Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:270/09.9 BECTB
Secção:CT
Data do Acordão:11/02/2023
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:FACTURAS FALSAS
ÓNUS DA PROVA
Sumário:I - O recurso não é normalmente o meio próprio para juntar documentos aos autos, por a sede própria para a instrução da causa ser o tribunal de primeira instância, revestindo natureza excepcional a admissão de documentos nesta sede, uma vez que a reapreciação das decisões dever ser efectuada em função dos meios de prova constantes dos autos no momento da prolação das mesmas.
II - Configura entendimento jurisprudencial reiterado e sólido, em situações como a dos autos, quando a Administração Tributária procede a correcções da matéria colectável declarada por considerar que as facturas que documentam custos, em IRC, não correspondem a operações reais, compete-lhe reunir e demonstrar factos que permitem, com recurso às regras de experiência, concluir que as facturas visadas não correspondem a operações reais e efectivas.
III - Cumprido este encargo pela Administração Tributária, passa a impender sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que tais facturas consubstanciam operações realmente efectuadas pela entidade emitente desses documentos e pelos valores constantes dos mesmos, comprovando que os custos que contabilizou.
Indicações Eventuais: Subsecção tributária comum
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. A Fazenda Pública, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, datada de 22/05/2012, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por F........, Lda contra o acto de liquidação adicional de Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) relativamente ao ano de 2006, no montante global de € 45.760,84.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«a) Foram violados os artigos 23° do CIRC e 42/1 alíneas b) e g) do CIRC [actual artigo 45/1 alíneas b) e g)], os artigos 661° do CPC e 668/1 alíneas d) e e) do CPC, o artigo 125° do CPPT, o artigo 4/1 da LGT.

b) Na conta do fornecedor 2211031 (exercício de 2005) e 22110059 (exercício de 2006) - A........, estão registadas facturas, das quais consta como entidade emitente o seguinte sujeito passivo:

- A........, NIF ........40, com domicílio inscrito nas facturas de Rua A........, n.° ……— 6270-…… Tourais Seia.

No que ora nos concerne está em causa a seguinte factura:

No que respeita à factura, 25 de 28-09-2006, o documento que consta da contabilidade é uma cópia, desconhecendo-se a existência do original, que tem a seguinte anotação “Ficou de trazer a original”. Está assinado por F.........

Consultado o sistema informático da DGCI, verifica-se que este contribuinte está cessado desde 31-01-2006, tendo em data anterior alterado o seu domicílio fiscal para Anadia.

Relativamente ao exercício de 2006, a conta corrente deste fornecedor evidencia o saldo de € 64.372,00, correspondente à cópia da factura n.° 25 de 23 de Setembro de 2006, de igual valor. De salientar o facto de junto a esta factura estar uma cópia de um recibo com o n.° 30, em nome deste fornecedor, que tem a seguinte descrição: “Pagamento da factura n.° 25 de Setembro de 2007.”

Este possível pagamento não está registado em conta corrente.

No âmbito do procedimento inspectivo, através do ofício n.º 32184 de 3/12/2007, foi a contribuinte A........ notificada, para o seu domicílio fiscal, para no prazo de dez dias prestar os seguintes esclarecimentos: 1 — Quais as relações comerciais estabelecidas com o destinatário identificado nos documentos; 2 - Se emitiu essas facturas e recibos; 3 — Em caso afirmativo, indicar que tipo de serviços prestou, em que obras e quando foram realizados, juntando comprovativos dos pagamentos; 4 — No caso de não ter sido a emitente dos documentos, indicar quem foi o responsável (nome completo e n.° de contribuinte); 5 - Confirmar se efectuou em 31-07-2002, a requisição de um livro de facturas/recibos com a numeração compreendida entre 001 e 050» à firma G........ Lda, com sede em Nelas, onde se incluem as presentes facturas/recibos.

A resposta foi dada em 14 de Dezembro de 2007, tendo sido informado o seguinte:

“ 1 — Inexistiram quaisquer relações comerciais com a pessoa mencionada nos documentos cujas cópias acompanham a notificação a que ora respondo; 2 — Por conseguinte, não emiti quaisquer das facturas e/ou recibos em causa nos presentes autos, sendo certo que a falsidade de alguns dos documentos é facilmente visível até porque a impressão dos mesmos não é igual - cfr., por exemplo, recibo n.º 0030 comparativamente com os demais documentos; 3 — Em face da resposta negativa ao ponto anterior, nada a responder a este; 4 — Não foi a respondente quem emitiu os documentos em causa, desconhecendo quem os terá emitido, (...).5 — É verdade que em 31-07-2007 requisitou um livro de facturas/recibos com a numeração constante da notificação a que ora se responde e à firma ali indicada — cf. a competente factura de compra que se protesta juntar em dez dias.”

A entidade identificada nas facturas como entidade emitente nas mesmas, afirma “(...) não emiti as facturas e/ou recibos em causa nos presentes autos, sendo certo que a falsidade de alguns dos documentos é facilmente visível até porque a impressão dos mesmos não é igual (...)”

A contabilização de uma cópia de factura

Como já referido, e para além dos indícios que põem em causa a veracidade das operações tituladas pelos documentos referenciados, acresce ainda que, no que respeita à factura n.º 25 de 28-09-2006, o documento que consta da contabilidade é uma cópia, desconhecendo-se a existência do original. Tem a seguinte anotação “Ficou de trazer a original”. Está assinado por F.........

Este documento não está processado em forma legal, inviabilizando a dedução do IVA nele mencionado, nos termos do artigo 19.° ns.° 2 e 6° do CIVA.

Em sede de IRC, a importância mencionada nesta cópia de factura não é dedutível fiscalmente, na razão de:

- nos termos do n.º 1 do artigo 42º do CIRC alínea b), {através desta alteração impõe-se ao adquirente de bens ou serviços a obrigatoriedade da verificação “mínima” da regularidade fiscal dos sujeitos passivos com quem contrata) não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável as importâncias constantes de documentos emitidos por sujeitos passivos com n.º de identificação fiscal inexistente ou inválido ou por sujeitos passivos cuja cessação de actividade tenha sido declarada oficiosamente nos termos do n.º 6 do artigo 8o, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício. Tratando-se de uma pretensa cópia datada de 28-09-2006, com data posterior à da cessação em sede de IVA e IRS, a importância nele constante não é dedutível fiscalmente.

Ora, ao não ter sido concretamente impugnada a correcção meramente aritmética supra evidenciada à matéria tributável, com os fundamentos supra evidenciados, o tribunal “a quo”, ao anular a liquidação de IRC/2006 ora em causa (julgando a impugnação totalmente procedente), violou o artigo 661/1 do CPC e o artigo 668/1 alínea e) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2° do CPPT, em virtude de ter condenado a administração fiscal “em quantidade superior” e “em objecto diverso do pedido”, e pronunciando-se “sobre questões” que não devia conhecer ou “de que não podia tomar conhecimento” nos termos do artigo 125/1 do CPPT e do artigo 668/1 alínea d) do CPC, violando ainda o artigo 23° do CIRC e o artigo 42/1 alínea b) do CIRC [actual artigo 45/1 alínea b)J, uma vez estar em causa o lançamento contabilístico dum pretenso custo ou gasto que violou direcíamente o artigo 42/1 alínea b) do CIRC e cujo fundamento de correcção não foi colocado em causa.

c) Foi desconsiderado pelo tribunal “a quo” — não constando dos factos provados — toda a prova documental — os documentos bancários — junta pela inspecção a comprovar a falsidade dos meios de pagamento utilizados/registados na contabilidade pela impugnante para justificar a existência de fluxos financeiros para os emitentes das facturas consideradas como falsas, para os “emitentes” “B........”, “S........” e “F........”, inquinando a decisão proferida na douta sentença ora em causa — tanto mais que “o que se discute nos presentes autos é a veracidade das facturas, se elas correspondem ou não a transacções reais, ou seja, se os emitentes das facturas postas em causa forneceram à impugnante os serviços que as mesmas mencionam” (douta sentença a fls. 20). Sendo, além do mais, toda a prova, documental e testemunhal, carreada aos autos pela impugnante no sentido de tentar provar a veracidade das facturas em causa, nunca tendo a impugnante argumentado no sentido dos eventuais serviços ou custos suportados terem sido prestados por outros que não as empresas constantes das facturas consideradas falsas pela administração fiscal (AF). Ao que acresce o facto da impugnante/recorrida, como salientado em sede de contestação, ntmca ter questionado, ou contraditado, ou carreado qualquer prova no sentido de infirmar a prova recolhida pela AF neste âmbito, nem sequer ter colocado em causa as conclusões decorrentes desses factos, pelo que, para a administração fiscal esta prova revelar-se-ia suficiente para corroborar a falsidade das facturas e as correcções aritméticas daí decorrentes, uma vez tratar-se. não de mera contraprova [criando a dúvida ou incerteza acerca da veracidade das facturas em causa (artigo 346° do Código Civil)], mas de verdadeira prova do contrário, provando a falsidade das facturas, implicando uma decisão diferente no sentido de manter a liquidação adicional de IRC/2005. em harmonia com esta prova produzida. Assim, pois, quer o tribunal “a quo”, quer a impugnante/recorrida simplesmente omitiram, ou preteriram, ou subtraíram esta prova em toda a sua argumentação. Sendo ainda junto aos autos, nos termos dos artigos 523/2 e 524/1 e 2 todos do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2o do CPPT, os documentos numerados de fls. 1 a 47, a corroborar a falsidade dos fluxos financeiros lançados na contabilidade, antes evidenciados pela inspecção tributária, sendo a análise de todos eles explicitada no n° 4o destes recurso.

d) Foi desconsiderado pelo tribunal “a quo” — não constando dos factos provados — o depoimento prestado pela testemunha A........, que também faz parte do rol dos emitentes da facturação falsa em causa nos autos, cujo depoimento a impugnante tentou destruir, sem que nunca o lograsse fazer, e que veio evidenciar as mentiras, ou destruir o depoimento, das testemunhas carreadas aos autos pela impugnante, mais uma vez inquinando a decisão proferida na douta sentença ora em causa, e que, por si só, desde logo, se revela prova suficiente da falsidade das facturas utilizadas pela impugnante com o seu nome.

Assim, e no concernente à “emitente” “A........”, NIF ........40, relativamente à qual estão em causa as seguintes facturas:

No âmbito da acção inspectiva que deu origem às liquidações ora em causa foi ouvido em auto de declarações F........ na qualidade de sócio gerente da impugnante, no dia 24/10/2007, como evidenciado em sede de contestação, acerca das relações comerciais estabelecidas com este fornecedor, tendo proferido as seguintes afirmações: “1) Nas obras realizadas nunca conheceu a A......... 2) Que os pagamentos foram feitos ao responsável da obra em numerário, não se recordando a quem os fez. 3) Que os trabalhos foram contratados verbalmente com o referido responsável. 4) Que no prazo de 72 horas irá apresentar toda a documentação que eventualmente disponha sobre este fornecedor e sobre as obras por ele realizadas”. Sendo que no prazo definido o representante da impugnante informou que “já não encontrei nenhum documento referente a este empreiteiro. Os trabalhos devem ter sido em Coimbra.”

Por sua vez, a testemunha R........ refere que “A........ esteve duas vezes no Fundão. Era a dona da firma. Fazia a parte do tijolo e reboco”. Referindo depois que “em 2006 na primeira metade do ano esteve parado e na segunda metade em Castelo Branco, no centro de saúde. Referindo ainda que viu A........ “na segunda metade do ano 2006 e as obras que fez terão acabado em 2007”, reafirmando que “esteve na obra do Fundão” e que “em 2005 não viu a dona A…..”. Verifica-se, pois, que apesar desta testemunha na segunda metade de 2006 ter trabalhado numa obra em Castelo Branco viu A........ duas vezes no Fundão, sendo que o seu patrão F........ afirmou nuca ter conhecido A........ e que os trabalhos desta devem ter sido em Coimbra. A testemunha mente, pois.

Já a testemunha L........, que refere que “andaram no Fundão, no mercado abastecedor e numa casa de moagem”, afirma relativamente a A........ que se “recorda mais ou menos, tem uma vaga ideia, mas nunca a viu”. Ou seja, a testemunha R........, que na segunda metade do ano 2006 apenas trabalhou em Castelo Branco, afirma ter visto a A........ duas vezes no Fundão, enquanto a testemunha L........, que trabalhou no Fundão, afirma que nunca viu A.........

A testemunha J........ refere que “acha que ouviu falar” na A........, “esteve no Fundão e na Figueira. Ouviu falar numa subempreiteira que era mulher”. Já a testemunha A.J........ relativamente aos subempreiteiros que conhecia que contrataram com a impugnante, refere que conhecia um B........, S........, A….”, para mais à frente referir, relativamente a A……., que “ouviu falar mas nao a conhecia. Não tinha ninguém da confiança dela que ele conhecesse”.

Ainda a testemunha P........ refere que “nunca ouviu falar numa A........ ”.

E mais. Após o depoimento peremptório da testemunha A........ a testemunhar a falsidade das facturas em causa, o mandatário da impugnante procura ainda insinuar ou confrontá-la com a possibilidade daquelas facturas terem sido emitidas pelo seu irmão, sendo esta mais uma vez peremptória negando, revelando tal insinuação do mandatário a confissão da facturação falsa em causa, para além das mentiras trazidas aos autos imediatamente reveladas pelas incongruências, quer dos próprios depoimentos, quer o confronto dos depoimentos de uns com os outros, quer com as declarações já antes prestadas pelo representante da impugnante, quer pelo depoimento prestado por A........ Rodrigues.

e) Evidencia-se a irrelevância da prova testemunhal e a contradição dos depoimentos prestados carreada aos autos pela impugnante, que é valorizada pelo tribunal “a quo” em sede de motivação ao ponto de a considerar contraprova bastante no sentido de provar que os custos em que a impugnante incorreu com as facturas “falsas” registadas foram indispensáveis para a realização dos proveitos e devidamente justificados. Sendo que o STA já teve oportunidade de se pronunciar acerca da questão da substituição da factura por prova testemunhal — não admitida por lei, cfr. artigo 42/1 alínea g) do CIRC [actual artigo 45/1 alínea g) do CIRC] — indo a sua posição no sentido da prova testemunhal funcionar como complemento dessa prova documental, reforçando-a e precisando-a, e não no sentido de esta se revelar suficiente de “per si”, sem necessidade de qualquer prova adicional, tanto mais que, a prova testemunhal apenas poderá servir de contraprova (criar a dúvida) e não servir de prova do contrário, em virtude do documento explicitar que tipo de relação obrigacional está em causa e delimitar o seu conteúdo, ou, ao contrário, evidenciar precisamente a inexistência dessa relação contratual — como é o caso da prova documental recolhida — os documentos bancários - a evidenciar a falsidade dos fluxos financeiros registados pela impugnante na sua contabilidade —, e revelar-se, em direito fiscal limitada, pela sua própria natureza, desde logo no respeitante à quantificação do custo (depois de provada a sua existência). Para além do que já foi referido, no sentido da testemunha A........ Rodrigues ter revelado as mentiras ou contradições das testemunhas da impugnante que, inclusivamente se contradisseram entre si, e do facto das testemunhas estarem subordinadas por contrato de trabalho às ordens do gerente da impugnante, diminuindo o seu valor probatório e tomando-a prova livremente apreciável, é ainda de evidenciar que:

Quanto ao emitente “F........, Lda.”, F........, em declarações prestadas no dia 24/10/2007, referiu o seguinte: “1) Contrato não fez contrato escrito, contratou verbalmente com um indivíduo que se apresentou como responsável da empresa. 2) Pagamentos foram feitos a essa pessoa. 3) Que no prazo de 72 horas irá apresentar toda a documentação que eventualmente disponha sobre este fornecedor e sobre as obras por ele realizadas.” No prazo definido o sujeito passivo apresentou os seguintes documentos: cópia não certificada da declaração de inscrição no registo/inicio de actividade da empresa “F........ Lda.”. Cabe destacar que nesta cópia fornecida a data do inicio de actividade (quadro 09), a data do enquadramento em sede de IVA e IR (campo 15 do quadro 10) e a data de recepção (campo 17 do quadro 10), estão rasurados. De facto a data ai constante é a de 10/07/2006, sendo que a data de início de actividade constante da base de dados da DGCI é de 10/07/2001. Consta do processo remetido pela Direcção de Finanças de Angra do Heroísmo uma cópia da declaração de início de actividade onde a data correcta inscrita na declaração é a de 10/07/2001; cópia não certificada do cartão de identificação de pessoa colectiva da empresa “F........, Lda.”. Mais informou que “estes são os documentos que tenho, os trabalhos foram feitos em Coimbra e Mealhada.” Por sua vez a testemunha R........, que trabalhou em Coimbra, refere que F…… e N........ não lhe diz nada, o mesmo referindo a testemunha L........ ou a testemunha J........ ou ainda P......... Apenas A.J........ refere que a “F……, de N........, ouviu falar mas nunca chegou a ver”. Sendo que o representante da impugnante “não fez contrato escrito, contratou verbalmente com um indivíduo que se apresentou como responsável da empresa”. Ou seja, estamos perante um fantasma, alguém que ninguém conhece e que aparece como emitente das facturas antes discriminadas. Sendo que a fls. 583 do processo administrativo consta um termo de declarações do “encarregado de obras” e procurador da “F………” - J.B.........— que refere não saber precisar “se a F........ realizou obras” no continente e que “no continente nunca foi encarregado”. Na situação em apreço não foi relevado na douta sentença, na matéria de facto dada como provada ou na motivação, nem o termo de declarações supra, nem o desconhecimento revelado pelas testemunhas da impugnante relativamente a este “emitente” de facturação “falsa”, o que se requer seja agora considerado.

No concernente aos “emitentes” “B........ Lda.” e “S........, Lda.”,

É referido por F........ em auto de declarações, relativamente a B........, que: “1) Contrato — não fez contrato escrito, contratou verbalmente com um indivíduo que se apresentou como responsável da empresa. 2) Pagamentos — foram feitos a essa pessoa. 3) Que no prazo de 72 horas irá apresentar toda a documentação que eventualmente disponha sobre este fornecedor e sobre as obras por ele realizadas.” No prazo definido o sujeito passivo apresentou os seguintes documentos: cópia de alvará de construção da firma B........ Lda, com o n.º 48914, com validade de 26/11/2003 a 31/1/2006; cópia não certificada da declaração de inscrição no registo/inicio de actividade (apenas folha de rosto) da empresa B……. Lda; cópia não certificada da matrícula n.° ………28, da empresa B........ Lda, da Conservatória do Registo Comercial de Cascais. Referindo relativamente a S........ que: “1) Contrato — não fez contrato escrito, contratou verbal mente com um indivíduo que se apresentou como responsável da empresa. 2) Pagamentos — foram feitos a essa pessoa. 3) Que no prazo de 72 horas irá apresentar toda a documentação que eventualmente disponha sobre este fornecedor e sobre as obras por ele realizadas.” No prazo definido o representante do sujeito passivo informou não possuir documentos nenhuns e que os trabalhos foram em Coimbra em diversas obras. Sendo depois de salientar o depoimento da testemunha P........ que refere que a impugnante “recorria a outros empreiteiros para dispensarem pessoal. Nas suas obras viu empregados dele e empregados de subempreiteiros”. Ou seja, os outros subempreiteiros dispensavam pessoal mas não o acompanhariam. Tanto mais que relativamente a S........ F........ declara que: “1) Contrato — não fez contrato escrito, contratou verbalmente com um indivíduo que se apresentou como responsável da empresa”. Refere ainda a testemunha P........ que “as pessoas de cor cá para cima não vieram… e questionado sobre a existência de contratos escritos celebrados por aqueles com o seu patrão “logicamente tinha de contratar com contrato escrito”.

Sendo que a testemunha R........ já refere conhecer S........, pois “andou noutra obra mas só 3 dias”, foi “o sr. B……. que trouxe o S........, que subcontratou S........”, “mas trabalhavam os dois para o sr. F........”.

Por sua vez L........ “não se recorda” de ter ouvido falar no S........ nem a testemunha J.........

Temos, pois depoimentos que não fazem qualquer contraprova dos elementos juntos aos autos a corroborar a falsidade das facturas em causa.

f) Ao contrário do que se deduz da douta sentença, a prova documental junta pela impugnante durante as diligências instrutórias e até à decisão ora em causa revelam-se inócuas, uma vez que não provam ou comprovam ou justificam os custos constantes das facturas em causa, nem a sua efectividade ou existência, nem sequer a sua indispensabilidade, apenas provando os proveitos obtidos pela impugnante, nunca colocados em causa pela administração fiscal. Assim, os documentos em causa juntos durante os presentes autos são semelhantes aos já juntos com a reclamação, que nada provam, que nada têm a ver e que em nada se relacionam com as facturas falsas em causa, apenas dando a conhecer trabalhos e serviços prestados pela impugnante como subempreiteira (vindo a meio da inquirição juntar ainda “mapas para seguro” de trabalhadores da impugnante, que também nada revelam em relação ao objecto da impugnação).

Como evidenciado pelo inspector R........, ouvido como testemunha, quando confrontado pelo mandatário da impugnante com o facto de relativamente aos emitentes B........ e S........ constar nos autos o alvará de construção, cópia da matrícula, da declaração de início de actividade, e questionado como é que o sr. F........ as adquiriu, a testemunha depois de responder que não sabe, constata que “se se preocupou em encontrar uma cópia do alvará de construção devia ter-se preocupado em documentar os custos”.

Não consta, pois, nos autos qualquer documento a justificar ou a corroborar os pretensos custos constantes das facturas falsas em causa. Sendo que, para além de não constarem quaisquer documentos justificativos dos custos (para além das facturas “falsas”) – que a impugnante facilmente podia juntar, como já supra evidenciado, toda a prova carreada para os autos vai no sentido da falsidade das facturas em causa e dos respectivos custos incorridos.

Assim, pois, os contratos de subempreitada por si realizados, cff. does. juntos pela impugnante, em que aparece como subempreiteiro, são reduzidos a escrito com a identificação dos outorgantes, das obras a realizar, com a menção do valor do contrato, fazendo referência ao prazo de execução dos trabalhos e constando a assinatura dos outorgantes- Relativamente às facturas em causa, pelo contrário, não existe contrato escrito, não se sabe que tipo de trabalhos foram efectuados, onde é que os trabalhos foram efectuados, quem interveio no negócio, dando a impugnante a conhecer apenas umas facturas (relevadas contabilísticamente e fiscalmente de forma a poder deduzir os custos e o IVA nelas constante) também carentes de qualquer elemento identificativo das obras a realizar, do local de execução, com a menção de intervenientes que desconhecem as facturas, com assinaturas diferentes (dos pretensos intervenientes/emitentes) das constantes em documentos oficiais (caso do emitente B........), pretensamente pagas com dinheiro e também com cheques — relevados contabilísticamente — cuios destinatários se revelam outros — directa ou indirectamente ligados à ora impugnante —, dando o circuito financeiro a aparência de maior credibilidade às facturas em causa (sendo certo que relativamente ao emitente S........, F........, embora, como já evidenciado, releve contabilisticamente pagamentos efectuados através da emissão de cheques, escreve à DSIFAE a informar que os pagamentos dos trabalhos eram efectuados em dinheiro”).

g) Como salientado na douta sentença de que se recorre e por António Moura Portugal a páginas 215 e 216 de ‘‘Reestruturação de empresas e limites do planeamento fiscal da Coimbra Editora, "... em termos sistemáticos, um custo será fiscalmente dedutível se for: i) efectivo (existente, real); ii) devidamente contabilizado como tal; iii) em obediência aos critérios de imputação temporal; iv) comprovado (justificado); v) indispensável; vi) incorrido para a obtenção de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto; vii) contanto que não exista qualquer preceito que negue directa ou indirectamente a respectiva dedutibiiidade”.

Com efeito, e começando pela questão da existência do custo, provou-se, de acordo com a fazenda pública: a) que não existe nenhuma transacção ou negócio entre duas empresas — apenas o lançamento de facturas “falsas” na contabilidade da impugnante; b) que não há fluxos financeiros envolvidos — ao contrário, são emitidos cheques ao portador, lançados na contabilidade pagamentos em dinheiro e o valor dos cheques registados na contabilidade como pagamento das facturas “falsas” regressa à titularidade do gerente da impugnante através do levantamento imediato ou do seu depósito em contas bancárias por si detidas; c) que não existe qualquer proveito de outra empresa — sendo tal evidenciado pela inexistência de fluxos financeiros, pela negação de quaisquer serviços prestados por A........, pela contradição da prova testemunhal da impugnante no concernente aos emitentes “A........”, “B........” e “S........” e ainda o manifesto desconhecimento daquelas testemunha em relação à emitente “F........”; d) que a emitente “F........”, desconhecida das testemunhas da impugnante, não revela à data a existência de estrutura produtiva no continente, e que a emitente “A........” não tem à data qualquer estrutura produtiva. Assim, desde logo, o primeiro requisito cumulativo de dedutibilidade dos custos não se verifica.

Depois, quanto à comprovação (prova ou justificação) do custo, como já salientado, o STA já teve oportunidade de se pronunciar acerca da questão da substituição da factura por prova testemunhal — não admitida por lei, cff. artigo 42/1 alínea g) do CIRC [actual artigo 45/1 alínea g) do CIRC] — indo a sua posição no sentido da prova testemunhal funcionar como complemento dessa prova documental, reforçando-a e precisando-a, e não no sentido de esta se revelar suficiente de “per si”, sem necessidade de qualquer prova adicional, tanto mais que, a prova testemunhal apenas poderá servir de contraprova (criar a dúvida) e não servir de prova do contrário, em virtude do documento explicitar que tipo de relação obrigacional está em causa e delimitar o seu conteúdo, ou, ao contrário, evidenciar precisamente a inexistência dessa relação contratual — como é o caso da prova documental recolhida a evidenciar a falsidade dos fluxos financeiros registados pela impugnante na sua contabilidade -, e revelar-se, em direito fiscal limitada, pela sua própria natureza, desde logo no respeitante à quantificação do custo (depois de provada a sua existência). E na situação em apreço, nem as testemunhas — que se revelou mentirem e entrarem em contradição entre si, subordinadas por contrato de trabalho às ordens do gerente da impugnante, diminuindo o seu valor probatório e tomando-a prova livremente apreciável — nem a prova documental junta pela impugnante — que nada revela em relação aos pretensos custos suportados pela impugnante ora em causa logram substituir as facturas — cuja prova da sua falsidade a fazenda pública considera ter obtido — no sentido de provar os custos que nelas consta e de fazer contraprova à prova da fazenda, devendo manter-se a liquidação adicional de IRC e causa.

h) E referido na douta sentença que “na verdade, a Administração Fiscal põe em causa a veracidade das operações suportadas nas facturas, não por estas não terem sido realizadas, mas porque da contabilidade do emitente, que não a impugnante, não resultam indícios de que o tivessem sido, aliado à falta de colaboração da impugnante. Afigura-se que a AF não pode continuar a defender a mesma tese que em fase inspetiva, uma vez que procedeu ao ajustamento do lucro tributável, em sede de IRC, afastando a presunção de veracidade dos elementos contabilísticos da Impugnante, apenas porque as facturas desconsideradas continham irregularidades formais, e porque os emitentes das mesmas se encontravam em situação irregular. A AF baseou-se em indícios externos e extrapolou as conclusões para a impugnante. Ora, independentemente, das questões que possam ser postas relativamente à contabilidade dos fornecedores de serviços, a verdade é que essas irregularidades só podem ter reflexos na contabilidade da Impugnante na medida em que, aqui, também reflitam irregularidades suceptiveis de pôr em causa a veracidade das operações nelas reproduzidas. A AF não invoca factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações da impugnante e dos dados constantes da sua contabilidade - artigo 75° da LGT”.

Na verdade, os indícios de não realização das operações suportadas nas facturas resultam quer da contabilidade dos emitentes, quer dos próprios “emitentes” — termo de declarações de J.B……, termo de declarações e depoimento testemunhal de A........ —, quer ainda da contabilidade da impugnante que, para além das facturas dadas a conhecer, não revela a existência de qualquer contrato escrito, não dá a conhecer que tipo de trabalhos foram efectuados, onde é que os trabalhos foram efectuados, quem interveio no negócio, dando a impugnante a conhecer apenas as facturas (relevadas contabilisticamente e fiscalmente de forma a poder deduzir os custos e o IVA nelas constante) também carentes de qualquer elemento identificativo das obras a realizar, do local de execução, com a menção de intervenientes que desconhecem as facturas, com assinaturas diferentes (dos pretensos intervenientes/emitentes) das constantes em documentos oficiais (caso do emitente B........), pretensamente pagas com dinheiro e também com cheques — relevados contabilisticamente — cujos destinatários se revelam outros — directa ou indirectamente ligados à ora impugnante -, dando o circuito financeiro a aparência de maior credibilidade às facturas em causa (sendo certo que relativamente ao emitente S........, F........, embora, como já evidenciado, releve contabilisticamente pagamentos efectuados através da emissão de cheques, escreve à DSIFAE a informar que os pagamentos dos trabalhos eram efectuados em dinheiro,”). Os indícios de falsidade resultam também da contabilidade da impugnante em virtude de nas facturas constarem assinaturas diferentes (dos pretensos intervenientes/emitentes) das constantes em documentos oficiais (caso do emitente B........), Os indícios de falsidade resultam ainda da contabilidade da impugnante porque os fluxos financeiros por esta evidenciados se revelaram inexistentes, falsos, sendo que, o que os fluxos financeiros aparentes evidenciam é que é há meras saídas em dinheiro a favor dos titulares do capital da sociedade, sobretudo do sócio gerente F......... A não consideração da prova — documental e testemunhal — carreada pela fazenda conduziu, pois, o tribunal “a quo” às erróneas conclusões supra.

É também referido na douta sentença que “na verdade, a AF reconhece até que com a não aceitação destes custos, o resultado fiscal do exercício de 2006, poderá, eventualmente, não refletir a capacidade contributiva da empresa, no entanto, coloca da parte do contribuinte o ónus da prova (...) caberia ao sujeito passivo colaborar no estabelecimento de menos expressiva quantificação do lucro tributável. Contudo, quando o representante do sujeito passivo F........ foi ouvido relativamente às relações comerciais estabelecidas com estes fornecedores, não apresentou elementos que confirmassem a existência daqueles custos ou de outros que pudessem subsumir-se em factos tributários configuradores de custos efetivamente suportados. (…) “Ora, a impugnante veio aos autos com elementos que permitem concluir que:

- A impugnante durante aos anos de 2005 e 2006, face às inúmeras obras de subempreitada que detinha, e face ao insuficiente número de trabalhadores da empresa, teve necessidade de subcontratar serviços com outras entidades;

- A empresa impugnante não tinha estrutura humana para suportar a realização de todas as obras que subcontratou, uma vez que;

- Nesses anos, realizou obras em Coimbra, Anadia, Figueira da Foz, Pinhel, Guarda, Castelo Branco, Fundão, Vila Velha de Rodão e Proença-a-Nova;

- Para realização desses serviços subcontratados pagou a empresas/entidades individuais de origem africana, romena, ucraniana, brasileira e portuguesa.

Ora, tal como a própria AF reconhece no relatório inspetivo, o elevado valor dos resultados fiscais apurados, sempre teria de ter como correspondência custos inerentes àqueles proveitos”.

É de salientar que a análise feita pela inspecçao tributária transcrita pela douta sentença e acima também referida, apenas é feita para o exercício de 2005, que não para o exercício de 2006, não se colocando para a inspecçao tributária qualquer óbice às eorrecções efectuadas ao exercício de 2006, revelando-se o resultado fiscal apurado após as eorrecções técnicas efectuadas, nomeadamente a rentabilidade fiscal, no valor de 37,1€, perfeitamente justa, aceitável e verosímil. De facto o relatório inspetivo, na análise efectuada começa logo por circunscrever o período em causa, apenas o ano 2005 e não já o ano 2006. Assim, começa por referir que “Após a não-aceitação destes custos, o resultado fiscal do exercício de 2005, (sublinhado nosso) poderá eventualmente, não reflectir a capacidade contributiva da empresa. No entanto, caberia ao sujeito passivo colaborar no estabelecimento de menos expressiva quantificação do lucro tributável. Contudo:

- quando o representante do sujeito passivo, Sr. F........ foi ouvido relativamente às relações comerciais estabelecidas com estes fornecedores, não apresentou elementos que confirmassem a existência daqueles custos ou de outros que pudessem subsumir- se em factos tributários configuradores de custos efectivamente suportados;

- nos autos declarações por ele subscritos, afirmou sempre que os pagamentos eram feitos a um responsável da empresa, não identificando essa pessoa. Estranha-se tal conduta na medida em que pagamentos de milhares de euros não se fazem a qualquer pessoa (sublinhado nosso).

Por outro lado, do ponto de vista de gestão económica da empresa, é injustificável a inexistência de outros documentos relacionados com os eventuais serviços prestados (sublinhado nosso).

Face ao exposto, as especificidades do presente caso, não obstante o elevado valor dos resultados fiscais apurados. impossibilitam que seja adoptada uma conclusão no sentido de que, em concreto, esse resultado seja injusto ou desproporcionado (sublinhado nosso). De facto, considera-se ser impossível estabelecer um juízo seguro e aceitável sobre a justiça ou não do resultado obtido pelo funcionamento das pertinentes regras legais, quando se mostra impraticável, por exemplo, o apuramento dos benefícios económicos e financeiros potenciados por este tipo de actuação pelo sujeito passivo.

Actuar doutra forma seria, sim, cometer profunda injustiça para com os contribuintes que se movem no cumprimento dos seus deveres e obrigações tributárias”.

Labora, aqui, o tribunal “a quo” em erro de análise conduzindo a conclusões erradas e à violação do artigo 4/1 da LGT em virtude da justeza da tributação, em virtude da impugnante ter sido tributada de acordo com a sua capacidade contributíva revelada através do rendimento antes omitido através da utilização de facturas falsas a fim de diminuir os respectivos proveitos.

i) No que se refere aos meios probatórios que impunham decisão diversa da recorrida, eles constam dos autos, tendo sido juntos quer pela oponente/recorrida, quer pela fazenda.

Junta: certidão, nos termos dos artigos 523/2 e 524/1 e 2 todos do CPC, aplicáveis ex vi artigo do CPPT, dos documentos numerados de fls. 1 a 47.

Pelo que, com o mais que Vossas Excelências se dignarão suprir, deve ser dado provimento ao recurso e em consequência ser revogada a decisão recorrida.»

3. A recorrida, F........, Lda, devidamente notificada, apresentou contra-alegações iguais para os presentes autos e para o processo n.º 271/09, justificando em razão da semelhança factual e identidade do direito aplicável, não tendo formulado conclusões. Nas contra-alegações a Recorrida insurge-se contra a junção de documentos com as alegações, requerendo o seu desentranhamento, e sustenta a sentença, concluindo no sentido de ser negado provimento ao recurso.


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4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista à Exma. Procuradora–Geral Adjunta, emitiu douto parecer, no sentido de julgar procedente o recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.


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II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de (i) nulidade por excesso de pronuncia, por ter condenado a Administração Tributária em “quantidade superior” e em “objecto diverso do pedido”, e, de (ii) erro de julgamento quanto à anulação da correcção à matéria colectável relativa ao exercício de 2006, por referência ao disposto no artigo 23.º do CIRC.

Como questão prévia apreciar-se-á da admissibilidade legal da junção de documentos com as alegações de recurso.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«Compulsados os autos e analisada a prova documental e testemunhal apresentada, encontram-se assentes, por provados, os seguintes factos com interesse para a decisão:

1. A impugnante é uma sociedade comercial constituída em 2004, tem como objeto social a “construção de edifícios” – cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

2. A sociedade tem como sócios F........ e M........, encontrando-se a gerência a cargo de F......... O outro sócio renunciou à gerência em 04/09/2006 -cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

3. Em fase anterior, o F........ integrava uma sociedade por quotas com a sua mulher a “B.E........, Lda.”, tendo posteriormente, em 2004 constituído a empresa “F........, Lda. – cfr. depoimento da testemunha R........;

4. Para o exercício da sua atividade a impugnante possui cerca de 25 trabalhadores, sendo que na sua contabilidade possui custos com o pessoal do seguinte montante:

ü Exercício de 2005 - € 125.359,14

ü Exercício de 2006 - € 171.591,65

- cfr. fls. 53 a 113 dos presentes autos e depoimentos das testemunhas R........, L……., J…….., A.J........ e P........;

5. No exercício de 2006 a impugnante apresentou custos com subcontratos sem que, na maioria dos casos, tais prestadores dos serviços tenham declarado em contrapartida esses valores como proveitos, que se enunciam:


“(texto integral no original; imagem)”

- cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

6. Quanto ao fornecedor de serviços B........., Lda., durante o exercício de 2006, emitiu uma fatura com o nº 256 (Maio) no valor de € 63.500,00, cujo descritivo mencionava “Serviços de construção civil em diversas obras – cfr. 47 a 112 dos presentes autos;

7. A Inspeção Tributária considerou os dados da Direção de Serviços de Investigação da Fraude e de Ações Especiais (DSIFAE), que reportava ao fornecedor B........., Lda. indícios de fraude fiscal, uma vez que os valores contabilizados de clientes do mesmo quase duplicaram entre 2002 e 2005 “ (…) considerando-se que se está perante um modesto pequeno empresário, de nacionalidade guineense, que não sabe ler nem escrever e cuja atividade consiste em fornecer mão- de- obra de operários africanos para trabalhos de construção civil (…) - cfr. 47 a 112 dos presentes autos;

8. A AF verificou que a fatura contabilizada na impugnante no exercício de 2006, com o nº 256, não foram reconhecidas por B……., Lda. entidade que consta como prestadora de serviços e emitente das faturas, tendo concluído “ Conclui-se desta forma que as faturas constantes da escrita da empresa, terão sido presumivelmente emitidas com a intervenção de pessoas ou entidades diferentes da que consta como entidade emitente” - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

9. Refere o relatório inspetivo que o gerente da impugnante, ouvido em declarações afirmou “ Contrato - não fez contrato escrito, contratou verbalmente com um individuo que se apresentou como responsável da empresa; Pagamentos foram feitos a essa pessoa; Que no prazo de 72 horas irá apresentar toda a documentação que eventualmente dispunha sobre este fornecedor e sobre as obras realizadas. No prazo definido o sujeito passivo apresentou cópia de alvará de construção da firma B........., Lda., com nº 48914, com validade de 26/11/2003 a 31/01/2006; cópia não certificada da declaração de inscrição no registo/início de atividade da empresa B........., Lda., cópia não certificada da matrícula nº 18509/020128, da empresa B….., Lda. da Conservatória do Registo Comercial de Cascais.” - cfr. 47 a 112 dos presentes autos;

10. Quanto aos meios de pagamentos usados, a AF verificou que os pagamentos foram efetuados em cheque, emitidos ao portador e “ saídas por caixa que impossibilitam, por um lado, comprovar a efetividade do pagamento e por outro o destinatário do mesmo”- cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

11. A AF conclui que “ Não foram identificados pelo sujeito passivo, os locais das obras, o tempo de duração, o nº de trabalhadores utilizados, a especificação da natureza do serviço, etc.. Não foram exibidos contratos de empreitada realizados com este fornecedor, orçamentos, folha de obra e outros documentos que demonstrassem e comprovassem a realização dos serviços constantes dessas faturas. Também a descrição dos trabalhos feita nessas faturas é de tal maneira vaga que fica omissa a natureza e localização espaço-temporal dos mesmos, tendo em conta a descrição genérica constante dos documentos contabilizados (…) existem indícios de que essas faturas, terão sido, presumivelmente, emitidas com a intervenção de pessoas ou entidades diferentes da que consta como entidade emitente das faturas e, que o representante do sujeito passivo se recusou a identificar. Face a tais factos, nos termos do art. 23º do CIRC, não são aceites fiscalmente os custos titulados por estes documentos, na medida em que não se verificam os requisitos aí estabelecidos ”- cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

12. Quanto ao fornecedor S........, Lda., no exercício de 2006, encontra-se registada uma fatura, nº 25 de 13/03/2006 no valor de € 45.000,00. A AF apurou que este fornecedor não entrega as declarações de IVA, nem as de rendimentos. - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

13. No relatório da DSIFAE, é dada nota que S........, Lda. apenas contratava trabalhadores para fornecer mão-de-obra aos seus clientes, funcionando como uma espécie de agente de recursos humanos. O S........ não reconhece como seus clientes a empresa F........, Lda., bem como não reconhece os vários livros de faturas com a mesma numeração, que form requisitadas nas tipografias A........., Lda., com a numeração 1 a 50 e do nº 50 ao 100 - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

14. Refere o relatório inspetivo que o gerente da impugnante, ouvido em declarações afirmou “ Contrato - não fez contrato escrito, contratou verbalmente com um individuo que se apresentou como responsável da empresa; Pagamentos foram feitos a essa pessoa; Que no prazo de 72 horas irá apresentar toda a documentação que eventualmente dispunha sobre este fornecedor e sobre as obras realizadas. No prazo definido o sujeito passivo afirmou não possuir documentos nenhuns e os trabalhos foram em Coimbra e em diversas obras” - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

15. No exercício de 2006, não constam pagamentos efetuados a este fornecedor, estando apenas registada a fatura desse ano - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

16. A AF conclui que “ Não foram identificados pelo sujeito passivo, os locais das obras, o tempo de duração, o nº de trabalhadores utilizados, a especificação da natureza do serviço, etc.. Não foram exibidos contratos de empreitada realizados com este fornecedor, orçamentos, folha de oba e outros documentos que demonstrassem e comprovassem a realização dos serviços constantes dessas faturas. Também a descrição dos trabalhos feita nessas faturas é de tal maneira vaga que fica omissa a natureza e localização espaço-temporal dos mesmos, tendo em conta a descrição genérica constante dos documentos contabilizados (…) existem indícios de que essas faturas, terão sido, presumivelmente, emitidas com a intervenção de pessoas ou entidades diferentes da que consta como entidade emitente das faturas e, que o representante do sujeito passivo se recusou a identificar. Face a tais factos, nos termos do art. 23º do CIRC, não são aceites fiscalmente os custos titulados por estes documentos, na medida em que não se verificam os requisitos aí estabelecidos “- cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

17. A........, consta como fornecedora da impugnante, encontrando-se contabilizada em 2006 a cópia da fatura com nº 25 de 28/09/2006, Descritivo: Trabalhos diversos de construção em 8 e 9 de 2006; no valor de € 53.200,00 - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

18. No âmbito da ação inspetiva, o sócio gerente da impugnante refere “ Nas obras realizadas nunca conheceu a A........; que os pagamentos foram feitos ao responsável da obra em numerário, não se recordando a quem os fez; que os trabalhos foram contratados verbalmente com o referido responsável; que no prazo de 72 horas irá apresentar toda a documentação que, eventualmente disponha No prazo definido o sujeito passivo informou que «não encontrei nenhum documento referente a este empreiteiro. Os trabalhos devem ter sido em Coimbra» ” - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

19. A fatura em questão no valor de € 53.200,00, que corresponde a uma cópia da fatura, tem a anotação de “Ficou de trazer o original”, concluindo a AF o seguinte: “ nos termos do nº 1 do art. 42º do CIRC, al. b) (…) não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável (…)”- cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

20. Foi efetuada a A........, notificação, para prestar esclarecimentos, tendo a mesma vindo a referir “ Inexistirem quaisquer relações comerciais com a pessoa mencionada nos documentos, refere que não emitiu qualquer fatura e/ou recibos em causa nos presentes autos, sendo certo que a falsidade de alguns dos documentos é facilmente visível, até porque a impressão dos mesmos não é igual (…) Responde ainda que é verdade que em 31/07/2007, requisitou um livro de faturas/recibos com a numeração constante da notificação a que ora responde; à firma aí indicada” - cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

21. Em síntese a AF conclui que “ Estamos pois perante documentos que se desconhece a proveniência e consequentemente impossibilitam comprovar a efetividade do serviço neles mencionado (…) Por outro lado, existem indícios de que as faturas, terão sido, presumivelmente emitidas com a intervenção de outras pessoas ou entidades diferentes da que consta como entidade emitente das faturas e que o representante do sujeito passivo se escusou a identificar Face a tais factos, nos termos do art. 23º do CIRC, não são aceites fiscalmente os custos titulados por estes documentos, na medida em que não se verificam os requisitos aí estabelecidos ”- cfr. fls. 47 a 112 dos presentes autos;

22. A impugnante realizou inúmeras obras situadas, nomeadamente, na Figueira da Foz, Anadia, Coimbra, Castelo Branco, Fundão, Proença-a-Nova, Vila Velha de Rodão, Guarda, Pinhel e Fundão – cfr. depoimento das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P........;

23. Os trabalhadores da impugnante, em número de 20/30, encontravam-se entre 15 a 30 dias numa obra e circulavam para outras obras de acordo com as necessidades a colmatar em cada empreitada – cfr. depoimento das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P........;

24. A impugnante era subcontratada por empresas que ganhavam os concursos de empreitada, e por sua vez, dado o número insuficiente de trabalhadores ao seu serviço para a quantidade de obras em curso, subcontratava outros empreiteiros, nomeadamente de origem africana e de outras nacionalidades – cfr. depoimentos das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P........;

25. Os pagamentos eram realizados em dinheiro e cheque - cfr. depoimento das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P........;

26. Havia um encarregado geral da obra, o qual pertencia à empresa que havia ganho o concurso, por sua vez F........ tinha o encarregado da empresa que orientava e dada instruções aos trabalhadores da empresa impugnante – cfr. depoimento das testemunhas L........., J........, A.J........ e P........;

27. A impugnante firmou vários contratos de subempreitada e/ou apresentou autos de medição e/ou orçamentos em 2006 com a Camara Municipal da Guarda; C........., SA.; G.........; Câmara Municipal da Figueira da Foz, C........., Lda. - cfr. fls.116 a 133 e 225 a 326 dos presentes autos;

28. Durante o ano de 2006, a impugnante firmou diversos contratos de subempreitada e/ou apresentou autos de medição para a realização das seguintes obras – “ Subestação de Penamacor”, “Remodelação do Centro de Saúde de Pinhel”, “Centro de Saúde de Castelo Branco”, “ Polo Termal de Longrovia – Construção do Balneário Termal”, R........., Lda.”, “ Edifício Habitacional «Madicentro Bloco F e G»-Rua João de Barros-Figueira da Foz” – cfr. fls.116 a 133 e 225 a 326 dos presentes autos;

29. A impugnante deduziu reclamação graciosa a qual veio a ser indeferida em 08/06//2009 – cfr. fls. 28 dos presentes autos.

II. 2- DOS FACTOS NÃO PROVADOS

Não existem factos relevantes para a decisão que importe destacar como não provados

II. 3 – MOTIVAÇÃO

A convicção do tribunal formou-se com base no teor dos documentos juntos aos autos e expressamente referidos no probatório supra e no depoimento das seguintes testemunhas:

R........, carpinteiro e trabalhador da impugnante.

Mostrou conhecimento sobre o modo de funcionamento da empresa onde trabalha há mais de 10 anos, revelando que a impugnante possuía muito trabalho, ou seja, subempreitadas, possuía cerca de 20/30 trabalhadores, sendo que o pagamento dos mesmos era feito tanto em dinheiro como em cheque.

Dada a insuficiência de trabalhadores da empresa, a impugnante recorria aos serviços de outras empresas as quais tinham uma equipa de trabalhadores de origem normalmente africana, de que não conhecia os nomes, pois eram nomes pouco usuais “esquisitos” que não conseguiu identificar. Não identificou a maior parte das obras mas os locais onde trabalhou, nomeadamente, em Castelo Branco (em 2006) (centro de Saúde), em 2005 Coimbra, Anadia, Fundão (Centro de Moagem), Proença-a-Nova, Vila Velha de Rodão.

L........., pedreiro e trabalhador da impugnante.

Mostrou conhecimento sobre o modo de funcionamento da empresa onde trabalha há mais de 10 anos, revelando que a impugnante possuía muito trabalho, ou seja, subempreitadas, possuía cerca de 20/30 trabalhadores, sendo que o pagamento dos mesmos era feito, tanto em dinheiro como em cheque.

A impugnante recorria a trabalhos de outras empresas, nomeadamente, africanos, que não identificou os nomes, afirma que sem essas subempreitadas a impugnante não conseguia concluir os trabalhos dentro dos prazos estipulados.

Identificou obras em, Coimbra (RDP), na Guarda e no Fundão (Mercado Abastecedor).

J........, motorista manobrador e trabalhador da impugnante.

Referiu que a impugnante tinha muitas obras em curso em 2005 e 2006, pelo que recorreu a subempreiteiros, mas que não conhecia bem as pessoas que se encontravam em cada obra.

Identificou obras na Guarda e na Figueira da Foz (urbanização privada).

A.J........, trabalhador da construção civil, trabalhou primeiro para a empresa B.E........, Lda, e desde 2005 para a F........ e B........., Lda., contudo diz conhecer o F........ há mais de 20 anos.

Refere também que a impugnante tem cerca de 20/30 trabalhadores e que face às inúmeras obras de que era subempreiteiro, tinha de recorrer a outros subempreiteiros, em que figuravam africanos, brasileiros, romenos e ucranianos.

Afirmou conhecer B........., um negro magro, mas não ouviu falar da empresa F........, Lda., nem de A........ . Referenciou B........., como ligado a obras em Castelo Branco, Anadia (ginásio) Fundão (Moagem e Mercado Abastecedor). Referiu que os trabalhos subcontratados pela impugnante eram necessários por forma ao cumprimento dos prazos das empreitadas.

P........, Pedreiro conhece o F........ há mais de vinte anos e trabalha para a impugnante desde 2005.

Refere que face ao número de trabalhadores da empresa, a impugnante tinha de recorrer a trabalhos de outras empresas, face às inúmeras obras que o patrão tinha contratado. Identificou obras em Pinhel (Hospital), Guarda, figueira da Foz, Fundão, Coimbra (Clinica) e Castelo Branco.

Refere que B........., não lhe é desconhecido, que chegou a levar dinheiro ao mesmo que identificou como sendo o encarregado da empresa que a impugnante subcontratou.

Refere que a impugnante firmava contrato escrito das subempreitadas, com a empresa vencedora do concurso. Referiu que o meio de pagamento usual era em cheque ou dinheiro.

R.M......... (inspetor tributário), C......... (inspetor tributário) e J.A......... (inspetor tributário) refirmaram os factos e conclusões constantes do relatório de inspeção.

A........, atualmente encontra-se coletada, em nome individual, para a atividade de acessórios de motociclos.

Afirma não ter tido qualquer relação comercial com a F........ e B........., Lda., não tendo emitido qualquer fatura ou assinado faturas nos anos de 2005 e 2006. Refere que só trabalhou em 2003 para a empresa Amadeu e que encerrou a atividade nas finanças (trabalhos de construção civil) em finais de 2005.

Afirma que as faturas que constam na impugnante são falsas, pois não titulam quaisquer trabalhos que tenha realizado para a impugnante bem como não recebeu qualquer dinheiro a que se reportam facturas/recibo em causa.

Refere que os recibos são falsos, que não fazem parte das faturas.

Afirma ainda que intentou uma ação judicial no Tribunal Judicial de Seia contra o Sr. B........., dada a falsidade das faturas.

Os depoimentos das testemunhas foram credíveis, não só pela argumentação que se manifestou dentro de uma linha factual homogénea traçada pelas mesmas, a qual é reforçada pela prova documental existente nos autos.»


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2. QUESTÃO PRÉVIA: Da junção de documentos com as alegações de recurso

A Recorrente juntou com as alegações uma certidão, datada de 13/06/2013, extraída do Inquérito n.º 8/08.8IDGRD a correr termos no Serviço do Ministério Público de Seia, com 47 folhas, pelo que previamente ao exame das questões suscitadas haverá que apreciar da possibilidade de junção de documentos com as alegações do recurso.

O recurso não é normalmente o meio próprio para juntar documentos aos autos, por a sede própria para a instrução da causa ser o tribunal de primeira instância, revestindo natureza excepcional a admissão de documentos nesta sede, uma vez que a reapreciação das decisões dever ser efectuada em função dos meios de prova constantes dos autos no momento da prolação das mesmas.

Efectivamente, o recurso como meio de impugnação de uma decisão judicial, apenas pode incidir sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas e não sobre questões novas, salvaguardando-se sempre as questões de conhecimento oficioso.

Sobre as questões colocadas no presente recurso, já este Tribunal Central Administrativo Sul se pronunciou, no âmbito do processo n.º 271/09.7BECTB, em acórdão de 21/05/2013, estando em causa as mesmas partes, o mesmo relatório de inspecção tributária e a mesma decisão que sancionou as correcções aritméticas em sede de IRC, dos anos de 2005 e 2006, com a diferença de que os presentes autos respeitam à liquidação de IRC do ano de 2006 e no acórdão citado estava em crise a liquidação de IRC do ano de 2005, sendo que as sentenças recorridas também são idênticas, subscritas pela mesma juíza, bem como as alegações de recurso e contra-alegações, sendo ainda de referir que as testemunhas ouvidas prestaram os seus depoimentos relativamente à matéria de factos alegada nos dois processos.

Assim, em função da semelhança em relação ao caso em apreço e por economia de meios, visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil), acolhemos a argumentação jurídica constante do identificado acórdão (ainda inédito) deste Tribunal Central Administrativo Sul, e por as questões aqui em análise não deferirem, seguiremos de perto este acórdão, permitindo-nos transcrever as passagens relevantes, relativamente a cada uma das questões suscitadas, cujo entendimento perfilhamos.

Relativamente à requerida junção do documento, consubstanciado numa certidão, com a alegação de recurso, escreveu-se no identificado acórdão:

«Nas suas contra-alegações, a ora Recorrida questiona a junção em sede de recurso e pelo recorrente, de uma certidão, composta de vários documentos, requerida e obtida no âmbito de um inquérito judicial a correr seus termos pelos Serviços do Ministério Público da comarca de Seia, junção é feita no abrigo dos invocados art.ºs 523.º, 2 e 524.º, 1 e 2, ambos do C.P.C., aplicável por força do art.º 2.º do C.P.P.T.

Ora, tendo em conta o inicio da acção inspectiva e os meios de investigação ao dispor da administração tributária (art.º 63.º-B, da LGT, v.g.) e, bem assim, os fundamentos dessa acção, é patente que lhe era possível obter tais documentos para fundamentar a decisão que veio a tomar e objecto desta impugnação, isto é, a AT não estava impossibilitada de ter obtido tais documentos, no limite, ate ao encerramento da discussão e a prova exuberante disso mesmo e que o recorrente não alega, em parte alguma essa impossibilidade.

Aliás e curiosamente, mas sem deixar de ser estranho, o Sr. Director de Finanças apenas solicitou tais documentos ao Ministério Público de Seia por ofício de 2012.05.21, ou seja, um dia antes de ter sido proferida sentença nos dois processos a que se referem estas alegações (cfr. ofício junto com as alegações).

E curiosamente também fundamenta o seu pedido expressando que a certidão requerida se destina “a instruir a contestação e as alegações das impugnações n.º 274/09.1BECTB, n.º 271/09.7BECTB e n.º 270/09.9BECTB…” (sublinhado nosso)

Mas a verdade é que, quer a contestação, quer as alegações subsequentes à produção de prova, há muito que tinham sido apresentadas. Alem de que, como se disse, a sentença recorrida foi proferida no dia seguinte à data do ofício em causa.

Portanto, a Administração Fiscal (AF) nunca esteve impossibilitada de apresentar tais documentos antes do termo da discussão, impossibilidade de resto, que nem sequer alega.

A A.F. poderia, atempadamente, ter desencadeado os procedimentos legais ao seu dispor para a obtenção dos documentos que ora junta, sem necessidade de “aguardar” (?). de se socorrer desses mesmos elementos documentais obtidos no âmbito de um inquérito de natureza criminal.

Consequentemente, o recorrente não alega capazmente e não prova que estivesse impossibilitado de apresentar tais documentos ate ao encerramento da discussão, pelo que, não deve ser admitida a sua junção, devendo ser ordenando o seu desentranhamento, questionando ainda o seu valor probatório e a falta do necessário contraditório neste domínio.

Que dizer?

Como é sabido, os recursos configuram.se como meio de impugnação das decisões dos tribunais inferiores e visam modificar as decisões recorridas e não apreciar questões não decididas pelo tribunal «a quo», ou seja, são meios de obter a reforma daquelas decisões e não vias jurisdicionais para alcançar decisões novas, como resulta, aliás, do disposto nos arts. 676°, n° 1, 680°, n° 1 e 685°-A, todos do C. Proc. Civil.

O seu objecto tem de cingir-se, em regra, à parte dispositiva da decisão (n° 2 do art. 684° do C. Proc. Civil) e encontra-se, portanto, objectivamente limitado pelas questões postas ao tribunal recorrido, o que significa que na fase de recurso não pode ser atendido um documento, só então junto, que não se destine a provar facto alegado pelo recorrente.

Com efeito, em sede de recurso, só dentro dos limites indicados no n° 1 do art. 524° do C. Proc. Civil ou só no caso de a junção se tornar necessária em virtude do julgamento proferido na Ia instância, é que as partes podem juntar documentos às alegações, dispondo o art. 693°-B do C. Proc. Civil que “as partes podem juntar documentos às alegações, nas situações excepcionais a que se refere o artigo 524° ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na Ia instância e nos casos previstos nas alíneas a) a g) e i) a n) do n° 2 do artigo 691°”.

Assim, após o encerramento da discussão na Ia instância são admitidos, conforme dispõe o n° 1 do art. 524° do mesmo diploma, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, sendo que o n° daquele artigo permite/que os documentos destinados a provar os factos posteriores aos articulados, ou cuja apresentação se tenha tornado necessária por virtude de ocorrência posterior, podem ser oferecidos em qualquer estado do processo.

Mas, a frase «em qualquer estado do processo» significa, conforme diz o Prof. Alberto dos Reis, que os documentos em referência podem ser juntos mesmo depois de encerrada a discussão em Ia instância, mas, como é evidente, na Ia instância (vide Código de Processo Civil Anotado, Vol. IV, pág. 18).

Em sede de recurso, relativamente à primeira parte da norma em apreço - art. 693°-B do C. Proc. Civil, para que a junção seja lícita, é necessário que a parte demonstre que não lhe foi possível juntar os documentos até ao encerramento da discussão na Ia instância.

Quanto ao mais, a lei não abrange, conforme dizem Antunes Varela. J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, a hipótese de a parte se afirmar surpreendida com o desfecho da acção (ter perdido, quando esperava obter ganho de causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento que já poderia e deveria ter apresentado na Ia instância.

O legislador quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida (vide Manual de Processo Civil. 2a ed., págs. 533 e 534).

O advérbio «apenas», usado na disposição legal significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na Ia instância.

Assim a junção de documentos às alegações só poderá ter lugar se a decisão da Ia Instância criar pela primeira vez a necessidade de junção de determinado documento quer quando se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes não contavam (vide Antunes Varela, RLJ, ano 115°, pág. 95)».

Ora, no caso dos autos, os documentos juntos pela recorrente com as alegações recursórias, consistem numa certidão que integra elementos coligidos no âmbito do processo de inquérito n° 8/08.8 IDGRD, com referência a cheques emitidos pela Recorrida para liquidação de serviços prestados pelos fornecedores aí identificados, que apresentam no verso o n° de conta bancária de depósito que pertence, na maioria dos casos, a F........s e à empresa da qual também é sócio-gerente B.E........, Lda.

Das datas a que se reportam os factos documentados vê-se que se trata de documentos que se referem a factos que não são supervenientes, tratando-se de matéria que integra todo o procedimento que envolve os presentes autos e como tal são anteriores à data da apresentação da presente impugnação, sendo que mesmo considerando a data em que o Millennium BCP terá disponibilizado tais elementos - 14-12-2011, é ponto assente que tais elementos poderiam ter sido apresentados antes da decisão da Ia

No entanto, também, é manifesto que os aludidos documentos são efectivamente relevantes na demonstração da matéria que importa discutir nos autos e tendem a demonstrar erro de julgamento da sentença recorrida, pelo que, em decorrência dos princípios do inquisitório e da livre investigação, aplicáveis no âmbito do direito tributário, sempre se imporia se o seu conhecimento fosse do domínio do Tribunal, diligenciar pela respectiva junção, razão porque se devem manter nos autos, sem embargo de a recorrente dever ser condenada em multa pela respectiva apresentação tardia, atendendo à relevância dos mesmos.»

Face ao exposto, admite-se a junção aos autos do documento apresentado com as alegações.

Vai, porém, a Recorrente, condenada em multa pela apresentação tardia do documento.


*

3. DO DIREITO

3.1. Da nulidade da sentença por excesso de pronuncia

A Recorrente, invoca nas suas conclusões de recurso a nulidade da sentença, como se colhe da alínea b) das conclusões supra transcritas.

O vício de nulidade assacado à sentença é o do excesso de pronúncia.

A Recorrente alicerça a sua alegação, referindo que a Impugnante não impugnou a correcção aritmética relativa à não admissão da dedutividade fiscal da factura n.º 25 de 28/09/2006, no valor de € 64.372,00 alicerçada, em suma, por a factura constituir uma cópia, desconhecendo-se o original, a entidade emitente das mesmas, encontrava-se com a actividade cessada e afirmou não a ter emitido, nem o recibo, sendo que este, também em cópia, com o n.º 30, tem como descrição Pagamento da factura n.º 25 de Setembro de 2007”, e o pagamento não está registado em conta corrente, padecendo, por isso, a sentença de nulidade, ao anular a liquidação de IRC do ano de 2006 ora em crise, em virtude de ter condenado a administração fiscal “em quantidade superior” e “em objecto diverso do pedido” e pronunciando-se “sobre questões” que não devia conhecer ou “de que não podia tomar conhecimento” nos termos do artigo 125.º, n.º 1 do CPPT e do artigo 668.º, n.º 1, alínea d) do CPC.

Como já deixamos expresso supra, as questões formuladas foram colocadas em termos idênticos no processo n.º 271/09.7BECTB, cujo acórdão foi proferido em 21/05/2013, acolhendo-se aqui integralmente o seu discurso fundamentador, visto que se trata da mesma questão de facto e de direito.

Assim, transcreve-se o seu discurso fundamentador relativamente à questão em apreço:

«A partir daqui, cumpre entrar na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida, desde logo, a tarefa de indagar da nulidade da sentença por excesso de pronúncia e por ter condenado a administração fiscal “em quantidade superior” e “em objecto diverso do pedido”.

Com efeito, no âmbito das suas alegações, a Recorrente aponta que b) Como já havia sido salientado em sede de contestação, não foram concretamente impugnadas, nunca invocando a impugnante/recorrida qualquer fundamento de ilegalidade, e logo aceites, as correcções meramente aritméticas à matéria tributável a seguir identificadas: ponto “III-1 do relatório de inspecção - registo contabilístico em duplicado - correcção em sede de IRC, exercício de 2005, correcção positiva ao lucro tributável declarado no exercício de 2005, no valor de 44.000,00€, por se tratar dum custo considerado em duplicado e, logo, não ser fiscalmente dedutível nos termos do artigo 23° do CIRC - fls. 11 e 12 do processo administrativo organizado nos termos do artigo 111° do CPPT.

(…)

Ora, ao não ter sido concretamente impugnada, e logo aceite, a correcção meramente aritmética supra evidenciada à matéria tributável, o tribunal “a quo”, ao anular a liquidação de IRC/2005 ora em causa (julgando a impugnação totalmente procedente), violou o artigo 661/1 do CPC e o artigo 668/1 alínea e) do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2o do CPPT, em virtude de ter condenado a administração fiscal “em quantidade superior” e “em objecto diverso do pedido”, e pronunciando-se “sobre questões” que não devia conhecer ou “de que não podia tomar conhecimento” nos termos do artigo 125/1 do CPPT e do artigo 668/1 alínea d) do CPC, violando ainda o artigo 23° do CIRC uma vez estar em causa um custo ou gasto que nem foi comprovado nem foi indispensável para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, ou seja, que não foi justificado e que nem sequer existe.

Quanto ao primeiro apontado no parágrafo anterior, esta nulidade é a consequência processual da violação da regra do ait. 661° n° 1 do C. Proc. Civil, em que se estabelece que «a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objecto diverso do que se pedir», sendo que como decorre do texto desta norma tal nulidade só se pode verificar em relação a pedidos de condenação e a decisões condenatórias: haverá nulidade se a condenação exceder quantitativamente aquilo que havia sido pedido ou modificar a qualidade do pedido, condenando a parte vencida em objecto diferente do que foi pedido.

No entanto, quanto ao segundo elemento acima apontado, cumpre ter presente que das nulidades de sentença indicadas no n° 1 do art. 668° do C. Proc. Civil, só não se inclui no art. 125° do Código de Procedimento e de Processo Tributário a prevista na sua alínea e), em que se considera ocorre nulidade quando o juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.

Assim sendo, embora tal matéria não deixe de ter relevância, tal como aponta o Cons. Jorge de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Vol. II, 6a edição, 2011, págs. 367-368, “estando o excesso de condenação excluído da lista de nulidades que consta do presente art. 125°, ele não poderá ser considerado como tal, designadamente por aplicação subsidiária do art. 668° n° 1 do C. Proc. Civil pois, a única utilidade da reprodução das restantes nulidades neste previstas e não da referida na sua alínea e), não pode deixar de ser afastar tal qualificação nas situações enquadráveis nesta última”, o que significa que esta matéria terá de ser considerada, como conclui o Autor referido, no âmbito do regime jurídico dos erros de julgamento.

Deste modo, circunscrita que está a matéria a tratar em termos de nulidade da sentença recorrida, cabe notar que segundo o disposto no artigo 125° n° 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, é nula a sentença quando ocorra ua falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer”, sendo que esta nulidade está directamente relacionada com o dever que é imposto ao juiz, pelo artigo 660° n° 2 do Código de Processo Civil, de resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras, determinando a violação dessa obrigação a nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

Assim, embora o julgador não tenha que analisar todas as razões ou argumentos que cada parte invoca para sustentar o seu ponto de vista, incumbe-lhe a obrigação de apreciar e resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, isto é, todos os problemas concretos que haja sido chamado a resolver no quadro do litígio (tendo em conta o pedido, a causa de pedir e as eventuais excepções invocadas), ficando apenas exceptuado o conhecimento das questões cuja apreciação e decisão tenha ficado prejudicada pela solução dada a outras. E questão, para este efeito (contencioso tributário), é tudo aquilo que é susceptivel de caracterizar um vício, uma ilegalidade do acto tributário impugnado.

A partir daqui, é manifesto que a Recorrente não tem razão no que diz respeito à invocada nulidade da sentença, dado que, esta não julgou para além da pretensão formulada pela impugnante na sua petição inicial, onde se refere que “Termos em que deve a presente impugnação ser julgada totalmente procedente por provada, com as legais consequências”.

Com efeito, em sede de petição inicial, com referência ao enquadramento da lide a impugnação judicial é deduzida “contra o despacho do Sr. Director de Finanças da Guarda, datado de 08-04-2009, que indeferiu a reclamação graciosa apresentada contra a liquidação adicional de IRC relativa ao exercício de 2005 e respectivos juros compensatórios, no montante de € 115.382,56”.

Tendo presente o teor da reclamação graciosa, cabe notar que já aqui a ora Recorrida não questionou a matéria a que alude a Recorrente, o que significa que tal realidade também não colocada em crise neste processo, de modo que, a anulação da liquidação impugnada decretada pela sentença recorrida tem de ser interpretada neste contexto, ou seja, em função do desenho da lide em função do teor da petição inicial.

Tal quer dizer que a decisão recorrida tem de ser entendida de acordo com as coordenadas do processo, o que tem como consequência, que a mesma não atinge, como parece ser o receio da Recorrente, a liquidação de IRC de 2005 na sua totalidade, mas apenas a aludida liquidação com referência aos elementos analisados e discutidos nestes, o que significa que o Tribunal “a quo” não excedeu os seus poderes, o que afasta a invocada nulidade prevista nos artigos 125º do Código do Procedimento e de Processo Tributário e 668° n° 1 alínea d), do C. Proc. Civil, nada mais se impondo apreciar neste âmbito.»

Na situação dos autos a Recorrida questionou na petição inicial a não admissão de custos titulados pela factura emitida em nome de “A........,” bem como aquelas que formam emitidas em nome da “B........, Lda.” e “S........, Lda.”, no ano de 2006.

Resulta da petição inicial e da decisão da primeira instância que a Senhora Juíza a quo moveu-se dentro da questão suscitada ao tribunal, sendo certo que o Tribunal a quo tem por obrigação conhecer da causa de pedir e do pedido, aplicando o direito ao caso concreto, pelo que não se verifica a arguida nulidade por excesso de pronúncia.

Assim, é de concluir não se verifica a arguida nulidade.

Face ao exposto, é também aqui de julgar improcedente a conclusão vertida na alínea b) da alegação de recurso.


*

3.2. Do erro de julgamento

A liquidação de IRC do ano de 2006 em crise nos autos tem origem em correcções à matéria colectável da Recorrida por a Administração Tributária não ter aceite como custos os valores das facturas emitidas à Recorrida por não titularem transacções efectivas, tais corrrecções encontram-se alicerçadas nos factos descrito no relatório de inspecção tributária.

A Recorrente discorda da decisão da primeira instância, alegando erro de julgamento ao ter concluindo que os custos não podem deixar de ser aceites, em suma, por embora os emitentes das facturas em concreto não terem fornecido aqueles serviços, tal não significa que a impugnante não tenha recorrido a outros fornecedores de serviços ou mesmo aqueles, e, consequentemente, ter anulado a liquidação adicional de IRC, do ano de 2006 e respectivos juros compensatórios, no valor total de € 45.760,84, sustentando que a Recorrida não logrou fazer prova de que os emitentes das facturas identificadas nos autos forneceram aqueles serviços mencionados nas facturas à impugnante, sendo que esta também nunca argumentou no sentido dos eventuais serviços ou custos suportados terem sido prestados por outros que não as empresas constantes das facturas consideradas falsas pela Administração tributária.

Vejamos.

Configura entendimento jurisprudencial reiterado e sólido, em situações como a dos autos, quando a Administração Tributária procede a correcções da matéria colectável declarada por considerar que as facturas que documentam custos, em IRC, não correspondem a operações reais, compete-lhe reunir e demonstrar factos que permitem, com recurso às regras de experiência, concluir que as facturas visadas não correspondem a operações reais e efectivas.

Cumprido este encargo pela Administração Tributária, passa a impender sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que tais facturas consubstanciam operações realmente efectuadas pela entidade emitente desses documentos e pelos valores constantes dos mesmos, comprovando que os custos que contabilizou.

Prosseguindo com o discurso fundamentador do acórdão prolatado no processo n.º 271/09.7BECTB, visto que se trata da mesma situação de facto e de direito, sendo o teor da sentença aí proferida absolutamente idêntica, divergindo tão só as facturas e montantes, uma vez que a liquidação dos presentes autos respeita ao exercício de 2006.

«Avançando, está na altura de analisar a matéria essencial em equação nos autos, tendo presente que a decisão recorrida julgou procedente a impugnação, com base nos seguintes elementos:

“…

Afigura-se-me, pois, que a partir destes indícios a AF demonstrou a consistência do seu juízo, e falta de credibilidade das declarações do contribuinte.

Passa a recair sobre a impugnante o ónus da prova.

Neste desiderato, nos presentes autos, a impugnante:

- Refere que as operações postas em crise são reais e junta documentos (contratos de subempreitada e autos de medição) e arrola testemunhas;

- Reafirma que a AF nunca colocou em causa a indispensabilidade dos custos para a obtenção dos proveitos, mas apenas a partir da falta dos requisitos formais das faturas aliada a uma fraca evidenciação dos fluxos financeiros, extrapolou a conclusão de que as operações eram simuladas.

Vejamos.

E certo que, durante a fase inspetiva a impugnante não carreou elementos que permitissem inflectir o juízo de probabilidade de faturação falsa, nomeadamente, não juntou os elementos adicionais, nomeadamente contratos, comprovação dos fluxos financeiros com essas entidades.

Mas será que, com a prova realizada nos autos podemos concluir que existiram operações simuladas, com o intuito de deduzir custos que não existiram?

Na verdade, a Administração Fiscal põe em causa a veracidade das operações suportadas nas facturas, não por estas não terem sido realizadas, mas porque da contabilidade do emitente, que não a impugnante, não resultam indícios de que o tivessem sido, aliado à falta de colaboração da impugnante.

Afigura-se que a AF não pode continuar a defender a mesma tese que em fase inspetiva, uma vez que procedeu ao ajustamento do lucro tributável, em sede de IRC, afastando a presunção de veracidade dos elementos contabilísticos da Impugnante, apenas porque as facturas desconsideradas continham irregularidades formais, e porque os emitentes das mesmas se encontravam em situação irregular.

A AF baseou-se em indícios externos e extrapolou as conclusões para a impugnante.

Ora. independentemente, das questões que possam ser postas relativamente à contabilidade dos fornecedores de serviços, a verdade é que essas irregularidades só podem ter reflexos na contabilidade da Impugnante na medida em que, aqui, também reflitam irregularidades suceptíveis de pôr em causa a veracidade das operações nelas reproduzidas.

A AF não invoca factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações da impugnante e dos dados constantes da sua contabilidade - artigo 75.° da LGT.

Na verdade, a AF reconhece até que com a não aceitação destes custos, o resultado fiscal do exercício de 2005, poderá, eventualmente, não refletir a capacidade contributiva da empresa, no entanto, coloca da parte do contribuinte o ónus da prova” (...) caberia ao sujeito passivo colaborar no estabelecimento de menos expressiva quantificação do lucro tributável. Contudo, quando o representante do sujeito passivo F........ foi ouvido relativamente às relações comerciais estabelecidas com estes fornecedores, não apresentou elementos que confirmassem a existência daqueles custos ou de outros que pudessem subsumir-se em factos tributários configuradores de custos efetivamente suportados. (...) ".

Ora, a impugnante veio aos autos com elementos que permitem concluir que:

- A impugnante durante aos anos de 2005 e 2006, face às inúmeras obras de subempreitada que detinha, e face ao insuficiente número de trabalhadores da empresa, teve necessidade de subcontratar serviços com outras entidades;

- A empresa impugnante não tinha estrutura humana para suportar a realização de todas as obras que subcontratou, uma vez que;

- Nesses anos, realizou obras em Coimbra, Anadia, Figueira da Foz, Pinhel, Guarda, Castelo Branco, Fundão, Vila Velha de Rodão e Proença-a-Nova;

- Para realização desses serviços subcontratados pagou a empresas/entidades individuais de origem africana, romena, ucraniana, brasileira e portuguesa.

Ora. tal como a própria AF reconhece no relatório inspetivo, o elevado valor dos resultados fiscais apurados, sempre teria de ter como correspondência custos inerentes aqueles proveitos.

Verificando-se que a impugnante contabilizou em custos com pessoal o valor de € 125.359,14 e, em subcontratos o valor € 538.457,00, considerando a correção, ora contestada, no valor de € 490.695,63 referente a subcontratos não aceites, facilmente se conclui não ser viável que para a obtenção dos proveitos a impugnante incorresse apenas naqueles custos com mão-de-obra.

Pois, o facto da impugnante não ter capacidade produtiva própria e ter um diminuto encargo com as remunerações dos trabalhadores da empresa, necessariamente, teria de recorrer a fornecedores de mão-de-obra externa (subcontratos).

Note-se que, com o volume de obras realizadas pela impugnante (subempreitada), esta sempre teria de socorrer-se de fornecedores externos (que até poderiam ser outros, ou, em hipótese alternativa, pode ter recorrido aqueles que se encontram formalizados na faturação, apesar daqueles não declararem os respetivos proveitos, encontrarem-se em situação irregular perante a Administração Fiscal e, por isso, não terem identificado as faturas com as quais foram confrontados pela Inspeção Tributária).

Das várias irregularidades encontradas nos fornecedores de serviços externos, e confrontada pelas dificuldades da impugnante em erigir fluxos financeiros decorrentes das operações efetuadas, dado que os pagamentos, como é uso na construção civil, serem efetuados em dinheiro e cheque, o que a AF vem a concluir é que os emitentes das facturas em concreto, a F........, Lda., B........., S........., Lda. e, A........, não forneceram aqueles serviços mencionados nas facturas à impugnante.

Note-se que, apenas, A........, repudia ter efetuado quaisquer serviços à impugnante.

Porém, tal não significa que a impugnante não tenha recorrido a outros fornecedores de serviços ou mesmo aqueles.

De acordo com o art. 23.º do CIRC são fiscalmente relevantes os custos ou perdas que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

E a jurisprudência acrescenta a indispensabilidade e o nexo causal entre os custos e os ganhos sujeitos a imposto.

Ou seja, em sede de IRC, o que releva para efeitos da comprovação e relevação fiscal, de determinadas despesas, enquanto custos de exercício é, essencialmente a comprovação da sua efetiva realização.

Nesta conformidade, face à instrução realizada, logrou a impugnante provar que os custos em que incorreu foram indispensáveis para a realização dos proveitos, já que sem a realização dos subcontratos (valor de custos desconsiderado pela AF) as empreitadas em que participou (em elevado número) não se encontrariam concluídas nos prazos adjudicados.

Relembremos que a perspetiva da AF é de que a impugnante não terá adquirido os fornecimentos de serviços aos fornecedores identificados, só que esta conclusão suscita um reparo se a impugnante não incorreu naqueles custos com subcontratos, também não terá faturado os correspondentes proveitos.

Sendo assim, tendo desconsiderado os custos nesta rubrica contabilística, deveria também ter eliminado os proveitos correspondentes, pois em circunstâncias normais estes últimos não podem existir sem os primeiros.

Poder-se-ia dizer, então, que os subcontratos não foram efetuados por aqueles sujeitos emitentes mas por outros, que não estavam em condições de emitir qualquer documento.

E possível, mas tais hipóteses desacompanhadas da prova adequada remete apenas para o domínio da ficção, sem qualquer préstimo para o Direito.

Termos em que, sendo óbvia a conclusão de que tais custos não podem deixar de ser aceites, a impugnação terá de proceder. ...”.

Com interesse para o enquadramento desta questão, cabe ter presente o exposto no Ac. deste Tribunal de 28-06-2011, Proc. n° 02477/08, wwvv.digsi.pt, onde se aponta que "O Imposto sobre o Rendimento/das Pessoas Colectivas (I.R.C.), introduzido no sistema tributário português pelo dec.lei 442-B/88, de 30/11, pode definir-se como um imposto directo, tanto de um ponto de vista jurídico (como tal é classificado no Orçamento do Estado), como de um ponto de vista económico, dado que incide sobre manifestações directas ou imediatas da capacidade contributiva como é o rendimento real (em geral lucros) das empresas com sede ou direcção efectiva em Portugal. E um imposto de características reais, visto não levar em consideração os sinais pessoais que se verificam na pessoa do contribuinte, antes se dirigindo objectivamente à tributação da riqueza. E, igualmente, um tributo de características unitárias, no sentido de abranger tendencialmente todos os rendimentos das pessoas colectivas. Encontramo- nos perante um imposto proporcional, dado a sua taxa ser fixa qualquer que seja o montante da matéria colectável e assentando, em princípio, na tributação do rendimento real ou efectivo, embora admita presunções de rendimento, assim como a sua fixação através de métodos indiciários. Por último, encontramo-nos perante um tributo periódico, visto que a obrigação de imposto se renova nos sucessivos períodos anuais de tributação, dando origem, consequentemente, a sucessivas obrigações tributárias anuais e independentes umas das outras (cfr.arts. l, 2, 3, 7, 51 e 69, todos do C.I.R.C.; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, I, Editora Rei dos Livros, 1996, pág.215 e seg.; Soares Martinez, Direito Fiscal, 8a.edição, Livraria Almedina, 1996, pág.573 e seg.).

A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no art°3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu n°.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.

Por outro lado, é no art°.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no art°23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.

Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido art°23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que inevitavelmente daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para fins fiscais (cfr. J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2a. Edição, pág.237 e seg.).

Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5 a. edição, 1996, pag.206 e seg.).

Refira-se, ainda, que as empresas são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal, a qual permita o controlo do lucro tributável (cfr.art°.98, do C.I.R.C., na versão em vigor no ano de 2001, actual art°115, do C.I.R.C.; arfs.29 e 31, do C.Comercial).

O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos (cfr. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág.324; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1996, páig.57; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3a. edição, 1997, pág.269). Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição "sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada…”.

Neste domínio, em função do que consta do probatório, a própria sentença recorrida considerou que “a AF detinha informação que as empresas subcontratadas pela impugnante, postas em crise, indiciariamente constariam de um esquema fraudulento de faturação a que não correspondiam operações reais e, por outro lado, a impugnante, mormente a evidenciação pouco clara dos fluxos financeiros da empresa (pagamentos em cheque, e dinheiro) não consegue provar inequivocamente que foram aqueles prestadores de serviços os beneficiários dos custos que a impugnante suportou”, para depois concluir que “a AF demonstrou a consistência do seu juízo, e falta de credibilidade das declarações do contribuinte”.

Neste âmbito, a jurisprudência aponta que o ónus da prova se reparte, em processo onde o contribuinte impugne a actuação da AT, desconsiderando operações consubstanciadas em determinadas facturas existentes na escrita daquele, no sentido de caber a esta (AT) a prova dos pressupostos da sua actuação e àquele (contribuinte) a prova de que as questionadas operações tiveram, efectivamente, lugar. Ou, numa outra formulação, obtendo a AT indícios sérios e credíveis de que determinada operação comercial titulada por uma factura não é real, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade dessa transacção (neste sentido, Ac. TCAN de 24-01-2008, Proc. n° 02887/04 - VISEU, vvww.dgsi.pt)

Além disso, se na contabilidade da impugnante se mostravam registados custos, além de outros devidamente comprovados, que aqueles não assumiram, não suportaram, sendo fora de dúvidas que, em virtude de tais registos serem apoiados por facturas fisicamente aí arquivadas, esses encargos ascendiam a uma quantia certa, a necessária não consideração de tais custos importava, directa e consequentemente, a subtracção dessa importância e não qualquer outra, aleatoriamente justificada e determinada, ao total dos resultados declarados como obtidos no ano em causa.

Cabe ainda notar que a AT não relevou ou fez apelo a quaisquer outras facturas que não as integrantes da contabilidade, pelo que, objectivamente, neste aspecto concreto, não se viu confrontada com qualquer motivo determinante da impossibilidade de quantificar exacta e precisamente os custos que não podiam ser fiscalmente aceites para efeitos de apuramento do lucro tributável do contribuinte nos anos em apreço.

Neste cenário, aos serviços da AT não restava outra alternativa legal que aquela que produziram de, sendo imposta, pelo art. 23. ° n.º 1 CIRC, a não consideração dos custos reputados fictos, efectuar a correcção consubstanciada na dedução do valor total, apurado por mera soma aritmética, desses encargos, tal como resultou das importâncias tituladas pelas facturas inquinadas de falsidade.

Nesta sequência, importa avançar para o outro elemento que se prende com a prova da veracidade das transacções em causa, sendo que inequívoco que cabe ao contribuinte evidenciar tal realidade.

Com este pano de fundo, resulta evidente que o raciocínio vertido na decisão recorrida não tem suporte bastante para se manter, na medida em que se desvia do essencial da questão que agora cumpre apreciar.

Desde logo, depois de ter considerado que a AT tinha demonstrado a consistência do seu juízo, e falta de credibilidade das declarações do contribuinte, refere-se depois que “a AF não invoca factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações da impugnante e dos dados constantes da sua contabilidade - artigo 75.° da LGT”, situação que não é possível compaginar, dado que, na primeira situação foi já ponderada a bondade da actuação da AT no que concerne à desconsideração de operações consubstanciadas em determinadas facturas existentes na escrita do contribuinte, sendo que, a resposta positiva a esta questão coloca o enquadramento da matéria num outro nível, em que surge o contribuinte com o ónus da prova da veracidade dessas operações, o que significa que a segunda afirmação não pode ser considerada neste domínio.

Por outro lado, na sentença recorrida considerou-se que as prestações de serviço assumidas pela Recorrida são indiscutíveis, mormente em função da natureza das entidades com quem estabeleceu tais prestações, sendo que esse elemento é também garantia de que tais prestações foram efectivamente realizadas.

Com efeito, a decisão recorrida salientou os seguintes elementos:

- A impugnante durante aos anos de 2005 e 2006, face às inúmeras obras de subempreitada que detinha, e face ao insuficiente número de trabalhadores da empresa, teve necessidade de subcontratar serviços com outras entidades;

- A empresa impugnante não tinha estrutura humana para suportar a realização de todas as obras que subcontratou, uma vez que;

- Nesses anos, realizou obras em Coimbra, Anadia, Figueira da Foz, Pinhel, Guarda, Castelo Branco, Fundão, Vila Velha de Rodão e Proença-a-Nova;

- Para realização desses serviços subcontratados pagou a empresas/entidades individuais de origem africana, romena, ucraniana, brasileira e portuguesa.

Assim sendo, e como a Recorrida não tinha condições para, pelos seus próprios meios, assegurar todas as obras que lhe foram adjudicadas, teve necessariamente que recorrer à subcontratação, o que conduz à afirmação da realidade reclamada pela então impugnante, até porque as deficiências formais das facturas e os pagamentos em dinheiro não são decisivas.

Ora, esta lógica como que intuitiva de decisão não encontra apoio bastante no probatório dos autos, nem procede ao devido enquadramento da matéria que efectivamente interessa aos autos.

Efectivamente, não obstante a posição assumida pela impugnante, reclamando a efectiva realização de todas as transacções referenciadas nas facturas postas em crise pela AT, constata-se que nenhuma dessa relevante factualidade foi demonstrada pela produção das provas, maxime, a testemunhal produzida no âmbito deste processo de impugnação judicial.

Desde logo, recaindo o ónus da prova sobre a impugnante, a esta competia demonstrar que a materialidade das operações económicas subjacentes às faturas, a saber: - que as prestações de serviços se haviam efetivado com as sociedades emitentes (identificadas no ponto 5 do probatório ) e não com qualquer outra entidade prestadora de serviços; - quais as quantidades precisas das prestações de serviços, local, natureza, preços praticados nas prestações de serviços que estariam em causa em cada uma das facturas.

Pois bem, lendo e relendo a matéria de facto apurada nos autos, não existe qualquer matéria que permita, sequer apontar algum elemento capaz de contribuir para eventualmente viabilizar a pretensão da Recorrida.

O probatório é constituído pela indicação das facturas emitidas pela Recorrida com referência aos trabalhos realizados no âmbito das prestações que lhe foram adjudicadas, pela caracterização do enquadramento fiscal da Recorrida, o procedimento que culminou com o relatório de inspecção, as facturas postas em crise no âmbito desse relatório e ainda outros elementos.

Além disso, as facturas que são questionadas não conseguem, só por si, comprovar a realidade que se pretende demonstrar, impondo-se evidenciar o processo a montante, ou seja, aquilo que foi contratado entre as partes, as condições fixadas, com referência aos serviços a prestar e ao preço a pagar por forma a tornar clara a leitura das facturas correspondentes.

Quanto ao probatório, é possível considerar que:

27. A impugnante realizou inúmeras obras situadas, nomeadamente, na Figueira da Foz, Anadia, Coimbra, Castelo Branco, Fundão, Proença-a- Nova, Vila Velha de Ródão, Guarda, Pinhel e Fundão - cfr. depoimento das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P........;

28. Os trabalhadores da impugnante, em número de 20/30, encontravam-se entre 15 a 30 dias numa obra e circulavam para outras obras de acordo com as necessidades a colmatar em cada empreitada - cfr. depoimento das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P.........

29. A impugnante era subcontratada por empresas que ganhavam os concursos de empreitada, e por sua vez, dado o número insuficiente de trabalhadores ao seu serviço para a quantidade de obras em curso, subcontratava outros empreiteiros, nomeadamente de origem africana e de outras nacionalidades - cfr. depoimentos das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P........;

30. Os pagamentos eram realizados em dinheiro e cheque - cfr. depoimento das testemunhas R........, L........., J........, A.J........ e P........;

31. Havia um encarregado geral da obra, o qual pertencia à empresa que havia ganho o concurso, por sua vez F........ tinha o encarregado da empresa que orientava e dada instruções aos trabalhadores da empresa impugnante - cfr. depoimento das testemunhas L........., J........, A.J........ e P........;

32. A impugnante firmou contrato de empreitada com G........., SA., em 19/05/2005 para a obra da” Pousada do Inatel” - cfr. fls. 114 dos presentes autos;

33. A impugnante firmou vários contratos de subempreitada com, C........., Lda.; C.-E........., Lda.; C.-C........., SA.; Câmara Municipal da Figueira da Foz; G.........; Á........., SA. - cfr. fls. 117 a 134 e 229 a 333 dos presentes autos;

34. Durante o ano de 2005, a impugnante firmou diversos contratos de subempreitada e/ou apresentou autos de medição para a realização das seguintes obras - “Biblioteca da Guarda”, “Emissário de Ligação entre Quiaios e a Etar da Murteirinha”, “Infraestruturas na Quinta da Cordeira”, “Infraestruturas do Lot. da Quinta de Sta. Teresa”, “Centro Gimnodesportivo da Gardunha/Fundão”, “Centro de Congressos Desportivos e Exposições de Pinhel, “Casa de Moagem do Fundão”, “Solar de Vila Ruiva - Pousada do Inatel”, “Clínica em Coimbra”, Reabertura do Acesso à Quinta do Paço”, “Construção de Edifício de Flabitação sito no lote Z da Urbanização da Quinta do Viso - Figueira da Foz”, “Remodelação do Estádio Municipal da Figueira da Foz”, “Conservação e Reparação da Pré-Primária de Arazede”, “Ampliação do Cemitério de Tavarede - Figueira da Foz”, “Subestação de Penamacor”, “Construção e Reparação de Diversos Jardins de Infância - Beneficiação do Jardim de Infância Conde Ferreira” - cfr. fls. 117 a 134 e 229 a 333 dos presentes autos.

No entanto, não se vislumbra nos elementos alinhados a virtualidade de permitirem outro tipo de leitura da realidade em apreço, dado que, apenas se sabe que dado o número insuficiente de trabalhadores ao seu serviço para a quantidade de obras em curso, a ora Recorrida subcontratava outros empreiteiros, nomeadamente de origem africana e de outras nacionalidades, ou seja, falta a necessária consistência ao exposto, que tinha ser enquadrado através da prova dos serviços contratados com as sociedades emitentes “F........, Lda.”, B........, Lda.”, “S….., Lda.” e “A........” e das condições acordadas quanto à natureza, local e preços praticados nas prestações de serviços, situação depois espelhada nas facturas emitidas.

Assim sendo, e na medida em que a ora Recorrida não fez prova da veracidade das transacções em causa, aqui, tal como foi assumido pela AT, só podemos apontar e aceitar o procedimento de desconsiderar os custos correspondentes aos montantes inscritos nas facturas reputadas “falsas”, na medida em que os mesmos, pura e simplesmente, não foram suportados, pagos, pela impugnante, na medida em que só desta forma, se concretiza e respeita, nomeadamente, a exigência legal de só se poderem considerar custos ou perdas “os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora ...” - cfr. art. 23° n° 1 do CIRC, o que significa que a sentença recorrida não pode manter-se, impondo-se a sua revogação.

Nesta matéria, e com referência ao facto de os proveitos terem sido mantidos, o que no fundo, teria de ter repercussão em termos de custos, diga-se, como se aponta no Ac. do TCAN de 12-01-2006, Proc. n° 444/04, vvww.dgsi.pt, que a "utilização de métodos indiciários numa situação destas em que apenas se não consideram os custos por inexistência de operações correspectivas é que nos parece atentatória dos princípios anteriormente referidos e mais precisamente o da justiça, da legalidade e tributação do lucro real, já que por força do uso de tal método se relevariam custos inexistentes por impossibilidade de suporte dos mesmos, o que a lei não quer. (...), através do uso de métodos indirectos não pode a AF fixar matéria colectável diferente e mais elevada do que aquela que derivaria de uma avaliação directa ou objectiva. No caso dos autos/dos factos provados não resulta impossibilidade alguma de comprovação da matéria colectável mas antes indícios sérios e objectivos de que as facturas discriminadas pelos SPIT não titulavam operações efectivamente realizadas sendo que o contribuinte não logrou provar a sua existência. Daí que face ao preceituado no art. 23.° do CIRC os custos delas constantes não possam ser relevados fiscalmente ou dito por outras palavras que não possa ser aceite a sua dedutibilidade”.

Assim sendo, subsiste a necessidade de revogar a sentença recorrida, com a total improcedência da presente impugnação judicial, ficando prejudicado o mais exposto pela Recorrente, nomeadamente, quanto ao julgamento da matéria de facto e consideração dos elementos agora juntos aos autos, pois que, como vimos, em termos de prova das operações, a decisão recorrida não foi assim tão longe como a própria Recorrente supõe, o que retira qualquer virtualidade ao alegado, na medida em que o ónus da prova cabia à ora Recorrida.»

Não podemos deixar de concordar e aderir ao explanado e decidido.

Assim, conclui-se do agora exposto, tendo presente o quadro jurídico traçado, que a sentença recorrida ao anular a liquidação adicional relativa às correcções em crise, incorreu em erro de julgamento, visto que a Recorrida não provou nos autos que os emitentes das facturas em causa prestaram efectivamente os serviços titulados pelas facturas (ou através de qualquer outra empresa), em suma, fica por esclarecer por quem foram realizados os trabalhos realizados nas obras da Recorrida e titulados pelas facturas em causa.

Pelo exposto, procede o recurso, impondo-se revogar a decisão da primeira instância


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Conclusões/Sumário:

I. O recurso não é normalmente o meio próprio para juntar documentos aos autos, por a sede própria para a instrução da causa ser o tribunal de primeira instância, revestindo natureza excepcional a admissão de documentos nesta sede, uma vez que a reapreciação das decisões dever ser efectuada em função dos meios de prova constantes dos autos no momento da prolação das mesmas.

II. Configura entendimento jurisprudencial reiterado e sólido, em situações como a dos autos, quando a Administração Tributária procede a correcções da matéria colectável declarada por considerar que as facturas que documentam custos, em IRC, não correspondem a operações reais, compete-lhe reunir e demonstrar factos que permitem, com recurso às regras de experiência, concluir que as facturas visadas não correspondem a operações reais e efectivas.

III. Cumprido este encargo pela Administração Tributária, passa a impender sobre o contribuinte o ónus de demonstrar que tais facturas consubstanciam operações realmente efectuadas pela entidade emitente desses documentos e pelos valores constantes dos mesmos, comprovando que os custos que contabilizou.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul, em conceder provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública e, em consequência, revogar a sentença recorrida e julgar a impugnação judicial totalmente improcedente.

Condena-se a Recorrente em 2 UC pela apresentação de documento com a alegação de recurso.

As custas em ambas as instâncias ficam a cargo da Recorrida.

Notifique.


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Após trânsito em julgado, remeta cópia do presente acórdão ao Ministério Público – Procuradoria da República da comarca da Guarda, Procuradoria do Juízo de Competência Genérica de Seia - Secção de Inquéritos, Inquérito n.º 8/08.8DGRD.

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Lisboa, 2 de Novembro de 2023.

Maria Cardoso - Relatora
Luísa Soares – 1.ª Adjunta
Ana Cristina Gomes Carvalho – 2.ª Adjunta

(assinaturas digitais)