Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:37/21.6 BEPDL
Secção:CA
Data do Acordão:11/09/2023
Relator:PAULA FERREIRINHA LOUREIRO
Descritores:CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL
DISPENSA DE PROVA
PRAZO PARA APRESENTAÇÃO DAS PROPOSTAS
DISCRICIONARIEDADE NA DEFINIÇÃO DAS ESPECIFICAÇÕES TÉCNICAS DO BEM
ART.º 49.º, N.º 4 DO CCP
FUNDAMENTAÇÃO DO ATO DE ADJUDICAÇÃO
Sumário:I- Depois do encerramento da discussão e em caso de recurso, só a título excecional pode ser admitida a junção de documento com as alegações recurso, e exclusivamente aqueles cuja apresentação não tenha sido possível anteriormente ou quando a sua junção se tenha tornado necessária por causa do julgamento proferido em 1.ª instância. O mesmo é dizer que não basta fazer menção numa das alegações a um documento junto, exigindo-se ao recorrente que invoque e prove o interesse processual que tem nessa junção ao abrigo de uma das situações elencadas no mencionado n.º 1 do art.º 651.º do CPC.

II- O despacho que dispensa a produção da prova testemunhal requerida, nos termos previstos no art.º 90.º, n.º 3 do CPTA, é correto se a prova que pretende realizar respeita a pontos da petição inicial que mais não são do que considerações valorativas e/ou especulativas, juízos conclusivos de facto e de direito, ou mesmo alegações de direito, e se os autos estavam já dotados de prova documental adequada e suficiente para que o Tribunal a quo pudesse formular a sua convicção relativamente à factualidade relevante para decisão do vertente dissídio.

III- O despacho que dispensa a produção da prova pericial requerida, nos termos previstos no art.º 90.º, n.º 3 do CPTA, é correto se os autos estavam já dotados de prova documental adequada e suficiente para que o Tribunal a quo pudesse formular a sua convicção relativamente à factualidade relevante para decisão do vertente dissídio, e se não se exige, para a compreensão dessa prova documental, conhecimentos técnicos específicos.

IV- De todo o modo, o que releva é a observância do Caderno de Encargos por banda da proposta apresentada pelo concorrente, ou seja, o serviço e os bens descritos nas propostas dos concorrentes devem ser compatíveis e cumprir escrupulosamente as especificações técnicas elencadas naquela peça, especialmente as atinentes aos atributos da proposta e aos termos e condições fixados pela entidade adjudicante.

V- O que significa, portanto, que o que se exige ao concorrente ganhador do concurso é que, no momento da celebração do contrato e início da respetiva execução, seja detentor do bem necessário e imprescindível à execução do contrato concursado, com as características enumeradas na proposta que apresentou, independentemente de, no momento em que apresentou a proposta, ser, ou não, efetivamente detentor de tal bem.

VI- Pelo que, logicamente, que, em regra, não é legalmente admissível, nem razoável, exigir aos concorrentes que sejam proprietários ou detentores do bem necessário à execução do contrato concursado para efeitos de o vistoriar ou fiscalizar durante o procedimento concursal, antecipando, desse modo, um momento que apenas encontra sentido após a adjudicação e, eventualmente, celebração do contrato.

VII- Não ocorre violação do preceituado nos n.ºs 1 e 3 do art.º 136.º do CCP, no que concerne ao encurtamento do prazo para apresentação das propostas, se, face à factualidade demonstrada, não resta qualquer dúvida de que o abastecimento de mercadorias e bens essenciais, especialmente à Ilha do Corvo, vem sofrendo, desde 2019, graves perturbações e interrupções, que se devem, por um lado, às difíceis condições de navegação sempre que o estado meteorológico sofre agravamento, às dificuldades de navegação no porto marítimo da Ilha do Corvo, às inadequadas características dos navios e embarcações usadas na execução do contrato de prestação de serviços de transporte marítimo de mercadorias, e a que acresce, finalmente, a proximidade do termo do contrato de prestação de serviços então em vigor.

VIII- Não ocorre violação dos art.ºs 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP, no que se refere à concreta definição das especificações técnicas exigidas no Caderno de Encargos para o navio que deverá executar a prestação de serviços de transporte de mercadorias entre as ilhas do Faial, Flores e Corvo, se tais especificações se prendem, em primeiro lugar, com as condições de navegação no mar dos Açores- o Atlântico-, tendo em conta a ondulação média, a corrente e a agravação destas condições em caso de más condições meteorológicas; em segundo lugar, com as características do porto marítimo da Ilha do Corvo, dado que o porto da Ilha das Flores ainda não tem as obras concluídas; e, em terceiro lugar, com as características que os navios que procederão ao abastecimento dessas ilhas deverão possuir por forma a serem capazes de navegar em condições meteorológicas adversas- e que são frequentes na região, especialmente, durante o Inverno-, bem como serem capazes de entrar no porto marítimo da ilha do Corvo, que é de acesso bastante difícil.

IX- O que vem de se expender permite fundar uma convicção séria de que as características que foram conduzidas às especificações técnicas constantes do art.º 4.º, n.º 1 do Caderno de Encargos resultaram de uma ponderação orientada exclusivamente pelo interesse público, ponderação essa que visou encontrar a solução técnica mais adequada a assegurar a regularidade e estabilidade do abastecimento de mercadorias às ilhas do Faial, Flores e, principalmente, Corvo.

X- Nesse sentido, e ante a experiência resultante da execução do contrato anterior de prestação de serviços de transporte de mercadorias, mormente, as dificuldades de abastecimento à Ilha do Corvo, entendeu a entidade adjudicante que o navio mais adequado a realizar tal transporte seria aquele que oferecesse mais garantias de lograr efetuar o transporte de mercadorias, independentemente das condições climatéricas e da dificuldade de acesso e operação no porto marítimo da Ilha do Corvo. E, tal navio seria, assim, o que possuísse condições de manobrabilidade e estabilidade suficientes para conseguir efetuar navegação no Atlântico e o abastecimento à Ilha do Corvo, não obstante as condições climatéricas desfavoráveis. E o mesmo sucede com a omissão do tipo ou classe do navio requerido pelo Caderno de Encargos, que foi deliberada, uma vez que as específicas condições do transporte de mercadorias apontavam para a necessidade de exigir um navio com uma versatilidade maior do que aquele que normalmente existe num típico navio de mercadorias, num cargueiro.

XI- Foi, sem dúvida, esta ordem de considerações que presidiu à estipulação das concretas especificações técnicas, especialmente, no que se refere ao cumprimento, boca e calado do navio, idade do navio e potência mínima do impulsor de proa, pois que tais características permitem, naturalmente, uma maior manobrabilidade e estabilidade do navio.

XII- Sendo assim, em face do objeto do contrato concursado, é de concluir pela razoabilidade e ajustamento das especificações técnicas consagradas no Caderno de Encargos, não se descortinando que as mesmas erijam algum tipo de obstáculos injustificados à concorrência, como proíbe o n.º 4 do art.º 49.º do CCP.

XIII- Não merece exclusão a proposta que, em face de toda a documentação e certificação contida, satisfaça as especificações técnicas contidas no Caderno de Encargos.

XIV- É que, mesmo que, porventura, navio descrito na proposta não detivesse todos os requisitos a que aludem as especificações técnicas no momento em que a Recorrida apresentou a sua proposta, tal não constitui motivo de exclusão, pois o que releva é que no momento da celebração do contrato e início da execução do mesmo a Recorrida disponha do navio em causa apetrechado com todas as características que inseriu na proposta apresentada.

XV- A decisão de adjudicação não fere o dever de fundamentação descrito nos art.ºs 147.º e 148.º do CCP, e nos art.ºs 152.º e 153.º do CPA, se, bem escrutinada a exposição relativa à audiência prévia, não se impunha ao Júri que rebatesse ou justificasse o que quer que seja no que se refere às características do navio referido na proposta da Recorrida Mutualista, visto que, não só o alegado em sede de audiência prévia é, essencialmente, de natureza especulativa, valorativa e conclusiva, não exigindo, por isso, ponderação ou resposta, como as características do navio derivam claramente da proposta em discussão.

Indicações Eventuais:Subsecção de CONTRATOS PÚBLICOS
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO
S................................. Agency e S ……….. (Recorrentes) vêm, na presente ação urgente de contencioso pré-contratual proposta contra o Fundo Regional de Apoio à Coesão e ao Desenvolvimento Económico e contra a contrainteressada M ………………….., S.A. (Recorridos), interpor recurso jurisdicional do despacho proferido em 17/06/2021 pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Ponta Delgada, na parte em que «entendeu rejeitar todos os meios de prova cuja produção foi requerida pelas (…) Recorrentes, concluindo pela desnecessidade da fase de instrução», bem como da sentença prolatada pelo mesmo Tribunal em 11/08/2021, nos termos da qual a vertente ação foi julgada totalmente improcedente.
Inconformadas, as Recorrentes interpuseram recurso, que culmina com as seguintes conclusões:
«A. O presente recurso é interposto da Sentença datada de 11.08.2021, através da qual o Tribunal a quo julgou improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual, e salvo o devido respeito por entendimento diverso, tal decisão não se pode manter na ordem jurídica porquanto é manifesta e ostensiva a nulidade de que padece, bem como os vários vícios de que enferma e que consubstanciam erros de julgamento (quanto à matéria de facto e de direito).
B. Constitui igualmente objeto do presente recurso, nos termos do disposto no artigo 142.º n.º 5, do CPTA, o Despacho interlocutório datado de 17.06.2021, através do qual o Tribunal entendeu rejeitar todos os meios de prova cuja produção foi requerida pelos Autores, aqui Recorrentes, concluindo pela desnecessidade da fase de instrução.
C. Conforme se logrará evidenciar o Tribunal a quo deliberadamente não se pronunciou nem escrutinou um dos pedidos e fundamentos da presente ação, pedido esse que o próprio Tribunal identifica claramente como sujeito à sua exegese: incumprimento da proposta da contra interessada das alíneas d) e k) do artigo 4.º, n.º 1, do Caderno de Encargos.
D. E tal omissão de pronúncia é notória e flagrante, dado que ao longo da extensa sentença o que é dito sobre tal fundamento da ação e erigido como pedido oportunamente formulado, é, singela e sincopadamente, o seguinte: “(…) quanto àquele incumprimento face aos factos provados o que se apura é que improcede o arguido incumprimento, e mais uma vez as AA. traçam “situação de facto” da sua autoria em desconformidade com os factos patentes no procedimento concursal e aqui provados, improcedendo o arguido incumprimento da proposta da contra-interessada das alíneas d) e k) do artº.4º/1 do caderno de encargos”.
E. Ou seja, em retas e honestas palavras, em jeito de petição de princípio, o Tribunal quer (forçosamente) demonstrar que improcede tal fundamento, mas absolutamente nenhum raciocínio fundamentador da sua posição apresenta visando tal convencimento.
F. Na verdade, a alusão (sem critério e sem justiça) de que os Autores traçam uma «situação de facto» da sua autoria que não se comprova (quando até foi o próprio Tribunal a rejeitar todos os meios probatórios requeridos pelos Autores) equivale, na prática, a uma omissão total de pronúncia sobre tal fundamento.
G. Ora, confiando-se que o Tribunal estava irrenunciavelmente obrigado a julgar tal requisito de verificação obrigatória, pois só assim podia ajuizar da licitude do ato adjudicatário (objeto da presente demanda), nunca se esperava que se remetesse a este sepulcral silêncio, à imagem do que ocorreu com o júri que se recusou a pronunciar (também) em sede de audiência prévia, sobre os fundamentos de crítica à proposta do concorrente adjudicatário, quanto a estes requisitos.
H. Em síntese, não é lícito que no âmbito de um processo judicial equitativo (princípio dimanado da Lei Fundamental – artigo 20.º, n.º 4, da CRP), o Tribunal não se pronuncie sobre um dos principais (talvez até o principal) pedido e fundamento hasteado pelos Autores, escusando-se deliberadamente a sindicar o cumprimento pelo navio da contra-interessada dos requisitos enunciados no Caderno de Encargos, os quais se mostram de verificação obrigatória/eliminatória.
I. A resposta dada pelo Tribunal traduz assim e fatalmente uma omissão de pronúncia, pois que a juíza a quo simplesmente não abordou tal fundamento, não tendo cuidado da análise, por mais sumária que fosse, da verificação daqueles requisitos pelo navio da contra-interessada (e a tanto estava imperativamente obrigada).
J. Neste sentido, tal postura totalmente evasiva e silenciosa apenas pode configurar uma recusa de escrutínio sobre tal fundamento/pedido, dado que não se pode defender que uma asserção judicial do tipo – não se verifica o que os Autores alegam, sem mais, é bastante e suficiente para assimilar uma decisão ao Tribunal sobre tal matéria.
K. Pressuposto de uma decisão judicial é que haja um raciocínio do Tribunal alicerçado nos factos e na lei por confronto com uma determinada premissa concreta, emitindo-se a final um juízo opinativo sobre tal controvérsia, e não simplesmente que se alegue – não se comprova o alegado pelos Autores.
L. Nesta conformidade, limitando-se o Tribunal a afirmar (mas como e com base em quê?) que não se verifica o alegado pelos Autores, é óbvio e mister reconhecer-se que estamos perante uma denodada omissão de pronúncia,
M. Pois pronunciar-se implica, e sempre, um esforço mínimo hermenêutico e exegético de análise dos factos e da lei, um raciocínio expendido conducente à decisão a ao juízo emitido, e a assunção de um sentido/direção decisórias adotado com base nas teses contrastantes presentes nos autos, mas nada disto ocorreu.
N. Termos em que deve ser expressamente reconhecida e declarada a nulidade da sentença, com as devidas consequências legais, assim se respeitando o preconizado no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, que quedou violado.
O. Embora não se conceda que tenha ocorrido pronúncia do Tribunal sobre tal pedido – incumprimento pela contra-interessada dos requisitos enunciados no artigo 4.º, n.º 1, alíneas d) e k), do Caderno de Encargos, o que apenas se admite à cautela de patrocínio, então forçoso será concluir que ocorreu manifesta falta de fundamentação da decisão de improcedência.
P. Com efeito, quando o Tribunal não esboça qualquer fundamentação (por mínima que seja) sobre o propósito e a bondade do por si determinado.
Q. Na verdade, ocorre antes a clássica petição de princípio, pois que o Tribunal alega que não foi feita prova (e não olvidar que toda a prova requerida pelos Autores foi «convenientemente» rejeitada) sobre os factos alegados, mas nada evidencia como concluiu afinal que o navio em causa cumpria com esses requisitos (é que constitui seu dever ajuizar e verificar tal cumprimento).
R. Ou seja, não sabem os aqui Recorrentes (e não sabe mais ninguém) as razões de facto e de direito que levaram e conduziram o Tribunal a considerar demonstrado que o navio em causa cumpria com os requisitos das alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos.
S. Por acaso o Tribunal realizou alguma perícia (ou foi efetivar inspeção judicial) que comprovasse que o navio em causa dispõe de espaço coberto para transporte de paletes (é que não dispõe – e contra factos não há argumento), e tem como capacidade de carga mínima a enunciada na alínea d); por acaso o Tribunal realizou alguma perícia (ou foi efetivar inspecção judicial) que comprovasse qual a grua instalada no navio?
T. Perante a impugnação de tais declarações e realidades declaradas, obviamente que se impunha ao Tribunal (due process of law) analisar criticamente tais fundamentos, perscrutando quais as reais características do navio da contra-interessada.
U. Num Estado de Direito Democrático, e perante um concurso público internacional, e em face da regras e princípios norteadores da formação dos contratos públicos, como a legalidade, a transparência, a concorrência, a boa-fé, é impensável (e vergonhoso) que ocorra, como sucedeu até agora, que um candidato apresente «gato» por «lebre» e nem o júri (antes) nem o Tribunal (depois) se interessem (sequer) por verificar se o gato é lebre ou se o gato é gato!
V. Por outro lado, acresce ainda como poderoso argumento à falta total de fundamentação da decisão de não violação pelo navio da contra-interessada do plasmado nas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos, a circunstância de, percorrida e analisada a matéria de facto dada como provada (V da sentença – pontos 1 a 33), em lado nenhum, o Tribunal:
- ter dado como provado que o navio T.... A..... dispõe de espaço coberto para transporte de paletes (na verdade não tinha como o fazer, pois não dispõe desse recurso ou faculdade – o que significa que as paletes são transportadas com total exposição aos elementos naturais, com as consequências facilmente assimiláveis daí decorrentes);
- ter dado como provado que o navio T.... A..... tem capacidade para transportar, no mínimo, 6 contentores de 20 pés, com pelo menos 2 tomadas para contentores frigoríficos e no mínimo 15 paletes em espaço coberto (na verdade não tinha como o fazer pois objetiva e realmente não cumpre com tais especificações);
- ter dado como provado que o navio T.... A..... possui grua com capacidade de carga mínima de 10 toneladas com comprimento mínimo de braço de 6 metros (na verdade não tinha como o fazer pois a sua grua é de capacidade muito inferior – cf. fls. 448 do processo administrativo instrutor – e documento junto pelos aqui Recorrentes, não objeto de impugnação em sede de audiência prévia – trata-se da informação oficial existente sobre tal navio).
W. Em jeito de conclusão, o Tribunal, ainda que se entenda que tenha emitido pronúncia sobre tal pedido, falhou completa e rotundamente na externalização da fundamentação do seu ato decisório (em rigor nunca teria como provar o que decidiu), pois não explicou minimamente que o navio T.... A..... cumpre com tais requisitos, e de que forma cumpre com tais requisitos.
X. Em síntese, a sentença ofende o disposto nos artigos 154.º e 615.º, n.º 1, alínea b), do CPC, donde importa reconhecer e declarar a sua nulidade, o que aqui expressamente se requer, com todas as legais consequências.
Y. A sentença padece de vários erros de julgamento, dado que a factualidade considerada assente o foi quase que exclusivamente com base nas unilaterais declarações da entidade demandada (entidade adjudicante), não se podendo olvidar ainda que todos os meios de prova requeridos pelos Autores foram rejeitados, o que impossibilitou que houvesse julgamento justo sobre os factos, isto mesmo a despeito do Tribunal, em várias passagens, “acusar” os Autores de não terem feito prova do por si alegado…
Z. Ora, quando é o próprio Tribunal a privar uma das partes de provar os factos por si alegados, impossibilitando tal demonstração fáctica, apenas por «hipocrisia» se poderá vir depois sentenciar que não se fez (antes) a competente (mas como?) prova…. para bom entendedor meia palavra basta!
AA. A despropósito da ilegal rejeição dos vários meios probatórios requeridos pelos Autores, certo é que, mesmo desconsiderando a sua valiosidade e contributo insofismável e decisivo para a descoberta da factualidade correta e verdadeira, ocorreram vários erros de julgamento. A saber:
BB. Ora, uma das primeiras falsidades do presente procedimento concursal público internacional consta do declarado na própria Resolução do Conselho do Governo Regional, pois que o prestador de serviços não manifestou qualquer intenção de fazer cessar o serviço em 01.04.2021, como a entidade adjudicante bem sabe e não tem como ignorar.
CC. Mais uma vez, se aos Autores tivesse sido dada oportunidade de demonstrar tal facto através do contributo e intervenção de terceiros, tal como requerido preteritamente nos autos (e novamente rejeitado pelo Tribunal), a empresa em causa podia ter provado que nunca existiu tal intenção,
DD. E tanto assim é que essa mesma empresa esteve a assegurar a prestação dos serviços objeto do contrato inerente ao presente procedimento concursal até agosto de 2021, mais concretamente até 2 dias antes de ser proferida a sentença (curiosamente) – e tal consta do facto provado n.º 8.
EE. Nesta conformidade, não podia o Tribunal ter considerado que houve risco de interrupção do serviço em 01.04.2021, ao dar como provado aquele ponto 4, com aquele conteúdo, quando o mesmo serviço sempre esteve, ininterruptamente, a ser prestado pela empresa TMG, pelo menos desde 17.02.2021 (cf. facto provado n.º 9), pelo que, sempre a entidade adjudicante sabia, antes dessa mesma negociação visando a cessão autorizada da posição contratual, que não estava em risco a prestação do serviço – negociação foi inclusivamente iniciada antes da publicação do aviso.
FF. Ora, se a entidade adjudicante tinha plena consciência (bem antes de 17.02.2021) que não existia qualquer risco para a prestação do serviço, e que, portanto, não correspondia à verdade que tal serviço se extinguisse ou cessasse em 01.04.2021, daqui resulta que o prazo fixado e mantido de 15 dias para apresentação de propostas se mostra ferido nos seus pressupostos de facto.
GG. Acresce que o facto provado n.º 12 não está minimamente demonstrado, antes correspondendo a mera alegação conclusiva do próprio Tribunal, sem adesão aos factos e à realidade, dado que a empresa TMG que assegurou o serviço durante a tramitação do concurso nunca teve qualquer quebra no abastecimento da ilha do Corvo,
HH. Sendo que tal ocorreu muito anteriormente (cf. facto provado n.º 13), de forma isolada e irrepetível, e por razões que não se prendem com as características do navio abastecedor (conforme se pretendia demonstrar através dos meios probatórios rejeitados in totum e foi preteritamente invocado),
II. Mas sim por força exclusiva (como a entidade adjudicante bem sabe) das limitações congénitas do próprio porto da ilha do Corvo que não viabiliza tais manobras quando as condições climatéricas são especialmente agrestes e inóspitas (mas isso é válido para qualquer que seja o navio que assim é indiferente à falta de possibilidade de atracamento).
JJ. Por outro lado, ainda, os factos dados como provados n.ºs 20 a 24 careciam absolutamente de contraditório (o que foi impossibilitado pelo Tribunal com a rejeição de todos os meios probatórios requeridos pelos Autores), até porque tal “parecer” foi elaborado por um dos membros do júri, o que sempre acarreta a sua manifesta parcialidade sobre a decisão pelo próprio tomada (mas curiosamente a presença em Tribunal do júri para esclarecimento de vários pontos da matéria de facto, tal como requerido pelos Autores, já foi considerado desnecessário – decisão ininteligível do Tribunal).
KK. Mas note-se que em lado nenhum, na matéria dada como assente, ficou estabelecido que o T.... A..... dispunha e verificava os requisitos concretamente exigidos pelas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos, e era tal facto, e apenas esse, que estava essencialmente em análise.
LL. Não pode, pois, o Tribunal pretender (de boa-fé) convencer os Autores que o navio da contra-interessada cumpre com os requisitos que os impetrantes expressamente contestaram, identificando os vícios, sem afinal demonstrar (nem sumária nem minimamente) que tal navio verdadeiramente satisfaz tais requisitos, em concreto;
MM. Assim contrariando e destruindo a alegação e prova (cf. fls. 448 do PAI) feitas pelos Autores (isto mesmo sem considerar a importante prova pericial ao T.... A..... – que foi declinada – a qual, sem resquício de dúvidas permitiria dissolver quaisquer equívocos sobre o (in)cumprimento do disposto nas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos – sem se compreender o porquê? – só pode ser, muito honestamente, para que não se apure que não se verifica o cumprimento de tais requisitos – mas tal atitude é uma afronta despudorada à descoberta da verdade material e consequente justa composição do litígio.
NN. Em síntese, ocorre erro de julgamento da matéria de facto, e mesmo sem o concurso da prova cuja produção foi ilicitamente subtraída dos autos, a matéria assente devia conter as seguintes alterações, devendo dar-se como provado que:
- não existiu qualquer risco de interrupção do serviço de transporte objeto do contrato inerente ao presente procedimento contratual, até 01.04.2021, ou depois dessa data;
- a entidade adjudicante negociou (antes) e autorizou em 17.02.2021 a cessão da posição contratual à empresa TMG, sabendo que o serviço estava assegurado (ao menos a partir dessa data);
- a empresa TMG assegurou sem falhas a prestação do dito serviço de transporte durante todo o período de tempo em que o executou;
- o navio T.... A..... não dispõe de espaço coberto para transporte de paletes e não dispõe de capacidade da carga mínima identificada na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos;
- o navio T.... A..... não dispõe da grua declarada pela contra-interessada aquando da submissão da proposta (o que configura situação de falsa declaração), nem possui qualquer outra grua que satisfaça os requisitos indicados na alínea k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos.
OO. Ora, se os Autores evidenciaram (desde sempre, e desde logo confrontando o júri com tal factualidade), que a proposta ganhadora contém declarações falsas, que o navio não tem as características exigidas (algumas delas – alíneas d) e k), designadamente, do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos), apenas pela prova pericial ao navio seria possível concluir: da improcedência do alegado pelos Autores (e até eventualmente da sua má-fé processual), ou da procedência de tal alegação.
PP. É que neste caso concreto é manifestamente inidóneo, conforme o Tribunal «inocentemente» defendeu, que a prova documental era bastante e suficiente para esse efeito, exatamente porquanto tal prova documental foi impugnada e contestada como não traduzindo a realidade dos factos!
QQ. E a prova de que tal evidência documental era falsa (e, portanto, estava a ser ofendido, dolosamente, o disposto no Caderno de Encargos) apenas podia ocorrer por via da perícia ao navio ou a sua inspeção judicial.
RR. Entendeu o Tribunal a quo que não ocorreu a violação do artigo 136.º do CCP porque:
“(…) o lançamento do procedimento concursal apelou à urgência da necessidade da mudança de embarcações para o serviço de transportes marítimos, em causa, e mudança devida ao existente não ter-se revelado apto às necessidades em causa (cfr. factos provados, e em concreto a Resolução do do Conselho do Governo Regional dos Açores nº 27/2021, de 29 de Janeiro do Conselho do Governo Regional dos Açores nº 27/2021, de 29 de Janeiro, bem como apelou à urgência da resolução da situação pré-existente ao procedimento concursal em causa. E foi aquela urgência motivou a redução de prazo procedimental para apresentação de propostas, dada a urgência em assegurar o serviço de transporte marítimo regular de mercadorias às ilhas das Flores e Corvo (cfr. factos provados), sendo sistematicamente realçada a “urgência na contratação de uma nova prestação de serviços, para evitar a ruptura de abastecimentos de bens essenciais, tais como bens alimentares, de higiene, rações, gás e combustíveis. E, atendendo, ainda, à necessidade premente de assegurar, sem interrupção, o serviço de transporte marítimo regular de mercadorias às ilhas das Flores e Corvo, garantindo o abastecimento de bens àquelas populações, preocupação que foi ditada em sede de regras regulamentares patente no caderno de encargos”.
SS. Serenamente, porém, não podemos acompanhar tal raciocínio, dado que, tal como já defendido antes (sem sede de factualidade assente), não é verdade que tenha ocorrido rutura do serviço de transporte, tenha sequer existido tal risco (entidade adjudicante negociou e autorizou depois a cessão da posição contratual em 17.02.2021 à empresa TMG), pelo que o prazo de 15 dias, que é de natureza excecional, não podia legalmente impor-se como o devido.
TT. E se olharmos ao objeto do presente contrato, facilmente concluímos, pela experiência e lógica do senso comum, que o prazo de 15 dias (admitindo que os candidatos estão todos em igualdade de circunstâncias, desconhecem a priori as características do navio pretendido, etc. – condições ideais que sabemos a prática [portuguesa] atraiçoa), para conseguir aceder a navio [próprio ou fretado] com tais características no mercado mundial, que não é coisa instantânea ou de fácil obtenção para qualquer operador ou agente, é um prazo muito curto e escasso - não é seguramente o mesmo que disponibilizar uma viatura automóvel, por exemplo.
UU. Por outro lado, a urgência também está afastada dado que (cf. facto assente n.º 6) o cataclismo natural que espoletou a necessidade de abertura do concurso já havia ocorrido em outubro de 2019, pelo que o lançamento do concurso em fevereiro de 2021 não pode configurar nenhuma necessidade de urgência sentida pela entidade pública.
VV. Conforme é de elementar justiça, constituindo um seu pressuposto e premissa irredutível, o prazo determinado na lei, injuntivamente, para apresentação de propostas em concursos públicos, visa, no respeito pelos superiores interesses da comunidade (os únicos que devem nortear a atuação da entidade adjudicante gestora dos dinheiros dos contribuintes), a ressalva de que existe uma dilação temporal razoável e equitativa para que os interessados possam conhecer tal oportunidade de negócio, decidir disputar livremente tal objeto contratual, assim se maximizando a concorrência entre agentes económicos.
WW. E note-se que tal “amputação” tem obviamente efeitos impactantes sobre a concorrência efetiva dado que não possibilita aos concorrentes apresentar as melhores e mais competitivas propostas, além de que reduz a possibilidade de acesso por agentes e operadores “não regionais” ou mais distanciados do centro de decisão e local da execução do contrato.
XX. É bom ter presente que os direitos sobre um navio não se obtêm rápida e facilmente, além de que se trata de objeto quase que esmagadoramente apenas existente no mercado internacional (mundial) e não objeto que se angarie no mercado doméstico.
YY. Em súmula, nada justificaria neste caso concreto uma redução para metade do prazo de apresentação de propostas, pelo que ao fazê-lo a entidade adjudicante violou grosseiramente o disposto no artigo 136.º do CCP, o que fulmina de ilegalidade todo o procedimento concursal subsequente, seja porque o serviço estava a ser prestado, e disso tinha consciência plena, porque havia autorizado tal solução, seja porquanto as características do objeto do contrato (navio) dificilmente se compaginam e articulam com um prazo tão curto (nem chegam a ser duas semanas de dias úteis).
ZZ. Ao errar sobre os pressupostos de facto, sobre a oportunidade da dita urgência (que não existia) e negligenciando totalmente o objeto específico do presente procedimento contratual (navio), o Tribunal a quo incorreu na errada interpretação do artigo 136.º, n.ºs 1 e 3 do CCP, donde se impõe a revogação de tal decisão.
AAA. Sobre as especificações constantes do Caderno de Encargos, seguramente o Tribunal não disporá de quaisquer conhecimentos técnicos especializados que lhe permita validar tais opções formuladas pelo júri como as mais coerentes, ajustadas e corretas, além de que o Tribunal se socorre sistematicamente de um parecer elaborado por um dos membros do júri, o que com o devido respeito, não pode servir (ao menos) para provar exclusivamente o que se pretende provar – pois provém de parte interessada na causa!
BBB. Ao recusar a audição de outros especialistas, o Tribunal impediu a descoberta da verdade material, a qual não se faz apenas (ao menos em todos os casos) com a versão única de uma das partes em conflito.
CCC. É que se o Tribunal dispusesse e manipulasse tais conhecimentos técnicos sabia de antemão uma de duas realidades:
Ou o T.... A....., enquanto navio de abastecimento, reboque e apoio a plataforma, constituía uma verdadeira exceção à regra e possuía grua com aquela capacidade exigida, o que seria duvidoso;
Ou o T.... A..... não podia nunca, pela sua estrutura de navio, possuir grua com aqueles recursos e características, até porque comprometia totalmente a sua estabilidade e navegabilidade em termos de segurança.
DDD. Nos termos prescritos no artigo 49.º do CCP, à entidade adjudicante compete definir as características exigidas (principais) para o objeto do contrato público, como é bom de ver, mas sucede que, designadamente, em face do teor do plasmado no artigo 3.º e 4.º do Caderno de Encargos, a entidade adjudicante foi totalmente omissa quanto à identificação preclusiva (como seria lógico) de uma característica que se reputa de fundamental – ou seja, em lado algum foi definido o tipo e/ou classe do navio que seria idóneo e apto ao serviço de transporte de mercadorias.
EEE. É absolutamente natural que qualquer candidato (que não soubesse do procedimento concursal e das características do navio, como é suposto ser) pensasse que o tipo de navio em causa fosse necessariamente de carga ou cargueiro, pois essa é a aptidão e destinação sua – correspondente ao objeto do presente contrato.
FFF. Poder-se-á pensar (foi o que fizeram os Autores e provavelmente também o outro concorrente excluído) que em função do objeto do contrato – serviço de transporte marítimo regular de mercadorias (contentores e paletes) apenas seria admissível, em função da natureza das coisas e do senso comum, que os concorrentes se apresentassem a tal concurso com propostas (exclusivamente) de navios de carga ou de transporte de mercadorias!
GGG. Na verdade, seria totalmente ilógico que pudessem vir a ser admitidos outros tipos e/ou classes de navios que não estão programados, nem foram fabricados ou concebidos, para o transporte de mercadorias (contentores e paletes), mas antes para o desempenho marítimo de outras missões, tarefas e com outras vocações teleológicas.
HHH. Aparentemente, o júri, ou não se apercebeu do erro capital (mas como tal é possível?), ou (e neste caso a amnésia na especificação a determinar no caderno de encargos – por omissão quanto ao tipo e/ou classe do navio exigível é assaz conveniente), ou é-lhe absolutamente indiferente que o transporte marítimo regular de mercadorias se faça num rebocador ou num cargueiro, o que é seguramente indefensável (admitindo-se a boa-fé da entidade adjudicante), pois que se tratam de navios dotados de características técnicas completamente contrastantes.
III. Destarte, ao ter omitido a definição da principal característica associada ao navio exigido e pretendido, a fazer constar obrigatoriamente do CE, quedou ostensivamente violado o artigo 49.º do CCP (resta saber se não dolosamente até), tanto mais que conduziu a uma total deslealdade perante os concorrentes pois o que seria lógico (segundo um princípio de boa-fé) é que o navio requerido fosse inelutavelmente um cargueiro, e nunca, por exemplo, um rebocador, donde não se pode manter a decisão recorrida que ignorou totalmente tal violação normativa.
JJJ. Em todo o caso, sempre imporiam as regras da boa-fé e da lealdade, a cargo da entidade pública adjudicante, que fosse expressamente previsto no Caderno de Encargos quais os vários tipos de navios que podiam afinal concorrer a tal objeto contratual, pese embora o disparate de tal opção e a sua falta de fundamentação quanto ao mérito da escolha.
KKK. Conforme é sabido, a entidade adjudicante não goza (não deve gozar) de discricionariedade nas suas decisões tomadas no seio do procedimento concursal público, pelo que lhe está vedada a fixação de certas exigências e/ou regras sem um respaldo de fundamento técnico, de razoabilidade e de coerência contratual.
LLL. Não lhe é, pois, lícito o exercício decisório arbitrário ou infundamentado, não lhe assistindo o direito ou faculdade de livremente, sem baias fundamentantes, determinar especificidades conforme lhe aprouver, e sobre tal matéria a decisão recorrida não questiona minimamente (tal como lhe foi solicitado) qualquer das soluções técnicas abraçadas.
MMM. É que como a entidade adjudicante sabe (ou tem obrigação de saber) um navio com as dimensões e idade solicitadas dificilmente se encontra no mercado (existem muito poucos ou nenhuns disponíveis com aquelas exatas dimensões e idade) – isto claro se estivermos a pensar no navio de carga – pois se estivermos a pensar no navio rebocador já existem vários – mas obviamente tal navio não é o certo para efetuar este tipo de transporte e navegabilidade.
NNN. A entidade adjudicante exigiu no CE um impulsor de proa com potência mínima de 350 kW e um navio com idade igual ou inferior a 20 anos. Veremos, contudo, que qualquer destas exigências não é razoável (sendo que em face da disponibilidade de navios existentes no mercado, conjugado com as restantes características impostas, apenas navios rebocadores as cumprem) e o seu não cumprimento não determina, de forma alguma, que não haja plena satisfação do interesse contratual e da performance exigida.
OOO. Tal como já manifestado antes, aquela potência mínima exigida quanto ao impulsor de proa (destinado à manobrabilidade do navio) é totalmente irrazoável e infundamentada num navio de carga – que regra geral dela não necessita.
PPP. Ao invés, tal potência já é prototípica num navio rebocador que dela carece para as tarefas que desempenha. Com efeito, a entidade adjudicante nutriu exclusiva preocupação por ter um navio rebocador (em face das características técnicas apresentadas) e não de um navio cargueiro – o que no mínimo se mostra incompreensível em face da natureza e objeto do contrato – transporte marítimo regular de mercadorias (contentores e paletes).
QQQ. No que concerne ao limiar de potência mínima de 350 kW (fixada na alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos, a mesma não tem qualquer justificação técnica plausível, ou exigibilidade fundamentada no âmbito das características próprias de um específico navio de carga (Cargo Vessel).
RRR. Não pode deste modo acompanhar-se a fundamentação do Tribunal a quo quando refere que os Autores se limitam a tecer uma argumentação opinativa e conclusiva, pois na verdade tais matérias, por pertencerem ao foro técnico, deviam ter sido apreciadas por peritos, mas não apenas pelo membro do próprio júri.
SSS. E se é verdade que um navio rebocador (como o T.... A.....) cumpre alguns dos requisitos do Caderno de Encargos (como um fato exatamente à medida), já outros requisitos [alíneas d) e k)] falha rotundamente porque não tem como os cumprir (mas sobre tais requisitos como vimos abundantemente já, a decisão recorrida não cuidou de apreciar).
TTT. Termos em que quedou violado o artigo 49.º do CCP, bem como ofendidos, pela decisão recorrida, os artigos 123.º e 124.º, n.º 1 do CCP, dado que nenhuma explicação foi dada no relatório final, e sobre tal facto a decisão recorrida é omissa.
UUU. Ainda sobre este ponto, deve enfatizar-se que a entidade adjudicante exigiu um navio com idade igual ou inferior a 20 anos, mas sucede que um navio de carga com essa idade e com as restantes características exigidas (mormente quanto às parcas dimensões) simplesmente não existe disponível no mercado – facto que é ou devia ser do conhecimento do ente público.
VVV. Por outro lado, ainda, e a decisão recorrida nada diz sobre tal aspeto, o navio apresentado na proposta submetida pelos Autores foi objeto de uma profunda e infraestrutural recuperação/restauro/modernização em 2003 – mas tudo isso foi olimpicamente ignorado, quer pelo júri, quer pelo Tribunal a quo.
WWW. Ademais o critério da idade não se revela de todo objetivo ou pertinente por si só, nem tem que ver diretamente com a prestação/performance do contraente ou qualidade dos atributos da proposta quanto à medição da satisfação do interesse público/execução do objeto do contrato.
XXX. Erigir uma idade máxima (cujo critério também se desconhece absolutamente) sem qualquer correlação com a necessidade de certificação da qualidade do navio, essa sim determinante, circunstância que se soma aqueloutra de que já não se fabricam nos últimos anos (praticamente) navios de carga com aquelas exíguas dimensões máximas exigidas (50 m de comprimento – alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos), volta a permitir total discricionariedade na tomada da decisão.
YYY. Em síntese, resulta evidente da vontade do legislador que ao concorrente deve ser dada a oportunidade de demonstrar os atributos da sua proposta em ordem a defender que a mesma cumpre com o desempenho exigido ou com os requisitos funcionais inerentes à execução do contrato, rejeitando-se, sem mais, que uma proposta possa ser sumariamente excluída porquanto não iguala eventualmente algum dos requisitos enunciados.
ZZZ. Como é bom de ver, nem sequer alguns dos requisitos técnicos têm relevância ou a sustentabilidade necessária para serem tomados como indisponivelmente obrigatórios (como a potência mínima do impulsor de proa – para mais não propositadamente explicada), como tais escolhas da entidade adjudicante não podem comprometer aprioristicamente o desiderato de fomentar a concorrência, falseando-a ou condicionando-a severamente (como no caso de uma idade máxima, fixada de forma absoluta e inultrapassável – como critério absoluto).
AAAA. Destarte, a decisão recorrida violou assim a interpretação acertada a oferecer-se ao artigo 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP, pelo que se reputa, também por aqui, de ilegal.
BBBB. Entendeu a decisão recorrida (mas mal) sobre que:
“1º - Os documentos que instroem e integram a proposta apresentada pelas AA. não contêm os atributos exigidos pelas regras concursais (cfr. supra expendido);
2º - Bem como não cumpre as exigências decorrentes do programa de procedimento (cfr. supra expendido);
3.º Não apresentou DEUCP que validamente vincule o agrupamento concorrente no procedimento concursal em causa nos autos.
CCCC. Em primeiro lugar, foi proposta a exclusão da proposta dos Autores com fundamento consubstanciado na alegada insuficiência da submissão de uma DEUCP, e não de duas DEUCP (por se tratar de concorrente agrupamento).
DDDD. Note-se desde logo que tal elemento (DEUCP) não corresponde a nenhum daqueles documentos que o legislador fixou, taxativamente, no artigo 57.º, n.º 1 do CCP , nomeadamente, os identificados nas alíneas b) e c), [tanto é que não releva minimamente para a aferição dos termos ou condições conexionados com os atributos da proposta ou condições de execução do contrato], para determinar qualquer fundamento teórico de exclusão, e ao ter decidido diferente, a decisão recorrida violou tal dispositivo normativo.
EEEE. Abona-se ainda o disposto no n.º 6 do artigo 57.º do CCP para concluir da ilegitimidade do decidido, pois que o formulário DEUCP é apresentado alternativamente, ou em substituição, à declaração do anexo i, a qual foi obviamente submetida, pelo que a existir alguma eventual irregularidade também esta nunca seria causalmente determinante da exclusão da proposta.
FFFF. Finalmente acrescente-se, porquanto nada despiciendo, que a representante comum do agrupamento dos aqui Recorrentes previamente se informou sobre a necessidade de submeter um DEUCP ou dois DEUCP (um por cada membro do agrupamento), tendo sido expressamente informada pelos técnicos da AcinGov que bastaria a submissão de um DEUCP, com identificação de ambos os membros integrantes,
GGGG. Donde, até com respaldo no princípio da colaboração e boa-fé (cf. artigos 10.º e 11.º do Decreto-Lei n.º 4/2015, de 07 de janeiro - CPA) inerentes a toda a atuação da administração pública, não poderá o particular ser «punido» quando legitimamente confiou (como não o fazer) em instruções dadas por tais entidades, e com as quais se alinhou.
HHHH. Quanto aos putativos vícios do preenchimento do anexo I (os quais não são invalidantes nem igualmente merecedores da exclusão da proposta), dado que tal punição tinha que resultar direta e textualmente da lei, o que não é caso, donde a decisão recorrida incorre em novo erro de julgamento sobre o artigo 57.º e 146.º do CCP.
IIII. Seja como for, tais documentos nunca seriam suscetíveis de determinar liminarmente a exclusão da proposta, nos termos da lei, até porque são exigíveis mormente em sede de execução do contrato – cfr. n.º 2 do artigo 4.º do CE.
JJJJ. Nesta conformidade verifica-se que a exclusão sumária da proposta dos Autores, aqui Recorrentes, que assim não chegou a ser admitida, apreciada e valorada, se deveu a várias ofensas e violações de lei, donde se impõe a anulação da decisão recorrida que as manteve na ordem jurídica a decisão do júri, violando também ela os citados comandos normativos.
KKKK. Mais uma vez os aqui Recorrentes dissentem ferozmente do teor da sentença recorrida, dado que não vislumbram como pode o Tribunal ter dado como provado o cumprimento do dever de fundamentação a cargo do júri, se absolutamente nada foi dito ou motivado por este quanto aos argumentos de exclusão da proposta da contra-interessada, por violação das alíneas d) e k) do n.º do artigo 4.º do Caderno de Encargos.
LLLL. Na verdade, e não há como negá-lo, o júri simplesmente não se pronunciou sobre a bondade e pertinência dos argumentos expendidos em sede de audiência prévia, argumentos especificamente expendidos para demonstrar a ilicitude da projetada adjudicação.
MMMM. O júri não desmontou qualquer desses argumentos nem contrariou qualquer dos factos alegados, ou nem sequer impugnou o documento junto a fls. 448 do PAI – simplesmente o júri ignorou a existência dessa factualidade e dessa argumentação.
NNNN. Note-se que o júri nem sequer abordou tais argumentos, negando-os ou evidenciando, com prova no processo, de que os factos eram antes outros, nomeadamente, que o navio T.... A..... tinha comprovadamente espaço coberto para albergar paletes de carga, dispunha efetivamente dessa capacidade de carga mínima exigida u dispunha da concreta grua de marca e modelo x.
OOOO. Como igualmente não impugnou que a grua instalada no navio da aqui contrainteressada, fosse a identificada pelos aqui Recorrentes através da informação oficial retirada sobre o navio em questão – tendo tudo ignorado e se pronunciando sobre nada, jamais se pode dizer que o ato de adjudicação foi fundamentado, se deixou precisamente de fora a alegação e prova do cumprimento dos requisitos pelo adjudicatário – alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos.
PPPP. E pelo mesmo rigoroso diapasão se alinhou e estribou a sentença recorrida, uma vez que o Tribunal (também ele) se recusou a verificar o cumprimento dos requisitos constantes das alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos, pela adjudicatária, nada se pronunciando em concreto sobres os mesmos e outrossim sem nenhuma fundamentação motivadora apresentada.
QQQQ. Afigura-se-nos deste modo evidente que o ato administrativo adjudicatário só pode soçobrar, escrutinadas e examinadas minuciosamente as características da proposta vencedora, dado que:
i) O tipo de navio apresentado, tal com declarado pelo próprio concorrente é, indubitavelmente, um support ship/vessel e não um navio de transporte de mercadorias.
ii) Tal navio não está formatado e/ou construído para o transporte de mercadorias nem dispõe de tal vocação (por mais prodigiosa que seja a imaginação da entidade adjudicante), tanto mais que não tem forma alguma de transportar/acomodar, em espaço coberto (porão – nem possui) o exigido na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos, o que também determinava, fatalmente, a exclusão da proposta, e não é minimamente seguro nem viável o transporte de contentores e paletes neste tipo de navio, para mais no agressivo e austero mar dos Açores.
iii) o T.... A..... não tem capacidade de transporte de 6 contentores de 20 pés e 15 paletes.
iv) o T.... A..... tem uma grua instalada com capacidade de 1,14tn, em clara violação do Caderno de Encargos.
RRRR. Por força do exposto, violou a sentença recorrida o disposto nos artigos 123.º e 124.º do CCP, e os artigos 152.º e 153.º do CPA, dado que, quer o relatório preliminar, quer o relatório final, foram omissos quanto à fundamentação da escolha, mormente no que concerne à fundamentação (omissa) da decisão sobre o cumprimento dos requisitos proclamados nas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos, pela contra-interessada, donde também por aqui se impõe a revogação da sentença recorrida.
SSSS. Caso não se entenda que ocorreu nulidade da sentença nesta temática, seja com fundamento na omissão de pronúncia, seja como fundamento na falta de especificação dos motivos, de facto e de direito, então, conforme se vem de alegar exaustivamente, sempre haverá que reconhecer que houve erro de julgamento, dado que nada nos autos permite concluir que o navio T.... A..... cumpre com os requisitos obrigatórios previstos nos referidos comandos do Caderno de Encargos.
TTTT. E não existe tal prova, nem sequer alegação subjacente nos autos, exatamente porquanto não é possível demonstrar uma realidade que não existe e um facto que não se verifica, conclusões que facilmente seriam alcançadas assim o Tribunal tivesse aceitado a competente prova pericial.
UUUU. Na verdade, os aqui Recorrentes, no limite, até podem aceitar que a sua proposta pode ter violado algum dos requisitos do Caderno de Encargos, mas simetricamente, não podem, atento o princípio da legalidade e da igualdade, tolerar e aceitar que a contra-interessada, também violando normas imperativas do Caderno de Encargos, possa gozar de qualquer licitude do ato de adjudicação nesse contexto decidido, sendo que todos os intervenientes estão perfeitamente cientes dos factos aqui alegados pelos Recorrentes corresponderem à verdade, fito de todo o processo judicial equitativo (cf. artigo 20.º, n.º 4, da CRP).
VVVV. Neste caso até com a agravante séria da contra-interessada prestar falsas declarações no âmbito do procedimento concursal, facto que por si só motivaria a exclusão liminar da sua proposta (cf. artigos 70.º e 146.º do CCP),
WWWW. Da mesma forma que não pode o Tribunal (cf. artigos 20.º, n.º 4, 202.º e 203.º da CRP) se eximir a um julgamento justo, alinhado e comprometido unicamente com a descoberta e o apuramento da verdade material (e dela não se voluntariamente alheando), pois apenas esta permite almejar a pretendida justa composição do litígio, assim se fazendo a Justiça em nome do Povo, titular da soberania.
XXXX. Na hipótese deste douto Tribunal não vir a admitir, apreciar a julgar o recurso autónomo já interposto contra o referido despacho de 17.06.2021, então, ao abrigo da citada norma, os Recorrentes, através do presente recurso da decisão final recorrem igualmente do dito despacho interlocutório.
YYYY. O Tribunal tem que adotar uma atitude de equidistância sobre as partes e relativamente aos factos controvertidos (e é desses que falamos) não pode o Tribunal, sem fundamento válido e forte, prescindir aprioristicamente de certos meios de prova porque vão ser eles que vão determinar que factos se vão considerar provados e não provados.
ZZZZ. Ou seja, o Tribunal a quo, com exceção da prova documental junta (dado que nesse âmbito não teria qualquer margem de manobra decisória em contrário), declinou expressamente, através do despacho de 17.06.2021 toda e qualquer prova cuja produção os aqui Recorrentes requereram, com isso impossibilitando um julgamento e uma decisão final equitativa (due process of law), enviesando notoriamente o sentido da decisão que recaiu sobre o mérito do litígio (aliás, já tinha recaído).
AAAAA. E chegados ao areópago jurisdicional, onde o contraditório é (deve ser) pleno, a possibilidade efetiva e real de fazer prova do que se alega, segundo um processo equitativo e justo, com igualdade de armas, verifica-se que aos Autores é simplesmente recusada a suscetibilidade de demonstrar que a proposta adjudicada não cumpre com os requisitos obrigatórios.
BBBBB. Na verdade, a regra magna, com assento e dignidade constitucional (cf. artigo 20.º n.º 4 da CRP) não consente nem autoriza que o tribunal se possa furtar à discussão livre, plena e democrática das razões de facto e de direito agitadas por cada parte, devendo viabilizar o concurso de cada uma delas na atuação de protagonista principal para o apuramento da verdade material.
CCCCC. Entendeu o Tribunal que a prova testemunhal e de declarações de parte deviam ser rejeitadas porquanto todos os factos identificados (sem exceção, pasme-se) traduziam factos valorativos, opinativos e conclusivos.
DDDDD. Ora, tal não é manifestamente o caso. Basta atentar na lista dos factos identificados como carecidos de instrução e cuja produção de prova se justificava, para perceber que há valiosidade da prova testemunhal (com conhecimentos técnicos especializados) em ordem a apurar-se e discutir-se as características técnicas do navio do adjudicatário e sua adequação aos requisitos, fins e objetivos do procedimento concursal,
EEEEE. Pois a mera leitura dos documentos que integram as propostas não permite (por si só, como é bom de ver) aquilatar do preenchimento daquelas condições objetivas de verificação obrigatória, pois está em causa (também) na presente ação a discussão sobre dinâmica de funcionamento e navegabilidade marítima do navio (que é do tipo - apoio a plataforma ou rebocador – totalmente inepto para transporte regular de mercadorias) que foi seleccionado
FFFFF. Da mesma forma seria de todo conveniente que os membros do júri (arrolados como testemunhas) justificassem/explicassem certas opções técnicas, a exigência de certas condições de verificação obrigatória e não de outras em face do objeto concreto do contrato e da dita (agora) preferência por um navio rebocador, dado que até em sede de audiência dos interessados o júri simplesmente afirmou perante os aqui Recorrentes não ter que explicar os critérios acolhidos.
GGGGG. É que não é livre nem arbitrária a escolha do conteúdo técnico de um caderno de encargos sob pena de não haver qualquer possibilidade de escrutínio jurisdicional e de controlo de legalidade da atuação da Administração Pública, com isso aniquilando a tutela judicial efectiva dos direitos dos concorrentes excluídos ou preteridos (cf. artigo 268.º, n.º 4 da CRP).
HHHHH. Da mesma forma era pertinente que o júri, em julgamento, ao contrário do sepulcral silêncio a que se remeteu em sede de notificação do relatório preliminar (em violação de lei), viesse explicar ao Tribunal a bondade dos seus argumentos e a interpretação das características técnicas do navio cuja adjudicação propôs em face das exigências do objecto contratual e sua conformação.
IIIII. E quanto ao indeferimento da prova pericial requerida, o Tribunal não sustenta qualquer fundamentação válida que escude de boa-fé o convencimento das razões ventiladas, dado que a instrução se destina precisamente a que as partes possam demonstrar, pelos meios probatórios idóneos, a verdade dos factos alegados.
JJJJJ. Ora, o objeto da ação, tal como delineado pelos Autores, consiste em apurar a licitude da decisão de adjudicação, assim como o respeito pela lei no procedimento concursal que culminou com tal ato decisório.
KKKKK. Neste conspecto, tendo os Autores, desde o primeiro momento (ainda em sede de audiência dos interessados) identificado falhas crónicas do navio da proposta adjudicatária, falhas essas que determinam a violação de regras de cumprimento e verificação obrigatória, como seja o espaço coberto/fechado (que não existe em tal navio), assim como a grua (muito inferior à exigida), o recurso à prova pericial é fundamental para perceber as características de tal navio rebocador,
LLLLL. E se na presente ação for espúria a discussão e prova sobre as características técnicas do navio da proposta adjudicatária, e sua conformação ao caderno de encargos, então naturalmente está esvaziada de utilidade a demanda,
MMMMM. Procura o Tribunal defender a sua posição argumentando que dos autos consta prova documental suficiente para essa decisão, mas tal é uma convicção (se o é) totalmente errada e que denega a realização da justiça material.
NNNNN. Ao contrário da «inocência» do julgador a quo, e da visão simplista da interpretação da documentação junta aos autos, no sentido de que tal acervo esclarece as características das embarcações, certo é que a prova pericial é intransigentemente necessária para demonstrar efetivamente se tal navio cumpre (ou não) com os requisitos técnicos exigidos,
OOOOO. E na verdade o julgador, seguramente, não dispõe de conhecimentos técnicos suficientes e idóneos para indagar se o navio em causa satisfaz tal tecnicidade do caderno de encargos, em clara violação do disposto no artigo 90.º, n.º 3, do CPTA. “No âmbito da instrução, o juiz ou relator ordena as diligências de prova que considere necessárias para o apuramento da verdade, podendo indeferir, por despacho fundamentado, requerimentos dirigidos à produção de prova sobre certos factos ou recusar a utilização de certos meios de prova, quando o considere claramente desnecessário”.
PPPPP. Desde a fase administrativa/graciosa, que os aqui Recorrentes identificaram (perante o júri) falhas do navio rebocador quanto ao cumprimento de condições técnicas de verificação obrigatória, e mais do que isso, sensibilizaram o júri para o seguinte facto principal: a declaração do concorrente adjudicatário quanto à grua instalada no navio não corresponde à realidade.
QQQQQ. O navio em causa não tem a grua que foi declarada aquando da apresentação da proposta, E sobre tal matéria estamos perante evidências factuais, não considerações subjectivas ou estados de alma. Ou o navio tem uma grua que cumpre com o caderno de encargos (assim como dispõe de um espaço coberto/fechado para acomodação dos contentores e restante mercadoria) ou não a tem…
RRRRR. Ora, provando-se que o concorrente prestou falsas declarações, declarando uma realidade que não existe efetivamente, pois tal navio não tem instalada a grua que consta da sua declaração, não é (nunca) a mera leitura da proposta e dos documentos que a acompanharam que permitirá ao Tribunal sindicar da verdade do aqui alegado.
SSSSS. Dito por outras palavras: o Tribunal não saberá qual a grua que está instalada no navio em causa se não for feita a correspondente e competente prova pericial pelos institutos responsáveis, pois que se limitará a compaginar a documentação e cotejá-la com os dizeres do caderno de encargos, mas sem nunca conseguir apurar (mas como?) que grua está efetivamente instalada no navio (logrando-se provar a dita falsidade entre o declarado e a realidade subjacente).
TTTTT. Ora, toda esta factualidade foi alegada junto do Tribunal em sede própria e formulada oportunamente, daí que a prova pericial requerida seja fundamental para demonstrar que a grua instalada no navio constante da proposta adjudicatária não cumpre com os requisitos, e em caso de ter ocorrido intervenção a posteriori, para designadamente se ter montado nova grua em estaleiro, qual a data da sua ocorrência e que grua foi efetivamente instalada.
UUUUU. Ao rejeitar tal meio probatório (dado que os navios carecem de «licenciamento» pela SOCIEDADE CLASSIFICADORA DE NAVIOS DET NORSKE VERITAS e que todas as alterações lhe devem ser comunicadas e vistoriadas, a fim de obterem a sua validação e conformação legal), o Tribunal a quo impossibilitou (que é situação diferente de ter dificultado onerosamente) os aqui Recorrentes de fazerem a competente prova (pela única entidade que o poderá fazer reconhecidamente) desse facto principal alegado.
VVVVV. Ora, a mera lucubração sobre os documentos juntos com a proposta não permite ao Tribunal apurar a verdade material, como é óbvio, dado que ali apenas se constata o que foi declarado e não o que existe no mundo real….
WWWWW. Mas se o que foi declarado não corresponde ao que existe, a verdade (que é una) apenas se pode demonstrar por recurso à prova pericial a realizar por terceiros – recusar tal prova equivale à rejeição da descoberta e apuramento da verdade material, e sem verdade material não há justa composição do litígio – leitmovit de todo e qualquer processo judicial, para mais quando está em causa (também) o superior interesse público (deste modo quedaram ofendidos os comandos ínsito nas seguintes normas: artigo 20.º, n.º 4, da CRP, 268.º, n.º 4, da CRP, artigo 2.º, n.º 2 do CPC, artigo 4.º do CPC, artigo 5.º, n.º 2, alíneas a) e b), do CPC, artigo 6.º, n.º 1, do CPC, artigo 7.º, n.º 1, do CPC, artigo 411.º do CPC, artigo 432.º do CPC, artigo 436.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, artigo 467.º, n.º 1, do CPC, artigo 476.º, n.º 2, do CPC, artigo 602.º, n.º 1, do CPC e artigo 7.º-A, n.º 1, do CPTA, artigo 8.º do CPTA e artigo 91.º, n.º 2, do CPTA.
XXXXX. Em síntese, o despacho recorrido, ao ter rejeitado e sem qualquer fundamento congruente, suficiente ou razoável os meios probatórios requeridos, privou os aqui Recorrentes de fazerem prova de factos principais alegados e nucleares ao objeto da ação, e bem assim, se exonerou voluntariamente do apuramento da verdade material absolutamente essencial à justa composição do litígio,
YYYYY. Pois se permitirá uma decisão jurisdicional baseada no singelamente declarado em documentos (que foram impugnados) e não na verdade material dos factos.
ZZZZZ. Fundamentos que determinam a fulminante ilegalidade do despacho recorrido, pois que a rejeição de tais meios de prova tem influência direta e esmagadora sobre a verdade material e a justa composição do litígio, não correspondendo tais meios probatórios a qualquer expediente processual dilatório, impertinente, desnecessário, supérfluo ou inútil – bem pelo contrário, conforme é facilmente (de boa-fé) percetível – motivos que, esses sim, podiam ter ditado a sua rejeição.
AAAAAA. Termos em que o recorrido despacho não se pode manter na ordem jurídica, em face da violação das normas retro identificadas, devendo nessa conformidade ser substituído por outro que ordene a realização das requeridas diligências probatórias, porquanto adequadas, pertinentes e necessárias à descoberta da verdade material e à justa composição do litígio.
Nestes termos e nos melhores de Direito, com o mui douto amparo de V. Exas., deve ser dado integral provimento ao presente recurso, pelos fundamentos ex ante expostos, revogando-se o despacho de 17.06.2021, assim como a sentença de 11.08.2021, à qual deve igualmente ser reconhecida a sua nulidade, nessa conformidade, com todas as legais consequências, maxime, anulando-se o ato de adjudicação e decidindo-se por tal adjudicação a favor dos aqui Recorrentes, com o que se fará a devida e costumeira JUSTIÇA!».

O Recorrido Fundo Regional de Apoio à Coesão e ao Desenvolvimento Económico (doravante, apenas Fundo Regional) contra-alegou, formulando as seguintes conclusões:
«1. O douto despacho recorrido não é um despacho de rejeição de meios de prova, mas um despacho que determina a não abertura da fase de instrução nos autos.
2. Um despacho de rejeição de meios de prova pressupõe despacho prévio que determine a realização da instrução, circunstancialismo que não ocorre nos presentes autos.
3. Pelo que o recurso interposto é inadmissível, nos termos da alínea d) do nº 2 do artigo 644º do CPC, na medida em que determinou a não abertura de fase de instrução e não a recusa da produção de meios de prova.
4. O recurso quanto à não abertura da fase de instrução nos autos deve ser interposto no eventual recurso da decisão final.
5. Sem prescindir e por mera cautela, a produção de prova requerida pelo recorrente é irrelevante para as questões suscitadas nos presentes autos.
6. Todas as questões suscitadas pelos recorrentes na douta pi, quer quanto ao alegado cumprimento dos requisitos estabelecidos pelo caderno de encargos por parte da sua proposta, quer quanto ao alegado incumprimento de requisitos estabelecidos pelo caderno de encargos por parte da proposta apresentada pelo adjudicatário, são objecto de prova documental e constam dos documentos juntos aos autos.
7. As características técnicas do navio T.... A....., a sua classificação DNV-GL, a sua idade, as características do convés, as características da bomba de trasfega de combustível, a área de transporte de euro-paletes, as características da grua para a movimentação de contentores, a operacionalidade do navio e as características e necessidade de impulsor de proa com a potência exigida nas peças do procedimento, resultam inequivocamente dos documentos da proposta do adjudicatário e do doc. 7 junto com a contestação do R, os quais não foram impugnados pelos recorrentes.
8. Nem foi arguida a sua falsidade.
9. Tais documentos fazem prova plena quanto às declarações atribuídas aos seus autores, nos termos do nº 1 do artigo 376º do Código Civil.
10. A prova testemunhal a produzir seria desnecessária face à natureza das questões em discussão nos autos e à prova documental deles constante.
11. O mesmo se diga em relação à requerida perícia, cujos quesitos têm por objecto capacidade de transporte de carga em contentores e em paletes, objecto de certificação DNV – entidade certificadora de navios, constante do processo instrutor e a capacidade do navio T.... A..... transportar paletes em compartimento fechado, a qual é estranha ao procedimento concursal, pois o artigo 4º do caderno de encargos não impõe esta característica, apenas exigindo um espaço coberto, conceito que não é confundível com espaço fechado.
12. A requerida perícia é inútil, tendo em conta os quesitos e os documentos constantes dos autos.
13. O douto despacho recorrido deve manter-se, com todas as consequências legais.
14. A douta sentença recorrida não merece censura.
15. A douta sentença não enferma de nulidade por omissão de pronúncia, pois pronuncia-se e decide sobre todos os pedidos formulados pelos AA, não se confundindo a discordância quanto à fundamentação ou à forma como foi decidida a questão – o que se verifica in casu – com omissão de pronúncia, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d) do CPC.
16. O Tribunal pronunciou-se – como os AA admitem - com suficiência e clareza quanto ao alegado não cumprimento por parte da contra-interessada dos requisitos obrigatórios do navio, previstos nas alíneas d) e k), do nº 1, do artigo 4º do Caderno de Encargos.
17. A douta sentença não enferma de nulidade por falta de especificação de facto e de direito quanto ao alegado não cumprimento por parte da contra-interessada dos requisitos obrigatórios do navio, previstos nas alíneas d) e k), do nº 1, do artigo 4º do Caderno de Encargos, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea b) do CPC.
18. O segmento da douta sentença em causa (pg. 41) decide com clareza e suficiência quanto ao pedido formulado e à questão suscitada.
19. Apenas a total falta de fundamentação e não a fundamentação errada, incompleta ou insuficiente, preenche a previsão do artigo 615º, nº 1, alínea b) do CPC, pressupondo a alínea c), um erro de raciocínio lógico ou de incongruência lógica entre a decisão e os factos que lhe servem de fundamento, o que não se verifica.
20. Não ocorre o alegado e não provado erro de julgamento.
21. Os AA não impugnaram nenhum dos documentos juntos pelo R com a sua contestação, tal como o R não impugnou nenhum dos documentos pelos AA, pelo que a prova documental está admitida por acordo, com os efeitos previstos no artigo 376º, do Código Civil.
22. A data de cessação da prestação de serviços prestados pelos TMG (anteriores prestadores do serviço posto a concurso) é a constante da Resolução do Conselho do Governo Regional dos Açores, nº 27/2021, de 29 de Janeiro, que não foi impugnada pelos AA, não tendo sido, também, recorrido o facto 4 da matéria provada.
23. As características do navio T.... A....., proposto pela contra-interessada estão provadas pelos factos 20 a 25 da matéria provada, os quais não foram impugnados.
24. Tal como sucede quanto à forma de prestação de serviço pelos TMG, dado como provado no facto 12, do qual os AA não recorreram
25. As características das embarcações utilizadas para a prestação deste serviço são facto provado sob o número 13, o qual não foi recorrido pelos AA.
26. Os factos provados nos números 12, 13, 20 a 25 são provados com fundamento na prova documental e admissão por acordo.
27. Os AA invocam erros de julgamento quanto à matéria de direito, os quais não ocorrem.
28. A entidade adjudicante pode fixar livremente o prazo para a apresentação das propostas, respeitando os prazos mínimos estabelecidos no CCP (artigos 135º, 136º, 158º, 190º, 191º, 192º e 218º, devendo interpretar-se a expressão “livremente” nos termos propostos pelo Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 12/10/2012, no processo nº 00371/11.BEBRG.
29. A fixação de um prazo de 15 dias para apresentação de propostas pelos concorrentes não viola norma ou princípios da contratação pública.
30. A fixação das características obrigatórias do navio por parte da entidade adjudicante integra-se na discricionariedade administrativa em sentido amplo (margem da livre decisão administrativa), limitada pelo princípio da juridicidade e pelos princípios cogentes da contratação pública estabelecidos no artigo 1º-A do CCP.
31. As propostas constituem uma declaração negocial em que o concorrente comunica à Administração a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo, permitindo à Administração, com base nelas, proceder à sua avaliação e proferir decisão adjudicatória.
32. A proposta apresentada pelos AA não cumpria com as seguintes características obrigatórias pelas peças do procedimento, os quais constituem atributos da proposta, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 56º, nº 2 do CCP:
a) Apresentou um navio com idade superior a 20 anos, como se confirma pelos dois documentos que apresenta com a pi – “class status report” da DNV, no qual se refere que a data de construção do navio é 07-1982 e a declaração de Bengt G. Bengtsson que afirma expressamente, na pg. 3 que o “TA respeita o limite exigido de 20 anos, o que não acontece com o AS”, em violação do artigo 4º, nº 1, alínea h);
b) Os AA não indicaram na proposta o número de passageiros, exigível pelo anexo I, B, xiv do caderno de encargos;
c) A proposta dos AA não continha o Plano de Capacidade de Carga, exigido pelo artigo 6º, alínea c), sub-alínea iii) do programa do procedimento;
d) A proposta dos AA não continha o Plano de Calados, exigido pelo artigo 6º, alínea c), sub-alínea iv) do programa do procedimento;
e) A proposta dos AA não continha o Plano de Capacidade Grua, exigido pelo artigo 6º, alínea c), sub-alínea v) do programa do procedimento, em conjugação com o artigo 4º, nº 1, alínea k) do caderno de encargos que exige que a grua possua capacidade de carga mínima de 10 toneladas, com comprimento mínimo de braço de 6 metros;
f) A proposta dos AA não continha o Plano de Segurança e dos Meios de Combate a Incêndios exigido pelo artigo 6º, alínea c), sub-alínea ii) do programa do procedimento;
g) A proposta apresentada pelos AA indica um impulsor de proa eléctrico 2 “Screws 1 Thruster 150 Kw” em violação do artigo 4º, nº 1, alínea g) do caderno de encargos, que exige como característica obrigatória do navio a existência de um impulsor de proa com a potência mínima de 350 Kw;
h) A proposta dos AA não era acompanhada de um dos DEUCP exigíveis.
33. Esta violação de normas das peças do procedimento é fundamento para a exclusão da proposta, nos termos dos artigos 70º, nº 2, alínea b) e alínea a), 57º, nº1, alíneas b) e c) e nos 5 e 6 146º, nº 2, alínea d), todos do CCP.
34. A exclusão da proposta dos AA está sujeita ao princípio da legalidade – que se mostra cumprido - e recolhe fundamentação legal nas normas do CCP que se mostram violadas e indicadas na douta sentença, tendo sido também indicadas no acto administrativo de exclusão da proposta.
35. A proposta da contra-interessada quanto ao navio T.... A....., cumpre todas as características obrigatórias, nos termos do artigo 4º do caderno de encargos, tendo sido apresentados todos os elementos exigidos pelo artigo 6º do programa do concurso.
36. Não tendo havido a prestação de falsas informações quanto à grua, como alegam os AA, pois tanto estes como o adjudicatário nas suas propostas, e de acordo com o anexo I a que se refere o artigo 6º, nº 1, alínea a) do programa do procedimento, utilizam a fórmula “propõe-se a prestar os respectivos serviços nas seguintes condições”, seguindo-se a indicação das características obrigatórias do navio.
37. Alegadas falsas declarações que decorrem de documentos cuja falsidade não foi arguida no momento processual próprio para o efeito.
38. O acto em causa – decisão de adjudicação – cumpre com os todos os requisitos quanto à fundamentação, que é clara, precisa, contém os elementos de facto e de direito para que o destinatário possa reconstruir o pensamento lógico-dedutivo da Administração e aprender o conteúdo do acto administrativo, cumprindo os requisitos estabelecidos no artigo 153º, nos 1 e 2 do CPA: é expressa, indica os motivos de facto e de direito, é sucinta, clara, congruente, lógica e suficiente.
39. Pelo que o recurso interposto deve ser julgado totalmente improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida com todas as consequências legais.».

A Recorrida contrainteressada M …………………….., S.A. (doravante, apenas Recorrida M...................) também apresentou contra-alegações, que findam com as seguintes conclusões:
«1. Vêm os Autores, ora Recorrentes, interpor recurso (i) da douta Sentença de 11.08.2021 que julgou improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual e (ii) do douto Despacho Saneador de 17.06.2021, nos termos do qual o Tribunal a quo determinou a não abertura de instrução.
2. Preliminarmente cumpre referir que o Navio proposto pela Contrainteressada já está a prestar os serviços tendo, para o efeito, sido objeto das necessárias verificações técnicas que atestam o cumprimento de todos os requisitos exigidos pelo Caderno de Encargos (“CE”).
3. Ao contrário do que os Recorrentes afirmam, o Tribunal pronunciou-se sobre o “incumprimento da proposta da contra-interessada das alíneas d) e k) do art.º 4.º/1 do caderno de encargos”, decidindo que “quanto àquele incumprimento face aos factos provados o que se apura é que improcede o arguido incumprimento, e mais uma vez as AA. Traçam “situação de facto” da sua autoria em desconformidade com os factos patentes no procedimento concursal e aqui provados: improcedendo o arguido incumprimento da proposta da contra-interessada das alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do caderno de encargos.
4. O Tribunal decidiu com base na prova documental junta aos autos e admitida por acordo das partes, a saber: (i) memorando/parecer elaborado pelo Eng. P...... Parece (cfr. doc. 7 junto à Contestação apresentada pelo Réu); (ii) proposta da Contrainteressada; (iii) relatório preliminar; (iv) audiência prévia dos interessados no procedimento concursal e (v) relatório final.
5. Nos termos do nº 1 do artigo 376º do Código Civil, o documento particular cuja autoria seja reconhecida, designadamente porque não foi impugnada, faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento, a qual não foi deduzida nos presentes autos, e já não pode ser.
6. E foi precisamente com base na prova documental que ficou provado, por um lado, o cumprimento por parte da Contrainteressada dos requisitos de verificação obrigatória plasmados nas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos e, por outro lado, a desconformidade da “situação de facto” da autoria dos ora Recorrentes com os factos patentes no procedimento concursal e provados nos autos.
7. Em face do exposto, dúvidas não restam que, ao contrário do que os Recorrentes pretendem fazer crer, a douta Sentença recorrida não viola o disposto a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.
8. Subsidiariamente, vêm os Recorrentes arguir a nulidade da douta Sentença por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.
9. Os Recorrentes parecem ignorar que, logo no Despacho Saneador, o Tribunal a quo entendeu, e bem, que os autos se mostram “dotados de prova suficiente e adequada para dirimir o litígio que opõe as partes”.
10. Com efeito, no que à prova pericial respeita, cumpre recordar que, na fundamentação da decisão de determinação de não abertura de instrução proferida no douto Despacho Saneador, o Tribunal refere que “a prova documental nos autos esclarece as características das embarcações, incluindo o patente no parecer junto aos autos, e por isso, a prova pericial pretendida revela-se desnecessária face à prova documental patente nos autos, apta a apurar as características das embarcações em causa”.
11. Os Recorrentes insistem que o Navio proposto pela Contrainteressada não cumpre o disposto nas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do CE, pelo que as declarações feitas na proposta apresentada são falsas.
12. Tal acusação é grave, descabida e sem qualquer fundamento.
13. Ao invés, aquilo que ficou devidamente provado nos autos foi que o Navio proposto pela M................... Açoreana de Transportes Marítimos, S.A., cumpre rigorosamente o disposto nas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno de Encargos, conforme devidamente certificado pela DNV.
14. É falso que o Tribunal não tenha fundamentado a decisão de não violação da proposta da Contrainteressada das alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do CE.
15. Tal decisão encontra-se plenamente fundamentada nos pontos 20 a 33 da Sentença.
16. Nos pontos 20 a 24 da Sentença, o Tribunal remete expressamente para o memorando/parecer elaborado pelo Eng. P...... Parece junto à Contestação do Réu como doc. 7, fls. 96 e seguintes do processo instrutor, e admitido por acordo.
17. O memorando/parecer faz prova plena do cumprimento pelo Navio da Contrainteressada das características a que se referem as alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do CE.
18. Tais características do Navio encontram-se visivelmente comprovadas pelas fotografias precisamente daquele Navio (cfr. fotos n.ºs 3, 4, 5 e 6, págs. 6, 7 e 8 do parecer elaborado pelo Eng. P...... Parece).
19. Conforme decidiu, e bem, o Tribunal a quo, a proposta apresentada pela M................... Açoreana de Transportes Marítimos, S.A., não viola o exigido pelas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do CE.
20. O Tribunal fundamentou a sua decisão na prova documental junta aos autos e na admissão por acordo das partes, designadamente no parecer/memorando elaborado pelo Eng. P...... Parece, pelo que não se verifica qualquer violação do disposto nos artigos 154.º e 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC.
21. Os Recorrentes confundem “declarações unilaterais da entidade demandada” com prova documental admitida por acordo das partes.
22. Os Recorrentes parecem esquecer que o Tribunal a quo não rejeitou apenas a produção de prova por eles requerida, mas sim, também, toda a prova requerida pelo Réu e pela Contrainteressa e que o fez por entender, e bem, que os autos se mostram “dotados de prova [documental] suficiente e adequada para dirimir o litígio que opõe as partes”.
23. A propósito do ponto 4 dos factos assentes, vêm agora os Recorrentes arguir que a afirmação de que “o prestador de serviços contratado veio agora manifestar a intenção de dar por findo o referido contrato de prestação de serviços em 1 de Abril de 2021” que consta da Resolução do Conselho do Governo Regional dos Açores n.º 27/2021, de 29 de janeiro, é falsa.
24. Tal documento faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor.
25. Dos factos dados como assentes resulta de forma clara e inequívoca que:
(i) “O concurso público internacional – dos autos – foi aberto pelo R. ao abrigo da Resolução do Conselho Regional dos Açores n.º 27/2021, de 29 de janeiro” (cfr. facto 4 da fundamentação de facto da Sentença);
(ii) O Concurso foi publicado no Jornal Oficial da Região Autónoma dos Açores pelo Anúncio n.º 19/2021 de 1 de fevereiro de 2021 (cfr. facto 2 da fundamentação de facto da Sentença);
(iii) Dessa Resolução se extrai que “o prestador de serviços contratado [Empresa Barcos do Pico – de Simas & Simas, Lda., que prestava os serviços objeto do presente Concurso desde 1 de abril de 2020] veio agora manifestar a intenção de dar por findo o referido contrato de prestação de serviços em 1 de Abril de 2021” (cfr. facto 4 da fundamentação de facto da Sentença);
(iv) Nos termos do n.º 3, do artigo 4.º, do caderno de encargos aprovado pela Resolução, supra identificada, motivada na urgência, o Concelho do Governo deliberou ainda, “reduzir o prazo a que se refere o n.º 3 do artigo 136.º do Código dos Contratos Públicos para 15 dias, atendendo à necessidade de assegurar o serviço de transporte marítimo regular de mercadorias às ilhas das Flores e Corvo, garantindo assim a não existência de uma interrupção do abastecimento de bens àquelas populações” (cfr. facto 5 da fundamentação de facto da Sentença);
(v) O contrato de cessão da posição contratual entre a Empresa Barcos do Pico de Simas & Simas, Lda., e os TMG – Transportes Marítimos G......................., Lda. foi celebrado em 17 de Fevereiro de 2021” – após a abertura do Concurso – (cfr. facto 9 da fundamentação de facto da Sentença).
26. Pelo que dúvidas não restam que, aquando da abertura do concurso público sub judice, se verificava uma situação de urgência que justificava a redução do prazo a que se refere o n.º 3 do artigo 136.º do Código dos Contratos Públicos para de 30 para 15 dias.
27. Os Recorrentes não têm qualquer razão na defesa de que o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP, porquanto, e conforme se pode ler na douta Sentença recorrida, “[e]m momento algum as AA. aludem ou alegam factos que configurem “… obstáculos injustificados…”, o que é exigido de modo claro no disposto no artº. 49º/4/CCP.”
28. Ficou provado nos autos que o Navio com que a Contrainteressada se apresentou cumpre com as características exigidas pelo CE, ao contrário do Navio com que os ora Recorrentes se apresentaram.
29. Não tendo os Recorrentes sequer alegado quaisquer factos que configurem “obstáculos injustificados à abertura dos contratos públicos à concorrência” (artigo 49.º, n.º4 do CCP), e, além disso, tendo ficado provado pela prova documental junta aos autos a “adequabilidade das características do navio”, evidente é que os ora Recorrentes não se apresentaram com um navio que cumprisse as características obrigatórias por opção e não por impossibilidade.
30. As peças do Concurso Público não exigem uma classe/tipo de navio específica para a prestação dos serviços.
31. Trata-se de uma opção perfeitamente legal, legítima e justificada no Concurso em causa, porquanto demonstra que a Entidade Adjudicante é conhecedora da situação que se tem vindo a verificar no abastecimento das ilhas, em particular do Corvo, estando atenta às necessidades das populações.
32. Nada impedia os ora Recorrentes de apresentarem um navio do tipo/classe do navio apresentado pela ora Contrainteressada, uma vez que tal navio não é único no mercado.
33. Conforme apurado nos autos, as características técnicas de cumprimento obrigatório em causa no Concurso Público sub judice não traduzem qualquer arbitrariedade por banda da Entidade Adjudicante.
34. Ao invés, aquilo que se verifica, e conforme refere o Tribunal a quo, é uma “preocupação de adequabilidade daquelas regras aos fins visados pelo procedimento concursal, realçados pela situação passada a ultrapassar pelo R., e o imprescindível e essencial transporte marítimo em causa”.
35. Dúvidas não restam que não se verifica qualquer violação do disposto no artigo 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP.
36. A proposta das Recorrentes foi excluída, e bem excluída, uma vez que não cumpria, sem lugar a dúvidas, diversos requisitos obrigatórios exigidos pelo CE.
37. Conforme decorre do n.º 6 do artigo 57.º do CCP: “Nos procedimentos com publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia, é apresentado, em substituição da declaração do anexo i do presente Código, o Documento Único de Contratação Pública”.
38. Tendo os ora Recorrentes usado da prorrogativa estabelecida no n.º 6 do artigo 57.º do CCP, ficou assim afastada a aplicação do n.º 5 do mesmo artigo, uma vez que a lei prevê expressamente uma “substituição” de um documento por outro.
39. Conforme resulta inequivocamente do processo instrutor, os ora Recorrentes apenas entregaram um Documento Europeu Único de Contratação Pública (DEUCP), quando estavam obrigados a entregar dois, na interpretação conjugada do artigo 59º, nº 6, do CCP e das regras contidas no próprio formulário do DEUCP, aprovado pelo Regulamento de Execução (UE) 2016/7, da Comissão, de 5 de janeiro de 2016.
40. De acordo com o preceituado no n.º 2 da alínea d) do CCP: “No relatório preliminar a que se refere o número anterior, o júri deve também propor, fundamentadamente, a exclusão das propostas:
d) Que não sejam constituídas por todos os documentos exigidos nos termos do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 57.º”.
41. Assim, por não conter todos os elementos exigidos nos termos do artigo 57º, nº 1 do CCP, foi a proposta dos Recorrentes justificadamente excluída, de acordo com o disposto no artigo 146º, nº 2, alínea d) do mesmo diploma.
42. Ao contrário do que sustentam os ora Recorrentes, ambos os relatórios cumprem os requisitos legais da fundamentação dos atos administrativos previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 153.º do CPTA.
43. Como se pode ler na douta Sentença, a fundamentação “mostra-se conforme ao dever legal de fundamentação, e ao disposto no art.º 153.º/1/2 CPA, já que é clara, concisa e congruente (cfr. factos provados)”.
44. Deverá, pois, improceder a alegada violação da Sentença do disposto nos artigos 123.º e 124.º do CCP, bem como dos artigos 152.º e 153.º do CPA.
45. Alegam os Recorrentes no artigo 139.º que “sempre haverá que reconhecer que houve erro de julgamento, dado que nada nos autos permite concluir que o navio T.... A..... cumpre com os requisitos obrigatórios previstos no Caderno de Encargos”.
46. Cumpre recordar que, conforme resulta dos factos provados nos autos, designadamente do memorando/parecer elaborado pelo Eng. P………, o Navio da Contrainteressada cumpre com as características a que se referem as alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do CE (cfr. doc. 7 junto à Contestação apresentada pelo Réu).
47. Parecer esse que, repete-se, faz prova plena dos factos nele referidos, ou seja, faz prova plena do referido cumprimento por parte da Contrainteressada.
48. Conforme resulta da prova documental junta aos autos, bem como do próprio Navio da Contrainteressada, que, aliás, já se encontra a prestar os serviços objeto do Concurso – tendo, para o efeito, sido objeto das necessárias verificações técnicas que atestam o cumprimento de todos os requisitos exigidos pelo CE –, o Navio com que a Contrainteressada se propôs prestar os referidos serviços cumpre com todos os requisitos de cumprimento obrigatório exigidos pelo artigo 4.º do CE.
49. Em suma, tais características de cumprimento obrigatório estão patentes:
(i) Na descrição do Navio proposto pela Contrainteressada (cfr. proposta apresentada pela Concorrente n.º 2 junta ao processo instrutor);
(ii) Na descrição do Navio da Contrainteressada atestada pelo memorando/parecer elaborado pelo Eng. P...... ……….. (cfr. doc. 7 junto à Contestação do Réu);
(iii) No facto de o Navio da Contrainteressada já se encontrar a prestar os serviços objeto do Concurso.
50. Dúvidas não restam que a Contrainteressada não prestou falsas declarações no âmbito do procedimento concursal, nem violou quaisquer normas imperativas do Caderno de Encargos, pelo que o ato de adjudicação não padece de qualquer ilicitude
51. Não se verifica qualquer erro de julgamento, dado que o Tribunal a quo fundou a sua convicção na prova documental junta aos autos e na sua admissão por acordo das partes.
52. Vêm também os Recorrentes, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 142.º do CPTA, interpor recurso do douto Despacho de 17.06.2021, através do qual o Tribunal a quo entendeu que os autos mostram-se “dotados de prova suficiente e adequada para dirimir o litígio que opõe as partes e, em consequência, por desnecessária, não se determina a abertura de instrução” (…) “o que motiva a recusa/indeferimento – em bloco – do requerimento probatório da A.; bem como recusasse os requerimentos probatórios das demais partes”.
53. Todas as questões suscitadas pelos Autores, ora Recorrentes, na Petição Inicial são objeto de prova documental, a qual se encontra juntos aos autos.
54. A prova documental nos autos é suficiente e adequada para a boa decisão da causa.
55. A recusa/indeferimento – em bloco – do requerimento probatório dos ora Recorrentes e das demais partes foi devidamente fundamentada com rigor e minúcia, demonstrando assim a correção e a justiça da mesma, afastando a alegada falta de fundamento da decisão.
56. Tais documentos fazem prova plena quanto às declarações atribuídas aos seus autores, pelo que a eventual produção de prova testemunhal e/ou pericial é, assim, não só desnecessária como inconsequente.
57. As características técnicas do Navio proposto pela Contrainteressada, a sua classificação DNVGL, a sua idade, as características do convés, as características da bomba de trasfega de combustível, a área de transporte de euro-paletes, as características da grua para a movimentação de contentores, a operacionalidade do navio e as características e necessidade de impulsor de proa com a potência exigida nas peças do procedimento, resultam inequivocamente dos documentos junto aos autos, os quais não foram impugnados pelos ora Recorrentes.
58. Tais documentos fazem prova plena quanto às declarações atribuídas aos seus autores, pelo que a eventual produção de prova testemunhal e/ou pericial é, assim, não só desnecessária como inconsequente.
59. Também as razões e fundamentos que justificaram a exclusão da proposta apresentada pelos ora Recorrentes se encontram demonstradas na documentação constante do Concurso Público sub judice, não havendo necessidade para a abertura de instrução que seria desnecessária, supérflua e inútil.
60. A M................... ………………, S.A., conforme resulta expressamente da proposta por si apresentada, “propôs-se prestar” os serviços objeto do Concurso Público sub judice utilizando para o efeito um navio que reúne todas as características de cumprimento obrigatório exigidas pelo artigo 4.º do Caderno de Encargos, e apresentou com a respectiva proposta todos os elementos exigidos pelo artigo 6.º do Programa do Concurso.
61. E foi precisamente por estas razões que lhe foi adjudicada a prestação de serviços em causa neste Concurso Público.
62. Com efeito, a proposta apresentada pela ora Contrainteressada cumpre rigorosamente todas as características de cumprimento obrigatório previstas no Caderno de Encargos, designadamente nas alíneas d) e k) do n.º 1 do seu artigo 4.º, conforme resulta (i) do conteúdo da própria proposta; (ii) do parecer emito pelo Eng. P...... ……..junto à Contestação do Réu como doc. 7, fls 96 e seguintes do processo instrutor, e admitido por acordo) e (iii) do certificado emitido pela DNV.
63. Conforme decidiu o Tribunal a quo, a proposta apresentada pela M................... ……………, S.A., não viola o exigido pelas alíneas d) e k) do n.º 1 do artigo 4.º do CE.
64. Os Recorrentes procuram sustentar que “a prova pericial é intransigentemente necessária para demonstrar efetivamente se tal navio cumpre (ou não) com os requisitos técnicos exigidos”, no facto de o Julgador não dispor “de conhecimentos técnicos suficientes e idóneos para indagar se o navio em causa satisfaz tal tecnicidade do caderno de encargos, em clara violação do artigo 90.º, n.º 3, do CPTA.” (cfr. artigos 166.º e 167.º).
65. Um dos documentos juntos ao processo é um parecer/memorando cujo autor goza de autonomia técnica, isenção, imparcialidade e, obviamente, dos necessários conhecimentos técnicos para o efeito (cfr. parecer elaborado pelo Eng. P...... ……… junto à Contestação do Réu como doc. 7).
66. E foi precisamente com base na prova documental junta aos autos, designadamente nesse parecer, que o Tribunal a quo entendeu que a prova documental nos autos esclarece as características das embarcações (e não, obviamente, com base nos “conhecimentos técnicos” do Julgador).
67. Como se pode ler no Despacho Saneador, “a prova documental nos autos esclarece as características das embarcações, incluindo o patente no parecer junto aos autos, e por isso, a prova pericial pretendida revela-se desnecessária face à prova documental patente nos autos, apta a apurar as características das embarcações em causa”.
68. A prova pericial pretendida pelos Autores, ora Recorrentes, é assim supérflua. A prova testemunhal, para além de supérflua, seria ineficaz, pois não pode contrariar a prova, plena, resultantes dos documentos juntos aos autos.
69. Em momento algum do presente processo judicial (ou, sequer, do Concurso Público sub judice) os ora Recorrentes alegaram que a proposta apresentada pela ora Contrainteressada tenha sido alterada.
70. E bem se compreende que não o tenham invocado, pois, conforme resulta dos documentos que integram o procedimento concursal, a proposta da Contrainteressada nunca sofreu modificação alguma.
71. Quer a Entidade Adjudicante quer o Tribunal se pronunciaram sobre o alegado incumprimento pela Contrainteressada dos requisitos exigidos pelo CE, concluindo, clara e inequivocamente pela inexistência desse incumprimento (na douta Sentença pode ler-se o seguinte: “face aos factos provados, o que se apura é que improcede o arguido incumprimento (…) da proposta da contrainteressada das alíneas d) e k) do art.º 4.º/1 do caderno de encargos”.».
*
O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo Sul, notificado para tanto, não emitiu parecer.
*
Foram dispensados os vistos dos Venerandos Adjuntos, atenta a natureza urgente dos presentes autos.


II. DA JUNÇÃO DE DOCUMENTO COM O RECURSO
No requerimento de recurso apresentado pelas Recorrentes, consta, a final, que «Junta: Alegações, DUC, comprovativo do pagamento da taxa de justiça devida e do acréscimo cominado no artigo 139.º do CPC aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA, e 1 (um) documento.»
E, compulsado o corpo alegatório, verifica-se que o ponto 188.º tem o seguinte teor: «Tanto mais que, já após proferida a sentença, os aqui Recorrentes, no exercício de um direito perfeitamente legítimo (cf. Doc. 1 ora junto) solicitaram à entidade adjudicante, por mais de uma vez, a facultação de cópia dos documentos constantes do n.º 2 do artigo 4.º do Caderno de Encargos (por forma a eventualmente aferirem, se possível, do cumprimento daqueles requisitos, aqui apontados, como de verificação obrigatória, pela adjudicatária), mas novamente se defrontaram com um empedernido e sepulcral silêncioAssim como se verifica que nenhuma outra referência é feita ao dito documento nas alegações, nas conclusões ou a final, ou à necessidade, como meio de prova, da sua junção aos autos, ou à norma ao abrigo do qual o juntam.
Ora, o referido “Doc.1”, que se encontra nos autos no SITAF sob a descrição “Comprovativo do pagamento (DUC) Autoliquidações diversas”, corresponde a uma sucessão de e-mails, de 31 de Agosto, 2 e 3 de Setembro de 2021, dirigidos pela 2.ª Recorrente ao endereço eletrónico do Recorrido, a solicitar e a insistir, respetivamente, no envio de cópia dos documentos identificados no n.º 2 do artigo 4.º do Caderno de Encargos [doravante apenas CE], a saber, «O adjudicatário deverá remeter, no prazo máximo de 30 dias a contar da celebração do contrato, os seguintes certificados em vigor: (…)».
Atento o disposto nos art.ºs 651.º, 425.º, 423.º e 410.º, do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA, os documentos que, por definição, são meios de prova de factos que configuram os fundamentos da acção ou da defesa e que deles carecem, depois do encerramento da discussão e em caso de recurso, só a título excecional pode ser admitida a sua junção com as alegações e exclusivamente aqueles cuja apresentação não tenha sido possível anteriormente ou quando a sua junção se tenha tornado necessária por causa do julgamento proferido em 1.ª instância.
O mesmo é dizer que não basta fazer menção numa das alegações a um documento junto, exigindo-se ao recorrente que invoque e prove o interesse processual que tem nessa junção ao abrigo de uma das situações elencadas no mencionado n.º 1 do art.º 651.º do CPC.
Sucede que, as Recorrentes não cumpriram o ónus de demonstrar o interesse processual do documento junto nesta oportunidade e, muito menos, explicitando o cumprimento do requisito elencado no art.º 425.º do CPC.
É que, ainda que seja evidente a superveniência objetiva do documento em causa, a sua junção foi referida no âmbito da impugnação do despacho de 17.6.2021, suportada, no essencial, no entendimento de que a prova testemunhal e pericial requerida era imprescindível para as Recorrente demonstrarem que a proposta adjudicada não cumpria com os requisitos obrigatórios previstos no procedimento concursal. Pelo que, assim sendo, não se vislumbra como o facto de a 2.ª Recorrente ter pedido ao Recorrido cópia dos documentos a entregar pela Recorrida após contrato, e de não ter obtido resposta, possa ser relevante para a questão a dirimir, ou que a decisão de rejeição dos requerimentos de prova se tenha baseado em preceito jurídico ou meio probatório inesperado, que exigisse a apresentação deste documento com o recurso.

Por conseguinte, não pode admitir-se a junção do aludido Doc.1, por a mesma não respeitar o disposto nos art.ºs 651.º, n.º 1 e 425.º do CPC, devendo o referenciado documento ser desentranhado e devolvido ao respetivo apresentante.



III. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO
As Recorrentes vêm, no presente recurso jurisdicional, impetrar duas decisões proferidas pelo Tribunal a quo: (i) o despacho emitido em 17/06/2021, na parte em considerou desnecessária a abertura da fase de instrução e dispensou a produção de meios de prova requeridos pelas Recorrentes e, (ii) a sentença proferida em 11/08/2021, que julgou a presente ação de contencioso pré-contratual totalmente improcedente e absolveu os Recorridos dos pedidos.
Naturalmente, porque a apreciação do vertente recurso quanto ao despacho emitido sobre os requerimentos probatórios poderá influir decisivamente no desfecho do recurso respeitante à sentença- em ultima ratio, prejudicar o conhecimento do recurso referente à sentença-, este Tribunal de Apelação enfrentará, primeiramente, o recurso atinente ao sobredito despacho e, só após e sendo caso disso, apreciará o recurso relativo à sentença promanada em 11/08/2021.
Assim estabelecida a prioridade de conhecimento, importa esclarecer que as questões suscitadas pelas Recorrentes, delimitadas pelas alegações de recurso e respetivas conclusões, bem como pelas contra-alegações dos Recorridos, atento o disposto no n.º 4 do art.º 635.º e nos n.ºs 1 a 3 do art.º 639.º, do CPC ex vi n.º 3 do art.º 140.º do CPTA, consistem, no essencial, em saber:
- quanto à decisão proferida em 17/06/2021, na parte em considerou desnecessária a abertura da fase de instrução e dispensou a produção de meios de prova requeridos pelas Recorrentes, se a mesma é incorreta, por desrespeito do princípio da igualdade de armas processuais e violação do previsto no art.º 90.º, n.º 3 do CPTA, e ainda, afronta ao estatuído nos art.ºs 411.º, 432.º, 436.º, 467.º, n.º 1, 476.º, n.º 2, 602.º, n.º 1, todos do CPC.
- quanto à sentença prolatada em 11/08/2021:
· se a mesma padece de nulidade por omissão de pronúncia e/ou por falta de fundamentação, nos termos prescritos no art.º 615.º, n.º 1, al.s d) e b) do CPC;
· se a mesma padece de erro de julgamento quanto a determinada matéria de facto conduzida ao probatório positivo;
· se a mesma padece de erros de julgamento, concretamente:
(i) quanto à apreciação da questão respeitante à redução do prazo para apresentação das propostas, por violar o disposto no art.º 136.º, n.ºs 1 e 3 do CCP;
(ii) quanto à seleção das especificações técnicas por banda da entidade adjudicante, por violar o disposto no art.º 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP;
(iii) quanto à exclusão da proposta das Recorrentes, por violação do estabelecido no art.º 57.º, n.º 1, al.s b) e c) do CCP;
(iv) quanto à observância das especificações técnicas constantes do Caderno de Encargos por banda da proposta da Recorrida M..................., por violar o disposto no art.º 4.º, n.º 1, al.s d) e k) do Caderno de Encargos.


IV. APRECIAÇÃO DO RECURSO QUANTO AO DESPACHO PROFERIDO EM 17/06/2021
As Recorrentes vêm, no presente recurso jurisdicional, impetrar a decisão proferida em 17/06/2021, que considerou desnecessária a abertura da fase de instrução e dispensou a produção de meios de prova requeridos pelas Recorrentes, por entender que a matéria factual relevante para apreciação e julgamento do litígio já se encontrava demonstrada através de prova documental já junta aos autos.
Entendem as Recorrentes que tal decisão é incorreta, por desrespeito, em suma, do princípio da igualdade de armas processuais e violação do previsto no art.º 90.º, n.º 3 do CPTA, e ainda, afronta ao estatuído nos art.ºs 411.º, 432.º, 436.º, 467.º, n.º 1, 476.º, n.º 2, 602.º, n.º 1, todos do CPC. Invocam, nas conclusões XXXX a AAAAAA do seu recurso, em síntese, que: ao rejeitar os meios de prova requeridos, com excepção do da prova documental, foi-lhes recusada a susceptibilidade de demonstrar que a proposta adjudicada não cumpre com os requisitos obrigatórios; a lista dos factos que identificaram como controvertidos permite perceber da “valiosidade” da prova testemunhal, com conhecimentos técnicos especializados, para apurar as características técnicas do navio adjudicatário e a sua adequação aos requisitos, fins e objectivos do procedimento concursal; seria conveniente que os membros do júri, arrolados como testemunhas, justificassem/explicassem certas opções técnicas, a exigência de certas condições de verificação obrigatórias e não outras em face do objecto do contrato e da preferência por um navio rebocador, que omitiram no relatório preliminar; não é livre nem arbitrária e escolha do conteúdo técnico de um caderno de encargos; as razões para indeferir a prova pericial não são válidas por a instrução visar permitir às partes demonstrar, pelos meios idóneos, a verdade dos factos; tendo identificado falhas crónicas do navio da proposta da adjudicatária, as quais determinam a violação de regras de cumprimento e verificação obrigatória, como seja o espaço coberto/fechado (que não existe em tal navio), a grua (inferior à exigida), a prova pericial é fundamental para perceber as características do referido navio; se tal não lhe é permitido está esvaziada a utilidade da demanda; o argumento de que a prova documental produzida é suficiente para a decisão, é totalmente errado e denega a realização da justiça material; o julgador não dispõe de conhecimentos técnicos suficientes e idóneos para indagar se o navio em causa efectivamente satisfaz a tecnicidade do caderno de encargos, se a grua declarada como a instalada no navio corresponde à realidade e se terá sido objecto de intervenção posterior à adjudicação, para o que é intransigentemente necessária a perícia, pelo que decidiu em violação do artigo 90.º, n.º 3 do CPTA; provando-se que a adjudicatária prestou falsas declarações, não é da leitura da proposta e dos documentos que a acompanham que permitirá o tribunal sindicar a verdade; recusar a prova pericial equivale à rejeição da descoberta e apuramento da verdade material, e sem verdade material não há justa composição do litígio.
Do invocado nas mencionadas conclusões impera, desde já, concluir que as Recorrentes centram os fundamentos recursivos do seu ataque a este despacho na rejeição da prova testemunhal e pericial, o que, de resto, quanto à prova testemunhal resulta evidenciado logo nas conclusões CCCCC, DDDDD, EEEEE, FFFFF e HHHHH - “DDDDD. Ora, tal não é manifestamente o caso. Basta atentar na lista dos factos identificados como carecidos de instrução e cuja produção de prova se justificava, para perceber que há valiosidade da prova testemunhal (com conhecimentos técnicos especializados) em ordem a apurar-se e discutir-se as características técnicas do navio do adjudicatário e sua adequação aos requisitos, fins e objetivos do procedimento concursal”- e, quanto à prova pericial, nas conclusões IIIII, KKKKK, PPPPP, QQQQQ, RRRRR e SSSSS.
Concomitantemente, da análise do recurso das Recorrentes decorre que estas nada alegam quanto ao indeferimento da prova por declarações de parte, importando, por isso, concluir que as Recorrentes se conformam com a decisão agora sob escrutínio nesse aspeto.
Sendo assim, nada cumpre a este Tribunal apreciar ou conhecer relativamente ao despacho recorrido na parte que indefere a produção de prova por declarações de parte.

Assente que a discordância das Recorrentes dirige-se à dispensa da produção da prova testemunhal e pericial requeridas, vejamos se lhes assiste razão na vertente impetração.
Ora, compulsados os autos, verifica-se que as Recorrente vêm peticionar, na presente ação, a declaração de nulidade ou a anulação do ato de adjudicação do procedimento concursal público para “Prestação de Serviços de Transporte Marítimo Regular de Mercadorias entre Faial-Corvo-Flores-Faial”, bem como a condenação do Recorrido Fundo a adjudicar-lhes o contrato concursado, com todas as legais consequências.
Para demonstração da sua tese, as Recorrentes, logo na petição inicial, requereram a produção de um conjunto de meios de prova: prova documental, prova pericial, prova por declarações de parte e prova testemunhal.
A prova pericial e a prova testemunhal foram requeridas do seguinte modo:
«Prova por Perícia:
Requer-se que seja notificada a SOCIEDADE …………………………, com sucursal em Portugal sita na Av. …………. n.º 23, 9.º piso, …….177, concelho de Lisboa, a fim de responder aos seguintes quesitos:
- o navio T.... A..... está capacitado para transportar mercadorias em contentores e paletes e em caso afirmativo quais os limites da carga;
- o navio T.... A..... está acomodado para transportar paletes em compartimento fechado e se dispõe de qualquer compartimento fechado para o efeito;
- que grua está instalada e credenciada para ser usada no navio T.... A..... e se existe alguma intervenção em curso no navio e em caso afirmativo qual a data do pedido e finalidade;
- o navio T.... A..... tem condições de navegabilidade com transporte de mercadorias no mar dos Açores.
Requer-se igualmente que seja notificado o INSTITUTO DA MOBILIDADE E DOS TRANSPORTES, I.P. – ATIVIDADES MARÍTIMO-PORTUÁRIAS, sito na Avenida Elias Garcia, n.º 103, 1050-098, concelho de Lisboa a fim de responder aos mesmos quesitos:
- o navio T.... A..... está capacitado para transportar mercadorias em contentores e paletes e em caso afirmativo quais os limites da carga;
- o navio T.... A..... está acomodado para transportar paletes em compartimento fechado e se dispõe de qualquer compartimento fechado para o efeito;
- que grua está instalada e credenciada para ser usada no navio T.... A..... e se existe alguma intervenção em curso no navio e em caso afirmativo qual a data do pedido e finalidade;
- o navio T.... A..... tem condições de navegabilidade com transporte de mercadorias no mar dos Açores.
(…)
Prova Testemunhal
G. ………………., com domicílio profissional sito na Avenida …………….. n.º 250, 3.º esquerdo, 1000-057, Lisboa.
B………………, com domicílio profissional sito no Caminho ………, Pinhal ……….., edifício D. João II, apto. 5, …..-412, V……….
C ………………………., com domicílio profissional sito na sede da Entidade Demandada.
S………………, com domicílio profissional sito na sede da Entidade Demandada.
P………….., com domicílio profissional sito na sede da Entidade Demandada.»
Após múltiplas vicissitudes, em 02/06/2021 foi proferido despacho nos termos do qual foi determinada a notificação das Recorrentes e Recorrido Fundo «para virem aos autos identificar a matéria de facto sobre a qual visam produzir prova testemunhal».
No caso das Recorrentes, por requerimento apresentado em 14/06/2021, vieram estas esclarecer sobre a matéria de facto sobre a qual pretendiam a produção de prova testemunhal da seguinte forma:
«G…………………….(factos alegados nos artigos 14.º a 18.º, 21.º, 31.º a 37.º, 40.º, 43.º, 46.º, 71.º, 75.º, 77.º a 79.º da petição).
B……………….(factos alegados nos artigos 70.º, 71.º, 75.º, 77.º, 78.º e 79.º da petição).
C………………………(factos alegados nos artigos 9.º a 11.º, 14.º a 16.º, 18.º, 19.º, 22.º, 30.º a 40.º, 42.º a 46.º. 51.º, 72.º, 73.º, 75.º, 78.º e 79.º da petição).
S…………………..(factos alegados nos artigos 9.º a 11.º, 14.º a 16.º, 18.º, 19.º, 22.º, 30.º a 40.º, 42.º a 46.º. 51.º, 72.º, 73.º, 75.º, 78.º e 79.º da petição).
P...... ………………. (factos alegados nos artigos 9.º a 11.º, 14.º a 16.º, 18.º, 19.º, 22.º, 30.º a 40.º, 42.º a 46.º. 51.º, 72.º, 73.º, 75.º, 78.º e 79.º da petição).»

Finalmente, o despacho sob recurso, emitido em 17/06/2021, na parte que releva, versa do seguinte modo:
«II – Dispensa de realização de audiência prévia. (…)
O artº.102º/1/CPTA estabelece remissão no que concerne à tramitação processual para o regime da acção administrativa, e por isso, nos termos e ao abrigo do disposto no artº 87º-B/3/CPTA, dispensa-se a realização de audiência prévia, e profere-se:
(…)
III – Instrução dos autos. Requerimentos probatórios.
A A. no requerimento probatório formulado na p.i. peticiona prestação de declarações de parte,
(…).
Formula, ainda, pedido de prova pericial e de prova testemunhal, que na sequência de despacho judicial veio identificar o objecto do requerimento probatório formulado, quanto à prova testemunhal, com referência aos artºs. da p.i.: 9º a 11º, 14.º a 19º, 21.º, 22º, 30º a 40º, 42º a 46.º, 51º, 70º a 73.º, 75.º, 77.º a 79.º
Vejamos, então, à luz do objecto do requerimento probatório da A. da procedência do mesmo em face da prova documental patente nos autos, objecto da causa, pedidos formulados e questões jurídicas e[sic] dirimir nos autos, e claro da verificação da previsão do artº.90º/1/CPTA aplicável por remissão do artº102º/1/CPTA.
1º - (…)
2º - Prova testemunhal:
a) Factos valorativos, opinativos e conclusivos: artºs. 9º a 11º; 14º a 19º; 21º; 22º; 30º a 40º; 42º a 46º; 51º; 70º a 73º; 75º; 77º a 79º; tudo sem prejuízo da prova documental patente nos autos;
b) Matéria de direito: artºs. 14º; 30º; 31º; 39º; 46º; 70º; 75º.
Em face do supra expendido, apura-se que o objecto das (…) e da prova testemunhal da ora A. reportam-se a factos dotados factos valorativos, opinativos e conclusivos, e a matéria de direito, o que justifica a sua recusa.
3º - Prova pericial:
Por último quanto à prova pericial, desde logo, há a referir que a instrução reporta-se ao objecto da acção e não às questões atinentes ao modo e características dos transportes marítimos visados substituir com o procedimento concursal lançado, e aqui questionado pela A.; e a prova documental nos autos esclarece as características das embarcações, incluindo o patente no parecer junto aos autos, e por isso, a prova pericial pretendida revela-se desnecessária face à prova documenta[sic] patente nos autos, apta a apurar as características das embarcações em causa, sem prejuízo da limitação dos princípios processuais do pedido e da delimitação objectiva do processo.
Em suma, mostram-se os autos dotados de prova suficiente e adequada para dirimir o litígio que opõe as partes, e em consequência, por desnecessária, não se determina a abertura de instrução (cfr. artº. 90º, nºs.1 e 2, do C.P.T.A aplicável “ex vi” artº. 102º/1/CPTA), o que motiva a recusa/indeferimento – em bloco – do requerimento probatório da A.; bem como recusa-se os requerimentos probatórios das demais partes.»
Ora, começando pela dispensa da prova testemunhal, desde já se adianta que não se descortina incorreção na decisão do Tribunal a quo de a dispensar.
É que, examinando os pontos da petição inicial relativamente aos quais foi requerida a produção de prova testemunhal- pontos 9º a 11º, 14.º a 19º, 21.º, 22º, 30º a 40º, 42º a 46.º, 51º, 70º a 73.º, 75.º, 77.º a 79.º da petição inicial-, facilmente se verifica que o que está em causa em tais pontos são considerações valorativas e/ou especulativas, juízos conclusivos de facto e de direito, ou mesmo alegações de direito.
Em concomitância, diga-se que os autos estavam já dotados de prova documental adequada e suficiente para que o Tribunal a quo pudesse formular a sua convicção relativamente à factualidade relevante para decisão do vertente dissídio, como é o caso das características pretendidas para o veículo marítimo, por constarem das especificações técnicas do Caderno de Encargos (doravante, apenas CE), e das características dos navios constantes das propostas das concorrentes, nomeadamente, por tais características deverem integrar um acervo documental cuja junção à proposta era obrigatória, nomeadamente, os descritos na al. c) do n.º 1 da cláusula 6.ª do Programa do Concurso (em diante, apenas PC): Desenho de Arranjo Geral, Planos de Segurança e dos Meios de Combate a Incêndios, Plano de Capacidade de carga, Plano de calados e o Plano de capacidade de grua. Ademais, também a necessidade de assegurar a regularidade e estabilidade do transporte de mercadorias para a Ilha do Corvo poderia ser aferida a partir de prova documental diversa, junta aos autos com articulados e requerimentos das partes, mormente, com as contestações dos agora Recorridos, bem como a necessidade de considerar algumas particularidades nas rotas a percorrer pelo navio concursado, particularidades essas dimanantes das condições e características da navegabilidade no mar que banha a Região Autónoma dos Açores, bem como dos portos e respetivos acessos nas ilhas do Faial, Corvo e Flores.
Por conseguinte, bem pode afirmar-se que a parte do conteúdo dos pontos 11, 14, 31, 33, 34, 36, 39, 40, 70, 75, 77 e 79 da petição inicial que assume algum cariz factual está adequadamente submetida à prova documental já constante dos autos.
Na verdade, o que perpassa da impetração das Recorrentes é a sua discordância quanto ao sentido em que o Tribunal formulou a sua convicção, reclamando que a produção da prova testemunhal que requereu seria apta a inverter tal convicção. Mas, também neste aspeto, não podemos acompanhar as Recorrentes, atento o princípio da livre convicção do julgador que preside à valoração crítica da prova produzida. E seja como for, também não se descortina, por exemplo, que contributo poderiam dar, em sede de prova testemunhal, os elementos do júri do concurso quanto às razões de seleção das características do navio que deveria executar o contrato concursado, ou às condições de navegabilidade e acessibilidade do mar dos Açores e dos portos das ilhas em causa, ou, finalmente, às características físicas e funcionais próprias dos navios constantes das propostas dos concorrentes, a menos que tivessem participado na elaboração das peças concursais ou detenham conhecimentos científicos e técnicos muito específicos.
Daí que, não se identifique a violação do prescrito no art.º 90.º, n.º 3 do CPTA, nem do princípio da igualdade processual, relativamente à dispensa da produção da prova testemunhal requerida pelas Recorrentes.
No que concerne à dispensa da produção da prova pericial requerida pelas Recorrentes na sua petição inicial, cumpre dizer, também, que não se vislumbra a utilidade ou necessidade da dita. E por duas razões.
A primeira, porque os autos eram já detentores de prova documental apta a esclarecer o Tribunal recorrido sobre a verificação, ou inverificação, dos factos relevantes para decisão das questões postas, designadamente no que se refere às características do navio constante da proposta da Recorrida M..................., como é o caso do documento n.º 7 junto com a contestação do Recorrido Fundo, e que não foi impugnado pelas Recorrentes.
A segunda, porque o que releva, no caso versado, é a observância do CE por banda da proposta, ou seja, o serviço e os bens descritos nas propostas dos concorrentes devem ser compatíveis e cumprir escrupulosamente as especificações técnicas elencadas no CE, especialmente as atinentes aos atributos da proposta e aos termos e condições fixados pela entidade adjudicante.
Quer isto dizer que, pressupondo o contrato concursado, na sua execução, um determinado bem, o que releva, para efeitos de observância dos atributos e termos e condições, é que as propostas apresentem um bem ou serviço que satisfaça, precisamente, aqueles termos e condições, o que pode, designadamente, ser comprovado por documentos apresentados pelo concorrente, v.g., documentos certificativos e normalizados.
O que significa, portanto, que o que se exige ao concorrente ganhador do concurso agora em discussão é que, no momento da celebração do contrato e início da respetiva execução, seja detentor do bem necessário e imprescindível à execução do contrato concursado, com as características enumeradas na proposta que apresentou, independentemente de, no momento em que apresentou a proposta, ser, ou não, efetivamente detentor de tal bem.
Do que vem de se dizer decorre, logicamente, que não é legalmente admissível, nem razoável, exigir aos concorrentes que sejam proprietários ou detentores do bem necessário à execução do contrato concursado para efeitos de o vistoriar ou fiscalizar durante o procedimento concursal, antecipando, desse modo, um momento que apenas encontra sentido após a adjudicação e, eventualmente, celebração do contrato.
De resto, para além de toda a documentação atinente ao navio que é exigida em sede de procedimento concursal pela cláusula 6.ª, n.º 1, al. c) do PC, é de destacar a demais documentação certificativa elencada no art.º 4.º, n.º 2 do CE, que o concorrente vencedor deve apresentar com a celebração do contrato concursado, e que atestam todas as características, qualidades, condições e funcionamento do navio que deverá ser usado na execução do contrato concursado.
Sendo assim, para efeitos de indagação da correção e adequação da proposta dos concorrentes face às especificações técnicas constantes do CE é bastante o declarado nas propostas pelos concorrentes, bem como o que deriva dos documentos exigidos pelo PC, especialmente, os que assumem conteúdo certificativo de características e/ou funcionalidades.
E tanto assim é que, em regra, não é necessária a apresentação do bem durante o procedimento concursal, a não ser que, por razões específicas, as peças concursais assim o exijam, o que não sucede no caso versado.
De todo o modo, importa esclarecer que a enumeração de especificações técnicas de um bem a usar na execução do contrato concursado, bem como a estipulação de determinados termos e condições, pressupõe, da parte da entidade adjudicante, um juízo e labor prévios no sentido da determinação das soluções funcional ou tecnicamente mais adequadas a alcançar o objetivo que preside à celebração do contrato posto a concurso. Por conseguinte, a fixação de um específico elenco de especificações técnicas encerra esse juízo de adequação do bem ou serviço concursado para a realização do interesse público que ditou a necessidade de celebração do contrato concursado.
Do que vem de dizer-se decorre, portanto, que o juízo sobre a adequação de um determinado bem à execução das prestações do contrato é, em regra, patenteado logo nas peças do concurso, não cabendo, por desnecessário, realizar tal juízo quanto aos concretos bens insertos nas propostas dos concorrentes.
O que vem de explicar-se permite afirmar- no que toca agora ao caso posto- que a exigência das Recorrentes, de realização de prova pericial ao navio que consta da proposta da Recorrida M................... (no sentido de verificar se o mesmo respeita as características elencadas no CE e se permite realizar as prestações do contrato concursado), é absolutamente descabida. Com efeito, a adequação do bem oferecido na proposta da Recorrida M................... para a execução das prestações que constituem o objeto do contrato concursado deriva da sua compatibilidade e observância das especificações técnicas inseridas no CE, não sendo admissível, no caso posto, uma vistoria procedimental.
Sendo assim, é mister concluir que a produção de prova pericial requerida pelas Recorrentes é despicienda, por ser irrelevante no caso dos autos.
E, por essa razão, não se mostra violado o disposto no art.º 90.º, n.º 3 do CPTA, nem o princípio da igualdade processual e, finalmente, nem o disposto nos art.ºs 411.º, 432.º, 436.º, 467.º, n.º 1, 476.º, n.º 2, 602.º, n.º 1, todos do CPC.
Improcede, portanto, o presente recurso jurisdicional no que concerne à decisão proferida em 17/06/2021, de dispensa de produção da prova testemunhal e pericial requerida pelas Recorrentes.
*
Fracassada a impetração do despacho proferido em 17/06/2021, na parte em que dispensou a produção da prova testemunhal e pericial requerida pelas Recorrentes, impõe-se prosseguir, então, para apreciação e julgamento do recurso no que respeita à sentença proferida em 11/08/2021.


V. APRECIAÇÃO DO RECURSO QUANTO À SENTENÇA PROFERIDA EM 11/08/2021
As Recorrentes vieram, na presente ação de contencioso pré-contratual, impugnar o ato de adjudicação, nos termos do qual foi adjudicado à Recorrida M................... o contrato objeto do concurso público internacional para a “Prestação de serviços de transporte marítimo regular de mercadorias entre Faial-Corvo-Flores-Corvo-Faial”.
Ademais, além de peticionarem a declaração de nulidade, ou anulação, do referenciado ato de adjudicação, as Recorrentes, pretendem, igualmente, a anulação do ato que determinou a sua exclusão do concurso, bem como a condenação do Recorrido Fundo a adjudicar-lhes o contrato em questão.
Por sentença proferida em 11/08/2021, o Tribunal Administrativo de Círculo de Ponta Delgada julgou a presente ação totalmente improcedente, absolvendo os Recorridos dos pedidos.
Discordam as Recorrentes do assim julgado, imputando diversas patologias à sentença agora sob escrutínio, a saber: nulidade, nos termos descritos no art.º 615.º, n.º 1, al.s b) e d) do CPC, erro de julgamento no que concerne à matéria de facto conduzida ao probatório positivo, assim como erros de julgamento no tocante ao direito aplicado.
Escrutinemos, então, a sentença recorrida.

a) Nulidades imputadas à sentença recorrida
As Recorrentes vêm, nas conclusões C a X do seu recurso, assacar nulidades à sentença, originadas por duas causas diferentes.
A primeira, a omissão de pronúncia do Tribunal a quo relativamente ao «incumprimento da proposta da contrainteressada das alíneas d) e k) do artigo 4.º, n.º 1 do Caderno de Encargos» (cfr. conclusões C a N, e claramente, a conclusão D).
A segunda, a ausência de fundamentos de facto e de direito que estribem a conclusão exposta pelo Tribunal recorrido, de que o navio constante da proposta da Recorrida M................... cumpria os requisitos descritos nas mencionadas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE, pois a sentença deveria
«- ter dado como provado que o navio T.... A..... dispõe de espaço coberto para transporte de paletes (na verdade não tinha como o fazer, pois não dispõe desse recurso ou faculdade – o que significa que as paletes são transportadas com total exposição aos elementos naturais, com as consequências facilmente assimiláveis daí decorrentes);
- ter dado como provado que o navio T.... A..... tem capacidade para transportar, no mínimo, 6 contentores de 20 pés, com pelo menos 2 tomadas para contentores frigoríficos e no mínimo 15 paletes em espaço coberto (na verdade não tinha como o fazer pois objetiva e realmente não cumpre com tais especificações);
- ter dado como provado que o navio T.... A..... possui grua com capacidade de carga mínima de 10 toneladas com comprimento mínimo de braço de 6 metros (na verdade não tinha como o fazer pois a sua grua é de capacidade muito inferior – cf. fls. 448 do processo administrativo instrutor – e documento junto pelos aqui Recorrentes, não objeto de impugnação em sede de audiência prévia – trata-se da informação oficial existente sobre tal navio).» (cfr. conclusão V do recurso)
O que não fez.
A este propósito, defendem as Recorrentes que não foi realizada qualquer prova quanto a essa matéria- atenta a dispensa da produção da prova requerida pelas Recorrentes-, nem nada consta da factualidade dada como provada na sentença quanto a esse tema (cfr. conclusões O a X, em especial, conclusão V), nomeadamente, para que a sentença pudesse ter concluído pelo cumprimento daqueles requisitos.
Mas não têm razão as Recorrentes.
E expliquemos porquê.
No tocante ao primeiro fundamento de nulidade convocado pelas Recorrentes, a omissão de pronúncia, é manifesto que esta omissão não ocorre, uma vez que a sentença pronuncia-se claramente sobre esta questão, como decorre do explanado, a propósito do art.º 49.º do CCP, na página 33:
«Em momento algum as AA. aludem ou alegam factos que configurem “…obstáculos injustificados…”, o que é exigido de modo claro no disposto no artº.49º/4/CCP, o que decerto lhes seria difícil, com o devido respeito, é que a prova patente nos autos é reveladora da adequabilidade das características exigidas ao navio proposto em sede do presente procedimento concursal, bem como é revelador o parecer patente nos factos provados quanto às características necessárias do navio proposto, o que é cumprido pela proposta da ora contra-interessada, tal como poderiam ter cumprido as AA., que não o fizeram, porque optaram, livremente, de apresentar a propor navio em desconformidade com as exigências requeridas pelo caderno de encargos, dedicando-se na p.i. a tese meramente argumentativa para escamotear as características da cumprir, e tentar, sem êxito, provar que o navio por si proposto tem potencialidade e capacidade para responder do mesmo modo que o navio com as características exigidas no caderno de encargos!» (sublinhado nosso)
E nas páginas 41 e 42 da sentença:
«Por último, falta apreciar do arguido “incumprimento da proposta da contra-interessada das alíneas d) e k) do artº.4º/1 do caderno de encargos”, e quanto àquele incumprimento face aos factos provados o que se apura é que improcede o arguido incumprimento, e mais uma vez as AA. traçam “situação de facto” da sua autoria em desconformidade com os factos patentes no procedimento concursal e aqui provados, improcedendo o arguido incumprimento da proposta da contra-interessada das alíneas d) e k) do artº.4º/1 do caderno de encargos (sublinhado nosso)
Quer isto significar, sem qualquer dúvida, que a sentença recorrida apreciou expressamente a questão atinente ao invocado incumprimento, por banda da proposta da Recorrida M..................., dos requisitos elencados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE, tendo concluído, também explicitamente, que tal incumprimento não sucede.
Não há, por conseguinte, omissão de pronúncia.
No que concerne à ausência de fundamentos de facto e de direito que justifiquem a decisão emitida pelo Tribunal recorrido quanto à aludida questão do incumprimento dos requisitos elencados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE por parte da proposta da Recorrida M..................., sempre se diga que as Recorrentes laboram em erro.
É que não é necessário conduzir ao probatório factos negativos para que daí se possa tirar a ilação de incumprimento ou fixar factos positivos para que daí se possa concluir pelo cumprimento de uma exigência. Isto é, a sentença não tinha que elencar na factualidade provada que o navio constante da proposta da Recorrida M................... era detentor de espaço coberto para transporte de paletes, que tinha capacidade para transportar pelos menos 6 contentores de 20 pés ou que possui grua com determinada capacidade mínima, para daí poder concluir que o dito navio preenche os requisitos elencados no art.º 4.º, n.º 1, al.s d) e k) do CE.
Como deriva satisfatoriamente da sentença recorrida, a decisão de improcedência da questão do referido incumprimento dos requisitos elencados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE baseia-se na matéria de facto constante da mesma sentença, concretamente, pontos 20, 21, 22, 23, 24, 25, 27, 31 e 33 do probatório, sendo certo que os pontos 25, 27, 31 e 33 remetem para o teor integral de documentos que integram o processo instrutor apenso aos autos.
Sendo assim, é inevitável assumir que a conclusão do Tribunal recorrido, relativamente à satisfação, por parte do navio descrito na proposta da Recorrida M..................., das duas especificações técnicas constantes das al.s d) e k) do n.º 1 do art.º 4.º do CE, estriba-se, precisamente, no conteúdo da proposta apresentada pela Recorrida M..................., constante de fls. 96 a 279 do processo instrutor, especialmente, da confrontação com o teor de fls. 97 a 99, 103, 172 a 185 e 261 a 263, no que tange à capacidade de carga do dito navio e características da grua, por aí se encontrarem descritas as características do navio quanto a esses aspetos.
É certo que, melhor seria se a sentença recorrida tivesse explicitado de modo descritivo e preciso qual o apoio documental concreto que funda a sua conclusão respeitante à verificação dos requisitos elencados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE, e precisamente qual a descrição que consta da proposta da Recorrida M................... relativamente ao navio, mormente, quanto à capacidade de carga, à existência de um espaço coberto e à existência de grua e suas características. No entanto, a circunstância de não o ter feito dessa maneira não arrasta a conclusão de que tal sentença é despida de fundamentação fáctica e jurídica.
É que, como é consabido, apenas a ausência total de fundamentação é que consubstancia a patologia descrita na al. b) do art.º 615, n.º 1 do CPC, sendo que a fundamentação insuficiente- de facto e/ou de direito-, ou a errada apreciação da prova e/ou do direito corporizam, apenas, erros de julgamento.
No caso posto, o que se verifica, uma vez mais, é que as Recorrentes não se conformam com o sentido da decisão promanada pelo Tribunal recorrido no que tange ao cumprimento dos requisitos insertos nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE, lavrando em erro quanto à factualidade que deveria constar da sentença recorrida como provada em esteio da decisão de que não ocorre incumprimento dos sobreditos requisitos do CE.
Ressalte-se que, a circunstância da sentença ora recorrida se caracterizar por grande simplicidade e singeleza no que concerne à subsunção jurídica operada relativamente à questão do cumprimento dos requisitos insertos nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE não acarreta a nulidade da mesma por falta de fundamentação, dado que, como já se explicou, somente a ausência total de fundamentos factuais e jurídicos é que é apta a materializar aquela nulidade.
Por outro lado, a verdade é que a sentença recorrida, não obstante a assinalada simplicidade e singeleza, aporta a factualidade provada necessária para ancorar a conclusão de que não ocorre o mencionado incumprimento dos requisitos insertos nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE.
A questão de saber se tal factualidade provada é ou não suficiente para suportar a conclusão que o Tribunal recorrido retirou da mesma é já problemática que pode consubstanciar um erro de julgamento, mas, definitivamente, não a nulidade da sentença.
Sendo assim, não ocorre falta de fundamentação na sentença recorrida.
Pelo que, atento o expendido, soçobra o recurso no que tange à imputação de nulidades à sentença sob escrutínio, pois que não se verificam as nulidades previstas no art.º 615.º, n.º 1, al.s b) e d) do CPC.

b) Matéria de Facto considerada provada na sentença recorrida
A sentença recorrida considerou provados os factos que se enumeram de seguida:
«1- O concurso público, dos autos, foi lançado para responder à necessidade de fazer chegar bens essenciais às ilhas do grupo ocidental da Região Autónoma dos Açores (RA Açores), mais isoladas das restantes ilhas da RA Açores, conforme resulta do artigo 6.º do Caderno de Encargos que se junta como docº.1, e cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 1 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
2- Com referência ao concurso dos autos, foi publicado o Anúncio n.º 19/2021 de 1 de fevereiro de 2021, na série II do Jornal Oficial da Região Autónoma dos Açores e do Anúncio de procedimento n.º 1442/2021 publicado na série II do Diário da República de 8 de fevereiro de 2021, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docºs. 2 e 3 juntos com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
3- O R. Fundo Regional de Apoio à Coesão e ao Desenvolvimento Económico é a entidade adjudicante do concurso público internacional para a “prestação de serviços de transporte marítimo regular de mercadorias entre Faial-Corvo-Flores-Corvo-Faial” (cfr. procº. instrutor junto aos autos e docºs. supra, procº. instrutor, e admissão por acordo).
4- O concurso público internacional – dos autos - foi aberto pelo R. ao abrigo da Resolução do Conselho do Governo Regional dos Açores nº 27/2021, de 29 de Janeiro, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e do qual extrai-se o seguinte:
“…”
“em 1 de Abril de 2020, o Fundo Regional de Apoio à Coesão e ao Desenvolvimento Económico procedeu à contratação da Prestação de serviços de transporte marítimo regular de mercadorias entre Faial - Corvo - Flores - Corvo – Faial, pelo período de 6 meses, prorrogável até ao prazo máximo de 18 meses a contar daquela data” e que “o prestador de serviços contratado veio agora manifestar a intenção de dar por findo o referido contrato de prestação de serviços em 1 de Abril de 2021”.
“…”
“com base neste facto, importa assegurar o serviço de transporte marítimo regular de mercadorias às ilhas das Flores e Corvo, uma vez que tal serviço é de vital importância para a população daquelas ilhas, situação esta que obriga a que seja encurtado o prazo para a apresentação das propostas em 15 dias no procedimento concursal dirigido a esse efeito, garantindo assim que não haja uma interrupção do abastecimento de bens àquelas populações”.
(cfr. docº.1 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
5- Nos termos do nº3, do artigo 4º, do caderno de encargos aprovado pela Resolução supra identificada, motivada na urgência, o Conselho do Governo deliberou, ainda, “reduzir o prazo a que se refere o nº 3 do artigo 136º do Código dos Contratos Públicos para 15 dias, atendendo à necessidade de assegurar o serviço de transporte marítimo regular de mercadorias às ilhas das Flores e Corvo, garantindo assim a não existência de uma interrupção do abastecimento de bens àquelas populações” (cfr. docº.1 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
6- Na noite de 1 de Outubro e tarde de 2 de Outubro de 2019, a Região Autónoma dos Açores foi fustigada pelo furacão Lorenzo, facto público e notório, que provocou cerca de 330 milhões de euros de prejuízos em habitações, explorações agrícolas, equipamentos de apoio à pesca, empreendimentos de comércio e serviço e provocou danos significativos nas infra-estruturas rodoviárias, portuárias e de apoio portuário, em particular com a destruição do porto das Lajes das Flores, na ilha das Flores, situação que originou a declaração de situação de calamidade na Região Autónoma dos Açores, pela Resolução do Conselho de Ministros nº 180/2019, de 8 de Novembro, com produção de efeitos a 1 de Outubro de 2019 e pelo período de 2 anos, cf. o seu nº 7 e pelo período de 2 anos, cf. o seu nº 2, para efeitos de aplicação de regime especial contratação pública com recurso ao procedimento de ajuste directo (cfr. docº.4 com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
7- A ilha das flores é a ilha mais próxima da ilha do Corvo, sendo esta ilha abastecida de produtos essenciais a partir daquela ilha ou da ilha do Faial, tendo em conta as condições do Porto da Casa (porto da ilha do Corvo), e a ilha do Corvo dista das Flores cerca de 35 km e 250 km do Faial (admissão por acordo).
8- O abastecimento de bens, incluindo os bens essenciais - bens alimentares, de higiene, rações, gás e combustíveis – à ilha do Corvo é assegurada em regime de prestação de serviços, mediante um contrato celebrado em 7 de Maio de 2020, com produção de efeitos a 1 de Abril de 2020, celebrado com a E ………… – …………………, Lda, que cedeu a sua posição contratual a T……– Transportes …………………., Lda., por contrato de 17 de Fevereiro de 2021, estando a prestação de serviços ainda em vigor, contratos cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. doc. 5 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
9- O contrato de cessão da posição contratual entre a E ……………. – de S …………, Lda. e os T……… –Transportes ………………, Lda. foi celebrado em 17 de Fevereiro de 2021 (cfr. docºs. 5 e 6 juntos com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
10- Após envio para publicação e subsequente publicação no Jornal Oficial, Diário da República e Jornal Oficial da União Europeia dos anúncios públicos de abertura do procedimento concursal, teve lugar a manifestação de intenção de fazer cessar a prestação dos serviços a 1 de Abril de 2021, conforme carta endereçada ao R., cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 6 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
11- Nos termos do contrato celebrado entre o R. e a Empresa Barcos do Pico – de Simas & Simas, Lda, o prestador de serviços pode denunciar o contrato com a antecedência mínima de 15 em relação ao seu termo, conforme a cláusula 3º do contrato celebrado entre esta empresa e o R., cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. doc. 5 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
12- A prestação dos serviços de transporte marítimo regular é efectuada com três navios – Paulo da Gama, Ponte da Barca e Espírito Santo – que não dispõem de características – idade, potência, arqueação e manobrabilidade – que permitam assegurar a prestação de serviços de abastecimento sem ruptura de abastecimento à população do Corvo, tendo em conta, ainda, o facto de terem de navegar em pleno oceano Atlântico, numa distância de 250 km (17 horas de viagem) a partir da ilha do Faial até ao Corvo. Estas duas circunstâncias – características dos navios utilizados e condições de mar e de onda média anual, que nos Açores é 2,5 metros de altura, cf. memorando elaborado pelo Engº P...... Parece, que se junta com doc. 7, e cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. doc. 7 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
13- As características das embarcações e da navegação no Atlântico – cfr. facto supra - provocaram, no período de Dezembro de 2019 a Fevereiro de 2021, inúmeras rupturas de abastecimento de produtos essenciais à ilha do Corvo. E, entre 6 de Dezembro de 2019 e 23 de Janeiro de 2020, o Corvo esteve 50 dias sem abastecimento de bens essenciais. E, entre 20 de Novembro de 2020 e 17 de Dezembro de 2020, o Corvo esteve 29 dias sem abastecimento de bens essenciais e a 2 de Janeiro de 2021 a falta de combustível provocou a suspensão da iluminação pública e a paragem de viaturas particulares e públicas por falta de combustível (admissão por acordo).
14- O abastecimento de bens essenciais à população do Corvo foi efectuado com carácter de urgência, tendo o R. recorrido à Força Aérea Portuguesa, à SATA (transportadora aérea regional) e a navios rebocadores em serviço no porto de Ponta Delgada – os quais são essenciais para as manobra de entrada, saída e atracagem dos navios no maior porto comercial dos Açores – tudo como resulta das notícias de imprensa que se juntam como docs. 8 a 22 e se dão como reproduzidas para todos os efeitos legais (cfr. docºs. 8 a 22 juntos com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
15- O R. aplicou ao prestador de serviços de transporte marítimo de mercadorias (Empresa ………..) multas contratuais por incumprimento do contrato de prestação de serviços de transporte marítimo e não realização de viagens marítimas para a ilha do Corvo no valor de 75.998,70€ (setenta e cinco mil novecentos e noventa e oito euros e setenta cêntimos), entre 30/09/2020 e 31/12/2020, cf. mapa-resumo elaborado pelos serviços do R., cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. doc. 23 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
16- O R. gastou em contratação de transporte de emergência – através de rebocadores para transporte de combustível e de meios aéreos da Força Aérea Portuguesa e da SATA Air Açores para transporte de bens essenciais - para levar à ilha do Corvo bem essenciais quando se verificaram situações de ruptura de abastecimento a quantia de 1.341.278,14€, no período de 2019 a 2021, sendo que os custo totais com estas operações em 2020 forma de 732.491,85€ e nos meses já decorridos de 2021 foram de 495.340,84€, como resulta dos mapas-resumo elaborados pelos serviços do R, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. doc. 24 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
17- A situação actual tem provocado a preocupação generalizada do Governo Regional dos Açores e dos partidos com assento na Assembleia Legislativa dos Açores, conforme se extrai do teor dos docºs. juntos sob os nºs. 10, 15, 17, 20 e 21, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docºs. 10, 15, 17, 20 e 21 juntos com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
18- O porto da Lajes das Flores apenas estará concluído no prazo de 22 meses, a contar de 1 de Março de 2021, como resulta do ofício de 30 de Março de 2021, remetido pela Porto dos Açores ao Director Regional dos Transportes Aéreos e Marítimos, do Governo Regional dos Açores, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. doc. 25 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
19- Foi referido pelo Comandante O ……………….., que “enquanto se mantiverem as actuais limitações de ao Porto das lajes das Flores, e este não puder dar resguardo a navios sempre que as condições meteorológicas sejam adversa, a melhor possibilidade para abastecer a ilha do Corvo, será a utilização de um navio com enorme estabilidade e manobrabilidade, à semelhança dos rebocadores (ex. multi purpuse vessel, suply vessel, etc.)”, conforme consta do doº. 26 cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 26 junto com a contestação, procº. instrutor, e admissão por acordo).
20- Segundo parecer emitido, o navio T.... A..... é um navio que tem capacidade para transportar até 180 toneladas de carga diversa, 480 m3 combustível em tanques estruturais e o convés tem uma área de 220 m2, como decorre do memorando elaborado pelo Engº P...... Parece, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 7 junto com a contestação, fls 96 e seguintes do processo instrutor, e admissão por acordo).
21- Segundo parecer emitido, o navio T.... A..... é um “navio classificado pela sociedade classificadora D……………(Det ………………… Lloyd), com 1A1 SUPPLY VESSEL, cf. anexo 1. Segundo as regras da DNV, um navio “OFFSHORE SERVICE VESSEL” é um navio que pode ser configurado para vários tipos de tarefas, desde operação com âncoras, reboque, AHTS e abastecimento (supply). A configuração supply permite o transporte de diversos tipos de carga, desde contentores, paletes, combustível, víveres, aguada, etc., para apoio, por exemplo, a plataformas petrolíferas ou outros de tipos de equipamentos que operam em alto mar, cf. anexo 2, da DNV com as notações de classe.
O navio foi construindo segunda as regras da DNV para transporte de carga, pois apresenta o certificado de segurança de construção para navio de carga, cf. anexo 3” como decorre do memorando elaborado pelo Engº P...... Parece, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 7 junto com a contestação, fls 96 e seguintes do processo instrutor, e admissão por acordo).
22- Segundo parecer emitido, as características de operacionalidade do navio T.... A..... permitem assegurar um abastecimento regular e previsível ao Corvo, sem solução de continuidade, pois este navio “foi projectado para operar no mar do Norte, nas ilhas Faroé, no arquipélago dinamarquês e alvora a bandeira da Dinamarca.
O navio está certificado pela autoridade marítima das ilhas Faroé, com permissão para operar em todos as áreas do mundo, cf. anexo 8.
Considerando que, a altura significativa de onda média anual no arquipélago dos Açores é de 2,5 metros, não existe qualquer limitação à operacionalidade deste navio no arquipélago”, como decorre do memorando elaborado pelo Engº P...... Parece, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 7 junto com a contestação, fls 96 e seguintes do processo instrutor, e admissão por acordo).
23- Segundo parecer emitido, o navio T.... A..... dispõe de um impulsor de proa, com a potência de 350 kw, que melhora as condições de manobra no Porto da Casa, na ilha do Corvo, como assinala o memorando elaborado pelo Engº P...... Parece, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 7 junto com a contestação, fls 96 e seguintes do processo instrutor, e admissão por acordo).
24- Segundo parecer emitido, o impulsor de proa – do navio supra referido - permite uma atracagem do navio ao porto, em condições melhores do que aquelas de que dispõem os navios P...... da Gama, Ponta da Barca e Espírito Santo que efectuam o transporte marítimo para o Corvo, na presente data e que não têm este sistema de impulsão. O impulsor de proa é um recurso já utilizado em navios de passageiros e carga – os navios Gilberto Mariano e Mestre Jaime Feijó - que operam nos mares dos Açores, em particular entre as ilhas do Faial, Pico e São Jorge, numa operação da empresa A………………., SA, como resulta do memorando elaborado pelo Engº P...... …………, que se junta com doc. 7 e da consulta ao site desta empresa https://www.atlanticoline.pt/navios/ . Os navios Gilberto Mariano e Mestre Jaime Feijó dispõem, cada um deles de 2 impulsores de proa, com 220 Kw cada um, numa potência conjunta de 440 Kw para cada um dos navios, cf. o memorando elaborado pelo Engº P...... Parece, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. docº. 7 junto com a contestação, fls 96 e seguintes do processo instrutor, e admissão por acordo).
25- O caderno de encargos do procedimento concursal tem o conteúdo patente no processo instrutor, cujo teor aqui se dá por reproduzido, e do qual extrai-se o seguinte (cfr. fls. 20 e segs. do procº. instrutor, e admissão por acordo):
“…”
« Texto no original»
“…”
26- O programa de procedimento tem o conteúdo patente no processo instrutor, cujo teor aqui se dá por reproduzido, com especial destaque para o fixado no seu artº.10º/1, onde é fixado o prazo de 15(quinze) dias para a apresentação das propostas (cfr. fls. 36 e segs. do procº. instrutor, e admissão por acordo).
27- As propostas da A. e contra-interessada têm o teor que aqui se dá por reproduzido (cfr. fls. 64 a 389 do procº. instrutor, e admissão por acordo).
28- O navio proposto pela A.:
- tem 38 anos, e não 20 anos;
- tem um impulsor de proa eléctrico 2 “Screws 1 Thruster 150 Kw”, e não um impulsor de proa com a potência mínima de 350 Kw;
conforme resulta do teor da proposta apresentada pela A., cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. fls. 64 a 389 do procº. instrutor, e admissão por acordo).
29- Na proposta apresentada pelas AA não integrava o exigido pelo programa de procedimento (PP) e caderno de encargos (CE):
- Plano de Capacidade de Carga (cfr. artigo 6º, alínea c), sub-alínea iii) do PP);
- Plano de Calados (cfr. artigo 6º, alínea c), sub-alínea iv) do PP);
- Plano de Capacidade Grua (cfr. artigo 6º, alínea c), sub-alínea v) do PP, e artigo 4º, nº 1, alínea k) do CE);
- Plano de Segurança e dos Meios de Combate a Incêndios (cfr. artigo 6º, alínea c), sub-alínea ii) do PP);
- Não indica o número de passageiros do navio
(cfr. anexo I, B, xiv do CE); (cfr. fls. 64 a 389 do procº. instrutor e admissão por acordo)
30- O DEUCP entregue pelos AA indica a S...............................Agency como chefe de grupo, ao contrário do declarado no instrumento de mandato, de fls, 319 a 320 do processo instrutor, cujo teor aqui se dá por reproduzido, em que S …………………., é indicada como representante comum; e no DEUCP entregue, está expressamente mencionada a indicação de que, em caso de participação conjuntamente com outros operadores é obrigatório que os outros operadores preencham um “formulário distinto” ( (cfr. fls. 319 e 320 do procº. instrutor e admissão por acordo).
31- Foi elaborado relatório preliminar cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. procº. instrutor e admissão por acordo).
32- Foi realizada audiência prévia dos intervenientes no procedimento concursal, cujo teor aqui se dá por reproduzido (cfr. procº. instrutor e admissão por acordo).
33- Foi elaborado relatório final, cujo teor abaixo reproduz-se (cfr. fls. 392 e segs. do procº. instrutor, e admissão por acordo):
«Texto no original»


A convicção do Tribunal fundou-se na prova documental, supra identificada, e na admissão por acordo das partes.
Nada mais logrou-se provar com relevância para a decisão do mérito da presente acção, designadamente não lograram as AA. provar factos que permitissem ao Tribunal apurar que a proposta apresentada pelas AA. cumpria os requisitos do procedimento concursal, e de que a proposta da contra-interessada viola o exigido pelo artº.4º/1/d)/k)/caderno de encargos; bem como não logram as AA. provar que lhes foi criado “obstáculos injustificados”; e não lograram provar que o navio proposto cumpre os objectivos e funcionalidades em igualdade com o navio com as características exigidas no caderno de encargos.»

c) Impugnação da matéria de facto
As Recorrentes, atento o teor das conclusões Y a QQ e AAA, BBB e CCC do seu recurso, revoltam-se, também, contra a condução ao probatório da factualidade a que respeitam os pontos 4, 12, 20, 21, 22, 23 e 24 da matéria de facto dada por provada na sentença recorrida.
Entendem as Recorrentes que a factualidade que integra os aludidos pontos do probatório não se encontra demonstrada, sendo, aliás, falsa.
Mas esta impetração está condenada a um rotundo fracasso. E por várias razões.
A primeira, porque as Recorrentes, na impugnação da matéria de fato, não cumprem as exigências descritas no art.º 640.º, n.ºs 1 e 2 do CPC, o que, naturalmente, conduz à rejeição do recurso nesta parte.
Mas ainda que não fosse de rejeitar o recurso das Recorrentes nesta parte, sempre se dirá que a sorte do mesmo não se alteraria muito.
É que, examinada a factualidade descrita nos enumerados pontos da matéria de facto, verifica-se que o que aí está em causa configura ou o teor de documento junto aos autos (cfr. ponto 4), ou decorre do teor de documentos juntos aos autos (cfr. pontos 12, 20, 21, 22, 23 e 24), documentos esses que integram o processo instrutor apenso, ou acompanham a contestação do Recorrido Fundo.
Percebe-se, nas alegações das Recorrentes, que as mesmas pretendem contestar a materialidade factual sobre que versa o teor dos ditos documentos. Porém, o que é certo é que as Recorrentes nunca impugnaram nenhum dos documentos juntos com as contestações, assim como nunca impugnaram nenhum dos documentos que integram o processo instrutor do concurso, especialmente, o teor dos documentos juntos com a proposta da Recorrida M.................... Saliente-se, aliás, que as Recorrentes não impugnaram o teor do documento n.º 7 junto com a contestação do Recorrido Fundo, nem sobre o mesmo teceram qualquer teor.
E não se argumente que as Recorrentes responderam às contestações dos Recorridos em 01/06/2021, visto que, por despacho proferido em 17/06/2021, tal peça foi considerada inadmissível e ordenado o respetivo desentranhamento, sendo certo que, porque as Recorrentes não recorreram dessa decisão, a mesma transitou em julgado.
E, mais a mais, a verdade é que mesmo nessa peça não se encontra qualquer impugnação desse documento n.º 7, nem, aliás, de qualquer outro.
Por outro lado, nas conclusões OO, PP e QQ, vêm as Recorrentes aludir ao teor dos documentos apresentados na propostas da Recorrida M................... como contendo “falsas declarações”, pois que o navio em causa não era detentor dos requisitos descritos nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE, especificamente, o espaço coberto para transporte de paletes, a capacidade de carga e a grua conforme declarada.
Contudo, como já se explicou em momento anterior, não só as Recorrentes nunca impugnaram processualmente a prova documental em causa- contrariamente ao que afirmam-, como é de mediana razoabilidade perceber que as características físicas do navio a que se refere a proposta da Recorrida M................... devem estar verificadas no momento da celebração e início de execução do contrato, como, de resto, deriva do disposto no art.º 3.º, n.º 1 do CE.
E, seja como for, os documentos de certificação emitidos pela entidade certificadora adequada, juntos com a proposta da Recorrida M..................., bem como para celebração do contrato concursado, são ilustrativos e descritivos das características do navio constante da proposta da mencionada Recorrida, e permitem fundar a convicção positiva relativamente à verificação dos requisitos enunciados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE.
Por conseguinte, não se descortina erro na apreciação da prova documental junta aos autos, atento até o conteúdo material do princípio da livre de convicção, inscrito no art.º 607.º, n.º 5 do CPC.
Sendo assim, não procede a tese das Recorrentes, quanto à existência de “falsas declarações” na proposta da Recorrida M..................., assim como não ocorre erro relativamente à valoração dos documentos efetuada pelo Tribunal recorrido e que conduziu à plasmação dos factos a que se referem os pontos 4, 12, 20, 21, 22, 23 e 24 do probatório.
E, por estas razões, improcede a impetração das Recorrentes no que tange à impugnação da matéria de facto.

d) Erros de julgamento
Definida e fixada, definitivamente, a factualidade provada, importa agora apreciar e julgar os erros de julgamento apontados pelas Recorrentes no que concerne à determinação do direito aplicável às questões içadas no caso posto.
De todo o modo, importa realçar que a impetração apresentada pelas Recorrentes corresponde, grosso modo, ao invocado na petição inicial, não se registando novidade de questões ou de argumentos na presente sede recursiva. Em bom rigor, as Recorrentes não se conformam com o sentido do julgado na Instância a quo, pretendendo deste Tribunal de Apelação a revisão da pronúncia emitida pelo Tribunal recorrido, tendo em conta as questões e argumentos que motivaram a propositura da vertente ação urgente.
Assim sendo, cumpre averiguar se a sentença recorrida padece de erros de julgamento, concretamente: (i) quanto à apreciação da questão respeitante à redução do prazo para apresentação das propostas, por violar o disposto no art.º 136.º, n.ºs 1 e 3 do CCP; (ii) quanto à seleção das especificações técnicas por banda da entidade adjudicante, por violar o disposto no art.º 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP; (iii) quanto à exclusão da proposta das Recorrentes, por violação do estabelecido no art.º 57.º, n.º 1, al.s b) e c) do CCP; e (iv) quanto à observância das especificações técnicas constantes do Caderno de Encargos por banda da proposta da Recorrida M..................., por violar o disposto no art.º 4.º, n.º 1, al.s d) e k) do Caderno de Encargos.

i. Quanto ao prazo para apresentação das propostas
As Recorrentes, nas conclusões RR a ZZ do seu recurso, atacam a decisão prolatada pelo Tribunal recorrido no tocante à legalidade da estipulação do prazo de 15 dias para apresentação das propostas.
Entendem as Recorrentes, em suma, que não ocorrem razões de urgência que possibilitem o encurtamento para 15 dias do prazo geral de 30 dias para apresentação de propostas. Sufragam, por isso, que o entendimento sustentado pelo Tribunal recorrido viola o disposto no art.º 136.º, n.º 3 do CCP.
Com efeito, o art.º 136.º, n.º 1 do CCP dispõe que quando o anúncio do concurso público seja publicado no Jornal Oficial da União Europeia, não pode ser fixado um prazo para apresentação de propostas inferior a 30 dias a contar da data do envio desse anúncio ao Serviço das Publicações Oficiais da União Europeia. No entanto, e em consonância com o n.º 3 do mesmo art.º 136.º, o prazo mínimo previsto no n.º 1 pode ser reduzido para 15 dias nos casos em que uma situação de urgência devidamente fundamentada pela entidade adjudicante inviabilize o cumprimento do prazo mínimo de 30 dias.
No caso dos autos discute-se, precisamente, um procedimento concursal internacional, concretamente, para a “prestação de serviços de transporte marítimo de mercadorias entre Faial-Corvo-Flores-Corvo-Faial”.
Ou seja, trata-se de um concurso público internacional, que foi também objeto de publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia, como decorre implicitamente dos pontos 2, 3 e 10 do probatório, sucedendo que o Conselho do Governo Regional dos Açores, pela Resolução n.º 27/2021, de 29 de janeiro, procedeu à redução do prazo de apresentação das propostas, de 30 para 15 dias, em conformidade com o permitido no n.º 3 do art.º 136.º do CCP, nos termos que decorrem do n.º 3 daquela Resolução (ponto 5 do probatório).
A justificação de tal redução de prazo encontra-se plasmada no próprio texto da mencionada Resolução, que foi também conduzida ao ponto 4 do probatório da sentença, e que reza, além do mais, o seguinte:
«Os estragos causados no Porto das Lajes das Flores devido à passagem do Furacão Lorenzo pelo Arquipélago dos Açores, têm impossibilitado o regular abastecimento por via marítima às Ilhas das Flores e do Corvo.
Prevê-se que a conclusão das obras no porto das Lajes das Flores ocorra no prazo de 22 meses após a data da respetiva consignação, altura em que em passam a estar repostas todas as condições que permitem a atracagem dos navios de tráfego local, bem como o respetivo abrigo e pernoita em absolutas condições de segurança, conforme Edital n.º 030/2019 da Capitania do Porto de Santa Cruz das Flores, da Capitania do Porto de Santa Cruz das Flores.
Atualmente, apenas podem praticar o porto das Lajes das Flores navios até 90 metros de comprimento e com calado até 5 metros.
Em 1 de abril de 2020, o Fundo Regional de Apoio à Coesão e ao Desenvolvimento Económico procedeu à contratação da Prestação de serviços de transporte marítimo regular de mercadorias entre Faial - Corvo - Flores - Corvo – Faial, pelo período de 6 meses, prorrogável até ao prazo máximo de 18 meses a contar daquela data.
O prestador de serviços contratado veio agora manifestar a intenção de dar por findo o referido contrato de prestação de serviços em 1 de abril de 2021.
Com base neste facto, importa assegurar o serviço de transporte marítimo regular de mercadorias às Ilhas das Flores e Corvo, uma vez que tal serviço é de vital importância para a população daquelas ilhas, situação esta que obriga a que seja encurtado o prazo para a apresentação das propostas em 15 dias no procedimento concursal dirigido a esse efeito, garantindo assim que não haja uma interrupção do abastecimento de bens àquelas populações.»
A exposição plasmada na Resolução do Conselho do Governo Regional dá nota da dificuldade no abastecimento especialmente das Ilhas do Corvo e Flores, em atenção aos estragos provocados nas ilhas dos Açores, e principalmente, nos portos marítimos, pela intempérie que assolou a Região dos Açores em outubro de 2019, bem como em atenção à circunstância do contrato de prestação de serviços para o transporte marítimo de mercadorias estar prestes a findar em 01/04/2021.
Ademais, considerando a factualidade descrita nos pontos 1, 6, 7, 8, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16 e 17 do probatório coligido na sentença recorrida, é mister concluir que, não só o contrato de prestação de serviços de transporte marítimo de mercadorias que se encontrava em vigor até então estava muito próximo do seu terminus, como tal contrato de prestação de serviços não era cumprido escrupulosamente, tendo-se registado desde 2019 diversas interrupções no abastecimento de mercadorias essenciais à sobrevivência essencialmente à Ilha do Corvo, fruto das condições climatéricas e de navegabilidade no mar das Ilhas dos Açores, na dificuldade de acesso a determinados portos marítimos, e das condições de navegação e características dos barcos que asseguravam a referida prestação de serviços de transporte marítimo de mercadorias.
Ora, todo o circunstancialismo considerado, e de resto conduzido ao probatório da sentença agora em discussão, faz cair por terra toda a argumentação esgrimida pelas Recorrentes em prol da ilegalidade da redução do prazo para a apresentação das propostas.
Com efeito, não resta qualquer dúvida de que o abastecimento de mercadorias e bens essenciais, especialmente à Ilha do Corvo, vem sofrendo, desde 2019, graves perturbações e interrupções, que se devem, por um lado, às difíceis condições de navegação sempre que o estado meteorológico sofre agravamento, às dificuldades de navegação no porto marítimo da Ilha do Corvo, e às inadequadas características dos navios e embarcações usadas na execução do contrato de prestação de serviços de transporte marítimo de mercadorias.
Por estas razões, a que acresce a proximidade do termo do contrato de prestação de serviços então em vigor, é nosso entendimento que, não só se encontra justificada a redução do prazo para a apresentação das propostas no procedimento concursal, como também a justificação plasmada na Resolução n.º 27/2021 do Conselho do Governo Regional se apresenta adequada e suficiente.
Por conseguinte, não ocorre, no procedimento concursal em causa, violação do preceituado nos n.ºs 1 e 3 do art.º 136.º do CCP, improcedendo, nesta parte, o ataque das Recorrentes.

ii. Quanto à definição das especificações técnicas constantes do Caderno de Encargos
As Recorrentes, nas conclusões DDD a QQQ e UUU a XXX, ZZZ e AAAA do seu recurso, vêm sustentar a ilegalidade das especificações constantes dos art.ºs 3.º e 4.º do CE, por entenderem que as mesmas são violadoras do art.ºs 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP.
Clamam as Recorrentes, em primeiro lugar, que o CE é totalmente omisso quanto à indicação ou identificação «do tipo e/ou classe de navio que seria idóneo e apto ao serviço de transporte de mercadorias» (conclusão DDD), o que não pode suceder, pois essa seria a principal característica a definir, até por razões de lealdade e transparência com os concorrentes, uma vez que, estando em causa a prestação de um serviço de transporte de mercadorias, será naturalmente lógico concluir que o tipo de navio adequado à execução dessa tarefa é um navio cargueiro e não, por exemplo, um rebocador.
Em segundo lugar, argúem as Recorrentes que a estipulação de duas específicas características do navio que deve realizar a prestação de serviços concursada apresentam-se desnecessárias e irrazoáveis, por não serem necessárias nem imprescindíveis à realização do objeto do contrato. Referem-se as Recorrentes às exigências de que o navio possuísse um impulsor de proa com potência mínima de 350 kW, bem como que o navio possuísse idade igual ou inferior a 20 anos (conclusão NNN).
Argumentam as Recorrentes que, não obstante a discricionariedade detida pela entidade adjudicante no que respeita à modelação das especificações técnicas, as mesmas devem encontrar justificação e serem plausíveis face ao objeto do contrato, o que não sucede no caso versado.
Mas, adianta-se já, não têm razão as Recorrentes.
Realmente, compulsados os autos, todo o acervo documental que aqui se encontra junto e, principalmente, os pontos 7, 12, 13, 14, 18 e 19 do probatório coligido, facilmente se apreende a motivação da entidade adjudicante no que respeita à concreta definição das especificações técnicas exigidas no CE para o navio que deverá executar a prestação de serviços de transporte de mercadorias entre as ilhas do Faial, Flores e Corvo.
E as razões que explicam a omissão deliberada da indicação do tipo ou classe de navio são as mesmas que explicam as exigências referentes ao cumprimento máximo do navio, à dimensão máxima da boca e do calado, à potência mínima do impulsor de proa, à exigência de defensas, etc. Tais exigências prendem-se, em primeiro lugar, com as condições de navegação no mar dos Açores- o Atlântico-, tendo em conta a ondulação média, a corrente e a agravação destas condições em caso de más condições meteorológicas; em segundo lugar, com as características do porto marítimo da Ilha do Corvo, dado que o porto da Ilha das Flores ainda não tem as obras concluídas; e, em terceiro lugar, com as características que os navios que procederão ao abastecimento dessas ilhas deverão possuir por forma a serem capazes de navegar em condições meteorológicas adversas- e que são frequentes na região, especialmente, durante o Inverno-, bem como serem capazes de entrar no porto marítimo da ilha do Corvo, que é de acesso bastante difícil.
Convoca-se, a este propósito, e para melhor ilustração das “especiais” condições em que decorrerá o transporte de mercadorias, bem como a dificuldade do mesmo, o teor do documento n.º 26 a que alude o ponto 19 do probatório, que foi junto com a contestação do Recorrido Fundo, e que foi elaborado por este Recorrido em preparação do procedimento concursal agora em discussão:
« MEMORANDO
BARCOS ADEQUADOS A ABASTECEREM O CORVO
Para utilização futura, elaborei este memorando com base nas informações prestadas pelo Comandante O…………….., técnico superior da Direção Regional dos Transportes, cujo conteúdo entendo que deverá ser consultado pelo Conselho Diretivo deste Fundo, sempre que esteja em causa o abastecimento do Corvo, especialmente num contexto em que o Porto das Lages das Flores ainda não estiver completamente operacional.

Transcrevo abaixo a informação prestada: "Caro Dr. M……………..,
No seguimento da nossa conversa telefónica, venho alertar para o facto de em início de janeiro, quando inicialmente me abordou a propósito dos problemas de abastecimento de combustível ao Corvo, e depois de vários emails trocados, ter-lhe enviado um quadro comparativo de vantagens e desvantagens de várias tipologias de navios naquela ilha.
Transmito-lhe assim, a minha opinião, meramente técnica, sem prejuízo de outros e melhores entendimentos sobre o transporte de mercadorias e combustíveis para a ilha do Corvo.
Existem 3 variáveis que determinam o sucesso da entrada, estadia e saída de um navio num porto: a capacidade operacional do porto; a capacidade operacional do navio e as condições meteorológicas. Afetada uma destas variáveis, todas as restantes terão de ser revistas e adequadas para que o transporte marítimo decorra sem prejuízo para o ambiente, mercadoria e salvaguarda da vida humana.
Após o furacão Lorenzo, a capacidade operacional do Porto das Lajes das Flores ficou seriamente danificada/limitada. Este porto perdeu, inclusive, a capacidade de abrigar (tal como o fazia antes) navios de comércio no seu interior em dias com condições meteorológicas adversas. Daqui têm resultado inúmeros constrangimentos ao abastecimento às ilhas das Flores e do Corvo (considerando que a ilha do Corvo era abastecida a partir da ilha das Flores).
Convém referir que os navios só procuram abrigo ao mau tempo num porto, quando não possuem capacidade operacional para aguentar o mar que se faz sentir. Ora, como bem sabe, os armadores de tráfego local que operam embarcações de comércio na RAA, e que regularmente escalavam/abasteciam as ilhas do Grupo Ocidental, têm cancelado inúmeras vezes as suas viagens devido à capacidade operacional dos seus navios nas ilhas daqueles portos com condições meteorológicas adversas.
Tal como acima referido, foi seriamente afetada a capacidade operacional do porto das Lajes das Flores, pelo que terão de ser revistas as outras 2 variáveis: capacidade operacional do navio e condições meteorológicas. Como, infelizmente, ainda não conseguimos controlar/manipular a meteorologia, e a ilha do Corvo não pode ficar sem abastecimento, julgo ser importante e imprescindível encontrar-se um navio que consiga navegar e operar na ilha do Corvo com condições meteorológicas adversas e com as atuais limitações do porto das Lajes das Flores.
Logicamente, não existem no mercado navios construídos à "medida" dos portos do grupo Ocidental, considerando todas as limitações existentes de calado, bacia de manobra, comprimento de cais, etc.. Não obstante, se atendermos aos abastecimentos excecionais e urgentes que têm socorrido às ilhas das Flores e Corvo sempre que há rutura de bens essenciais, verificamos que têm sido (invariavelmente) utilizados rebocadores.
Os rebocadores possuem excelente estabilidade, devido à baixa altura metacêntrica (GM) e elevado momento de estabilidade (ME), o que lhes confere maior capacidade de navegação, em condições meteorológicas adversas, comparativamente às tradicionais embarcações de transporte de mercadoria.
À semelhança dos rebocadores, existem outros tipos de navios (ex. multipurpose vessel), com excelente estabilidade e que conseguem operar em condições meteorológicas onde os tradicionais navios de mercadorias não operam.
Assim, e salvo melhor opinião, julgo que enquanto se mantiverem as atuais limitações ao porto das Lajes das Flores, e este não poder dar resguardo a navios sempre que as condições meteorológicas sejam adversas, a melhor possibilidade para abastecer a ilha do Corvo, será a utilização de um navio com enorme estabilidade e manobrabilidade, à semelhança dos rebocadores (ex. multipurpose vessel, supply vessel, etc.) que como bem sabe têm sido utilizados sempre que os tradicionais navios de mercadorias cancelam as suas viagens devido ao mar grosso/alteroso àquelas ilhas.
Ressalvo, contudo, que a utilização desta tipologia de embarcação, se ainda não estiver convenientemente registada para o transporte de mercadoria, deverá ser solicitada junto da DGRM mediante o cumprimento de determinadas condições e certificações. Assim, parece-me que o Fundo Regional poderá considerar a utilização deste tipo de embarcação se o armador garantir a necessária certificação/autorização da DGRM."
Ponta Delgada, 10 de janeiro de 2021
«Texto no original»
Marco P...... …………..» (sublinhados nossos)
O exame do documento transcrito permite percecionar facilmente as dificuldades de navegação e operação de um navio que navegue na Região Autónoma dos Açores e que proceda ao abastecimento de mercadorias à Ilha do Corvo, atentas as conhecidas dificuldades de operação no seu porto marítimo, para mais agravadas em situações climatéricas adversas.
Assim, a modelação das características que desembocou na plasmação das especificações técnicas no CE para o navio destinado a executar o serviço de transporte de mercadorias deveu-se, efetivamente, à consideração das dificuldades patenteadas no documento n.º 26, relativas à navegação no Atlântico, às condições do porto marítimo da Ilha do Corvo e às características mais adequadas das embarcações para realizar o abastecimento de mercadorias, ponderando, até, a experiência decorrente da realidade vivenciada.
O que vem de se expender permite fundar uma convicção séria de que as características que foram conduzidas às especificações técnicas constantes do art.º 4.º, n.º 1 do CE resultaram de uma ponderação orientada exclusivamente pelo interesse público, ponderação essa que visou encontrar a solução técnica mais adequada a assegurar a regularidade e estabilidade do abastecimento de mercadorias às ilhas do Faial, Flores e, principalmente, Corvo.
Nesse sentido, e ante a experiência resultante da execução do contrato anterior de prestação de serviços de transporte de mercadorias, mormente, as dificuldades de abastecimento à Ilha do Corvo, entendeu a entidade adjudicante que o navio mais adequado a realizar tal transporte seria aquele que oferecesse mais garantias de lograr efetuar o transporte de mercadorias, independentemente das condições climatéricas e da dificuldade de acesso e operação no porto marítimo da Ilha do Corvo. E, tal navio seria, assim, o que possuísse condições de manobrabilidade e estabilidade suficientes para conseguir efetuar navegação no Atlântico e o abastecimento à Ilha do Corvo, não obstante as condições climatéricas desfavoráveis.
Foi, sem dúvida, esta ordem de considerações que presidiu à estipulação das concretas especificações técnicas do CE, especialmente, no que se refere ao cumprimento, boca e calado do navio, idade do navio e potência mínima do impulsor de proa, pois que tais características permitem, naturalmente, uma maior manobrabilidade e estabilidade do navio.
E o mesmo sucede com a omissão do tipo ou classe do navio requerido pelo CE, que, como é bom de ver, foi deliberada, uma vez que as específicas condições do transporte de mercadorias apontavam para a necessidade de exigir um navio com uma versatilidade maior do que aquele que normalmente existe num típico navio de mercadorias, num cargueiro.
Sendo assim, em face do objeto do contrato concursado, é de concluir pela razoabilidade e ajustamento das especificações técnicas consagradas no CE, não se descortinando que as mesmas erijam algum tipo de obstáculos injustificados à concorrência, como proíbe o n.º 4 do art.º 49.º do CCP.
Adicionalmente, cumpre esclarecer que o modo como são descritas as especificações técnicas no CE do concurso agora em discussão subsume-se na al. a) do n.º 7 do art.º 49.º do CCP, o que quer significar que não ocorre a imputada violação dos n.ºs 10, 11 e 12 do mesmo preceito, até porque aqueles normativos versam sobre situações diversas.
Desta feita, ante todo o expendido, é forçoso concluir que não se verifica qualquer ilegalidade no que concerne às especificações técnicas constantes do art.º 4.º do CE.
E, por isso, o recurso das Recorrentes fracassa nesta parte.

iii. Quanto à exclusão da proposta das Recorrentes
Resulta das conclusões YYY e BBBB a JJJJ do recurso das Recorrentes que as mesmas discordam da sua exclusão do procedimento concursal agora em análise, em suma, porque entendem que o DEUCP não é um documento obrigatório, porque apresentaram o Anexo I ao concurso e porque quaisquer erros e omissões nesses documentos que integram a proposta não devem conduzir à imediata exclusão da proposta.
Mas, uma vez mais, não assiste qualquer razão às Recorrentes.
É que, independentemente das questões relativas à falta de representação quanto à apresentação do DEUCP, a verdade é que a proposta das Recorrentes foi excluída por não respeitar diversas especificações técnicas exigidas no art.º 4.º, n.º 1 do CE, bem como por não apresentar outros elementos documentais, como bem patenteado ficou nos Relatórios Preliminar e Final.
Veja-se, a este propósito, o exarado no Relatório Preliminar, que integra o ponto 31 do probatório reunido na sentença recorrida, e que consta de fls. 400 a 424 do processo instrutor:
«(…)
- O concorrente apresenta-se em agrupamento, o qual é constituído por Sandra Paula Faria Pacheco Carvalho e S......................................Agency, de acordo com a declaração apresentada em conformidade com o modelo constante do anexo I ao programa do concurso e nos termos da declaração de agrupamento e do instrumento de mandato, ambos documentos que acompanham a proposta apresentada e nos quais se refere que S ……………….. é a chefe do agrupamento. Todavia, a DEUCP é apresentada em nome da S...................... ………….Agency, nela se declarando que esta é a entidade chefe do agrupamento. Conforme exigido no próprio formulário da DEUCP, quando o concorrente se apresente em agrupamento é necessário o preenchimento de uma DEUCP por cada membro do agrupamento, facto que não sucedeu e determina a exclusão do concorrente nos termos da alínea d) do n.9 2 do artigo 146.9 do CCP;
- Na declaração elaborada de acordo com o modelo constante do Anexo I ao programa do concurso:
a) Na parte A, relativa à identificação do navio, não foi fornecida informação sobre o proprietário/armador/operador e o ano de construção indicado é 1982, pelo que é ultrapassada a idade máxima do navio de 20 anos estabelecida para cumprimento obrigatório na alínea h) do n.9 1 do artigo 4.9 do caderno de encargos, o que determina a exclusão nos termos da alínea b) do n.9 2 do artigo 70.9 do CCP;
b) Na parte B, relativa às características principais do navio, não foi fornecida qualquer informação sobre o pontal de construção e número de passageiros, o que determina a exclusão nos termos da alínea a) do n.9 2 do artigo 70.9 do CCP;
c) Na parte C, relativa às características dos equipamentos principais, é referido um impulsor de proa elétrico 2 Screws 1 Thruster 150 kW, fazendo com que não seja cumprida a potência mínima de 350 kW fixada na alínea g) do n.9 1 do artigo 4.9 do caderno de encargos, determinando a exclusão nos termos da alínea b) do n.9 2 do artigo 70.9 do CCP;
d) O concorrente apresentou um preço contratual de € 2.652.163,00, o qual é inferior ao preço base fixado no artigo 5.9 do caderno de encargos.
- A proposta não foi instruída com os planos de segurança e dos meios de combate a incêndios, o plano de capacidade de carga, o plano de calados e o plano de capacidade de grua, conforme exigido pelas subalíneas ii), iii), iv) e v) da alínea c) do n.9 1 da cláusula 6.9 do programa de concurso, o que determina a exclusão da proposta nos termos da alínea d) do n.9 2 do artigo 146.9 do CCP.
Considerando a causa de exclusão da proposta, o Júri não procedeu à sua análise para efeitos de avaliação.»
E no Relatório Final, a que se refere o ponto 33 do probatório, e que consta de fls. 391 a 398 do processo instrutor:
«(…)
Em análise à pronúncia do concorrente n.º 3 o Júri considera o seguinte:
- No que concerne à exposição vertida nos pontos III a X da sua pronúncia, entende o Júri que a apresentação da DEUCP em procedimentos pré-contratuais com publicidade no JOUE, como é o caso, não constitui uma alternativa de decisão discricionária pelas entidades adjudicantes, mas antes uma obrigação que resulta diretamente do Regulamento de Execução (UE) 2016/7 da Comissão, de 5 de janeiro de 2016, a qual se encontra plasmada no n.º 6 do artigo 57.º do CCP. De igual modo, a exigência de apresentação de uma DEUCP por cada membro de agrupamento que se apresente a um procedimento não teve origem em qualquer decisão arbitrária do Júri, sendo antes exigência do Regulamento já referido, exigência que, aliás, consta do próprio formulário apresentado pelo concorrente, embora tenha sido por este desconsiderada. Não procedem, por isso, os argumentos apresentados nos pontos III a X da sua pronúncia;
- No que concerne à idade do navio, o Júri desconsidera quaisquer alegações acerca de eventuais reconstruções ou reparações que o navio apresentado pelo concorrente n.® 3 possa ter sofrido, porquanto se revelam irrelevantes para aferição do cumprimento do requisito de cumprimento obrigatório previsto na alínea h) do n.º 1 do artigo 4.º do caderno de encargos. Com efeito, aquele requisito apenas prevê a idade do navio, devendo a mesma ser igual ou inferior a 20 anos, não fazendo qualquer menção ao conceito de idade por associação a intervenções que possam ter ocorrido. Não procede, por isso, o argumento apresentado no ponto XII da sua pronúncia;
- O Júri dá por aceite o argumento apresentado pelo concorrente no ponto XIII da sua pronúncia no que se refere à verificação das características do navio não indicadas no anexo I da sua proposta, concretamente e apenas quanto ao "pontal de construção", mas constantes do ficheiro "SPEC GA AQUASENIOR";
- Não colhe o argumento de não apresentação do número de passageiros no anexo I da sua proposta, porquanto esse elemento era exigido e, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 57.º do CCP, os documentos exigidos pelo programa do procedimento que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule são de verificação obrigatória, razão pela qual a sua não apresentação constitui motivo de exclusão. Não procede, por isso, o argumento apresentado no ponto XIV da sua pronúncia;
- No que diz respeito às alegações constantes dos pontos XV e XVI, o Júri desconsidera quaisquer juízos de valor quanto aos pressupostos da decisão de contratar, em concreto, quanto à justificação técnica para o requisito de cumprimento obrigatório relativo à potência mínima do impulsor de proa. Com efeito, encontrando-se tal requisito plasmado no caderno de encargos, a proposta que não o cumpra, como é o caso da apresentada pelo concorrente, deve ser excluída. Não colhe, por isso, o argumento apresentado pelo concorrente nos pontos XV e XVI da sua pronúncia;
- Em resposta ao ponto XVII da sua pronúncia, o Júri reitera, tal como já explicado em resposta à pronúncia do concorrente n.º 1, que a referência feita em relatório preliminar ao preço apresentado pelo concorrente não constituiu motivo de exclusão, mas apenas uma verificação das condições e atributos apresentados na sua proposta. No caso concreto, o preço apresentado é inferior ao preço base fixado pelo caderno de encargos.
- Quanto ao ponto XVIII da pronúncia deste concorrente n.º 3, afirmando que o "Plano de Capacidade de Carga - consta do anexo sob o título INT LOAD LINE.pdf", o Júri salienta que se trata do Certificado Internacional das Linhas de Carga, que certifica que o navio cumpre com a Convenção Internacional das Linhas de Carga, não contendo o mesmo qualquer informação sobre a capacidade de carga do navio, razão pela qual o Júri reitera que a proposta deste concorrente não se encontra instruída com o exigido na subalínea iii) da alínea c) do n.º 1 da cláusula 6.2 do programa de concurso;
- Identicamente, no mesmo ponto XVIII da pronúncia o concorrente refere que 0 "Plano de Calados - consta do anexo sob o título SPEC GA AQUASENIOR.pdf', contudo, o Júri apura que o documento "SPEC GA AQUASENIOR.pdf" somente expõe o calado de verão, não existindo qualquer informação sobre as restantes condições de calados, pelo que o Júri repete que a proposta do concorrente n.º 3 não se encontra instruída com o exigido na subalínea iv) da alínea c) do n.º 1 da cláusula 6.ª do programa de concurso;
- O Júri contesta, ainda, a afirmação do concorrente n.º 3, no mesmo ponto XVIII da pronúncia, quando o mesmo alude que o "Plano de Capacidade de Grua - consta do anexo sob o título CRANE.pdf", tendo em conta que o certificado CRANE certifica a grua para a carga útil máxima admissível (SWL), não contendo qualquer informação sobre o intervalo de capacidade de carga versus braço (capacidade de grua) e, deste modo, uma vez mais o Júri menciona que a proposta do concorrente n.e 3 não se encontra instruída com o exigido na subalínea v) da alínea c) do n.2 1 da cláusula 6.3 do programa de concurso;
- Por último, em resposta à parte final da pronúncia do concorrente n.º 3, no mesmo ponto XVIII, o Júri comprova que a proposta não foi instruída com o Plano de Segurança nem com o Plano de Meios de Combate a Incêndios, conforme exigido na subalínea ii) da alínea c) do n.º 1 da cláusula 6.3 do programa de concurso;
Face ao exposto, o Júri mantém a decisão de exclusão do concorrente n.º 3 com os seguintes fundamentos:
· Não apresentação do DEUCP por todos os membros do agrupamento, determinando a exclusão do concorrente nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 146.º do CCP;
· O ano de construção do navio apresentado viola a condição de cumprimento obrigatório prevista na alínea h) do n.º 1 do artigo 4.º do caderno de encargos, o que determina a exclusão nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP;
· Na declaração elaborada de acordo com o modelo constante do Anexo I ao programa do concurso não foi fornecida informação sobre o proprietário/armador/operador e sobre o número de passageiros, o que determina a exclusão nos termos da alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP;
· O impulsor de proa apresentado não cumpre com a potência mínima fixada na alínea g) do n.º 1 do artigo 4.º do caderno de encargos, determinando a exclusão nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 70.º do CCP;
· A proposta não foi instruída com os planos de segurança e dos meios de combate a incêndios, o plano de capacidade de carga, o plano de calados e o plano de capacidade de grua, conforme exigido pelas subalíneas ii), iii), iv) e v) da alínea c) do n.º 1 da cláusula 6.ª do programa de concurso, o que determina a exclusão da proposta nos termos da alínea d) do n.º 2 do artigo 146.º do CCP.» (sublinhados nossos)
Quer tudo isto significar que, para além das problemáticas relativas ao DEUCP, a proposta das Recorrentes foi excluída por não cumprir as especificações técnicas fixadas nas al.s g) e h) do n.º 1 do art.º 4.º do CE, o que redunda na violação de termos ou condições estabelecidos no CE, por estarem em causa aspetos não submetidos à concorrência, em conformidade com o prescrito no art.º 70.º, n.º 2, al. b) do CCP.
Ademais, a proposta das Recorrentes não contém um dos termos ou condição (sobre o proprietário/armador/operador e sobre o número de passageiros), o que conduz à respetiva exclusão fundada no disposto no art.º 70.º, n.º 2, al. a) do CCP.
E, finalmente, verifica-se que a proposta das Recorrentes não apresentava os documentos exigidos na cláusula 6.ª, n.º 1, al. c), ii), iii), iv) e v) do PC, o que determina a sua exclusão, em consonância com o disposto nos art.ºs 57.º, n.º 1, al. c) e 146.º, n.º 2, al. d) do CCP.
Sendo assim, a impetração das Recorrentes, porque dirigida à causa de exclusão referente ao DEUCP, apresenta-se meramente venial, não tendo nunca por efeito reverter a decisão de exclusão da proposta das Recorrentes, dado que esta exclusão fundamentou-se em diversas causas para além da questão do DEUCP.
Seja como for, mantém-se, de qualquer modo, o decidido pelo Tribunal a quo no que concerne à irregularidade do DEUCP, considerando os termos acertados de tal julgamento:
«(…)
Assim, e com apelo ao supra expendido, é de concluir também que a proposta das AA. foi excluída, e bem excluída já que ao R. nada mais lhe restava que não excluir a proposta das ora AA.(cfr. artº. 146º/2/d)/CCP), face à improcedência da arguida ilegalidade das peças e regras concursais, afastando a arguida nulidade ou anulabilidade do acto de exclusão das ora AA., aditado do facto que as AA. também não cumpriram com outras regras em sede do procedimento concursal. E, a propósito, vêem as AA. arguir o vício violação de lei traduzido na violação do disposto no artº. 57º/1/b)/c)/5/6/CCP, preceito legal que se reporta aos documentos atinentes à “proposta”, e que prevê e estatui que:
“Artigo 57.º
Documentos da proposta
1 - A proposta é constituída pelos seguintes documentos:
b) Documentos que, em função do objeto do contrato a celebrar e dos aspetos da sua execução submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, contenham os atributos da proposta, de acordo com os quais o concorrente se dispõe a contratar;
c) Documentos exigidos pelo programa do procedimento ou convite que contenham os termos ou condições relativos a aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo caderno de encargos, aos quais a entidade adjudicante pretende que o concorrente se vincule;”
“…”
“5 - Quando a proposta seja apresentada por um agrupamento concorrente, os documentos referidos no n.º 1 devem ser assinados pelo representante comum dos membros que o integram, caso em que devem ser juntos à proposta os instrumentos de mandato emitidos por cada um dos seus membros ou, não existindo representante comum, devem ser assinados por todos os seus membros ou respetivos representantes.
6 - Nos procedimentos com publicação de anúncio no Jornal Oficial da União Europeia, é apresentado, em substituição da declaração do anexo I do presente Código, o Documento Europeu Único de Contratação Pública.”
Face aos factos provados as AA. apresentaram o DEUCP – Documento Europeu Único de Contratação Pública, e por isso, o que as AA. fizeram foi usar da prerrogativa estabelecida no artº.57º/6/CCP, o que afasta a aplicação do artº.57º/5/CCP, pois aquele nº.6 refere a expressa “substituição” pelo DEUCP, a questão reporta-se, então, ao conteúdo do DEUCP apresentado pelas AA., e face aos factos provados o que se apura é que naquele documento as AA. indicam a S……………. Agency como chefe de grupo, o que se mostra em desconformidade com o declarado no instrumento de mandato, no qual a A. S ……………………., é indicada como representante comum, e de que no DEUCP apresentado está expressamente mencionada a indicação de que, em caso de participação conjuntamente com outros operadores é obrigatório que os outros operadores preencham um “formulário distinto”, ao que não foi dado o devido cumprimento pelas ora AA., ou seja, é verdade a possibilidade da apresentação do DEUCP mas também é verdade que as AA. não dotaram aquele documento de conteúdo válido, o que equivale à falta de válida declaração pelas AA. quanto ao facto de possuírem uma situação financeira e capacidades para participar no procedimento concursal, no que se traduz e é a finalidade do DEUCP. E, mais uma vez, são as AA. que se colocam em situação de facto de incumprimento quer das regras concursais, quer das regras legais aplicáveis.
Donde que, improcede a arguida violação do artº.57º/1/b)/c)/5/6/CCP, por não terem as AA. logrado provar factos que validamente alicercem aquele vício de violação de lei, já que:
1º - Os documentos que instroem e integram a proposta apresentada pelas AA. não contêm os atributos exigidos pelas regras concursais (cfr. supra expendido);
2º - Bem como não cumpre as exigências decorrentes do programa de procedimento (cfr. supra expendido);
3º - Não apresentou DEUCP que validamente vincule o agrupamento concorrente no procedimento concursal em causa nos autos.»
Em derradeiro lugar, cumpre deixar uma nota, referente ao invocado na conclusão YYY do recurso, e que se relaciona com a pretensão das Recorrentes entenderem que a sua proposta não deveria ser excluída sem antes lhes ser facultada a possibilidade de demonstrarem que o seu navio corresponde ao desempenho exigido ou cumpre os requisitos funcionais da entidade adjudicante, em harmonia com o prescrito no art.º 49.º, n.º 12 do CCP.
Realmente, para que as Recorrentes pudessem beneficiar da mencionada faculdade, impunha-se, antes do mais, que demonstrassem a ocorrência da situação descrita no n.º 11 do mesmo art.º 49.º, visto que, como se explicitou anteriormente, o Recorrido Fundo optou, quanto à formulação das especificações técnicas, pela modalidade estabelecida na al. a) do n.º 7 do dito art.º 49.º. Todavia, como deriva manifestamente dos autos, nunca as Recorrentes invocaram qualquer instrumento de certificação ou normalização que parificasse as características do navio constante da sua proposta com as especificações técnicas elencadas no CE, e muito menos que demonstrasse que o navio a que se refere a sua proposta alcançaria um desempenho similar ou equivalente ao que é requerido nas especificações técnicas.
Quer isto dizer, portanto, que a decisão de exclusão da proposta das Recorrentes não viola o disposto nos ar.ºs 49.º, n.ºs 4, 10, 11 e 12 do CCP, como pretendem as Recorrentes, e muito menos afronta o art.º 57.º, n.º 1, 5 e 6, também do CCP.

Por estas razões, improcede o recurso das Recorrentes também nesta parte.


iv) Quanto à violação, pela proposta vencedora, das especificações técnicas constantes do Caderno de Encargos
As Recorrentes vêm, ainda, impetrar a sentença recorrida no que concerne ao julgamento da questão relativa ao invocado incumprimento, por parte da proposta da Recorrida M..................., das especificações técnicas descritas nas al.s d) e k) do n.º 1 do art.º 4.º do CE. Dedicam a tal impetração as conclusões RRR a TTT e KKKK a RRRR.
Defendem as Recorrentes, em suma, que só se poderia concluir que a proposta da Recorrida M................... observa as sobreditas especificações técnicas se, para tanto, tivesse sido produzida a prova requerida pelas Recorrentes. Não tendo sido produzida a dita prova, o Tribunal a quo não poderia ter entendido estarem cumpridas aquelas especificações técnicas, uma vez que a matéria de facto dada como provada não contém qualquer menção às características em discussão.
Vejamos se assiste razão às Recorrentes.
Ora, como já se explicitou antecedentemente, as Recorrentes lavram numa certa confusão no que se refere à questão da prova que é necessária para decisão da questão atinente ao cumprimento ou incumprimento dos requisitos elencados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE por parte da proposta da Recorrida M....................
É que não é necessário conduzir ao probatório factos negativos para que daí se possa tirar a ilação de incumprimento ou fixar factos positivos para que daí se possa concluir pelo cumprimento de uma exigência. Isto é- e como já se disse-, a sentença não tinha de elencar na factualidade provada que o navio constante da proposta da Recorrida M................... era detentor de espaço coberto para transporte de paletes, que tinha capacidade para transportar pelos menos 6 contentores de 20 pés ou que possui grua com determinada capacidade mínima, para daí poder concluir que o dito navio preenche os requisitos elencados no art.º 4.º, n.º 1, al.s d) e k) do CE.
Como deriva satisfatoriamente da sentença recorrida, a decisão de improcedência da questão do referido incumprimento dos requisitos elencados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE baseia-se na matéria de facto constante da mesma sentença, concretamente, pontos 20, 21, 22, 23, 24, 25, 27, 31 e 33 do probatório, sendo certo que os pontos 25, 27, 31 e 33 remetem para o teor integral de documentos que integram o processo instrutor apenso aos autos.
Sendo assim, é inevitável assumir que a conclusão do Tribunal recorrido, relativamente à satisfação, por parte do navio descrito na proposta da Recorrida M..................., das duas especificações técnicas constantes das al.s d) e k) do n.º 1 do art.º 4.º do CE, estriba-se, precisamente, no conteúdo da proposta apresentada pela Recorrida M..................., constante de fls. 96 a 279 do processo instrutor, especialmente, da confrontação com o teor de fls. 97 a 99, 103, 172 a 185 e 261 a 263, que contêm desenhos e descrições no que tange à capacidade de carga do dito navio e características da grua, por aí se encontrarem descritas as características do navio quanto a esses aspetos.
Ademais, os documentos de certificação emitidos pela entidade certificadora adequada, juntos com a proposta da Recorrida M..................., bem como para celebração do contrato concursado, são ilustrativos e descritivos das características do navio constante da proposta da mencionada Recorrida, e permitem fundar a convicção positiva relativamente à verificação dos requisitos enunciados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE.
Por conseguinte, este Tribunal não sente hesitação em considerar, quanto à proposta da Recorrida M..................., verificados os requisitos elencados no art.º 4.º, n.º 1, al.s d) e k) do CE.
E, ainda que, porventura, aquele navio não detivesse todos os requisitos a que aludem as especificações técnicas no momento em que a Recorrida apresentou a proposta- e não tinha, na verdade, de ter-, tal não constitui motivo de exclusão, pois o que releva é que no momento da celebração do contrato e início da execução do mesmo a Recorrida disponha do navio em causa apetrechado com todas as características que inseriu na proposta apresentada.
Aliás, esta situação não deixa de ser similar a outras em que está em causa, por exemplo, a celebração de um contrato para aquisição de veículos adaptados nas suas características, pois que, como se sabe, as concorrentes não dispõem, no momento da apresentação das suas propostas, dos veículos alterados que se propõem fornecer. Na verdade, o que releva é que, no momento do início da execução do contrato, os bens necessários sejam disponibilizados pelo concorrente adjudicatário nos precisos termos que constam da proposta que apresentou no procedimento concursal.
E o que vem de dizer-se faz claudicar a alegação das Recorrentes, de que a proposta da Recorrida M................... deveria ter sido excluída por conter “falsas declarações”, precisamente porque o navio em causa não era detentor dos requisitos descritos nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE, especificamente, o espaço coberto para transporte de paletes, a capacidade de carga e a grua conforme declarada.
Contudo, como já se explicou em momento anterior, não só as Recorrentes nunca impugnaram processualmente a prova documental em causa- contrariamente ao que afirmam-, como é de mediana razoabilidade perceber que as características físicas do navio a que se refere a proposta da Recorrida M................... devem estar verificadas no momento da celebração e início de execução do contrato, como, de resto, deriva do disposto no art.º 3.º, n.º 1 do CE.
E, seja como for, os documentos de certificação emitidos pela entidade certificadora adequada, juntos com a proposta da Recorrida M..................., bem como para celebração do contrato concursado, são ilustrativos e descritivos das características do navio constante da proposta da mencionada Recorrida, e permitem fundar a convicção positiva relativamente à verificação dos requisitos enunciados nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE.
As Recorrentes invocam, derradeiramente, que a decisão de adjudicação não se encontra fundamentada, quer ao abrigo do preceituado nos art.ºs 123.º e 124.º do CCP, quer ao abrigo do previsto nos art.ºs 152.º e 153.º do CPA.
Ora, cumpre esclarecer, em primeiro lugar, que os normativos insertos nos art.ºs 123.º e 124.º do CCP não respeitam ao concurso público, mas sim à tramitação procedimental da consulta prévia e do ajusto direto, o que não é, manifestamente, o caso dos autos.
De todo o modo, a tramitação do concurso público possui normativos estipuladores de deveres procedimentais similares, como é o caso do estatuído nos art.ºs 147.º e 148.º do CCP, o que se tomará em conta no caso posto.
Nesta senda, e examinados os relatórios preliminar e final, verifica-se que, realmente, o relatório final, apesar de ponderar atentamente as considerações apresentadas pelas Recorrentes contra determinadas conclusões insertas no Relatório preliminar, emitindo pronúncia quanto às mesmas, já não responde às observações apresentadas pelas Recorrentes em sede de audiência prévia quanto a determinadas características do navio que consta da proposta da Recorrida M....................
Todavia, bem escrutinada a exposição relativa à audiência prévia citada, entendemos que, realmente, não se impunha ao Júri que rebatesse ou justificasse o que quer que seja no que se refere às características do navio referido na proposta da Recorrida M..................., visto que, não só as características do navio derivam claramente da proposta da dita Recorrida, como o alegado em sede de audiência prévia é, essencialmente, de natureza especulativa, valorativa e conclusiva, não exigindo, por isso, ponderação ou resposta.
O teor da audiência prévia, no que que respeita à questão do cumprimento dos requisitos descritos nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE é o seguinte:
«(…)
Quanto â proposta de adjudicação ao concorrente n.º 2
XIX. Afigura-se-nos que tal intenção só pode soçobrar, escrutinadas e examinadas minuciosamente as características da proposta, dado que:
i) O tipo de navio apresentado, tal com declarado pelo próprio concorrente é, insofismavelmente, um support ship/vessel (anexo I, A, ponto v, e página 17 do anexo intitulado DESENHOS_SIGNED.pdf e/ou um towing vessel (página 85 do anexo intitulado DESENHOS_SIGNED.pdf); e não um navio de transporte de mercadorias.
ii) Tal navio não está formatado e/ou construído para o transporte de mercadorias nem dispõe de tal vocação (por mais prodigiosa que seja a imaginação), tanto mais que não tem como transportar/acomodar, em espaço coberto (porão - nem possui) o exigido na alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do Caderno Encargos, o que também determina, fatalmente, a exclusão da proposta. Cf. igualmente o alegado tecnicamente no documento ora junto - TRITON SHIPPING AB - com efeito, não é minimamente seguro nem viável o transporte de contentores e paletes neste tipo de navio, para mais no agressivo e austero mar dos Açores.
iii) Desafia-se inclusivamente o júri a informar-se sobre o seguinte facto: Terá o T.... A..... alguma vez transportado 6 contentores de 20 pés e 15 paletes?
iv) Aliás, não espanta que o concorrente n.º 2 se tenha atrevido a concorrer com um tipo/classe de navio totalmente desapropriado ao transporte de mercadorias (dado que não é um cargo vessel) pois que o procedimento concursal, tão minucioso quanto a alguns detalhes, parece ter sido amnésico na identificação da característica principal da execução do contrato - o tipo de navio exigido em foce do objeto contratual [não é por ser apresentado um gato com aparentes características exógenas de lebre que o gatídeo ganha corpo e alma de lepus, como é bom de ver).
v) Acresce ainda que a proposta do concorrente n.º 2 falha rotundamente quanto ao consignado na alínea k) do n.º 1 do Caderno de Encargos - condição eliminatória - pois que a grua instalada no navio está a milhas de cumprir tal desiderato - a grua instalada no T.... A..... é l,14tn (cf. documento ora anexo) - próximo de 1 tonelada - muito afastada das exigíveis 10 toneladas.
vi) Realidade divorciada do declarado no anexo I, B, pontos xvii) e xviii) da proposta do concorrente n.º 2, pois que nem a capacidade da grua instalada no navio é a declarada, nem o modelo e a marca correspondem àquela (estamos, pois, objetivamente, perante falsas declarações suscetíveis de responsabilização criminal).
vii) Robustecendo tal asserção (divergência nítida e dolosa entre o declarado pelo concorrente n.º 2 e o existente no navio oferecido a concurso), vem a ser ainda a fotografia da grua constante das páginas 165 e 166 do anexo intitulado DESENHOS_SIGNED.pdf - tal grua não é a existente no navio (e contra tal facto nenhum argumento pode valer), o que configura uma situação de falsa declaração - ela mesmo legitimadora da exclusão da proposta, por si só.
Termos em que se requer ao Júri que seja promovida a anulação da proposta de adjudicação ao concorrente n.º 2, em face dos fundamentos ex ante expostos que determinam a sua exclusão, e por força das violações de lei retro assinaladas, e simultaneamente, por cumprimento dos requisitos exigíveis ao navio de carga, seja proposta a adjudicação ao aqui Reclamante (concorrente n.º 3), com todas as legais consequências.»
Ora, como já se expendeu supra, a questão da adequação de navios tipo rebocador, ou de função polivalente, para a execução da prestação dos serviços de transporte marítimo para as Ilhas em causa apresenta-se indiscutível, especialmente se se atender ao teor do documento n.º 26 junto com a contestação do Recorrido Fundo e ponderar as dificuldades de navegação e operação consideradas na execução do abastecimento de mercadorias à Ilha do Corvo.
No que respeita à capacidade de carga do navio constante da proposta da Recorrida M..................., as alegações produzidas pelas Recorrentes em audiência prévia constituem mera especulação, sem qualquer aporte factual ou documental.
E, finalmente, no que concerne à grua, a resposta assoma como mais simples ainda, visto que as Recorrentes confundem a grua a que se refere o plano de segurança, com a grua descrita a fls. 103 do processo administrativo, pois que ambas servem funcionalidades diversas.
Seja como for, o teor meramente conclusivo das alegações apresentadas em audiência prévia não reclama, a nosso ver, uma ponderação séria, nem, pela mesma razão, o rebate expresso no relatório final.
Por conseguinte, não se descortina que subsista falta de fundamentação do ato de adjudicação, por o mesmo não responder ao invocado conclusivamente e, por vezes, de modo especulativo, em sede de audiência prévia.
Na verdade, o que se constata é que o relatório final é verdadeiramente lapidar quanto à exclusão da proposta das Recorrentes, e absolutamente claro na seleção da proposta ganhadora.
Do que vem de dizer-se decorre, portanto, que não se verifica, por banda da proposta da Recorrida M..................., incumprimento das especificações técnicas inscritas nas al.s d) e k) do art.º 4.º, n.º 1 do CE, bem como não subsiste falta de fundamentação no ato adjudicatório.
Pelo que, o recurso das Recorrentes fracassa também neste aspeto.
*
Destarte, ponderando todo o expendido, é mister concluir que o despacho e a sentença recorridos apresentam-se corretos, não merecendo, por isso, a censura que lhes vem assacada. Consequentemente, impera negar-se provimento ao presente recurso jurisdicional.
*
Considerando o elevado valor da presente ação de contencioso pré-contratual, procede-se, nos termos previstos no art.º 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais, à dispensa do pagamento de 50% do remanescente da taxa de justiça devida neste recurso, por se entender proporcional à complexidade fáctico-jurídica envolvida no vertente litígio, que ainda é significativa, bem como atenta a extensão assinalável das peças recursivas.


VI. DECISÃO
Pelo exposto, acordam, em Conferência, os Juízes da Subsecção de Contratos Públicos deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
I. Não admitir a junção do documento requerida pelas Recorrentes e ordenar o respetivo desentranhamento;
II. Negar provimento ao recurso e confirmar o despacho e a sentença recorridos.


Custas pelo incidente relativo ao desentranhamento a cargo das Recorrentes, que se fixa em 1 UC.
Custas pelo recurso a cargo das Recorrentes, nos termos do disposto no art.º 527.º do CPC, com dispensa do pagamento de 50% do remanescente da taxa de justiça em dívida, devida neste recurso, em conformidade com o disposto no art.º 6.º, n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais.

Registe e Notifique.

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Lisboa, 9 de novembro de 2023,

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Paula Cristina Oliveira Lopes de Ferreirinha Loureiro- Relatora

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Jorge Pelicano

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Ana Cristina Lameira