Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1368/12.1 BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:09/13/2023
Relator:VITAL LOPES
Descritores:OPOSIÇÃO
REVERSÃO
CULPA
Sumário:I - Concretizada a reversão ao abrigo do art.º 24.º, n.º 1 da LGT, a culpa do gestor na situação de insuficiência patrimonial da SDO para solver a dívida ou na situação de falta de pagamento ou entrega da prestação tributária, deve ser apreciada em relação ao crédito tributário que sobrevem à liquidação, não relevando eventuais causas excludentes da culpa do gestor no extravio/ dissipação dos elementos de contabilidade necessários ao apuramento da matéria tributável.
II - Não sendo invocado fundamento válido de oposição à execução fiscal (porque a alegada ausência de culpa respeita à constituição da obrigação tributária, fundamento de impugnação judicial, e não ao crédito tributário, fundamento de oposição) a consequência é de improcedência da oposição, que não o erro na forma do processo.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:1 – RELATÓRIO

O Exmo. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a oposição deduzida por J… e M…. à execução fiscal n.º 3131201201028359 contra si revertida e originariamente instaurada contra “L… Assistência Técnica e Venda de Equipamentos Hoteleiros, Lda.” por dívidas de IVA de 2008 e respectivos juros compensatórios, perfazendo o valor total de 25.593,58€.

O Recorrente conclui as doutas alegações assim:
«
4.1. Visa o presente recurso reagir contra a decisão que julgou procedente a Oposição judicial, intentada, pelo ora recorrido contra execução fiscal com o processo n.º 3131201201028359, instaurados pelo Serviço de Finanças de Amadora 1, por dívida de IVA contra a sociedade comercial “L… – Assistência Técnica e Venda de Equipamentos Hoteleiros, Lda.”, referente ao ano de 2008, divida essa posteriormente revertida na ora oponente, no montante total de 25.593,58 €.
4.2. Como fundamentos da oposição invocou o oponente no seu petitório inicial, em suma:
- A falta de culpa sua pela não apresentação da documentação solicitada pela Administração Tributária, pelo que inexiste qualquer responsabilidade pela dívida exequenda;
- No ano de 2011, apresentou no serviço de finanças um pedido de reembolso em sede de IVA;
- Em 18/2/2011, foi iniciada uma ação inspetiva tributária à Sociedade L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda., na qual foram solicitados elementos ao Oponente na qualidade de Administrador, para a verificação do pedido de reembolso;
- A contabilidade da sociedade estava entregue ao Técnico Oficial de Contas (TOC) S…;
- Em 16/12/2008, a Sociedade L… encerrou a sua atividade para efeitos de IVA e IRC e toda a documentação contabilística e fiscal da sociedade ficou na posse do técnico oficial de contas;
- O Técnico Oficial de Contas desapareceu no ano de 2009 e apesar das inúmeras diligências para o encontrar realizadas pelo Oponente nunca foi encontrado.
Concluiu o seu articulado inicial peticionando a procedência da oposição, sendo o oponente “declarado não responsável por qualquer dívida exequenda”.
4.3. o Ilustre Tribunal “a quo” julgou a procedente a presente oposição, considerando, para o efeito, que “… deve considerar-se ilidida a presunção de culpa que recaía sobre o Oponente, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, e, em consequência, determinar-se, a extinção da execução fiscal contra si instaurada”, concluindo pela “… ausência de culpa na insuficiência do património da devedora originária para pagamento das dívidas”.
No entanto,
4.4. é entendimento da Fazenda Pública que a decisão ora recorrida, não perfilhou, com o devido respeito, e salvo sempre melhor entendimento, a acertada solução jurídica no caso sub-judice.
Senão vejamos:
4.5. Entendeu o Ilustre Tribunal a quo, na decisão ora em crise, não se ter in casu verificados os pressupostos legais de cuja verificação depende a reversão, nomeadamente, não se ter verificado o pressupostoda culpa do oponente pela insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária, por o oponente ter logrado ilidir “… a presunção de culpa que recaia sobre o Oponente, nos termos da alínea b) do n.º 1do artigo 24.º da LGT…”.
Ora,
4.6. Antes de mais, e em primeiro lugar, entende a Fazenda Pública que, atendendo ás causas de pedir e ao pedido de tutela jurisdicional aduzidas pelo oponente no seu petitório inicial, a presente oposição, com o devido respeito e s.m.e., só poderia ser julgada improcedente, por infundada.
Senão vejamos:
4.7. Se atentarmos na narração do articulado inicial do oponente, este alega factos e circunstâncias que contendem não com a certeza, exigibilidade e liquidez da dívida exequenda, mas antes factos e circunstâncias que poderão contender com a legalidade da acto tributário praticado pela Administração Tributária que, posteriormente, originou a dívida exequenda.
4.8. Tais factos e circunstâncias alegados pelo oponente – contendentes com a legalidade do acto tributário que consubstanciou, posteriormente, da dívida em execução – poderiam ser objecto de apreciação jurisdicional em sede de impugnação judicial.
No entanto,
4.9. não se vislumbra, nos termos do artigo 204.º do CPPT, que a legalidade da dívida possa ser objecto de apreciação judicial em sede de oposição judicial à execução.
Pelo que,
4.10. no entendimento da Fazenda Pública, verifica-se uma inadequação do meio processual de oposição para o conhecimento do pedido aduzido pelo oponente, atendendo às causas de pedir por ele aventadas no petitório inicial.
4.11. Assim, não sendo a oposição judicial o meio processual adequado para o conhecimento do pedido formulado pelo oponente, sendo-o antes a impugnação judicial, e não sendo possível então a convolação da oposição em impugnação judicial, deveria o Ilustre Tribunal a quo julgar a oposição improcedente, por infundada, pois que, de acordo com os factos e as circunstâncias alegadas pelo oponente na petição inicial, não se vislumbra que estas se enquadrem em algum dos fundamentos constantes do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.
4.12. Ao assim não entender, o Ilustre Tribunal recorrido, sempre com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, incorreu em erro de julgamento, violando o disposto no artigo 204.º do CPPT.
Por outro lado,
4.13. conforme melhor se pode colher da fundamentação da decisão pela qual o órgão de execução fiscal decidiu reverter as dívidas tributárias da sociedade executada no oponente, ora recorrido, este foi revertido por ter o órgão de execução fiscal considerado que o oponente seria responsável por tais dívidas nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT.
4.14. Ora, da factualidade tida por provada na sentença ora em crise não se pode concluir que o oponente logrou demonstrar a ausência de culpa sua, enquanto gerente da sociedade executada, pelo não pagamento do IVA em questão por parte desta.
4.15. Quando muito, da factualidade provada poder-se-ia concluir que o oponente não terá tido culpa pela não entrega, por parte da sociedade executada, dos documentos a esta solicitados pelos serviços de inspeção tributária da Administração Tributária em sede de procedimento inspectivo. Ou seja, em momento anterior à conformação do acto tributário em questão.
4.16. Mas essa seria matéria a ser apreciada em sede de procedimento gracioso ou, já em sede jurisdicional, em impugnação judicial – o que, note-se, não aconteceu – mas jamais em sede de oposição judicial.
4.17. No que à reversão da dívida de IVA em questão no ora oponente diz respeito, sendo esta efectuada nos termos do disposto na al. b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, restaria ao oponente, para que não fosse subsidiárimamente responsabilizado por tal dívida, demonstrar que não teve culpa no não pagamento atempado do IVA ao estado por parte da sociedade da qual era gerente.
4.18. dos factos tidos por provados na sentença ora em apreciação não se vislumbra qualquer um que faça alusão à sorte que foi sendo dada ao património da sociedade executada. Não existindo qualquer facto, tido por provado, que verse sobre a situação patrimonial da devedora originária durante o exercício do cargo de gerente desta por parte do oponente, nenhum juízo de valor se pode fazer relativamente à actuação do oponente, no que situação patrimonial da sociedade executada diz respeito.
4.19. Assim sendo, e à revelia do entendido no decisório ora em crise pelo Ilustre Tribunal recorrido, com o devido respeito e s.m.e., da factualidade tida por provada jamais se poderia concluir pela ausência de culpa do oponente na insuficiência do património da devedora originária para pagamento das dívidas.
4.20. Ao assim não entender, e ao concluir que nenhuma culpa se pode assacar ao oponente pela insuficiência patrimonial da sociedade executada, bem como se que o oponente ilidiu a presunção de culpa que sobre ele impendia, nos termos do disposto na al. b) do n.º 1 do artigo 24.º da LGT, o Ilustre Tribunal a quo, no modesto entendimento da Fazenda Pública e salvo sempre melhor entendimento, incorreu em erro de julgamento, violando o disposto no artigo 24.º, n.º 1, alíneas a) e b), da LGT.
Razão pela qual,
4.21. com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, deve ser revogada a decisão ora recorrida, com as legais consequências daí decorrentes.
Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e costumada
JUSTIÇA!»


Foram apresentadas contra-alegações, que culminam com as seguintes conclusões:
«
A. Não tem razão a Recorrente.

B. Porque o meio adequado para reagir à reversão é a oposição judicial.

C. Conforme assumido pela jurisprudência dos nossos tribunais.

D. E porque o Oponente logrou ilidir a presunção de culpa que sobre si impendia.

E. Como se refere na mui douta sentença.

Assim, pelos factos e fundamentos expostos, deve o presente recurso ser considerado improcedente por falta de fundamento.».

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu mui douto parecer concluindo que o recurso deverá improceder e deverá ser mantida a sentença recorrida, em suma, no entendimento de que o oponente logrou ilidir a presunção de culpa na falta de pagamento ou entrega da prestação tributária, prevista na alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da Lei Geral Tributária.

Com dispensa de vistos dada a simplicidade das questões a resolver, vêm os autos à conferência para decisão.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão essencial que importa resolver reconduz-se a saber se a sentença incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, ao concluir que o oponente logrou ilidir a presunção de culpa na falta de pagamento ou entrega da prestação tributária prevista na alínea b) do n.º1 do art.º 24.º da LGT, em que se apoiou de direito a reversão, sem olvidar a questão do invocado erro na forma do processo.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:
«
Consideram-se documentalmente provados os seguintes factos, relevantes para a decisão da causa:
1. Em 10/07/1996, foi constituída a sociedade por quotas sob a Firma “L…. ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.” e nomeados gerentes os dois sócios J… e P… (cf. certidão conservatória constante de fls. 2 do Processo de execução fiscal de ora em diante designado abreviadamente de PAT).
2. A sociedade identificada no ponto que antecede, obrigava-se com a assinatura de um dos dois gerentes (cf. certidão conservatória constante de fls. 2 PEF).
3. Entre 18/2/2011 e 14/9/2011, a Administração Tributária realizou uma inspeção tributária de âmbito parcial em sede de IVA à Sociedade “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.”, na sequência do pedido de reembolso, referente ao período de 08/12T (cf. Relatório de inspeção constante a fls. 66 do PEF).
4. Em 13/5/2011, a Direção de Finanças de Lisboa, Serviço de Inspeção Tributária enviou ao oponente J…, o oficio constante de fls. 66 dos autos, cujo conteúdo se dá por reproduzido (cf. comprovativo do registo a fls. 67 dos PEF) da qual consta em síntese o seguinte:
“(…)
Tendo-se iniciado o procedimento interno de inspecção, relativamente ao pedido de reembolso do período 08.12T, no valor de €1 316,53, notífica-se V.a Ex.a, em conformidade com o n.° 4 do art.° 59° da Lei Geral Tributária e artigos 28° e 48° do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, para proceder à remessa a este Serviço - morada infra no prazo máximo de 10 (dez) dias, fazendo menção dos dados constantes na N/ Referência dos seguintes elementos e/ou esclarecimentos:
1. Descrição concreta da actividade exercida.
2. Justifique devidamente a origem do crédito que produz o reembolso..
3. Cópia de documentos de Iva dedutível de valor mais significativo de 2008.
4. Cópia dos mapas de amortização do imobilizado.
5. Cópia dos documentos de venda das existências e do Imobilizado à data da cessação.
NOTA: Na resposta, os elementos solicitados deverão vir individualizados e devidamente referenciados, com o n° e data do presente ofício e com menção do n° de contribuinte.
Para maior facilidade no esclarecimento de eventuais dúvidas, solicita-se que seja indicado número de telefone para contacto.
A falta de apresentação no prazo indicado, do solicitado anteriormente, é fundamento para o indeferimento do pedido de reembolso do IVA, nos termos do n° 11 do artigo 22° do Código do IVA.
(…)”
5. O oponente em resposta ao oficio descrito no ponto que antecede referiu que o contabilista da sociedade desapareceu para parte incerta, motivo pelo qual não possui qualquer documento que serviu às deduções efetuadas e constantes das declarações periódicas do ano de 2008 (cf. manuscrito contante a fls. 68 do PEF).
6. Em 17/8/2011, a Direção Geral dos Impostos emitiu a certidão constante de fls. 59 do PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido, na qual atesta que a gerência da L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.”, tem a situação tributária regularizada e que não é devedora à Fazenda Nacional de quaisquer impostos.
7. Em 8//8/2011, o oponente na qualidade de gerente da “L…” enviou ao Conselho Diretivo da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, o requerimento constante de fls. 56 do PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido, com o assunto: “Desconhecimento do Paradeiro de S….” da qual consta em síntese o seguinte:
“(…)
Depois de todas as tentativas que temos enveredado para contatar referido TOC, de que se juntam cartas registadas c/ AR, não conseguimos contatar nem ser contatado, até à data.
Como, referido TOC possui toda a documentação da empresa “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.” (…) e esta empresa encontra-se num processo de dissolução, a Direção de Finanças tem-nos notificado p/ procedermos à apresentação de variada documentação (cartas anexas) sem que tenhamos a mínima possibilidade de cumprirmos os nossos deveres fiscais.
(…)”
8. Em 2/11/2011, a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas enviou à “L…” o oficio constante de fls. 57 dos PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido, com o assunto: “Remessa para o Conselho Disciplinar – V/participação contra o TOC n.º 19364, S….”.
9. Em 27/11/2009 e 24/6/2011, o oponente na qualidade de gerente da “L…. ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.” enviou cartas registadas a S… a solicitar contacto e a documentação da sociedade nos termos constantes de fls. 43 a fls. 54 do PEF
10. Em 29/3/2012, o Serviço de Finanças da Lisboa instaurou contra a sociedade “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda., o processo de execução fiscal (PEF) n.º 3131201201028359, por falta de pagamento de liquidação oficiosa de IVA do ano de 2008 e juros compensatórios no valor total de EUR 23.509,83, com data limite de pagamento de 28/2/2012 (cf. certidão de divida a fls. 2 do PEF).
11. Em 25/9/2012, o chefe do Serviço de Finanças da Amadora emitiu a informação constante de fls. 39 e 40 do do PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido, da qual consta em síntese o seguinte:
“(…)
3131201201028359-L…. ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS LDA.
INFORMAÇÃO
Cumpre-me informar que, em face das diligências processuais que antecedem, nomeadamente consulta às aplicações informáticas do Património, SIPA e CEAP, que não são conhecidos bens penhoráveis à executada.
Mais informo que, de acordo com os elementos constantes dos arquivos deste Serviço de Finanças, a executada teve os seguintes órgãos sociais:
(IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS)
Mais informo que o presente processo executivo corre termos, pelas importâncias a seguir discriminadas constantes na relação anexa à presente informação e cópias das certidões de dívidas.
PROJECTO DE REVERSÃO
Em face das diligências que antecedem, verifica-se a inexistência de bens penhoráveis ao executado —L… « Assistência Técnica e Venda de Equipamentos Hoteleiros Lda., Com o NIF.503…. e sede na Pc Á…. 1…. A-2….Amadora.
Não havendo bens da devedora originária, que respondam pelo pagamento da divida, estão pois verificadas as condições previstas nos termos do n.° 2 do art.° 153.° do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), para o chamamento à execução, dos responsáveis subsidiários, de acordo com a legislação em vigor no momento do exercício do seu cargo e no momento de constituição de responsabilidade, revertendo assim contra estes a execução.
Existem dois momentos relevantes para a constituição da responsabilidade subsidiária, a saber, o momento de formação do facto tributário, que está na origem da dívida e o momento da obrigação de pagamento, pelo que, considerando o(s) período(s) aqui em causa, temos como enquadramento(s) legal (is):
1. Relativamente ao facto tributário:
Verifica-se que o facto tributário ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea a) do n.° 1 do seu art.° 24.°, os gerentes e administradores serão subsidiariamente responsáveis pelas dividas da sociedade, mediante prova de culpa a efectivar pela Administração Tributária. Como não dispõe este Serviço de Finanças de elementos que permitam concretizar a referida prova,não é possível efectuar a responsabilidade latente.
2. Relativamente à obrigação de pagamento:
Verifica-se que a obrigação de pagamento ocorreu já na vigência da Lei Geral Tributária (LGT), assim, nos termos da alínea b) do n.° 1 do seu art.° 24.°, os gerentes e administradores que exerçam, ainda que somente de facto, funções de gestão em pessoas colectivas ou equiparadas, serão subsidiariamente responsáveis pelas dividas tributárias cujo prazo legal de pagamento tenha terminado no período de exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Assim, em face da informação que antecede e considerando os momentos de constituição da responsabilidade subsidiária, ao conjugar estes com a legislação então vigente temos que são solidariamente responsáveis pelo pagamento das dívidas:
P….
J…
Face ao disposto no n° 4 do art° 23° e do art° 60° da Lei Geral Tributária (LGT), proceda-se à notificação e3do(s) interessado(s), para efeitos do exercício do direito de audição prévia, fixando-se o prazo de 10 dias a contar da notificação, devendo aquela ser exercida por escrito.
(…)”
12. Em 15/9/2012, no âmbito do PEF n.º 3131201201028359, o Chefe do Serviço de Finanças da Amadora, emitiu o projeto de reversão da divida total de EUR 25.509,83, contra o ora oponente, nos termos constantes de fls. 41 e 42 do PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido.
13. Em 10/9/2012, o Oponente exerceu o direito de audição prévia nos termos constantes de fls. 43 a fls. 47 do PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido, no qual pôs em causa a sua responsabilidade sobre as dividas exequendas por ausência de culpa, face ao desaparecimento do TOC da Sociedade devedora originária com toda a documentação da empresa e aos esforços realizados para o encontrar.
14. Em 29/10/2012, o Serviço de Finanças de Lisboa emitiu a informação constante de fls. 74 do PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido, da qual consta o seguinte:
“(…)
Ao analisar os presentes autos verifica-se que os mesmos foram preparados para a audição previa nos termos do art°60 da LGT, em virtude da devedora original ter dividas e não ter bens em seu nome susceptíveis de serem penhorados para garantia do pagamento dos presentes autos. Verifica-se também que a devedora original cessou a sua actividade para efeitos de Iva e para efeitos de IRC em 2008-12-16.
O revertido vem alegar que não tem quaisquer responsabilidades sobre o pagamento de IVA, referente ao ano de 2008 no valor de (no valor dê) €23 509,83, visto que quando os serviços da Inspecção Tributária lhe solicitou informações as mesmas foram prestadas de acordo com os elementos que o gerente tinha disponível.
Assim este serviço em 2012-10-11, solicitou fotocópia do relatório elaborado por aquele serviço no sentido de ter mais elementos para se poder analisar os presentes autos.
Porém de acordo com os elementos constantes do relatório dos autos, elaborado pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, o mesmo alega que, a presente inspecção teve inicio quando o devedor original solicitou um reembolso do IVA do período 0812T no valor de €1 316,53, e os serviços lhe solicitaram provas documentais do IVA dedutível desse período de 2008 e as mesmas não foram apresentadas. Logo aquele serviço concluiu que o reembolso do IVA no valor de €1316,53 deveria ser indeferido, devendo-se manter as correcções propostas no valor de €21 814,05.
Como o revertido não trouxe elementos novos, na audição previa que possam alterar a reversão contra o mesmo, sou de opinião que os autos devem prosseguir a reversão contra o revertido J…
(…)”
15. Em 29/10/2012, no âmbito do PEF n.º 3131201201028359, o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa, proferiu o despacho de reversão contra o Oponente nos termos constantes de fls. 84 e 75 do PEF, cujo conteúdo se dá por reproduzido, com fundamento na informação que antecede e respetivo projeto de decisão.
16. Em 19/8/2019, o Conselho Jurisdicional da Ordem dos Contabilistas Certificados, no âmbito do processo disciplinar proferiu o Acórdão n.º 4601/18, constante de fls. 160 a fls. 165 dos autos em suporte de papel, cujo conteúdo se dá por reproduzido, no qual julgou várias participações realizadas contra S… e decidiu relativamente à participação realizada por “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.” o seguinte:
“(…)
a) À data em que a denúncia deu entrada no Conselho Disciplinar, nomeadamente em 2011/10/25, a sociedade participante Já se encontrava extinta, por torça do registo de dissolução e encerramento da sociedade que ocorreu em 2008/01/15.
b) De acordo com o disposto no art° 160.º n°, 2 do Código das Sociedades Comerciais, com o registo de encerramento da liquidação, a sociedade extingue-se, ou seja, deixa de existir a pessoa coletiva, que assim perdeu a sua personalidade jurídica e Judiciária.
c) Conclui-se assim, que a sociedade participante encontrava-se já extinta quando participou á então OTOC os factos objeto da denúncia, pelo que, dúvidas não existem de que a participação foi apresentada por entidade que não tem personalidade Jurídica nem personalidade judiciária, impondo-se assim, o arquivamento da mesma.
VII - PROPOSTA
Face ao exposto. proponho o arquivamento do presente processo disciplinar, atendendo ao seguinte:
a) A prescrição do procedimento disciplinar relativamente à denúncia apresentada por F…, por si e na qualidade de legal representante da sociedade „"F…. Despachante Oficial, Unipessoal, Lda. “;
b) Ao pagamento das quotas em dívida â data da apensação da denúncia do Conselho Diretivo ao presente processo; e,
c) À extinção da sociedade "L…- Assistência Técnica e Venda de Equipamentos Hoteleiros, Lda.*, por força do registo de dissolução e encerramento que ocorreu em data anterior à denúncia apresentada no então Conselho Disciplinar.
(…)”
17. A contabilidade da “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.” estava entregue a o Técnico Oficial de contas S….(cf. depoimento da testemunha M…).
18. A documentação contabilística e fiscal da sociedade ficou na posse do TOC S… (cf. depoimento da testemunha M…).
19. Em 8/7/2008, a Sociedade “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.” encontrava-se pendente de dissolução administrativa (cf. certidão constante a fls. 38 do PEF).
20. Em 16/12/2008, foi registada a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, Lda.” (cf. certidão constante a fls. 38 do PEF).
*
Não se provaram outros factos com relevo para a decisão da causa.
*
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos, não impugnados, e, bem assim, no depoimento da testemunha arrolada M…, que prestou depoimento com aparente isenção e credibilidade, conforme é especificado nos vários pontos do probatório».

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Como ressalta dos autos e do probatório, já após o registo da dissolução e encerramento da liquidação da sociedade devedora originária – “L… ASSISTÊNCIA TÉCNICA E VENDA DE EQUIPAMENTOS HOTELEIROS, LDA.” – em 16/12/2008 (cf. certidão da CRC, a fls.38 do apenso de execução e ponto 20 do probatório), foi efectuada reversão contra o oponente por dívidas sociais no valor de 23.509,83€, provenientes de IVA e respectivos juros compensatórios referenciados a períodos de 2008, com data limite de pagamento/ entrega em 28/12/2012 (cf. projecto e despacho de reversão e citação, pontos 11 e 15 do probatório e fls.77 do apenso).

O oponente, na douta P.I. questiona a legalidade da reversão ao abrigo do art.º 24.º da Lei Geral Tributária, mas unicamente com fundamento em que a situação de falta de entrega dos documentos solicitados na acção inspectiva, de que viriam a resultar as liquidações exequendas, não decorre de culpa sua, nem lhe é imputável, sendo responsável o T.O.C. da sociedade devedora originária, de quem não foi possível, apesar de várias diligências nesse sentido, reaver a documentação contabilística da empresa.
+ºçA sentença acolheu os argumentos do oponente quanto à ausência de culpa sua na situação de insuficiência do património da devedora originária para solver as dívidas, com o que se não conforma a recorrente Fazenda Pública.

E, realmente, com os factos constantes do probatório e pertinentes à apreciação da culpa – os vertidos nos pontos 4 a 9 e 16 a 20 – também nós não podemos acompanhar a sentença recorrida na conclusão a que chegou de que “o oponente provou que enquanto gerente da sociedade, actuou com diligência e prudência, através de actos positivos para encontrar o T.O.C., que de forma errática desapareceu com a documentação relativa à sociedade”.

E, isso, pela elementar razão de que os factos respeitantes a uma eventual ausência de culpa no cumprimento de obrigações tributárias acessórias (art.º 31/2 da LGT), em nada se relacionam com a ausência de culpa na situação de insuficiência patrimonial da devedora originária para solver as dívidas, ou com a não imputabilidade da falta de pagamento ou entrega do imposto, que são os pressupostos a que a lei manda atender na concretização da reversão ao abrigo do n.º 1 do art.º 24.º da Lei Geral Tributária.

Com efeito, a ausência de elementos de contabilidade necessários ao apuramento da matéria tributável por invocadas razões que não se prendem com a actuação do gerente e revertido oponente respeitam à constituição da obrigação tributária “stricto sensu” mas não respeitam ao crédito tributário, que ocorre em momento posterior com a liquidação e relativamente ao qual tem de ser ajuizada a culpa do gerente, seja na situação de insuficiência patrimonial da devedora originária para a sua satisfação, seja na situação de falta de pagamento ou entrega da prestação tributária (vd. artigos 29.º, 31.º e 88.º, alínea a), da LGT).

Nesta linha de entendimento, há que convir que o oponente, aqui recorrido, nada de convincente demonstrou que permita alijar a sua culpa, seja na situação de insuficiência patrimonial da sociedade devedora originária para satisfação da dívida, seja na situação de falta de pagamento ou entrega da prestação tributária, sendo certo que o ónus de prova era seu (artigos 342/1 e 344/1, do Código Civil), de acordo com o fundamento jurídico em que se apoiou a reversão (alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º), que não é discutido nos autos.

Antes de terminar, apenas uma palavra quanto ao invocado erro na forma do processo e propugnada convolação para processo de impugnação judicial.

Como é pacífico na jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, o erro na forma do processo, nulidade decorrente do uso de um meio processual inadequado à pretensão de tutela jurídica formulada em juízo, afere-se pelo pedido.

Se o pedido formulado na P.I. é o de que «…deve ser julgada provada e procedente a presente oposição e, em consequência, ser o oponente declarado não responsável pela dívida exequenda», mais se referindo no corpo do articulado que é deduzida oposição à execução nos termos do art.º 204.º do CPPT, é manifesto que o pedido só pode ser interpretado como sendo próprio de oposição.

Já saber se as causas de pedir aduzidas podem ou não suportar esse pedido é matéria que se situa no âmbito da procedência. Por isso, com o fundamento de que as causas de pedir invocadas não são adequadas ao pedido formulado poderá decidir-se no sentido da improcedência da acção, mas não no sentido da verificação do erro na forma do processo.

Parafraseando o acórdão da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de 28 de Março de 2012, proferido no processo com o n.º 1145/11 (Publicado no Apêndice ao Diário da República de 18 de Abril de 2013 (http://dre.pt/pdfgratisac/2012/32210.pdf), págs. 402 a 409, também disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/4ee18297540be732802579df0033cd10?OpenDocument.), a circunstância de as causas de pedir gizadas não constituírem, porventura, fundamentos válidos de oposição à execução fiscal, não constitui motivo para dar por verificada uma nulidade processual por erro na forma de processo, mas, ao invés, motivo para a improcedência do pedido com base nessa causa de pedir.

Neste ponto, não assiste razão ao Recorrente.

Tudo visto, concluímos que a sentença incorreu em erro de julgamento, não podendo manter-se na ordem jurídica.

O recurso merece provimento.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a oposição improcedente.

Condena-se o Recorrido em custas.

Lisboa, 13 de Setembro de 2023



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Vital Lopes




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Luísa Soares




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Tânia Meireles da Cunha