Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1657/19.4 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/19/2023
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:RCO
TAXA DE JUSTIÇA
Sumário:I – Apesar de o RCP não estabelecer consequência para a falta de pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso da decisão da autoridade administrativa, a verdade é que essa omissão tem vindo a ser suprida pela jurisprudência no sentido de que a mesma (a falta de pagamento da taxa de justiça) não conduz à rejeição do recurso, sem que antes o recorrente seja notificado para efetuar o pagamento omitido acrescido da multa devida.

II - O pagamento da taxa de justiça inicial é prévio à apreciação de quaisquer questões.

Votação:UNANIMIDADE
Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul


I – RELATÓRIO

JOSÉ MARIA FABIÃO RIBEIRO, melhor identificado nos autos, interpôs recurso judicial das decisões de aplicação de coimas e de fixação de custas administravas proferidas nos processos de contraordenação (PCO) autuados sob os n.ºs …………….150, ……………..270, ……………..655, …………………..173, ………………..440 e ……………433, que contra si foram instaurados no Serviço de Finanças de Lisboa-3, por alegada falta de apresentação das declarações periódicas do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) relativas ao 3.º trimestre de 2013, aos 2.º, 3.º e 4.º trimestres de 2014 e aos 1.º e 2.º trimestre de 2016, respetivamente, em violação do disposto nos artigos 29.º, n.º 1, alínea c), e 41.º, n.º 1, alínea b), do Código do IVA (CIVA), infrações previstas e punidas pelo artigo 116.º, n.º 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT).

O Tribunal Tributário de Lisboa, perante a falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça, rejeitou o recurso e determinou o desentranhamento da petição. Mais declarou a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide.

Inconformado, o arguido, José Maria Fabião Ribeiro, veio recorrer contra a referida decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

1. Foi proferida sentença, com a qual não pode o recorrente colher entendimento e não pode colher entendimento, porque na simples natureza da decisão, encontra- se a mais censurável violação do Principio da Primazia da Materialidade sobre a Forma, para tanto nos remetendo para o supra alegado e em particular para Marcelo Rebelo de Sousa e André Salgado de Matos, 2 Direito Administrativo Geral, Tomo I, 3a edição, pag. 221 e seguintes.

2. Com relevo para o recurso da decisão surpresa ora em crise temos que, foi entendimento do douto Tribunal a quo, não se pronunciar sobre as duas questões prévias acidentais: Prescrição e apensação,

3. Perante a postura processual do arguido recorrente que nunca se recusou ao pagamento das mesmas, caso viesse esse a ser o entendimento do douto Tribunal após se pronunciar de mérito sobre as questões controvertida,

4. O que nunca veio a ocorrer por parte deste douto Tribunal.

5. Consistindo o despacho decisão proferido uma verdadeira decisão surpresa enferma de vício de violação de Lei, e porquanto deverá a mesma se considerada nula, bem como nulo todo o processado subsequente, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais.

6. Quando ao invés, competia outrossim ao douto Tribunal, ter notificado o recorrente para vir aos autos pronunciar-se sobre a intenção de decisão do douto Tribunal a quo, para o recorrente arguido exercer contraditório mas sabendo que nunca o douto Tribunal a quo se iria pronunciar, como aliás deverias, sobre as questões prévias incidentais,

7. O que nunca ocorreu.

8. E que de per si constitui nulidade suficiente, por falta de decisão, para determinar a procedência por provada do presente recurso, o que desde já se arguiu para todos os devidos efeitos legais.

9. Porém, não o fez o douto Tribunal e ao invés de ser instrumento auxiliar e de aplicação da JUSTIÇA, perante um cidadão (que procura na douta JUSTIÇA (Tribunais) a resolução de um problema, in casu, veio originar um problema acrescido com a violação do exercício do Direito de Contraditório, Constitucionalmente previsto.

10. O convite ao exercício do contraditório é uma incumbência do juiz, isto é, um seu dever funcional e consequentemente a omissão desse ato devido, influindo no exame e decisão da causa, implica a nulidade da sentença nos termos dos n°s 1 e 2 do art. 195° do Código de Processo Civil, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais.

11. Assim e na verdade, ao agir em forma totalmente contrária quer à Lei quer à própria jurisprudência dominante, mais encetou o douto Tribunal a quo na promoção de uma decisão surpresa, não fundamentada por não pronuncia sobre as duas questões controvertidas prévia e acidentais, o que representa uma obstaculização à participação efectiva que foi negada ao recorrente com o indeferimento promovido pelo douto Tribunal a quo, razão pela qual e de per si, deverá também conduzir à nulidade da sentença proferida, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais, em estrito cumprimento da tão douta e costumada JUSTIÇA!


*


O Ministério Público, notificado para os termos e efeitos do disposto no artigo 413º do CPP, apresentou resposta que finalizou com as seguintes conclusões:

1. Alega o Recorrente, em suma, que o Tribunal a quo proferiu decisão surpresa e violou o princípio do contraditório, porquanto não apreciou as questões prévias suscitadas, relativas à prescrição e apensação, pelo que deve a decisão proferida ser anulada e substituída por outra que, de facto e de direito, determine a pronuncia de mérito sobre as duas questões controvertidas

2. A falta de pagamento da taxa de justiça consubstancia uma exceção dilatória inominada que obsta ao conhecimento de mérito, nos termos do disposto no artigo 576º, do CPC.

3. Ora, o Recorrente não juntou aos autos comprovativo do pagamento da taxa de justiça em falta, acrescida da respetiva multa, nos termos do disposto nos nºs 7 e 8, do artigo 8º, do Regulamento das Custas Processuais, não obstante ter sido advertido, mais de uma vez, que, não o fazendo, haveria lugar, definitivamente, ao desentranhamento e devolução da petição de recurso, nos termos do disposto nos artigos 145º, nº 3, e 642º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aplicáveis ex vi artigos 3º, alínea b) do RGIT, 41º do RGCO e 4º do CPP.

4. Perante a omissão do pagamento da taxa de justiça em falta, e após sucessivas notificações para o efeito, foi, em estrito cumprimento da lei, e atentas as disposições legais supra citadas, julgada verificada a exceção dilatória inominada de falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça e, consequentemente, ordenado o desentranhamento e devolução das petições de recurso apresentadas, declarada a instância extinta por impossibilidade superveniente da lide e condenado o Recorrente pelas custas processuais.

5. Assim sendo, e face ao supra exposto, a douta sentença ora recorrida não padece de qualquer vício ou censura, devendo a mesma, consequentemente, ser mantida na íntegra na ordem jurídica. Porém, V. Exas. farão como sempre JUSTIÇA!


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O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de o recurso não merecer provimento.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência.

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Como é sabido, são as conclusões das alegações do recurso que definem o respetivo objeto e consequente área de intervenção do Tribunal ad quem, com a ressalva para as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr. artigo 412.º n.º 1, do CPP, aplicável “ex vi” do artigo 3.º al. b), do RGIT e do artigo t74.º n.º 4, do RGCO).

No caso sub judice, não obstante a forma menos clara como a alegação vem feita, consideramos que as questões suscitadas são as de saber se:

- a decisão recorrida padece de nulidade por violação do princípio do contraditório, por falta de notificação da intenção de rejeição do recurso e, nessa medida, por consistir numa decisão-surpresa;

- a decisão é nula por não ter apreciado as questões da apensação e da prescrição;

- o tribunal incorreu na violação do princípio da primazia da materialidade sobre a forma.


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II - FUNDAMENTAÇÃO

- De Facto

Com interesse para a decisão, é o seguinte o circunstancialismo processual relevante:

A - Em 07/10/16, em 25/09/16, em 17/10/14, em 03/10/14, em 02/05/15 e em 07/01/15 foram proferidas as decisões administrativas de fixação da coima nos processos de contraordenação m.i no introito supra, relativamente às quais foram apresentados recursos judiciais

B – Em 01/02/21, no TT de Lisboa foi proferido o despacho de admissão do recurso judicial.

C - Em 19/10/21 foi proferido o seguinte despacho judicial:

“De harmonia com o disposto no artigo 64.º, n.º 2, do RGCO, subsidiariamente aplicável por via do artigo 3.º, alínea b), do RGIT, notifique a Recorrente e o Ministério Público para, no prazo de 10 dias, virem aos autos deduzir oposição a que o presente recurso judicial de decisão de aplicação de coima e de fixação de custas administrativas seja decidido mediante despacho, com a advertência de que o silêncio será valorado como não oposição”.

D – Em 2/12/21, foi proferido o seguinte despacho:

“Notifique novamente o Recorrente para, no prazo de 10 dias, juntar aos autos o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, sob pena de, não o fazendo, haver lugar às cominações previstas na lei para a falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça (cfr. artigos 145.º, n.º 3, e 642.º do CPC)”.

E - Em 28/02/22, não tendo sido dado cumprimento ao determinado no despacho referido no ponto precedente, foi proferido o seguinte despacho:

“Notifique o Recorrente para, no prazo de 10 dias, juntar aos autos os comprovativos do pagamento da taxa de justiça que se mostra devida (cfr. artigo 8.º, n.º 7 e 8 do Regulamento das Custas Processuais) e do pagamento de multa de montante igual ao da taxa de justiça, sob pena de, não o fazendo, haver lugar, definitivamente, ao desentranhamento e devolução da petição de recurso (cfr. artigos 145.º, n.º 3, 642.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil)”

F – Em 27/03/22, o Recorrente apresentou nos autos um requerimento com o seguinte teor:

“José Maria Fabião, recorrente nos autos supra indicados e nos mesmos melhor identificado, vem expor e consequentemente requerer, o que o faz nos seguintes termos e demais fundamentos:

1. Vem o arguido notificado para pagamento de taxa de justiça e de penalidade processual.

2. Contudo, excepção processual existe previamente, de reconhecimento oficioso,

3. Que poderá determinar a isenção do pagamento da guia ora notificada.

4. Assim e para todos os devidos efeitos legais, vem o recorrente arguir a prescrição.

5. Dispõe o artigo 27.º do Regime Geral das Contraordenações que: “O procedimento por contra-ordenação extingue-se por efeito da prescrição logo que sobre a prática da contra-ordenação

hajam decorrido os seguintes prazos:

a) Cinco anos, quando se trate de contra-ordenação a que seja aplicável uma coima de montante

máximo igual ou superior a (euro) 49879,79;

b) Três anos, quando se trate de contra-ordenação a que seja aplicável uma coima de montante

igual ou superior a (euro) 2493,99 e inferior a (euro) 49879,79;

c) Um ano, nos restantes casos.”.

6. Por outro lado, a prescrição, enquanto facto extintivo da responsabilidade penal e igualmente por maioria de razão, da responsabilidade contraordenacional, é de conhecimento oficioso pelo que não necessita de ser invocada, devendo ser declarada ex oficio.

7. O que ora respeitosamente se requer para todos os devidos efeitos legais”.

G - Em 09/05/22 os autos foram com vista ao EMMP, o qual se pronunciou nos seguintes termos:

“Não documentam os autos o pagamento da taxa de justiça, a que se referem os nºs 7 e 8, do artigo 8º do RCP. Efetuada, mais de uma vez, a notificação a que se refere o nº 1, do artigo 642º, do CPC, (aplicável ex vi artigo 41º, do RGCO e artigo 4º, do CPP), com as cominações aí previstas, constata-se que o pagamento ali referido não se mostra realizado. Deste modo, o Ministério Público pronuncia-se no sentido de os presentes autos não poderem prosseguir a sua ulterior tramitação, devendo, designadamente, ser desentranhada e devolvida a petição de recurso apresentada pelo Recorrente”.


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- De Direito

Vem o presente recurso interposto de decisão proferida pelo TT de Lisboa, em 17/05/22, de não admissão do recurso de decisões administrativas de aplicação de coimas por falta de pagamento da taxa de justiça devida.

O Recorrente insurge-se contra a decisão, defendendo que se mostra violado o princípio do contraditório por falta de notificação da intenção de rejeição do recurso. Sustenta que a decisão contestada é nula, pois deveria o juiz ter conhecido as questões da apensação e da prescrição. Para o Recorrente, a decisão posta em crise é uma verdadeira “decisão surpresa”. Importará ainda aferir se o tribunal incorreu na violação do princípio da primazia da materialidade sobre a forma.

As questões que aqui nos ocupam coincidem exatamente com as que foram recentemente apreciadas no processo nº 1017/21BESNT, cujo acórdão foi proferido no dia 04/10/23. Diga-se, de resto, que é absolutamente idêntico o teor das conclusões formuladas nesse recurso e daquelas que aqui nos ocupam.

Assim sendo, por não virem colocadas questões novas e por concordarmos com a análise feita no referido acórdão deste TCA Sul (no qual, de resto, tivemos intervenção também), passaremos a seguir, transcrevendo, o que aí se escreveu. Assim:

“Vejamos antes de mais o direito aplicável.

Decorre do n.º 7 do artigo 8.º do Regulamento das Custas Processuais (RCP) que é devida taxa de justiça pela impugnação das decisões de autoridades administrativas, no âmbito de processos de contraordenação, no montante de 1 UC, podendo ser corrigida a final pelo juiz.

Por sua vez, o n.º 8 do mesmo dispositivo legal, determina que a taxa de justiça é autoliquidada, assim que o arguido seja notificado da data de marcação da audiência de julgamento ou do despacho que a considere dispensada.

Porém, apesar de o RCP não estabeleça a consequência para a falta de pagamento da taxa de justiça devida pela interposição do recurso da decisão da autoridade administrativa, a verdade é que essa omissão tem vindo a ser suprida pela jurisprudência no sentido de que a mesma (a falta de pagamento da taxa de justiça) não conduz à rejeição do recurso, sem que antes o recorrente seja notificado para efetuar o pagamento omitido acrescido da multa devida, nos termos das disposições conjugadas do artigo 41.º do Regime Geral das Contraordenações (RGCO), do artigo 4.º do Código de Processo Penal (CPP) e do artigo 642.º do Código de Processo Civil (CPC), por aplicação subsidiária.

Com efeito, o artigo 41.º n.º 1 do RGCO refere que os preceitos reguladores do processo criminal, são aplicáveis subsidiariamente ao processo de contraordenação e, por sua vez, o artigo 4.º do CPP, determina que nos casos omissos, observam-se as normas do processo civil que se harmonizem com o processo penal.

Estando em apreço um recurso, significa que a regime atinente ao pagamento da taxa de justiça deve observar o estatuído no CPC sobre matéria dos recursos.

Assim, ao abrigo do n.º 1 do artigo 642.º do CPC, face à omissão de pagamento da taxa de justiça devida pelo recurso, o interessado deve ser notificado para efetuar o pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante, mas não inferior a 1 UC, nem superior a 5 UC.

Significa isto, que no caso em apreço, o Recorrente deveria ter sido notificado para pagar a taxa de justiça omitida, acrescida de multa de igual montante.

Situação que, ocorreu, conforme resulta da materialidade relevante, supra elencada”.

Senão vejamos, tal como resulta da matéria de facto:

- em 02/12/21, foi proferido o seguinte despacho: “Notifique novamente o Recorrente para, no prazo de 10 dias, juntar aos autos o comprovativo do pagamento da taxa de justiça, sob pena de, não o fazendo, haver lugar às cominações previstas na lei para a falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça (cfr. artigos 145.º, n.º 3, e 642.º do CPC)”;

- não tendo sido dado cumprimento ao determinado no despacho supra transcrito, em 28/02/22 foi proferido o seguinte despacho: “Notifique o Recorrente para, no prazo de 10 dias, juntar aos autos os comprovativos do pagamento da taxa de justiça que se mostra devida (cfr. artigo 8.º, n.º 7 e 8 do Regulamento das Custas Processuais) e do pagamento de multa de montante igual ao da taxa de justiça, sob pena de, não o fazendo, haver lugar, definitivamente, ao desentranhamento e devolução da petição de recurso (cfr. artigos 145.º, n.º 3, 642.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil)”

Temos, pois, que o arguido foi instado pelo Tribunal a pagar a taxa de justiça, num primeiro momento, tendo-lhe, aí, sido concedido o prazo de 10 dias para proceder ao referido pagamento, no montante de 1 UC, tudo conforme se preceitua no artigo 8.º, n.ºs 7 e 8, do RCP; depois, como o pagamento não ocorreu, foi proferido novo despacho a determinar a realização do pagamento omitido, desta vez acrescido de multa de igual montante, e com a cominação de, não o fazendo, ser proferido despacho de desentranhamento da petição de recurso.

Tal como no acórdão que vimos seguindo, trata-se de “Situação de que o recorrente mostrou ter tido conhecimento porque respondeu, rebatendo com entendimento da existência de duas questões controvertidas pré-existentes que, arguiu, poderem determinar o não pagamento de taxa de justiça, nomeadamente a invocada prescrição e a requerida apensação.

Mas não lhe assiste razão, desde logo, porque, como bem refere o digno Magistrado do Ministério Publico junto deste TCAS no seu mui douto parecer, a que, por concordância e facilidade aderimos e aqui apelamos, em parte alguma a lei possibilita o diferimento do pagamento da taxa de justiça inicial em recurso de contraordenação para momento posterior à decisão relativamente a eventuais questões prévias ou exceções que sejam suscitadas antes da notificação para julgamento ou da decisão que o considere desnecessário.

Como se disse e a sentença recorrida também o refere, o pagamento da taxa de justiça inicial é prévio à apreciação de quaisquer questões, termos em que improcedem nesta parte as suas alegações recursivas

Vejamos agora o que se nos apraz dizer quanto à invocada violação do princípio do contraditório.

Dispõe o n° 3 do artigo 3° do Código de Processo Civil que:

"O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem."

Ora, em face ao que supra deixamos referido, não vemos e o arguido também não o diz, em que medida é que na presente situação o princípio do contraditório pode ter sido violado uma vez que o segundo despacho proferido pelo TAF de Sintra a determinar o pagamento da taxa de justiça em falta foi expressa como cominação, o sentido da decisão que iria ser proferida em caso de inobservância do que nele se determinava, ou seja diz-se ali claramente que de “notifique o Recorrente para vir aos autos proceder ao pagamento omitido, acrescido de multa de igual montante, com a cominação de, não o fazendo, ser proferido despacho de desentranhamento do requerimento de recurso”, circunstância de que o recorrente teve conhecimento, já que, repete-se, respondeu à notificação.

Termos em que, como, mais uma vez, bem refere o digno PGA, “era manifesta a desnecessidade de notificação do mesmo para exercer o contraditório a cuja falta imputa o vício de nulidade.”

Também não se verifica a ocorrência de qualquer (leia-se, violação da) prevalência do princípio da materialidade sobre a forma, porquanto ao juiz estava legalmente vedada a possibilidade de protelar o pagamento da taxa de justiça para momento ulterior.

Arrematando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá no dispositivo”.

O que acabámos de transcrever é aqui inteiramente aplicável, com as adaptações necessárias, pelo que nos abstemos de maiores considerações.

Impõem-se, contudo duas notas finais.

A primeira para dizer que, tal como consta da decisão ora recorrida, aí ficou consignado que “os recursos foram liminarmente admitidos e, assim, a serem tramitados como um só”, pelo que a questão da apensação nem se coloca, nos termos em que o Recorrente o fez.

A segunda para dizer que, para além de ter ordenado o “desentranhamento e devolução, ao Recorrente, das petições de recurso das decisões de aplicação de coimas”, o tribunal declarou a “instância extinta, por impossibilidade superveniente da lide”.

Tal inutilidade vem justificada, conforme se retira da decisão, deste modo: “no presente recurso de decisões de aplicação de coimas e de fixação de custas administrativas, será ordenado o desentranhamento e devolução, ao Recorrente, das petições de recurso, por falta de comprovação do pagamento da taxa de justiça, nos termos das normas do artigo 642.º do CPC. O processo judicial vive na umbilical dependência da existência de uma petição inicial, da qual resulte um pedido assente em causas de pedir, pelo que, concretizado o desentranhamento da mesma, ficará o processo privado do seu objecto. Por este motivo, o processo tornar-se-á impossível, por falta de objecto”. Como se percebe, trata-se de um esteio do segmento decisório que não tem justificação, que não deve manter-se e que, salvo o devido respeito, encerra alguma confusão de conceitos. A impossibilidade superveniente da lide pressupõe justamente uma lide que, apesar de regularmente iniciada, acaba extinta por um acontecimento posterior que a torna impossível, concretamente por perda do seu objeto. Não é o caso dos autos, seguramente.

O que aqui sucedeu, nos termos expostos já, é que foi ordenado o desentranhamento e devolução da petição de recurso, por falta de pagamento da taxa de justiça e multa e, por isso, nada mais o Tribunal podia conhecer.

Nessa medida, sem que tal colida com o decidido e aqui já confirmado, deve ter-se por não escrito este segundo segmento decisório da sentença sob recurso.

Face a todo o exposto, e com a precisão que acabámos de fazer, confirma-se o decidido e nega-se provimento ao recurso.


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III- DECISÃO

Termos em que, acordam os juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais, da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso.

Dá-se por não escrito o segmento decisório que dispunha quanto à extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide.

Custas pelo Recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 19/10/23


Catarina Almeida e Sousa

Isabel Fernandes

Hélia Gameiro Silva