Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1113/08.6 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/19/2023
Relator:ANA CRISTINA CARVALHO
Descritores:ARTIGO.º 17.º, N.º 1 EBF;
CRIAÇÃO LÍQUIDA DE POSTOS DE TRABALHO
FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO
PROVA DA CONVERSÃO EM CONTRATO SEM TERMO
Sumário:I – A fundamentação tem de ser contemporânea do acto que determina;

II – A fundamentação do acto de liquidação resultante da acção de inspecção é a que constado relatório de inspecção, não valendo como fundamentação do acto tributário a sua posterior densificação;

III - A prova da celebração dos contratos de trabalho sem termo não carece de forma escrita, sendo admissíveis todos os meios de prova em Direito permitidos.

Indicações Eventuais: Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I - RELATÓRIO

I., LDA., NIPC ….6, com os sinais nos autos, deduziu impugnação contra a liquidação adicional de IRC n.º 2007 8310017328 e liquidações de juros compensatórios n.ºs 2007 00001992473 e 2007 0000199274 relativas ao exercício de 2003, peticionando a condenação a AT ao pagamento de juros indemnizatórios.

Inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra que julgou improcedente a impugnação judicial e declarou a inutilidade superveniente da lide quanto ao pedido de anulação da liquidação de juros compensatórios nº 2007 1992474, e correspondente pedido de juros indemnizatórios, veio interpor o presente recurso formulando, para o efeito, as seguintes conclusões:

«a) A douta sentença recorrida confirmou as correcções efectuadas pela Administração Fiscal, no montante de 64.672,25 euros, com base em três fundamentos:

(i) Existir um colaborador que à data da celebração do contrato já havia ultrapassado a idade limite;

(ii) Dois contratos terem sido celebrados a termo certo;

(iii) Insuficiência documental justificativa, isto é, não foram apresentadas cópias dos contratos dos restantes colaboradores considerados no cálculo da majoração, tida como benefício fiscal.

b) O presente recurso versa essencialmente sobre duas questões; (i) saber se a conversão em sem termo de um contrato inicialmente celebrado a termo (certo ou incerto) releva para aferição da criação líquida de postos de trabalho para efeitos do disposto no artigo "17.° do EBF; e (ii) saber se é ou não imperativa a redução a escrito dos contratos de trabalho sem termo, para que opere o benefício previsto no artigo 17.° do EBF.

c) No que respeita à primeira questão, estabelece a douta sentença recorrida que "Quando um contrato a termo se transmuta em contrato sem termo não ocorre qualquer criação de um novo posto de trabalho, mas apenas uma alteração da situação jurídico laboral entre o empregado e o empregador. (...) Deste modo, também aqui improcede a tese da impugnante, não sendo elegíveis para efeitos do artigo 17.° do EBF os contratos de trabalho mencionados nas alíneas O), P) e Q) do probatório.”

d) Ao decidir neste sentido, a douta sentença viola o disposto nos artigos do art.° 44.n.° 4 e art.° 47.° do Decreto-Lei n.° 64-A/89, de 27 de Fevereiro, vigente à data dos factos - actualmente o artigo 141.º do Código do Trabalho - que estabelece que sempre que ocorre a conversão de um contrato a termo certo em contrato de trabalho sem termo, à luz da legislação laboral, tal contrato considera-se como um único e mesmo contrato, assumindo ainda tal conversão efeitos rectroactivos — i.e. "a antiguidade do trabalhador conta-se, então; desde o início da prestação do trabalho” Cfr. António Menezes Cordeiro, Manual de direito do Trabalho, Almedina, Coimbra, 1997, pág. 63. (nota de rodapé por nós renumerada)… tudo sucedendo como se ta! contrato fosse um só e sem termo, desde o início.

e) Tal decisão incorre igualmente na violação do princípio constitucional da igualdade, também consagrado no art.° 55.° da LGT, uma vez que tal conclusão tem sido reconhecida pela própria Administração Fiscal em diversos processos semelhantes ao que se encontra em apreciação. A título de exemplo, permite-se a ora Recorrente invocar a decisão proferida pela Direcção de Finanças de Lisboa no processo n.° 649/03 — que aqui se invoca nos termos e para os efeitos do artigo 64° n.º 4 da LGT — e ainda a Informação Vinculativa proferida por subdelegação de competências, através de despacho do Subdirector Geral, de 2007.11.26, no âmbito do Processo 2691/2007.

f) A corroborar este entendimento, refira-se que foi proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no âmbito do Processo n.° 434/09.5BESNT de 02.12.2010 (referente às correcções efectuadas relativamente ao exercício de 2005), sentença favorável à Recorrente, tendo o referido Tribunal confirmado que o ónus da prova da existência de contratos sem termo competia à Administração Fiscal já que não se trata aqui de um benefício dependente de reconhecimento (cfr art.° 4.° e 17.° do E.B.F. e art.° 14°, n.° 4 e art.° 74.°, ambos da LGT). Entendimento este que é igualmente confirmado pelo Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 19.10.2011, proferido no âmbito do Processo n.° 607/2011 e disponível em www.dgsi.pt.

g) A maioria das correcções efectuadas pela Administração Fiscal relaciona-se com a inexistência de contratos escritos com a maioria dos trabalhadores, assumindo, face à inexistência de tais contratos, que tais trabalhadores não poderiam ser considerados para efeitos do cálculo do benefício fiscal.

h) A verdade é que este é um tema que nunca ofereceu quaisquer dúvidas interpretativas, seja na Doutrina, seja na Jurisprudência, uma vez que o contrato de trabalho por tempo indeterminado não exige forma escrita nos termos, à data dos factos, ipsis verbis do art.° 6.° da Lei do Contrato Individual de Trabalho (LCT) aprovada pelo Decreto-Lei n.° 49 408, de 24 de Novembro de 1969 e que é hoje mantida no art.° 102.° do Código do Trabalho, pelo que continua a Recorrente a ser considerada elegível para efeitos do disposto no art° 17.° do EBF, conforme decorre da análise do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 24 de Maio de 2006 e proferido no âmbito do processo n.° 0554318 (Sousa Peixoto) - in www.dgsi.pt-, onde se refere expressamente que o contrato de trabalho não está “sujeito a qualquer formalidade, salvo quando a lei expressamente determinar o contrário (art. ° 6 o da LCT, aqui aplicável!)”.

i) Ora, tendo sido devidamente demonstrada supra a validade dos contratos de trabalho sem forma escrita à luz do nosso ordenamento jurídico laboral, parece inquestionável que os contratos não escritos, sendo contratos válidos e por tempo indeterminado, serão inteiramente subsumíveis na qualificação de contrato de trabalho por tempo indeterminado, tendo os montantes relevantes para o cálculo do referido benefício sido devidamente atestados através da entrega de documentos comprovativos da inscrição dos trabalhadores na segurança social (onde consta a respectiva data de admissão) e de folhas de remunerações para efeitos de segurança social referentes ao mencionado exercício (Janeiro e Dezembro de 2003).

j) Neste sentido a douta sentença viola claramente o disposto no artigo 17.° do EBF que é bastante claro na descrição dos requisitos para aplicação da majoração aí prevista, os quais não incluem a exigência de celebração de contrato escrito, mas antes a celebração de contratos de trabalho sem termo (o que aconteceu no caso sub judice).

k) Finalmente, releva ainda nesta sede o disposto no Acórdão proferido em 19.10.2011, peia Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, uma vez que ao contrário do que acontece na douta sentença recorrida, no âmbito do Relatório de Conclusões da Administração Fiscal nunca foi questionada a existência dos contratos sem termo (que poderia legitimamente justificar as correcções efectuadas), mas apenas a suficiência dos meios de prova para o cálculo da majoração, tendo as correcções por fundamento a “insuficiência documental justificativa”, Desta forma, mantém a douta sentença uma decisão ilegal da Administração Fiscal por violação do disposto artigo 77.º da LGT.

l) No que respeita aos juros compensatórios alegadamente devidos pela Recorrente pelo atraso na liquidação do imposto, mais uma vez a douta sentença viola o disposto no n.° 1 do art ° 35.° da LGT “São devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido (...) Sublinhado nosso. (nota de rodapé por nós renumerada), uma vez que não se encontram verificados no caso sub judice, os requisitos cumulativos que a lei estabelece, a saber: (i) que haja lugar. perante a Lei, a um acto de liquidação: (ii) que essa liquidação tenha sido retardada e; (iii) que esse retardamento seja imputável ao contribuinte.

m) Independentemente de se considerarem, ou não, preenchidos os dois primeiros requisitos, nunca se poderá considerar verificado o último requisito uma vez que é entendimento da melhor Doutrina e a Jurisprudência que, para que o juízo de imputabilidade possa operar, é necessária a existência de um nexo de causalidade adequada entre o comportamento do sujeito passivo e a falta de recebimento pontual da prestação como o Supremo Tribunal Administrativo tem entendido que, para a subsunção da conduta no âmbito de aplicação do artigo 35.° da Lei Geral Tributária, “não basta a omissão e mera ligação objectiva do facto ao contribuinte, comportando ainda um juízo subjectivo consistente na atribuição ou falta de cumprimento à vontade do agente de forma a poder formular-se a respeito de sua conduta, um juízo de censura”22 2 Sublinhado nosso. (nota de rodapé por nós renumerada). Ainda, relativamente ao requisito da imputabilidade ao contribuinte do atraso da liquidação, tem-se entendido que não existirá culpa do sujeito passivo quando 0 atraso se fique a dever à (í) “mera e compreensível divergência de critérios entre a AF e o contribuinte”2 Cfr. os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, datados de 16/03/1997 e 23/10/2002, e proferidos, respectivamente, nos processos n.ºs 16211 e 01145/02, in www.dgsi.pt. (nota de rodapé por nós renumerada), ou (ii) a “erro desculpável do contribuinte” 2 Neste sentido, entre outros, os Acórdãos do STA, datados de 05/06/1985 e proferidos, respectivamente, nos processos n.ºs 003007 e 002790, in www.dgsi.pt. (nota de rodapé por nós renumerada) (sendo que esse juízo de culpa se deve efectuar ao abrigo dos deveres gerais de diligência, aptidão e conhecimento de um "bónus pater famílias” 2 Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 18/02/1998 e proferido no recurso n.º 22.325, com a concordância de Lima Guerreiro, in Lei Geral Tributária Anotada, Editora Rei dos Livros, Lisboa, 2000, pág. 173 e de Jorge Lopes de Sousa, in Ob. Cit., pág. 149. (nota de rodapé por nós renumerada))

n) Assim, “não haverá responsabilidade por juros compensatórios, quando apesar do atraso na liquidação ser provocado pela conduta do contribuinte e ser errónea a sua posição ele tenha actuado de boa-fé e o erro seja desculpável, por a sua posição ser razoável Sublinhado nosso. (nota de rodapé por nós renumerada). Pelo exposto incorre ainda a douta sentença em violação do artigo 59.° n.° 2 da LGT que estabelece que estabelece uma presunção de boa fé na actuação dos contribuintes. Na verdade, o requisito estabelecido no artigo 17.° é a celebração de contrato sem termo e não a celebração de contrato escrito sem termo, pelo que, estando legalmente consagrada a liberdade de forma na celebração de tais contratos, não é exigível que a ora Recorrente assumisse a posição da Administração Fiscal e agora do Meritíssimo Julgador a quo, de que só os contratos reduzidos a escrito serão elegíveis para efeitos da majoração.

o)Finalmente, considerou ainda a douta sentença recorrida ter resultado “prejudicado o conhecimento do pedido de juros indemnizatórios relativa à quantia de imposto pago, bem como quanto aos respectivos juros compensatórios, por se ter concluído que o pagamento do imposto apurado era devido”, decisão que se traduz numa violação do disposto no artigo 43.º da LGT, que consagra o direito da Recorrida de ser ressarcida do pagamento que efectuou, em 9 de Novembro de 2007, no montante de €24.234,44, valor que teve origem nas correcções ilegais efectuadas pela Administração Fiscal, as quais, sublinhe-se, foram efectuadas por erro imputável aos Serviços da Administração Fiscal, uma vez que tais serviços, à data da mencionada liquidação, dispunham de todos os elementos necessários a uma boa decisão da causa (cfr. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 8 de Maio de 2002, na sequência do processo de recurso n.º 115).

43. Face ao que acima fica exposto, deve o recurso interposto pela ora Recorrente ser julgado totalmente procedente, revogando-se, em consequência a douta sentença recorrida, com todas as consequências legais.

Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com todas as legais consequências, nomeadamente a da procedência da impugnação.

Só assim se fará JUSTIÇA.»


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A Recorrida, não apresentou contra-alegações.


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Foi dada vista ao Ministério Público, e neste Tribunal Central Administrativo, a Procuradora–Geral Adjunta pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência para apreciação e decisão.

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II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, o objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente no âmbito das respectivas alegações, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Importa assim, decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao julgar que, com a conversão de contrato a termo em contrato sem termo não ocorre a criação líquida de emprego e ao erigir o contrato escrito como meio de prova da celebração de contrato de trabalho sem termo.

Por fim, importa apreciar e decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de direito ao julgar que são devidos juros compensatórios e indevidos os juros indemnizatórios peticionados na acção.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

III – 1. De facto


É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

«A) A Impugnante exerce a atividade de limpeza industrial, enquadrada no CAE – 074 700.
B) A Impugnante é tributada no regime normal de IVA e IRC.
C) A Impugnante procedeu à entrega da Declaração de IRC, Modelo 22, para o exercício de 2003, da qual resultou a autoliquidação de € 150.355,04 de imposto a pagar. (Doc.fls. 354 do PAT)
D) Sobre o valor mencionado na alínea que antecede a Administração Tributária efetuou a liquidação nº 2004 2310381394 em 22.09.2004, apurando juros de mora no valor de € 1.503,55. (Doc. n.º6 junto à PI)
E) Em 10.01.2005 a Impugnante reclamou da liquidação de juros moratórios que antecede, alegando ter procedido ao pagamento do imposto autoliquidado três dias antes do decurso do prazo legal para o efeito. (Doc. nº7 junto à PI)
F) Em 01.02.2005 a Impugnante procedeu ao pagamento da liquidação a que alude a al. D) do probatório. (Doc. n.º7 (fls. 266) junto à PI)
G) Em 03.02.2005 a Impugnante requereu à Administração Fiscal o reembolso do pagamento identificado na alínea que antecede. (Doc. n.º7 (fls. 258) junto à PI)
H) Por cheque do Tesouro de 30.01.2006, o valor de juros moratórios pago em 01.02.2005 foi reembolsado à Impugnante. (Doc. 7 (fls. 262) junto à PI)
I) Em cumprimento da Ordem de Serviço 0I200706346 de 22.08.2007, que teve como fundamento o enquadramento da Impugnante no cadastro de “Acompanhamento Permanente”, foi levada a efeito uma ação de inspeção interna, que incidiu sobre o exercício de 2003. (Relatório Final de Inspeção a fls. 275 a 296 do PAT)
J) Na sequência da inspeção referida na alínea que antecede foi elaborado o Relatório Final do qual se destaca:
«(…) III – Descrição dos factos e fundamentos das correcções
(…) Face ao descrito anteriormente não poderá considerar-se, na totalidade, a importância declarada na linha 234 do quadro 7 como dedução à matéria coletável, correspondente à majoração prevista no artigo 17º do EBF uma vez que verifica-se existir um colaborador que à data da celebração do contrato já havia ultrapassado a idade limite, dois contratos foram celebrados a Termo Certo, mas e principalmente verifica-se insuficiência documental justificativa, isto é, não foram apresentadas cópias dos contratos dos restantes colaboradores contemplados no cálculo da majoração, tida como benefício fiscal. (…)
IV – Conclusões e Propostas
(…) o Sujeito Passivo utilizou indevidamente a seu favor um montante a deduzir à matéria coletável relativo a benefício sem enquadramento no Estatutos dos Benefícios Fiscais, devido a situações que não satisfazem os quesitos exigíveis para dedução e pela insuficiência documental justificativa.» (Relatório Final de Inspeção a fls. 275 a 296 do PAT)
L) Com base nas correções efetuadas foi emitida a liquidação adicional de IRC n.º 2007 8310017328, relativa ao ano de 2003, e liquidações de juros compensatórios n.ºs 2007 1992473 e 2007 1992474, no valor total de € 24.234,44. (Doc. n.º 1 junto à P.I.)
M) Em 09.11.2007, a Impugnante procedeu ao pagamento da quantia a que alude a al. L) do probatório. (Doc. n.º 1 junto à P.I.)
N) Em 19.12.2007, a Impugnante deduziu reclamação graciosa contra os atos tributários a que alude a al.L) do probatório. (Doc. de fls. 3/24 do processo de reclamação graciosa apenso)
O) O colaborador da Impugnante, A. V., nasceu em 1..0...1972. (Doc. de fls. 30, 31 e 311 do processo de reclamação graciosa apenso)
P) Em 01.04.2001, entre a Impugnante e C. G. foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo com a duração de 9 meses, com início em 01.04.2001 e termo em 31.12.2001. (Doc. de fls. 316/318 do processo de reclamação graciosa apenso)
Q) Em 09.08.2003, entre a Impugnante e M. N. foi celebrado um contrato de trabalho a termo incerto justificando-se pela necessidade de «substituir temporariamente a trabalhadora O. L. que se encontra em situação de baixa. Enquadra-se designadamente na alínea a) do n.º1, do Artigo 41º, do Decreto-Lei 64-A/89, de 27 de Fevereiro» (Doc. de fls. 312/312 do processo de reclamação graciosa apenso)
T) Em 19.08.2003, entre a Impugnante e M. N. foi acordado designadamente o seguinte:
«PRIMEIRA: A partir de 20/08/2003 o Contrato de Trabalho a Termo Incerto celebrado em 09/08/2003 é transformado em Contrato de Trabalho a Termo Certo.
SEGUNDA: O presente Contrato de Trabalho terá a duração de trinta dias, com início em 20/08/2003 e termo em 18/09/2003» (Doc. de fls. 315 do processo de reclamação graciosa apenso)
U) Através do ofício nº 008318, de 02.02.2009, a Impugnante foi notificada do despacho de revogação parcial que anulou os juros compensatórios por recebimento indevido, no montante de € 100,01, e determinou o cálculo de juros indemnizatórios sobre aquele valor, desde 10.11.2007 até efetivo reembolso -acordo-.
V) Em 30.06.2009, deu entrada em juízo a petição inicial que originou os presentes autos – cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos


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Consta ainda da mesma sentença que «Não se mostram provados quaisquer outros factos com relevância para a decisão da causa.».

No que respeita à motivação de facto, refere a sentença que: «A convicção do tribunal, quanto aos factos provados, formou-se com base no teor dos documentos referidos em cada uma das alíneas supra.».
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Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, adita-se ao probatório, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 281.º do CPPT, a seguinte factualidade:

W) Os fundamentos da correcção relativa à decução da majoração a título do benefício fiscal previsto no artigo 17.º do EBF constantes no relatório final da acção inspectiva, referido em J) são os seguintes:
«III – Descrição dos factos e dos fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria colectável
(…) foi o Sujeito Passivo notificado através do ofício (…) solicitando-se os seguintes elementos:
Cópias dos contratos de trabalho celebrados relativamente aos colaboradores que estejam nas condições previstas no Artigo 17.º do E.B.F.;
Cópia dos mapas elaborados para a Segurança Social relativos aos meses Janeiro e Dezembro dos anos de 2003;
Mapa discriminativo (por colaborador) dos cálculos efectuados:
(…) Em cumprimento da notificação (…) enviou alguns contratos de trabalho referentes a trabalhadores que poderiam beneficiar da majoração prevista no artigo 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Apresentou cópias dos Mapas da Segurança Social
(…)
Enviou mapa discriminativo (por colaborador) dos cálculos conducentes ao montante inserido no campo 234 do Quadro 7 da Declaração Periódica de Rendimentos Modelo 22 que se transcreve:
Imagem: Original nos autos

(…) «sobre esta matéria, também, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo em acórdão de 11 de Outubro de 2003, no processo 0723/06, cujo sumário se transcreve: “O incentivo à criação de emprego para jovens, previsto do artigo 48-A do Estatuto dos Benefícios fiscais, na redacção introduzida pela Lei n.º 72/98 de 3 de Novembro (a que corresponde o artigo 17.º na redacção de 2001) só é atribuído quando houver «criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos» o que pressupõe aumento do número global de trabalhadores da empresa admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos em determinado exercício”, … e entendeu-se ainda que; à face de tal conceito, «a conversão de contratos de trabalho a termo em contratos sem termo de trabalhadores já vinculados à impugnante não consubstancia aumento efectivo do número de trabalhadores, nem tão pouco de postos de trabalho.»

Face ao descrito anteriormente não poderá considerar-se, na totalidade, a importância declarada na linha 234 do quadro 7 como dedução à matéria colectável, correspondente à majoração, prevista no artigo 17.º do EBF uma vez que verifica-se existir um colaborador que à data da celebração do contrato já havia ultrapassado a idade limite, dois contratos foram celebrados a Termo Certo, mas e principalmente verifica-se insuficiência documental justificativo, isto é não foram apresentados cópias dos contratos dos restantes colaboradores contemplados no cálculo da majoração, tida como benefício fiscal.»
– cf. fls. 43 a 251 e 334 do PAT - relatório de inspecção identificado em J);

Y) No mesmo relatório foi efectuada a apreciação da pronúncia e documentos juntos no âmbito da audição prévia, ali se concluindo nos seguintes termos:
«IX Consolidação do projecto de conclusões
(…) Enviou cópias de contratos de alguns colaboradores. Face aos novos elementos refaz-se o respectivo mapa de apuramento do montante deduzido a título de benefício fiscal proveniente da majoração dos encargos com a criação líquida de postos de trabalho para jovens.
Imagem: Original nos autos
As justificações ora apresentadas em nada contrariam o que havia sido tomado por base para alteração aos elementos declarados no Campo 234 da Declaração Modelo 22 do ano de 2003 em apreço. Não se verificou qualquer dado novo que cumprisse com 0 que se encontra legislado e assumido pela Administração Fiscal relativamente às condições para poder usufruir do benefício fiscal previsto no artigo 17.° do estatuto. Não foi complementada a insuficiência documental justificativa.» – cf. fls. 43 a 251 e 334 do PAT - relatório de inspecção identificado em J);
Z) Entre a Impugnante e L. R. foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo com a duração de 6 meses, com início em 11.01.2001 e termo em 10.07.2001 – cf. Doc. de fls. 307 e sgs do processo administrativo apenso;
AA) Entre a Impugnante e C. S. foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo com a duração de 8 meses e 7 dias, com início em 11.01.2000 e termo em 28.09.2000 – cf. Doc. de fls. 299 e sgs do processo administrativo apenso;
AB) Entre a Impugnante e M. F. T. foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo com a duração de 12 meses, com início em 11.11.2000 e termo em 11.11.2001 – cf. Doc. de fls. 301 e sgs do processo administrativo apenso;
AC) Entre a Impugnante e C. P. foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo com a duração de 6 meses, com início em 21.05.2001 e termo em 20.11.2001 – cf. Doc. de fls. 304 e sgs do processo administrativo apenso;
AD) Entre a Impugnante e J. C. foi celebrado um contrato de trabalho a termo certo com a duração de 12 meses, com início em 23.10.2001 e termo em 31.10.2002 – cf. Doc. de fls. 311 e sgs do processo administrativo apenso;
AE) Por acordo escrito a Impugnante e J. C. converteram o contrato identificado em AD) em contrato sem termo com efeitos a 22/10/2002 – cf. Doc. de fls. 314 e sgs do processo administrativo apenso;
AF) Com a reclamação graciosa identificada em N), a recorrente procedeu à junção dos seguintes documentos: «extrato de declaração de remunerações entregues por internet» referentes aos meses de Janeiro a Dezembro de 2003, entregues perante a Segurança Social, dos quais constam o respectivo código de certificação discriminando o NISS e o nome dos trabalhadores da reclamante, a data de nascimento, o mês de referência, além de outros elementos – cf. fls. 43 a 251 do PAT - reclamação graciosa.


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III. 2 – Fundamentação de direito


Na sequência de uma acção inspectiva interna, a Administração Fiscal considerou que o montante deduzido pela Impugnante a título de benefício fiscal respeitante à criação líquida de postos de trabalho, previsto no artigo 17.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais (EBF), no exercício de 2003 não podia ser aceite na sua totalidade, pelo que procedeu à correção da matéria colectável no valor de total de € 64 672,25.

Como se salienta na sentença, a referida correcção foi suportada em três fundamentos, a saber:

i. um colaborador que à data da celebração do contrato já havia ultrapassado a idade limite;

ii. Dois contratos terem sido celebrados a termo certo, e

iii. Insuficiência documental justificativa, isto é, não foram apresentadas cópias dos contratos dos restantes colaboradores considerados no cálculo da majoração, tida como benefício fiscal.

O Tribunal recorrido julgou a acção improcedente.

A recorrente restringe o seu recurso ao segmento da decisão que manteve as correcções por julgar que não relevam para a aferição da criação líquida de postos de trabalho os casos em que ocorreu a conversão de contratos a termo (certo ou incerto) em contratos sem termo e nos demais, por insuficiência de prova documental, mais concretamente, por falta de apresentação de cópias dos contratos sem termo.

A Recorrente sustenta, desde logo, que o Relatório de Inspeção Tributária não sindicou, em concreto, a conversão dos contratos de trabalho, conforme é espelhado, designadamente, no ponto 17 e seguintes das suas alegações e conclusivamente formulado em k), relevando, assim, que a fundamentação contemporânea do ato não controverte a premissa base em que assentou a decisão.

Para depois, se insurgir, em concreto, quanto à própria valia dessa interpretação.

Com efeito, nas conclusões a) a f), a recorrente insurge-se assim, contra a sentença recorrida no seguinte segmento: «[q]uando um contrato a termo se transmuta em contrato sem termo não ocorre qualquer criação de um novo posto de trabalho, mas apenas uma alteração da situação jurídico laborai entre o empregado e o empregador. (...) Deste modo, também aqui improcede a tese da Impugnante, não sendo elegíveis para efeitos do artigo 17.° do EBF os contratos de trabalho mencionados nas alíneas O), P) e Q) do probatório»

O recorrente alega que ao decidir no referido sentido, a sentença «viola o disposto nos artigos 44.°, n.° 4 e 47.° do Decreto-Lei n.° 64-A/89, de 27 de Fevereiro, vigente à data dos factos - actualmente o artigo 141.º do Código do Trabalho - que estabelece que sempre que ocorre a conversão de um contrato a termo certo em contrato de trabalho sem termo, à luz da legislação laboral, tal contrato considera-se como um único e mesmo contrato, assumindo ainda tal conversão efeitos rectroactivos - i.e. "a antiguidade do trabalhador conta-se, então, desde o início da prestação do trabalho’’ tudo sucedendo como se tal contrato fosse um só e sem termo, desde o início.»

Vejamos, antes de mais, qual o regime aplicável.

À data dos factos aqui em causa dispunha o n.º 1 do artigo 17.º do EBF (na redação conferida pelo Decreto-Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho):

«1. Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos por contrato de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos, são levados a custo em valor correspondente a 150%».

Ora, conforme decorre da norma acabada de citar, os critérios para a admissão da dedução dos encargos com majoração não excluem a conversão de contratos de trabalho a termo em contratos sem termo, desde que se verifique a condição essencial de tal conversão corresponder à criação líquida de postos de trabalho, especificamente para jovens e para desempregados de longa duração, admitidos com idade não superior a 30 anos.

Daí que, o essencial é que o interessado comprove a verificação dos requisitos previstos no artigo 17.º do EBF.

Com efeito, nos termos do artigo 7.º do EBF, o direito aos benefícios fiscais, automáticos ou dependentes de reconhecimento, ficam sujeitas a fiscalização da Direcção-Geral dos Impostos e das demais entidades competentes, para controlo da verificação dos pressupostos dos benefícios fiscais respectivos e do cumprimento das obrigações impostas aos titulares do direito aos benefícios.

Conjugando este preceito normativo com o que dispõe o n.º 1 do artigo 74.º da LGT, que estipula que «o ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração fiscal ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque» impõe-se concluir que era à recorrente que se impunha comprovar que reunia os pressupostos necessários à constituição do direito ao benefício fiscal que serviu de fundamento à dedução majorada dos encargos a que alude o artigo 17.º do EBF, sob pena de se sujeitar à correcção de tal dedução pela AT, no âmbito do exercício dos seus poderes/deveres de fiscalização e inspecção.

Assim sendo, cabia à recorrente efectuar a prova de que reunia os requisitos necessários à dedução dos encargos nos termos do artigo 17.º do EBF.

Conforme referimos anteriormente, antes de aferir da própria valia da interpretação prosseguida na decisão recorrida relativamente ao âmbito e abrangência da conversão, há que apreciar, a montante, se tal realidade era, efetivamente, controvertida no RIT.

E isto porque, conforme já referido, sindicado, desde logo, pela Recorrente, sendo certo que, sempre se dirá, que centrando-se tal questão no âmbito da qualificação jurídica, o Tribunal não se encontra balizado a estabelecer qualquer enquadramento e delimitação legal (artigo 5.º, nº3 do CPC).

Assim, antes de mais, há que apreciar se o RIT, controverte, em rigor, a questão atinente à própria conversão ou se a dá por adquirida e o seu entendimento se queda por uma questão de insuficiência probatória, donde, assente, em fundamentação a posteriori.

Recordemos então, a fundamentação da correcção aqui em causa: «sobre esta matéria, também, já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo em acórdão de 11 de Outubro de 2003, no processo 0723/06, cujo sumário se transcreve: “O incentivo à criação de emprego para jovens, previsto do artigo 48-A do Estatuto dos Benefícios fiscais, na redacção introduzida pela Lei n.º 72/98 de 3 de Novembro (a que corresponde o artigo 17.º na redacção de 2001) só é atribuído quando houver «criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos» o que pressupõe aumento do número global de trabalhadores da empresa admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos em determinado exercício”, … e entendeu-se ainda que; à face de tal conceito, «a conversão de contratos de trabalho a termo em contratos sem termo de trabalhadores já vinculados à impugnante não consubstancia aumento efectivo do número de trabalhadores, nem tão pouco de postos de trabalho.»

Face ao descrito anteriormente não poderá considerar-se, na totalidade, a importância declarada na linha 234 do quadro 7 como dedução à matéria colectável, correspondente à majoração, prevista no artigo 17.º do EBF uma vez que verifica-se existir um colaborador que à data da celebração do contrato já havia ultrapassado a idade limite, dois contratos foram celebrados a Termo Certo, mas e principalmente verifica-se insuficiência documental justificativo, isto é não foram apresentados cópias dos contratos dos restantes colaboradores contemplados no cálculo da majoração, tida como benefício fiscal (sublinhados e destacados nossos).

Do teor do relatório o que se retira é que não é controvertida a questão da conversão dos contratos e da própria criação líquida de postos de trabalho, dando-se, em rigor, por certas e assumidas essas premissas e fundando-se apenas na insuficiência probatória.

Com efeito, e embora seja citado o Acórdão do STA de 11/10/2006 proferido no recurso n.º 723/06, a sua convocação é feita a título de enquadramento dos requisitos da atribuição da majoração resultante do benefício fiscal em causa, já que não são retiradas nenhumas consequências quanto a tal requisito, nem implícitas, nem expressas.

Aliás, a alicerçar este entendimento está, desde logo, o entendimento constante na contestação, no qual a AT dá por adquirido que a conversão dos contratos de trabalho a termo certo para sem termo é passível de consideração, pondo o acento tónico na prova e na concreta formalização.

Acresce que, à data da Inspeção, a AT doutrina, justamente, nesse sentido.

Com efeito, a própria AT expressou esse entendimento, em diversos documentos, citando-se a título de exemplo a informação vinculativa a que se refere a ficha doutrinária relativa ao processo 2691/2007, sancionada por Despacho do Subdirector–Geral, de 26/11/2007, proferido no uso de subdelegação de competências. Recorda-se aqui o seu teor: «Considera-se que um trabalhador é admitido por contrato sem termo quando no contrato não está determinado o número de meses ou anos que o trabalhador deverá prestar serviço na respectiva empresa. Pelo que, só os contratos firmados nessas condições contam para o cálculo da criação líquida de postos de trabalho.

Uma vez que os contratos com termo não relevam para efeitos do artigo 17º do EBF, quando estes se transformam em contratos sem termo podem entrar, a partir do respectivo exercício, para a aferição da criação líquida de postos de trabalho, desde que todos os outros requisitos de acesso ao benefício estejam preenchidos.» (disponível em https://info.portaldasfinancas.gov.pt/pt/informacao_fiscal/informacoes_vinculativas/beneficios_fiscais/Documents/Ficha_Doutrinaria_Artigo_17_EBF.pdf).

No mesmo sentido pode ver-se o Acórdão deste Tribunal de 19/01/2023, processo n.º 1352/09.2 BELRS, em situação idêntica, a AT auto vinculando-se a tal entendimento: «no que respeita ao Ofício n.º 25944 de 30/11/2007 e informação N.º 1552/2007, ambos emitidos pela Direcção de Serviços do IRC e que constam em anexo 4, é claramente informado que terá de verificar todos os requisitos do artigo 17.º do EBF, sempre que os Contratos a Termo que se transformam em Contratos Sem Termo.

É afirmado - “Desde que todos os outros requisitos de acesso estejam preenchidos “De facto, é este o sentido do artigo 17.º do EBF, já que a contratação de Contrato Sem Termo é requisito essencial a verificar no benefício fiscal a usufruir. Assim, o sentido das informações apresentadas, Ofício n.º 25944 de 30/11/2007 e Informação n.º 1552/2007, ambos» emitidos pela Direcção de Serviços de IRC, é consistente com o disposto no artigo 17.º do EBF e esclarecimento vertido na Informação 288/05- Processo N.º 123/05, já referida

Assim, a sentença ao convocar como fundamento das correcções quer a criação líquida de postos de trabalho, quer a conversão dos contratos, funda-se em fundamentação não contemporânea como alega a recorrente. Sendo inadmissível a fundamentação a posteriori tais fundamentos não podem sustentar a apreciação da legalidade das liquidações impugnadas.

Cita-se a este propósito o Acórdão deste Tribunal datado de 24/11/2022, em que foi relatora a aqui 2ª adjunta, proferido no processo n.º 528/09.7 BELRS: «o Tribunal tem de quedar-se pela formulação do juízo sobre a legalidade do ato sindicado em face da fundamentação contextual subjacente a esse próprio ato, não podendo, naturalmente, valorar quaisquer razões de facto e de direito que não estejam contempladas nessa fundamentação -por se coadunarem com fundamentação a posteriori, legalmente não admissível- ter-se-á de concluir que assiste, efetivamente, razão à Recorrente quando assaca esse erro de julgamento.

Como claramente explicitado, em termos de fundamentação a posteriori, no Aresto do STA, prolatado no âmbito do processo nº 0208/17, datado de 22 de março de 2018, e demais jurisprudência nele convocada: “A fundamentação dos actos administrativos e tributários à posteriori não é legalmente consentida, cfr. os acórdãos do STA, de 26/3/2014, proc. nº 01674/13 e de 23/4/2014, proc. nº 01690/13, sendo que a validade do acto terá necessariamente que ser apreciada em função dos fundamentos de facto e de direito que presidiram à sua prática, irrelevando os que posteriormente lhe possam ser “aditados”. (destaques e sublinhados nossos).

Esclarecendo, neste concreto particular, que “[s]e o acervo dos fundamentos e argumentos (…) não constam expressamente do relatório da inspecção, indo mais além do que ali ficou dito. Sabendo nós que a fundamentação dos actos administrativos e tributários a posteriori não é legalmente consentida, cfr. os acórdãos do STA, de 26/3/2014, proc. nº 01674/13 e de 23/4/2014, proc. nº 01690/13, sendo que a validade do acto terá necessariamente que ser apreciada em função dos fundamentos de facto e de direito que presidiram à sua prática, irrelevando os que posteriormente lhe possam ser "aditados", podemos concluir sem margem para dúvida que, ainda que fosse reconhecida razão à recorrente com base nos fundamentos agora esgrimidos tal não poderia ser determinante para a manutenção do acto anulado pelo tribunal a quo e, logicamente, também não poderia conduzir à revogação da sentença recorrida.” (destaques e sublinhados nossos)

Resulta, assim, que a fundamentação em que assentou a manutenção da correção não pode manter-se porquanto, como visto, não contemporânea do ato.

Aqui chegados, sendo não controvertida, a premissa atinente à admissibilidade da própria conversão dos contratos celebrados a termo para contratos sem termo, o que importa, então, apurar é se foi feita a prova dessa conversão por forma a assumir uma contratação sem termo constante no normativo analisado.

Vejamos, então, qual a prova realizada nos autos.

No caso dos autos, o primeiro fundamento da correção – existência de um colaborador com idade superior a 30 anos à data da contratação - não integra o objecto do recurso, o que significa que se consolidou na ordem jurídica.

Os outros dois fundamentos são:

- dois contratos foram celebrados a termo certo; e

- «insuficiência documental justificativa, isto é, não foram apresentadas cópias dos contratos dos restantes colaboradores contemplados no cálculo da majoração».

O fundamento da correcção relativo à contratação a termo certo foi confirmado pelo Tribunal recorrido sem que a recorrente se conforme com tal decisão.

No caso da trabalhadora C. G., foi celebrado contrato de trabalho a termo certo em 01/04/2001, com duração de 9 meses, conforme decorre do ponto P) da matéria de facto. Aplicando o regime jurídico supra exposto, operando-se as duas renovações limite, o contrato a termo converter-se-ia em contrato sem termo em 1/8/2003.

Compulsados os extratos de declaração de remunerações submetidos pela recorrente via internet à Segurança Social referentes aos meses de Janeiro a Dezembro de 2003, anexos ao relatório de inspecção, constatamos que a referida trabalhadora consta dos referidos extratos desde Janeiro a Dezembro de 2003, pelo que se verificou a conversão a contrato sem termo, mantendo-se a mesma ao serviço da recorrente, donde se conclui que nesta parte, a recorrente tem razão.

Por sua vez M. N. viu o seu contrato a termo incerto celebrado em 09/08/2003 com vista à substituição de uma trabalhadora de baixa, no entanto, tal contrato foi convertido em contrato a termo certo em 20/08/2003, conforme é referido no relatório de inspecção e resulta expressamente do ponto T) da matéria de facto.

Tendo em conta que o contrato a termo certo foi celebrado em 20/08/2003 pelo prazo de 30 dias, podemos inferir que, ocorrendo duas renovações, em 20/11/2003 o contrato a termo ter-se-á convertido em contrato sem termo ope legis. Tanto assim é que a referida trabalhadora consta dos aludidos extractos desde o mês de Agosto a Dezembro de 2003, pelo que, também aqui assiste razão à recorrente, verificando-se que o Tribunal recorrido incorreu em erro na valoração da prova recolhida e em erro de julgamento de direito, procedendo o recurso na parte apreciada.

Ora, como visto, não tendo sido sindicados os demais pressupostos, mormente, a própria criação líquida de postos de trabalho, há que julgar, efetivamente, procedente e anular as correções.


*

Como se deixou dito, as demais correções estão concatenadas com insuficiência probatória, no entanto, antes de mais, importa apreciar uma questão preliminar e que radica na concreta necessidade de outorga de um contrato escrito sem termo.

Importa agora apreciar a questão de saber se a sentença incorreu em erro de julgamento, sufragando o entendimento da AT, ao declarar que, no caso vertente, se impunha a prova documental para prova da existência dos contratos sem termo. Ou seja, que se impunha à recorrente munir-se dos contratos de trabalho na forma especial escrita.

Como tem sido reiterado pelos tribunais superiores, o benefício relativo à criação líquida de postos de trabalho para jovens depende da prova da existência do concreto contrato de trabalho por tempo indeterminado, prova que pode ser efectuada através de qualquer meio geral de prova, de entre os previstos nos artigos 392.º e 376.º do CC e de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, neste sentido vide, a título de exemplo, os Acórdãos proferidos nos processos n.ºs 1352/09.2BELRS, 414/09.0BESNT, datados de 19/01/2023 e de 11/03/2021.

A solução apontada tem por fundamento, por referência à data em que os factos ocorreram, o regime decorrente do Decreto-lei n.º 49408, de 24/11, que aprovou o regime jurídico do contrato individual de trabalho e o Decreto-lei n.º 64-A/89, de 27/2, que aprovou o regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho, incluindo as condições de celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo.

Dispunha o artigo 6.º do Decreto-lei n.º 49 408, quanto à sua forma: «o contrato de trabalho não está sujeito a qualquer formalidade, salvo quando a lei expressamente determinar o contrário

Já o contrato de trabalho a termo certo ou incerto está sujeito a forma escrita, devendo ser assinado por ambas as partes e conter as indicações identificadas nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 42.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27/2.

Sublinha-se ainda que, nos termos do n.º 3 do artigo 42.º, do referido diploma legal, considera-se contrato sem termo aquele em que falte a redução a escrito, a assinatura das partes, o nome ou denominação, bem como as referências exigidas na alínea e) do n.º 1 (estipulação de prazo) ou, simultaneamente, nas alíneas d) e f) do mesmo número (data de início do trabalho e data da celebração).

Ora, não estando o contrato de trabalho sem termo sujeito à forma escrita, compreende-se que a prova da sua existência se possa operar por qualquer meio geral de prova, também para efeitos de comprovação dos requisitos necessários à constituição do benefício fiscal aqui em causa.

Importa ainda referir que a prova no caso de conversão de contrato, pode resultar da prova da existência dos contratos a termo (necessariamente documental) e da permanência dos mesmos trabalhadores para além do período legalmente previsto para as renovações da contratação a termo. Isto porque de tal prova permite-se inferir a prova indirecta, com elevado grau de verosimilhança e até de certeza que, decorrido tal prazo, se operou a sua conversão em contrato sem termo.

Com efeito, dispunha o artigo 46.º sobre a caducidade do contrato a termo certo o seguinte:

«1 - O contrato caduca no termo do prazo estipulado desde que a entidade empregadora comunique ao trabalhador até oito dias antes de o prazo expirar, por forma escrita, a vontade de o não renovar.

2 - A falta da comunicação referida no número anterior implica a renovação do contrato por período igual ao prazo inicial. (…)»

Resultava do disposto no artigo 44.º, n.º 2 e 47.º do mesmo diploma legal, que as renovações do contrato a termo não poderiam efectuar-se para além de duas vezes e a duração do contrato terá por limite, em tal situação, três anos consecutivos, sendo excedidos os prazos de duração fixados o contrato converte-se em contrato sem termo.

No caso dos contratos de trabalho a termo incerto, nos termos do artigo 49.º do mesmo diploma, a sua duração ocorre pelo tempo necessário à substituição do trabalhador ausente ou à conclusão da actividade, tarefa ou obra cuja execução justifica a sua celebração, convertendo-se em contrato sem termo se o trabalhador continuar ao serviço decorrido o prazo do aviso prévio ou, na falta deste, passados quinze dias sobre a conclusão da actividade, serviço ou obra para que haja sido contratado ou sobre o regresso do trabalhador substituído, conforme resulta do disposto no artigo 51.º do Decreto-Lei n.º 64-A/89.

Vejamos.

Recorde-se que o fundamento da correcção em causa foi o seguinte: «não foram apresentadas cópias dos contratos dos restantes colaboradores contemplados no cálculo da majoração, tida como benefício fiscal».

A sentença recorrida reconhece que «um contrato de trabalho sem termo não carece de forma escrita», no entanto, decide que «não obstante o contrato de trabalho sem termo, reduzido a escrito, não ser uma formalidade ad substantiam, do ponto de vista da relação laboral, não pode deixar de consubstanciar uma formalidade ad probationem na relação justributária, no que respeita à aferição dos pressupostos necessários ao funcionamento do benefício fiscal constante do art. 17º do EBF.
De facto, aquele que aproveita o benefício fiscal deve munir-se dos meios de prova necessários relativos aos pressupostos fácticos do mesmo.
O mesmo é dizer que, a forma de a Impugnante provar a criação de postos de trabalho nos termos previstos no art. 17º do EBF, designadamente no que respeita ao tipo de contrato celebrado com o trabalhador de idade inferior a 30 anos, é através do respetivo contrato de trabalho, reduzido a escrito. Só assim se assegura que, no momento da sua celebração, o mesmo tinha em vista a criação de um posto de trabalho não sujeito a termo.
De outro modo reinaria a incerteza, dificilmente ultrapassável com recurso a outros meios de prova como aqueles que a Impugnante oferece nos presentes autos. (…)»

Ora, percorrendo o relatório de inspecção constatamos que a AT não questiona que os trabalhadores em referência prestavam o seu trabalho à recorrente, àquela data, nem se questiona a sua conversão em contratos de trabalho sem termo. Apenas se refere como fundamento para a não aceitação da dedução majorada a «insuficiência documental justificativa, isto é, não foram apresentadas cópias dos contratos dos restantes colaboradores contemplados no cálculo da majoração, tida como benefício fiscal.» (cf. ponto J) e W) dos factos assentes).

A expressão «insuficiência documental justificativa» no contexto em que é referida, refere-se à falta de cópia dos contratos de trabalho sem termo, isto é, não há prova documental dos contratos de trabalho sem termo.

Tanto assim é, que a própria Fazenda Pública efectua essa interpretação, conforme decorre dos artigos 19.º a 23.º da contestação. Com efeito, na contestação é efectuada uma análise da evolução do entendimento da AT sobre a questão, citando a informação n.º 288/05 – Proc 123/05, na qual se refere que «sendo a admissão por contrato sem termo um dos pressupostos essenciais para a utilização do benefício previsto no art.º 17.º do EBF, afigura-se que o mesmo seja formalizado por escrito» pois de outro modo «poderá originar situações abusivas de aproveitamento ilícito do benefício fiscal previsto no artigo 17.º (…) o ponto 18 da referida informação refere ainda que “os serviços da Inspecção tributária apenas poderão constatar a verificação desse pressuposto caso exista um contrato de trabalho sem termo reduzido a escrito.»

Reforçando esse entendimento, cita ainda a informação 1691/08 na qual se desenvolve o seguinte entendimento mais lato: «cabendo à entidade empregadora provar a existência do contrato sem termo para efeitos do benefício fiscal, parece relevante que esta tenha a cautela de reduzido a escrito; - Contudo, para efeitos de benefício fiscal, em certas circunstâncias, é possível, através de outros elementos apresentados pelos sujeitos passivos, elaborar um raciocínio que permita atestar a celebração de contrato sem termo; - O que se deve exigir é que os elementos de prova sejam vinculativos para a entidade empregadora, envolvendo, pelo menos, as duas partes do contrato; - A permanência ao serviço de determinado trabalhador apôs o decurso do período de duração máxima do contrato de trabalho a termo (este obrigatoriamente reduzido a escrito) é um facto que permite ajuizar da existência de contrato de trabalho sem termo; - Esta permanência ao serviço deve, no entanto ser comprovada através de documentos que vinculem externamente a entidade”

Comparando as duas tabelas constantes do relatório de inspecção tributária (RIT) retiramos a mesma conclusão.

A primeira tabela ou mapa contante do ponto III relativo à descrição dos factos e fundamentos das correcções (que corresponde à tabela constante do projecto de relatório) consta do ponto W) da matéria de facto aditada.

A segunda tabela, constante do ponto Y) da matéria de facto aditada, que resulta da apreciação da pronúncia apresentada pela recorrente no âmbito do exercício do direito de audição prévia, verificamos que a recorrente juntou cópia de vários contratos de trabalho a termo certo (que constam em anexo ao RIT) pretendendo comprovar que os mesmos se haviam convertido em contratos sem termo.

Do ponto IX do RIT referente à «consolidação do projecto de conclusões» (ponto Y) da matéria de facto aditada), refere-se expressamente que a recorrente «enviou cópia de contratos de alguns colaboradores», o que deu lugar a alterações no mapa de apuramento do montante deduzido (correspondendo à 2ª tabela do ponto Y) da matéria de facto), apenas no que se refere à coluna respeitante ao tipo de contrato, passando a referir «TERMO CERTO» em vez de «N/Enviado». A conclusão que é retirada no mesmo ponto do RIT, é a de que «As justificações ora apresentadas em nada contrariam o que havia sido tomado por base para alteração aos elementos declarados no Campo 234 da Declaração Modelo 22 do ano de 2003 em apreço. Não se verificou qualquer dado novo que cumprisse com o que se encontra legislado e assumido pela Administração Fiscal relativamente às condições para poder usufruir do benefício fiscal previsto no artigo 17.° do estatuto. Não foi complementada a insuficiência documental justificativa

Ora, inversamente ao que foi entendido na sentença recorrida, e conforme já explanámos anteriormente a conversão dos contratos não foi posta em causa no relatório de inspecção, apenas foi colocada em causa a prova documental dos contratos sem termo, donde se pode perceber que a prova documental junta nem sequer foi analisada pela AT.

Ora, aplicando o regime jurídico supra exposto, nos termos do qual se considera contrato sem termo aquele em que falte a redução a escrito a existência da relação laboral, pode ser provada pela existência de um contrato a termo certo anterior, do qual se pode inferir em que data se operou a sua conversão em contrato sem termo.

Reconduzindo-se a fundamentação da correcção à insuficiência documental, isto é, à falta de apresentação de cópias dos contratos, nos casos em que foi comprovada a existência de uma contrato a termo certo, com a junção de cópia dos respectivos contratos, em conjugação com a apresentação dos extratos de declaração de remunerações referentes a 2003, submetidos por comunicação electrónica à Segurança Social, onde constam os mesmos trabalhadores, considerando o prazo estipulado no contrato a termo, pode extrair-se a prova de que se operou a respectiva conversão pelo que, o fundamento da correcção, nesses casos é ilegal por afrontar o disposto no artigo 42.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27/2, como defende a recorrente, não se podendo manter.

É o caso dos trabalhadores identificados em Z), AA), AB), AC) e AD) cujos contratos, operando as renovações legalmente previstas se converteram em contratos sem termo em 11/07/2002, Fevereiro de 2002, 11/11/2003, 20/11/2002 e 22/10/02, este último por força de acordo escrito, conforme resulta do ponto AE) dos factos aditados.

Ora, tendo presente o que se dispõe no n.º 2 do artigo 11.º da LGT, que estatui que «sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm, salvo se outro decorrer directamente da lei», bem como o que supra se deixou dito quanto ao regime do contrato de trabalho sem termo e à admissibilidade dos meios de prova admitidos em Direito, não decorrendo directamente da lei entendimento diverso do exposto, impõe-se concluir que a sentença incorreu em erro de julgamento de direito, ao manter a correcção em apreciação, quanto aos trabalhadores identificados em Z), AA), AB), AC) e AD), cujos contratos a termo se converteram a contratos sem termo, não se podendo manter.

Quanto aos restantes trabalhadores a prova produzida não permite alcançar tal conclusão, pelo que se impõe a improcedência do recurso e em consequência, a manutenção da correcção nessa parte.

O que significa, então, que nos encontramos perante uma procedência parcial, como visto, improcedência mantida por falta de prova dos pressupostos, na medida em que não foi carreada qualquer prova para efeitos da demonstração dos pressupostos, sem que possa, ademais, reclamar-se qualquer violação de princípios constitucionais, mormente, da igualdade.

E por assim ser, há que analisar a questão da ilegalidade da liquidação de juros compensatórios.


*


Nas conclusões l) a n) a recorrente insurge-se contra a manutenção do acto de liquidação de juros compensatórios, alegando que não se verificam os pressupostos previstos no artigo 35.º da LGT.

Anulada parcialmente a correcção em causa nos autos, a liquidação de imposto deve ser anulada na respectiva proporção, pelo que, não ocorre, quanto a tal montante de imposto o requisito essencial previsto no n.° 1 do artigo 35.° da LGT, relativo ao retardamento da liquidação que constituía o fundamento da liquidação de juros compensatórios.

No entanto, subsistindo as demais correcções, já que o recurso foi provido apenas parcialmente, importa aferir se inexiste o juízo de censurabilidade que a recorrente alega.

A recorrente reitera o que invocou na petição inicial, alegando no corpo das alegações que não se verifica o requisito relativo à existência do nexo de causalidade adequada entre o comportamento do sujeito passivo e a falta de recebimento pontual da prestação. A falta de imputabilidade ou culpa decorre do facto de não ter assumido a posição subjacente aos presentes autos por má fé, pois a haver algum imposto em falta, tal deveu-se simplesmente a divergência de critérios entre a Administração fiscal e a Recorrente. Concretiza na conclusão n) que atento o fundamento da correcção, estando legalmente consagrada a liberdade de forma na celebração de contratos sem termo em causa, não é exigível que a recorrente assumisse a posição da AT de que só os contratos reduzidos a escrito serão elegíveis para efeitos da majoração, supondo-se que com tal alegação imputa à sentença a verificação de erro de julgamento.

Conforme decorre do disposto no artigo 35.º, n.º 1 da LGT, são devidos juros compensatórios quando, por facto imputável ao sujeito passivo, for retardada a liquidação de parte ou da totalidade do imposto devido.

Ora, como se refere na sentença recorrida «a liquidação de juros compensatórios depende, da existência de culpa, a qual consiste na omissão reprovável de um dever de diligência, que é de aferir em abstrato (face à diligência de um bom pai de família) e que, por isso, tem de ser apreciada segundo os deveres gerais de diligência e aptidão de um bónus pater famílias – cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, in “Juros nas relações tributárias”, Problemas Fundamentais do Direito Tributário, pág. 145). (…) não são devidos juros compensatórios quando o retardamento da liquidação se ficou a dever, por exemplo, a compreensível divergência de critérios entre a Administração Fiscal e o contribuinte quanto ao enquadramento e/ou qualificação de determinada situação tributária ou a erro desculpável do contribuinte.»

No caso dos autos, pretendendo a recorrente usufruir da majoração decorrente do benefício fiscal previsto no artigo 17.º do EBF, impunha-se-lhe munir-se dos elementos de prova necessários à comprovação dos requisitos inerentes ao benefício, já que, conforme decorre do estatuído no artigo 7.º do EBF, as pessoas «a quem sejam concedidos benefícios fiscais, sejam automáticos, sejam dependentes de reconhecimento, ficam sujeitos a fiscalização da Autoridade Tributária e Aduaneira, para controlo da verificação dos seus pressupostos e ao cumprimento das obrigações de impostas aos titulares do direito aos benefícios

Cabendo-lhe o ónus da prova quanto aos pressupostos do benefício em causa, sendo admissível a prova da contratação sem termo por outros meios de prova, para além do contrato escrito, a verdade é que, à excepção dos casos identificados nos pontos quanto aos trabalhadores identificados em Z), AA), AB), AC) e AD), não logrou comprová-los nos restantes casos. Nessa medida, é-lhe imputável o retardamento por traduzir a omissão reprovável do dever de diligência, por ter deduzido custos com majoração sem se ter munido dos indispensáveis meios de prova do direito que invocou, ao preencher a declaração de rendimentos nos termos em que o fez, dando lugar ao retardamento na liquidação do imposto na parte que não foi objecto de anulação.

Impõe-se assim, julgar parcialmente improcedentes as conclusões l) a n) na parte em que não logrou obter a anulação das correcções impugnadas e manter a liquidação de juros compensatórios na parte subsistente, porquanto, como visto, não padece de qualquer ilegalidade..


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Por fim, importa apreciar a conclusão o) na qual a recorrente se insurge contra o facto de na sentença recorrida ter sido julgada prejudicada a apreciação dos juros indemnizatórios peticionados relativamente ao montante de imposto e de juros compensatórios pagos.

Alega que se verificam os pressupostos previstos no artigo 43.º da LGT, relativos ao pagamento de imposto em montante superior ao devido, resultante de erro imputável aos serviços.

A sentença recorrida declarou que «resulta prejudicado o conhecimento do pedido de juros indemnizatórios relativo à quantia de imposto pago, bem como quanto aos respetivos juros compensatórios, por se ter concluído que o pagamento do imposto apurado era devido, e porque o retardamento do apuramento do mesmo é imputável à Impugnante, improcedendo a presente impugnação judicial em tudo quanto vem peticionado, salvo quanto à ilegalidade da liquidação de juros compensatórios nº 2007 1992474, relativamente à qual se concluiu pela inutilidade superveniente da lide por satisfação da pretensão da Impugnante.»

Apesar de declarar prejudicado o conhecimento do pedido de condenação a AT no pagamento de juros indemnizatórios, o Tribunal acabou por julga-lo improcedente, fazendo reflectir esse julgamento no segmento decisório, julgando «improcedente a presente impugnação judicial no que se refere à liquidação adicional de IRC do exercício de 2003, bem como a liquidação dos respectivos juros compensatórios, improcedendo consequentemente, o pedido de juros indemnizatórios».

Tal decisão foi tomada no pressuposto de que o pagamento do imposto apurado era devido e o retardamento apurado do mesmo foi imputável à ora recorrente.

Ora, como se deixou dito supra o recurso foi julgado parcialmente procedente, com a correspondente procedência parcial quanto aos juros compensatórios.

Tendo em conta que a recorrente logrou obter vencimento parcial na acção e que a anulação parcial da liquidação de IRC e dos correspondentes juros compensatórios, foi determinada em última análise por erro nos pressupostos de facto e de direito, estamos em presença de erro vício que, nos termos do disposto no artigo 43.º, n.º 1 da LGT, configura erro imputável aos serviços de que resultou pagamento de imposto superior ao devido.

Tal erro confere ao recorrente o direito a juros indemnizatórios, na parte em que logrou obter vencimento no recurso, pelo que também neste segmento do recurso lhe assiste parcialmente razão.


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A decisão que julgue a acção ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da acção, quem do processo tirou proveito.

Atento o provimento parcial do recurso e a procedência parcial da acção, as custas ficam a cargo de ambas as partes em ambas as instâncias (cf. n.ºs 1 e 2 do artigo 527.º do CPC ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT e artigo 6.º, n.º 2, do Regulamento das Custas Processuais) na proporção de 60% para a Fazenda pública e de 40% para a recorrente.


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IV – Conclusões

I – A fundamentação tem de ser contemporânea do acto que determina;

II – A fundamentação do acto de liquidação resultante da acção de inspecção é a que constado relatório de inspecção, não valendo como fundamentação do acto tributário a sua posterior densificação;

III - A prova da celebração dos contratos de trabalho sem termo não carece de forma escrita, sendo admissíveis todos os meios de prova em Direito permitidos.




V - DECISÃO


Termos em que, acordam os juízes da Subsecção Comum de Contencioso Tributário do TCA Sul em conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional, revogar parcialmente a sentença na parte recorrida e julgar a impugnação parcialmente procedente:

i) Anulando as correcções relativas aos contratos referidos em P), T), Z), AA), AB), AC) e AD) da matéria de facto e, em consequência, mantendo as demais;

ii) Anulando parcialmente as liquidações de imposto e de juros compensatórios na parte proporcional, à ajuizada ilegalidade, e descrita no ponto i), mantendo-se no demais;

iii) Reconhecendo o direito ao pagamento de juros indemnizatórios com a consequente condenando da AT ao seu pagamento na parte respeitante às liquidações anuladas desde a data do pagamento até ao processamento da nota de crédito.


Custas pelas partes na proporção de 60% para a Fazenda pública e de 40% para a recorrente Fazenda Pública.


Lisboa, 19 de Outubro de 2023.



Ana Cristina Carvalho - Relatora


Susana Barreto – 1ª Adjunta


Patrícia Manuel Pires – 2ª Adjunta