Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:426/10.1BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:02/14/2019
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:DESPACHO DE REVERSÃO
VÍCIO DE INCOMPETÊNCIA
CONSEQUÊNCIAS
Sumário:1. O despacho de reversão proferido por órgão delegado, no quadro de delegação de competências não publicada em Diário de República, enferma do vício de incompetência, pelo que deve ser anulado.
2. O vício de incompetência do despacho de reversão determina a absolvição do oponente da instância executiva por falta de legitimidade processual e não a extinção da execução quanto ao oponente.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I- Relatório
A FAZENDA PÚBLICA interpõe o presente recurso jurisdicional contra a sentença proferida a fls. 199 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), que julgou procedente a oposição deduzida por J...., referente ao processo de execução fiscal (PEF) n.º 310720….., que o Serviço de Finanças de Lisboa – 8 instaurou inicialmente contra a sociedade «J…… Lda», e que contra si reverteu, na qualidade de responsável subsidiário, para cobrança coerciva da quantia de € 36 393,49 proveniente de IRS relativo ao ano de 2005.

Nas alegações de fls. 232 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), a recorrente, FAZENDA PÚBLICA, formula as conclusões seguintes:

«I – Pelo elenco de razões acima arroladas, ressalvado melhor entendimento, infere-se que a sentença proferida pelo Tribunal “ad quo” ao julgar procedente o pedido formulado pelo oponente, lavrou em erro na fixação dos factos e fez uma incorrecta interpretação da lei.

II – A questão a apreciar consiste em saber se o acto em crise, o acto de reversão foi validamente praticado e qual a sua base legal.

III – Salvo melhor entendimento e mais precisamente, a contenda reside em determinar se o despacho de reversão, acto objecto dos autos de oposição, enferma das ilegalidades formais e substanciais que lhe são imputáveis pelo oponente, verificado que está que tal acto de reversão, sub Júdice, foi praticado pelo coordenador da equipa PRESFED.

IV – Salvo melhor entendimento, a sentença labora em erro quando conclui que o mesmo foi praticado apenas e por via da delegação de competências subscrita pelo Chefe de Serviço de Finanças de Lisboa 8, sem observar que essa delegação apenas traduz a prática de um acto administrativo secundário.

V – Pois que, contrariamente e como melhor explanámos em sede de alegações, face ao decreto regulamentar n.º 42/83, lei habilitante, a prática do acto em causa enquadrando-se numa substituição do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 8, poderia validamente ser praticado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Faro, ali deslocado, nos termos do despacho do Senhor Director Geral dos Impostos datado de 2009/06/15 que o designou como coordenador da equipa criada para efeitos de PRESFED.

VI - Sendo o órgão da execução fiscal a quem compete dar ordens para praticar actos processuais, ordens internas dadas no âmbito do serviço em que corre o processo, consideram-se as mesmas dadas pela entidade que dirige o processo; essa função é acometida ao dirigente do serviço, regra geral, Chefe do Serviço de Finanças, órgão dotado para tal de competência própria e não delegada.

Aliás, conforme é, desde há muito, jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, a falta de menção do uso de delegação de poderes, degrada-se em formalidade não essencial (irrelevante) se não afectou nem prejudicou o direito ao respectivo recurso contencioso (v., entre outros, Ac. de 21.3. 85, rec. 17869, in Acórdãos Doutrinais 287, pág. 1176 e segs, Ac. de 23.10.97, rec. 38.607, Ac. de 24/04/2001, rec. 039895, Ac. de 30.1.2002, rec. 46135).

VII - Tendo o Director Geral dos Impostos no âmbito das suas competências e na qualidade de dirigente máximo do serviço [arts. 4.°, alínea a), 5.°, n.°s 1 e 3, do Decreto-Lei n.° 366/99, de 18 de Setembro, e 11.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 47/2005, de 24 de Fevereiro] nomeado em substituição do Chefe aí colocado um outro ainda que com eventual restrição de funções, através de despacho e por conveniência de serviço, agiu ao abrigo do regime legal.

VIII - Estando a substituição legalmente justificada [art. 97.º n.º 1, alínea i) e n.º 3 do mesmo artigo do Decreto Regulamentar n.º 42/83] e, feita essa substituição por uma pessoa com o mesmo cargo, qualquer despacho de delegação de competências promovido pelo Chefe de Serviço de Finanças que delegasse os seus poderes a outro chefe de repartição, seria inócua ou melhor, consubstanciaria a prática de um acto administrativo secundário, uma vez que estão em causa funções acometidas ao órgão da execução fiscal, competências próprias desse órgão e não a prática de poderes delegados.

IX - Concludentemente, como resulta do acima exposto e além do mais dos autos, a análise exaustiva dos documentos, levaria assim a uma decisão diferente da adoptada pelo Tribunal.

X - Atente-se por fim a que no processo de execução fiscal que corre contra o oponente e que foi instaurado no SF (Serviço de Finanças), consta o despacho de reversão que na sequência do que foi dito, contrariamente ao entendido pela decisão recorrida, se encontra suficientemente fundamentado sob o ponto de vista formal, não padecendo da omissão que lhe é imputada.

XI - Como se conclui do anteriormente exposto, aferindo-se territorialmente a competência do órgão de execução fiscal e portanto, sendo as suas competências orgânicas próprias e inerentes porque exercidas por quem dirige esse órgão, essa direcção depende de uma colocação por nomeação, o que nada impede que seja em regime de substituição.

XII – Diversamente, o objecto da delegação de competências visa a possibilidade prática de actos próprios dos poderes de outra pessoa ou órgão, em função da matéria e em preterição do critério da competência territorial para a prática desses poderes, mas sempre atribuindo-lhe funções sem os quais os actos que o mesmo praticou não poderiam ter sido praticados por falta de poderes para tal.

XIII - Pelo que, atendendo ao efectivamente demonstrado supra, salvo o muito devido respeito, o douto Tribunal “ad quo”, não fundamentou a sua decisão conforme ao direito e à lei.

Porém, V. EXAS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA.»
X


O Recorrido, devidamente notificado para o efeito, optou por não apresentar contra-alegações.
X

O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer a fls. 254 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), no sentido da improcedência do recurso.
X


Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.


X


II- Fundamentação.
2.1.De Facto.

A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes:

«A) Em 7 de Setembro de 2005, o Serviço de Finanças de Lisboa - 8 instaurou contra a sociedade «J…… Lda» o processo de execução fiscal nº 310720….. visando a cobrança coerciva de dívidas provenientes de IRS – retensão na fonte referente ao ano de 2005 no montante de € 36.393,49 - cfr. fls. 1 a 3 da certidão do processo de execução fiscal (PEF) apenso;

B) No âmbito do processo de execução fiscal identificado na alínea antecedente foi remetido ao ora Oponente, via postal registado, o ofício nº 2647, datado de 21 de Fevereiro de 2007, denominado “notificação – audição-prévia (reversão)”, e assinado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 8, referindo o seguinte: «(…) Por despacho de 15/02/2007, determinei a preparação do processo para efeitos de reversão da(s) execução(ões) fical(ais) infra identificada(s), (..) na qualidade de responsável subsidiário da firma J….. (…) n.º 4 do artigo 23.º e art.º 60.º da LGHT fica notificado , para (…) exercer o direito de audição prévia para efeitos de avaliação da possibilidade ou não de reversão contra Vª Exª» - cf. fls. 5 do PEF;

C) Em 13 de Julho de 2009, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 8 despacho, designado de "delegação de competências", identificando como delegado L…, Chefe do Serviço de Finanças de Faro, na qualidade de coordenador da equipa criada para efeitos de PRESFED, com o seguinte teor: «(...) Atendendo ao facto de ter sido deslocado para este Serviço de Finanças o TAT N. 2 L…., Chefe do Serviço de Finanças de Faro, nos termos do despacho do Senhor Director Geral dos Impostos de 2009/06/15 como coordenador da equipa criada para efeitos do PRESFED, até ao final do corrente ano, promovo a presente delegação de competências, ao abrigo do disposto nos artigo 94 do Decreto-Lei n° 42/83, de 20/05, do artigo 35º do Código de Procedimento Administrativo e do artigo 62º da Lei Geral Tributária, relativamente à 3ª Secção, para vigorar no período que decorre desde esta data até 31/12/2009, pela seguinte forma:

No Coordenador da equipa L….
a) Implementação da metodologia de gestão de devedores estratégicos e tramitação dos processos referentes aos mesmos,
b) Coordenação a realização de todo o serviço relativo às aplicações informáticas do SEF, SIPA, SICJUT, SIGVEC, CERTIEF e CEAP;
c) Proferir despachos para instrução dos processos de execução fiscal, assinar mandados de citação e citações postais e praticar todos os actos a eles respeitantes, incluindo o registo de penhoras e decidir sobre reversões em situação de responsabilidade subsidiária, tendo em vista a extinção, quer por pagamento quer por anulação quer por prescrição até ao valor de 100 000,00 €, bem como julgar em falhas processos de valor não superior a 250 000,00€;
d) Concepção e proposta de controlo interno, tanto em matéria de produtividade como de qualidade dos actos praticados pelos elementos da Equipa PRESFED;
e) Promoção da prática de todas as diligências necessárias para a célere tramitação dos processos de execução fiscal, em especial os de maior valor;
f) Marcação das vendas e aguardar activação;
g) Certificação de todos os processos;
h) Marcação de penhoras e respectivos Despachos;
i) Aplicação de fundos.

Tendo em atenção o conteúdo doutrinal do conceito de delegação de competências conforme o previsto no artigo 39 do Código do Procedimento Administrativo, o delegante conserva, de entre outros, os seguintes poderes:
1. Chamamento a si, em qualquer momento e sem formalidades, da tarefa de resolução e apreciação que entenda conveniente, sem que isso implique a derrogação, ainda que parcial, desta delegação de competências;
2. Modificação, anulação ou revogação dos actos praticados pelo delegado. O Chefe do serviço de Finanças (…)»- cf. fls. 23 dos autos;

D) Em 30 de Setembro de 2009, foi prestada informação no âmbito da execução fiscal com o seguinte teor: «(…) Por despacho do senhor Coordenador da Equipa PRESFED exarado no processo de execução fiscal que corriam originariamente contra J…., Lda., NIPC 5046…, foi determinada a preparação para efeitos de reversão da execução contra J…., NIF 1753… e J...., NIF 19013….

O direito de audição previsto no artigo 60° da Lei Geral Tributária em articulação com o artigo 45° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, para o qual foram notificados não foi utilizado.

O valor a reverter refere-se a dívidas relativas a I.R.S. do exercício de 2005 no valor total de quantia exequenda de € 36.393,49.

Perante a inexistência de património da devedora originária para satisfazer a dívida exequenda e seus acréscimos legais conforme o disposto nos Artº 23° Lei Geral Tributária (L.G.T.) e Artº 153° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (C.P.P.T.), não tendo os gerentes provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo conforme Artº 24° nº 1 alínea b) da L.G.T., cumpre chamar à execução por força das suas funções de gestão Jo….. e J..... (…)» - cf. fls. 6 do PEF;

E) Na sequência daquela informação, foi, na mesma data, proferido despacho, por L…., na qualidade de Coordenador de Equipa PRESFED e indicando actuar por delegação do Chefe de Finanças, com o seguinte teor: «(…) Concordo com a informação prestada, dando-a como integralmente reproduzida para efeitos de fundamentação do presente despacho.

Face ao informado e tidos em conta os elementos suscitados em sede de audição reverto a presente execução contra J….., NIF 1753….. e J...., NIF 1901…..na qualidade de responsáveis subsidiários por força da gerência de direito e de facto, pelas dívidas constante nos presentes autos cuja constituição da mesma (prazo legal de pagamento ou entrega) ocorreu no período de exercício do cargo de gerente e assente que está a inexistência de bens penhoráveis do devedor originário (Artº 153° e 160° do C.P.P:T. e Art° 23° e nº 1 alínea b) do Art° 24° da L.G.T.). Proceda-se à citação dos executados por reversão, nos termos e para os efeitos previstos no Art° 160° do C.P.P.T., para pagarem no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da assinatura do aviso de recepção, a quantia que contra si reverteu, sem juros de mora nem custas (n.º 5 do Art° 23° da L.G.T.), dando-lhes ainda conta de que no mesmo prazo poderão, querendo, deduzir oposição, requerer pagamento em prestações ou requerer a dação em pagamento nos termos dos Art° 196º e seguintes do C.P.P.T. (…)» - cf. fls. 7 do PEF;

F) Ainda na mesma data, pelo Coordenador de Equipa PRESFED, indicando actuar por delegação do Chefe de Finanças, foi proferido despacho com o seguinte teor: «(…) Face às diligências de fls. 6, e estando concretizada a audição do(s) responsável(veis) subsidiário(s), prossiga-se com a reversão da execução fiscal contra J.... contribuinte n.º 1901…., morador em URB ….- ….- LOTE 10.. - RUA …..- 2… …na qualidade de Responsável Subsidiário, pela dívida abaixo discriminada. Atenta a fundamentação infra, a qual tem de constar da citação, proceda-se à citação do(s) executado(s) por reversão, nos termos do Art,º 160º do C. P. P. T para pagar no prazo de 30 (trinta) dias, a quantia que contra si reverteu sem juros de mora nem custas (nº 5 do Art.º 23° da L. G. T). (…)» - cf. fls. 10 do PEF;

G) Em 9/10/2009 foi remetido ao Oponente ofício de citação que foi recepcionado por E…. em 12/10/2009 – cf. aviso de recepção de fls. 15 do PEF;

H) Em 16/11/2009 o Oponente apresentou a petição de oposição – cf. fls. 122 dos autos;

I) Em 11 de Fevereiro de 2010, foi elaborada informação no Serviço de Finanças de Lisboa 8, na sequência da apresentação da oposição à execução, com o seguinte teor: «(… ) «Remetem-se os autos ao Tribunal Tributário de Lisboa nos termos do nº 1 do artigo 208º do CPPT. O Chefe de Finanças (…)» – cf. fls. 6 dos autos;

J) Na sequência da apresentação n.º 6 de 10 de Fevereiro de 2000 foi registada, na Conservatória de Registo Comercial de Lisboa, além do mais, a designação do Oponente como gerente da sociedade executada identificada em A) - cf. fls. 10 dos autos.
*
Factos não provados

Não se provaram os seguintes factos:

1) Que o despacho reproduzido em C) tenha sido objecto de publicação no Diário da República;

2) Que anteriores administradores da sociedade «GSI – Gestão de Sistemas de Informação SA» fizeram uma campanha de desinformação junto dos seus anteriores clientes, que impediu, designadamente, o recebimento, pela sociedade devedora originária, da facturação esperada referente aos contratos objecto da cessão da posição contratual;
2) Que o Oponente investiu todas as suas economias pessoais na sociedade devedora originária, para fazer face aos problemas de tesouraria enfrentados;

3) Que alguns dos trabalhadores-chave transferidos para a sociedade devedora originária, na sequência da cessão da posição contratual, foram recrutados por valores muito elevados e eram trabalhadores sem os quais era impossível manter os contratos com os clientes finais;

4) Que os pagamentos com atraso no âmbito de contratos de prestação de serviços relativos ao sector público, designadamente com a DGITA, nunca permitiram à sociedade devedora originária equilibrar a sua tesouraria.
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Motivação da Decisão de Facto

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame crítico das informações oficiais e dos documentos não impugnados, constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»


X

2.2. De Direito
2.2.1. Vem sindicada a sentença proferida a fls. 199 e ss., (numeração em formato digital – sitaf), que julgou procedente a oposição deduzida por J...., referente ao processo de execução fiscal (PEF) n.º 3107200…, que o Serviço de Finanças de Lisboa – 8 instaurou inicialmente contra a sociedade «J….. Lda», e que contra si reverteu, na qualidade de responsável subsidiário, para cobrança coerciva da quantia de € 36 393,49 proveniente de IRS relativo ao ano de 2005.
2.2.2. A sentença recorrida esteou-se, em síntese, na fundamentação seguinte:
«(…) [O] despacho de reversão da execução contra o Oponente, foi proferido, em 30 de Setembro de 2009, pelo “Coordenador de Equipa PRESFED”, constando do referido despacho que o mesmo é proferido “por delegação” do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa - 8.
Sendo que, em 13 de Julho de 2009, havia sido proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa - 8 o despacho de delegação de competências reproduzido em C) dos factos assentes, nos termos do qual delegou no referido Coordenador de Equipa PRESFED, L…., a competência para, designadamente, “proferir despachos para instrução dos processos de execução fiscal, assinar mandatos de citação e citações postais a eles respeitantes, incluindo o registo de penhoras e decidir sobre reversões em situação de responsabilidade subsidiária”, competência a ser exercida até 31/12/2009.
Resulta dos autos que o acto de reversão em apreciação foi efectivamente praticado pelo Coordenador de Equipa PRESFED, L……., ao abrigo de delegação de competências emanada do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa - 8, que lhe delegou a competência para a prática de actos no âmbito da tramitação dos processos de execução fiscal, entre outros, para determinar a reversão contra os responsáveis subsidiários, não é, desde logo, imediato inferior hierárquico do delegante (Chefe do SF de Lisboa - 8), pois sendo ambos chefes de serviços de finanças, o Coordenador de Equipa PRESFED não é inferior hierárquico do Chefe de Finanças delegante.
Resulta ainda dos autos que o despacho de delegação de competências em causa não foi objecto de publicação no Diário da República (cfr. alínea 1) dos factos não provados) o que implica a sua ineficácia.
(…)
Donde se conclui que os actos praticados ao abrigo de uma tal delegação ou subdelegação ineficaz devem ser considerados como se a delegação pura e simplesmente não existisse, uma vez que a publicação marca o início de produção de efeitos do acto, pelo que os actos subsequentes praticados ao seu abrigo são ilegais.
(…)».
2.2.3. Contra o veredicto que fez vencimento na instância, a recorrente invoca erro de julgamento na apreciação e qualificação da matéria de facto.
Alega, em síntese, que o despacho de reversão não enferma de qualquer ilegalidade, dado que o mesmo foi praticado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Faro, no âmbito de delegação de poderes, conferida pelo Chefe de Serviço de Finanças de Lisboa – 8, e à luz do regime de substituição de titulares de cargos dirigentes da DGI (artigo 97.º do Decreto-Regulamentar n.º 42/83, de 20 de Maio).
Vejamos.
A presente intenção recursória centra-se sobre a questão de saber qual é a habilitação legal do órgão autor do despacho de reversão, identificado em E) e F), do probatório, para proferir o mesmo (i) e quais os efeitos da falta de publicação do despacho de delegação de competências em causa nos autos (ii).
2.2.4. A competência para a prática de actos na execução fiscal pertence ao órgão periférico local da DGI (artigo 150.º/1, do CPPT). Sem embargo, suscita-se a questão de saber a que título é que L….., Chefe do Serviço de Finanças de Faro, na qualidade de coordenador da equipa criada para efeitos de PRESFED (recuperação de pendências em execuções fiscais), proferiu o despacho de reversão em causa nos autos (alíneas E) e F), do probatório).
A resposta à presente questão decorre da análise do probatório, dado que, estando em causa a prática de acto no âmbito da execução fiscal instaurada pelo Serviço de Finanças de Lisboa – 8, compete ao Chefe do Serviço de Finanças respectivo a prática do acto de reversão em apreço (artigo 150.º/1, do CPPT). No caso, o exercício da competência em exame, por parte do Chefe do Serviço de Finanças de Faro, na qualidade de coordenador da equipa criada para efeitos de PRESFED, ocorreu no quadro da transferência de competências conferidas pelo despacho de delegação de competências do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa – 8, de 13.07.2009 (alínea C), do probatório), por meio do qual, L…., Chefe do Serviço de Finanças de Faro, na qualidade de coordenador da equipa criada para efeitos de PRESFED, foi habilitado a proferir despachos para instrução dos processos de execução fiscal, assinar mandados de citação e citações postais e praticar todos os actos a eles respeitantes, incluindo o registo de penhoras e decidir sobre reversões em situação de responsabilidade subsidiária (alínea C), ponto c), do probatório).
A recorrente pretende enquadrar o exercício da competência em referência no regime da substituição legal de titulares de cargos dirigentes da DGI (artigo 97.º do Decreto-Regulamentar n.º 42/83, de 20 de Maio).
Sem razão, porém.
É que, no caso, não existe falta ou impedimento legal do órgão legalmente competente para determinar a reversão (o Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa – 8), que justificasse a aplicação do regime de substituição referido, mas antes a prática de acto por parte de órgão delegado, com base no despacho de delegação de competências, proferido pelo órgão titular da mesma.
«Os órgãos administrativos normalmente competentes para decidir em determinada matéria podem, sempre que para tal estejam habilitados por lei, permitir através de um acto de delegação de poderes, que outro órgão ou agente pratique actos administrativos sobre a mesma matéria (artigo 35.º, n.º do CPA(1) e artigo 44.º, n.º 1, do NCPA(2) ). No que respeita aos requisitos do acto de delegação de competências, estatui o artigo 37.º (“Requisitos do acto de delegação”), n.º 1, do CPA (artigo 47.º/2, do NCPA), que «[n]o caso de delegação ou subdelegação, deve o órgão delegante ou subdelegante especificar os poderes que são delegados ou subdelegados ou quais os actos que o delegado ou subdelegado pode praticar»; o n.º 2 do preceito estatui que «[o]s actos de delegação e subdelegação de poderes estão sujeitos a publicação no Diário da República».
O regime dos requisitos do acto de delegação de competências, bem como a sua publicação em Diário da República não são inócuos. «A disciplina do acto de delegação de competências obedece aos requisitos especiais contemplados no artigo 47.º, os quais se reportam ao conteúdo e à forma do ato, todos eles informados pelos imperativos da transparência e de accountability, facilitando o controlo da sua legalidade»(3).
Os actos relativos à reversão em causa nos autos foram praticados por titular de órgão, L….., Chefe do Serviço de Finanças de Faro, sem habilitação legal para o efeito, dado que, por um lado, não interveio com base no regime de substituição legal do órgão competente cujos pressupostos não se comprovam nos autos (artigo 97.º do Decreto-Regulamentar n.º 42/83, de 20 de Maio), por outro lado, a intervenção como órgão delegado carece de habilitação legal, por falta de publicação do acto de delegação de competências. Os actos praticados, ao abrigo de delegação de poderes inexistente ou não publicada enfermam do vício de incompetência, pelo que devem ser anulados(4).
Como se refere no Acórdão do STA, de 18.12.2002, P. 0646/02, «Para que o acto de (sub)delegação seja válido e eficaz deve o órgão (sub)delegante especificar os poderes que são (sub)delegados, quais os actos que o (sub)delegado pode praticar e deve tal acto ser publicado no DR, ou tratando-se de administração local, no boletim da autarquia e afixado nos lugares de estilo, quando tal boletim não exista (artº37, nº1 e 2 do CPA). // Assim, para aferir da competência do autor do acto não basta a invocação, por este, de que foi praticado com competências subdelegadas, há que identificar nos autos os actos de delegação e subdelegação, designadamente seus autores, datas e locais onde estão publicados».
Ao julgar no sentido referido, a sentença recorrida não incorreu em erro, pelo que deve ser mantida, nesta parte.
Termos em que se julgam improcedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.5. No que respeita à consequência extraída pelo tribunal recorrido, no sentido da extinção da execução fiscal, por inexigibilidade da dívida, a mesma não é de manter, nesta parte.
Como se consigna no Acórdão do STA, de 22.04.2015, P. 0511/14, «No caso de a oposição ser julgada procedente com fundamento na falta de fundamentação do despacho de reversão, a decisão a proferir pelo tribunal deverá ser de anulação daquele acto e consequente absolvição do oponente da instância executiva por falta de legitimidade processual e não a extinção da execução quanto ao oponente (pois não foi feito qualquer juízo quanto ao mérito da matéria controvertida), de modo a não obviar à possibilidade do órgão de execução fiscal proferir um novo acto de reversão, expurgado do vício que determinou a anulação do anterior acto, possibilidade que lhe assiste em virtude do motivo determinante da anulação ser de carácter formal».
Doutrina que é de aplicar ao caso em exame, dado que está em causa um vício formal (latu senso) do acto de reversão, o que determina a necessária substituição do segmento decisório em apreço por outro que absolva o oponente da presente instância executiva, por falta de legitimidade processual. O que se determinará no dispositivo.
DISPOSITIVO

Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul no seguinte:
a) Negar provimento ao recurso;
b) Anular o despacho de reversão, com a consequente absolvição do oponente da instância executiva por falta de legitimidade processual e não a extinção da execução quanto ao oponente.

Custas pela recorrente.
Registe.
Notifique.


(Jorge Cortês - Relator)


(1º. Adjunto)
Mário Rebelo

(2º. Adjunto)
Ana Pinhol


(1) Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 442/91, de 15 de Novembro.
(2) Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 4/2015, de 7 de Janeiro.
(3) Ana Raquel Gonçalves Moniz, A delegação administrativa de poderes públicos, in Organização Administrativa: Novos actores, novos modelos, Vol. II, Coord. Carla Amado Gomes e outros, AAFDL, 2018, pp. 637/674, máxime, p. 659
(4). Neste sentido, V. Mário Esteves de Oliveira e outros, CPA, anotado, Almedina, 1997, p. 224; José Maria Fernandes Pires, LGT, anotada, Almedina, 2015, p. 646.