Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:49/18.7 BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:11/02/2023
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:IVA.
ANULAÇÃO PARCIAL
Sumário:A procedência de vício que atinge apenas parte da liquidação adicional origina a sua anulação parcial.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
I- Relatório
L..................... Expresso ......................, Lda., deduziu impugnação judicial da decisão que indeferiu a reclamação graciosa apresentada contra os atos de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), do exercício de 2013, no valor total de €8.994,54, peticionando a sua anulação com a consequente restituição do imposto pago, acrescido dos juros devidos.
O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls.413 e ss. (numeração do processo em formato digital-sitaf), datada de 23/03/2021, julgou a acção procedente e, em consequência, anulou as liquidações impugnadas.
Desta sentença foi interposto o presente recurso em cujas alegações de fls. 436 e ss. (numeração do processo em formato digital - sitaf), a recorrente, Fazenda Pública, alegou e formulou as conclusões seguintes:
«I – O presente recurso é interposto da sentença proferida nos autos, no qual foi determinada a anulação total dos atos tributários impugnados.
II – Da ação inspetiva credenciada pela OI201500185, foram efetuadas correções através de avaliação direta e avaliação indireta, as quais, na sua devida proporção, influenciaram as liquidações adicionais de IVA impugnadas.
III – Os vícios apontados às liquidações de IVA reportam-se apenas à avaliação efetuada por métodos indiretos.
IV – Nada tendo sido suscitado com referência às liquidações adicionais de IVA resultantes de avaliação direta e sendo aquela determinável, deverão subsistir os atos tributários impugnados, ainda que parcialmente, na parte correspondente às correções de natureza meramente aritmética.
V – Assim, se salvaguardará devidamente o caráter subsidiário da avaliação indireta, em conformidade com o disposto no número 1 do artigo 85º da Lei Geral Tributária.
VI – Será essa a solução que melhor se coaduna com o caráter divisível do ato tributário, aceite, quer na jurisprudência, quer na doutrina.»

Pugna pela procedência do recurso e consequente manutenção do acto tributário, na parte não impugnada.

X
A Sociedade Impugnante, ora recorrida, apresentou nas contra-alegações, insertas a fls. 619 ss. (numeração do processo em formato digital-sitaf), as seguintes conclusões:
«1.ª
Não assiste qualquer razão à impugnante na invocação da subsistência dos actos impugnados, ainda que parcialmente, na parte alegadamente correspondente a correcções de natureza aritmética.
2.ª
Esta questão nova, colocada em sede de recurso, que não fez parte do objecto do processo, nem incluída nas questões a resolver e que tem a sua sustentação numa posição oposta ao que antes fora alegado pela AT em sede de contestação, não é admissível.
3.ª
Ainda que, em tese, fosse defensável o alegado pela AT, impunha-lhe a lei ab initio que tivesse procedido à liquidação de dois actos tributários distintos, ou seja, um referente às alegadas correcções técnicas e outra referente aos valores apurados por meio de métodos indirectos.
4.ª
Provando os autos que a impugnante atacou os actos de liquidação como notificados à impugnante, bem andou a douta sentença recorrida ao anular na totalidade os actos impugnados, pois não podia substitui-se à AT e apurar a matéria colectável e proceder à respectiva liquidação e ainda porque a anulação parcial não pode ter lugar se o acto de liquidação tiver apenas um fundamento jurídico e não seja possível distinguir uma parte do acto conforme à lei e outra que a viola, mesmo que se entenda que uma liquidação poderia ter lugar, com base noutras disposições.
5.º
Nem podia a douta sentença recorrida ter decidido de outro modo e cuja fundamentação, por economia aqui se dá por integralmente reproduzida, porque a ilegalidade afectava o acto tributário no seu todo e não apenas em parte.
6.º
Sem prescindir, no âmbito do direito tributário a retificação ou aproveitamento do ato tributário pelo Tribunal é de todo inadmissível, não se aplicando o princípio do aproveitamento do ato administrativo, porque, não existe qualquer disposição legal que o preveja e, caso fosse aplicável, violaria o direito de impugnação contenciosa de atos lesivos constitucionalmente consagrado no art.º 268º, n.º 4 da CRP; a garantia constitucional de acesso aos tribunais consagrada no art.º 20º da CRP e o princípio da separação de poderes previsto no art.º 111º da CRP.
7.ª
Sem prescindir, a retificação de atos administrativos prevista no art. 148º do CPA visa a retificação de atos administrativos na fase do procedimento administrativo e não no âmbito do contencioso tributário ou da impugnação dos atos, uma vez que na fase de impugnação judicial (contencioso tributário) a AT só pode “corrigir” “retificar” e “revogar” os atos tributários objeto de impugnação judicial, no prazo de 30 dias previsto para a organização do processo administrativo na sequência da citação para contestar, sob pena da revogação do ato impugnado ser considerada ilegal (art.º 111º nº1 e 112º do CPPT).»
8.ª
Ainda sem prescindir, e caso assim não fosse, sempre seria procedente a impugnação, determinado a anulação dos actos tributários impugnados, pelos demais vícios aduzidos na petição inicial de violação de lei por violação de possibilidade de suprimento contida na al. a) do n.º 1 do artigo 88.º da LGT e vício de forma, por falta de fundamentação.»

Pugna pela manutenção do julgado.

X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal notificado para o efeito, emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso e, em consequência, manter-se a sentença recorrida.
X
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
X
II- Fundamentação
2.1. De Facto.
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto:”
1. Em 07.06.2016 a inspectora tributária dos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Castelo Branco elaborou o “Relatório de Inspecção Tributária” cuja cópia de fls. 24 a 38 aqui se dá por reproduzida e transcreve parcialmente: “(…)
IV – Motivo e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos

Em 7 de Dezembro de 2015 foi a sociedade notificada na pessoa da sua sócia gerente para apresentar, no dia 22 de Dezembro de 2015, pelas dez horas, os seguintes elementos:
- listagem, por loja, de todas as facturas, vendas a dinheiro e notas de crédito emitidas no ano 2012 na qual constem o n.º e tipo de documento comercial, a data de emissão, os montantes da base de imposto e de IVA e a descrição do serviço prestado.;
- listagem de todos os recibos emitidos aos clientes nos anos 2012 e 2013;
- listagem de todas as entregas de roupa feitas pelos clientes nos anos 2012 e 2013 na qual constem os valores cobrados e as datas de entrada e saída de roupa.
A sociedade apresentou a listagem das facturas emitidas pela loja 3, sita na quinta do socorro em Castelo Branco e tem disponíveis nos dossiers da sua contabilidade a maioria dos recibos emitidos.
No que se refere às facturas emitidas em 2012 nas lojas 1 e 2, de acordo com o esclarecimento prestado pelo técnico de informática, as listas não puderam ser recuperadas do programa usado que fora substituído por outro.
No que se refere às listagens das entregas de roupa dos anos de 2012 e 2013 elas não foram disponibilizadas, segundo a sócia gerente por também não ser possível extraí-las do programa.
Nos termos do n.º 1 do art.º 52.º do Código do IVA os sujeitos passivos são obrigados a arquivar e conservar em boa ordem durantes os 10 anos civil subsequentes todos os livros, registos e respectivos documentos de suporte, incluindo, quando a contabilidade é estabelecida por meios informáticos, os relativos à análise, programação e execução dos tratamentos. // (…)
Nos termos do n.º 4 do art.º 59.º da Lei Geral Tributária (LGT), a colaboração dos contribuintes com a administração tributária compreende o cumprimento das obrigações acessórias previstas na lei e a prestação dos esclarecimentos que esta lhes solicitar sobre a sua situação tributária.
Dispõe o n.º 2 do artigo 57.º do Código do IRC que a não exibição imediata dos livros e registos contabilísticos, a que se refere o artº 88º da LGT dá lugar à aplicação de métodos indirectos. Assim, nos termos das disposições conjugadas, da alínea b) do n.º 1 do art.º 87.º da LGT, alínea b) do artº 88.º da LGT, artigo 57.º do CIRC e artigo 90.º do CIVA, vão ser aplicados métodos indirectos na determinação da matéria tributável relativa às lojas 1 e 2 e ao ano de 2012 por motivo de inexistência de elementos da contabilidade.
Tendo em conta que, no capítulo III, se concluiu ter sido omitida a facturação de montantes pagos através de TPA e que o valor dos outros meios de pagamento é superior ao valor dos pagamentos por TPA (representam 61,58 % dos pagamentos no ano de 2012, 64,51% no ano 2013 e 64,63% em 2014), admite-se que nos pagamentos feitos través de outros meios que não o TPA também tenha havido omissões.
Assim, vão ser aplicados métodos indirectos à determinação da matéria tributável dos anos 2012, 2013 e 2014, no que se refere à omissão de facturação dos pagamentos feitos por outros meios que não o TPA, nos termos do n.º 1 do artigo 57.º do CIRC e n.º 1 do artigo 90.º do CIVA conjugados com a alínea b) do n.º 1 do art.º 87.º da LGT, a qual determina a avaliação indirecta em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto, e com a alínea a) do art.º 88.º da LGT, nos termos da qual a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta da matéria tributável pode resultar da inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração. // (…)

IX – Direito de audição – Fundamentação // (…)
No exercício do direito de audição, o sujeito passivo anexa as listas de pagamentos por TPA
(…).
Afirma ainda ter sido recuperado o PC com a facturação do ano 2012 e ter entregue ao técnico de informática o respectivo suporte digital a fim de possibilitar que sejam feitas tentativas para obter a facturação desse ano das lojas 1 e 2 que não foi disponibilizada no decurso da inspecção. Informa que a contabilidade tem os totais diários e mensais da facturação de 2012 de forma que demonstra claramente que, quer para efeitos de IVA quer para efeitos de IRC, não houve omissão de documentos. // (…)
Como o sujeito passivo não junta a lista da facturação das lojas 1 e 2 em 2012 mantem-se o recurso a métodos indirectos para o cálculo de pagamentos omissos na facturação dessas lojas no ano de 2012.
O facto de o sujeito passivo ter na contabilidade os totais diários e mensais da facturação de 2012 não demonstra só por si que não houve omissão de documentos, como vem argumentar no direito de audição.
Feita a comparação de alguns desses totais de facturação e dos montantes dos recibos do dia com o montante diário de pagamentos por TPA, relativamente às lojas 1, 2 e 3, verifica-se que estes últimos são superiores, conforme os quadros abaixo. Logo, a argumentação do sujeito passivo é desprovida de fundamento. // (…)
Assim, mantêm-se as correcções relativas ao ano de 2012 apenas com as alterações motivadas pelas correspondências feitas na lista anexa ao direito de audição que foram aceites nos quadros em Anexo 3.

(…)” – cfr. relatório de fls. 24 a 38 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
2. Em 08.06.2016 o chefe da Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Castelo Branco exarou o seguinte despacho sob o relatório identificado no ponto anterior do probatório: “Concordo com as correcções/alterações propostas, bem como com a necessidade de recurso a métodos indirectos para apuramento do resultado fiscal em sede de IRC e de IVA para os anos de 2012, 2013 e 2014 dado o que se informa e legislação aplicável. (…)” – cfr. despacho exarado na primeira página do relatório de fls. 24 a 38 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
3. Em 15.07.2016 a Impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável por métodos indirectos – cfr. requerimento de fls. não numeradas do processo administrativo.
4. Em 30.08.2016 realizou-se a reunião entre o perito da administração tributária e o perito designado pela Impugnante, no âmbito do procedimento de revisão da matéria colectável, não tendo os mesmos alcançado acordo – cfr. acta n.º 2/2016 de fls. 72 do processo físico.
5. Em 20.09.2016 o Director de Finanças de Castelo Branco exarou despacho de fixação da matéria tributável cuja cópia de fls. não numeradas do processo administrativo aqui se dá por reproduzida e transcreve parcialmente:
“(…)
2. Deste modo, considerando as posições expressas nos laudos que os dois Representantes entregaram e todos os outros documentos que fazem parte dos Procedimentos entende que, pela análise que efectuei aos vários elementos que constituem estes Processos de Revisão quer ainda ao Relatório de Inspecção Tributária que o originou e aos fundamentos constante do Pedido de Revisão do contribuinte, é minha convicção que, nos vermos do n.º 3 do art.º 74.º, da L.G.T., a A.T. – Autoridade Tributária e Aduaneira provou fundamentadamente a verificação dos pressupostos para a determinação da matéria tributável por métodos indirectos, como lhe competia, assim como as correcções efectuadas basearam-se em factos cuja veracidade não está desacreditada porque não foi produzida, até agora, prova em contrário, e muito menos, isso mesmo resultou desta reunião;
3. Nestes termos e com base nos fundamentos expostos pela representante da Administração Tributária (que faço meus e dos quais me aproprio)e também os invocados no Relatório de Inspecção Tributária que o originou (que, do mesmo modo, faço meus e dos quais me aproprio para este fim), julgo o pedido de revisão improcedente, em conformidade com essa análise.
4. Assim sendo, mantenho os valores fixados quer relativamente à matéria colectável (…).

(…)” – cfr. despacho de fls. 70 e 71 do processo físico.
6. Em 11.03.2017 foi emitida, em nome da Impugnante a liquidação de IVA com o n.º ……………..097, do período 201303T, no valor de 1.150,78 EUR, e a liquidação dos respectivos juros compensatórios, com o n.º ………………..733, no valor de 154,35 EUR – cfr. liquidações de fls. 18 e 19 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
7. Em 11.03.2017 foi emitida, em nome da Impugnante a liquidação de IVA com o n.º …………….158, do período 201312T, no valor de 4.484,93 EUR, e a liquidação dos respectivos juros compensatórios, com o n.º ………………736, no valor de 136,67 EUR – cfr. liquidações de fls. 12 e 13 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
8. Em 11.03.2017 foi emitida, em nome da Impugnante a liquidação de IVA com o n.º ……………140, do período 201309T, no valor de 1.528,13 EUR, e a liquidação dos respectivos juros compensatórios, com o n.º ……………….735, no valor de 174,16 EUR – cfr. liquidação de fls. 14 e 15 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
9. Em 11.03.2017 foi emitida, em nome da Impugnante a liquidação de IVA com o n.º ……………..123, do período 201306T, no valor de 1.214,94 EUR, e a liquidação dos respectivos juros compensatórios, com o n.º …………….734, no valor de 150,58 EUR – cfr. liquidação de fls. 16 verso e 17 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
10. Em 07.07.2017 a Impugnante apresentou reclamação graciosa – cfr. reclamação de fls. 3 a 12 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
11. Em 24.10.2017 o técnico responsável do Serviço de Finanças de Castelo Branco 1 elaborou, no âmbito do procedimento de reclamação graciosa, a informação cuja cópia aqui se dá por integralmente reproduzida e transcreve parcialmente:
“(…) // As liquidações em causa resultaram directamente da acção inspectiva que decorreu directamente na Divisão de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Castelo Branco sob o n.º OI201500184/5/6, de cujas conclusões o agora reclamante foi devidamente notificado.
Relatório com conlusões que, pelo motivo do reclamante dele ter integral conhecimento, aqui não se transcrevendo directamente, se considera reproduzido na íntegra.
Da análise do alegado na reclamação não resultam quaisquer factos novos ou diferentes do já alegado no direito de audição exercido no âmbito do respectivo processo inspectivo.
Sou assim de parecer que a reclamação não poderá ser deferida.

(…)” – cfr. informação de fls. 67 a 70 do processo administrativo.
12.Em 25.10.2017 o Chefe do Serviço de Finanças de Castelo Branco 1 exarou o seguinte despacho sobre a informação acima identificada: “Em face da proposta de decisão infra e com os seus fundamentos, INDEFIRO previamente a presente reclamação. Notifique-se a entidade reclamante de que poderá, querendo, nos termos do art.º 60.º da Lei Geral Tributária (LGT), exercer o direito de audição no prazo de 15 dias a contar da notificação.” – cfr. despacho exarado na primeira página da informação de fls. 67 a 70 do procedimento de reclamação graciosa apensado aos autos.
13.Em 27.10.2017 foi enviado, em correio postal registado, o ofício destinado a notificar a Impugnante para exercer o direito de audição relativamente ao projecto de decisão identificado no ponto anterior do probatório – cfr. ofício e registo postal de fls. 71 a 73 do procedimento de reclamação graciosa.
14.Em 20.11.2017 o Director de Finanças de Castelo Branco exarou, sobre a informação elaborada em 16.11.2017, o seguinte despacho: “Em face da proposta de decisão infra e com os seus fundamentos INDEFIRO a presente reclamação.” – cfr. despacho a fls. 74 do procedimento de reclamação graciosa.
15. Em 21.11.2017 foi enviado, em correio postal registado, o ofício destinado a notificar a Impugnante da decisão de indeferimento da reclamação graciosa identificada no ponto anterior do probatório – ofício e registo postal de fls. 75 verso e 76 do procedimento de reclamação graciosa.
16. Em 09.02.2018 foi apresentada neste Tribunal, via correio electrónico, a petição inicial dos presentes autos – cfr. mensagem de correio electrónico de fls. 1 do processo físico.

X
“Não existem quaisquer outros factos com relevo que importe fixar como não provados.”
X
“A convicção do tribunal quanto à matéria de facto provada assentou na análise da documentação constante do processo administrativo e dos autos conforme discriminado supra no probatório.”
X
Ao abrigo do disposto no artigo 662.º/1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
17. Do relatório inspectivo referido em 1. consta o seguinte:
«III - Descrição dos Factos e Fundamentos das Correções Meramente Aritméticas à Matéria Tributável // III. 1. Correcções relativas aos pagamentos através de TPA sem facturação
Foram feitas as listas dos pagamentos dos clientes através de terminal de pagamento automático (TPA) das três lojas da sociedade, por loja e por ano, com base nos talões emitidos pelo TPA e disponibilizados pela gerência. // A sociedade usou o programa SAFT nos anos 2013 e 2014. Foram disponibilizados os SAFT da facturação das três lojas permitindo a comparação entre as listas de talões dos anos 2013 e 2014 e a facturação dos mesmos anos. A sociedade apresentou também a listagem das facturas emitidas na loja 3 durante o ano 2012. // Com base nas listas de valores pagos através de TPA e da facturação emitida procedeu-se à verificação da emissão de facturas nos valores e datas que constam nos talões emitidos pelos terminais de pagamento automático nas três lojas da empresa. // Nas listas que constituem o Anexo 1 (folhas 24 a 43) encontram-se os pagamentos através de TPA que não têm correspondência na facturação. Estas listas referem-se aos seguintes anos e lojas: // Ano 2012: Loja 3. // Ano 2013: Lojas 1.2 e 3. // Ano 2014: Lojas 1, 2 e 3. // Relativamente ao ano 2012 e às Lojas 1 e 2 não foi possível elaborar a lista porque a sociedade não dispunha das facturas impressas ou das suas listagens, de forma a ser possível comparar a facturação com os pagamentos por TPA. A contabilização dos rendimentos foi feita mensalmente com base em listagens de valores diários da facturação extraídas nas lojas. // Nos termos da alínea b) do nº 1 do artº 29º do CIVA. o sujeito passivo tem que emitir obrigatoriamente uma fatura por cada transmissão de bens ou prestação de serviços, tal como vêm definidas nos artigos 3o e 4o do CIVA, independentemente da qualidade do adquirente dos bens ou do destinatário dos serviços, ainda que estes não a solicitem, bem como pelos pagamentos que lhe sejam efectuados antes da data de transmissão dos bens ou da prestação dos serviços. // Dispõe a alínea a) do nº 1 do artº 1o do CIVA que estão sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado as transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como íaí. Nos termos do nº 1 do artº 27º do CIVA, conjugado com a alinea b) do nº 1 do artº 41º do CIVA, o sujeito passivo está obrigado a entregar o montante de imposto exigível até ao dia 15 do mês seguinte ao trimestre do ano civil a que respeitam as operações. // Nos termos do disposto na alínea a) do nº 1 do artº 20º do CIRC, consideram-se rendimentos e ganhos os resultantes, nomeadamente, de vendas ou prestações de serviços. // Nos termos do nº 1 do artº 17º do CIRC, o lucro tributável das pessoas colectivas é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do período e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos do CIRC. // Vai ser acrescido ao lucro tributável e ao IVA liquidado o montante dos pagamentos feitos através de TPA que não têm correspondência na facturação, nos termos das disposições legais antes mencionadas, conforme quadro que se segue.
Cálculo da base/rendimento e do IVA em falta nos pagamentos por TPA sem correspondência nas faturas de 2012 (loja3), 2013 e 2014
    anos
    cálculo
descrição
Valores
base/rendim.
    IVA
    2012
1
    Pagam, por TPA sem correspond nas fat. 1.3
5.550,60
4.512,68
1.037,92
2
    pagamentos sem correspond nas fat. 1.1
4.761,53
3.871,16
    890,37
    2013
3
    pagamentos sem correspond nas fat. 1.2
6.482,67
5.270,46
1.212,21
4
    pagamentos sem correspond nas fat. 1.3
2.509,18
2.039,98
    469,20
    5=2+3+4
    total omitido em 2013
13.753,38
11.181,61
2.571,77
6
    pagamentos sem correspond nas fat.1.1.
1.005,04
817,11
    187,93
    2014
7
    pagamentos sem correspond nas fat. 1.2
966,95
786,14
    180,81 :
8
    pagamentos sem correspond nas fat. 1.3
739,15
600,93
    138,22 í
    9=6+7+8
    total omitido em 2014
2.711,14
2.204,18
    506,96 I
    total
    10=1+5+9
    pagamentos sem correspond nas fat.
22.015,12
17.898,47
4.116,65
LI = loja 1, L2 = loja 2,
    L3 = loja 3

Após o exercício do direito de audição pelo sujeito passivo, foi o quadro anterior alterado de acordo com novos elementos apresentados, passando a ter os valores seguintes:
J Cálculo da base/rendimento e do IVA em falta nos pagamentos por TPA sem correspondência nas ifaturas de 2012 (loja 3), 2013 e 2014
    | anos
    cálculo
descrição
    Valores
base/rendim.
IVA
    2012
1
    pagamentos por TPA sem correspond nas fat. L3
    4.071,44
3.310,11
761,33 j
    2013
2
    pagamentos sem correspond nas fat. LI
    3.024,53
2.458,97
565,56 i
3
    pagamentos sem correspond nas fat. 12
    5.173.54
4.206,13
967,41
4
    pagamentos sem correspond nas fat. L3
    1.695,05
1.378,09
316,96
    5=2+3+4
    total omitido em 2013
    9.893,12
8.043,19
1.849,93
6
    pagamentos sem correspond nas fat. LI
    686,04
557,76
128,28
    2014
7
    pagamentos sem correspond nas fat. L2
    823,35
669,39
153,96
8
    pagamenlos sem correspond nas fat. L3
    499,50
406,10
93,40
    9=6+7+8
    total omitido em 2014
    2.008,89
1.633,24
375,65 j
    total
    10=1+5+9
    pagamentos sem correspond nas fat.
15.973,45
12.986,54
2.986,91
LI = loja 1,12 - loja 2, 13 = loja 3 i

18. Do relatório inspectivo em referência constam os itens “v.2. Cálculo do rendimento e IVA (por trimestre) omissos em pagamentos por outros meios que não através de TPA” e “v.3. Valores do rendimento e do IVA (por trimestre) a corrigir em pagamentos efectuados por TPA”.

X
2.2. De Direito.
2.2.1. A presente intenção rescisória centra-se sobre o alegado erro de julgamento no que se refere ao segmento decisório da sentença sob recurso. A recorrente afirma que a anulação integral dos actos de liquidação sob escrutínio não é consentânea com os fundamentos da impugnação. A tese que fez vencimento na instância e com a qual a recorrente se conforma respeita à anulação dos actos tributários na parte respeitante ao recurso aos métodos indirectos na determinação da matéria colectável. No entanto, os actos tributários em apreço assentam também nas correcções aritméticas, as quais não foram objecto da presente impugnação, pelo que os actos tributários, nesta parte, mantém-se incólumes, sustenta.
Por seu turno, a sentença julgou a impugnação procedente, determinando a anulação das liquidações impugnadas. Considerou, em síntese, que «não está a administração legitimada a utilizar métodos indirectos de determinação e quantificação da matéria tributável para efeitos de IVA, nos termos dos sobreditos preceitos legais» e que «procede o vício de violação de lei invocado pela Impugnante, o que determina a anulação das liquidações impugnadas».

2.2.2. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento nos termos já recenseados.
Dos elementos coligidos no probatório resulta que os actos de liquidação impugnados nos autos encerram correções aritméticas e correcções através da avaliação indirecta (n.os 2 e 17 e 18). A petição de impugnação invoca vícios relativos à avaliação indirecta da matéria colectável para justificar o pedido de anulação das liquidações em causa, omitindo qualquer referência às correcções aritméticas.
A este propósito, constitui jurisprudência fiscal assente a seguinte:
i) «Os actos administrativos que impõem a obrigação de pagamento de uma quantia, designadamente os actos de liquidação de tributos, são naturalmente divisíveis, sendo-o também juridicamente, por a lei prever a possibilidade de anulação parcial dos mesmos. // Anulada parcialmente a liquidação, que corresponda à matéria colectável cuja consideração era ilegal, mantém-se a liquidação na parte que corresponde a matéria colectável que não é afectada por ilegalidade». (1)
ii) «O acto tributário, enquanto acto divisível, tanto por natureza como por definição legal, é susceptível de anulação parcial. // O critério para determinar se o acto deve ser total ou parcialmente anulado passa por aferir se a ilegalidade afecta o acto tributário no seu todo, caso em que o acto deve ser integralmente anulado, ou apenas em parte, caso em que se justifica a anulação parcial» (2).
No caso em exame, verifica-se que assiste razão à recorrente, quando convoca a divisibilidade do acto tributário para justificar a necessidade da determinação da anulação parcial das liquidações impugnadas apenas na parte em que assentam sobre o recurso à avaliação indirecta da matéria colectável, mantendo as mesmas intocadas quanto às demais correcções. O vício detectado pela sentença recorrida apenas respeita à matéria colectável apurada com recurso à avaliação indirecta, pelo que não atinge o acto tributário, na sua totalidade.
Tendo sido emitidas liquidações adicionais de IVA de 2013, com base no relatório inspectivo referido em 1., em homenagem à ideia da divisibilidade do acto tributário, a anulação com base no erro no apuramento da matéria colectável, com base na avaliação indirecta, não atinge a demais matéria colectável subjacente às liquidações em causa. Pelo que se impõe alterar o dispositivo da sentença, passando a constar do mesmo a anulação parcial das liquidações impugnadas, na parte apurada com base em métodos indirectos.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.

X
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da subsecção do juízo comum da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul conceder provimento ao recurso, alterando-se o dispositivo da sentença, passando a constar do mesmo o seguinte:
«Anula-se as liquidações adicionais impugnadas, na parte em que as mesmas têm por fundamento o recurso à avaliação indirecta».
Custas pela recorrida.
Registe.
Notifique.

(Jorge Cortês - Relator)

(1ª Adjunta – Ana Cristina de Carvalho)

(2.ª Adjunta – Tânia Meireles da Cunha)

(1) Acórdão do TCAS, de 16-09-2019, P. 14/09.5BECTB
(2) Acórdão do STA, de 30-01-2019, P. 0436/18.0BALSB.