Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1146/22.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:11/02/2023
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
NOVA PI
REJEIÇÃO LIMINAR
Sumário:I - O princípio da estabilidade da instância, consagrado no artigo 260º do Código de Processo Civil (CPC), diz-nos: «citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei
II - Este princípio não deixa de estar presente no contencioso tributário, face à aplicação supletiva do CPC – artigo 2º alínea e) CPPT.
III - É a citação do Impugnado que torna estáveis os elementos essenciais da causa, i. é, quanto aos sujeitos, à causa de pedir e o pedido – cf. alínea b) do artigo 564º do CPC.
Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - Relatório

Massa Insolvente de A… e H…, com os sinais dos autos, inconformado com o despacho que indeferiu a junção de nova petição inicial e julgou inepta a petição inicial de impugnação, dele veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

I. Nos termos e para os efeitos previstos na conjugação dos artigos 96.ª n.º 1, 280.º n.º 1, 281.º, 282.º, 20.º, 54.º in fine e 2.º al. e) do CPTT; artigos 644.º n.º 1 al. a), 644.º n.º 2 al. d) , 644.º n.º 3 do CPC e artigos 629.º n.º 3, al. b), ex vi, 647.º n.º 3 al. b) do CPC, ex vi, art. 2 al. e) e 281.º e 286.º n.º 2, 96.º n.º 1, 103.º n.ºs 4 e 5 do CPPT; artigo 38.º al. a), da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro, ETAF, e nos de melhor em direito permitidos, seja admitido o presente recurso de apelação, a subir nos próprios autos à secção de contencioso tributário do venerando Tribunal Central Administrativo Sul, com efeito suspensivo.
II. Por economia e simplicidade, consideram-se aqui com integralmente reproduzidas todas as normas jurídicas e princípios de direito antes alegados, assim como os autos de impugnação, pelos quais, as decisões surgem impugnadas e em virtude, o tribunal a quo deveria ter interpretado os factos e o Direito, aplicado correctamente as regras de direito, decidindo admitir a segunda PI, que foi substituída pela autora, antes da citação da ré, e antes do despacho liminar, e com base nessa PI proceder aos ulteriores termos, citando a AT e os insolventes os admitindo à relação Juridica controvertida, serem avocados os PA´s das reclamações graciosas intentadas pela autora e insolventes, contra a AT, assim como o processo de inspecção tributária, e ainda as certidões a obter junto dos autos de processo de insolvência que deu origem aos factos para a AT entender imputar os tributos e demais responsabilidades tributárias a pagar pela M.I. assim como admitindo os demais meios de prova requeridos pela autora, ora recorrente, realizando diligencias de prova em audiência, seguindo-se os seus ulteriores termos até final
III. O sentido de cada uma das decisões judiciais, impugnadas, sua interpretação não pode assentar exclusivamente no teor literal da respetiva parte decisória, que foram respetivamente de não admissão de uma PI ( segunda PI) e de declarar a PI admitida (primeira PI) como inepta, mas antes, impondo-se para a interpretação das decisões em crise, ante, considerar e analisar todos os antecedentes lógicos, que a suportam e a pressupõem, dada a sua íntima interdependência, o que releva para a documentação existente ao tempo nos autos onde a M.I. face ao que apresentou e questionou a decidir nos autos, perante a interpretação articulada que se extrai da sua autoria e dos documentos que juntou, s.m.o. interpreta as decisões em crise como decisões eivadas de vícios, erros de má interpretação dos factos e de má subsunção destes ao direito, com má e errada interpretação e aplicação do Direito e ao exercício da Justiça,
IV. Resultando ainda, que se uma decisão judicial sendo um acto jurídico, formal e receptício, subtraído à liberdade negocial, a sua interpretação não pode procurar a reconstituição de uma declaração pessoal de vontade do julgador (entendida na base da determinação de um propósito subjectivo), mas sim o correcto entendimento do resultado final e objectivo de um percurso pré-ordenado à obtenção da dita decisão além do erro daquele percurso, se verifica que a sentença baseada no despacho que lhe antecede, que ao invés de admitir a segunda PI admitiu a primeira e com esta veio-a a declarar inepta, transportou o erro, vício de «simpatia» para a sua segunda decisão,
V. E é através deste percurso, que aquelas decisões devem ser substituídas por outras, cumprindo o devido percurso pré-ordenado de acordo com o Direito para a realização da devida Justiça, pelo que na conjugação de acordo com os critérios estabelecidos nos artigos 236º, nº 1 e 238º, nº 1, ambos do Código Civil e artigos, 247.º, 250.º n.º 1 do CC, e artigo 146.º n.º 1 do C.P.C. conjugado com artigo 248.º do CC, a vontade declarada pela M.I. na primeira PI não corresponde à vontade real da M.I. pelas circunstâncias se verificava a necessidade da correcção (até porque as decisões a basearem-se naquela primeira PI, errada, a declararam inepta), além de que nos termos conjugados dos artigos artigo 2.º al. e) do CPPT e artigos 259.º do C.P.C, conj. com, artigo 35.º do CPPT e artigos 219.º n.º 1 do 260.º, al. b) do art. 262 do C.P.C. e artigo 78.º n.º 2 al. f) e 10.º n.º 10 do CPTA e ainda, artigos 264.º , 265.º e 588.º do CPC, e artigos 63.º (64.º e 65.º) do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) conjugado com artigo 265.º n.º 2 , 3.º e 608.º n.º 2, 6.º n.º 1, “parte final”, do C.P.C. e artigos 52.º, 104.º, 96.º n.º 1, do C.P.P.T. a substituição da PI era sempre legalmente admissível, onde a M.I. pode alterar a causa de pedir, o pedido e até os sujeitos da relação material controvertida caso assim não fosse e a Ré já tivesse sido citada, sempre deveria o tribunal no mínimo pelos deveres de boa gestão e adequação, e processo equitativo, em se esforçar, para que oficiosamente ou a convite, permitir aperfeiçoamentos, convolações, aceitando a segunda PI e nela aproveitar tudo o que pudesse aproveitar, projetar decisão liminar que aprouvesse, sem prejuízo pelo cumprimento do direito ao contraditório, pelo que impedia ao tribunal a quo, antes e em vez de rejeitar a segunda PI, caso assim, mesmo erradamente, não entendesse, notificar para o efeito a autora M.I. a ré, e os contra interessados, insolventes pelo que não poderia a decisão em crise se permitir circunscrever num errado articulado que nunca seria a base para qualquer aperfeiçoamento ou convolação da PI pelo que nos termos do art.º 590.º n.º 1 do C.P.C. a segunda PI tinha que ser admitida e nunca a primeira P.I. decisão que até ofende o poder/dever de cognição do tribunal, da análise critica das provas e do dever de decidir as questões que cumpria solucionar, assim como ofende o pleno direito da M.I. ao dever do ónus de alegação e conclusão – art.º 5.º, 607.º, 608.º do CPC.
VI. A Sentença que sucede ao despacho antes identificado a ser substituído por outra decisão, foi prolactrada com base naquele despacho, ou seja assenta na apreciação da primeira PI e não na segunda PI, pelo que os vícios, erros que servem de fundamento à impugnação daquele despacho se reflectem nesta Sentença, pelo que os mesmos efeitos lhe são aplicáveis, levando-a inexoravelmente à sua impugnação e necessidade de ser substituída por outra de acordo com os factos, com o Direito e Justiça a aplicar ao caso,
VII. A nulidade é o último acto que deva o juiz prolactrar, ou seja, sempre que possível, deve permitir os articulados, os mandar aperfeiçoar, os convolar, esgotar a possibilidade de aproveitamento dos actos, permitir o contraditório e só em último caso, sendo irremediável, declarar a nulidade, no caso errado da PI,
VIII. A Administração Fiscal tem o ónus de provar a factualidade que a levou a imputar à M.I. as dividas que alega e que constituem as citações que a M.I. juntou às PI’s, e diga-se que sobre as mesmas recaíram reclamações graciosas quer dos insolventes quer da A.I. quer da M.I. assim como foi requerido a adesão de fundamentos, assim como a apensação das reclamações graciosas, e a AT ainda não decidiu,
IX. Pelo supra, tais factos são susceptíveis de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte insolvente, assim como a validade da aplicação dos métodos indirectos, e dos respectivos documentos de suporte, e agravando que toda a citação e notificação realizada pela AT deviam e não foram realizadas nos termos legalmente válidos e admissíveis, foram com omissões ou inexistências, assim como as decisões que as notificam deviam ter sido fundamentadas, só então passando a competir ao contribuinte insolvente, o ónus de prova, e nos termos que sejam aplicáveis à M.I. o que impende o exercício do contraditório e da aquisição processual, além dos actos tributários de liquidação subjacentes, como qualquer outro é por natureza um acto divisível e consequentemente é susceptível de anulação mesmo que parcial, no respectivo processo de impugnação, o que nas circusntancias que a sentença declarou estava prejudicada de decidir declarar inepta qualquer das PI’s, muito menos a segunda PI.
X. E como é do conhecimento geral, as reclamações graciosas quando apresentadas antes da impugnação judicial, como foram no caso, devem ser apensas à impugnação judicial e são igualmente consideradas para todos os efeitos, no âmbito do processo de impugnação,
XI. E ainda, os PA’s de reclamação graciosa, aquando, antes do envio do PA ao tribunal o dirigente máximo do serviço da AT, pode revogar total ou parcialmente o acto, o que torna instável os pressupostos da acção e o pedido, agravado que ao juiz quando não conhecer logo o pedido, devia ter ordenado as diligencias de produção de prova necessárias - artigos, 111.º n.ºs 3 e 4 a 114.º do CPPT – o que determina que o tribunal a quo não estava em condições de declarar inepta a PI.
XII. A figura da ineptidão da petição inicial, distingue-se e contrapõe-se à mera insuficiência na densificação ou concretização adequada de algum aspecto ou vertente dos factos essenciais em que se estriba a pretensão deduzida a haver tal insuficiência, ou incompletude devia ser suprida em consequência da aquisição processual de tais factos concretizadores, antes descritos, mesmo a serem revelados no decurso da instrução - art.ºs 5º, n.º 2, alínea b) e 590º, n.º 4 do CPC e 98.º n.º 1 al. b) e n.º 2 a 5, e 111.º a 114 do CPPT - nomeadamente através dos meios de prova requeridos, quer pelos princípios do inquisitório e da oficialidade, o que afecta a compreensão necessária para que houvesse uma livre decisão que não eivada dos vícios, erros antes descritos,
XIII. E atendendo, a uma interpretação de uma PI, em termos paralelos com a previsão do art.º 186.º n.º 3 do CPC, face ao supra, não existirá nos termos das alíneas a) e b) do n.º 2 do art.º 186.º do CPC, ineptidão da PI,
XIV. Quanto ao erro do meio processual, na oposição judicial não pode ser discutida a legalidade da liquidação e esta é tema central na impugnação judicial nas PI’s, além de face às reclamações graciosas nomeadamente entre outros com os seus pedidos de adesão e apensação, dirigidos à AT, ocorridas antes da interposição da acção de impugnação judicial, nos autos em crise e que daquelas reclamações a AT ainda não decidiu, as quais estão no âmbito, pertencem aos temas a decidir nestes autos, as mesmas carecem de decisão que as permita qualificar a pertencerem aos temas de impugnação e os temas que sejam de outro meio processual seguirem os seus devidos termos, pelo que a questão do meio processual, fica prejudicado até ao fim/decisão que sejam dadas aquelas reclamações, poderem fazer emergir em separado sem perdas de prazo ou oportunidade outras acções que correspondam ao exercício do direito tutelado à defesa dos interesses da ora recorrente, todavia o objecto, peça processual que é licita fazer emergir tais decisões é a segunda PI.
XV. Quanto às PI’s serem de impugnação, resulta bem claro que são de impugnação, resulta logo pelos valores que indica de 2.708.247,53€, referente a mais valias, e o demais de 509,69€ e 2.910,67€, respetivamente referentes a coimas e IMI que declara que estas duas correrão noutros tramites, e estão aquelas duas referenciadas na segunda PI, porque das reclamações conta requerida a apensação de todas para uma decisão global e conjunta,
XVI. E ainda face ao teor das PI’s, se podem extrair condições para vir a ocorrer extinção da instância (ou de pedido) referente à M.I. por inutilidade superveniente da lide pela pretensão da invalidade das liquidações, por nulidade ou anulação total dos impostos, assim como após a preclusão de prazos, ter ocorrido a falta ou deficiência da notificação da AT e dos seus fundamentos que é invocada, questões que são matéria de impugnação,
XVII. Assim como a entender-se a ocorrência de litispendência, que não está prevista como fundamento da oposição – veja-se, Artigo 97º, nº 3 da LGT, e 98º, nº 4 do CPPT e artº 499º do CPC – ou perante a preterição do litisconsórcio necessário, que face à própria natureza da relação Juridica, é necessário que a decisão a obter produza o seu efeito útil normal, evitando-se também assim a inutilidade futura ou a contradição prática de julgados até para a delimitação do recurso – art.º 33.º, 35.º e 635.º n.º 1 do CPC – será matéria para impugnação,
XVIII. Verificando-se que as PI´s estão identificadas como de impugnação judicial e não de oposição, pelo que na parte de matéria de impugnação, a haver seria o aperfeiçoamento, quanto à matéria que fosse de oposição, a poder haver convolação, se carecia que a Sentença, remetesse para oposição ou absolvesse a instância e permitisse em prazo, a M.I. apresentasse a PI de oposição àquelas matérias, todavia a Sentença nem aquela nem esta hipótese, nem as duas concedeu, erro na interpretação e aplicação do direito face ao dever de gestão e adequação processuais e aproveitamento dos actos processuais,
XIX. Assim até por se permitir a convolação de impugnação em oposição mas já não o inverso, pelo que a impugnação judicial constitui o meio de reação paradigmático de que dispõe o contribuinte para atacar, com fundamento em qualquer ilegalidade, o ato de liquidação do tributo, sendo igualmente este o meio processual adequado para reagir contra outros atos em matéria tributária para os quais a lei preveja ser este o meio de reação do contribuinte e não sendo o mesmo se permite ser nomeadamente convolado, pelo que também por esta razão a decisão de ineptidão da PI deve ser substituída por outra de acordo com o direito e justiça,
XX. E o erro na forma de processo, para que constitua exceção dilatória que determinará a anulação de todo o processo, teria que ser uma nulidade que atingisse todo o processo, no caso toda a PI, e como se viu, a existir, que no mínimo até ao presente não existe, nunca corresponderia a uma nulidade total, assim como as previsões:
a. «a nulidade de uma parte do acto não prejudica as outras partes que dele sejam independentes» e ainda,
b. «Se o vício de que o acto sofre impedir a produção de determinado efeito, não se têm como necessariamente prejudicados os efeitos para cuja produção o acto se mostre idóneo»
c. e ainda «nas nulidades devem sempre aproveitar-se as peças úteis ao apuramento dos factos» e,
d. «no erro da forma do processo, será convolado na forma de processo adequado nos termos da lei»
e. O que se extrai do n.ºs 2 in fine e n.º 3 do artigo 195.º do CPC e ainda do artigo 98.º n.ºs 3 e 5 do CPPT.
XXI. A haver, algum tipo de nulidade a Sentença deveria ter aproveitado tudo o que pudesse ser aproveitado, pelo que as decisões não interpretaram nem aplicaram corretamente o direito, e impende sobre o juiz, proceder ao aproveitamento dos actos, face nomeadamente aos princípios anti-formalista, pro actione e pro favoritate instantiae, nomeadamente como se extrai ainda do nº 4 do artº 98º do CPPT em conjugação com os artºs 97º, nº 3 da LGT e 7º do CPTA – e ainda porque, o processo tributário, segue o principio do contraditório, participando o contribuinte, nos termos da lei, na formação da decisão o processo judicial tributário tem por função a tutela plena, efectiva e em tempo útil dos direitos e interesses legalmente protegidos em matéria tributária - art.º 98.º n.ºs 1 al. b) e n.º 2 do CPPT art.º 48.º n.º 1 do CPPT art.º 45.º n.º 1 do CPPT art.º 96.º n.º 1 do CPPT.
XXII. Ainda sobre as decisões agora em crise e suas notificações, se verifica que as decisões ora impugnadas, face ao litisconsórcio necessário, permitem afectar os direitos dos insolventes, pelo que deviam ter sido notificadas as decisões, aqueles e lhes permitir participar nos autos, assim como face à especificidade nos autos da existência de Administradora Judicial, devia ter sido notificada o que não foi – art.º 36.º e 40-A do CPPT.
XXIII. Que o processo seja remetido eletronicamente ao tribunal superior através do sistema informático de suporte à actividade dos Tribunais Administrativos e Fiscais, nos termos previstos no art.º 27.º da Portaria n.º 380/2017 de 19 de Dezembro.


A Recorrida não apresentou contra-alegações.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

O Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


II – Fundamentação

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme previsto nos artigos 635/4 e 639/1.2 do Código de Processo Civil (CPC), sendo as de saber, em primeiro lugar se as decisões recorridas enfermam de erro de julgamento ao não ter admitido a junção de nova petição inicial e, em caso de resposta negativa, ao julgar inepta a petição inicial e indeferir liminarmente a petição inicial.


II.1- Pertinente, releva dos autos o seguinte:

A) Em 2022.07.01, no Tribunal Tributário de Lisboa deu entrada a petição de impugnação, constante de fls. 6 – doc nº 004637948, que aqui se dá como integralmente reproduzida, na qual a impugnante, termina pedindo:

«(…)
Por todo o supra se requer, a V/Exa. com o douto suprimento:
a. que a presente impugnação seja livre de quaisquer garantias para a suspensão dos actos impugnados,
b. Seja suspensa a execução fiscal, sem necessidade de prestar garantias,
c. Que sejam suspensos todos os actos da administração Tributária identificados,
d. Seja mandada a secretaria se oficiar com vista a obter as certidões supra requeridas, assim como o PA da AT.
e. Sejam anulados os actos da AT.
f. Não seja a M.I. considerada responsável pelos tributos,
g. Não seja a A.I. responsável tributaria nem responsável subsidiária.»
(…)

B) Em 2022.07.14, deu entrada requerimento contendo nova petição de impugnação, constante de fls. 171 e que aqui se dá por integralmente reproduzida na qual termina pedindo:

(…)
Pedido:
Por todo o supra se requer, a V/Exa. com o douto suprimento:
a. Seja admitido o pedido de intervenção provocada dos insolventes e em consequência serem citados do presente.
b. Que as reclamações graciosas subscritas pela A.I. e pelos mandatários da M.I. dirigidas à AT, aqui identificadas, sejam apensadas aos presentes autos, assim como as identificadas reclamações dos Insolventes,
c. Que daquelas reclamações e seus P.A. e documentação requerida e ora junta, com a produção de prova requerida, sejam aqui decididos, impugnados os actos da AT pelos quais deram causa, ao pedido e às formalidades preteridas subjacentes, nulidades, vícios, ilegalidades, pelas quais a AT formula em Citação pedido para a M.I. pagar 2.708.247,53€.
d. Que seja extraída das referidas reclamações graciosas os pedidos da AT referente a coimas (509,69€) e a IMI (2.910,67€) os quais devem prosseguir os tramites de reclamação graciosa, junto da AT expurgados dos vícios, nulidades, preterição de formalidades aqui identificados e reclamados,
e. Que a presente impugnação seja livre de quaisquer garantias para a suspensão dos actos impugnados, assim como não permita a AT em praticar qualquer acto que obstaculize as decisões proferidas no processo de insolvência, nomeadamente, liquidação da M.I. nem reflexamente onere com apreensões ou penhoras ou outros meios de garantia a M.I.
f. Sejam suspensos os actos de execução fiscal, e seu processo, sem necessidade da M.I. prestar garantias,
g. Que sejam suspensos todos os actos da administração Tributária identificados, mesmo que conexos, com a pretensão da AT em ver reconhecidos créditos emergentes de mais valias.
h. Seja mandada a secretaria se oficiar com vista a obter as certidões de teor integral com menções especiais, supra requeridas, no ponto 7, junto do tribunal onde corre o processo de insolvência, assim como certidões dos Processos Administrativos, referentes às reclamações antes identificadas, aos processos executivos em curso e dos que a AT teve ou tem intervenção como parte, interessada nos autos de insolvência e de PER, assim como dos processos inspetivos da AT desde o ano de 2014 e
i. Que os preparos e despesas com certidões fiquem prejudicados até que a Seg. Social, decida do apoio judiciário requerido pela M.I. sem prejuízo de até lá a secretaria proceder aos bons ofícios com vista a obter as referidas certidões, a levar em conta de custas, independentemente do apoio judiciário que venha a ser decidido.
j. Não seja a M.I. considerada responsável pelos tributos.
k. Não seja a A.I. responsável tributaria nem responsável subsidiária.
(…)

C) Por despacho de 2022.09.22, foi indeferida a requerida junção da petição inicial identificada na alínea que antecede e que deu entrada em 2022.07.14, contante de fls. 385 – doc. nº 004637985 e que aqui se dá por integralmente reproduzido; deste despacho transcreve-se:

«Indefere-se a junção de petição inicial aperfeiçoada requerida em 11-07-2022 e que deu entrada em 14-07-2022, uma vez que não se trata de uma mera correcção de lapsos de escrita, mas da invocação de novos fundamentos/factos.»

D) É o seguinte o teor do despacho que indeferiu liminarmente a petição inicial de impugnação sob recurso:

«Massa Insolvente de António Ministro dos Santos, NIF 136872875 e de sua cônjuge Helena Maria Kéri de Almeida Ricardo Ministro dos Santos, NIF 136872883, insolventes residentes na Rua Manuel Marques, n.º 12, 49 E, 1750-171 Lisboa, com processo de Insolvência a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Oeste, Sintra, Juiz 2, processo n.º 7951/17.1T8SNT, e onde é Administradora da Insolvência (AI), a Dra. Maria de Fátima Teixeira Gonçalves, com escritório em Rua Laura Alves, n.º 7, 1.9 C, 2675-608 Odivelas, deduziu a presente impugnação judicial com pedido de dispensa de garantia, na sequência da apresentação pela AI de reclamação perante a Administração Tributária (AT), questionando as citações que lhe foram efectuadas, no âmbito de vários Processos de Execução Fiscal (PEF).
Conforme consta da petição inicial, a Massa Insolvente pretende impugnar, anular os seguintes actos tributários (art.º 97.º n.º 1 als. a) a d) do CPPT):
a. - Actos de liquidação de tributos,
b. - Actos de fixação da matéria tributável,
c. - Actos de indeferimento de reclamações graciosas
d. - Actos administrativos em matéria tributável para apreciação da ilegalidade do acto de liquidação;
Atribui àqueles actos os seguintes vícios:
- Erros na qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários e a fundada na dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário por métodos indirectos – art.º 99.º al. a), 100.º n.º 1 do CPPT,
- Ausência ou vicio de fundamentação – art.º 99.º al. c) do CPPT e 268.º n.º 3 da CRP e 77.º n.º 1, 4 e 5 da LGT
- Anulabilidades de actos, por vícios de forma, por não observância dos requisitos procedimentais e formais; falta de notificação legalmente exigível; falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia – arts. 99.º al. d) e 134.º do CPPT e 60 da LGT.
Identifica os actos impugnados por referência aos documentos n.ºs 1 e 2, os quais comportam as citações da Unidade dos Grandes contribuintes, e actos subjacentes, com certidões de divida de processos de execução fiscal, e pelas reclamações da Massa Imnsolvente/Administradora da Insolvência. de 27-06-2022, expedida pelo Obj. Postal n.º RH……PT, e e-mails, da A.I. de 24 de Junho e de 07 de Junho de 2022.
Da remissão para os documentos juntos é possível identificar que os actos cuja legalidade é sindicada e correspondem às citações efectuadas no âmbito dos seguintes PEFs:
- PEF Nº 3344202201027050, instaurado contra A… e H…., para cobrança coerciva de € 2.708.247,53, referente a IRS do ano de 2017,
- PEF Nº 3344202101136020, instaurado contra A….para cobrança coerciva de € 451,50, referente a coimas e Encargos de Processos de Contra-Ordenação do ano de 2021.
- PEF Nº 3344202201014927, instaurado contra António Ministro dos Santos para cobrança coerciva de € 2.716,05, referente a IMI do ano de 2020
Do petitório e dos documentos para os quais remete, é possível extrair sinteticamente as seguintes alegações:
- Que na sequência das citações que lhe foram efectuadas em 24-05-2022 e 05-05-2022 no âmbito dos PEFs supra identificados, apresentou à Administração Tributária, em 24-06-2022, uma reclamação questionando a legalidade das mesmas, por considerar não ser responsável pelo pagamento das dívidas em execução.
- Que foi notificada em 30-06-2022 da resposta da Administração Tributária, na qual, além do mais se informa, que o meio processual próprio para reagir contra as citações que lhe foram efectuadas, é a oposição à execução, com os fundamentos previstos no art. 204º do CPPT, convidando-se a apresentante à correcção/convolação da petição e a dirigi-la ao juiz do tribunal administrativo e fiscal competente.
- Que na presente impugnação, remetida a tribunal em 01-07-2022, pretende-se sindicar a legalidade da resposta obtida à reclamação apresentada na AT, imputando-lhe incongruências, referindo nomeadamente que a “AT tem todos os elementos para diretamente apreciar, decidir, haverem ou não mais ou menos valias a haver e a obter por métodos directos e não indirectos”(…) “Quanto a coimas que a AT pretende aplicar (…) com a actividade encerrada, do insolvente, inexiste a empresa (…) e como é do conhecimento da AT, tal actividade está encerrada, a coima pressupões uma censura, subjectiva, para a qual a sua imputação carece da existência da empresa/actividade, que inexiste, logo é inaplicável pelo que a interpretação que a AT no seu ponto 8 do e-mail de 29-Junho-2022, faz não pode ser válida, erro de facto e de direito (…) Sobre a citação de IMI de 2020 (…) o que teria que fazer a AT seria notificar a M.I. através da sua administradora para pagamento, há uma incongruência, ora se a AT entende que não tem que citar o insolvente para nada, mas notifica aquele para proceder ao pagamento das liquidações de IMIS e AlMs,(…)sendo a M.I. condenada por facto desconhecido a si não imputável, pelo que tal falta de pagamento, deve o insolvente esclarecer e provar, e caso exista a falta de pagamento, a M.I. deve pagar o tributo, mas quanto aos juros por tal omissão não poderá ser responsável (…) Assim quanto ao apuramento da liquidação e a sua exigibilidade dos impostos em causa, assim como quanto á responsabilidade, pelo pagamento, do supra se verifica que a AT produz actos inválidos, que devem ser substituídos por outros, (…) neste sentido não tem razão o declarado pela AT (…) na parte que entende a dívida por mais valias ser da M.I. quando a haverem responsáveis no mínimo será a CEMGeral, e como se pode entender não haver mais valias mas antes menos valias, não é exigível qualquer pagamento, muito menos quando a AT obtém valores por métodos indiretos (…) Quanto ao erro na identificação do sujeito passivo, e da AT considerar que a A.I. é responsável subsidiária ou responsável tributaria pelos Insolventes (…) se forem exigíveis e lícitos algum pagamento de impostos, ao caso concreto, não pode ser a pessoa da A.I. responsável subsidiária, mesmo que tal fosse responsável a M.I., mas antes a ser responsável subsidiário seria a CEMG e ou o insolvente. (…) Que a AT detinha, detém todos os meios probatórios, para realizar prova dos factos que alega ter direito, tendo a AT praticado actos ilegais, e ou nulos, porquanto existirem erros quanto à identificação do sujeito passivo, o que é uma ausência ou vicio da fundamentação legalmente exigida, sem razões de facto e de direito, sem exposição dos motivos e razões nem dos pressupostos de facto e de direito, nem da fundamentação oficiosa, completa, clara, actual e expressa devida, não se tendo assim verificado o cumprimento dos requisitos e procedimentos formais, faltando inclusive a notificação legalmente exigível e para o exercício do direito de audição (…)
Que a notificação da liquidação tinha que ser feita à M.I. e não foi o que viola a previsão do art.º 81.º n.º 4 do CIRE, e 41.º n.º 3 do CPPT na pessoa do A.I. nem foi respeitado o direito de audiência e resposta (…) que a AT omite mas tem intenção de penhorar bens do insolvente, o que desde já se diga que os bens apreendidos para a M.I. não devem ser penhorados, nem onerados nem dados em garantia, à AT (…) A AT., nas suas citações, pretende pagamento e acrescidos ou requerer dação ou até à venda dos bens penhorados obter o pagamento em prestações, ou obter garantia, caso em que a AT declara perseguir com penhora de bens ou direitos existentes no património da citada no valor suficiente para cobrar as dividas (…) Ora estamos perante comportamentos abusivos da AT, em pleno abuso de Direito, a AT, sabe que a transacção não foi uma venda foi uma dação, ou seja pela venda dos bens em que a AT por métodos indirectos, pretende arrecadar 2.708.247,53€, sabe que não tem esse valor, nem se sabe se a M.I. alguma vez vai conseguir obter esse valor pela liquidação do activo apreendido para a M.I.(…)»
A Impugnante termina formulando o seguinte pedido:
«a. que a presente impugnação seja livre de quaisquer garantias para a suspensão dos actos impugnados,
b. Seja suspensa a execução fiscal, sem necessidade de prestar garantias
c. Que sejam suspensos todos os actos da administração Tributária identificados,
Tribunal Tributário de Lisboa
d. Seja mandada a secretaria se oficiar com vista a obter as certidões supra requeridas, assim como o PA da AT.
e. Sejam anulados os actos da AT.
f. Não seja a Massa Insolvente considerada responsável pelos tributos,
g. Não seja a Administradora da Insolvência responsável tributária nem responsável subsidiária.»
*
Nos termos do artigo 110º, nº 1 do CPPT, cumpre proferir despacho liminar, tendo por base a petição inicial constante dos presentes autos de impugnação judicial.
Apreciando.
Da análise à petição inicial e documentos para que a mesma faz remissão, resulta, que se pretende questionar toda a actuação da AT no que tange à situação tributária dos insolventes, imputando-lhe incongruências, nomeadamente no que se refere à resposta à reclamação apresentada na sequência da citação em processo de execução fiscal.
Vejamos.
O artigo 552º do CPC, aplicável em sede de processo judicial tributário por força do disposto no art. 2º, al. e) do CPPT, estabelece os requisitos a que deverá obedecer a petição inicial.
Entre os requisitos exigidos pelo citado normativo legal, encontra-se (al. d) e e)) a exposição dos factos e das razões de direito que servem de fundamento à acção e a formulação do pedido, cominando a lei com a ineptidão da petição inicial, as situações em que falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir, quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir e quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis (art. 186º, nº 2 do CPC), facto gerador de nulidade de todo o processo, passível de conhecimento oficioso até ao trânsito em julgado da decisão final (art. 186º, nº1 e artigo 98º, nº 1, al. a) e nº 2 do CPPT).
A causa de pedir pode definir-se como o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido, não bastando a indicação vaga ou genérica dos factos em que a impugnante fundamenta a sua pretensão para que se verifique o preenchimento de tal exigência legal (cfr. Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, 2ª edição, Coimbra, Editora, 1945, pág. 369 e segs). Segundo o Professor J. Alberto dos Reis (Comentário, II, pag. 370), o autor, na petição inicial, para além de formular o pedido “tem de especificar a causa de pedir, ou seja, a fonte desse direito, o facto ou o acto de que, no seu entender, o direito procede” .
Como bem se alcança de uma análise da materialidade descrita petição inicial, complementada, por remissão, pelos documentos anexos, esta não se encontra elaborada em conformidade com o disposto no artigo 552º do CPC.
Compulsada a petição inicial, verifica-se que a impugnante não indica claramente qual ou quais os actos cuja legalidade pretende ver apreciada, nem indica claramente quais as causas de pedir, indicando causas de pedir e pedidos que correspondem a formas de processo distintas.
Concretizando:
A impugnante questiona a legalidade da utilização de métodos indirectos na determinação da matéria tributável sem identificar o tributo, não identificando em concreto a liquidação, nem o facto tributário que lhe deu origem.
Do contexto da petição e documentos anexos, pode depreender-se que se trata de uma transacção, que terá dado origem a rendimentos de mais-valias tributáveis em sede de IRS. Contudo carece de elementos concretizadores da situação de facto subjacente.
A impugnante questiona, igualmente, a sua responsabilidade no pagamento do IMI e coimas.
Ora, tendo sido citada em processo de execução fiscal, o meio próprio para reagir, invocando algum dos fundamentos taxativamente previstos no art. 204º do CPPT, seria a oposição à execução fiscal, regulada pelos artigos 203º e segs. do CPPT.
Por outro lado, a dispensa de garantia para suspender a execução deve ser formulado perante o órgão da execução fiscal e, em caso de indeferimento, caberá reclamação para o tribunal, nos termos do artigo 276º do CPPT.
Fazendo um esforço interpretativo, a argumentação expendida padece de várias incongruências e lacunas, e elementos concretizadores, sendo, no entanto possível concluir que à apreciação do pretendido, correspondem formas de processo distintas.
Por um lado, a apreciação da legalidade da utilização de métodos indirectos na determinação da matéria tributável poderia ser apreciada, nos termos do artigo 102º do CPPT, no processo de impugnação judicial, que é o meio próprio para obter a anulação de actos de liquidação de tributos com fundamento em ilegalidade dos mesmos.
Por outro lado, à invocação pela impugnante, que não é responsável pelo pagamento das dívidas exequendas, corresponde o processo de oposição á execução fiscal regulado pelos artigos 203º e segs. do CPPT.
Já o pedido de dispensa de prestação de garantia deve ser formulado perante o órgão da execução fiscal.
Ora, no caso em apreço, a petição expõe de forma incompleta os factos que fundamentam a acção e formula um pedido que abrange toda a actuação da AT, a qual, como se sabe, se concretiza na prática de actos de diversa natureza (p. ex. liquidações, citações etc.), a que os contribuintes podem reagir através de diferentes meios processuais.
Face ao exposto, conclui-se que, a presente impugnação, é inepta, nos termos dos arts. 186º nº1 e nº2, al. a) do CPC aplicável por força do art. 2º, al. e) do CPPT, o que constitui nulidade insanável em processo judicial tributário, conforme dispõe o art. 98º, nº1, al. a) do CPPT.
Constituindo a cumulação de pedidos e causas de pedir substancialmente incompatíveis, uma nulidade, de conhecimento oficioso (artigo 186º, nº1 e nº2, al. c) e 196º º do CPC), encontra-se o Tribunal impedido de a procurar suprir através de despacho de aperfeiçoamento (art.º 98º, nº1, al.a) do CPPT).
*
Nestes termos, ao abrigo do disposto nos artigos 186º, nº1 e 2 e 590º, n.º 1, do CPC, indefere-se liminarmente a petição inicial da presente impugnação.
(…)»


II.2- Do Direito

A Recorrente não se conforma com o despacho que indeferiu a junção de nova petição inicial recorrendo também do despacho de indeferimento liminar da primeira das petições iniciais entregues.

Com efeito, a Massa Insolvente, ora Recorrente, entregou no Tribunal Tributário de Lisboa uma primeira peça processual de impugnação judicial, «com dispensa de garantia», dos atos de liquidação dos tributos, coimas e encargos, atos de liquidação que identifica como apenas como aqueles que lhe estão a ser exigidos nos processos de execução fiscal para os quais foi citada.

Naquela petição inicial (pi) no artigo 1º diz pretender anular os atos de liquidação de tributos, os atos de fixação da matéria tributável e os atos administrativos em matéria tributável para apreciação da ilegalidade do ato de liquidação. E, no artigo 2º identifica os seguintes vícios dos atos: (a) erros na qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários; (b) ausência ou vício de fundamentação e (c) anulabilidade de atos, por vícios de forma, por não observância dos requisitos procedimentais e formais; falta de notificação legalmente exigível; falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia.

Espontaneamente a ora Recorrente entregou nova peça processual que corresponderia, em seu entender, a uma nova petição «aperfeiçoada», em que pede a intervenção provocada dos insolventes e no artigo 10º diz pretender impugnar: (a) os atos de liquidação de tributos; (b) atos de fixação da matéria tributável; (c) atos de indeferimento de reclamações graciosas; (d) atos administrativos em matéria tributável para apreciação da ilegalidade do ato de liquidação. E no artigo 11º identifica os seguintes fundamentos da impugnação: (e) erros na qualificação e quantificação dos rendimentos, lucros, valores patrimoniais e outros factos tributários e a fundada na dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário por métodos indiretos; (f) ausência ou vicio de fundamentação; (g) anulabilidades de atos, por vícios de forma, por não observância dos requisitos procedimentais e formais; falta de notificação legalmente exigível; falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia.

Anote-se que, além da dispensa de prestação de garantia para suspensão dos processos de execução fiscal, vem ainda peticionado que a exequente, Autoridade Tributária e Aduaneira se abstenha de praticar atos de apreensão ou de penhora de bens que integrem a massa insolvente, que a massa insolvente não seja considerada responsável pelos tributos e que as execuções não sejam revertidas contra a Administradora da Insolvência.

Quando esta «nova petição inicial» foi apresentada não tinha ainda sido proferido qualquer despacho no processo.

No primeiro despacho proferido em 2022.09.22, foi logo indeferida a junção da referida petição inicial «aperfeiçoada», com fundamento em não se tratar de uma mera correção de lapsos de escrita, mas da invocação de novos fundamentos/factos [cf. despacho transcrito supra na alínea c)]. Na verdade, acrescentamos nós, na nova petição pede a intervenção de novos sujeitos, altera a causa de pedir e cumula novos pedidos.

E, logo em seguida foi proferido o despacho recorrido e supra transcrito que julgou inepta a pi pelas razões nela apontadas e que se podem esquematicamente resumir à (i) falta de identificação do ato tributário impugnado; (ii) falta de exposição dos factos essenciais que constituem a causa de pedir e as razões de direito que servem de fundamento à ação, (iii) deficiente formulação do pedido.

A primeira questão apreciar no presente recurso dirá assim respeito à manutenção do despacho que indeferiu a junção daquela segunda petição inicial, porquanto a ser admitida a sua substituição, o despacho de indeferimento liminar que julgou inepta aqueloutra primeira petição inicial, por ter recaído e apreciado apenas a primeira das petições, não se poderá, naturalmente, manter.

Vejamos então se a ora Recorrente no período que antecede a citação da Impugnada, podia substituir a petição inicial, como defende nas suas alegações de recurso.

O princípio da estabilidade da instância, consagrado no artigo 260º do Código de Processo Civil (CPC), diz-nos: «citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei

Sem consagração expressa no CPPT, este princípio não deixa de estar presente no contencioso tributário, face à aplicação supletiva do CPC – artigo 2º alínea e) CPPT. Assim tem decidido a jurisprudência.

Nesse sentido chamamos à colação o recente acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, 2ª Seção, de 2021.03.10, Proc nº 0473/11.6BEALM disponível em www.dgsi.pt., com o qual concordamos e de cujo sumário transcrevemos:

«Princípio estruturante, transversal aos vários edifícios jurídico-processuais portugueses, é o da estabilidade da instância, afirmativo de que, citado/notificado o réu/demandado/ impugnado, esta se deve manter a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, com ressalva das situações de exceção, consignadas na lei - art. 260.º do Código de Processo Civil (CC) »

É, assim, a citação do Impugnado que torna estáveis os elementos essenciais da causa, i. é, quanto aos sujeitos, à causa de pedir e o pedido – cf. alínea b) do artigo 564 do CPC.

Citando Lebre de Freitas (1) (…) «A instância é inicialmente conformada pelo autor na petição inicial, nos seus elementos subjetivos (“quanto às pessoas”) e objetivos (pedido fundado numa causa de pedir). Até ao momento da citação, o autor pode ainda alterar a conformação por si efetuada, mediante modificação dos sujeitos ou do objeto da ação, sem prejuízo da não retroatividade dos efeitos da proposição que se reportem apenas à nova petição que apresente. A citação do réu fixa os elementos definidores da instância, que seguidamente só é alterável na medida em que a lei o permita.»

Seguindo esta orientação conclui-se que até à notificação da Administração Fiscal para contestar, podia o Impugnante apresentar nova petição, e não apenas aperfeiçoar a petição inicialmente apresentada.

Tem, pois, que ser dada razão à ora Recorrente: até à citação da Ré podia a Impugnante apresentar da nova petição inicial com alteração ou ampliação do pedido.

O despacho que indeferiu a apresentação de nova petição inicial não se pode, pois, manter e irá ser revogado e em substituição é proferido despacho no sentido da sua admissão.

Embora formalmente tenham sido proferidos dois despachos no processo, o primeiro que julgou inadmissível a junção da nova petição inicial e o segundo de indeferimento liminar da petição inicial, verifica-se uma conexão umbilical entre eles, sendo que o primeiro determinou que a petição que foi apreciada e liminarmente indeferida foi a substituída.

Desaparecendo aquele primeiro despacho de não admissão da petição inicial, constata-se que o Tribunal a quo não apreciou ainda a petição inicial, a nova petição inicial entregue antes da citação/notificação da Impugnada. Com efeito, não subsistindo aquele primeiro despacho, o subsequente despacho de indeferimento liminar que, insiste-se, apreciou apenas a petição substituída não se pode manter: a revogação do primeiro projeta os seus efeitos sobre o segundo despacho recorrido.

Em suma, revogando-se o despacho que não admitiu a apresentação da nova petição e decidindo-se, em substituição por deferir a sua admissibilidade, o subsequente despacho que indeferiu a petição inicial substituída perdeu objeto e não se pode, pois, manter.

O despacho de indeferimento liminar recorrido que recaiu apenas sobre aquela primeira petição inicial substituída, pelas razões expostas é de revogar assim se verificando que o Tribunal a quo não se pronunciou ainda sobre a nova petição: consequentemente não deve este Tribunal de recurso pronunciar-se sobre ela.

Em face do exposto, procede o recurso devendo os autos baixar ao Tribunal a quo a fim de ser proferido novo despacho liminar pronunciando-se sobre a nova petição inicial.


Sumário/Conclusões:

I. O princípio da estabilidade da instância, consagrado no artigo 260º do Código de Processo Civil (CPC), diz-nos: «citado o réu, a instância deve manter-se a mesma quanto às pessoas, ao pedido e à causa de pedir, salvas as possibilidades de modificação consignadas na lei
II. Este princípio não deixa de estar presente no contencioso tributário, face à aplicação supletiva do CPC – artigo 2º alínea e) CPPT.
III. É a citação do Impugnado que torna estáveis os elementos essenciais da causa, i. é, quanto aos sujeitos, à causa de pedir e o pedido – cf. alínea b) do artigo 564º do CPC.


III - Decisão

Termos em que, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogando-se os despachos proferidos e determinando-se a baixa dos autos ao Tribunal Tributário de Lisboa para ser proferido despacho liminar.

Sem custas.

Lisboa, 2 de novembro de 2023

Susana Barreto

Jorge Cortês

Tânia Meireles da Cunha

_____________
(1) Aut Cit, CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL; Anotado, volume 1º, 2014, pág. 505: