Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:83/20.7 BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:09/13/2023
Relator:SUSANA BARRETO
Descritores:TSAM
GRUPO DE EMPRESAS
REGIME DE ISENÇÃO
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
Sumário:I - Um grupo de empresas define-se pelas relações jurídicas, económicas e financeiras que empresas estabelecem com uma empresa do grupo – a empresa dominante – como formas de concentração na pluralidade em que duas ou mais empresas ficam submetidas a uma direção comum, sendo irrelevante que existam ou não relações entre as empresas submetidas à direção comum.
II - No que à taxa de segurança alimentar mais diz respeito trata-se apenas de uma denominação de – grupo – em que o legislador, ciente do aumento crescente de contratos de franchising ou que conduzem ao mesmo resultado de parcelamento do espaço de venda, pretende a responsabilização pelo pagamento da taxa reportado à globalidade do espaço de venda da empresa franchisadora que o faz pulverizar em múltiplas empresas franchisadas.
III - A taxa poderia ter sido aplicada à empresa franchisadora, mas o seu recorte teria que ser diverso do que é efetuado para cada empresa em concreto. A opção legislativa encontrada faz com que o mesmo modelo possa ser aplicado a cada empresa concreta, com o espaço de venda que detém, sem deixar de ter em conta o total espaço de venda nacional que corresponde, neste caso à utilização da mesma insígnia.
Iv - Não exige a lei que esteja estabelecida qualquer relação jurídica, comercial ou financeira entre a impugnante e cada uma das empresas que utilizam a mesma insígnia para cálculo da área total de venda que corresponde a essa utilização, bastando a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia – artigo 3.º, n.º 5 da Portaria nº 215/2012: considera-se «grupo» o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação decorrentes da utilização da mesma insígnia ou de direitos ou poderes, nos termos previstos na alínea o) do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro.
V - Se o sujeito passivo comunica à DGAV a área do seu estabelecimento afecta ao comércio alimentar, é a totalidade dessa área que serve de base à quantificação do facto tributário e não a que resulta dos coeficientes de ponderação sobre a área de venda do estabelecimento, previstos no art.º 1.º da Portaria n.º 200/2013, de 31 de Maio.
VI - O acto tributário considera-se devidamente fundamentado se contém uma imprecisão (refere “área de venda”, quando deveria referir área de venda afecta a comércio alimentar), mas contextualmente o seu sentido resulta claro e acessível a um destinatário médio.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral: I - Relatório

A M…. – Sociedade de Distribuição, SA, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o ato de liquidação da Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM), referente ao ano de 2019, 1ª prestação, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul.

Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente, formulou as seguintes conclusões:

i. Na alínea 1) da matéria de facto, foi dado como provado a Impugnante comunicou aos serviços da administração que opera sob a insígnia “A Impugnante explora o referido estabelecimentos utilizando a insígnia E. …”.
ii. Como decorre da alínea 3) da matéria de facto, “Em 26 de Junho de 2019, a DGAV – Fundo Sanitário de Segurança Alimentar Mais emitiu a “Factura n.º FT 2019F/001084”, em nome da Impugnante, no valor de € 8.260,00, nela constando a referência a uma área de venda de 2.360,00 e área ponderada de 2.360,00 e o seguinte descritivo: “Taxa de Segurança Alimentar Mais – 1.ª Prestação do Ano de 2019 (Decreto-Lei n.º 119/2012, Portarias n.º 215/2012, n.º 200/2013 e n.º 107-A/2017) referente a 50% do valor da taxa anual (7€/m2)” e com data limite de pagamento em 31 de Outubro de 2019;”
iii. Não consta na matéria de facto dada como provada que o estabelecimento comercial da Recorrente possui uma área de comércio alimentar de 1770,00 m2.
iv. Não consta na matéria de facto não provada que o Tribunal a quo considerou como não provado que a Recorrente é uma das cooperantes da “C…”.
v. Não obstante, a Recorrente entende que do quadro factual dado como provado, resultam os pressupostos para considerar que se encontra isenta do pagamento da TSAM nos termos em que tal isenção é definida pelos nº 2 do artigo 9º do DL 119/2012 de 15 de Junho e nº 1, 2, 3 e 5 do artigo 3º da Portaria nº 215/2012 de 17 de Julho.
vi. Pois, o estabelecimento de que a Recorrente é titular apenas possui uma área de comércio alimentar de 1.770,00m2, inferior, portanto, à área de 2.000m2 exigida por aquelas normas.
vii. Assim como, a Recorrente não está integrada num grupo nos termos definidos na alínea b) do nº 3 e no nº 5 do artigo 3º da Portaria 215/2012 de 17 de julho, já que, entre esta e as outras empresas que fazem parte da C… e utilizam a insígnia “E. …”, não existe qualquer relação jurídica, comercial, financeira ou outra, isto é,
viii. A Recorrente e aquelas restantes empresas não mantêm quaisquer laços de interdependência ou de subordinação entre si, apesar de utilizarem a mesma insígnia.
ix. E a lei é clara ao exigir que, no conceito de grupo, estejam integradas empresas que, apesar de juridicamente distintas, utilizem a mesma insígnia e que desta utilização, mantenham laços de interdependência ou subordinação jurídica ou de direitos ou poderes. Isto é, não basta a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia.
x. E no caso dos presentes autos, a única relação jurídica e económica a que a Recorrente está sujeita é a que decorre do facto de ser uma das cooperantes da C…, não tendo qualquer relação com mais nenhuma empresa que, eventualmente, utilize a mesma insígnia “E…”.
xi. Logo, não se encontra abrangida pelo conceito de grupo conforme definido na lei.
xii. Salvo o devido respeito, a intenção do legislador é aplicar a taxa a empresas detentoras de estabelecimentos com grandes áreas (cfr. nº 1 e nº 3 do artigo 3º da Portaria Nº 215/2012 de 17 de Julho) e não a pequenas empresas com as características da empresa titulada pela Recorrente!
xiii. Na verdade, seguindo a perspectiva da douta sentença, quem deveria ser sujeita à aplicação da TSAM seria a detentora da insígnia, pois, o somatório das áreas dos estabelecimentos que utilizam tal insígnia ultrapassa os 6.000m2 de área acumulada,
xiv. E nunca a Recorrente, cuja área de estabelecimento não pode servir como base para liquidação de duas taxas.
xv. A decisão violou o disposto no artigo 74º n.º 1 da Lei Geral Tributária (LGT), que prevê que o “ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”.
xvi. Conforme acima exposto, resulta dos autos que o estabelecimento da Recorrente, tem uma área de venda inferior a 2000m2, pelo que se verifica o pressuposto da isenção previsto no nº 2 do artigo 9º do Decreto-Lei e no nº 1 do artigo 3º da Portariam supra citados.
xvii. Ora, como especifica o nº 2 do artigo 3º da portaria citada, a “isenção abrange os estabelecimentos comerciais que, apesar de usarem uma insígnia comum, estão associados através, nomeadamente, de cooperativas, desde que não pertençam a uma empresa ou integrem um grupo.”
xviii. Salvo o devido respeito, não está demonstrado nos autos, nem tão pouco foi invocada, a verificação de qualquer um dos factos que determina a desaplicação da isenção, enunciados no nº3 e seguintes do referido artigo 3º, em sintonia com as alíneas a) e b) do nº 2 do artigo 9 do Decreto-Lei, pelo que deve ser reconhecido o direito da Recorrente à invocada isenção.
xix. Nos presentes autos, nem sequer é invocado, muito menos provado, pela DGAV a existência de “uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000m2” que fosse comum aos estabelecimentos que ostentem a insígnia E. ….
xx. E tal facto não pode ter-se por presumido, para justificar uma desaplicação da isenção, antes carecendo de ser assente, quer no procedimento tributário que conduziu à liquidação, quer nos presentes autos a fim de aferir da legalidade da liquidação.
xxi. Pelo exposto, deveria ter sido julgado procedente o vício do erro nos pressupostos de facto e anulada a liquidação impugnada.
xxii. Não obstante, a Recorrente entende que do quadro factual dado como provado, resultam os pressupostos para considerar que encontra-se isenta do pagamento da TSAM nos termos em que tal isenção é definida pelos nº 2 do artigo 9º do DL 119/2012 de 15 de Junho e nº 1, 2, 3 e 5 do artigo 3º da Portaria nº 215/2012 de 17 de Julho.
xxiii. Pois, o estabelecimento de que a Recorrente é titular apenas possui uma área de comércio alimentar de 1.770,00 m2, inferior, portanto, à área de 2.000m2 exigida por aquelas normas. Assim como, a Recorrente não está integrada num grupo nos termos definidos na alínea b) do nº 3 e no nº 5 do artigo 3º da Portaria 215/2012 de 17 de Julho, já que, entre esta e as outras empresas que fazem parte da C… e utilizam a insígnia “E….”, não existe qualquer relação jurídica, comercial, financeira ou outra, isto é, a Recorrente e aquelas restantes empresas não mantêm quaisquer laços de interdependência ou de subordinação entre si, apesar de utilizarem a mesma insígnia.
xxiv. Por outro lado, o Tribunal a quo deveria ter aplicado o disposto no nº 1 do artigo 100º do CPPT. Trata-se de norma que se reporta à questão do ónus da prova.
xxv. Acresce que esta prova produzida há-de ser não só a prova aduzida pelas partes, como também a prova que ao juiz se impõe diligenciar (art. 13º, nº 1 do CPT).
xxvi. A causa da dúvida no caso concreto não derivou do comportamento da Recorrente não tendo sido por incumprimento dos seus deveres de cooperação, que se inviabilizou a descoberta e apuramento dos factos tributários, não podendo a dúvida reverter contra ela.
xxvii. No caso dos autos, a prova produzida pela Recorrente logrou infirmar os factos em que assentou o acto tributário.
xxviii. Era nesse sentido que se orientava a jurisprudência no atinente à impugnação judicial nomeadamente com fundamento na inexistência dos pressupostos do acto tributário, entre os quais se incluía a existência do facto tributário (vide, entre muitos, os Acórdãos do STA de 5/5/76, Ads 176-177, pág. 1141; de 9/2/77, no Recurso nº 768 e de 15/11/78, Ads 206º- 244).
xxix. No artº 100º do CPPT (e já o mesmo acontecia no artº 121º do CPT) acolhe-se claramente o princípio da verdade material, vinculante para a própria AF que só deverá praticar o acto tributário quando «formar convicção da existência e conteúdo do facto tributável» devendo, em caso de subsistência de dúvida «acerca do objecto do processo(..) abster-se de praticar o acto tributário, dando assim cumprimento ao princípio in dubio contra fiscum»(Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 150, 158 e 169).
xxx. Em suma, é a indubitável consagração do princípio de que a dúvida reverte a favor do contribuinte, em substituição do princípio «in dubio pro fisco» que vigorou anteriormente à Reforma Fiscal.
xxxi. A prova para o efeito relevante será não apenas a aduzida pelas partes, mas também e especialmente a prova que ao juiz se impõe diligenciar.
xxxii. Assim sendo, cabia à MMa. Juiz a quo realizar ou ordenar todas as diligências que considerasse úteis ao apuramento da verdade pois não pode considerar-se fundada a dúvida que implica a anulação do acto impugnado se assentar na ausência ou na inércia probatória das partes, especialmente da Impugnante.
xxxiii. É que esta não pode limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida «a existência e quantificação do facto tributário», incumbindo-lhe o «ónus probandi» de tais factos sem prejuízo de o Juiz, no uso do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também pela sua comprovação só sendo possível concluir-se pelo fundamento da dúvida mediante a prova concludente dos mesmos.
xxxiv. A este enquadramento do regime do artº 100º do CPPT há um «prius» que é a conceituação de facto tributário aderindo nós à que dele dá Alberto Xavier em Conceito e Natureza do Acto Tributário, págs. 247 e segs segundo a qual naquele existem um elemento subjectivo e um elemento objectivo integrado por um elemento material (acontecimento natural ou fenómeno de natureza económica, acto ou negócio jurídico tipificados na norma de incidência real), um elemento temporal (factos instantâneos ou duradouros) e um elemento quantitativo (factores legais de medição do objecto material do imposto).
xxxv. A sentença judicial não pode reduzir-se a um puro silogismo lógico, não pode nem deve representar uma aplicação por assim dizer maquinal da lei geral e abstracta aos factos da causa (vd. Acórdão da RL de 12/10/93, CJ, Ano XVIII, T. IV), antes devendo o juiz fazer uma apreciação crítica das provas, o que equivale a dizer que terá necessariamente de valorar e interpretar os factos apurados no julgamento à luz dos interesses e finalidades que o legislador quis defender, presentes nas normas jurídicas aplicáveis a cada hipótese.
xxxvi. Assim sendo, face ao quadro factual desenhado pela MMa. Juiz a quo, torna-se necessário recorrer à regra do artº 100º do CPPT pois que resulta do probatório exarado na sentença sob recurso fundada dúvida quanto à verificação das condições do regime de isenção legalmente previsto, pelo que deveria ter aplicado esta norma e não procedido ao seu sumário afastamento, como fez.
xxxvii. Na sentença recorrida em nenhum momento se faz menção à delimitação entre aquelas que são os atos (comunicativo e comunicado) e os atos que se consubstanciam numa verdadeira liquidação tributária e os formalismos legais que se exigem para a mesma.
xxxviii. Sendo a TSAM um tributo, como ficou delimitado e expresso pelo Tribunal a quo, são aplicáveis as regras e os princípios previstos na Lei Geral Tributária (LGT), nomeadamente o artigo 3º e seguintes da LGT.
xxxix. A AT rege-se pelos princípios constitucionais previstos nos artigos 266º da CRP, designadamente pelo princípio da legalidade procedimental, previsto e regulado no art. 3º do CPA e do art. 55 da LGT.
xl. Ora, é inequívoco que a “fundamentação” utilizada pela Recorrida é manifestamente insuficiente para que se possa considerar como fundamentado o acto de liquidação impugnado, nomeadamente quanto ao seu valor e à forma como o mesmo foi apurado.
xli. A liquidação não foi efectuada com base na área que foi comunicada pela própria DGAV em sede de audiência prévia, havendo assim contradição entre o valor que foi com comunicado à Recorrente em sede de audiência prévia e aquele que lhe foi comunicado na decisão final.
xlii. Ora, o que ressalva dos presentes autos é que existe ambiguidade ou obscuridade da fundamentação, porquanto, pressupõe duas ou mais interpretações de qualquer ponto da decisão.
xliii. Perante tal contradição, nem do ofício nem da factura acima referida é possível compreender o cálculo do valor apurado. Aliás, nas facturas não consta nada acerca da aplicação dos coeficientes de ponderação previstos legalmente.
xliv. Face às considerações acima tecidas sobre o dever de fundamentação, e aplicando-as ao caso dos autos, é possível concluir de forma segura que, quer das facturas, quer do ofício através do qual as mesmas foram remetidas à Recorrente, nomeadamente do teor da respectiva fundamentação, não é possível a um destinatário normal compreender o iter percorrido, pela DGAV, quanto à norma como foi apurado o concreto o valor da TSAM relativa ao ano de 2019.
xlv. Importa ter presente que a fundamentação, é desde logo, uma imposição constitucional, porquanto a CRP, no nº 3, do artigo 268º, garante aos administrados o direito a uma fundamentação expressa e acessível de todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos.
xlvi. Atentando no teor do acto impugnado, resulta que o mesmo se limita a evidenciar que é devido o montante de € 8.260,00, constando de cada uma das facturas como item descritivo “Taxa de Segurança Alimentar Mais – 1ª Prestação do Ano de 2019 (Decreto-Lei nº 119/2012, Portarias nº 215/2012, nº 200/2013 e nº 35/2021), referente a 50% do valor da taxa anual (7/m2).
xlvii. Ora, face ao supra aludido dimana inequívoco que o mesmo se limita a fazer uma mera enunciação dos diplomas legais, porém não apresenta qualquer referência expressa ou implícita ao seu modo de cálculo.
xlviii. É manifesto que nos encontramos face a um “ato de massa”, emitido pela DGAV para inúmeros destinatários, mas a verdade é que tal em nada pode acarretar uma diminuição do dever de fundamentação, em nada podendo justificar uma menor densificação dos pressupostos de facto que subjazem à emissão do ato impugnado.
xlix. No mesmo sentido, a fundamentação que suporta a liquidação teria de conter a indicação do motivo pelo qual, apesar de o estabelecimento da Recorrente não possuir a área mínima legalmente prevista é apesar de tudo sujeita a tributação.
l. Ora, como refere a Recorrente, na notificação da liquidação em apreço é indicada como área de venda do estabelecimento a de 1.770,00 m2. Não surgindo aí de todo justificado porque é que, sendo esta a área de venda, não se trata de uma situação de isenção do pagamento da TSAM e qual é o coeficiente de ponderação aplicável.
li. Assim sendo, outra conclusão não podemos retirar que não a de que o acto não se encontra devidamente fundamentado, pelo que, a insuficiência da fundamentação constitui vício invalidante que inquina de forma determinante a liquidação ora em crise, devendo ser considerado procedente o pedido anulatório e à anulação da liquidação contestada, com as consequências legais.
lii. Assim sendo, salvo o devido respeito, assiste razão à Recorrente quando invoca a falta de fundamentação do ato de liquidação devendo proceder, neste aspeto, a presente impugnação, o que determina a anulação do ato.
liii. E, nessa conformidade, a concluir-se pela ilegalidade da liquidação de TSAM, deve também ser ordenada a restituição do montante pago pela Recorrente a esse título.
liv. Com efeito, no que concerne ao pedido de devolução do montante pago, importa referir que em virtude da emissão de liquidações ilegais, ao abrigo do disposto no artigo 100.º da LGT, a entidade que recebeu o correspondente pagamento está obrigada a reconstituir a situação legal que hipoteticamente existiria, não fora a prática dos atos lesivos por si praticados contra os direitos e interesses protegidos do administrado, dever este que justifica, de forma inequívoca, a obrigação de restituição do montante que foi pago pela Impugnante.

Nestes termos, e com douto suprimento de Vossas Excelências que aqui se invoca, deve o presente recurso de apelação ser admitido e ser julgado totalmente procedente, com todos os efeitos legais daí resultantes, com o que será feita Justiça!


A Recorrida, não apresentou contra-alegações.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito meramente devolutivo

Os autos foram com vista ao Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


II – Fundamentação

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações, que fixam o objeto do recurso, sendo as de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento: de facto e de direito, ao ter considerado que a Recorrente não se encontra abrangida pelo regime de isenção previsto nos artigos 9/2 do Decreto-Lei nº 119/2012 de 15 de junho, e artigo 3/3.b) da Portaria nº 215/2012 e que o ato tributário não padece de erro nos pressupostos de facto nem de insuficiente fundamentação.


II.1- Dos Factos

O Tribunal recorrido considerou como provada a seguinte factualidade:

1. A impugnante explora um estabelecimento comercial de venda de produtos alimentares (admitido);
2. A impugnante explora o referido estabelecimentos utilizando a insígnia E… (admitido);
3. Em 26/06/2019 foi emitida pelo Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais, a factura nº FT 2019F/001084, em nome da Impugnante e da qual consta o seguinte:



(cfr. doc. junto a fls. 42 do doc. de fls. 108 do SITAF);

4. Por ofício de 1/07/2019 foi comunicado à impugnante o valor a pagar da taxa de Segurança Alimentar Mais referente ao exercício de 2019, nos seguintes termos:


(…)”
(cfr. doc. junto a fls. 40 e 41 do doc. de fls. 108 do SITAF);


Quanto a factos não provados, a sentença exarou-se o seguinte:

«Não se provaram outros factos com relevância para a decisão da causa.»

E quanto à Motivação da Decisão de Facto, consignou-se:

«A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»



Por se entender relevante à decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, ao abrigo do preceituado no artigo 662.º, nº 1, do Código de Processo Civil (CPC) ex vi artigo 281.º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), adita-se ao probatório as alíneas 3-A a inserir entre as alíneas 3. e 4. e uma nova alínea sob o nº 5:

3-A. Consta ainda da fatura identificada na alínea que antecede:



5. Em 2017.03.06, a Impugnante e ora Recorrente através de mensagem eletrónica constante de fls. 25 e 26 do PA que aqui se dá por integralmente reproduzido, informou que a área de produtos alimentares no estabelecimento era de 2 360m2 e a área de produtos não alimentares era de 1 575 m2. Deste transcreve-se:

(IMAGEM, ORIGINAL NOS AUTOS)

(…)»

II.2 Do Direito

A Impugnante e ora Recorrente, veio impugnar junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada o ato de liquidação da vulgarmente designada por taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) respeitante à 1ª prestação do ano de 2019.

Notificada da sentença que julgou a impugnação improcedente, veio dela recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul, alegando, como vimos já supra e em suma, que esta padece de erro nos pressupostos de facto e de direito por não aplicação ao caso dos autos da isenção prevista no artigo 9/2, do DL. nº 119/2012, porquanto o estabelecimento possui uma área de comércio alimentar de 1 770,0 m2 e entre a Recorrente e as outras empresas que fazem parte da “C….” e utilizam a insígnia “E….”, não existe qualquer relação jurídica, comercial, financeira ou outra. E ainda por não ter considerado que o ato de liquidação impugnado não se encontra suficientemente fundamentado quanto ao valor e à forma como este foi apurado.

Nas conclusões iii) e iv) das alegações de recurso, impugna ainda a matéria de facto dada como não provada na sentença recorrida.

Comecemos a análise pela impugnação da matéria de facto para após a estabilização desta partirmos depois para o exame das demais questões alegadas.

Em regra, quando impugna a matéria de facto, a Recorrente tem de cumprir os ónus que sobre si impendem, sob pena de rejeição do recurso nesta parte [artigo 640º, n.º 1, alíneas a) a c) e n.º 2, alínea a) do CPC, aplicável ex vi artigo 281º CPPT], cabendo ao Recorrente especificar:
a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas quanto aos indicados pontos da matéria de facto.

Assim, quando os meios de prova invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravadas, incumbe à Recorrente, transcrevê-las ou indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso [artigo 640/2.a) CPC].

Incumbe ao Recorrente cumprir este programa, identificando os factos que entende terem sido mal julgados: quer por terem sido dados como provados quando o não deveriam ter sido, quer os que foram desconsiderados e considera serem relevantes à decisão, com indicação dos meios de prova que suportam esta sua pretensão de alteração do probatório.

Desde já diremos que estes ónus não foram cumpridos pela ora Recorrente.

A ora Recorrente nas alegações de recurso apesar de indicar os pontos concretos da matéria de facto que não foram levados ao probatório e que não foram dados como não provados e contra os quais se insurge, não indica, todavia, com a precisão que lhe era exigível os meios de prova em que funda a sua discordância.

Se bem compreendemos a alegação da Recorrente as objeções manifestadas prendem-se com a área do estabelecimento considerada para aplicação do coeficiente e se é ou não cooperante e quais as relações entre cooperantes.

Desde já adiantaremos que esta problemática recai no chamado erro de julgamento e não em matéria de impugnação da matéria de facto.

Com efeito, como consta do ofício levado ao probatório foi a Impugnante e ora Recorrente quem comunicou ao Fundo as áreas relevantes do estabelecimento comercial, comunicação essa que consta do processo administrativo junto, matéria que consideramos pertinente e que aditamos ao probatório.

Ora, sobre se a área a considerar era a totalidade da área comunicada ou se deveria ter sido ou não aplicado um coeficiente de ponderação é, sem dúvida, matéria cuja análise integra o erro de julgamento e que será analisada infra, no momento e lugar próprios. Com efeito, e para efeitos de impugnação dos factos levados ao probatório interessa que foi a Impugnante e ora Recorrente que comunicou que a área alimentar era de 2 360 m2 e não alimentar de 1 575m2, não tendo carreado para os autos qualquer prova em sentido contrário.

Também a questão sobre as relações jurídicas entre cooperantes não tem a relevância que a Recorrente lhe atribui, como veremos de seguida.

Em suma, a crítica dirige-se à valoração da prova que foi feita e à que no seu entender o deveria ter sido, não se tratando, pois, de uma verdadeira e própria impugnação da matéria de facto assente, caindo todo o alegado no chamado erro de julgamento, que melhor será apreciado infra.

Termos em que se rejeita a impugnação da matéria de facto.

Vejamos, agora:

As questões submetidas pela Recorrente à apreciação deste Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS) não são novas e foram já apreciadas nomeadamente no acórdão de 2023.06.06, proferido no processo que correu termos sob o nº 2573/19.5BELRS e nos acórdãos de 2023.06.22 nos processos nº 81/20.0BEALM e 199/20.0BELRS, os quais subscrevemos na qualidade de 2ª Adjunta e com os quais concordamos e que seguiremos de muito perto.

Vejamos então:

Dizia o artigo 9º do Decreto-Lei nº 119/2012, no segmento relevante para os autos:

Decreto-Lei n.º 119/2012, no segmento relevante para os autos:
«Artigo 9.º
Taxa de segurança alimentar mais
1 - Como contrapartida da garantia de segurança e qualidade alimentar é devido o pagamento, pelos estabelecimentos de comércio alimentar de produtos de origem animal e vegetal, frescos ou congelados, transformados ou crus, a granel ou pré-embalados, de uma taxa anual, cujo valor é fixado entre (euro) 5 e (euro) 8 por metro quadrado de área de venda do estabelecimento, por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da agricultura.
2 - Estão isentos do pagamento da taxa a que se refere o número anterior os estabelecimentos com uma área de venda inferior a 2000 m2 ou pertencentes a microempresas desde que:
a) Não pertençam a uma empresa que utilize uma ou mais insígnias e que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2;
b) Não estejam integrados num grupo que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2.
3 – (…)».


E dispunha o artigo 3º da Portaria 215/2012, de 17 de julho, que regulamenta a taxa de segurança alimentar mais, no seu artigo 3.º:
«Artigo 3.º
Isenções
1 - Estão isentos do pagamento da taxa os estabelecimentos com uma área de venda inferior a 2000 m2 ou pertencentes a microempresas, tal como definidas no Decreto-Lei 372/2007, de 6 de novembro, alterado pelo Decreto-Lei 143/2009, de 16 de junho, nos termos e condições do presente artigo.
2 - A isenção abrange os estabelecimentos comerciais que, apesar de usarem uma insígnia comum, estão associados através, nomeadamente, de cooperativas, desde que não pertençam a uma empresa ou integrem um grupo nos termos previstos nos números seguintes.
3 - As isenções previstas no n.º 1 não são aplicáveis aos estabelecimentos que:
a) Pertençam a uma empresa que utilize uma ou mais insígnias e que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2;
b) Estejam integrados num grupo que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2.
4 - Para efeitos da alínea a) do número anterior, considera-se como pertencendo a outra as empresas que, embora juridicamente distintas, constituem uma unidade económica ou mantenham entre si laços de interdependência decorrentes, nomeadamente:
a) De uma participação maioritária no capital;
b) Da detenção de mais de metade dos votos atribuídos pela detenção de participações sociais;
c) Da possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou de fiscalização;
d) Do poder de gerir os respetivos negócios.
5 - Para efeitos da alínea b) do n.º 3, considera-se «grupo» o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação decorrentes da utilização da mesma insígnia ou de direitos ou poderes, nos termos previstos na alínea o) do artigo 4.º do Decreto-Lei 21/2009, de 19 de janeiro.

Sobre a questão suscitada pela Recorrente já se pronunciou o Supremo Tribunal Administrativo em diversos arestos, destacando-se o que se consignou no seu acórdão de 2019.05.22, no proc.º nº 0418/14.1BECBR, disponível em www.dgsi.pt, do qual se transcreve:

«Por um lado, um grupo de empresas define-se pelas relações jurídicas, económicas e financeiras que se estabelecem com uma empresa do grupo – a empresa dominante –. São formas de concentração na pluralidade em que duas ou mais empresas ficam submetidas a uma direcção comum, sendo irrelevante que existam ou não relações entre as empresas submetidas à direcção comum, art.º 488º e seguintes do Código das Sociedades Comerciais. Por outro, no que à taxa em discussão diz respeito trata-se apenas de uma denominação de – grupo – que o legislador, ciente do aumento crescente de contratos de franchising ou que conduzem ao mesmo resultado de parcelamento do espaço de venda, pretende a responsabilização pelo pagamento da taxa reportado à globalidade do espaço de venda da empresa franchisadora que o faz pulverizar em múltiplas empresas franchisadas. A taxa poderia ter sido aplicada à empresa franchisadora, mas o seu recorte teria que ser diverso do que é efectuado para cada empresa em concreto. A opção legislativa encontrada faz com que o mesmo modelo possa ser aplicado a cada empresa concreta, com o espaço de venda que detém, sem deixar de ter em conta o total espaço de venda nacional que corresponde, neste caso à utilização da mesma insígnia.
Não exige a lei que esteja estabelecida qualquer relação jurídica, comercial ou financeira entre a impugnante e cada uma das empresas que utilizam a mesma insígnia para cálculo da área total de venda que corresponde a essa utilização, bastando a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia – artigo 3.º, n.º 5 da Portaria nº 215/2012: considera-se «grupo» o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação decorrentes da utilização da mesma insígnia ou de direitos ou poderes, nos termos previstos na alínea o) do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro (…)» (fim de cit.).

Esta jurisprudência que acabamos de citar foi recentemente reiterada no acórdão de 2022.03.09, Proc nº 416/14.5BECBR, também disponível em www.dgsi.pt, que acolhemos na íntegra.

Em face do decidido e seguindo esta jurisprudência a sentença recorrida não merece, pois, a censura que lhe foi feita e é de confirmar neste segmento.


Alega, depois, a ora Recorrente o erro nos pressupostos de facto que serviram de base à liquidação do tributo, defendendo ser-lhe aplicável o regime da isenção por ter uma área de venda inferior a 2000m2 [cf. nomeadamente conclusão xvi) das alegações de recurso].

Todavia, foi a própria Impugnante e ora Recorrente que informou que o estabelecimento comercial que explora é um estabelecimento misto, com a área global de venda de 3 935 m2 (2 360 + 1 575), dos quais 2360 m2 constituem a área afeta a comércio alimentar.

Ora, tal como se decidiu no já citado acórdão deste TCAS de 2023.06.01, no Proc nº 2579/19.5BELRS: «de acordo com a interpretação conjugada que fazemos dos [artigos 1º, 2º e 5º da Portaria 215/2012, de 17 de julho] e que nos parece a mais plausível, nos casos em que o sujeito passivo comunica aos serviços administrativos competentes que a área do estabelecimento afecta a comércio alimentar é de [2630] m2, indo mais além do dever declarativo imposto no n.º 4 do art.º 5.º e n.º 3 do art.º 10.º da Portaria 215/2012, que apenas obriga à comunicação da área de venda do estabelecimento (art.º 5.º, n.º 2 al. d) e n.º 4), não há lugar à aplicação dos coeficientes de ponderação previstos no art.º 1.º da Portaria n.º 200/2013.
E o sujeito passivo tem todo o interesse em colaborar com os serviços administrativos competentes comunicando logo a área do estabelecimento afecta a comércio alimentar, como fez a recorrente, pois desse modo vê essa área determinada com base na declaração e não por via presumida ou ficcionada a partir da área de venda do estabelecimento, sendo certo que o legislador tributário dá clara preferência à declaração na quantificação dos factos tributários (art.º 83.º da Lei Geral Tributária).
Agora o que a recorrente não pode é ver artificialmente minguada essa quantificação por via da pretendida aplicação à área do estabelecimento afecta a comércio alimentar que comunicou, do coeficiente de ponderação estabelecido em razão da comunicação da área de venda do estabelecimento.

Ao contrário do alegado pela Recorrente não se suscitam quaisquer dúvidas sobre o facto tributário que permitisse o recurso ao disposto no artigo 100º do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) conducente à anulação do ato tributário nem vislumbramos qualquer diligência que deveria ter sido ordenada e que fundamente o alegado déficit instrutório porquanto, reitera-se, não se suscitam quaisquer dúvidas sobre quanto à existência ou quantificação do facto tributário.

Os argumentos da Impugnante e ora Recorrente quer quanto à sua inserção num grupo que utiliza a mesma insígnia quer quanto à área a considerar afeta a comércio alimentar, nos termos expostos, não podem proceder, desde logo, por a área a considerar ser superior a 2000m2, não se verificando desde logo os pressupostos para ser enquadrada no regime de isenção, como defende.

Vejamos ainda quanto à alegada carência da fundamentação do ato tributário de liquidação, por ambiguidade ou obscuridade.

Tal como alega a Recorrente, o direito à fundamentação tem consagração constitucional no artigo 268/3 da Constituição da República Portuguesa (CRP): os atos administrativos estão sujeitos a notificação aos interessados, na forma prevista na lei, e carecem de fundamentação expressa e acessível quando afetem direitos ou interesses legalmente protegidos. Este princípio encontra-se densificado quanto aos atos tributários no artigo 77º da Lei Geral Tributária (LGT), que no nº 1 diz: A decisão de procedimento é sempre fundamentada por meio de sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, podendo a fundamentação consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, incluindo os que integrem o relatório da fiscalização tributária.

Como é consabido e alegado pela Impugnante e ora Recorrida, a fundamentação formal dos atos tributários tem de ser expressa, clara, suficiente e congruente. Assim, e como é jurisprudência pacífica e assente dos Tribunais Superiores em incontáveis acórdãos, da qual citamos apenas o Acórdão STA de 2018.03.14, proferido no processo nº 0512/17 Disponível em www.dgsi.pt, a fundamentação deve ser contextual e integrada no próprio ato (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa e acessível (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do ato um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação), equivalendo à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato.

Tal como se entendeu na sentença recorrida «A jurisprudência do STA tem-se debruçado, repetidamente, sobre esta matéria concluindo que "O acto só está fundamentado quando, pela motivação aduzida, se mostra apto a revelar a um destinatário normal as razões de facto e de direito que determinaram a decisão, habilitando-o a reagir eficazmente pelas vias legais contra a respectiva lesividade, caso com a mesma se não conforme" e, ainda, que “Variando a densidade da fundamentação em função do tipo legal de acto e das suas circunstâncias, é aceitável uma fundamentação menos densa de certos tipos de actos, considerando-se suficiente tal fundamentação desde que corresponda a um limite mínimo que a não descaracterize, ou seja, fique garantido o “quantum” indispensável ao cumprimento dos requisitos mínimos de uma fundamentação formal: a revelação da existência de uma reflexão e a indicação das razões principais que moveram o agente" ( Vide Acórdãos do STA de 05/06/02 no recurso 43085 e 13/04/00, no recurso nº 31616).
Em ambos os casos, trata-se de afirmar um princípio adquirido no âmbito do contencioso administrativo, que consagra o carácter relativo da fundamentação, a variar conforme os casos e as situações, mas visando sempre dar a conhecer ao destinatário o que se decidiu e porque se decidiu assim.
Em sede de Direito Tributário a necessidade de fundamentar os actos tributários encontra-se plasmada no art. 77º da LGT.
O acto de liquidação da taxa em apreço nos autos é um acto tributário pelo que deve encontra-se devidamente fundamentado nos termos supra citados, permitindo ao seu destinatário conhecer as razões de facto e de direito que levantar a ser proferido aquele acto concreto.

Volvendo ao caso dos autos, e se bem entendemos o alegado, a insuficiência da fundamentação arguida pela Recorrente prende-se com a falta de indicação dos motivos pelos quais a ora Recorrente foi sujeita a tributação apesar de, como sempre veio defendendo durante a lide, a área afeta a alimentação do estabelecimento que explora ter área inferior à legalmente prevista naquele normativo.

No texto do ofício que externaliza o ato tributário impugnado parcialmente transcrito no ponto 4) da matéria de facto levada ao probatório são indicadas as normas legais que criaram a Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM), o valor da taxa aplicável, fixada em € 7 por metro quadrado fixado na Portaria nº 326/2018, de 14 de dezembro, que as áreas do estabelecimento a considerar são as informadas pelo sujeito passivo, tendo sido tomado em consideração a área afeta a comércio alimentar informada, o montante global da TSAM, que consta das faturas em anexo os montantes do fracionamento em duas prestações e que delas também consta a data limite de pagamento.

Da fatura relativa à primeira prestação da taxa respeitante ao ano de 2019 aqui impugnada transcrita nas alíneas 3. e 3-A, com data limite de pagamento de 2019.07.26, apesar de se fazer referência à área de venda e não à área afeta a comércio alimentar, esta tem o mesmo valor da área de venda ponderada, e ambos os valores indicados correspondem à área de venda afeta a comércio alimentar comunicada pelo sujeito passivo, o que conjugado com a informação constante do ofício que acompanhou as faturas de ter sido considerada a área afeta a comércio alimentar informada, resulta para um destinatário médio que a área do estabelecimento referenciada é a que se encontra afeta a comércio alimentar, não havendo, pois, ainda lugar à aplicação do coeficiente de ponderação presumido.

Não tem pois, razão a ora Recorrente, foram indicadas as normas legais, a área considerada e sobre a qual incide a taxa e o montante desta, e a data limite de pagamento. Não procede, pois, a argumentação expandida relativa à insuficiência da fundamentação.

A sentença recorrida não merece, pois, a crítica que lhe foi feita e é de manter.

Em face do exposto, improcede o recurso.




Sumário/Conclusões:

I. - Um grupo de empresas define-se pelas relações jurídicas, económicas e financeiras que empresas estabelecem com uma empresa do grupo – a empresa dominante – como formas de concentração na pluralidade em que duas ou mais empresas ficam submetidas a uma direção comum, sendo irrelevante que existam ou não relações entre as empresas submetidas à direção comum.
II. - No que à taxa de segurança alimentar mais diz respeito trata-se apenas de uma denominação de – grupo – em que o legislador, ciente do aumento crescente de contratos de franchising ou que conduzem ao mesmo resultado de parcelamento do espaço de venda, pretende a responsabilização pelo pagamento da taxa reportado à globalidade do espaço de venda da empresa franchisadora que o faz pulverizar em múltiplas empresas franchisadas.
III. - A taxa poderia ter sido aplicada à empresa franchisadora, mas o seu recorte teria que ser diverso do que é efetuado para cada empresa em concreto. A opção legislativa encontrada faz com que o mesmo modelo possa ser aplicado a cada empresa concreta, com o espaço de venda que detém, sem deixar de ter em conta o total espaço de venda nacional que corresponde, neste caso à utilização da mesma insígnia.
IV. - Não exige a lei que esteja estabelecida qualquer relação jurídica, comercial ou financeira entre a impugnante e cada uma das empresas que utilizam a mesma insígnia para cálculo da área total de venda que corresponde a essa utilização, bastando a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia – artigo 3.º, n.º 5 da Portaria nº 215/2012: considera-se «grupo» o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação decorrentes da utilização da mesma insígnia ou de direitos ou poderes, nos termos previstos na alínea o) do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de Janeiro.
V. - Se o sujeito passivo comunica à DGAV a área do seu estabelecimento afecta ao comércio alimentar, é a totalidade dessa área que serve de base à quantificação do facto tributário e não a que resulta dos coeficientes de ponderação sobre a área de venda do estabelecimento, previstos no art.º 1.º da Portaria n.º 200/2013, de 31 de Maio.
VI. - O acto tributário considera-se devidamente fundamentado se contém uma imprecisão (refere “área de venda”, quando deveria referir área de venda afecta a comércio alimentar), mas contextualmente o seu sentido resulta claro e acessível a um destinatário médio.


III - DECISÃO

Nos termos expostos, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente, que decaiu.

Lisboa, 13 setembro de 2023

Susana Barreto

Vital Lopes

Tânia Meireles da Cunha