Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1/11.3BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:10/26/2023
Relator:FREDERICO MACEDO BRANCO
Descritores:CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS
INTEGRAÇÃO NO QUADRO
COMPETÊNCIA MATERIAL
Sumário:I – Tendo o controvertido contrato de Prestação de Serviços sido celebrado nos termos do Artº 7º do DL n.º 409/91, de 17/10, e Artigo 81º do DL nº 197/99, de 8 de junho, caracterizando-se por ter como objeto prestações sucessivas no exercício de profissão liberal mediante remuneração certa mensal, não pode ser convertido em contrato que confira a qualidade de agente ou funcionário ao seu titular,
II - Ao contrato de prestação de serviço está ligada intimamente uma ideia de independência do prestador do serviço na execução do serviço encomendado: o serviço a prestar tem de ser o indicado pelo beneficiário deste, mas a forma de execução tem de ser aquela por via da qual o prestador melhor consiga alcançar o resultado pretendido exercitando com autonomia os seus conhecimentos e as suas aptidões, conduzindo-se como melhor entender segundo os ditames da sua vontade, saber e inteligência, sem sujeição à autoridade ou direção da pessoa servida quanto ao modo de execução do seu trabalho.
III - Nos termas do art.° 4°, n°1, al. f) do ETAF, aplicável, compete aos Tribunais Administrativos o julgamento das ações que tenham por objeto dirimir litígios que tenham por objeto "questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objeto passível de ato administrativo, de contratos especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspetos do respetivo regime substantivo, ou de contratos em que pelo menos uma das partes seja um entidade pública ou um concessionário que atue no âmbito da concessão e que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público.”
IV – A relação jurídica constituída entre os outorgantes titulada por contrato de prestação de serviços, que não confere a qualidade de funcionário o agente, é uma relação jurídica de direito privado, não tendo, na sua base um conflito em torno da conformação de uma relação jurídica de direito público, não sendo os Tribunais Administrativos competentes para a sua resolução.
Acresce que a vinculação ao município da referida trabalhadora, iria subverter o regime de admissões na Administração Autárquica, a qual estava já então sujeita a um conjunto de formalidades que invalidavam e impediam a qualificação da Recorrente como funcionária ou agente.
V - Efetivamente, a seleção e recrutamento de pessoal estava já sujeita a um procedimento concursal, nos termos da Lei n.° 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e subsidiariamente, do disposto na Lei n.° 59/2008, de 11 de Setembro, pelo que a eventual admissão da Recorrente nos quadros do Município à revelia dos referidos princípios concursais constituiria uma grave desvirtuação do regime legal vigente, violadora, nomeadamente, do principio da legalidade e da igualdade, pois que é incontornável que o contrato outorgado entre as partes, expressamente excluiu a possibilidade de conferir a qualidade de agente ou funcionário.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção SOCIAL
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo, Subsecção Social, do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório
M........., no âmbito da Ação Administrativa Comum intentada contra a Município do Alandroal, tendente à condenação deste:
“1- a reconhecer que o contrato de prestação de serviços outorgado pelo Réu com a Autora é nulo por violação do disposto nos arts. 35°, n°s 2, 3 e 6, 36° e 94° da Lei n° 12-A/2008, de 27/02;
2- a reconhecer que a Autora foi sujeita a uma relação jurídica de emprego (contrato de trabalho a termo certo) no Município do Alandroal nos termos do art. 14° da Lei n° 59/2008, de 11/09, e por ter exercido, de facto, funções próprias do serviço público prestado com carácter de permanência, de subordinação e sujeito a horário de trabalho, ainda que formalmente, o tivesse feito ao abrigo de mero contrato de prestação de serviços desde 03/01/2007 até 23/04/2010;
3- a reconhecer que a Autora tem direito a ser reintegrada como trabalhadora do Município do Alandroal e integrar o mapa de pessoal do Município para todos os efeitos legais atento o período de trabalho prestado e as renovações do contrato que se operaram e ainda a natureza e características dos serviços prestados;
4- o Réu ser condenado a pagar à Autora uma indemnização pelos prejuízos patrimoniais que até à presente data perfazem o valor de 25.670,82€ e que esta sofreu em virtude da situação precária e ilícita e pelos danos não patrimoniais sofridos pela Autora derivados da frustração da confiança que adquiriu no ingresso como trabalhadora do Município a título permanente no valor de 2.500€, acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a citação di Réu até integral e efetivo pagamento;
5- o Réu ser condenado a pagar À Autora todas as remunerações mensais e demais regalias que se venceram até ao trânsito em julgado da sentença que venha a ser proferida, à razão de 1.241,32 €/mês”, inconformada com a Sentença proferida em 8 de fevereiro de 2015, através da qual foi declarada “a incompetência deste Tribunal em razão da matéria para se pronunciar sobre os pedidos formulados pela Autora”, veio interpor recurso da referida decisão, proferida em primeira instância, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja.
Formula a aqui Recorrente/M......... nas suas alegações de recurso, apresentadas em 9 de abril de 2015, as seguintes conclusões:
“1 - A competência em razão da matéria do tribunal se afere pela natureza da relação jurídica, tal como ela é configurada pela recorrente na petição inicial, ou seja, no confronto entre a pretensão deduzida (pedido), independentemente do seu mérito, e os respetivos fundamentos (causa de pedir).
2 - A relação jurídica controvertida tal como é configurada pela recorrente na P.I., é manifestamente fundamentada e regulada pelas normas relativas ao regime do contrato de trabalho em funções públicas e no regime de vinculação de carreiras e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas e não em normas de direito privado respeitantes ao regime do contrato de trabalho sem termo.
3 - A recorrente na P.I. apenas invoca como relação material controvertida tal como foi por esta configurada, normas que regulam o contrato de trabalho em funções públicas por correspondência com o seu respetivo regime jurídico aprovado pela lei n.° 12-A/2008 de 27 de Fevereiro e pela lei 59/2008 de 11 de Setembro, neste sentido veia-se Art.° 1, 2, 31, 48 da PI e alínea B do pedido.
4- O recorrido reconhece e confessa que as funções desempenhadas pela recorrente “respeitam a uma atividade profissional cuja necessidade, para o Município, é diária e permanente, e que a mesma se encontra a prestá-la há cerca de três anos tendo conhecimento próprio da dinâmica processual e da organização” e que “Entendendo adequado para o exercício da atividade que o Município necessita nesta área a constituição de relação jurídica de emprego público” veja-se Doc. n.° 2.
5 - A apreciação e reconhecimento da relação jurídica de emprego público, por ter a recorrente de facto exercido funções próprias do serviço público, revestem natureza de direito público.
6 - No âmbito do processo n.° 345/09.4BEBJA, decisão já transitada em julgado, a questão submetida à apreciação deste Tribunal, foi precisamente “Declarar que o R. foi sujeito a uma relação jurídica de emprego no Município do Alandroal por ter exercido de facto funções próprias do serviço público prestado...” questão que o Tribunal decidiu que ser competente para sua apreciação em razão da matéria, veja-se fls. 22 II - saneamento do douto aresto Doc. n.° 1 junto com a resposta à contestação.
7- O despacho saneador/sentença proferido pela Meritíssima Juiz do Tribunal “a quo” no qual se determinou a incompetência material do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja, em razão da matéria, para apreciar a presente ação e competente o foro laboral, viola o disposto na parte final da alínea d) do n.° 3 do Art.° 4 do ETAF, já que, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja é competente materialmente para apreciar a questão “sub judice” tal como prevê o citado normativo legal.
8 - Assim, o despacho saneador sentença proferido pela Meritíssima Juiz do Tribunal “a quo”, ao invés do que decidiu, deveria ter reconhecido como sendo materialmente competente, para apreciar o presente procedimento o Tribunal “a quo” por força do disposto no Art.° 4 n.° 1 b) segunda parte e do disposto na parte final da alínea d) do n.° 3 do Art.° 4 ambos do ETAF.
Nestes termos e nos demais de direito que V.exas. Doutamente Suprirão deve o presente recurso de apelação ser julgado procedente por provado, revogando-se o despacho saneador sentença recorrido e ordenando-se a sua substituição por outro que determine o Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja como materialmente competente para apreciar e julgar o presente procedimento nos termos do disposto no Art.° 4 n.° 1 b) segunda parte e do disposto na parte final da alínea d) do n.° 3 do Art.° 4 do ETAF, assim se fazendo JUSTIÇA.”

O aqui Recorrido/Município veio apresentar as suas contra-alegações de Recurso em 27 de abril de 2023, aí tendo concluído:
“1.ª É impensável a apresentação de um recurso pela ora Recorrente âmbito dos presentes autos.
2.ª A Recorrente celebrou um contrato com o Recorrido caracterizado ter como objeto prestações sucessivas de serviços, com direito a uma retribuição certa mensal e sem adquirir a qualidade de agente ou funcionário.
3.ª Tal contrato poderia cessar efeitos a todo o tempo, por qualquer das partes, sem a obrigação de indemnizar. E foi o que sucedeu.
4.ª Pois as condições contratuais para o «contrato de prestação serviços» foram claramente reduzidas a escrito e plenamente aceites e conhecidas por ambas as partes.
5.ª É inequívoco que o Recorrido é uma pessoa coletiva pública Recorrente não é, nem nunca foi, funcionário público ou agente administrativo.
6.ª Pelo que, tal como já alegado em sede de contestação, nunca será mais invocar que "A relação jurídica constituída entre os outorgantes titulada pelo contrato de avença, foi uma relação jurídica de direito privado, não tendo, na sua base um conflito em torno da conformação de uma relação jurídica de direito público, não sendo os Tribunais Administrativos competentes para a sua resolução." - in Acórdão do STA, de 16.01.2008, Processo n.° 0780/07.
7.ª E nem se venha alegar com outras decisões judiciais, pois Autora/Recorrente bem sabe que tal facto constituiu caso julgado material e formal nesses processos, não podendo ser minimamente acolhido para os presentes autos.
8.ª Por outro lado, e sem prescindir, a constituição da relação de emprego público na administração autárquica está sujeita a formalidades e princípios elementares - ex. princípio da legalidade e do direito ao acesso ao emprego público, que jamais poderão ser transpostos.
9.ª O Recorrido em momento algum reconhece e/ou confessa que existiu uma relação jurídica de emprego público com a Recorrente.
10.ª Pelo exposto, é inquestionável que o recurso ora apresentado ser julgado improcedente, mantendo-se a incompetência do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja em razão da matéria para se pronunciar sobre os pedidos formulados pela Recorrente/Autora.
Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências não deixarão de doutamente suprir, deve ser julgado totalmente improcedente o recurso apresentado pela Recorrente, com todas as demais consequências legais, assim se fazendo a Costumeira Justiça.”

O Recurso Jurisdicional apresentado veio a ser admitido por Despacho de 19 de maio de 2015.

O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 16 de junho de 2015, veio a emitir Parece em 17 de junho de 2015, no qual, a final, se pronuncia no sentido da improcedência do recurso.
Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.
II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA, de modo a verificar se os Tribunais Administrativos serão competentes materialmente para julgar a presente Ação.

III – Fundamentação de Facto
Não foi fixada em 1ª Instância qualquer matéria de facto Provada.
Fixa-se aqui o seguinte facto, nos termos do Artº 662º nº 1 CPC:
a) A A. foi contratada pelo R. Município de Alandroal, em 3 de Janeiro de 2007, através de "contrato de prestação de serviços", outorgado pelo Presidente da Câmara Municipal para conceção e projeção de conjuntos urbanos, edificações, obras públicas e objetos, prestando a devida assistência técnica e orientação no decurso da respetiva execução; elaboração de informações relativas a processos na área da respetiva especialidade, incluindo o planeamento urbanístico, bem como sobre a qualidade e adequação de projetos para licenciamento de obras de construção civil ou de outras operações urbanísticas, colaboração na organização de processos de candidatura a financiamentos comunitários, da administração central ou outros; colaboração na definição das propostas de estratégia, metodologia e de desenvolvimento para as intervenções urbanísticas e arquitetónicas; coordenação e fiscalização na execução de obras; articulação das suas atividades com outros profissionais, nomeadamente nas áreas do planeamento do território, arquitetura paisagística, reabilitação social e urbana e engenharia, desempenhando funções nas instalações da R. – (Cfr. Contrato de Prestação de Serviços - Doc. n° 1 PI).

IV – Do Direito
No que aqui releva, discorreu-se no discurso fundamentador da decisão de 1ª Instância:
“(…) Dispõe o art. 13° do CPTA que "o âmbito da jurisdição administrativa e a competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de qualquer outra matéria”.
Por seu turno o n° 1 do art. 1° do ETAF estatui que "os tribunais da jurisdição administrativa e fiscal são os órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais”. Na sequência deste normativo as diferentes alíneas do n° 1 do art. 4° do ETAF, estatuem, de forma exemplificativa, os tipos de litígios sujeitos à apreciação dos tribunais administrativos e fiscais. Já os n°s 2 e 3 do referido art. 4° do ETAF, estabelecem, nas suas diferentes alíneas, situações em que determinado tipo de lides se encontram fora da competência material dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Assim, estabelece a alínea d) do n° 3 do art. 4° do ETAF que estão expressamente excluídas do âmbito da jurisdição administrativa e fiscal, “a apreciação de litígios emergentes de contratos individuais de trabalho, que não confiram a qualidade de agente administrativo ainda que uma das partes seja uma pessoa coletiva de direito público”.
No caso em apreço, a Autora alega ter um vínculo contratual com o Município de Alandroal, assumindo a natureza de um verdadeiro contrato individual de trabalho. Ora, não subsistem dúvidas quanto à natureza de pessoa coletiva pública do Município, tal como resulta, nomeadamente, dos arts. 235° e seguintes da CRP.
Impõe-se, agora, aferir se as funções alegadas pela Autora, são ou não atribuidoras do carácter de agente administrativo. Ora, dispõe o n.° 2 do art.° 2° da Lei n° 23/2004, de 22/06, que, em princípio, o contrato de trabalho com pessoas coletivas públicas não confere a qualidade de funcionário público ou agente administrativo, ainda que estas tenham um quadro de pessoal em regime de direito público. Acresce que conforme já foi decidido, entre outros, no Ac. do Tribunal de Conflitos, proferido no Proc. N° 55/13, em 27/02/2014 (disponível em www.dgsi.pt), a competência para a apreciação judicial do hipotético vínculo laboral existente entre as partes cabe ao foro laboral assim como as demais questões que se configuram como secundárias face à definição desta.
Cabe, ainda, referir que a existir decisão que coincida com a tese da competência material deste TAC sustentada pela Autora a mesma constitui caso julgado material e formal nesse processo e não configura jurisprudência que este Tribunal deva acolher obrigatoriamente.
Conclui-se, pelo exposto, ser este Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja materialmente incompetente para apreciar os pedidos formulados pela Autora nos presentes autos.”

Vejamos
O controvertido contrato de Prestação de Serviços foi celebrado nos termos do Artº 7º do DL n.º 409/91, de 17/10, e Artigo 81º do DL nº 197/99, de 8 de junho, caracterizando-se por ter como objeto prestações sucessivas no exercício de profissão liberal mediante remuneração certa mensal.

Como resulta do disposto no art.º 1154º do Cód. Civil, contrato de prestação de serviço é aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.

Assim, “ao contrato de prestação de serviço está ligada intimamente uma ideia de independência do prestador do serviço na execução do serviço encomendado: o serviço a prestar tem de ser o indicado pelo beneficiário deste, mas a forma de execução tem de ser aquela por via da qual o prestador melhor consiga alcançar o resultado pretendido exercitando com autonomia os seus conhecimentos e as suas aptidões, conduzindo-se como melhor entender segundo os ditames da sua vontade, saber e inteligência, sem sujeição à autoridade ou direção da pessoa servida quanto ao modo de execução do seu trabalho” (Cfr. Acórdão STA nº 018/03, de 27-01-2004).
Nos termos do DL nº 409/91 de 17.17, os contratos de Prestação de Serviços não conferem ao particular outorgante a qualidade de funcionário ou agente.
Nos termas do art.° 4°, n°1, al. f) do ETAF, aplicável, compete aos Tribunais Administrativos o julgamento das ações que tenham por objeto dirimir litígios que tenham por objeto "questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objeto passível de ato administrativo, de contratos especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspetos do respetivo regime substantivo, ou de contratos em que pelo menos uma das partes seja um entidade pública ou um concessionário que atue no âmbito da concessão e que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público.”
“A competência e, consequentemente, a jurisdição de um tribunal afere-se pela forma como o autor configura a ação, definida pelo pedido e pela causa de pedir, ou seja, pelos objetivos com ela prosseguidos, o quid disputatum , sendo por isso, irrelevante o juízo de prognose que se possa fazer quanto à inviabilidade do mesmo, por se tratar de questão atinente com o mérito da pretensão” - cfr. neste sentido, entre outros, Ac. do Tribunal de Conflitos, de 10 de Julho de 2007 in Rec. n° 1/2007.
Em qualquer caso, importa não perder de vista que estão excluídas do âmbito da jurisdição administrativa, nos termos da alínea d) do n°3 do Artigo 4º do ETAF aplicável, que “ ... a apreciação de litígios emergentes de contratos indivíduas de trabalho, que não confiram a qualidade de agente administrativo ainda que um das partes seja uma pessoa coletiva de direito público“.
Na realidade, como se viu já, nos termos do n° 6 do DL n° 409/91 de 17.10, ao abrigo do qual foi outorgado o controvertido contrato, o mesmo não confere ao particular outorgante a qualidade de agente, nem se vislumbra qualquer indicio que permita concluir que o mesmo tem subjacente qualquer subordinação jurídica típica de uma relação de trabalho subordinado, suscetível de subverter o objeto do contrato.
Como se sumariou no Acórdão do STA, de 16.01.2008, Processo n.° 0780/07, aqui aplicado mutatis mutandis, "A relação jurídica constituída entre os outorgantes titulada pelo contrato de avença, foi uma relação jurídica de direito privado, não tendo, na sua base um conflito em torno da conformação de uma relação jurídica de direito público, não sendo os Tribunais Administrativos competentes para a sua resolução."
Acresce que a vinculação ao município da referida trabalhadora, iria subverter o regime de admissões na Administração Autárquica, a qual estava já então sujeita a um conjunto de formalidades que invalidavam e impediam a qualificação da Recorrente como funcionária ou agente.
Efetivamente, a seleção e recrutamento de pessoal estava já sujeita a um procedimento concursal, nos termos da Lei n.° 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e subsidiariamente, do disposto na Lei n.° 59/2008, de 11 de Setembro, pelo que a eventual admissão da Recorrente nos quadros do Município à revelia dos referidos princípios concursais constituiria uma grave desvirtuação do regime legal vigente, violadora, nomeadamente, do principio da legalidade e da igualdade, pois que é incontornável que o contrato outorgado entre as partes, expressamente excluiu a possibilidade de conferir a qualidade de agente ou funcionário.
Em face de tudo quanto se expendeu, não merece censura a decisão recorrida.

* * *

Deste modo, em conformidade com o precedentemente expendido, acordam os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo do presente Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao Recurso, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente


Lisboa, 26 de outubro de 2023

Frederico de Frias Macedo Branco

Alda Nunes

Pedro Figueiredo