 e 5 do artigo anterior. 2 - No caso de a citação pessoal ser efectuada mediante carta registada com aviso de recepção e este vier devolvido ou não vier assinado o respectivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal, nos termos do artigo 43.º, é repetida a citação, enviando-se nova carta registada com aviso de recepção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte. 3 - A citação considera-se efectuada, nos termos do artigo anterior, na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação da alteração do seu domicílio ou sede”.

Dito de outra forma, “I - De acordo com o nº 2 do artigo 192º do CPPT, no caso de a citação pessoal ser efetuada mediante carta registada com aviso de receção (como aconteceu, no caso) e este vier devolvido ou não vier assinado o respectivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal (o que corresponde ao circunstancialismo de facto em análise), então há que convocar a 2ª parte do mencionado nº 2, repetindo-se a citação, através do envio de nova carta registada com aviso de receção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte. II - A cominação em causa refere-se ao disposto no nº3 do artigo 192º do CPPT, ou seja, a advertência relativa a considerar-se a citação efetuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados. III - No caso em apreciação, foi o que se passou, tendo o SF repetido a citação, através de correio registado com AR, tendo sido deixado aviso no recetáculo postal, pelo que a citação tem que se considerar efetuada no 8ºdia a contar da data em que foi deixado o aviso, ou seja, no dia 13/07/17. IV- A jurisprudência “reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art. 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisãoque puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art.327.º do CC)” [Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 27/10/2022, tirado no processo 415/22.3BELRA].

Aliás, um dos ofícios de citação refere, cristalinamente, repetida nos termos do art.° 192° n.° 2 e 3 do CPPT, por ter sido devolvida sem AR assinado: não foi reclamado o seu levantamento junto dos CTT no prazo legal e não foi comunicada nova morada. Advertência: A citação considera-se efetuada na data certificada pelo distribuidor ou, se for deixado aviso, no 8º dia posterior. Presume-se que o citando teve conhecimento dos elementos deixados, sem prejuízo de fazer prova da impossibilidade de comunicação de novo endereço” [facto provado 14)].

Ora, tendo em conta que estamos face a dívidas de IVA de 2012 e 2013, e de IRS – retenção na fonte, do ano de 2013, dúvidas não há que, tendo ocorrido as citações em 2014 e 2016, estas foram cumpridas dentro do prazo de prescrição, o que significa que, conforme a citada jurisprudência, ocorreu a a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art.327.º do CC)”.

Não estão, portanto, prescritas as dívidas correspondentes a estes processos, sendo de manter a decisão nesta parte.»

Como supra se deixou escrito, concorda-se com a fundamentação da sentença na parte recorrida.

Vem, também, o reclamante alegar que do probatório não consta que a morada para o qual foram remetidos os dois registos postais corresponda à “sua residência ou local de trabalho” (cf. nº 1 do art. 228º do CPC), sequer ao “seu domicílio fiscal” (cf. artigo 192º, nº 3 do CPPT).

Ora se o recorrente não concorda ou considera incompleto o probatório, deveria ter impugnado a matéria de facto, nos termos previstos no art. 640º do CPC, o que não fez.

Ainda assim sempre se dirá, que em vários factos se refere o “Receptáculo Postal Domiciliário”, a título de exemplo, vejam-se os factos nºs 3, 5, 7, 9, 11, 13.

Por outro lado, da leitura de toda a fundamentação da sentença recorrida não fica qualquer dúvida que a morada para o qual foi enviada a citação foi o domícilio do reclamante, agora, recorrente.

Veja-se o que se escreveu na sentença recorrida sobre esta matéria:
«Com efeito, em cada um destes processos foi enviada uma citação para o domicílio do Reclamante e, devolvida, foi expedida nova citação, tendo ficado averbada a data do seu depósito na caixa postal do Reclamante.»

Vem, ainda, o recorrente, em abono do seu recurso, indicar o Acórdão do STA, proc. 0116/12, de 07/12/2012, disponível em www.dgsi.pt.

Ora, após consulta em www.dgsi.pt não se descortina o Acórdão com a identificação constante das conclusões do recurso – não existindo no STA qualquer Acórdão proferido na data mencionada - pelo que não nos é possível apreciar o mesmo.

Alega, ainda, o recorrente que sendo obrigatória a citação por via postal através de carta com aviso de recepção e sendo a mesma frustrada, perante a inexistência de presunção do conhecimento do acto de citação, teria o órgão de execução fiscal de ter cumprido as diligências que a lei prescreve (art. 228º do CPC), ou seja, deveriam ter sido efectuadas diligências para encontrar o recorrente.

Parece, no entanto, o recorrente olvidar que nos termos conjugados dos artigos 19.º, n.º 4 da LGT e 43.º do CPPT, sobre o contribuinte impende a obrigação de alteração do domicílio fiscal e a inoponibilidade, perante a administração, das alterações de domicílio que não sejam comunicadas, em omissão daquela obrigação legal (exceto quando tenha na sua posse elementos que permitam concluir com segurança que é outra a residência habitual do contribuinte); a este respeito, o n.º 2 do artigo 43.º, in fine, prevê que essa inoponibilidade existe “sem prejuízo do que a lei dispõe quanto à obrigatoriedade da citação e da notificação e dos termos em que devem ser efetuadas”.

Acresce que dos autos não consta (nem tal vem alegado) que tivessem ocorrido circunstâncias que impossibilitassem a comunicação da alteração do domicílio do Recorrente.

Caso semelhante ao presente, foi recentemente decidido neste Tribunal por Acórdão de 27/10/2022, Proc. 415/22.3BELRA, disponível em www.dgsi.pt, onde a ora Relatora foi 1ª Adjunta, de onde se retira o seguinte Sumário:

«I - De acordo com o nº 2 do artigo 192º do CPPT, no caso de a citação pessoal ser efetuada mediante carta registada com aviso de receção (como aconteceu, no caso) e este vier devolvido ou não vier assinado o respetivo aviso por o destinatário ter recusado a sua assinatura ou não ter procedido, no prazo legal, ao levantamento da carta no estabelecimento postal e não se comprovar que o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio ou sede fiscal (o que corresponde ao circunstancialismo de facto em análise), então há que convocar a 2ª parte do mencionado nº 2, repetindo-se a citação, através do envio de nova carta registada com aviso de receção ao citando, advertindo-o da cominação prevista no número seguinte.

II - A cominação em causa refere-se ao disposto no nº3 do artigo 192º do CPPT, ou seja, a advertência relativa a considerar-se a citação efetuada na data certificada pelo distribuidor do serviço postal ou, no caso de ter sido deixado aviso, no 8.º dia posterior a essa data, presumindo-se que o citando teve conhecimento dos elementos que lhe foram deixados.

III - No caso em apreciação, foi o que se passou, tendo o SF repetido a citação, através de correio registado com AR, tendo sido deixado aviso no recetáculo postal, pelo que a citação tem que se considerar efetuada no 8º dia a contar da data em que foi deixado o aviso, ou seja, no dia 13/07/17.

IV- A jurisprudência “reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do art. 49.º da LGT) um duplo efeito: a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art. 327.º do CC)”.»

Nos presentes autos não é posto em causa o computo do prazo prescricional, mas tão somente, como se disse supra, a efectividade da citação.

Ora, tal como decidido na sentença recorrida, tendo em conta que estamos face a dívidas de IVA de 2012 e 2013, e de IRS – retenção na fonte, do ano de 2013, dúvidas não há que, tendo ocorrido as citações em 2014 e 2016, estas foram cumpridas dentro do prazo de prescrição, o que significa que, ocorreu a “a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do art. 326.º do CC) e o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do art.327.º do CC)”.

Assim sendo, forçoso é concluir que não estão, portanto, prescritas as dívidas correspondentes a estes processos, sendo de manter a sentença na parte recorrida, improcedendo, deste modo, o presente recurso.


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III - DECISÃO
Termos em que, acordam os juízes que compõem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, mantendo a sentença na parte recorrida.


Custas pelo Recorrente.

Registe e Notifique.


Lisboa, 4 de Outubro de 2023

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Lurdes Toscano

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Isabel Maria Fernandes

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Catarina Almeida e Sousa

(1)Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, 6ª Edição, 2011.