Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:350/17.7 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/19/2023
Relator:HÉLIA GAMEIRO SILVA
Descritores:CONTRAORDENAÇÃO FISCAL
PRESCRIÇÃO DO PROCEDIMENTO CONTRAORDENACIONAL
IVA
INTERRUPÇÃO E PRESCRIÇÃO
Sumário:I - A falta de entrega da prestação tributária (IVA) dentro do prazo (T) constitui uma infração punida pelo artigo 114.º n.º 2 do RGIT trata-se de uma situação dependente do apuramento do imposto em falta, já liquidado, para a qual o artigo 45.º, nº 1, da LGT, prevê um prazo de caducidade do direito à liquidação de quatro anos, esclarecendo no n.º 4 da mesma disposição legal que o prazo de caducidade se conta, excecionalmente a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.
II - A interrupção do prazo de prescrição, determina o reinício da contagem do prazo, porém na situação em análise, o decurso do novo prazo encontra-se limitado pela regra imposta pelo n.º 3 do artigo 28° do RGCO, supratranscrita, que determina que a prescrição tem sempre lugar “quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade”.
III - Para efeitos de contagem de prazo de suspensão ressalta das alíneas b) e c) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 27.ºA do RGCO que, nestes casos a suspensão não pode ultrapassar seis meses.
Votação:Unanimidade
Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes da Subsecção da Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenação do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

V………, melhor identificada nos autos, veio interpor recurso judicial da decisão administrativa de fixação da coima, proferida pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3, no processo de contraordenação nº ..........26, no montante de € 9.161,20 acrescido de € 76,650 de custas, pela prática da contraordenação prevista nos artigos 27.°, n.° 1 e 41.°, n.° 1, alínea a) do CIVA indicando como norma punitiva o artigo 114.°, n.º 2 e 5, alínea a) e 26.°, n.º 4 do RGIT.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença de 30 de junho de 2022, julgou extinto o procedimento de contraordenação com o seu consequente arquivamento.

Inconformada, a FAZENDA PUBLICA, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:
« 5.1. Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou extinto o procedimento de contraordenação n.° ……….26, movido pelo Serviço de Finanças de Lisboa 3 à Recorrente pela prática da contraordenação prevista e punida pela conjugação dos artigos 27.°, n.° 1 e artigo 41.°, n.° 1, alínea a) do CIVA, e artigos 114.°, n.° 2 e 5, alínea a) e 26.°, n.° 4 do RGIT, e no qual foi aplicada à arguida a coima no montante de 9.161,20 €, montante este acrescido de custas processuais no valor de 76,50 €.

5.2. O Ilustre Tribunal "a quo” declarou extinto o procedimento de contraordenação n.° ..........26, por nele se ter verificado a prescrição do procedimento contraordenacional.

5.3. Para tanto, considerou o Ilustre Tribunal recorrido, no decisório ora em crise, em suma, que desde a data da infração fiscal de que foi acusada a arguida, ora recorrida, até à data da prolação da decisão ora em apreciação, já havia decorrido o prazo de prescrição do procedimento acrescido de metade, acrescido do tempo em que o prazo prescricional esteve suspenso nos termos do artigo 27.°-A do RGCO, conforme o disposto no artigo 28.°, n.° 3, do RGCO, normas ora aplicáveis por força do disposto na al. b) do artigo 3.° do RGIT.

5.4. No entanto, a decisão ora recorrida, não perfilhou, com o devido respeito, e salvo sempre melhor entendimento, a acertada solução jurídica no caso sub-judice.

5.5. Antes de mais, refira-se que, nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 83.° do RGIT, e atento o valor da coima aplicada à arguida nos autos de contraordenação supra citados, é admissível o presente recurso.

Isto porque,

5.6. apesar de na sentença ora em crise ter sido atribuído o valor à causa de 237,65 €, o facto é que, noa termos do disposto no n.° 1 do artigo 83.° do RGIT, o presente recurso é sempre admissível, uma vez que, conforme melhor se pode aferir pela compulsa do despacho de aplicação à arguida da coima em questão, o valor da coima aplicada (9.161,20 €) é superior a % da alçada fixada para os tribunais judiciais de 1.a instância (1.250,00 €).

Posto isto,

5.7. e como decorre do conteúdo da sentença proferida, decidiu o Tribunal “a quo” fixar com interesse para a sua decisão, a matéria de facto constante das alíneas a) a g) do ponto IV da fundamentação de facto da decisão ora recorrida - cfr. págs. 3 e 4 do suporte documental da decisão ora em crise, e que ora se dá por reproduzida.

5.8. Em primeiro lugar, refira-se que o Ilustre Tribunal a quo considerou, na fundamentação de direito do decisório ora em crise, que “No caso concreto, estando em discussão a aplicação de coima pela prática de contraordenação, prevista no artigo 17.°, n.° 2 do Código do Imposto Único de Circulação [CIUC], por falta de pagamento do imposto devido...”. Circunstância esta que não corresponde à realidade, pois em causa nos autos de contraordenação n.° ..........26 encontra-se em discussão a infração tributária de cuja prática a arguida foi acusada decorrente da falta de pagamento, não de IUC mas antes de IVA do período de 12/2011 - cfr. a alínea a) dos factos provados, bem como a decisão administrativa objecto do recurso de contraordenação.

5.9. Conclui-se, assim, ter o Ilustre Tribunal a quo incorrido em erro no julgamento da matéria de facto.

Depois

5.10. considerou o Ilustre Tribunal recorrido, na sentença ora em apreciação, que “...estando em causa o pagamento de um imposto periódico e anual...” quando, em verdade, o IVA não tem natureza de imposto anual.

5.11. Razão pela qual, com o devido respeito e s.m.e., se colhe ter, neste segmento do decisório, incorrido em erro de direito no julgamento da causa.

5.12. Seguidamente, entendeu o Ilustre Tribunal recorrido que “.nos termos do artigo 45.º, n.° 4 da LGT, o prazo de prescrição conta-se a partir do termo do ano da verificação do facto tributário, ou seja, 31/12/2013.”, quando, em verdade e nos termos do disposto no n.° 1 do artigo 33.° do RGIT, o início do decurso do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional tem lugar após a prática da infração tributária e não como considerou o Ilustre Tribunal a quo “a partir do termo do ano da verificação do facto tributário”.

5.13. Assim sendo, e pelo exposto, colhe-se que o Ilustre Tribunal recorrido, ao considerar que, in casu, o início do decurso do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional teve lugar após o termo do ano da verificação do facto tributário, nos termos do disposto no n.° 4 do artigo 45.° da LGT, incorreu, com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, em erro de direito no julgamento da causa.

5.14. Erro de direito no julgamento da causa que, por isso, levou a Ilustre Tribunal a quo a cometer novo erro de julgamento, ao considerar como sendo o termo inicial do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional em questão a data de 31-12-2013, ao invés de considerar que esse mesmo termo ocorreu em 15-02-2012, data da infração tributária em questão, conforme o disposto no artigo 33.°, n.° 1, do RGIT.

Finalmente,

5.15. considerou o Ilustre Tribunal recorrido, na sentença ora em crise, que o procedimento contraordenacional em questão teria corrido no âmbito do processo de contraordenação n.° ..........26 (vd. último parágrafo constante da pág. 7 da sentença recorrida) quando, em verdade, a infração tributária ora em questão foi escortinada e sancionada no âmbito do processo de contraordenação n.° ..........26, conforme melhor se pode aferir pela compulsa dos autos de contraordenação ora em questão.

Assim

5.16. e pelo exposto, é entendimento da Fazenda Pública que o Ilustre Tribunal recorrido, com o devido respeito e salvo sempre melhor entendimento, ao decidir conforme decidiu, incorreu:

a) Em erro de julgamento da matéria de facto, ao considerar que nos autos de contraordenação n.°..........26 encontra-se em apreciação a (i)legalidade da aplicação de uma coima à arguida, ora recorrida, pela prática por esta da infracção fiscal decorrente da falta de pagamento de IUC;

b) Em erro de direito no julgamento da causa, ao considerar que nos autos de contraordenação n.° ..........26 encontra-se em apreciação a aplicação de uma coima por uma infracção fiscal cometida pela arguida relativamente a um imposto anual;

c) Em erro de direito no julgamento da causa, ao considerar que o início do decurso do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional tem lugar a partir do termo do ano da verificação do facto tributário, nos termos do disposto no n.° 4 do artigo 45.° da LGT, e

d) Em erro material de escrita, ao considerar que a infracção tributária em questão encontra-se a ser escrutinada no âmbito do processo de contraordenação n.° ..........26, violando o Ilustre Tribunal a quo com o decisório ora em crie, ademais, o disposto no artigo 33.°, n.° 1, do RGIT.

Pelo que se peticiona o provimento do presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, assim se fazendo a devida e costumada

JUSTIÇA!»


»«

A arguida, não apresentou contra-alegações.

»«

Neste TCA Sul, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

»«

Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Subsecção da Execução Fiscal e de Recursos de Contraordenação do Contencioso Tributário para decisão.

»«

Objeto do recurso

Como é sabido, são as conclusões das alegações do recurso que definem o respetivo objeto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem” (artigo 411.º, do CPP ex vi artigo 41.º, n.º 1, do RGCO, por remissão da alínea b) do artigo 3.º do RGIT), com a ressalva para as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. artigo 412.º n.º 1, do CPP, artigo 3.º al. b), do RGIT e artigo 74.º n.º 4, do RGCO).

No caso sub judice, a questão que nos cumpre apreciar é a de saber se a sentença padece de erro de julgamento da matéria de facto e de direito ao julgar extinto o procedimento contraordenacional em analise.

II - FUNDAMENTAÇÃO

De Facto

A sentença recorrida considerou assente a seguinte factualidade:

« a) Em 11/09/2015, foi levantado auto de notícia pelo Serviço de Finanças de Lisboa 3 contra a Recorrente V……., imputando- lhe a prática, em 15/02/2012, de infração ao disposto nos artigos 27.°, n.° 1 e 41.°, n.° 1, alínea a), ambos do CIVA, conduta punida pelo artigo 114.°, n.° 2 e 5, alínea a) e 26.°, n.° 4, ambos do RGIT- Falta de pagamento do imposto devido/Falta de entrega da prestação tributária dentro de prazo — cfr. auto de notícia, constante dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido

b) Com base no auto de notícia referido em a), foi autuado em 11/09/2015, o processo de contraordenação [PCO] n.° ..........26 que correu termos no Serviço de Finanças de Lisboa 3 — cfr. auto de autuação constante dos autos.

c) Em 11/09/2015, o Serviço de Finanças de Lisboa 3 elaborou ofício de notificação da Recorrente, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 70.°, n.° 1 do RGIT, “NOTIFICAÇÃO DE DEFESA/PAGAMENTO C/ REDUÇÃO ART°70RGIT” — cfr. ofício constante dos autos

d) Em 10/10/2015, foi proferida no âmbito do PCO referido em b), decisão de fixação de coima no valor de €9.161,20, acrescido de custas processuais no valor de €76,50, condenando a Recorrente pela prática da contraordenação prevista e punida pelos artigos 27.°, n.° 1 41.°, n.° 1, alínea a) do CIVA e 26.°, n.° 4 e 114.°, n.° 2 e 5, alínea a) do RGIT — cfr. decisão da fixação da coima constante dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

e) Em 10/10/2015, pelo Serviço de Finanças de Lisboa 3 foi elaborado ofício dirigido à Recorrente, para notificação da decisão mencionada em d) e, em consequência, efetuar pagamento ou apresentar recurso judicial, nos termos dos artigos 79.°, n.° 2 e 80.° do RGIT — cfr. ofício de notificação constante dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido

f Em 11/11/2015, foi remetido ao Serviço de Finanças de Lisboa 3 o presente recurso judicial da decisão proferida referida em d) — cfr. informação do Serviço de Finanças de Lisboa 3 e data do carimbo aposta no requerimento de entrega de recurso, constantes dos autos.

g) Em 09/02/2017, pela Chefe do Serviço de Finanças foi ordenada a remessa dos autos ao Tribunal Tributário de Lisboa — cfr. despacho que acompanhou a remessa da petição inicial


*

FACTOS NÃO PROVADOS

Dos factos alegados, com interesse para a decisão da causa, nenhum importa registar como não provado.


*

MOTIVAÇÃO

A decisão da matéria de facto relevante para a decisão da causa efetuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, conforme referido nos pontos da matéria de facto provada.


»«

Do direito

Como se retira das conclusões recursivas, na situação sub judice, está em causa, a questão de saber se a decisão recorrida errou ao julgar verificada a prescrição do procedimento contraordenacional.

A Fazenda Pública insurge-se contra o assim decidido, entendendo, no essencial, que para assim decidir o tribunal incorreu em:

“(…)
a) Em erro de julgamento da matéria de facto, ao considerar que nos autos de contraordenação n.° ..........26 encontra-se em apreciação a(i)legalidade da aplicação de uma coima à arguida, ora recorrida, pela prática por esta da infracção fiscal decorrente da falta de pagamento de IUC;
b) Em erro de direito no julgamento da causa, ao considerar que nos autos de contraordenação n.° ..........26 encontra-se em apreciação a aplicação de uma coima por uma infracção fiscal cometida pela arguida relativamente a um imposto anual;
c) Em erro de direito no julgamento da causa, ao considerar que o início do decurso do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional tem lugar a partir do termo do ano da verificação do facto tributário, nos termos do disposto no n.° 4 do artigo 45.° da LGT, e
d) Em erro material de escrita, ao considerar que a infracção tributária em questão encontra-se a ser escrutinada no âmbito do processo de contraordenação n.° ..........26, violando o Ilustre Tribunal a quo com o decisório ora em crie, ademais, o disposto no artigo 33.°, n.° 1, do RGIT.”

Vejamos, então.


Na apreciação da questão que nos vem dirigida, encetamos por dizer que acompanhamos, na integra, o mui douto parecer do Exmo. Procurador Geral Adjunto, emitido nos presentes autos, que aqui, por concordância e por considerarmos desnecessárias quaisquer outros desenvolvimentos, seguiremos de perto.

Como refere aquele ilustre Magistrado, nas alegações recursivas a Fazenda Pública começa por dizer que o presente recurso visa “… reagir contra a douta decisão que julgou extinto o procedimento de contraordenação n° ..........26 (...)"(1), no entanto, “… não obstante esse desígnio, o certo é que a recorrente, em caso algum procurou demonstrar o suposto desacerto da decisão recorrida no que respeita à conclusão retirada de se encontrar o procedimento contraordenacional já prescrito, demonstrando, designadamente, como lhe competia, que o prazo, para tanto, ainda se encontra a decorrer.

E na verdade assim é.

Como efeito, da leitura do salvatério, apenas se retira a alusão a meros erros materiais ou de escrita que constam da decisão, sem qualquer força capaz de atribuir à sentença algum tipo de consequência invalidante da decisão proferida, quanto ao ali decidido, sendo certo que, por seu lado, a recorrente também não logra a materialização de qualquer trilho capaz de conduzir a desfecho diferente daquele que calcado pelo Tribunal a quo.

Senão vejamos;

No que tange ao invocado erro de julgamento da matéria de facto, na parte da sentença em que ali se alude à “… infracção fiscal decorrente da falta de pagamento de IUC(3), claramente se percebe que se trata de um erro material, já que, como é óbvio, tendo o processo de contraordenação aqui em analise sido instaurado por violação ao 27.º n.º 1 e 41.º n.º 1 do CIVA - falta de pagamento do imposto (T), a infração é esta e não outra, sendo certo que a referencia assinalada no salvatério é a única situação em que o texto decisório referência este imposto, ou dito de outro modo, a situação que nos vem colocada pela recorrente não apresenta qualquer acolhimento nas normas referidas nos autos como sendo aquelas de que depende a infração, sendo estas, repete-se, artigos 27°, n° 1, e 41°, n° 1, al. a), do CIVA, as únicas que foram consideradas pela decisão administrativa e objeto do recurso.

Dito isto, importa corrigir os lapsos de escrita ínsitos na sentença.

Assim onde se lê: “No caso concreto, estando em discussão a aplicação de coima pela prática de contraordenação, prevista no artigo 17.°, n.º 2 do Código do Imposto Único de Circulação [CIUC], por falta de pagamento do imposto devido...”, deve ler-se: “No caso concreto, estando em discussão a aplicação de coima pela prática de contraordenação, prevista e punida pelos artigos 27.°, n.º 1 41.°, n.º 1, alínea a) do CIVA e 26.°, n.º 4 e 114.°, n.º 2 e 5, alínea a) do RGIT, por falta de pagamento do imposto devido/Falta de entrega da prestação tributária dentro de prazo ” – cfr. pontos a) e d) do probatório

O mesmo se diga ao lapso quanto à da indicação do processo de contraordenação n.º ..........26(3), devendo ter-se presente que, como é óbvio a Mma. Juíza do TT de Lisboa, queria referir-se ao processo em análise, ou seja, ao n.º ..........26.

E bem assim quanto ao valor da causa, que foi indicado no texto decisório o valor de € 237,65, quando o referido valor é € 9.161,20 – cfr. decorre do ponto d) do probatório.

Trata-se, por conseguinte, de erros materiais cuja correção, poderiam e deveriam ter sido suscitada junto da Mma. Juíza prolatora da decisão.

Quanto à distinção de erros materiais da decisão e erros de julgamento, acolhemos aqui, a titulo de complemento, o acórdão do STJ, de 10/02/2022 proferido no proc. n° 529/17.1T8AVV- A.G1.S1, também citado pelo Exmo. Procurador Adjunto no parecer que vimos seguindo.

Diz-se ali assim:

"I. Os erros materiais da decisão, a que se alude no art.614/1 do CPC, têm lugar quando há divergência entre a vontade declarada e a vontade real do juiz, ou seja, no caso em que o juiz tenha escrito uma coisa diferente daquela que queria, de facto, escrever.
II. Tal divergência deve ressaltar, de forma clara e ostensiva, do teor da própria decisão, só desta, do seu contexto ou estrutura, sendo possível aferir se ocorreu ou não esse erro. Ou seja, é o próprio texto da decisão que há-de permitir ver e perceber que a vontade declarada não corresponde à vontade real do juiz que proferiu a decisão.
III. Há que não confundir o erro material da decisão com o erro de julgamento: (...); neste, o juiz disse o que queria dizer, mas decidiu mal, decidiu contra lei expressa ou contra os factos apurados."- o destacado e sublinhado são nossos
Dito isto e consistindo o objeto do recurso unicamente na questão da extinção do procedimento contraordenacional, por prescrição, consideramos totalmente irrelevantes os apontados erros materiais já que como se viu, em nada afetam ou prejudicam a decisão do caso.

Vejamos agora o que dizer quanto ao invocado erro de julgamento de direito(4) imputado à circunstância de a sentença recorrida ter considerado ali se encontrava em “… em apreciação a aplicação de uma coima por uma infracção fiscal cometida pela arguida relativamente a um imposto anual”.

Advoga a recorrente a existência de “ … novo erro de julgamento, ao considerar como sendo o termo inicial do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional em questão a data de 31-12-2013, ao invés de considerar que esse mesmo termo ocorreu em 15-02-2012, data da infração tributária em questão, conforme o disposto no artigo 33.°, n.° 1, do RGIT. “

Mas, também aqui, sem razão porque estando em causa, uma vez que a questão da atribuição do carater anual ao IVA há muito que se mostra pacificada na lei.

Com efeito, está aqui em causa, como temos vindo a referir, uma infração punida pelo artigo 114.º n.º 2 do RGIT - falta de entrega da prestação tributária dentro do prazo (T) trata-se, por conseguinte de uma situação dependente do apuramento do imposto em falta, já liquidado, para o que o artigo 45.º, nº 1, da LGT, prevê um prazo de caducidade do direito à liquidação de quatro anos, esclarecendo no n.º 4 da mesma disposição legal que o prazo de caducidade se conta: “… nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, exceto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efetuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respetivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário. – o sublinhado e destacado são nossos.

De acordo com o n.º 2 do artigo 33.º do RGIT: “[o] prazo de prescrição do procedimento por contraordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infração depender daquela liquidação.”, que é o caso.

Dito isto temos independentemente de se tratar de um imposto periódico ou se obrigação única, o certo é que para efeitos de contagem de prazo de caducidade do direito à liquidação e bem assim, e do prescrição do procedimento contraordenacional, a lei remete o respetivo cômputo ao início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto.

Vide neste sentido o, relativamente à contagem de prazo de caducidade do direito à liquidação do IVA, se deixou dito no sumario do acórdão do STA proferido em 14/06/2012, n.º 0402/12: “[N]o IVA, embora estejamos perante um imposto de obrigação única o prazo de caducidade conta-se, por força da lei 32-B/2002 de 30-12 (que aprovou o Orçamento do Estado para 2003) a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto”. – o destacado e sublinhado são nossos

No mesmo sentido, com referência ao prazo de prescrição, sumariou, recentemente (26/01/2022), o mesmo Tribunal no processo 02462/20.0BEPRT, que se transcreve: “II - O termo inicial do prazo de prescrição conta-se em função da ocorrência do facto tributário, sendo computado a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, nos impostos periódicos, ou a partir da data em que o facto tributário ocorreu, nos impostos de obrigação única, salvo em relação ao I.V.A. em que tal prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que ocorreu a exigibilidade do tributo, se o regime aplicável for o previsto na L.G.T. (cfr.artº.48, nº.1, da L.G.Tributária).”

Logo na situação em apreço, respeitando a infração a IVA - exercício de 201112T e sendo a exigibilidade do imposto reportada a 15/02/2012, temos que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, logo, 01 de janeiro de 2014, em conformidade com o consignado no artigo 45.º, nº4 da LGT e 33.º n.º 2 do RGIT.

Termos em que, não se vislumbra a este Tribunal qualquer razão de facto ou de direito para que o Tribunal ad quem tome qualquer posição em sentido divergente da que foi seguida na sentença recorrida a que apelamos e aqui transcrevemos:

Diz-se ali que:

«Nos termos do disposto no artigo 33.°, n.° 1, do RGIT, o procedimento contraordenacional extingue-se, por efeito da prescrição, logo que sobre a prática do facto sejam decorridos cinco anos.

Prevê, no entanto, o n.° 2 do mesmo artigo, que o prazo de prescrição do procedimento por contraordenação é reduzido ao prazo de caducidade do direito à liquidação da prestação tributária quando a infração depender daquela liquidação.

Determina o n.° 3 do artigo 33° do RGIT, que “o prazo de prescrição interrompe-se e suspende-se nos termos estabelecidos na lei geral, mas a suspensão da prescrição verifica-se também por efeito da suspensão do processo, nos termos previstos no n° 2 do artigo 42.º, no artigo 47.° e no artigo 74.°, e ainda no caso de pedido de pagamento da coima antes de instaurado o processo de contraordenação desde a apresentação do pedido até à notificação para pagamento.”

A este propósito cumpre fazer referência às palavras dos Juízes Conselheiros Jorge Lopes de Sousa e Manuel Simas Santos, no “Regime Geral das Infracções Tributárias, Anotado”, 2.a Edição, página 283, quando referem que: “Não é cara a idíeia subjacente a esta coincidência entre o prazo de liquidação e o prazo de prescrição do procedimento contra-ordenaáonal, parecendo que ela se poderia justificar por não ser razoável que a tutela sancionatória se estendesse para além do prazo em que é possível a liquidação, isto é, se na perspectiva legislativa deixa de interessar, pelo decurso do prazo de caducidade, a liquidação do tributo, também deixará de justificar-se a punição de condutas que conduziram à sua omissão.

No entanto, a fórmula utilizada no n° 2 deste artigo, ao referir a dependência da infracção relativamente à liquidação da prestação tributária, não traduz esta ideia, pois a infracção depende da liquidação da prestação tributária sempre que a determinação do tipo de infracção ou da sanção aplicável depende do valor daquela prestação, pois é a liquidação o meio de determinar este valor. Neste sentido, casos em que a existência da contra-ordenação depende da liquidação da prestação tributária são dos previstos nos arts. 108.° n.° 1, 109.°, n.° 1, 114.°, 118.° e 119.°, n.° 1, do R.G.I.T.”

Deste modo, e quanto à prescrição do procedimento, a norma citada, para além das causas de suspensão desse procedimento que prevê, remete ainda, para a aplicação das normas sobre suspensão e interrupção da prescrição do processo contraordenacional previstas no RGCO.

Determina o artigo 27.°-A do RGCO que a prescrição do procedimento por contraordenação se suspende, para além dos casos previstos na lei, durante o tempo em que o procedimento não puder legalmente iniciar-se ou continuar por falta de autorização legal [alínea a)], estiver pendente a partir do envio do processo ao Ministério Público até à sua devolução à autoridade administrativa [alínea b)], estiver pendente a partir da notificação do despacho que procede ao exame preliminar do recurso da decisão da autoridade administrativa que aplica a coima, até à decisão final do recurso [alínea c)], sendo que nestes dois últimos casos, a suspensão não pode ultrapassar seis meses [cfr. n.° 2 do artigo 27.°-A do RGCO].

Por sua vez, consagra o artigo 28.° do RGCO, sob a epígrafe “Interrupção da prescrição”, que: “1. A prescrição do procedimento por contraordenação interrompe-se: a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação; b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa; c) Com quaisquer declarações que o arguido tenha proferido no exercício do direito de audição. (…)”.

A inaplicabilidade do Código Penal [CP], em matéria de suspensão e de interrupção da prescrição limita-se às causas, e não aos efeitos e limites dos prazos, matérias que, não vindo reguladas nem no RGCO nem no RGIT, terão de ser resolvidas com recurso àquele Código.

É, assim, de aplicar o artigo 120.° do CP quando enuncia que a prescrição volta a correr a partir do dia em que cessar a suspensão e, bem assim, que a interrupção inutiliza o prazo até então decorrido, voltando a contar-se novo prazo, depois de cada interrupção.

Verificando-se uma causa de interrupção da prescrição, importa ainda ter presente o disposto no artigo 28.°, n.° 3, do RGCO, aplicável por remissão do artigo 33°, n.° 3, do RGIT [em idêntica redação à do n.° 3 do artigo 120.° do CP], e segundo o qual a prescrição do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo de prescrição acrescido de metade [cfr. Ac. do STA de 05/02/2020/Proc. n.° 0273/12.6BEALM 0197/18 e Ac. de uniformização de jurisprudência do STJ, no seguinte sentido: “A regra do n° 3 do artigo 121o do Código Penal, que estatui a verificação da prescrição do procedimento quando, descontado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade, é aplicável, subsidiariamente, nos termos do artigo 32° do Regime Geral das Contraordenações (Decreto-Lei n° 433/82, de 27 de outubro, alterado pelo Decreto-Lei n° 244/95, de 14 de Setembro) ao regime prescricional do procedimento contraordenacional” -cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n° 6/2001, publicado no Diário da República, I Série, de 30/013/2001].

No mesmo sentido se refere no Ac. do STA de 12/12/2018/Proc. n.° 0367/14.3BELRA quando diz “É aplicável às contra-ordenações tributárias o limite máximo do prazo de prescrição do procedimento previsto no n.° 3 do artigo 28.° do RGCO, ou seja, a prescrição tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão — que não pode ultrapassar seis meses, nos casos previstos nas alíneas b) e c) do artigo 27.0-A do RGCO, tiver decorrido o prago de prescrição acrescido de metade”.

E, por isso, é consentâneo que o aludido artigo 28.° n.° 3 do RGCO institui um prazo de prescrição máximo do procedimento [obstando à perpetuação do prazo de prescrição por força de sucessivas interrupções que renovam o prazo de prescrição], apenas releva o tempo de suspensão, não sendo de considerar qualquer interrupção ocorrida no procedimento [cfr. entre outros, Ac. do TCAS de 28/10/2021/Proc.n.° 1975/15.0BELRS].

À luz destas considerações legais e jurisprudenciais, vejamos o caso concreto.

No caso concreto, estando em discussão a aplicação de coima pela prática de contraordenação, prevista no artigo 17.°, n.° 2 do Código do Imposto Único de Circulação [CIUC], por falta de pagamento do imposto devido, punida pelos artigos 26.°, n.° 4 e 114.° n.° 2 do RGIT, conclui-se que o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional, em causa, é, nos termos dos artigos 33.° n.° 2, 114.°, n.° 2 do RGIT e 45.° n.° 1 da Lei Geral Tributária [LGT], de 4 [quatro] anos.

Considerando que tal prazo se pode interromper e suspender [cfr. n.° 2 e 27.°-A do RGCO], e atendendo ao disposto no artigo 28.°, n.° 3 do RGCO, no caso concreto, o prazo máximo de prescrição do procedimento de contraordenação é de 6 anos e 6 meses [ressalvada a suspensão prevista no artigo 27.°-A, n.° 2 do RGIT] [cfr. Ac. do STA de 20/12/2017/Proc. n.° 0224/17].

E estando em causa o pagamento de um imposto periódico e anual, nos termos do artigo 45.°, n.° 4 da LGT, o prazo de prescrição conta-se a partir do termo do ano da verificação do facto tributário, ou seja, 31/12/2013.

Tendo o seu termo inicial em 31/12/2013, o mesmo computar-se-ia, em 30/06/2019 [6 anos e 6 meses].

Para além das causas gerais que nunca permitiriam que o procedimento decorresse para além de 30/06/2019, inexistem quaisquer outras causas de suspensão ou interrupção do prazo prescricional, às quais cumpra atender no computo do prazo em questão, sobretudo com a virtualidade de não considerar já prescrito o procedimento de contraordenação …” – fim de citação

Conclui-se, pois, à luz dos citados preceitos legais, que o procedimento contraordenacional se encontra integralmente prescrito, verificando-se assim a exceção perentória que determina a extinção do procedimento contraordenacional sendo de negar provimento ao recurso e de manter na ordem jurídica a sentença que assim decidiu.



III - DECISÃO

Face ao que, acordam em conferência os juízes da Subsecção da execução fiscal e de recursos de contraordenação do Contencioso Tributário deste TCA Sul em negar provimento ao recurso.

Sem custas (artigo 94.º n.º 4 do RGCO).

Registe e notifique.

Lisboa, 19 de outubro de 2023


Hélia Gameiro Silva – Relatora
Catarina Almeida e Sousa – 1.ª Adjunta
Isabel Vaz Fernandes – 2.ª Adjunta
(assinado digitalmente)


(1)Concl. 5.1
(2)Concl. 5.8.
(3)Conc. 5.15
(4)Concl 5.10 a 5.14