Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1102/12.6 BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:10/04/2023
Relator:LURDES TOSCANO
Descritores:PRETERIÇÃO DE AUDIÇÃO PRÉVIA
APROVEITAMENTO DO ACTO ADMINISTRATIVO
Sumário:I - A audição do responsável subsidiário é a concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no n.º 4 do artigo 267.º da CRP tendo a sua densificação no artigo 100.º do CPA, artigo 60.º da LGT e artigo 23.º n.º 4 da LGT.
II - Destinando-se a audiência dos interessados a permitir a sua participação nas decisões que lhes digam respeito (cfr. artigo 267.º n.º 5 da CRP), contribuindo para um cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão, a omissão dessa audição constitui preterição de uma formalidade legal conducente à anulabilidade da decisão (cfr. artigo 163.º n.º 1, do CPA).
III - A possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do acto deve ser apreciada casuisticamente através da análise das circunstâncias particulares do caso concreto. Deste modo, há que aferir se, no caso sob análise, a decisão não poderia de forma alguma ser influenciada pela participação do interessado.
IV - Na verdade, a potencial participação do revertido na fase anterior à prolação de despacho de reversão era suscetível de alteração da decisão que foi proferida, até porque poderia juntar elementos de prova, bem como requerer a produção de outros meio de prova relevantes para a tomada dessa decisão. Assim sendo, in casu, não é manifesto que a decisão de reversão da execução fiscal, em abstrato, não podia ser outra da que foi tomada no caso concreto, e por isso se impunha, o seu aproveitamento.
Indicações Eventuais:Subsecção de execução fiscal e de recursos contra-ordenacionais
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública, veio, em conformidade com o artigo 282.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, recorrer da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, a qual julgou procedente a oposição judicial apresentada por J........, no âmbito do processo de execução fiscal n.º …….71 e apensos, que correu termos no Serviço de Finanças de Lisboa 10, para cobrança da quantia exequenda de € 97.210,63, proveniente de dívidas de IRS do ano de 2007, IRC dos anos 2003 e 2005, IVA do ano de 2006 e coimas dos anos de 2007 e 2008, das quais é devedora originária a sociedade S........., Lda.

A Recorrente termina as alegações do seu recurso formulando as conclusões seguintes:
«A- Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos à margem melhor identificados, que julgou procedente a oposição judicial apresentada por J........, anulando o despacho de reversão.
B- A questão na qual diverge esta Fazenda Publica prende-se com o facto de o tribunal a quo ter entendido que não se efetivando a presunção estabelecida no nº 1 do art.º 39º do CPPT, tal por si só, conduziria à anulação do despacho de reversão sem ponderar, no caso concreto, se a omissão dessa audição constitui preterição de uma formalidade legal conducente à anulabilidade da decisão (cfr. art.º 163.º, n.º 1, do CPA), ou se se impunha, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do ato administrativo.
C- J……, contribuinte fiscal n.º ……21, veio deduzir oposição à execução fiscal, no âmbito do processo de execução fiscal n.º ………71 e apensos, que correu termos no Serviço de Finanças de Lisboa 10, para cobrança da quantia exequenda de € 97.210,63, proveniente de dívidas de IRS do ano de 2007, IRC dos anos 2003 e 2005, IVA do ano de 2006 e coimas dos anos de 2007 e 2008, das quais é devedora originária a sociedade S........., Lda.
D- Alegou, em síntese, em sede de Petição Inicial, que foi nomeado gerente da sociedade devedora originária, não tendo exercido a gerência de facto, uma vez que sempre residiu com caracter de permanência em Espanha, Estado onde declara a totalidade dos seus rendimentos. Alegou ainda que, não foi citado para exercer o seu direito de audição prévia na presente reversão.
E- Tratando-se de efetivar a responsabilidade subsidiária em processo de execução fiscal, como era o caso, prescreve o n° 4 do art.º 23° da LGT que a reversão será precedida da audição do responsável subsidiário.
F- No caso vertente, ao Oponente, ora Recorrido, foi-lhe remetido, por carta registada, comunicação denominada “notificação audição prévia (reversão)” [cfr. alínea D. dos factos provados], tendo a referida comunicação sido devolvida com a indicação “desconhecido” [cfr. alínea E. dos factos provados].
G- Ora, não obstante o órgão de execução fiscal não ter repetido a notificação, tal omissão, no presente caso em concreto, não poderia conduzir à anulação do despacho de reversão, tout court, impondo-se antes, salvo melhor opinião, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do ato administrativo.
H- A possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do ato exige, assim, um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso, com vista a aferir, num juízo de prognose póstuma, se se está ou não perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do órgão de execução fiscal ser influenciada pela participação do interessado.
I- Sendo controvertida a questão do exercício da gerência de facto do oponente na sociedade originariamente devedora, fácil se denota que a Administração Tributária tinha, já à data do projeto de reversão, diversos documentos assinados pelo oponente, ora recorrido, enquanto gerentes da dita sociedade, vinculando-a perante terceiros, facto este que veio a ser corroborado em sede de inquirição de testemunhas na presente ação de oposição, pelo que, mesmo que o oponente tivesse exercido o seu direito de audição, em nada alteraria a posição assumida pelo órgão de execução fiscal.
J- Pelo que, não pode, salvo respeito por entendimento diverso, anular-se o despacho de reversão, por si só, sem fazer o muito famigerado, juízo de prognose póstuma, ao contrário do entendido pelo tribunal a quo.
K- Conclui-se, portanto, que a defesa do contribuinte não ficou precludida por tal irregularidade, não devendo o despacho de reversão ser anulado, impondo-se, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do ato administrativo.
L- Assim, não tendo a sentença do Tribunal a quo conhecido as restantes questões levantadas pelo ora recorrido, por as considerar prejudicadas pela solução encontrada, sendo a sentença revogada pelo Acórdão proferido pelo TCA, deverão os presentes autos baixar àquele Tribunal para que essas questões sejam conhecidas, pois toda a prova deve ser reapreciada e devidamente selecionada o que só poderá ser efetuado por aquele Tribunal,
M- Dando assim por satisfeito o objetivo do duplo grau de jurisdição, e a não prolação de “decisões surpresa” uma vez que em momento algum será coatado o exercício do direito ao contraditório.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a oposição improcedente, quanto à matéria aqui discutida, devendo ser ordenada a remessa dos autos ao tribunal recorrido para que sejam conhecidas as questões cujo conhecimento ficou omitido. PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA»

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O Recorrido, J………., devidamente notificado do recurso interposto, apresentou contra-alegações onde formulou as seguintes conclusões:

«1. Vem o presente Recurso interposto da Sentença proferida nos autos, nos termos do qual o Tribunal a quo, oficiosamente, se pronunciou e julgou a Oposição procedente, e em consequência, determinou a anulação do despacho de reversão proferido no âmbito do processo de execução fiscal n.º ……..71 e apensos, que correu termos no Serviço de Finanças de Lisboa 10, para cobrança da quantia exequenda de EUR 97.210,63 (noventa e sete mil, duzentos e dez euros e sessenta e seis cêntimos), proveniente de dívidas de IRS do ano de 2007, IRC dos anos 2003 e 2005, IVA do ano de 2006 e coimas dos anos de 2007 e 2008, das quais é devedora originária a sociedade S........., Lda., e condenou a Recorrente no pagamento das custas processuais.
2. Vem a douta Sentença decidir que, no caso sub judice, "Assim, verifica-se que a notificação para o exercício da audição prévia não chegou ao conhecimento do Oponente. A falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia do revertido, ora Oponente, configura um vício de forma do procedimento tributário, que conduz à anulação do despacho de reversão. Nestes termos, procede o argumento do Oponente”.
3. Decisão essa também perfilhada pela Exma. Magistrada do Ministério Público, conforme consta do respetivo parecer junto aos autos.
4. No entanto, a Recorrente considera que a Sentença ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correta apreciação dos factos pertinentes para efeitos de decisão.
5. No essencial, a Recorrente pretende fazer valer o princípio do aproveitamento do ato administrativo.
6. Cremos que a Recorrente ignora o facto de que o exercício do direito de audição em sede de reversão possui dois efeitos fundamentais: numa primeira hipótese, o visado poderá demonstrar, desde logo, perante a Administração Tributária que não existe qualquer fundamento para a pretendida reversão e, em consequência, o processo será extinto. Ou então a Administração Tributária não retira qualquer ilação da audição prévia realizada e faz prosseguir o processo de reversão.
7. Recorde-se que a audição do responsável subsidiário é a concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no n.º 4 do artigo 267.º da CRP tendo a sua densificação no artigo 100.º do CPA, artigo 60.º da LGT e artigo 23.º n.º 4 da LGT.
8. Assim, o direito de audiência prévia de que goza o administrado incide sobre o objeto do procedimento: estando em preparação uma decisão, a comunicação feita ao interessado para o exercício do direito de audiência deve informá-lo do projeto da mesma decisão, da sua fundamentação, do prazo em que o mesmo direito pode ser exercido e da possibilidade de exercício do citado direito por forma oral ou escrita.
9. Destinando-se a audiência dos interessados a permitir a sua participação nas decisões que lhes digam respeito (cfr. artigo 267.º n.º 5 da CRP), contribuindo para um cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão, a omissão dessa audição constitui preterição de uma formalidade legal conducente à anulabilidade da decisão (cfr. artigo 163.º n.º 1, do CPA).
10. Assim e relativamente à falta de notificação para o exercício de audição prévia, cumpre sublinhar que, todo o ato tributário necessita de ser notificado para produzir plenos efeitos na esfera jurídica do destinatário (artigos 77. ° n.º 6 da LGT e 36. ° n.º 1 do CPPT).
11. E, o ónus de demonstrar que fez a notificação, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais, cabe à Recorrente.
12. Em face do circunstancialismo comprovado nos autos, é evidente que a Recorrente não juntou qualquer prova da receção da comunicação legalmente devida para efeitos de exercício do direito de audição prévia pelo Recorrido.
13. Assim sendo, há que concluir que o Recorrido, efetivamente, não foi notificado para exercer o direito de audição prévia à reversão, nos termos exigidos pelo já referido 23º, nº4 da LGT, o que constitui ilegalidade suscetível de determinar a anulação do despacho de reversão.
14. Com efeito, a decisão de reversão adotada pela Recorrente mostra-se viciada por falta de audiência prévia, e é evidente que se tal audiência tivesse sido devidamente proporcionada poderia ter sido alterado o rumo da decisão, tendo em conta que realmente o Recorrido nunca geriu de facto os destinos da sociedade S........., Lda.
15. Logo, a sentença sob recurso julgou devidamente ambos os pontos supra identificados, interpretou corretamente o disposto no art.°23°, n° 4 e artigo 60.º da LGT e artigo 39.º do CPPT, e bem andou ao decidir como decidiu, anulando o despacho de reversão e absolvendo o Recorrido da instância executiva.
16. Neste desiderato, veja-se o entendimento vertido no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 20/06/2018, processo n.º 01435/17: “os vícios formais do despacho de reversão, como o é o decorrente da preterição desse direito, constituem fundamento de oposição, na medida em que determinam a invalidade do acto de reversão e, consequentemente, deixam a execução sem título relativamente ao revertido, pelo menos transitoriamente. Assim, a decisão a proferir pelo tribunal deverá ser de anulação do acto de reversão e consequente absolvição do oponente da instância executiva por falta de legitimidade processual e não a extinção da execução quanto ao oponente (pois não foi feito qualquer juízo quanto ao mérito da matéria controvertida), de modo a não obviar à possibilidade do órgão de execução fiscal proferir um novo acto de reversão, expurgado do vício que determinou a anulação do anterior acto, possibilidade que lhe assiste em virtude do motivo determinante da anulação ser de carácter formal.”.
17. É importante ainda fixar que o procedimento de notificação, regulado nos artigos 35.º a 39.º do CPPT, compreende a emissão de uma carta, que incorpora o projeto da decisão, a fundamentação e o prazo de audição, o registo nos serviços postais e a entrega no domicílio fiscal do respetivo destinatário. Em princípio, do ponto de vista formal, estes atos colocam a informação para o exercício do direito de audição ao alcance do sujeito passivo, fazendo depender o respetivo conhecimento exclusivamente da sua vontade.
18. Mas porque a comunicação é efetuada através dos serviços postais, que podem levar algum tempo a colocar a carta em condições do destinatário ter possibilidade de conhecer a sua existência, através de uma regra de experiência, a lei presume que a comunicação postal demora três dias posteriores ao registo, que se transfere para o 1º dia útil, se o último dia não for dia útil (cfr. n.º 1 do artigo 39.º do CPPT e n.º 6 do artigo 45.º da LGT). O registo da carta faz presumir que o seu destinatário provavelmente a receberá, ou terá condições de a receber, três dias após a data registo. Trata-se, pois, de uma presunção legal destinada a facilitar à AT a prova de que a notificação foi introduzida na esfera de cognoscibilidade do notificando.
19. A atribuição legal de certa relevância ao registo da carta não permite inferir a certeza de que o seu destinatário a recebeu naquele prazo. Como tal forma de notificação não exclui o risco da carta não ser efetivamente recebida pelo destinatário, o nº 2 do artigo 39º permite que o notificado possa ilidir tal presunção “quando não lhe seja imputável o facto de a notificação ocorrer em data posterior à presumida”, solicitando à AT e ao Tribunal que requeiram aos correios a informação sobre “a data efectiva da recepção”.
20. Se a carta for devolvida, em regra, não se pode inferir que o registo faz presumir que ela foi colocada na esfera de cognoscibilidade do destinatário.
21. Perante a devolução da carta registada e da falta de garantia da certeza jurídica da sua cognoscibilidade por parte do Recorrido, há que concluir, com a Sentença ora em análise e na linha da jurisprudência supracitada, que não foi efetuada validamente a notificação para o exercício do direito de audição prévia à reversão, o que determina a preterição dessa formalidade legal, gerando um vício procedimental com potencialidade para invalidar o ato final.
22. Nesta sequência, importa ainda considerar a alegação da Recorrente segundo a qual “mesmo que o oponente tivesse exercido o seu direito de audição, em nada alteraria a posição assumida pelo órgão de execução fiscal”. Nesta asserção pretende a Recorrente fazer valer o princípio do aproveitamento do ato, ou seja, evidenciando que nem sempre a preterição da audiência prévia conduz à anulação do ato, pois que, aparentemente, estaríamos perante uma situação em que, mesmo perante o exercício do direito de audição, nenhuns elementos podiam ser carreados para o processo que levassem a uma decisão final de conteúdo diverso. Ou seja, no entendimento da Recorrente, independentemente do conteúdo do exercício do direito de audição, o despacho de reversão em nada seria diferente.
23. Como é evidente, não desconhecendo o Douto Tribunal a quo o alcance do apontado princípio do aproveitamento do ato, a tese da Recorrente, não é aceitável.
24. Note-se que a possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do ato exige um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso, com vista a aferir, num juízo de prognose póstuma, se se está ou não perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do órgão de execução fiscal ser influenciada pela participação do interessado.
25. Ou seja, a pedra-de-toque para a aplicação do referido princípio é a insusceptibilidade de a participação do interessado influenciar a decisão final, seja no seu sentido seja nos seus fundamentos. 26. No caso em apreço, em que o ato sindicado corresponde ao despacho de reversão operante da responsabilidade subsidiária de um gerente (de direito), não restam dúvidas que não estamos perante uma situação legal evidente ou perante uma atividade vinculada, não se podendo afirmar a insusceptibilidade de a participação do interessado/gerente nominal influenciar a decisão final, quanto ao seu sentido e fundamentos.
27. Analisando a Oposição vemos que o Recorrido questionou o exercício efetivo da gerência de facto do gerente nomeado, sendo claro que aí se defende que não foram, pelo Recorrido, praticados atos que vinculassem a sociedade devedora originária, relativamente a trabalhadores, fornecedores, clientes ou entidades financeiras; que o mesmo não dava ordens aos trabalhadores da sociedade devedora originária; que não dispôs de bens da devedora originária, entre outro circunstancialismo com o qual pretendeu questionar o exercício da gerência por sua parte.
28. Nesta medida, está claro que a participação do Recorrido na fase anterior à reversão era suscetível de contribuir para a alteração do projeto de decisão, na fase do procedimento de reversão, através da junção de elementos de prova e/ou requerendo a produção de outros.
29. Relativamente à prova da gerência de facto, constitui Jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores, que a prova da gerência de facto do administrador ou gerente da sociedade constitui ónus da entidade exequente, devendo a respetiva prova ser contemporânea do despacho de reversão, sendo que in casu a Recorrente nada alegou nem provou nesse sentido.
30. Por outro lado, o Recorrido comprovou nos autos que não foi gerente de facto da sociedade S........., Lda. no período em apreço e que inclusivamente já existe uma sentença judicial que dá tal factualidade como provada e a exonera da responsabilidade correspondente.
31. Também aqui a Recorrente não logrou provar o contrário, conforme o ónus que lhe incumbia.
32. Assim, e conforme amplamente demonstrado, a presente reversão não poderá ser admissível, dado que, não obstante a nomeação de direito, o Recorrido nunca exerceu, de facto, a gerência da sociedade S........., Lda.
33. Pelo que o presente Recurso deve ser necessariamente declarado improcedente, por não provado e desprovido de mérito, mantendo-se a Douta Sentença proferida pelo Douto Tribunal a quo.
Nestes termos e nos demais que forem doutamente supridos por V. Exas., deve o presente Recurso ser julgado totalmente improcedente mantendo-se a decisão apelada neste âmbito, como é de Lei e imperativo da JUSTIÇA!»

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Notificado, o Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo emitiu parecer no sentido de negar provimento ao recurso.
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Sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que a recorrente remate a sua alegação (art. 639º do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do referido tribunal.
De outro modo, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.
Assim, atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, temos que no caso concreto, as questões fundamentais a decidir são as de saber se a sentença recorrida errou no seu julgamento quando anulou o despacho de reversão por preterição de audição prévia, ou se se impunha o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do acto administrativo.

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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. De facto

A sentença recorrida deu por provados os seguintes factos:
«A) O Oponente foi nomeado administrador da sociedade S........., Lda., em 30 de Setembro de 1998.
(Cfr. certidão do registo comercial a fls. 140 e 141 do PEF)
B) O Serviço de Finanças de Lisboa 10 instaurou contra a sociedade S........., Lda., os seguintes processos de execução fiscal entretanto apensos:
a) Processo n.º …….71, instaurado em 5 de Julho de 2007, por dívidas de IRS, no valor de € 802,35, com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Maio de 2007;
b) Processo n.º ……71, instaurado em 7 de Janeiro de 2008, por dívidas de IRS, no valor de € 3.182,35 com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Novembro de 2007;
c) Processo n.º ……99, instaurado em 8 de Janeiro de 2008, por dívidas de IVA, no valor de € 860,01 com prazo de pagamento voluntário até ao dia 6 de Dezembro de 2012;
d) Processo n.º …..39, instaurado em 7 de Agosto de 2007, por dívidas de IRS, no valor de € 847,35 com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Junho de 2007;
e) Processo n.º …..20, instaurado em 9 de Agosto de 2007, por dívidas de IRC, no valor de € 38.275,23, com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Julho de 2007;
f) Processo n.º ……85, instaurado em 15 de Agosto de 2015, por dívidas de IRC, no valor de € 30.815,02, com prazo de pagamento voluntário até ao dia 26 de Julho de 2007;
g) Processo n.º …….07, instaurado em 4 de Setembro de 2007, por dívidas de IRS, no valor de € 1.451,35, com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Julho de 2007;
h) Processo n.º …….08, instaurado em 5 de Outubro de 2007, por dívidas de IRS, no valor de € 913,35, com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Agosto de 2007;
i) Processo n.º ……..47, instaurado em 6 de Novembro de 2007, por dívidas de IRS, no valor de € 790,35, com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Setembro de 2007;
j) Processo n.º ……81, instaurado em 5 de Dezembro de 2007, por dívidas de IRS, no valor de € 794,35, com prazo de pagamento voluntário até ao dia 20 de Outubro de 2007.
(Cfr. certidões de dívida a fls. 153 a 158 do PEF)
C) Em 27 de Agosto de 2008 foi emitida informação pelo Serviço de Finanças de Lisboa 10, que mereceu despacho de concordância, da qual consta nomeadamente, o seguinte teor:
“(…)
“(texto integral no original; imagem)”
(…)”
(Cfr. documento a fs. 144 do PEF)
D) Em 1 de Setembro de 2008 foi remetido ao Oponente, por carta registada, comunicação denominada “notificação audição prévia (reversão)”.
(Cfr. documento a fls. 146 e 147 do PEF)
E) A comunicação constante na alínea anterior foi devolvida com a indicação “desconhecido”. (Cfr. documento a fls. 147 verso do PEF)
F) Em 14 de Fevereiro de 2011 foi proferido despacho de reversão contra o Oponente. (Cfr. documento a fls. 149 do PEF)
G) Em 18 de Fevereiro de 2011 o Serviço de Finanças de Lisboa 10 remeteu ao Oponente, comunicação, por via postal registada, denominada “citação (reversão)”.
(Cfr. documento a fls. 159 do PEF)
H) Em 28 de Fevereiro de 2011 foi emitido “mandado de citação (reversão)” quanto ao Oponente, tendo sido requerido, junto dos serviços tributários espanhóis a efectivação da notificação do mesmo.
(Cfr. documentos a fls. 170, 172 a 176 do PEF)
I) Em 26 de Junho de 2011, o Oponente recebeu a notificação referida na alínea anterior.
(Cfr. documento a fls. 204 e 205 do PEF)»
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No que respeita a factos não provados, refere a sentença o seguinte:
«Não existem factos não provados com interesse para a decisão da causa.»
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Em matéria de convicção, refere o Tribunal a quo:
«A decisão sobre a matéria de facto realizou-se com base na análise do teor dos documentos constantes nos autos, não impugnados, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.»

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II.2. Enquadramento Jurídico

Em sede de aplicação de direito, a sentença recorrida julgou a presente oposição procedente e, em consequência, anulou o despacho de reversão proferido no processo de execução fiscal ……..71 e apensos.
Para tal apresentou a seguinte fundamentação, em síntese:
«Regressando aos autos, resulta do documento constante na alínea E) do probatório, que o Oponente não tomou conhecimento da notificação remetida para o exercício do direito de audição prévia, no âmbito do processo de reversão instaurado.
Com efeito, apesar de o Serviço de Finanças ter remetido ao Oponente ofício de notificação para exercício do direito de audição prévia, conforme resulta do documento constante na alínea D) da matéria de facto provada, a verdade é que tal notificação não foi efectivamente recebida pelo Oponente.
De facto, conforme resulta da alínea E) do probatório, a referida notificação foi devolvida ao Serviço de Finanças com a indicação “Desconhecido”, pelo que o teor da mesma nunca chegou ao conhecimento do Oponente.
Não tendo tal notificação chegado ao conhecimento do Oponente, verifica-se que o mesmo não pôde exercer o direito de audição prévia.
Considerando o já exposto, não pode nos presentes autos admitir-se verificada a presunção de notificação resultante do citado artigo 39.º do C.P.P.T., uma vez que a notificação para o exercício de audição prévia nunca foi entregue ao Oponente, não tendo sequer ficado depositada num receptáculo postal, uma vez que pelos CTT foi lavrada informação, de onde se retira que a carta não foi entregue, em virtude de o Oponente ser “desconhecido” em tal morada.
Neste sentido veja-se o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10 de Março de 2021 referente ao processo 0435/16.7BELLE, quando sumariza que:
“IV - De acordo com a lei, a notificação (no caso, do revertido) com vista ao exercício do direito de audição prévia à decisão de reversão deve realizar-se através de carta registada a enviar para o seu domicílio fiscal (cfr.artº.60, nº.4, da L.G.T.).
V- A presunção prevista no citado artº.39, nº.1, do C.P.P.T., tem como pressuposto que a notificação tenha sido efectuada nos termos legais, designadamente que a carta registada seja enviada para o domicílio da pessoa a notificar. Mais se devendo referir que o ónus de demonstrar a correcta efectivação da notificação cabe à Fazenda Pública.
VI - A presunção sob exame apenas vale nos casos em que a carta não seja devolvida, como se pressupõe no nº.2 do mesmo preceito, em que apenas se admite a possibilidade de ilidir a presunção demonstrando que a notificação ocorreu em data posterior à presumida, e já não quando a notificação não tiver ocorrido, nomeadamente, porque a carta foi devolvida.”
Assim, verifica-se que a notificação para o exercício da audição prévia não chegou ao conhecimento do Oponente.
A falta de notificação para o exercício do direito de audição prévia do revertido, ora Oponente, configura um vício de forma do procedimento tributário, que conduz à anulação do despacho de reversão. Nestes termos, procede o argumento do Oponente. Considerando a solução dada à questão supra analisada, fica prejudicado o conhecimento do demais invocado pelo Oponente.»

Inconformada com a referida decisão, a Fazenda Pública veio interpor recurso da mesma alegando que no caso vertente, ao Oponente, foi-lhe remetido, por carta registada, comunicação denominada “notificação audição prévia (reversão)” [cfr. alínea D. dos factos provados], tendo a referida comunicação sido devolvida com a indicação “desconhecido” [cfr. alínea E. dos factos provados]. Ora, não obstante o órgão de execução fiscal não ter repetido a notificação, tal omissão, no presente caso em concreto, não poderia conduzir à anulação do despacho de reversão, tout court, impondo-se antes, salvo melhor opinião, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do ato administrativo.
Mais alega que, mesmo que o oponente tivesse exercido o seu direito de audição, em nada alteraria a posição assumida pelo órgão de execução fiscal, concluindo que a defesa do contribuinte não ficou precludida por tal irregularidade, não devendo o despacho de reversão ser anulado, impondo-se, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do ato administrativo.

Vejamos.
A audição do responsável subsidiário é a concretização do direito de participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhe digam respeito consagrado no n.º 4 do artigo 267.º da CRP tendo a sua densificação no artigo 100.º do CPA, artigo 60.º da LGT e artigo 23.º n.º 4 da LGT.
Destinando-se a audiência dos interessados a permitir a sua participação nas decisões que lhes digam respeito (cfr. artigo 267.º n.º 5 da CRP), contribuindo para um cabal esclarecimento dos factos e uma mais adequada e justa decisão, a omissão dessa audição constitui preterição de uma formalidade legal conducente à anulabilidade da decisão (cfr. artigo 163.º n.º 1, do CPA).

O artigo 60.º da Lei Geral Tributária (LGT), sob a epígrafe “Princípio da participação”, corolário dos direitos dos administrados que vêm previstos no artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa, prevê uma série de situações em que deve ser garantida a participação do contribuinte nas decisões que diretamente lhe digam respeito.
Em especial acerca da audição do responsável subsidiário, refere expressamente o n.º 4 do artigo 23.º da LGT que “a reversão, mesmo nos casos de presunção legal de culpa, é precedida de audição do responsável subsidiário nos termos da presente lei e da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação”.
Significa isto não só que é obrigatória a audição do responsável subsidiário, mas também que a mesma deve fazer-se nos termos definidos pela LGT, sendo aplicável o que dispõe a este propósito o já referido artigo 60.º deste diploma legal, cujas regras dispõem, justamente, a de que a audiência de interessados seja exercida após envio de carta registada para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte, como pode ler-se no n.º 4 deste preceito legal.
No presente caso, tal como é referido na sentença recorrida:
(…) resulta do documento constante na alínea E) do probatório, que o Oponente não tomou conhecimento da notificação remetida para o exercício do direito de audição prévia, no âmbito do processo de reversão instaurado.
Com efeito, apesar de o Serviço de Finanças ter remetido ao Oponente ofício de notificação para exercício do direito de audição prévia, conforme resulta do documento constante na alínea D) da matéria de facto provada, a verdade é que tal notificação não foi efectivamente recebida pelo Oponente.
De facto, conforme resulta da alínea E) do probatório, a referida notificação foi devolvida ao Serviço de Finanças com a indicação “Desconhecido”, pelo que o teor da mesma nunca chegou ao conhecimento do Oponente.
Não tendo tal notificação chegado ao conhecimento do Oponente, verifica-se que o mesmo não pôde exercer o direito de audição prévia.
Considerando o já exposto, não pode nos presentes autos admitir-se verificada a presunção de notificação resultante do citado artigo 39.º do C.P.P.T., uma vez que a notificação para o exercício de audição prévia nunca foi entregue ao Oponente, não tendo sequer ficado depositada num receptáculo postal, uma vez que pelos CTT foi lavrada informação, de onde se retira que a carta não foi entregue, em virtude de o Oponente ser “desconhecido” em tal morada.»

A recorrente reconhece, nas conclusões de recurso F- e G-, que a notificação audição prévia (reversão) foi devolvida com a indicação “desconhecido” e que o órgão de execução fiscal não repetiu a notificação.
No entanto, entende que essa factualidade não conduzia à anulação do despacho de reversão, impondo-se antes, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do acto administrativo.

Vejamos.
A doutrina e a jurisprudência têm vindo a alertar para a necessária degradação deste momento procedimental em formalidade não essencial, quando suficientemente se comprove que, mesmo com a participação do interessado, a decisão da Administração sempre teria o mesmo conteúdo, de tal modo que se revela perfeitamente inútil a anulação de tal acto, não se produzindo esse efeito anulatório, sem que, contudo, se elimine a invalidade de que o acto padece.
Este entendimento tem sido de tal forma reiterado que a mais recente versão do Código do Procedimento Administrativo (CPA), introduzida pelo DL n.º 4/2015, de 7 de Janeiro, consagrou mesmo este aproveitamento do acto anulável, como vem sendo apelidado, no n.º 5 do seu artigo 163.º, havendo necessariamente que analisar-se se, no caso concreto, este instituto poderá ter aplicação.
Para que possa aplicar-se o princípio do aproveitamento do acto administrativo, terá de poder concluir-se, com suficiente certeza, que o conteúdo do acto não seria outro mesmo que o interessado tivesse tido oportunidade de pronunciar-se no momento devido. O acto em causa teria de apresentar, portanto, um conteúdo vinculado, ou a finalidade da audição do Oponente teria de ter-se alcançado por outra forma (cf., neste sentido, e afirmando que estas circunstâncias vêm sendo identificadas pelos tribunais administrativos, MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, Teoria Geral do Direito Administrativo – O Novo Regime do Código do Procedimento Administrativo, Almedina, Coimbra, 3.ª Edição, 2015, pág. 275).
Não é o que sucede no caso concreto, em que por não ter sido dada ao Oponente a possibilidade de se pronunciar em sede de audiência prévia não é possível saber quais os elementos que o mesmo traria ao processo executivo nessa sede, até porque poderia juntar elementos de prova, bem como requerer a produção de outros meio de prova relevantes para a tomada dessa decisão. A verdade é que é impossível ao Tribunal saber qual a decisão que seria tomada pelo órgão da execução fiscal quando confrontado, designadamente, com a demonstração de que não existe qualquer fundamento para a pretendida reversão, uma vez que o oponente alega não ser parte legítima nos presentes autos executivos.
Temos, portanto, que não pode operar nesta sede o princípio do aproveitamento do acto administrativo, produzindo-se plenamente os efeitos anulatórios que são consequência da preterição da audiência prévia do Oponente.

No mesmo sentido, veja-se o Acórdão deste Tribunal proferido em 16/12/2020, Proc. 2662/14.2BELRS, disponível em www.dgsi.pt, onde se pode ler:
«Há muito que a jurisprudência do STA tem adotado o princípio do aproveitamento do ato administrativo, que com a entrada em vigor do DL 4/2015, de 07 de Janeiro que aprovou o Novo Código de Procedimento Administrativo encontra consagração legal no art. 163.º, n.º 5 do CPA (aplicável ao procedimento tributário ex vi art. 2.º, alínea c) da LGT, e alínea d) do art. 2.º do CPPT) dispondo-se que “5 - Não se produz o efeito anulatório quando: a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível; b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via; c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo.”
Com efeito, o Supremo Tribunal Administrativo tem reiteradamente afirmado que a omissão da audição do contribuinte constitui preterição de uma formalidade legal conducente à anulabilidade da decisão, a menos que, ao abrigo do princípio do aproveitamento do ato administrativo, seja manifesto que a decisão tributária em abstrato, não podia ser outra da que foi tomada no caso concreto, e por isso se impunha, o seu aproveitamento (cf. por todos, Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 22/01/2014).

Ao abrigo deste princípio, o Tribunal tem o poder de não anular um ato inválido quando a decisão administrativa não pode ser outra, uma vez que em execução do efeito repristinatório da sentença não existe “alternativa juridicamente válida” que não seja a de renovar o ato inválido, embora sem o vício que determinou a anulação (cf. Acórdão do STA de 31/01/2012, Proc. n.º 017/12).
Mas como se salienta no Ac. do STA de 24/10/2012, proc. n.º 0548/12 “[o] princípio do aproveitamento do ato administrativo apenas é admissível quando a intervenção do interessado no procedimento tributário for inequivocamente insuscetível de influenciar a decisão final, o que acontece em geral nos casos em que se esteja perante uma situação legal evidente ou se trate de atividade administrativa vinculada, não se vislumbrando a mínima possibilidade de a audição poder ter influência sobre o conteúdo da decisão.”.

É hoje pacificamente aceite na jurisprudência que “a audiência prévia dos interessados não é um mero rito procedimental, a formalidade em causa (essencial) só se podia degradar em não essencial (não invalidante da decisão) se essa audiência não tivesse a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada, e se se impusesse, por isso, o aproveitamento do ato – utile per inutile non viciatur.” (Acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do STA de 22/01/2014, Proc. n.º 0441/13).
A possibilidade de aplicação do princípio do aproveitamento do ato deve ser apreciada casuisticamente através da análise das circunstâncias particulares do caso concreto. Deste modo, há que aferir se, no caso sob análise, a decisão não poderia de forma alguma ser influenciada pela participação do interessado.
Atento ao supra exposto, há que concluir que, para que se possa aplicar o princípio do aproveitamento do ato administrativo, há que aferir se, in casu, se a audição do revertido antes do despacho de reversão não tinha a mínima probabilidade de influenciar a decisão tomada, e só nesse caso é que o juiz poderá não anular o ato, aproveitando-o ao abrigo daquele princípio.
Está em causa nos presentes autos o ato de reversão, pelo qual se efetiva a responsabilidade subsidiária (art. 23.º, n.º 1, da LGT), cujos pressupostos se encontram vertidos no art. 24.º da LGT.
Ora, é evidente que a participação do Oponente em momento anterior à prolação do despacho de reversão poderia ter influenciado a decisão e seus fundamentos, desde logo porque o Oponente alega factos no sentido de que não exerceu a gerência efetiva da sociedade executada, o que poderia e deveria ter sido tomado em consideração para a prolação de decisão sobre a reversão da execução, influenciando aquela decisão.

Na verdade, a potencial participação do revertido na fase anterior à prolação de despacho de reversão era suscetível de alteração da decisão que foi proferida, até porque poderia juntar elementos de prova, bem como requerer a produção de outros meio de prova relevantes para a tomada dessa decisão.
Assim sendo, in casu, não é manifesto que a decisão de reversão da execução fiscal, em abstrato, não podia ser outra da que foi tomada no caso concreto, e por isso se impunha, o seu aproveitamento.
Pelo exposto, improcede de igual modo este fundamento do recurso.»


Face ao exposto, improcede o presente recurso, e mantém-se a sentença recorrida.

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III. DECISÃO

Face ao exposto, acordam em conferência os juízes da Subsecção de Execução Fiscal e de Recursos Contraordenacionais deste Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso e manter a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e notifique.


Lisboa, 4 de Outubro de 2023





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[Lurdes Toscano]


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[Catarina Almeida e Sousa]


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[Isabel Maria Fernandes]