Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1208/19.0BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:10/19/2023
Relator:MARIA CARDOSO
Descritores:TSAM
GRUPO DE EMPRESAS
REGIME DE ISENÇÃO
Sumário:I. A liquidação de TSAM é efectuada, em regra, com base na declaração do contribuinte e só no caso de tais elementos não serem fornecidos pelo sujeito passivo é que a DGAV efectua a liquidação com base nos elementos de que disponha, tendo a Portaria n.º 200/2013, de 31/5 vindo esclarecer o critério de apuramento da área relevante e o modo da sua determinação.

II. O conceito de “grupo”, previsto no artigo 3.º, n.º 5 da Portaria nº 215/2012, conforme decorre da letra da lei, não depende da existência de qualquer relação societária estabelecida nos termos do Código das Sociedades Comerciais, mas tão só da utilização da mesma insígnia.

Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul:

I - RELATÓRIO

1. C......., S.A, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 14-02-2022, que julgou improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra o ato de liquidação da Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM), efetuado pela Direção Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV), relativa a 2019, no valor global de €5.747,00.

2. A Recorrente apresentou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«i. O Tribunal a quo julgou totalmente improcedente a impugnação judicial à margem referenciada, por sentença proferida a 14-02-2022, absolvendo a Recorrida de todos os pedidos formulados.

ii. Ora com o mais elevado respeito, que é muito, considera a Recorrente que a Mm. Juiz a quo cometeu no caso concreto grandes e graves erros de julgamento! E não pensem os VENERANDOS DESEMBARGADORES que a Recorrente faz semelhante afirmação apenas por mera presunção, vaidade ou maledicência.

iii. A Recorrente di-lo absolutamente convicta que os VENERANDOS DESEMBARGADORES no final da leitura das presentes alegações conhecerão todas as circunstâncias do caso concreto e poderão verificar pessoalmente que a decisão recorrida enferma de erros graves de julgamento, tanto no que toca à matéria de facto, como no que toca à aplicação do Direito aos factos.

iv. O Tribunal “a quo” julgou a “presente impugnação totalmente improcedente …”

v. A MMa. Juiz entendeu que “…o estabelecimento explorado pela Impugnante não preenche os requisitos do regime de isenção previsto no nº 1 do art. 9º do DL nº 119/2012 e nº 1 do art. 3º da Portaria nº 215/2012 de 17 de Julho…”

vi. Na alínea H) da matéria de facto, foi dado como provado que de acordo com a planta o estabelecimento comercial da Impugnante, instalado com a insígnia “E.......”, possui as seguintes áreas: “Área alimentar=1.642m2” e “Área não alimentar=2.356m2”.

vii. Como decorre da alínea D) da matéria de facto, em 26-04-2019, “a DGAV – Fundo Sanitário de Segurança Alimentar Mais” emitiu a “Factura nº FT 2019F/00…6”, em nome da Impugnante, no valor de € 5.747,00 nela constando a referência a uma área de venda de 1.642,00 e área ponderada de 1.642,00 e o seguinte descritivo: “Taxa de Segurança Alimentar Mais – 1ª Prestação do Ano de 2019” (Decreto-Lei nº 119/2012, Portarias nº 215/2012, nº 200/2013 e nº 107-A/2017) referente a 50% do valor da taxa anual (7€/m2)…”

viii. Resultou provado no ponto E) da matéria de facto, que as faturas identificadas com os números antecedentes foram remetidas à Recorrente através de ofício com data de 01-07-2019.

ix. O Tribunal a quo considerou como não provado que a Recorrente é uma das cooperantes da “C.......”.

x. Não obstante, a Recorrente entende que do quadro factual dado como provado, resultam os pressupostos para considerar que encontra-se isenta do pagamento da TSAM nos termos em que tal isenção é definida pelos nº 2 do artigo 9º do DL 119/2012 de 15 de Junho e nº 1, 2, 3 e 5 do artigo 3º da Portaria nº 215/2012 de 17 de Julho,

xi. Pois, o estabelecimento de que a Recorrente é titular apenas possui uma área de comércio alimentar de 1.642m2, inferior, portanto, à área de 2.000m2 exigida por aquelas normas.

xii. Assim como, a Recorrente não está integrada num grupo nos termos definidos na alínea b) do nº 3 e no nº 5 do artigo 3º da Portaria 215/2012 de 17 de Julho, já que, entre esta e as outras empresas que fazem parte da C....... e utilizam a insígnia “E.......”, não existe qualquer relação jurídica, comercial, financeira ou outra, isto é, a Recorrente e aquelas restantes empresas não mantêm quaisquer laços de interdependência ou de subordinação entre si, apesar de utilizarem a mesma insígnia.

xiii. E a lei é clara ao exigir que, no conceito de grupo, estejam integradas empresas que, apesar de juridicamente distintas, utilizem a mesma insígnia e que desta utilização, mantenham laços de interdependência ou subordinação jurídica ou de direitos ou poderes. Isto é, não basta a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia.

xiv. E no caso dos presentes autos, a única relação jurídica e económica a que a Recorrente está sujeita é a que decorre do facto de ser uma das cooperantes da C......., não tendo qualquer relação com mais nenhuma empresa que, eventualmente, utilize a mesma insígnia “E.......”.

xv. Logo, não se encontra abrangida pelo conceito de grupo conforme definido na lei.

xvi. Salvo o devido respeito, a intenção do legislador é aplicar a taxa a empresas detentoras de estabelecimentos com grandes áreas (cfr. nº 1 e nº 3 do artigo 3º da Portaria Nº 215/2012 de 17 de Julho) e não a pequenas empresas com as características da empresa titulada pela Recorrente!

xvii. Na verdade, seguindo a perspectiva da douta sentença, quem deveria ser sujeita à aplicação da TSAM seria a detentora da insígnia, pois, o somatório das áreas dos estabelecimentos que utilizam tal insígnia ultrapassa os 6.000m2 de área acumulada,

xviii. E nunca a Recorrente, cuja área de estabelecimento não pode servir como base para liquidação de duas taxas.

xix. Por outro lado, o Tribunal a quo deveria ter aplicado o disposto no nº 1 do artigo 100º do CPPT. Trata-se de norma que se reporta à questão do ónus da prova.

xx. Com efeito, anteriormente à vigência deste normativo e do artº 121º do CPT, firmara-se o entendimento de que o ónus da prova recaía sobre o impugnante, a quem cabia o encargo de provar a inexistência dos pressupostos que justificassem a anulação do acto impugnado (cfr. ac. do STA, de 5/5/76, AD 176/177, 1141 e ac. STA, de 9/2/77, Rec. 768).

xxi. A norma presente destrói claramente essa presunção legal a favor da AF (in dubio pro Fisco), e estabelece uma verdadeira repartição do ónus da prova (que se coloca apenas em relação a questões de facto), de acordo com os princípios da legalidade e da igualdade, e em termos de que a incerteza sobre a realidade dos factos tributários reverte, em regra, contra a AF, não devendo ela efectuar a liquidação se não existirem indícios consistentes da existência daqueles, isto é, se o conhecimento desses factos for baseado em meras aparências desacompanhadas da expressão factual de verdadeiros elementos probatórios.

xxii. Acresce que esta prova produzida há-de ser não só a prova aduzida pelas partes, como também a prova que ao juiz se impõe diligenciar (art. 13º, nº 1 do CPT).

xxiii. A causa da dúvida no caso concreto não derivou do comportamento da Recorrente não tendo sido por incumprimento dos seus deveres de cooperação, que se inviabilizou a descoberta e apuramento dos factos tributários, não podendo a dúvida reverter contra ela.

xxiv. No caso dos autos, a prova produzida pela Recorrente logrou infirmar os factos em que assentou o acto tributário.

xxv. Era nesse sentido que se orientava a jurisprudência no atinente à impugnação judicial nomeadamente com fundamento na inexistência dos pressupostos do acto tributário,

xxvi. entre os quais se incluía a existência do facto tributário (vide, entre muitos, os Acórdãos do STA de 5/5/76, Ads 176-177, pág. 1141; de 9/2/77, no Recurso nº 768 e de 15/11/78, Ads 206º- 244).

xxvii. No artº 100º do CPPT (e já o mesmo acontecia no artº 121º do CPT) acolhe-se claramente o princípio da verdade material, vinculante para a própria AF que só deverá praticar o acto tributário quando «formar convicção da existência e conteúdo do facto tributável» devendo, em caso de subsistência de dúvida «acerca do objecto do processo(..) abster-se de praticar o acto tributário, dando assim cumprimento ao princípio in dubio contra fiscum»(Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 150, 158 e 169).

xxviii. Em suma, é a indubitável consagração do princípio de que a dúvida reverte a favor do contribuinte, em substituição do princípio «in dubio pro fisco» que vigorou anteriormente à Reforma Fiscal.

xxix. A prova para o efeito relevante será não apenas a aduzida pelas partes, mas também e especialmente a prova que ao juiz se impõe diligenciar.

xxx. Assim sendo, cabia à MMa. Juiz a quo realizar ou ordenar todas as diligências que considerasse úteis ao apuramento da verdade pois não pode considerar-se fundada a dúvida que implica a anulação do acto impugnado se assentar na ausência ou na inércia probatória das partes, especialmente da Impugnante.

xxxi. É que esta não pode limitar-se a alegar factos que ponham em dúvida «a existência e quantificação do facto tributário», incumbindo-lhe o «ónus probandi» de tais factos sem prejuízo de o Juiz, no uso do seu poder-dever inquisitório, diligenciar também pela sua comprovação só sendo possível concluir-se pelo fundamento da dúvida mediante a prova concludente dos mesmos.

xxxii. A este enquadramento do regime do artº 100º do CPPT há um «prius» que é a conceituação de facto tributário aderindo nós à que dele dá Alberto Xavier em Conceito e Natureza do Acto Tributário, págs. 247 e segs segundo a qual naquele existem um elemento subjectivo e um elemento objectivo integrado por um elemento material (acontecimento natural ou fenómeno de natureza económica, acto ou negócio jurídico tipificados na norma de incidência real), um elemento temporal (factos instantâneos ou duradouros) e um elemento quantitativo (factores legais de medição do objecto material do imposto).

xxxiii. A sentença judicial não pode reduzir-se a um puro silogismo lógico, não pode nem deve representar uma aplicação por assim dizer maquinal da lei geral e abstracta aos factos da causa (vd. Acórdão da RL de 12/10/93, CJ, Ano XVIII, T. IV), antes devendo o juiz fazer uma apreciação crítica das provas, o que equivale a dizer que terá necessariamente de valorar e interpretar os factos apurados no julgamento à luz dos interesses e finalidades que o legislador quis defender, presentes nas normas jurídicas aplicáveis a cada hipótese.

xxxiv. Assim sendo, face ao quadro factual desenhado pela MMa. Juiz a quo, torna-se necessário recorrer à regra do artº 100º do CPPT pois que resulta do probatório exarado na sentença sob recurso fundada dúvida quanto à verificação das condições do regime de isenção legalmente previsto, pelo que deveria ter aplicado esta norma e não procedido ao seu sumário afastamento, como fez.

xxxv. Conforme acima referido, consta na alínea A) da matéria de facto que em 14-02-2019 “…foi enviado à Impugnante o ofício nº 003819 da Direção Geral de Administração e Veterinária – DGAV, com o assunto: “Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) – 2019 – Elementos para liquidação – Direito de Audição”, no qual se lê…a área de venda do estabelecimento comercial que serve de base ao cálculo da taxa a pagar é definida nos termos do art. 1º da Portaria nº 200/2013 de 31 de maio, conjugado com a alínea b) do nº 2, do art. 2º, da Portaria nº 215/2012, de 17 de julho.
Para o ano de 2019 a TSAM é de € 7€ por metro quadrado de área de venda do estabelecimento comercial, nos termos do art. 1º da Portaria nº 326/2018 de 14 de dezembro.
Assim, tendo em consideração o disposto nos números 4 e 5 do artigo 5º da mencionada Portaria nº 215/2012, de 17 de julho, quanto aos elementos comunicados a esta DGAV, e tendo em vista liquidação a realizar em 2019, o valor da TSAM a
liquidar no presente ano será de € 20.989,50, valor que resulta da multiplicação de € 7 por 2.998,50 m2 obtida nos termos dos cálculos seguintes:
Área bruta x Coeficiente de ponderação (nº 1 do art. 1º da portaria nº 200/2013 de 31 de maio) = Área ponderada (nº 1 do art. 1º da portaria nº 200/2013 de 31 de Maio).
Área Ponderada (nº 1 do art, 1º da portaria nº 200/2013 de 31 de Maio) x Valor da TSAM 2017 (art. 1º da portaria nº 107-A/2017 de 14 de março = 7€) = Montante da TSAM para o ano de 2019.
Assim, são apurados os seguintes valores de áreas em concreto:”




xxxvi. Na alínea B) dos factos provados consta que: “através de carta registada, datada de 13 de Março de 2019, com o remetente “E....... – C…., S.A”, a Impugnante exerceu o direito de audição prévia no qual expos e após requereu o seguinte:

“(…) 1 – Verifica-se que V.Exas. consideraram para apuramento do valor referente à TSAM de 2019, que a área de venda do estabelecimento explorado pela nossa empresa é de € 3998m2.”
2 – Sucede que o nosso estabelecimento tem uma área total de 3998m2, sendo certo que a área alimentar corresponde a 1642m2, e a área não alimentar a 2356 m2 – cfr Doc. 1 que aqui se junta e se dá por reproduzido para todos os legais efeitos.
3 – Assim sendo, considerando que a área alimentar do estabelecimento explorado pela nossa empresa corresponde a 1642m2, requer-se a V.Exas., que o coeficiente de ponderação seja aplicado apenas sobre a área alimentar, e não sobre a área total do estabelecimento, para os devidos e legais efeitos.” [cfr. a fls.109 a 127 do PA].”

xxxvii. No entanto, estranhamente, no ofício nº 010883, com data 01-07-2019 nada é referido pela Recorrida acerca do coeficiente de ponderação.

xxxviii. Na factura nº 2019F/001066, de 26-06-2019, consta apenas a referência à área de venda (1.642m2) e na demonstração de liquidação da TSAM é referido “1642,00 x 100%).”

xxxix. Ou seja, o coeficiente de ponderação referido no ofício nº 003819 sumariamente deixou de existir sem nenhuma explicação aquando do envio do ofício nº 010883, mas isto é uma clara ilegalidade cometida pela entidade liquidadora e que não pode ser permitida!

xl. Ora, a «área de venda do estabelecimento» vem definida, como vimos, no artigo 2.º n.º 2 alínea b) da Portaria n.º 215/2012, de 17 de julho, aí se circunscrevendo «área de venda do estabelecimento» à «área destinada a venda, onde os compradores têm acesso ou os produtos se encontram expostos ou são preparados para entrega imediata».

xli. Efetivamente, e desde logo, importa não confundir os conceitos de área do estabelecimento em si considerado, a que corresponde a área total do estabelecimento, a área total do seu espaço físico em si considerado, e a «área de venda do estabelecimento», a que corresponde, nos termos do citado normativo, a área destinada à venda dos produtos aos compradores pelo estabelecimento em causa,

xlii. Quer isto significar que na área do estabelecimento há de apurar-se a «área de venda do estabelecimento», isto é, a área do estabelecimento

xliii. onde há de efetuar-se a venda dos produtos aos compradores, entendendo-se como tal toda a área de comércio alimentar, apurada de acordo com determinados coeficientes de ponderação.

xliv. Tanto assim que no artigo 1º da Portaria n.º 200/2013, de 31 de maio, o qual define os coeficientes de ponderação da «área de venda do estabelecimento», vem referido: «Para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 do Artigo 2.º da Portaria nº 215/2012, de 17 de julho, entende-se por «área de venda do estabelecimento» toda a área de comércio alimentar apurada de acordo com os seguintes coeficientes de ponderação: […]».

xlv. Nesse pressuposto, a Impugnante regularmente informou a entidade Impugnada que a sua «área física de vendas de produtos alimentares» é 1.642m2.

xlvi. Resulta dos autos que, na sequência da notificação do projecto de taxa, a Recorrente se pronunciou informando que a área do seu estabelecimento não se encontrava correcta, devendo a taxa incidir apenas sobre a área alimentar de 1.642m2, e não sobre a totalidade da área do estabelecimento, 3.998m2, como resulta do acto impugnado. (cf. alínea B) da factualidade assente).

xlvii. Verifica-se que, embora, do ofício que acompanhou o acto impugnado resulte a notificação da Recorrente para se pronunciar quanto à referida taxa, com a expressa cominação a que, no seu silencia, o projecto de liquidação se tornaria definitivo (cf. alínea B) da factualidade assente), a Entidade Impugnada ignorou a pronúncia da Impugnante que continha a alegação e prova de um facto relevante para o apuramento da taxa, em concreto da área de incidência e aplicação do coeficiente de ponderação.

xlviii. Perante tal pronúncia, o projecto de liquidação não poderia manter-se nos mesmos termos, porquanto, ou a área era corrigida em conformidade com o alegado ou a alegação e aprova junta eram refutadas e o acto mantinha-se, embora com fundamentação adicional resultante da apreciação do exercício do direito de audição prévia.

xlix. Aqui chegados, podemos desde já concluir a taxa impugnada deveria incidir sobre a área alimentar, ou seja, sobre € 1.642 m2, devendo o coeficiente de ponderação ser aplicado sobre esta área.

l. Aliás, se a DGAV aplicou o coeficiente de ponderação no âmbito do projeto de liquidação, qual foi a razão pela qual não o fez na liquidação?

li. E tal releva, porque: a «área física de vendas de produtos alimentares» é sinónimo de «toda a área destinada a venda, onde os compradores têm acesso ou os produtos se encontram expostos ou são preparados para entrega imediata», correspondendo, consequentemente, à noção «área de venda do estabelecimento» definida no artigo 2.º n.º 2 alínea b) da Portaria n.º 215/2012, de 17 de julho.

lii. E isto porque, resulta de meridiana evidência que é, justamente, na «área física de vendas» que se concretizam as operações comerciais, correspondendo aquela exatamente à área «onde os compradores têm acesso ou os produtos se encontram expostos ou são preparados para entrega imediata».

liii. Conforme resultou provado nos autos, o estabelecimento da Recorrente é do tipo misto (tem uma área destinada à venda de bens alimentares, com 1.642 m2, sujeita a esta tributação, pelo que a base de incidência corresponderá apenas à área destinada ao comércio de bens alimentares, isto é, 1.642 m2 (sob pena de violação do princípio da correlatividade que deve existir entre a taxa e a área de estabelecimentos sobre a qual incide).

liv. Não obstante, considerando que a área de comércio alimentar do estabelecimento da Recorrente corresponde à área de 1642m2 é sobre este valor que deve ser aplicado o coeficiente de ponderação de 75% previsto no ponto ii) do n.º 1 do artigo 1º da Portaria n.º 200/2013.

lv. Face ao exposto, ao contrário do que é sustentado pela MMa. Juiz a quo há um claro erro no cálculo do valor da taxa, pelo que a liquidação deve ser anulada para os devidos e legais efeitos.

lvi. Entendeu a douta sentença recorrida que a fundamentação, “…da informação constante dos documentos enviados à Impugnante é possível aferir com clareza qual a data limite para o pagamento do ato, faculdade que a Impugnante usou e o regime legal ao abrigo do qual o ato foi praticado. Por seu turno, no ato de liquidação impugnado foi considerado a área de comércio alimentar comunicada pela Impugnante. A factura nº “FT 2019F/….6” em crise, porque diz respeito à 1ª prestação, contém o valor correspondente à mesma, sendo que o valor total dimana do ofício que notificou o ato impugnado.”

lvii. O caminho que a decisão recorrida percorreu para assim concluir foi: considerar que “o ato administrativo de mostra devidamente fundamentado ou seja, à Impugnante, colocada na posição de um destinatário normal, é possível apreender o iter cognoscitivo e valorativo que esteve na base da liquidação da taxa em crise. Termos em que não se verifica a ilegalidade do ato de liquidação da Taxa de Segurança Alimentar Mais, por falta de fundamentação, pelo que também esta alegação da Impugnante é de improceder.”

lviii. Em termos de fundamentação da sentença, o Tribunal a quo nada mais acrescentou.

lix. Ora, o ofício e as faturas anexas, pressupõe a existência de uma liquidação tributária em momento prévio, não se tratando de uma mera fatura, onde constem os elementos contabilísticos da mesma.

lx. Na sentença recorrida em nenhum momento se faz menção à delimitação entre aquelas que são os atos (comunicativo e comunicado) e os atos que se consubstanciam numa verdadeira liquidação tributária e os formalismos legais que se exigem para a mesma.

lxi. Sendo a TSAM um tributo, como ficou delimitado e expresso pelo Tribunal a quo, são aplicáveis as regras e os princípios previstos na Lei Geral Tributária (LGT), nomeadamente o artigo 3º e seguintes da LGT.

lxii. A AT rege-se pelos princípios constitucionais previstos nos artigos 266º da CRP, designadamente pelo princípio da legalidade procedimental, previsto e regulado no art. 3º do CPA e do art. 55 da LGT.

lxiii. Ora, é inequívoco que a “fundamentação” utilizada pela Recorrida é manifestamente insuficiente para que se possa considerar como fundamentado o acto de liquidação impugnado, nomeadamente quanto ao seu valor e à forma como o mesmo foi apurado.

lxiv. A liquidação não foi efectuada com base na área que foi comunicada pela própria DGAV em sede de audiência prévia, havendo assim contradição entre o valor que foi com comunicado à Recorrente em sede de audiência prévia e aquele que lhe foi comunicado na decisão final.

lxv. Atentando ao teor do ato impugnado, identificado na alínea D), dos factos provados, encontramo-nos perante falta de fundamentação consubstanciada pela ambiguidade e obscuridade do ato de liquidação e ofício de notificação, desde logo, por confronto com o projeto de liquidação e correspondente montante a pagar (cf. alínea A e B) do probatório).

lxvi. Ora, o que ressalva dos presentes autos é que existe ambiguidade ou obscuridade da fundamentação, porquanto, pressupõe duas ou mais interpretações de qualquer ponto da decisão. Concretizando. Existe um primeiro ofício e um projeto de liquidação que evidencia que o valor final a pagar é de € 20.989,50, enquanto, o ato de liquidação final consubstancia um valor (contraditório, obscuro e ambíguo) de € 11.494,00.

lxvii. Perante tal contradição, coloca-se a questão de saber qual o valor que se afigura correto. Sendo que um destinatário normal não consegue percecionar qual o itinerário que motivou a aquiescência de um valor diferencial de € 9.495,50.

lxviii. Note-se, ademais, mediante confronto do projeto e da liquidação final, que existe a adopção de critérios distintos para o apuramento do valor final. O que, necessariamente, coarta a defesa do contribuinte porquanto não se consegue percecionar quais, a final, os valores e critérios a adotar, existindo, como visto, uma nítida contradição que inquina o ato de falta de fundamentação.

lxix. Nem do ofício nem da factura acima referida é possível compreender o cálculo do valor apurado. Aliás, nas facturas não consta nada acerca da aplicação dos coeficientes de ponderação previstos legalmente.

lxx. Face às considerações acima tecidas sobre o dever de fundamentação, e aplicando-as ao caso dos autos, é possível concluir de forma segura que, quer das facturas, quer do ofício através do qual as mesmas foram remetidas à Recorrente, nomeadamente do teor da respectiva fundamentação, não é possível a um destinatário normal compreender o iter percorrido, pela DGAV, quanto à norma como foi apurado o concreto o valor da TSAM relativa ao ano de 2019.

lxxi. Importa ter presente que a fundamentação, é desde logo, uma imposição constitucional, porquanto a CRP, no nº 3, do artigo 268º, garante aos administrados o direito a uma fundamentação expressa e acessível de todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos.

lxxii. Atentando no teor do acto impugnado, resulta que o mesmo se limita a evidenciar que é devido o montante de € 5.747,00, constando de cada uma das facturas como item descritivo “Taxa de Segurança Alimentar Mais – 1ª/2ª Prestação do Ano de 2019 (Decreto-Lei nº 119/2012, Portarias nº 215/2012, nº 200/2013 e nº 35/2021), referente a 50% do valor da taxa anual (7/m2).

lxxiii. Ora, face ao supra aludido dimana inequívoco que o mesmo se limita a fazer uma mera enunciação dos diplomas legais, porém não apresenta qualquer referência expressa ou implícita ao seu modo de cálculo.

lxxiv. É manifesto que nos encontramos face a um “ato de massa”, emitido pela DGAV para inúmeros destinatários, mas a verdade é que tal em nada pode acarretar uma diminuição do dever de fundamentação, em nada podendo justificar uma menor densificação dos pressupostos de facto que subjazem à emissão do ato impugnado.

lxxv. No mesmo sentido, a fundamentação que suporta a liquidação teria de conter a indicação do motivo pelo qual, apesar de o estabelecimento da Recorrente não possuir a área mínima legalmente prevista é apesar de tudo sujeita a tributação.

lxxvi. Ora, como refere a Recorrente, na notificação da liquidação em apreço é indicada como área de venda do estabelecimento a de 1.642 m2. Não surgindo aí de todo justificado porque é que, sendo esta a área de venda, não se trata de uma situação de isenção do pagamento da TSAM e qual é o coeficiente de ponderação aplicável.

lxxvii. Assim sendo, outra conclusão não podemos retirar que não a de que o acto não se encontra devidamente fundamentado, pelo que, a insuficiência da fundamentação constitui vício invalidante que inquina de forma determinante a liquidação ora em crise, devendo ser considerado procedente o pedido anulatório e à anulação da liquidação contestada, com as consequências legais.

lxxviii. Assim sendo, salvo o devido respeito, assiste razão à Recorrente quando invoca a falta de fundamentação do ato de liquidação devendo proceder, neste aspeto, a presente impugnação, o que determina a anulação do ato.

lxxix. E, nessa conformidade, a concluir-se pela ilegalidade da liquidação de TSAM, deve também ser ordenada a restituição do montante pago pela Recorrente a esse título.

lxxx. Com efeito, no que concerne ao pedido de devolução do montante pago, importa referir que em virtude da emissão de liquidações ilegais, ao abrigo do disposto no artigo 100.º da LGT, a entidade que recebeu o correspondente pagamento está obrigada a reconstituir a situação legal que hipoteticamente existiria, não fora a prática dos atos lesivos por si praticados contra os direitos e interesses protegidos do administrado, dever este que justifica, de forma inequívoca, a obrigação de restituição do montante que foi pago pela Impugnante.

Nestes termos, e com douto suprimento de Vossas Excelências que aqui se invoca, deve o presente recurso de apelação ser admitido e ser julgado totalmente procedente, com todos os efeitos legais daí resultantes, com o que será feita Justiça!»


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3. A Recorrida, Fazenda Pública, devidamente notificada, não apresentou contra-alegações.

4. Recebidos os autos neste Tribunal Central Administrativo Sul, e dada vista ao Exma. Procuradora–Geral Adjunta, emitiu douto parecer, no sentido de julgar improcedente o recurso.

5. Colhidos os vistos legais, vem o processo à Conferência para julgamento.


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II – QUESTÕES A DECIDIR:

O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil.

Assim, considerando o teor das conclusões apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença enferma de erro de julgamento de facto e de direito, ao ter considerado que a Recorrente não se encontra abrangida pelo regime de isenção previsto no Dec.-Lei n.º 119/2012 e artigo 3.º, n.º 1 da Portaria n.º 215/2012, de 17 de Julho; que o acto tributário de liquidação da TSAM não padece de erro de cálculo, nem de falta de fundamentação.

A Recorrente invocou ainda a aplicação do disposto no artigo 100.º, n.º 1, do CPPT.


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III - FUNDAMENTAÇÃO

1. DE FACTO

A sentença recorrida proferiu a seguinte decisão relativa à matéria de facto:

«Compulsados os autos, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os seguintes factos:

A) Em 14 de Fevereiro de 2019 foi enviado à Impugnante o ofício n.º 003819 da Direção Geral de Alimentação e Veterinária – DGAV, com o assunto: “Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) – 2019 – Elementos para liquidação – Direito de Audição”, no qual se lê:

“Como é do conhecimento de V.Ex., o Decreto-Lei n.° 119/2012, de 15 de junho, criou, a Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM), a qual constitui uma contrapartida da garantia de segurança e qualidade alimentar, para os estabelecimentos de comércio alimentar de produtos de origem animal e vegetal, frescos ou congelados, transformados ou crus, a granel ou pré-embalados, conforme estabelecido no n.° 1 do artigo 9.° do mencionado diploma.

Nos termos do n.° 1 do artigo 5.° da Portaria n.° 215/2012, de 17 de julho, para efeitos de aplicação da taxa, é considerada a situação dos estabelecimentos comerciais à data de 31 de dezembro do ano anterior ao que respeita a liquidação.

Nos termos do n.° 3 do referido artigo 5.° da mesma Portaria, cabe a esta Direção-Geral notificar o sujeito passivo do montante da taxa a pagar.

A área de venda do estabelecimento comercial que serve de base ao cálculo da taxa a pagar é definida nos termos do art.º 1° da Portaria n.º 200/2013 de 31 de maio, conjugado com a alínea b) do n.º 2, do art.º 2°, da Portaria n.º 215/2012, de 17 de julho.

Para o ano de 2019 a TSAM é de 7€ por metro quadrado de área de venda do estabelecimento comercial, nos termos do art.º 1° da Portaria n.° 326/2018 de 14 de dezembro.

Assim, tendo em consideração o disposto nos números 4 e 5 do artigo 5.° da mencionada Portaria n.° 215/2012, de 17 de julho, quanto aos elementos comunicados a esta DGAV, e tendo em vista a liquidação a realizar em 2019, o valor da TSAM a liquidar no presente ano será de: €20.989.50, valor que resulta da multiplicação de € 7 por 2 998.50 m2 obtida nos termos dos cálculos seguintes:

Área Bruta X Coeficiente de ponderação (n.º 1 do art.º 1.º da portaria n.° 200/2013 de 31 de Maio) = Área Ponderada (n.º 1 do art.º 1.º da portaria n.° 200/2013 de 31 de Maio).


e

Área Ponderada (n.º 1 do art.º 1.º da portaria n.° 200/2013 de 31 de Maio) X Valor da TSAM para 2017 (art.º 1.º da portaria n.° 107-A/2017 de 14 de Março = 7€) = Montante da TSAM para o ano de 2019.

Assim, são apurados os seguintes valores de áreas em concreto:




Face ao disposto no artigo 45.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário bem como no n.° 1 do artigo 60° da Lei Geral Tributária, fica assim V. Ex.a notificado para, querendo, no prazo de 15 dias contados da presente notificação, exercer o direito de audição prévia, pela forma escrita, por correio eletrónico para o endereço fssam.dgav@deav.pt ou por via postal para o endereço em rodapé, relativamente à liquidação da "Taxa de Segurança Alimentar Mais” nos termos supra descritos.” [cfr. a fls. 109 a 127 do PA];

B) Através de carta registada, datada de 13 de Março de 2019, com o remetente com o remetente “E.......” – C……, SA.-, a Impugnante exerceu o direito de audição prévia, no qual expos e após requereu o seguinte:

“(…) 1 - Verifica-se que V. Exas consideraram para apuramento do valor referente à TSAM de 2019, que a área de venda do estabelecimento explorado pela nossa empresa é de 3998 m2.

2 - Sucede que o nosso estabelecimento tem uma área total de 3998 m2, sendo certo que a área alimentar corresponde a 1642 m2, e a área não alimentar a 2356 m2 - cfr. Doc. 1 que aqui se junta e se dá por reproduzido para todos os legais efeitos.

3 - Assim sendo, considerando que a área alimentar do estabelecimento explorado pela nossa empresa corresponde a 1642 m2, requer-se a V. Exas., que o coeficiente de ponderação seja aplicado apenas sobre a área de alimentar, e não sobre a área total do estabelecimento, para os devidos e legais efeitos.” [cfr. a fls. 109 a 127 do PA];

C) Com a carta descrita no ponto anterior, a Impugnante juntou o documento 1, composto pela planta do estabelecimento comercial e um quadro cujo teor se reproduz:


“(texto integral no original; imagem)”
[cfr. de fls. 109 a 127 do PA];

D) Em 26 de Abril de 2019, a DGAV – Fundo Sanitário de Segurança Alimentar Mais emitiu a “Factura n.º FT 2019F/…6”, em nome da Impugnante, no valor de €5.747,00, nela constando a referência a uma área de venda de 1.642,00 e área ponderada de 1.642,00 e o seguinte descritivo: “Taxa de Segurança Alimentar Mais – 1.ª Prestação do Ano de 2019 (Decreto-Lei n.º 119/2012, Portarias n.º 215/2012, n.º 200/2013 e n.º 107-A/2017) referente a 50% do valor da taxa anual (7€/m2)” e com data limite de pagamento em 27 de Junho de 2019, como se reproduz:


[cfr. doc. 1 da pi, cujo teor se dá por reproduzido];

E) Através do ofício de 1 de Julho de 2019, o Fundo Sanitário de Segurança Alimentar Mais - FSSAM com o assunto “Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) - 2019”, foi enviado à Impugnante, o documentos referido na alínea anterior, nele constando informações relativas ao modo de pagamento da taxa, bem como os prazos de impugnação. No qual se lê, ainda:

“(…) Nos termos do n.º 3 do artigo 5.° da Portaria n.° 215/2012, de 17 de Julho, cabe a esta Direção-Geral notificar o sujeito passivo, do montante da taxa a pagar, o que sucedeu, tendo V. Exas. informado das respetivas áreas do estabelecimento.
Em conformidade com o reportado, foi elaborada a presente liquidação, suportada nos dados comunicados, corrigidos de eventuais alterações que nos tenham sido apontadas no prazo da audiência prévia, concedida ao abrigo do disposto no artigo 45° do Código de Procedimento e de Processo Tributário bem como no n.° 1 do artigo 60° da Lei Geral Tributária.
Nestes termos considerando os valores já indicados somos a proceder ao envio das faturas correspondentes às 1.ª e 2.ª prestação, para o ano de 2019, da TSAM.
O montante devido pela TSAM do ano de 2019 é de 11.494,00 € (vinte mil, novecentos e oitenta e nove euros e cinquenta cêntimos), dividido em duas prestações, conforme faturas n.° …6/F e …7/F em anexo, sendo este o resultado da aplicação daquela taxa fixada no artigo 1.° da Portaria n.° 326/2018, de 14 de dezembro, à área de venda do estabelecimento, atento o previsto nas disposições conjugadas do n.° 1 do artigo 2.° da Portaria n.° 215/2012, de 17 de Julho e do artigo 1.ª da Portaria n.° 200/2013, de 31 de maio, foi ainda levada em consideração a área de comércio alimentar que V.Exas. nos comunicaram em devido tempo.
O pagamento da primeira prestação deve ser realizado até à data indicada na respetiva fatura e a 2.ª prestação deverá, nos termos do n.º 2 do art.° 6.° da Portaria 215/2012, de 17 de julho, ser paga até final de outubro do corrente ano.
Alerta-se que, nos termos do n.° 1 do artigo 7° da referida portaria, a falta de pagamento da taxa no prazo estabelecido constitui o devedor em mora, sendo devidos juros legais desde a data do vencimento.
Por último, informa-se que a presente liquidação poderá ser objeto de impugnação nos termos dos artigos 99.° e seguintes do Código do Procedimento e do Processo Tributário, no prazo de 90 dias a contar do termo do prazo para o respetivo pagamento. [cfr. doc. 1 da pi, cujo teor se dá por reproduzido];
F) A Impugnante, procedeu ao pagamento de €5.747,00, correspondente ao valor em cobrança na fatura descrita em D) em 25 de Julho de 2019. [cfr. doc. 2 da pi, cujo teor se dá por reproduzido];

G) O estabelecimento comercial da Impugnante é do tipo misto, tem uma área destinada à venda de bens alimentares e de bens não alimentares. [cfr. facto alegado no ponto 37. da pi e não controvertido e doc. 1 da pi];

H) De acordo com a planta do estabelecimento comercial da Impugnante, instalado com a insígnia “E.......”, da qual resulta a indicação das seguintes áreas: “Área Alimentar = 1642 m2” e “Área Não Alimentar = 2356 m2”. [cfr. doc. 1 da pi, cujo teor se dá por reproduzido];

I) Em 24 de Outubro de 2019, deu entrada neste Tribunal, via Sitaf, a presente Impugnação. [cfr. a fls. 1 dos autos];

Factos não provados:

1. Não resultou provado que “a Impugnante se encontra associada na cooperativa “C....... – A. F. S., CRL”.

Motivação da decisão sobre a matéria de facto

A decisão da matéria de facto efetuou-se com base na posição assumida pelas partes nos articulados, no exame dos documentos constantes dos autos no qual se inclui o Processo Administrativo, tal como se foi fazendo referência em cada um dos pontos do probatório.

Quanto à motivação dos factos não provados, dada a ausência de prova comprovativa do alegado não foi possível ao Tribunal dar como provado aquele facto.»


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2. DO DIREITO

Está em causa nos presentes autos a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a impugnação quanto aos invocados vícios de não aplicação do regime de isenção previsto no n.º 1, do artigo 9.º do Dec.-Lei n.º 119/2012, erro de cálculo do valor da taxa e de falta de fundamentação do acto tributário de liquidação da TSAM do ano de 2019 (1.ª prestação).

A Recorrente não se conforma com o assim decidido, argumentando, no essencial, que se verificam os pressupostos para considerar que encontra-se isenta do pagamento da TSAM, pois, embora faça parte da C....... e utilize a insígnia “E.......” não existe qualquer relação financeira entre a Recorrente e as restantes empresas, apesar de utilizarem a mesma insígnia, que a entidade impugnada ignorou a pronuncia da Recorrente no âmbito do exercício do direito de audição prévia, quando informou da área correcta sobre a qual devia incidir a taxa, defendendo a existência de erro no cálculo da taxa, por a área de comércio e alimentação do estabelecimento ser de 1.642 m2. Mais invoca a falta de fundamentação do acto de liquidação, nomeadamente quanto ao seu valor e à forma como o mesmo foi apurado.

Alega ainda que o Tribunal a quo deveria ter aplicado o disposto no n.º 1, do artigo 100.º do CPPT, norma que no seu entender se reporta à questão do ónus da prova.


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2.1. A Recorrente no ponto III das conclusões da alegação de recurso alega que a sentença enferma de erro de julgamento de facto.

No entanto, apesar da Recorrente imputar à sentença erro de facto, o certo é que não só não indica os concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, como também, os concretos meios de prova constantes do processo que imponham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnados, nos termos dos artigos 640.º CPC.

Efectivamente, analisadas as conclusões em conjugação com a alegação de recurso constata-se que a Recorrente não cumpre minimamente com o referido ónus que é imposto por lei.

Mais, afirma a Recorrente, no ponto X das conclusões da alegação de recurso, entender que o quadro factual dado como provado, resultam os pressupostos para considerar que encontra-se isenta do pagamento da TSAM.

Nesta conformidade, não há lugar à reapreciação da matéria de facto, por não ter sido objecto de impugnação, restando apenas apreciar os imputados erros de julgamento de direito, considerando os factos dados como provado.

Importa, então, apreciar e decidir quanto ao acerto do entendimento sufragado pelo Tribunal a quo, no segmento recorrido.

Assim sendo, avançamos para a apreciação das questões que nos foram suscitadas e supra identificadas.


*

2.2. Alega a Recorrente que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento no que toca à aplicação do direito aos factos, por se verificam os pressupostos para considerar que se encontra isenta do pagamento da TSAM, pois, embora faça parte da C....... e utilize a insígnia “E.......” não existe qualquer relação financeira entre a Recorrente e as restantes empresas, apesar de utilizarem a mesma insígnia, o estabelecimento de que é titular possui uma área de comércio alimentar de 1.642 m2, inferior à área de 2.000m2 exigida pelos artigos 9.º, n.º 2 do Dec.-Lei n.º 119/2012, de 15 de Junho e nºs 1, 2, 3 e 5 do artigo 5.º da Portaria n.º 215/2012, de 17 de Junho, e que, ainda que assim não se entenda, verifica-se erro de cálculo do valor da taxa por dever ser aplicado à área de 1.642m2 o coeficiente de ponderação de 75% previsto no ponto ii) do n.º 1 do artigo 1.º da Portaria n.º 200/2013.

Vejamos.

Iniciamos a nossa apreciação com o enquadramento jurídico do tributo dos autos.

A Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) foi criada pelo Dec.Lei n.º 119/12, de 15/6, como contrapartida da garantia de segurança e qualidade alimentar é devido o pagamento, pelos estabelecimentos de comércio alimentar de produtos de origem animal e vegetal, frescos ou congelados, transformados ou crus, a granel ou pré-embalados, de uma taxa anual, cujo valor é fixado entre € 5 e € 8 por metro quadrado de área de venda do estabelecimento, por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da agricultura (artigo 9.º), estando isentos do pagamento dessa taxa os estabelecimentos com uma área de venda inferior a 2000 m2 ou pertencentes a microempresas, em certas situações definidas no nº 2 deste mesmo normativo.

Ao abrigo do n.º 2 do aludido preceito estão isentos do pagamento da referida taxa, os estabelecimentos com uma área de venda inferior a 2000 m2 ou pertencentes a microempresas desde que: a) Não pertençam a uma empresa que utilize uma ou mais insígnias e que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2; b) Não estejam integrados num grupo que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2»

Nos termos dos artigos 2.º, 3.º e 6.º do citado diploma foi criado o Fundo Sanitário e de Segurança Alimentar Mais, no âmbito do Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, com os objectivos e actividade aí prevista, constituindo a TSAM, entre outras, receita do Fundo (cfr. artigo 4.º do Dec.-Lei n.º 119/2012).

A Portaria n.º 215/2012, de 17/7 veio regulamentar a cobrança e liquidação desta taxa. O artigo 3.º regula as isenções do pagamento da taxa e o artigo 4.º o valor da taxa.

O artigo 3.º, com a epígrafe “isenções”, estabelece o seguinte:

1 - Estão isentos do pagamento da taxa os estabelecimentos com uma área de venda inferior a 2000 m2 ou pertencentes a microempresas, tal como definidas no Decreto-Lei n.º 372/2007, de 6 de novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 143/2009, de 16 de junho, nos termos e condições do presente artigo.

2 - A isenção abrange os estabelecimentos comerciais que, apesar de usarem uma insígnia comum, estão associados através, nomeadamente, de cooperativas, desde que não pertençam a uma empresa ou integrem um grupo nos termos previstos nos números seguintes.

3 - As isenções previstas no n.º 1 não são aplicáveis aos estabelecimentos que:

a) Pertençam a uma empresa que utilize uma ou mais insígnias e que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2;

b) Estejam integrados num grupo que disponha, a nível nacional, de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6000 m2.

4 - Para efeitos da alínea a) do número anterior, considera-se como pertencendo a outra as empresas que, embora juridicamente distintas, constituem uma unidade económica ou mantenham entre si laços de interdependência decorrentes, nomeadamente:

a) De uma participação maioritária no capital;

b) Da detenção de mais de metade dos votos atribuídos pela detenção de participações sociais;

c) Da possibilidade de designar mais de metade dos membros do órgão de administração ou de fiscalização;

d) Do poder de gerir os respetivos negócios.

5 - Para efeitos da alínea b) do n.º 3, considera-se «grupo» o conjunto de empresas que, embora juridicamente distintas, mantêm entre si laços de interdependência ou subordinação decorrentes da utilização da mesma insígnia ou de direitos ou poderes, nos termos previstos na alínea o) do artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 21/2009, de 19 de janeiro.

E o artigo 5.º, com a epígrafe “Liquidação e cobrança” estabelece o seguinte:

1 - Para efeitos de aplicação da taxa, é considerada a situação dos estabelecimentos comerciais à data de 31 de dezembro do ano anterior ao que respeita a liquidação.

2 - A Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV) elabora, até ao dia 31 de janeiro de cada ano, uma lista atualizada dos estabelecimentos abrangidos, e da qual constam, designadamente, os seguintes elementos:

a) Nome ou denominação social;

b) NIF;

c) Morada do estabelecimento;

d) Área de venda do estabelecimento.

3 - A liquidação da taxa é notificada ao sujeito passivo, por via eletrónica para a caixa postal eletrónica a que se refere o n.º 9 do artigo 19.º da lei geral tributária ou por carta registada, até ao final do mês de março de cada ano, com a indicação do montante da taxa a pagar.

4 - Os sujeitos passivos devem comunicar à DGAV, no prazo de 30 dias a contar do início da atividade ou de qualquer alteração, os elementos previstos no n.º 2 relativos aos respetivos estabelecimentos comerciais.

5 - Em caso de omissão ou inexatidão dos elementos comunicados, a liquidação é efetuada com base na informação relevante de que a DGAV disponha nos termos do n.º 2 do artigo 9.º

Resulta daqui que a liquidação de TSAM é efectuada, em regra, com base na declaração do contribuinte e só no caso de tais elementos não serem fornecidos pelo sujeito passivo é que a DGAV efectua a liquidação com base nos elementos de que disponha, tendo a Portaria n.º 200/2013, de 31/5 vindo esclarecer o critério de apuramento da área relevante e o modo da sua determinação.

O conceito de “grupo”, previsto no artigo 3.º, n.º 5 da Portaria nº 215/2012, conforme decorre da letra da lei, não depende da existência de qualquer relação societária estabelecida nos termos do Código das Sociedades Comerciais, mas tão só da utilização da mesma insígnia.

Efectivamente, estas entidades projectam no público consumidor uma imagem de identidade e uniformização, de tal forma que os clientes apenas reconhecem a insígnia.

A sentença recorrida para julgar improcedente o alegado vício de não aplicação do regime de isenção apoiou-se no seguinte discurso fundamentador:

(...) com relevo para a apreciação da questão que, o estabelecimento da Impugnante é do tipo misto, tendo uma área destinada à venda de bens alimentares com 1642m2 e uma área não alimentar com 2 356 m2. [cfr. al. G) e H)]

Resultou, também, que a Impugnante integra o Grupo “E……” e a Insígnia “E……”, como dimana do documento junto pela própria com o requerimento enviado à Direção Geral de Alimentação Veterinária, com vista ao exercício do direito de audiência prévia. [cfr. al. C)]

Por seu turno, dos autos, não resultou provado que a Impugnante se encontra associada na cooperativa “C....... – A. F. S., CRL”. [cfr. al. 1]

Dimana assim, subsumindo os factos ao regime legal exposto que o estabelecimento explorado pela Impugnante não preenche os requisitos do regime da isenção previsto no n.º 1 do art.º 9.º do DL n.º 119/2012 e n.º 1 do art.º 3.º da Portaria n.º 215/2012 de 17 de Julho. Sendo que, acresce referir, a aplicação do regime legal previsto no artigo 3.º da Portaria n.º 215/2012, resulta da leitura conjugada de todos os números que compõem a norma, designadamente o n.º 3 do mesmo preceito legal.

Neste sentido, já se pronunciou a jurisprudência do Colendo Supremo Tribunal Administrativo, na qual se considerou que a “lei não exige que esteja estabelecida qualquer relação jurídica, comercial ou financeira entre a impugnante e cada uma das empresas que utilizam a mesma insígnia para cálculo da área total de venda que corresponde a essa utilização, bastando a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia nos termos previstos no n.º 5 do art.º 3.º da Portaria nº 215/2012”. [neste sentido, veja-se o Acórdão do STA de 22 de Maio de 2019, proferido no processo n.º 0418/14.1BECBR e o Acórdão do STA de 2 de dezembro de 2020, proferido no processo n.º 0660/14.5BECBR disponível em www.dgsi.pt]

O assim decidido não nos merece censura.

Nos termos do artigo 3.º, n.º 3, alínea b), da Portaria 25/2012) a isenção é excluída pelo facto de a Recorrente operar sob uma insígnia, a qual, como é público e notório, e não vem colocado em crise, dispõe de uma área de venda acumulada igual ou superior a 6.000 m2 a nível nacional

Como se entendeu nos Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 22/05/2019, proferido no processo 0418/14.1BECBR, e de 02/12/2020, proferido no processo n.º 0660/14.5BECBR (citados na sentença recorrida) a lei não exige que esteja estabelecida qualquer relação jurídica, comercial ou financeira entre a impugnante e cada uma das empresas que utilizam a mesma insígnia para cálculo da área total de venda que corresponde a essa utilização, bastando a existência de empresas juridicamente distintas e que utilizem a mesma insígnia.

Assim sendo, à Recorrente está vedada a aplicação da isenção, de acordo com o disposto nos artigos 9.º do Dec-Lei n.º 119/2012 e 3.º da Portaria 215/2012.

A Recorrente, como bem decidido pela 1.ª instância, não preenche os requisitos para a isenção.

Termos em que improcede, neste segmento, o recurso.

Alega ainda a Recorrente, nas conclusões liv. e lv. que, contrariamente ao decidido pela sentença recorrida, se verifica erro no cálculo do valor da taxa, porquanto, como afirma, Não obstante, considerando que a área de comércio alimentar do estabelecimento da Recorrente corresponde à área de 1642m2 é sobre este valor que deve ser aplicado o coeficiente de ponderação de 75% previsto no ponto ii) do n.° 1 do artigo 1º da Portaria n.° 200/2013.

Porém, a sentença não se pronunciou sobre o coeficiente de ponderação de 75% ou sobre aquele que foi efectivamente aplicado, uma vez que essa questão não lhe foi suscitada na petição inicial, mas tão só a área considerada para o cálculo da taxa.

A questão do coeficiente trata-se assim de uma questão nova.

Ora, como os Tribunais superiores têm vindo a decidir, o recurso jurisdicional visa apreciar a correcção das decisões dos tribunais de hierarquia inferior, reapreciando-as, visando anulá-las ou alterá-las, com fundamento em vício de forma ou de fundo.

Não pode, assim, admitir-se o conhecimento desta questão nova, por caso contrário, se estar a permitir a apreciação perante o Tribunal ad quem de questão, que, não sendo do conhecimento oficioso, não foi apreciada pelo Tribunal a quo.

Porém, conforme resulta do probatório, a área de comércio que foi sujeita à taxa foi aquela que foi comunicada à DGVA, como a correspondente à área alimentar, e não qualquer outra área alcançada através da área de venda do estabelecimento, por aplicação dos coeficientes previstos no n.º 1, do artigo 1.º da Portaria 200/2013 (cfr. alínea B) e D) da matéria de facto dada como provada).

Área alimentar que a Recorrente reitera em diversas conclusões da alegação de recurso (cfr. conclusão xlv).

No que respeita aos estabelecimentos mistos, isto é, aqueles que comercializam produtos alimentares e não alimentares, como o da Recorrente, como já se deixou expresso supra, o cálculo da taxa deve considerar a área correspondente apenas ao comércio alimentar.

A DGVA, na sequência do exercício do direito de audição prévia, alterou a área de venda do estabelecimento constante do projecto de liquidação para a área alimentar de 1.642 m2, indicada, desde logo, pela Impugnante.

Assim sendo, atento que a área de comércio de produtos alimentares foi comunicada pela Recorrente, e que foi essa a área considerada para a quantificação do valor a pagar de TSAM, não se vislumbra qualquer erro de cálculo.

Termos em que improcede, neste segmento, o recurso.


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2.3. Alega a Recorrente que o acto de liquidação padece de falta de fundamentação. Em discordância do decidido pela 1.ª instância, sustenta a Recorrente este vício, em suma, no seguinte: a liquidação não foi efectuada com base na área comunicada pela DGAV em sede de audiência prévia, havendo assim contradição entre o valor que foi comunicado nessa sede e aquele que lhe foi comunicado na decisão final, e nem do oficio nem da factura é possível compreender o cálculo do valor apurado.

Para concluir que não se verifica o vício invocado, a sentença recorrida julgou o seguinte:

No caso subjudice está em causa a fundamentação da notificação da liquidação impugnada, nomeadamente se faltam elementos essenciais à sua perfeição e se ocorre falta de fundamentação quanto ao montante especificado.

Atento o recorte probatório, verifica-se que a fundamentação que consta da notificação e da “fatura n.º FT2019F/…6” relativa à Taxa de Segurança Alimentar Mais, do ano de 2019 (1.ª prestação), contém os seguintes elementos:

- foi emitida em nome da Impugnante a “Factura n.º FT 2019F/…6”, no valor de €5.747,00, nela constando a referência a uma área de venda de 1.642,00,00 e área ponderada de 1.642,00 e o seguinte descritivo: “Taxa de Segurança Alimentar Mais – 1.ª Prestação do Ano de 2019 (Decreto-Lei n.º 119/2012, Portarias n.º 215/2012, n.º 200/2013 e n.º 107-A/2017) referente a 50% do valor da taxa anual (7€/m2)”. [cfr. al. D)]

- do mesmo documento consta a data limite de pagamento da mesma – 26-07-2019, como aliás, resulta sublinhado do documento junto pela Impugnante. [cfr. al. D)]

- A “Factura n.º FT 2019F/…6” foi notificada através do ofício de 1 de Julho de 2019, com o assunto “Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) - 2019”, nele constando informações relativas ao modo de pagamento da taxa, bem como os prazos de impugnação. [cfr. al. E)]

- Com efeito, do referido ofício decorre a seguinte informação: “O montante devido pela TSAM do ano de 2019 é de 11494,00€ (…) dividido em duas prestações, conforme faturas n.° ...6/F e …7/F em anexo, sendo este o resultado da aplicação daquela taxa fixada no artigo 1.° da Portaria n.° 326/2018, de 14 de dezembro, à área de venda do estabelecimento, atento o previsto nas disposições conjugadas do n.° 1 do artigo 2.° da Portaria n.° 215/2012, de 17 de Julho e do artigo 1.ª da Portaria n.° 200/2013, de 31 de maio, foi ainda levada em consideração a área de comércio alimentar que V.Exas. nos comunicaram em devido tempo”. [cfr. al. E)]

Acresce, outrossim, que a Impugnante foi notificada do ofício n.º 003819 da Direção Geral de Alimentação e Veterinária – DGAV, com o assunto: “Taxa de Segurança Alimentar Mais (TSAM) – 2019 – Elementos para liquidação – Direito de Audição”, faculdade que exerceu através do requerimento de 13 de Março de 2019. [cfr. al. A) e B)]

Em face do exposto, considera o Tribunal que, também neste ponto, os argumentos da Impugnante padecem de razão, na medida em que, da informação constante dos documentos enviados à Impugnante é possível aferir com clareza qual a data limite para o pagamento do ato, faculdade que a Impugnante usou e o regime legal ao abrigo do qual o ato foi praticado. Por seu turno, no ato de liquidação impugnado foi considerado a área de comércio alimentar comunicada pela impugnante. A fatura n.º “FT 2019F/…6” em crise, porque diz respeito à 1.ª prestação, contém o valor correspondente à mesma, sendo que o valor total dimana do ofício que notificou o ato impugnado

Ante o exposto, considera-se que o ato administrativo se mostra devidamente fundamentado, ou seja, à Impugnante, colocada na posição de um destinatário normal, é possível apreender o iter cognoscitivo e valorativo que esteve na base da liquidação da taxa em crise.

Vejamos.

Como é consabido, os actos tributários estão sujeitos a fundamentação (artigos 268.º, n.º 3 da CRP, 77.º da LGT e 125.º do CPA).

Sobre o dever de fundamentação dos actos administrativos tributários pronunciou-se este Tribunal Central Administrativo Sul, entre muitos outros, em acórdão de 19/06/2012, proc. n.º 03096/09, cujo discurso fundamentador sufragamos e do qual transcrevemos a seguinte passagem:

«Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr.ac.S.T.J.26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág.57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1985, pág.687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág.139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cfr.por todos, ac.S.T.A-1ª.Secção, 6/2/90, A.D., nº.351, pág.339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Mais se dirá que a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação “per relationem” - cfr.artº.125, do C.P.Administrativo).

(…)

Se a fundamentação formal não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº.125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Por outras palavras, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final (cfr.Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol.I, Almedina, 1991, pág.477 e seg.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol.II, Almedina, 2001, pág.352 e seg.; Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág.381 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/12/2008, proc.2606/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/11/2009, proc.3510/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/3/2011, proc.4489/11).» (vide ainda, entre muitos outros, Acórdão do STA de 12/02/2020, processo n.º 01661/14.9BEPRT, todos disponíveis em www.dgsi.pt/).

O n.º 2 do artigo 77.º da LGT, estabelece que «A fundamentação dos actos tributários pode ser efectuada de forma sumária, devendo sempre conter as disposições legais aplicáveis, a qualificação e quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo».

A questão agora a apreciar resume-se a saber se os elementos constantes da notificação realizada ao sujeito passivo, são ou não suficientes para dar cumprimento às exigências legais de fundamentação, designadamente se esclarece a forma de cálculo da TSAM impugnada.

No caso dos autos, como decorre da alínea D) do probatório, a liquidação mostra-se suficientemente fundamentada, uma vez que, como bem decidido pela 1.ª instância, nela consta a referência à área de venda, área ponderada e o valor da taxa aplicável, fixada em € 7,00, o valor da 1.ª prestação do ano de 2019 e a fundamentação legal, tendo sido considerado como área de venda a área de venda alimentar comunicada em sede audiência prévia, como consta das alíneas B) e E) do probatório.

Na verdade, foi a Recorrente que notificada para exercício do direito de audiência prévia nos termos constantes da alínea A) do probatório, informou a área alimentar do seu estabelecimento.

Não se compreende, pois, o argumento invocado pela Recorrente relativo à contradição entre o valor comunicado em sede audiência prévia e aquele que lhe foi comunicado na decisão final, visto que a diferença de valores foi consequência do teor do exercício do direito de audição prévia pela Recorrente.

Concluindo, a decisão recorrida ao julgar não verificado o vício de falta de fundamentação do acto de liquidação da TSAM não incorreu em erro de julgamento, pelo que deve ser confirmada.

Improcede, neste segmento; o recurso.


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2.4. Por último a questão a apreciar respeita ao erro de julgamento por a sentença não ter aplicado o disposto no artigo 100.º, n.º 1 do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT).

Importa referir, em primeiro lugar, que a Recorrente só suscita a aplicação da citada norma nesta sede recursiva.

Em segundo lugar, diga-se, desde já, que não lhe assiste razão.

A norma ínsita no n.º 1 do artigo 100.º da LGT é aplicável quando da prova produzida resultem fundadas dúvidas sobre a existência do facto tributário. Provando-se a existência ou inexistência de um facto tributário, não haverá lugar à aplicação desta norma, porque não há dúvidas (num ou noutro sentido).

O disposto no artigo 100.º, n.º 1 do CPPT não tem aplicação ao caso dos autos, pois, a dúvida quanto à existência e quantificação do facto tributário, que deve ser decidida contra a AT, apenas existe nos casos em que seja esta a afirmar a existência dos factos tributários e respectiva quantificação, o que não é o caso, onde não se suscitam dúvidas sobre a existência ou quantificação do facto tributário.

A Recorrente ainda ensaia, embora relativamente à aplicação da citada norma, afirmar que cabia à Mma. Juiza a quo realizar todas as diligências que considerasse úteis ao apuramento da verdade (cfr. pontos xix e xxx das conclusões da alegação de recurso).

Porém, não indica qualquer diligência que tenha requerido, e que lhe tenha sido indeferido ou qualquer outra que o Tribunal deva ter oficiosamente determinado.

Por tudo o exposto, improcedem também estes fundamentos do recurso.

Sobre as questões em apreciação neste recurso, já este Tribunal Central Administrativo Sul se pronunciou em diversos arrestos, designadamente, nos acórdãos de 01/06/2023, proferido no processo n.º 2573/19.5BELRS, de 22/06/2023, proferido no processo n.º 199/20.0BELRS, de 11/09/2023, proferido no processo nº 83/20.7BEALM e de 04/10/2023, proferido no processo n.º 1064/20.6BELRA (no qual a actual Relatora interveio como 1.ª Adjunta), jurisprudência com a qual concordamos e acolhemos no presente acórdão(artigo 8.º, n.º 3, do Código Civil), visando a interpretação e aplicação uniforme do direito (todos disponíveis em www.dgsi.pt/).

Resta, pois, negar provimento ao mesmo.


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Conclusões/Sumário:

I. A liquidação de TSAM é efectuada, em regra, com base na declaração do contribuinte e só no caso de tais elementos não serem fornecidos pelo sujeito passivo é que a DGAV efectua a liquidação com base nos elementos de que disponha, tendo a Portaria n.º 200/2013, de 31/5 vindo esclarecer o critério de apuramento da área relevante e o modo da sua determinação.

II. O conceito de “grupo”, previsto no artigo 3.º, n.º 5 da Portaria nº 215/2012, conforme decorre da letra da lei, não depende da existência de qualquer relação societária estabelecida nos termos do Código das Sociedades Comerciais, mas tão só da utilização da mesma insígnia.


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IV – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Subsecção Tributária Comum do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente

Notifique.

Lisboa, 19 de Outubro de 2023


Maria Cardoso - Relatora
Susana Barreto – 1.ª Adjunta
Luísa Soares – 2.ª Adjunta

(assinaturas digitais)