Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2112/20.5T8CSC.L1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: FÁTIMA GOMES
Descritores: CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA
INCUMPRIMENTO DEFINITIVO
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
ÓNUS DA PROVA
RESTITUIÇÃO DO SINAL
OBRIGAÇÃO
MORA
INTERPELAÇÃO ADMONITÓRIA
PROMITENTE-VENDEDOR
PROMITENTE-COMPRADOR
Data do Acordão: 10/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
O promitente vendedor não pode resolver o contrato-promessa e fazer seu o sinal se o promitente comprador não estiver em mora.
Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça



I. Relatório

1. AA e BB intentaram uma acção declarativa contra CC e DD, pedindo que fosse considerado licitamente por si resolvido o contrato-promessa celebrado com estes a 14/05/2020, por factos imputáveis a estes e que os réus fossem condenados na restituição em dobro do sinal (144.000€ x 2) e no pagamento de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos, no montante de 79.102,40€, tudo acrescido de juros vincendos a contar desde a data da citação e até integral pagamento.

Alegaram, em síntese, que ajustaram com os réus um contrato-promessa de compra e venda de uma moradia, tendo entregue àqueles, na qualidade de promitentes vendedores, 144.000€ a título de sinal. Porém, após a subscrição daquele ajuste vieram a ser surpreendidos pela descoberta, naquela moradia, de manchas de humidade e bolor que estavam ocultas/dissimuladas por móveis e que estavam disseminadas por todo o imóvel.

Por não confiarem nas explicações que foram adiantadas pelos réus – informaram que se tratavam de situações pontuais, justificadas pelo precedente Inverno e que a moradia estava bem conservada –, efectuaram uma inspecção técnica àquele bem, finda a qual se concluiu pela existência de defeitos estruturais, pela impossibilidade de ali desenvolver uma habitabilidade sã e pela existência de obras que não haviam sido licenciadas, sendo que a regularização de todas essas situações requereria a realização de obras no valor de 118.900€.

Nessa sequência, dirigiram aos réus uma interpelação admonitória, tendo estes, em resposta, confessado ter conhecimento do verdadeiro estado do imóvel, acabando, no entanto, por agendar a realização da escritura pública de compra e venda, ao que os autores replicaram com a resolução do contrato; porém, não obstante a eficácia da resolução contratual, os réus consideraram o contrato resolvido e fizeram seu o montante entregue a título de sinal. Referiram ter despendido 29.104,50€ com consultadorias e materiais que adquiriram para a remodelação da moradia, tendo-se sentido ansiosos, enganados e revoltados com todo o processo, avaliando em 50.000€ o valor de indemnização por danos não patrimoniais.

2. Os réus contestaram alegando que, mesmo no contexto pandémico que então se vivia e apesar de ainda residirem na moradia, disponibilizaram a moradia para que os autores a visitassem sempre que entendessem, que responderam a todos os esclarecimentos por aqueles solicitados e que lhes entregaram as telas finais, pelo que aqueles estavam em condições de aferir a questão do licenciamento camarário. Mais aduziram que, no contrato-promessa de compra e venda, os autores aceitaram que a moradia seria vendida no estado em que estava e a veracidade destes factos e que as manchas e humidade tiveram origem no entupimento do colector externo de águas pluviais, que, à data da realização da dita inspecção, a moradia se mantinha no estado em que fora prometida vender e que o prazo concedido jamais seria suficiente para a realização das obras ali elencadas. Referiram ainda que o valor obtido pela venda dessa moradia seria reinvestido na aquisição de um outro imóvel, o que implicava que a escritura de compra e venda daquela fosse realizada em momento anterior à formalização destoutro negócio. A falta de comparência à escritura agendada pelos réus determinou que os autores tivessem incorrido em incumprimento contratual definitivo.

E reconvieram, alegando que, em virtude do incumprimento protagonizado pelos autores, têm direito a fazer seu o montante recebido a título de sinal e que, por exigência dos promitentes vendedores da habitação que planeavam comprar e para obterem a prorrogação do prazo para a realização da respectiva escritura pública, tiveram que renegociar o preço para a sua aquisição, o qual acabou por se fixar em mais 40.000€ do que havia sido inicialmente acordado (o que implicou o pagamento de quantias adicionais a título de IMT e de imposto de selo), para o que tiveram que obter um empréstimo intercalar por via do qual se encontram adstritos a uma adicional amortização mensal no valor de 3.800€. Mais advogam que a moradia prometida vender aos autores foi vendida por valor inferior àquele que fora acordado com estes e que, para o efeito contrataram uma nova mediação imobiliária, no que despenderam 31.980€. Pugnaram pela absolvição dos pedidos contra si formulados, pelo reconhecimento do direito a fazerem sua a quantia entregue pelos autores e pela condenação destes no pagamento de indemnização no valor de 214.700€, acrescido dos juros vencidos e vincendos.

3. Os autores replicaram, impugnando os factos que sustentam a reconvenção e alegando que a indemnização peticionada não era acumulável com a retenção do sinal entregue e que os danos invocados não são imputáveis à sua conduta, tanto mais que o contrato-promessa de compra e venda já fora resolvido pelos autores. Concluíram pela improcedência da reconvenção.

4. Depois de realizada a audiência final foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, absolvendo os réus dos pedidos contra eles formulados pelos autores, e a julgar a reconvenção parcialmente procedente, reconhecendo-se que os réus têm direito a fazer seus os 144.000€ entregues pelos autores a título de sinal e princípio de pagamento e absolvendo os autores do demais pedido pelos réus. As custas foram fixadas em 40% pelos autores e 60% pelos réus.

5. Os autores recorrem desta sentença – para que seja revogada e substituída por outra que absolva os autores do pedido reconvencional e condene os réus ao pagamento do sinal em dobro, ou, subsidiariamente, condene os réus à restituição do sinal e ao pagamento de danos sofridos pelos autores -, impugnando alguns pontos da decisão da matéria de facto e a improcedência da acção e procedência da reconvenção.

6. Os réus contra-alegaram, defendendo a improcedência do recurso e pediram a rectificação das custas.

7. O Tribunal da Relação conheceu do recurso, tendo considerado que o seu objecto era o seguinte:

se deve ser alterada a decisão da matéria de facto e se os autores têm direito ao sinal e à indemnização pedidos e se os réus não têm o direito de ficarem com o sinal entregue pelos autores.”

8. Após análise, com alteração da matéria de facto, o Tribunal decidiu:

“Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente quanto aos pedidos formulados pelos autores, confirmando-se a improcedência da acção, e julga-se o recurso procedente quanto à reconvenção, revogando-se a sentença na parte em que a julgou parcialmente procedente e substituindo-a por esta decisão que agora julga a reconvenção totalmente improcedente e absolve os autores dos pedidos contra eles deduzidos pelos réus.

As custas da causa, na vertente de custas de parte (já que não há outras), são a suportar pelos autores em 50,72% e pelos réus em 49,29%.

As do recurso são a suportar pelos autores 2/3 e pelos réus em 1/3.”

9. Não se conformando com a decisão os RR. apresentaram recurso de revista, onde constam as seguintes conclusões (transcrição):

A. O presente recurso tem por objeto o acórdão proferido no processo n.º 2112/20.5T8CSC.L1, que correu termos na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa, que revogou parcialmente a Sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância, confirmando a improcedência da ação, mas julgando o recurso dos Autores procedente quanto à reconvenção, e, em consequência, absolveu os autores dos pedidos contra eles deduzidos pelos réus.

B. Os Recorrentes não se conformam com o Acórdão na parte em que julgou a reconvenção improcedente e vêm interpor recurso de revista do mesmo por entenderem que o Tribunal da Relação fez uma aplicação errada (e ilegal) da lei, quer processual, quer substantiva, nomeadamente das regras de direito probatório, violando as normas constantes dos arts. 662.º, n.º 1 do CPC e 341.º e seguintes do CC, fazendo uma interpretação errada (e ilegal) dos regimes da resolução ilícita do contrato-promessa, da constituição da mora e incumprimento definitivo e do funcionamento do mecanismo do sinal e da compra e venda de coisa defeituosa, nomeadamente, das normas constantes dos 442.º, 801º, 805º e 913.º e seguintes do CC.

C. De facto, muito embora o Acórdão recorrido confirme o entendimento da 1ª instância de que os promitentes compradores resolveram ilicitamente contrato-promessa dos autos, entende que essa resolução ilícita não teve por efeito extinguir o vínculo existente, e impede o funcionamento do mecanismo do sinal pela contraparte não adimplente – os Réus – por força da aplicação do regime da compra e venda de coisas defeituosas aos promitentes vendedores, que, no entender da Relação, os obrigava a reparar antes da marcação da escritura uma alegada “lista de defeitos”, não obstante se tratar de um contrato celebrado entre particulares, relativamente a um imóvel construído há maisde40anoseprometido vender no estado de usado!

D.A revogação da sentença da 1ª instância, na parte em que havia julgado parcialmente a reconvenção dos Réus, resultou, assim, de um equívoco do Tribunal da Relação quanto à qualidade do imóvel objeto do contrato-prometido – imóvel em 3ª mão, no estado de usado, sem ter sofrido quaisquer obras ou remodelações pelo menos nos últimos 15 anos – e à qualidade dos vendedores – particulares, que utilizavam o imóvel como habitação própria permanente e se comprometeram a vender o imóvel no estado em que se encontrava – o que levou a uma interpretação enviesada da prova produzida nos autos e, sobretudo, à aplicação de uma jurisprudência que foi concebida para imóveis novos ou remodelados, por forma a proteger os consumidores de profissionais, como seja empresas de construção ou de remodelação que tenham realizado esse trabalho de forma defeituosa, o que manifestamente não é o caso dos autos.

E. A intervenção do Supremo Tribunal de Justiça no apuramento da factualidade relevante da causa, restringe-se a fiscalizar a observância das regras de direito probatório material, sindicando se a decisão, ao proceder da forma como o fez, se conformou, ou não, com as normas que regulam tal matéria, precisamente o que se requer nos presentes autos.

F. Com efeito, o Tribunal da Relação, no Acórdão recorrido desconsiderou, sem motivo aparente e sem apresentar qualquer justificação por que motivo as desconsiderada, determinadas provas regularmente produzidas nos autos, de valor probatório igual ou superior a outras provas - como sucedeu relativamente à alegada falta de licenciamento do imóvel que impediria a sua transmissão, estando nos autos cópia da escritura pública, com menção da licença de habitação, que desmente tal afirmação.

G. A Relação atribui igualmente um valor probatório a provas que manifestamente não têm essa qualidade, como sucedeu com um documento particular apresentado pelos Autores que o Tribunal da Relação valorou como se de um relatório pericial se tratasse, ou à confissão extraída de uma carta dos Réus aos Autores durante as negociações do contrato, que não tem manifestamente esse valor.

H. Da mesma forma, o Acórdão recorrido, ao decidir como decidiu, recorreu a uma série de presunções judiciais, que não decorrem da prova produzida nos autos, ou sequer de regras de experiência comum, desconsiderando, sem justificação, a apreciação critica da prova efetuada pelo Tribunal de 1.ª Instância, o qual, beneficiando dos princípios da oralidade e da imediação da prova, havia concluído que o imóvel objeto do Contrato-Promessa não padecia de quaisquer defeitos estruturais e que em momento algum os ora Recorrentes haviam procurado esconder / dissimular dos Recorridos qualquer característica do imóvel usado que haviam prometido vender aos Recorridos.

I. Os Recorrentes não desconhecem que, em sede de recurso de revista, a sindicância do STJ sobre a decisão de facto da Relação em matéria de presunções judiciais é limitada, mas o STJ tem vindo a admitir que pode avaliar o uso de tais presunções pela Relação, se este uso ofender qualquer norma legal, se padecer de evidente ilogicidade ou se partir de factos não provados, que é precisamente o que se passou neste caso.

J. O Tribunal da Relação mandou acrescentar à matéria de facto dada como provada os Factos 10bis, 11bis, 13bis e 13ter, mas fê-lo, de modo ilegal e enviesado, para confessadamente justificar uma solução de direito que não tem aderência aos factos provados nos autos.

K. O Facto 11bis que foi aditado, em si mesmo este nada acrescenta ao que se discute nestes autos, tratando-se de uma comunicação enviada pelos Autores aos Réus depois da celebração do contrato promessa, com aquilo que os primeiros entendem ser “a sua verdade” e com a qual os Réus não concordaram, tendo respondido a essa comunicação. Tratando-se de um documento particular elaborado pelos próprios Autores, a Relação não poderia inferir do conteúdo deste documento, como o fez adiante no Acórdão, que o seu conteúdo correspondia à realidade e que o imóvel padecia das “patologias” ali identificadas, por dar como reproduzido um relatório apresentado pelos Autores (Facto 12) ao qual a Relação atribuiu – ilegalmente – o valor de uma perícia.

L. In casu, não foi ordenada qualquer perícia nos autos, tendo ambas as Partes juntado ao processo com os respetivos articulados documentos elaborados por técnicos especialistas da sua confiança na pendência do contrato-promessa, a saber, o “Relatório de visita e inspeção da moradia” datado de junho de 2020, elaborado pelo Eng. EE (junto como Documento n.º 5 da petição inicial) e o “Relatório de visita a imóvel com cpcv assinado”, datado de 25 de junho de 2020 e assinado pelo Eng. Civil FF (junto como Documento n.º 5 da contestação) e ainda o relatório obtido pelos ora Recorrentes, posteriormente ao incumprimento dos Autores, o relatório denominado “Inspeção e Diagnóstico da Habitação Unifamiliar sita na Rua ..., n.º 104, ...”, da Oz, Lda (Diagnóstico, Levantamento e Controlo de Qualidade em Estruturas e Fundações), datado de outubro de 2020 e assinado pelos Engenheiros civis GG e HH.

M. Estranhamente só ficou a constar do elenco dos Factos Provados este Relatório | Orçamento junto pelos Autores, sendo que o que consta do Facto Provado 12 é simplesmente que, por escrito datado de 25/06/2020, respeitante à moradia, foi elaborado um documento, cujo teor a 1ª instância resolveu transcrever parcialmente.

N. A circunstância de a 1ª instância ter optado por transcrever parcialmente o teor desse documento particular – como, aliás o fez, com a maioria dos documentos juntos pelas partes, desde o contrato promessa às comunicações entre as Partes – não faz com que tenha dado o seu conteúdo como provado, quer integral, quer parcialmente, nem estava autorizada a Relação a fazer tal afirmação.

O. Aliás, em parte alguma da sentença de 1ªinstância se afirma que o imóvel dos autos padece de vícios, muito menos estruturais, “que desvalorizavam e impediam a realização do fim (de habitação) a que ela se destinava (já que a área habitável da moradia revela uma presença sistémica de humidade elevada)”, como veio a Relação despudoradamente afirmar no Acórdão recorrido, fazendo uma leitura enviesada da sentença, mas sobretudo da matéria de facto que foi dada como provada.

P. Não resultou provado nos autos que o imóvel dos autos não tivesse condições de habitabilidade e, ainda que a Relação pudesse entender que tal prova tinha de ser feita pela positiva e não foi, o recurso a uma presunção judicial sempre apontaria no sentido oposto ao que a Relação entendeu, porquanto: a)os Recorrentes, um casal de médicos, viviam lá, de modo permanente, com a sua família há mais de 15 anos; b) constam dos autos dois relatórios de engenheiros civis distintos (Docs 5 e 6 da Contestação) que afirmam expressamente não foram detetadas anomalias visíveis referentes a humidades nos tetos ou paredes, que não existem evidências de humidade sistémica, e que “[p]elas evidências das inspeções efetuadas, as condições de salubridade da habitação são evidentes, sendo que as anomalias identificadas não inviabilizam a utilização da moradia”; c) O banco dos Recorridos avaliado pelo Banco BPI pelo valor de €1.524.500,00(Documento n.º 6 da PI) oque não se coaduna com um imóvel “sem condições de salubridade necessária para uma habitação saudável”…

Q. Também não ficou provado o custo estimado para a correção dos putativos defeitos do imóvel, porquanto, repete-se, até um leigo facilmente percebe, que o orçamento constante do “escrito parcialmente reproduzidoem12” diz respeito à remodelação da moradia para colocá-la como “nova” – estado em que nunca os Recorrentes se comprometeram a vendê-la aos Autores, como aliás resulta da “sugestão de reparações” incluída nesse documento: pintura exterior e interior do Imóvel, mudança de canalizações, impermeabilização do telhado, demolição e a remoção do pavimento impermeável existente no logradouro norte, regularização do terreno, pavimentação da área intervencionada com solução permeável e resistente à circulação de veículos, só para mencionar os mais evidentes.

R. A atribuição de um valor reforçado a um documento particular como se de prova pericial se tratasse, sem análise crítica da contraprova apresentada sobre a mesma matéria, configura um vício de erro notório na apreciação da prova pelo Tribunal da Relação, passível de ser sindicado pelo STJ nos termos do art. 674.º, n.º 1, alíneas a) e b), e n.º 3 do CPC.

S. O Tribunal da Relação não esconde que deu como provado o facto 11bis para, adiante, concluir que “Aditados os factos decorrentes da impugnação da decisão da matéria de facto, esta conclusão é reforçada, pois que agora se dá expressamente como provado (enquanto antes tal decorria da conjugação de factos provados) que os réus tinham conhecimento de todas as situações descritas em 12, e decidiram não revelar aos autores o que se passava quanto à falta de legalização da maior parte das obras que tinham feito na morada (factos 13bis e 13ter) e quanto à existência e causas das humidades (factos 10bis e 13bis).”.

T. Ora, os Recorrentes reputam como manifestamente ilegal e abusiva a interpretação efetuada pelo Tribunal da Relação da matéria de facto provada, a qual, além de considerar como “facto”, não o mero envio de um documento particular pelos Autores aos Réus, mas o próprio teor e conteúdo desse documento, muito embora os Réus nunca aceitaram o seu teor como verdadeiro – tanto que obtiveram dois relatórios de engenheiros em sentido contrário, que estão nos autos – fá-lo, em absoluta desconsideração da restante prova produzida nos autos, nomeadamente, documental e testemunhal, e, mais grave ainda, sem fundamentar por que motivo a restante prova não deve ser atendida.

U. Ao invés do decidido pelo Tribunal da 1ª instância, o Tribunal da Relação considera como facto provado que “[O]s réus sempre disseram aos autores que a moradia estava licenciada.”, através do recurso a uma presunção judicial.

V. Mais uma vez a Relação atribuiu ao “escrito parcialmente reproduzido em 12” um valor probatório que este manifestamente não tem, nada autorizando esse Tribunal a assumir que as “obras que era necessário legalizar constam da extensa lista do facto 12” , quando tal documento não constitui uma perícia, o seu autor não apresenta as qualificações necessárias para afirmar que “construções” existentes, necessitam ou não de licenciamento camarário, nem apresenta qual a base legal de tais afirmações para se poder aferir da veracidade das mesmas.

W. Sucede que as ilações que o Tribunal da Relação retirou do depoimento das testemunhas EE e II para dar tal facto como provado – nomeadamente dos factos que estes conhecem a respeito da indicação dos Recorrentes aos Recorridos que as obras que haviam efetuado careciam de licenciamento – são absolutamente incompreensíveis, configurando uma presunção judicial ilógica face ao que foi dito

X. Dos depoimentos das testemunhas EE (que elaborou o “escrito parcialmente reproduzido em 12”) e II (mediadora, que acompanhou o processo prévio à celebração do Contrato-Promessa e algumas das visitas ao imóvel) mencionados no Acórdão recorrido resultou inequivocamente que foi disponibilizada aos Recorridos, desde o primeiro momento, toda a documentação referente ao imóvel prometido, incluindo as telas finais do imóvel.

Y. Deste modo, o Tribunal da Relação não poderia presumir, partindo de um facto conhecido – o de que os Recorrentes facultaram aos Recorridos as telas finais, plantas e demais documentação do imóvel e permitiram a inspeção do mesmo pelos Recorridos e pelas pessoas que estes entenderam lá levar – que os Recorrentes “… tinham feito obras na moradia, se sabiam que essas obras tinham de ser legalizadas e se apenas informaram os autores de que algumas delas não estavam a coberto de licenciamento, é porque estão a dizer que o resto está licenciado; logo, foi produzida prova bastante sobre parte do facto B, isto é, que os réus sempres disseram aos autores que as obras da moradia estavam legalizadas, à excepção do que se refere à janela, casa de banho exterior e telheiro.”

Z. Os Recorrentes não disputam que avisaram os Recorridos que a janela (transformada em porta) casa de banho exterior (IS apoio à piscina) e telheiro (alpendre para viaturas) não estavam conforme às telas finais, refutam sim, que, para além dessas “construções”, tenha ficado provado nos autos que outras situações houvesse – ou das quais os Réus, particulares, médicos de profissão, tivessem conhecimento, ou obrigação de conhecer, dado que já compraram a moradia no estado de usada– que carecessem de licenciamento e estes as tivessem conscientemente ocultado aos Autores.

AA. Contrariamente à 1ª instância, o Tribunal da Relação julgou provado que “[O]s réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido em 12 e decidiram não as revelar aos autores antes da assinatura do contrato-promessa”.

BB. Tal conclusão parte, mais uma vez, de uma apreciação enviesada da prova, nomeadamente da atribuição de força probatória ao referido “escrito parcialmente reproduzido em 12” que este não tem, pois, repete-se, não sendo um relatório pericial, não tem um valor reforçado que permita à Relação, desconsiderar, sem justificar por que motivo o faz, a restante prova produzida nos autos, nomeadamente prova documental e testemunhal de igual valor probatório em sentido contrário.

CC. O Tribunal da Relação considera que os Recorrentes confessaram, na carta que enviaram aos Recorridos em julho de 2020, ter conhecimento “de tudo o que consta do relatório” e que “comunicaram tudo isso aos autores” para concluir que “ao contrário do que os réus dizem eles não comunicaram aos autores todas as situações descritas no relatório”, o que é absolutamente inadmissível e resulta de um erro clamoroso da aplicação do direito probatório material, que pode ser sindicado pelo STJ.

DD. A Relação não atentou devidamente no teor do escrito dos Réus identificado no Facto Provado 15, porquanto o mesmo é uma resposta à interpelação admonitória dos Autores e não ao relatório em si mesmo que estes juntaram com tal comunicação, até porque sendo os Réus leigos – e tendo, aliás contratado um engenheiro civil para aferir da fiabilidade desse relatório – não lhes cabia comentar tal relatório, sendo absolutamente evidente do teor dessa comunicação que, em momento algum, os Réus aceitam ou reconhecem a existência desses vícios – para além do que é expectável existir numa moradia vivida com mais de 40 anos – e, sobretudo, assumem a responsabilidade pela sua reparação.

EE. Aquilo que os Réus pretenderam nessa comunicação foi relembrar aos Autores qual era o objeto do Contrato Promessa – venda de uma moradia no estado de usada – sendo que a transcrição parcial desse documento no FP 15 poderá ter induzido em erro a Relação quanto à existência de uma suposta confissão dos Réus acerca dos alegados defeitos apontados ao imóvel pelos Autores, mas nos termos do disposto no art. 454.º do CPC, a confissão só pode ter por objeto factos pessoais ou de que o depoente deva ter conhecimento, pelo que não sendo os Recorrentes autores do relatório, nem profissionais do ramo, tal comunicação aos Autores não tem esse efeito processual.

FF. Não só não é aceitável a atribuição do valor probatório de confissão à comunicação dos Recorridos, como é absolutamente inconcebível o juízo de valor que o Tribunal da Relação atribuiu à conduta dos Recorrentes, alegadamente através do recurso a uma presunção judicial, alicerçada nas “regras da experiência comum das coisas”, quando toda a prova produzida nos autos foi em sentido absolutamente contrário ao entendimento do Tribunal da Relação, como aliás resulta da Sentença da 1ª instância.

GG. Ficou cabalmente provado que os Recorrentes, não obstante o período agudo da pandemia do Covid 19 que se fazia sentir, sempre tiveram uma atitude afável e transparente para com os Autores, mostrando-se sempre disponíveis para autorizar visitas ao imóvel objeto do Contrato-Promessa, não só aos Recorridos, mas a todos de que estes se fizeram acompanhar nessas visitas, conduta que se manteve inalterada, quer antes da celebração do contrato, quer posteriormente, disponibilizando igualmente aos Recorridos e seus assessores toda a documentação pertinente ao imóvel, o que contraria a presunção da Relação de que os Réus agiram com o intuito de prejudicar os Autores.

HH. Da prova produzida nos autos resulta que o Tribunal da Relação dispunha de uma série de factos conhecidos que, por si só, permitiram confirmar a qualificação de não provado ao aludido “facto C”, como consta da Sentença.

II. Todavia, ao arrepio do pressuposto para utilização da presunção judicial – a existência de factos desconhecidos que devem ser provados – o Tribunal da Relação optou por desconsiderar os factos conhecidos (a inexistência de defeitos estruturais), os quais foram referidos pelas testemunhas que depuseram em audiência de julgamento, para dar como provado que os Recorrentes conscientemente ocultaram dos Recorridos defeitos estruturais, não obstante não ter ficado provado que estes defeitos existissem, o que não se afigura admissível face às regras de direito probatório e pode ser sindicado o Supremo Tribunal de Justiça.

JJ. Nestes termos e ao abrigo do disposto no art. 674.º, n.º 3 do CPC, pode o STJ decidir que a alteração que a Relação fez à matéria de facto dada como provada pela 1ª instância foi ilegal, por violadora das regras de direito probatório, e ordenar a sua revogação.

KK. Quanto à solução de direito constante do Acórdão recorrido, os Recorrentes discordam igualmente da mesma, por não se coadunar com o disposto na lei.

LL. No Direito Português, a parte exerce o seu direito de resolução sem necessidade de recurso a tribunal, pelo que, enquanto modo de extinção do contrato, a resolução ocorre quando a declaração se torna eficaz, deixando nesse momento o contrato de existir.

MM. O princípio da autonomia privada exige a destruição do contrato quando uma das partes, ainda que sem fundamento se desvincula, só restando à parte não faltosa a via indemnizatória, que foi o que os Recorrentes fizerem, ao fazer suas as quantias entregues a título de sinal ao abrigo do art. 442º n.º 2 CC, inexistindo qualquer fundamento legal para a sua devolução em singelo.

NN. Resulta do Acórdão recorrido que a Relação não partilha o entendimento do Tribunal da 1ª instância quanto às consequências da ilicitude da resolução de um contrato promessa, afirmando que não é possível ver a resolução ilícita do contrato, só por si, como eficaz.

OO. O raciocínio – irrepreensível – da 1ª instância transcrito no Acórdão recorrido foi o seguinte:

“Como os autores resolveram o contrato através de uma interpelação admonitória que não foi feita de boa fé, isto é, que não se traduziu na fixação de um prazo razoável, a sentença entende que a resolução foi ilícita. Mas considera-a eficaz (em 16, 17 e 18) fazendo-a equivaler a um incumprimento definitivo do contrato. Apesar de parecer que, segundo a sentença, tal bastaria para dar razão à reconvenção, a sentença depois acresce, à resolução ilícita, o posterior comportamento dos autores, e é a tudo isto junto, que a sentença considera revelar uma vontade séria, absoluta e inequívoca de não cumprir o contrato-promessa, que a sentença, agora tendo em conta o comportamento dos autores, qualifica como um incumprimento definitivo que faculta aos réus o direito de fazerem sua a quantia entregue”.

PP. Ainda que se defenda uma posição mitigada, de que a declaração de resolução do contrato-promessa, mesmo que ilícita, possa determinar a subsistência do vínculo ilicitamente resolvido nos casos em que a execução do contrato ainda é possível e o promitente fiel mantém interesse na execução do contrato e esta não é excessivamente onerosa para aquele que o resolveu ilicitamente, necessário é analisar o comportamento dos declarantes para concluir se da sua comunicação admonitória resultava (ou não) uma declaração antecipada de não cumprimento, o que a Relação não fez.

QQ. De facto, a sanha da Relação com os ora Recorrentes é tal, que nem concluiu por que motivo entendia que, não obstante a resolução ilícita dos Autores, o contrato promessa continuava em vigor, passando logo a atacar – sem razão, como se verá – a conduta dos Recorrentes, que se limitaram a cumprir o que estava previsto no Contrato-Promessa, marcando a data da escritura em substituição dos Autores.

RR. Quando os Autores remetem aos Réus em 3 de julho de 2020, já numa situação de mora face ao previsto no Contrato, a comunicação que intitularam de “interpelação admonitória”, nos termos da qual alegavam que o estado do Imóvel comprometia – pasme-se! – a “habitabilidade saudável do mesmo” e que intimavam os Réus para, no prazo de 15 (!) dias, procederem à correção integral de uma longa lista de alegados “defeitos”, sob pena de considerarem o Contrato-Promessa definitivamente incumprido e procederem à sua resolução, não pretendiam que os Réus “reparassem” o que quer que fosse, e nem se vislumbra que pretendessem sequer obter uma redução no preço, como seria natural se continuassem efetivamente interessados em adquirir o Imóvel, pois recusaram uma proposta dos Réus de nova redução de preço para tentar salvar o contrato, o que estes fizeram em desespero de causa atentos os compromissos assumidos (e que constam dos FP 22 a 24), e muito embora entendessem não assistir qualquer razão aos Autores.

SS. Perante este cenário, só restou aos Réus converter a mora em incumprimento definitivo, nos termos do disposto no art. 808º do CC, e fazendo funcionar o mecanismo do sinal previsto no art. 442º do CC.

TT. Assim, foi absolutamente acertada a conclusão constante da sentença da 1ª instância de que

“Evidencia-se, assim, de sobremaneira, a falta de razoabilidade daquele prazo, o que, conjugado com o aproximar do prazo para a celebração da escritura pública, denota que esta interpelação lhes foi dirigida como uma mera formalidade.

Ainda que se entendesse diferentemente, há a salientar que a valoração do comportamento concludente encetado pelos reconvindos – a resolução do contrato promessa de compra e venda, o teor da comunicação reproduzida no ponto n.º 16 e o facto de os reconvindos não terem comparecido à escritura pública (potestivamente agendada pelos reconvintes, ao abrigo do n.º 4 da cláusula 4.ª do contrato-promessa de compra e venda) – permite extrair a ilação de que os reconvindos não mais cumpririam o contratado.

Tal comportamento constitui, pois, um facto que, com toda a probabilidade, revela (cfr. n.º 1 do artigo 217º do Código Civil), uma vontade séria, absoluta e inequívoca de não cumprir o contrato promessa.

A declaração antecipada de não cumprir tem também a virtualidade de tornar desnecessária a constituição em mora e/ou a sua conversão em incumprimento definitivo –na medida em que não se justifica que o credor tenha de aguardar o vencimento para se desvincular do contrato, tanto mais que se acha quebrada a confiança no cumprimento que sustentava o contrato – merecendo o mesmo tratamento jurídico da verificação do incumprimento.

Ora, no contexto específico do contrato-promessa, o incumprimento definitivo por parte dos promitentes compradores faculta aos promitentes vendedores a possibilidade de fazerem sua a quantia entregue a título de sinal (primeira parte do n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil). Em face do que viemos de expor, cabe reconhecer que assiste aos reconvintes o direito a fazer seu o montante que lhe foi entregue a título de sinal.

UU. Para justificar a revogação da sentença, na parte em que julgou procedente a reconvenção, a Relação dedica várias páginas do Acórdão recorrido a citar doutrina e jurisprudência e a problematizar sobre o regime das vendas das coisas defeituosas e a sua aplicação ao contrato-promessa, sem cuidar de perceber que a doutrina e a jurisprudência que cita nada têm que ver com o que se discute nos autos, dirigindo-se à relação entre consumidores e profissionais e à aquisição de imóveis novos, que não é manifestamente o caso dos autos.

VV. Nenhuma dessa jurisprudência apresenta qualquer semelhança com o que se discute nestes autos, estando sempre em causa promessa de vende de imóveis novos ou em construção e a relação entre consumidores e vendedores profissionais (sociedades construtoras).

WW. E assim é porquanto não existe jurisprudência nem doutrina que mande aplicar a um promitente vendedor particular de um imóvel usado as mesmas obrigações que são impostas ao proprietário | construtor de um imóvel novo, decorrentes do regime da venda dos bens defeituosos e destinadas a proteger os consumidores.

XX. Os Recorrentes não negam que um promitente-comprador possa ter direito a recusar-se a adquirir um imóvel novo, que apresenta defeitos de construção, enquanto o mesmo não for reparado (até porque haverá ínsita uma garantia do construtor da qualidade dessa construção).

YY. O que os Recorrentes negam e a Relação, ao contrário da 1ª instância, não compreendeu é que, no caso dos autos, os promitentes vendedores não se comprometeram a vender aos Recorridos um imóvel novo – nem sequer remodelado – não existindo já qualquer garantia do construtor, que pudessem transmitir aos novos adquirentes, como sucede na jurisprudência citada.

ZZ. Acresce que, não sendo os Recorrentes profissionais do ramo, não sabem, nem têm de saber que vícios ou desconformidades, principalmente ocultos, possam existir numa moradia construída há mais de 40 anos, daí que se tenham comprometido a vender a casa “no estado em que se encontrava”, o que os Autores tiveram comprovadamente oportunidade de verificar antes qual era.

AAA. É estapafúrdia a pretensão da Relação de que, para estarem em condições de celebrar o contrato definitivo de venda e interpelar os Autores para comparecer na escritura, os Réus, particulares, tinham antes de proceder, a expensas suas, à longa lista de “reparações” que o “remodelador” contratado pelos Autores sugeria que fossem efetuadas, em valor orçamentado em € 118.000 e que disse em julgamento levar, pelo menos, 4 meses a fazer,

BBB. “Reparações” essas que não se coadunam com o conjunto típico de obrigações que resultam para os proprietários aquando da venda de um imóvel usado, na medida em que incluíam exigências tão absurdas num “contexto de reparação”, como seja a pintura integral das paredes interiores e exteriores da moradia, que tem mais de 300 m2, isolamento de caleiras, instalação de novas canalizações, aquisição de nova caldeira ou a substituição do pavimento do logradouro, entre outros.

CCC. Tendo em conta a qualidade dos promitentes vendedores e os termos do contrato-promessa celebrado com os Autores não era, assim, exigível aos Réus que procedessem a essas obras (no fundo benfeitorias) antes de poderem venderem a casa aos Autores, pelo que ao recusar comparecer na data agendada para a escritura por esse motivo, os Autores incumpriram definitivamente o contrato-promessa.

DDD. No contexto específico do contrato-promessa, o incumprimento definitivo por parte dos promitentes compradores faculta aos promitentes vendedores a possibilidade de fazerem sua a quantia entregue a título de sinal (primeira parte do n.º 2 do artigo 442.º do Código Civil), devendo a Relação ter confirmado a sentença nessa parte, reconhecendo aos reconvintes o direito a fazer seu o montante que lhe foi entregue a esse título.”

10. Foram apresentadas contra-alegações, onde se conclui (transcrição):

A. Vêm os Recorrentes interpor Recurso de Revista, não só questionando a aplicação das normas processuais concretizada pelo Tribunal a quo à situação em apreço, mas, ainda, na expetativa de alcançar uma decisão que contemple uma modificação na matéria de facto assente pelo Tribunal a quo, matéria insuscetível de vir a ser agora alterada.

B. O Supremo Tribunal de Justiça encontra-se impedido, nos termos do disposto nos artigos 662º, nº4 e 674º, nº3 do Código de Processo Civil (doravante CPC) de sindicar o acerto da decisão tomada por parte do Tribunal a quo, a respeito da impugnação da matéria de facto suscitada em sede de apelação.

C. Assim, inexiste base legal para a pretensão dos Recorridos de alteração da matéria de facto, matéria assente pelo Tribunal a quo, porquanto, como vimos, o recurso para o STJ de acórdão de Tribunal da Relação é, puramente, de revista, pelo que terá por objeto, exclusivamente, matéria de Direito.

D. Não basta aos Recorrentes alegarem a necessidade de sindicância sobre a decisão de facto, têm estes de especificar os meios de prova concretos que impõe a modificação da decisão e o sentido da decisão a proferir e os Recorrentes não demonstram, que qualquer exceção se possa aplicar a qualquer um dos factos dados como provados pelo Tribunal a quo.

E. O facto dado como provado como facto 11bis, ao contrário do alegado pelos Recorrentes, vem deixar claro que os Recorridos enviaram aos Recorrentes tal missiva, que a mesma foi por estes recebida, e que foi dado conhecimento, pelos Recorridos aos Recorrentes dos factos que compõe o teor da referida comunicação, sendo que o que fica provado com este facto é o envio da referida comunicação e não os factos que da mesma constam.

F. Se, de facto, tal comunicação foi enviada pelos Recorridos e recebida pelos Recorrentes e se, tanto os Recorridos como os Recorrentes, não só não colocaram em causa tal comunicação como, ainda, a juntaram aos presentes autos com os seus articulados, não existe razão para que não se dê como provado o referido facto 11bis.

G. No que concerne ao facto 11bis, os Recorrentes vêm ainda desvalorizar a referida prova documental, dando a entender que o Tribunal da Relação não atendeu à restante prova testemunhal e documental, porém, como vimos, tanto Autores como Réus procederam à junção com os seus articulados do referido escrito, o que é consubstancia, por si só, a clara demonstração de que tal facto ocorreu - mais, se atentarmos aos depoimentos da testemunha JJ e às declarações de parte da Autora, BB, podemos constatar que tal não corresponde à verdade.

H. No que ao facto dado como provado “A” diz respeito, vêm os Recorrentes alegar, que “o Tribunal da Relação limitou-se a tirar uma mera ilação da não refutação dos Recorrentes de tal episódio na comunicação a que respondera, recorrendo a uma presunção judicial não autorizada, já que a demais prova testemunhal foi contrária à mesma”, porém, não individualizam os Recorrentes qual a prova testemunhal que entendem ter sido “contrária à mesma”.

I. Os Recorrentes, ao impugnar a decisão de facto, devem individualizar os factos que estão mal julgados, especificar os meios de prova concretos que impõe a modificação da decisão, indicar o sentido da decisão a proferir, e, não o tendo feito, só se poderá concluir pela rejeição imediata do recurso no que à impugnação deste facto diz respeito.

J. Em sede de Recurso de Apelação, os Recorrentes alegaram não ter ficado provado, por Sentença proferida pelo tribunal de 1ª instância, a existência dos defeitos invocados pelos Autores e melhor descritos no Relatório sob 12, sem, porém, impugnar o referido facto, razão pela qual considerou o Tribunal a quo, e bem, não ser relevante o que vieram os Réus/Recorrentes invocar no que a este facto diz respeito.

K. Nos termos do disposto nos artigos 636º, nº2 do CPC: “Pode ainda o recorrido, na respetiva alegação e a título subsidiário, arguir a nulidade da sentença ou impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas.”

L. Os Recorrentes não suscitaram a questão ao Tribunal a quo, razão pela qual, não podem vir agora os Recorrentes impugnar o facto dado como provado sob o nº 12 ou colocar em causa a força probatória do documento que o Tribunal de 1ª Instância teve por base na sua tomada de decisão.

M. Não obstante, ao contrário do que os Recorrentes alegam, o Tribunal de 1ª Instância, ainda que transcrevendo apenas os “trechos mais relevantes” do documento nº5, pretende dar como demonstrado as alegações dos Recorridos no que toca aos defeitos existentes no imóvel.

N. No que concerne ao facto provado “B”, segundo o qual se firma que “Os réus sempre disseram aos autores que a moradia estava licenciada, à exceção do que se refere à janela, casa de banho exterior e telheiro”, o mesmo foi dado como provado pelo Tribunal a quo.

O. De facto, foi feita prova, documental, pelos Recorridos de que os Recorrentes “sempre disseram aos autores que a moradia estava licenciada”, tendo a veracidade desse facto sido igualmente atestado por via da prova testemunhal.

P. Não colhe a tese apresentada pelos Recorrentes de que “eram os Autores que tinham de dar como provado que os Réus lhe tinham faltado à verdade”, o que, efetivamente, ocorreu e foi, com base nesta prova, que o Tribunal a quo deu o facto “B” como provado e não, como alegam os Recorrentes, numa presunção judicial.

Q. No que concerne ao facto provado “C”, segundo o qual se firma que “Os réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido 12 e decidiram não as revelar aos autores antes da assinatura do contrato-promessa”, vêm os Recorrentes alegar que o Tribunal a quo partiu de uma apreciação enviesada da prova, nomeadamente do valor probatório do facto nº 12.

R. Os Recorrentes confessaram, nomeadamente se atentarmos no facto provado nº 15, ter conhecimento de todos os factos que constavam do referido relatório, o que equivale a dizer que “Os réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido 12 e decidiram não as revelar aos autores antes da assinatura do contrato-promessa”.

S. Os Recorrentes consideram, nas suas alegações, ser o facto provado como “C” “absolutamente inadmissível e resulta de um erro clamoroso da aplicação do direito probatório material, que pode ser sindicado pelo STJ”.

T. Uma vez que não se encontra em questão o facto de ter sido violada uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, não há qualquer expediente legal que permita que o STJ possa sindicar esta matéria.

U. A mesma fundamentação se aplica ao alegado pelos Recorrentes quando referem “foi contrário à lei o recurso à presunção judicial feita pelo Tribunal da Relação de Lisboa para concluir que “de acordo com as regras da experiência” os Recorrentes “… que tem conhecimento desses defeitos e que não os comunicam aos promitentes compradores fazem-no deliberadamente de modo a que o preço não seja diminuído.” Na medida em que, conforme se explicou, o imóvel objeto do Contrato-Promessa, por ser um imóvel construído há mais de 40 anos e com obras de remodelação há mais de 15, foi vendido por um valor bastante inferior ao preço de mercado praticado para imóveis da mesma tipologia, com a mesma localização mas de construção (mais) recente” – solicitando, mais uma vez, a sindicância do STJ nesta matéria quando, evidentemente, continua a não estar em causa uma violação de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova – não sendo o STJ, mais uma vez, o Tribunal competente para conhecer da matéria de facto, a não ser na situação apontada agora.

V. Os Recorrentes alegam, nesta senda, que “a Relação não atentou devidamente no teor do escrito dos Réus identificado em 15, porquanto o mesmo é uma resposta à interpelação admonitória dos Autores e não ao relatório em si mesmo que estes juntaram com tal comunicação, até porque sendo os Réus leigos – e tendo, aliás contratado um engenheiro civil para aferir da fiabilidade desse relatório – não lhes cabia comentar o mesmo (…)”

W. Não colhe a tese dos Recorrentes de que não estariam a responder ao Relatório pois a verdade é que declararam, não só estarem, de facto, a responder ao mesmo como demonstram, ainda, tê-lo compreendido – caso contrário, não poderiam fazer as afirmações que fizeram supra, em resposta aos Recorridos.

X. Os Recorrentes discordam do entendimento do Tribunal a quo, não só quanto à eficácia da resolução do contrato promessa alegadamente operada por estes, mas, ainda, no que à consequência da ilicitude da resolução de um contrato promessa diz respeito.

Y. Os Recorrentes, aquando da data marcada para a celebração do contrato prometido, já se encontravam eles próprios interpelados para o cumprimento da obrigação de reparação dos defeitos existentes no imóvel.

Z. Ainda que sabendo os Recorrentes que os Recorridos apenas aceitariam celebrar o contrato prometido com a correção das questões que se encontravam pendentes entre ambos – no caso, a reparação dos defeitos -, decidiram, de má-fé, marcar a data para a celebração da escritura do contrato prometido, ignorando todas as interpelações dos Recorridos, sendo que a resposta que apresentaram durante toda esta fase de comunicações era sempre a de que o imóvel tinha sido prometido vender naquelas condições.

AA. Os promitentes vendedores, ao convidarem os promitentes compradores a outorgar uma escritura de um imóvel com defeitos não colocaram os Recorridos em mora; tão-pouco, e por maioria de razão, teve a interpelação para a celebração da compra e venda a virtualidade de converter qualquer alegado incumprimento temporário em incumprimento definitivo.

BB. A fundamentação principal do acórdão recorrido — e que os Recorrentes não logram reprovar ou, sequer, afastar nas suas alegações de recurso! — é precisamente a de que a interpelação dos promitentes vendedores para uma escritura de compra e venda de um imóvel com defeitos totalmente ignorados pelos promitentes compradores no momento da celebração do contrato não só é uma oferta de cumprimento exato da sua parte, como ainda não constitui a exigência de um ato devido, porquanto os promitentes compradores não estavam obrigados a adquirir um imóvel com defeitos!

CC. Ao contrário do referido pelos Recorrentes, se alguma das partes demonstrou a intenção de não cumprir o contrato – nas condições em que o mesmo foi assinado – foram os Recorrentes e não os Recorridos.

DD. Tendo os Recorrentes resolvido o contrato de forma ilícita, isto é, com base num falso incumprimento definitivo do contrato por parte dos Recorridos, a resolução do contrato não produz qualquer efeito, não havendo lugar à retenção do sinal por parte dos Recorrentes.

EE. Não têm os Recorrentes o direito de exigir a celebração do contrato prometido, bem sabendo estes que - tal como ficou aliás aqui provado -, os Recorridos não tinham conhecimento do verdadeiro estado do imóvel ao nível das causas de humidade que o mesmo apresentava ou, ainda, da necessidade de legalização da maior parte das obras realizadas no imóvel e só com base nessa ignorância decidiram celebrar o contrato-promessa.

FF. Se a lógica que se aplica aos Recorridos é a de que os mesmo não podiam ter resolvido o contrato celebrado entre as partes, da forma que o fizeram, isto é, através de uma interpelação admonitória com um prazo de 15 (quinze) dias para os Recorrentes sanarem os defeitos da coisa, sob pena de se encontrarem a agir de má-fé – concluindo o Tribunal a quo que este prazo não era razoável -, então, teremos de aplicar exatamente a mesma linha de raciocínio quando se trata de uma eventual resolução por parte dos Recorrentes, já que estes não só se propuseram vender um imóvel com defeitos, como invocaram uma obrigação de comprar dos Recorridos que nunca existiu, pois estes não se comprometeram à compra de um imóvel com defeitos.

GG. Os Recorrentes não só ignoraram todas as preocupações dos Recorridos, dando-lhes sempre a mesma resposta de que “o imóvel se encontrava no estado em que tinha sido prometido vender” – o que é manifestamente falso, como ficou provado - como, prosseguiram com a marcação da escritura, quando era do seu pleno conhecimento que os Recorridos não estavam vinculados celebrar contrato definitivo nos termos em que o imóvel se encontrava – que não eram os termos acordados, como vimos.

HH. Se o Tribunal de 1ª Instância considera ilícita a resolução do contrato pelos Recorridos, com base na não verificação de boa-fé aquando da fixação do prazo de 15 (quinze) dias para a correção dos defeitos do imóvel, também não pode considerar lícita uma resolução de contrato operada pelos Recorrentes, quando os Recorridos se limitaram a exercer um direito seu ao não comparecer na escritura de um imóvel com defeitos, não a violando a sua obrigação.

II. Considerando que os factos que deram causa às preocupações dos Recorridos e à manifestação de vontade dos mesmos de resultam dos autos como provados, os Recorrentes não podem exigir dos Recorridos que estes tivessem celebrado o contrato prometido, sob pena de fazerem seu o sinal entregue.

JJ. A lógica que existe para se defender que a resolução de um contrato que seja considerada ilícita seja, também, ineficaz, prende-se com o facto de evitar situações em que, caso a resolução ilícita ditasse a cessação automática do contrato, eventualmente se viesse a recorrer, de forma intencional a este expediente da resolução ilícita, inviabilizando a execução específica do mesmo.

KK. Nesta senda, sendo a resolução ilícita e, por isso, ineficaz, seguindo-se assim a linha de raciocínio adotada pelo Tribunal da Relação e por grande parte da doutrina, o contrato não se considera resolvido, com fundamento em incumprimento definitivo dos Recorridos, razão pela qual os Recorrentes não têm o direito de fazer seu o valor entregue a título de sinal pelos Recorridos; mais, têm eles de restituir aos Recorridos a quantia entregue, em última análise com fundamento em enriquecimento sem causa (restituição do que foi prestado por causa que deixou de existir: art. 473.º, n.º 2, do CC).

LL. O facto de a resolução ser ineficaz, por ser desprovida de fundamento, não significa, evidentemente, que o contrato-promessa dos autos se mantenha em vigor porquanto a obrigação de venda — e, consequentemente, também a obrigação de compra — foi definitivamente tornada impossível pelos promitentes-vendedores ao alienarem o imóvel a um terceiro.

MM. Nenhuma razão subsiste para que os Recorrentes continuem a reter a quantia, uma vez que, por um lado, (1) o contrato-promessa não foi incumprido por causa imputável aos promitentes-adquirentes, não havendo por isso, direito a reter definitivamente o sinal por parte dos promitentes-alienantes (art. 442.º, n.º 2 do CC a contrario); por outro lado, (2) o cumprimento das obrigações de venda e de compra emergentes do contrato-promessa foi tornado definitivamente impossível pelo promitentes alienantes, o que leva à caducidade do contrato-promessa. Deixando de existir a causa que motivou a entrega da quantia (a título de sinal), não resta outra solução se não ter esta de ser devolvida pelos Recorrentes, com juros contados a partir do momento da propositura da presente ação, com fundamento em enriquecimento sem causa (art. 473.º, n.º 2, e art. 480.º do CC).

NN. Vêm ainda os Recorrentes alegar que a jurisprudência utilizada pelo Tribunal a quo para fundamentar a sua decisão não apresenta qualquer semelhança com o que se discute nestes autos, estando sempre em causa imóveis novos e vendedores profissionais (mormente sociedades construtoras).

OO. O regime da venda de coisas defeituosas aplica-se, independentemente da antiguidade da coisa a ser vendida – tanto assim o é que não se estipula, no texto da norma, qualquer requisito de antiguidade (ou não) para a aplicação daquele regime.

PP. O que se discute aqui é a existência ou não de defeitos no imóvel, sendo que a informação acerca da existência de defeitos, sendo a existência destes do conhecimento dos Recorrentes, deveria ter sido transmitida aos Recorridos, sob pena de os Recorridos se encontrarem a celebrar um contrato cujo objeto não corresponde ao prometido – o que aconteceu.

QQ. A questão de existirem vícios ou defeitos no imóvel é independente da questão de se tratar de um imóvel mais ou menos recente, razão pela qual não poderá colher a fraca argumentação dos Recorrentes quando alegam que tal jurisprudência não terá aplicabilidade ao caso em concreto.

RR. Encontramo-nos numa situação prevista no regime do artigo 913º, tratando-se os defeitos em questão, de defeitos que desvalorizam a coisa, que impedem a realização do fim a que é destinada, no caso apresentando indícios de falta de condições de habitabilidade e a falta de qualidade necessárias para a realização do fim constante do contrato, que, no caso, é habitar aquele imóvel.

SS. Por outro lado, os Recorrentes invocam que o regime da compra e venda de coisas defeituosas não se aplica a vendedores não profissionais. Essa é uma tese inédita, sem qualquer fundamento legal. Bem pelo contrário: é sabido que com a instituição de um regime de conformidade especificamente aplicável à compra e venda feita por profissionais a consumidores — veja-se hoje o Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro, em especial, nos seus artigos 2.º, g) e o) e 3.º, n.º 1, al. a ) —, o regime dos artigos 913.º e ss. do CC se aplicam precisamente a compras e vendas celebradas entre não profissionais, como é o caso!

TT. Os Recorrentes inventam uma tese abstrusa, sem qualquer apoio legal, de que os particulares não poderiam sujeitar-se ao regime da compra e venda de coisas defeituosas.

UU. Vêm alegar os Recorrentes “a obrigação de reparação da coisa vendida não existe, assim, se o vendedor desconhecer sem culpa ou vício ou falta de qualidade” – quando ficou provado dos presentes autos que, de facto, os vendedores, ora aqui Recorrentes, conheciam exatamente os defeitos existentes.

VV. Na argumentação plasmada nos artigos 200º e seguintes das Alegações dos Recorrentes, vêm estes, numa tentativa desesperada de, ignorando os factos vertidos no relatório a que se referem, bem como, as preocupações e comunicações dos Recorridos no sentido de insistir pela reparação dos defeitos, fazer crer ao Tribunal que as pretensões dos Recorridos eram outras e que, com base nessas pretensões, fizeram cessar o contrato com os Recorrentes – alegações com gravidade, que são totalmente falsas e que demonstram bem a exasperação dos Recorrentes de não aceitar a verdade dos factos.

WW. Inexistindo a possibilidade de modificação da matéria de facto, conforme já vimos, também - mas não só por esta razão - não colhe a pretensão dos Recorrentes no que concerne à alteração da matéria de direito, isto é, à decisão de revogação da Sentença no que concerne ao pedido reconvencional dos Recorrentes.

XX. Os Recorrentes não poderão fazer seu o sinal entregue pelos Recorridos, sob pena de se encontrarem a enriquecer sem causa para tal, uma vez que, como vimos, i) não foi sequer resolvido pelos Recorrentes o contrato-promessa celebrado com os Recorridos; ii) ainda que se considerasse que os Recorrentes tinham procedido, conforme decorre da Lei, à resolução do contrato, tal resolução só poderia ter como consequência a sua ineficácia – não produzindo qualquer efeito e, não havendo produção de efeitos, os Recorrentes têm de devolver o valor pago a título de sinal aos Recorridos.

11. Foi proferido despacho a admitir a revista, onde consta:

Por estarem em tempo e para tal terem legitimidade, tendo pago a respectiva taxa de justiça (incluindo a multa) admite-se o recurso interposto pelos réus, a subir nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.

Remeta os autos desde já ao STJ por não haver que esperar qualquer prazo de reclamação.

Colhidos os vistos legais, cumpre analisar e decidir.

II. Fundamentação

De facto

12. Das instâncias vieram apurados como provados, com aditamento dos pontos 10bis, 11bis, 13bis e 13ter pelo Tribunal da Relação, os seguintes factos:

1\ Os réus viviam há mais de 15 anos na moradia sita na Rua ..., n.º 104, ....

2\ Em 25/04/2020, os autores, após saberem que a moradia estava à venda pelo valor de 1.490.000€, efectuaram uma visita à mesma para verificarem as suas características e localização.

3\ Em 27/04/2020, a autora efectuou uma visita à moradia, tendo questionado os réus acerca da origem de sinais de humidade que se verificavam em algumas zonas da casa, ao que estes responderam que aqueles resultavam de uma situação que ocorrera no Inverno e que já havia sido resolvida, mediante intervenção que haviam efectuado na cobertura plana da moradia.

4\ Em escrito datado de 28/04/2020 e dirigido aos autores, os réus declararam:

“[…] Este Inverno notámos o aparecimento de alguma humidade em pontos específicos que nos levaram a inspeccionar possíveis áreas de infiltração tendo chegado as seguintes conclusões:

Detectaram-se três pequenas áreas na cobertura do terraço, não do telhado, com quebra da integridade da tela de cobertura, que justificaram a infiltração na área do corredor. Já reparadas.

Constatou-se entupimento da caixa colectora que leva todas as águas pluviais ao colector exterior com consequente impossibilidade de drenagem e acumulação de água nas caleiras e algerozes, sem drenagem, o que levou ao aparecimento de humidade em pontos específicos, adjacentes aos algerozes, nomeadamente na sala e no escritório.

Tirando estes locais as restantes paredes não têm sinais de humidade. O sistema de drenagem de águas pluviais foi submetido a uma inspecção e intervenção por uma empresa especializada na semana passada com total resolução do problema.

Não foram alteradas as áreas da casa encontrando-se conforme as plantas originais, portanto não julgo haver qualquer problema com os bancos que também intervieram em 2005 quando nós comprámos a casa.”

5\ Na sequência da apresentação de uma proposta de aquisição pelos autores, os réus, em escrito datado de 28/04/2020 e àqueles dirigido, declararam:

“[…] A casa está bem conservada e naturalmente necessita apenas de alguns trabalhos. Toda a zona do telhado apresenta uma cobertura de telhas de boa qualidade e integras sem necessidade de reparações. As zonas de terraço do telhado estão estanques mas aqui julgo que se podia optar por uma nova impermeabilização. Esta obra é relativamente pouco dispendiosa e garante tranquilidade por muito tempo. […] Finalmente resta a necessidade de pintura completa do interior da moradia que é normal numa casa usada e até por motivos de higiene.

Quaisquer outras obras serão puramente pessoais, a gosto de cada um e normais quando existe uma mudança de proprietários.

Sendo assim gostaríamos de fazer a seguinte contra proposta: Deduzindo o valor das obras a realizar, com uma margem alargada, nomeadamente as do terraço e pintura, de cerca de 20.000€ e ainda de uma dedução negocial de 30.000€ ao preço anunciado, apresentamos uma contra proposta de 1.440.000€. […]”.

6\ Em escrito encimado pela expressão “contrato-promessa de compra e venda” e datado de 14/05/2020, os réus, aí identificados como promitentes vendedores e os autores, aí identificados como promitentes compradores, declararam

“[…] É livremente celebrado o presente contrato promessa de compra e venda que se rege pelas cláusulas seguintes e em tudo o que for omisso, pela legislação aplicável.

Cláusula primeira (Objecto)

1\ Os promitentes vendedores são os proprietários e legítimos possuidores do prédio urbano constituído por Moradia de cave, rés-do-chão, 1º andar, garagem e piscina e logradouro, situado em ..., concelho de ..., na Rua ..., n.º 104 [...], adiante também designado abreviadamente por Imóvel.

[…]

Cláusula segunda (Promessa de Compra e Venda)

1\ Pelo presente contrato, os promitentes vendedores, prometem vender aos promitentes compradores e estes prometem comprar-lhe a eles, livre de quaisquer ónus ou encargos à data da outorga do contrato prometido, nomeadamente as identificadas hipotecas voluntárias o bem descrito na cláusula anterior, no estado em que se encontra.

[...]

3\ Os promitentes compradores expressamente manifestam e declaram que previamente à celebração do presente contrato:

a\ Procederam à visita do identificado Imóvel;

b\ Analisaram a documentação a ele relativa;

c\ Têm conhecimento integral do seu estado físico [...]

Cláusula terceira (Preço e Condições de Pagamento)

1\ O preço convencionado para a prometida venda é de 1.440.000€ […] e será pago nos seguintes termos:

a\ A título de sinal e princípio de pagamento por conta do preço acordado. Os promitentes compradores entregam com a assinatura do presente contrato aos promitentes vendedores a importância total de 144.000€ […]

b\ O remanescente do preço, ou seja, 1.296.000€ será pago no acto da outorga do contrato prometido, através de cheque bancário.

[…]

Cláusula quarta (Contrato Prometido)

1\ O contrato prometido será outorgado por escritura pública de compra e venda, por contrato particular autenticado, ou por título Casa Pronta, no prazo máximo de 60 dias contados da assinatura do presente contrato, em dia, hora e local, que os promitentes compradores venham a notificar os promitentes vendedores com pelo menos 10 dias úteis de antecedência da data pretendida.

[…]

4\ Findo o prazo previsto no n.º 1, não tendo sido prorrogado nos termos do número anterior outro não tiver sido acordado entre as partes, a marcação da escritura definitiva de compra e venda passará a ser da responsabilidade, exclusiva dos promitentes vendedores os quais para o efeito deverão indicar aos promitentes compradores a respectiva data, hora e local de realização, com, pelo menos, 10 dias de antecedência. […]”.

7\ Os autores despenderam as importâncias de 645,75€, de 150€, de 100€ e de 344,40€ no pagamento de consultadorias técnicas respeitantes à remodelação da moradia.

8\ Os autores encomendaram conjunto de material de soalho/chão e a respectiva entrega, tendo, para tanto, despendido o valor de 25.546,94€.

9\ A 16/05/2020, os réus declararam prometer adquirir, mediante escritura pública a celebrar até 60 dias após aquela data, um prédio urbano […] pelo valor de 880.000€, tendo entregue a 100.000€ a título de sinal.

10\ Em visitas realizadas à moradia que tiveram lugar em momentos posteriores à celebração do contrato, os autores viram manchas de humidade e bolor em paredes daquela habitação que antes estavam tapadas por mobiliário e radiadores.

10bis\ Na sequência do referido em 10, os autores confrontaram os réus, tendo-lhes estes dito que as manchas seriam apenas resquícios pontuais da situação ocorrida nesse último Inverno e que se resolvia com uma simples limpeza (anterior facto não provado A)

11\ Na sequência do facto 10, os autores solicitaram a realização de uma inspecção à moradia.

11bis\ Em escrito datado de 21/06/2020 e dirigido aos réus, que o receberam, os autores, declararam:

“(…) Gostaríamos de não ter necessidade de enviar este e-mail, e queremos reforçar que estamos neste processo com a mesma boa fé e vontade de chegar a um entendimento, mas infelizmente os vários vícios e defeitos do imóvel com os quais fomos sendo surpreendidos e se confirmaram nos últimos dias, não nos deixam alternativa que não seja a de expor o nosso desconforto, tendo em conta que não estavam previstos na negociação. De acordo com apreciação técnica de um Engenheiro, efectuada na visita de 5ª feira, dia 18/06, verifica-se que a casa tem determinadas patologias que não podiam ter sido avaliadas e deslindadas sem um olhar clínico profissional, em simples visitas imobiliárias e que rebatem a versão que nos foi apresentada e as garantias prestadas antes da assinatura do CPVC.

Estas patologias têm de ser corrigidas para que a casa tenha qualidade e condições para ser habitável sem danos futuros para quem lá residir. Gostaríamos de recordar que, mediante o que nos foi transmitido, partimos do pressuposto que estaríamos perante uma casa que sofreu uma remodelação total - completa, como foi dito - e não apenas parcial. Acreditamos que também os vendedores há 15 anos possam ter sido induzidos em erro pela empresa que fez a remodelação, porém essa responsabilidade não nos pode ser imputada, uma vez que as patologias estão presentes e já estavam na altura da negociação, sem que nós tivéssemos conhecimento.

Em seguida, enviamos detalhadamente os pontos, tal como foram identificados pelo Engenheiro, seguidos de algumas considerações.

Começando pelas patologias da cobertura:

- Todas as caleiras da cobertura inclinada têm o isolamento comprometido e terá de ser refeito.

- As telhas têm de ser lavadas e sujeitas à colocação de fungicidas, uma vez que estão cobertas de fungos.

- A cobertura plana tem todo o isolamento comprometido, que terá de retirado e refeito, incluindo as caleiras. E a impermeabilização é também fundamental, sendo este ponto do nosso conhecimento.

Estes factos, à excepção da última alínea, contrariam a informação de que dispúnhamos e nos foi relatada por escrito aquando da negociação.

Patologias do interior:

- A casa apresenta sinais de muita humidade em vários pontos, que têm origem em factores de origem diversa.

- A condição exterior da cobertura plana e inclinada, tal como das caleiras e a falta de isolamento térmico são motivo de surgimento de fungos, bolores, manchas e humidade no interior.

- A caixa de ar das paredes externas está comprometida, sendo uma questão estrutural (má construção) que tem de ser resolvida, caso contrário a casa terá sempre humidades e fungos.

- Todas as humidades interiores têm de ser tratadas, com aplicação de fungicidas, não sendo a limpeza e pintura suficientes, sob pena de ser um risco para a saúde. (por exemplo: vários pontos da sala, escritório, sala multiusos, em pelo menos dois quartos, os dois halls do piso térreo, hall superior, não se tratando apenas de pontos específicos).

Uma vez mais, estamos presentes factos contraditórios, face ao que nos havia sido dito: que a humidade e manchas de bolor estariam apenas presentes em alguns pontos do hall dos quartos, na sala, escritório e zonas adjacentes aos algerozes e que teria sido apenas resultado de uma inundação/entupimento que, por ora, estaria resolvida. O que não se coaduna com a realidade, uma vez que pelas razões acima mencionadas o problema é patológico e não circunstancial e muda completamente a perspectiva. Apesar das paredes não terem sido pintadas, uma parte significativa das manchas de humidade e fungos havia sido limpa ou estava oculta, não permitindo avaliar o grau do problema antes da assinatura do CPCV.

Recordamos que no 19/05, 5 dias após a assinatura do CPCV, como sabem, deparámo-nos com outra questão impossível de detectar até esse momento - por se tratar de um espaço oculto da casa - que nos causou bastante apreensão: por detrás de alguns radiadores existia a presença de bolor, o que representa, como se sabe, uma série de riscos. Manifestámos a nossa preocupação face ao problema, até porque a parte compradora tem no núcleo familiar que iria habitar a casa, quem tenha problemas respiratórios, mas o problema foi desvalorizado pelos proprietários.

A título de exemplo, após medições, em anexo, verificou-se que na parede de um dos quartos que apresentava o bolor, os níveis de humidade rondam os 30% e na parede do hall que vai para os quartos temos um valor de cerca de 40%, o que confirma o problema, até porque estamos a falar de valores muito elevados, principalmente nesta época do ano.

A casa não tem qualquer tipo de isolamento, encontrando-se todas as estruturas permeáveis. O que também não está de acordo com uma informação que nos foi dada e nos levou a ser induzidos em erro.

No decorrer das visitas, a propósito da recolha de algumas medidas para as alterações estéticas, fomos detectando alguns pontos que foram causando preocupação e que procurámos sempre junto dos proprietários perceber e obter respostas, mas todas as respostas nos remetiam para o facto de serem questões sem importância ou que estariam resolvidas. Porém, na passada semana, ao constatarmos a percentagem de humidade nas paredes, suspeitámos que estaríamos perante questões mais delicadas e sérias e que não poderiam continuar a ser desvalorizadas. Nesse mesmo dia, percebemos que haveria a necessidade de requerer a presença de um Engenheiro para avaliar a gravidade do problema e de tudo o resto que poderia escapar ao nosso conhecimento. Pedimos, por isso, uma última visita à casa, para ter a real noção do que se passava e, simultaneamente, percebermos se o projecto, perante tudo o que surgiu, continuava a ser viável. O resultado dessa visita trouxe-nos até ao ponto em que estamos hoje.

Por fim, no que diz respeito às patologias, deparamo-nos com o tema das fundações.

Patologias das Fundações:

- Há evidências claras de que não houve isolamento exterior das fundações periféricas, que se encontram húmidas ou bastante húmidas, assim como a terra que em alguns locais se encontra barrenta. Um problema estrutural, que se reflecte na casa e se não for corrigido compromete a habitabilidade sã da moradia em questão. Segundo o que nos foi transmitido, todas estas patologias são factuais e o que delas surge não é transitório. E, à excepção da cobertura plana, o que aqui relatamos não corresponde de todo à informação que tínhamos em fase de negociação e vai ao arrepio do que nos foi dito, nomeadamente que a única necessidade de “obra” seria para pintura e cobertura plana.

Canalizações:

- Na sequência das visitas técnicas da passada semana constatámos, também, que a tubagem da linha de abastecimento de água da casa - não só desde o contador, mas também da alimentação de um furo - até ao início da linha principal de distribuição da moradia - está em ferro galvanizado, incluindo acessórios.

O que nos havia sido transmitido era que teria sido feita uma renovação total, incluindo canalizações, verifica-se porém que a tubagem não terá sido toda renovada, havendo diversos segmentos que remontam à estrutura inicial da casa, de há 36 anos. Em virtude disso é necessário que toda esta sequência de segmentos seja substituída até ao contador, uma vez que pela idade e constituição da mesma, é certo o perigo que a parede interior do tubo esteja comprometida e bastante danificada, com "contaminação" da água, e passível de roturas num futuro próximo. As caixas de esgotos também apresentam sinais de rupturas/vazamentos.

Estes são, na realidade, um conjunto de factores de extrema relevância a ter em conta nos pressupostos essenciais do negócio e de comunicação entre ambas as partes e que seguramente uma delas – a parte compradora - não poderia ter conhecimento antecipado e que a obriga a confiar na boa-fé dos vendedores, confiando nas garantias e explicações que nos foram prestadas. Perante todas estes pontos e os factos aqui sublinhados são inegáveis os prejuízos que os mesmos aportam, para quem com eles se depara, até porque não são “apenas alguns trabalhos”, porque não estamos a falar de afinar portas ou janelas, pinturas ou mudar rodapés, nem se tratam de questões de natureza estética.

Ainda para mais, os pareceres dados após visita técnica, indicam que algumas das patologias fazem parte do ADN da habitação ou já estão presentes há vários anos. Logo, os problemas com os quais fomos surpreendidos, após a assinatura do CPCV – que assinámos de boa fé - deveriam ter sido comunicados quando da negociação, até porque como já foi referido não se apresentavam passíveis de serem constatados e alguns são, aliás, contraditórios com as informações prestadas, por escrito, na sequências dos pedidos de informação que solicitámos.

Também, na mais recente visita, fomos alertados para o facto do terreno, por conta do pavimento exterior colocado pelos actuais proprietários, não estar a cumprir, provavelmente, com a percentagem de permeabilidade exigida por lei e que poderá ser foco também de problemas – para um lote de 900m2 a área de impermeabilização deverá ser de 270m2. O que nos obriga a uma obra total do exterior, na zona de entrada e lateral Poente, com alterações e obras que também não estavam previstas.

A propósito, da alteração da porta para janela e demolição da varanda na fachada sul, sendo uma alteração da geometria da casa, requer parecer/licenciamento da câmara. Uma vez que nos foi dito que tudo estava em conformidade, agradecemos a documentação referente. Nesta fase, é igualmente pertinente questionar se os actuais proprietários estão na posse do número da licença que indica a legalização do alpendre construído na frente da casa. Uma vez que fomos confrontados com o facto de ter características e dimensões que carecem também de licenciamento. Este alpendre, tal como está e segundo os arquitectos, acresce a área coberta da habitação e conta como anexo. Depreendemos que falta um documento, uma vez que o que temos não menciona a presença do telheiro.

Acreditamos que alguns destes pontos (patologias) possam ser uma surpresa para os actuais proprietários e que, com o real conhecimento dos mesmos, teriam sido contemplados na negociação, mas, por maioria de razão, foi-o ainda maior para nós, porque altera completamente a visão que nos foi dada e tínhamos do imóvel. Chegados aqui, se for do interesse dos proprietários, o Engenheiro poderá voltar, esta semana, à moradia com o intuito de fazer um relatório de inspecção, algo que não poderia ter sido feito anteriormente, uma vez que requer autorização dos proprietários, e onde serão feitas medições e listadas e documentadas todas as patologias e respectiva projecção orçamental.

No link abaixo, enviamos várias fotos, que corroboram o que aqui está escrito. https://we.tl/t-NWtT914w4h

Como sinal da nossa boa fé e por todas as razões subjacentes ao que nesta carta foi detalhado, chegámos a uma fase em que somos forçados a reavaliar o processo como um todo e sobretudo as condições de aquisição estipuladas com base em premissas que não se verificam. Em consequência disso, decidimos conferir aos actuais proprietários o direito e primazia de propor uma solução para todo este processo.

Dado o estágio em que nos encontramos, ficamos a aguardar a resposta com a maior brevidade possível. (…)”

12\ Nessa sequência, foi, em escrito datado de 25/06/2020 e respeitante à moradia, vertido que:

“[…] DESCRIÇÃO DAS PATOLOGIAS VERIFICADAS

Da visita ao interior do imóvel foi possível identificar várias zonas em paredes e tectos com evidências de humidade, identificadas pela presença de manchas escuras, destacamento de tinta, eflorescências e cripto florescências, bolores e manchas com evidências de limpeza dos fenómenos citados. Estas manifestações de fenómenos gerados pela presença de elevadas percentagens de humidade relativa foram identificadas em diversas divisões, conforme testemunham as fotos seguintes. […]

É de referir que as diversas leituras efectuadas nesta divisão de "garrafeira", quer ao nível das quatro paredes, quer do tecto ou do pavimento, resultaram em 99% de humidade relativa. O mesmo foi verificado num pequeno anexo a esta divisão. […]

Da fotografia anterior destaca-se o surgimento de fenómenos que evidenciam a presença de humidade, mesmo após reparação do acabamento, isto é, a reparação efectuada não resolveu a origem da patologia existente. […]

Da análise às evidências acima mostradas pelas fotografias, que pretendem ser apenas uma amostra das situações identificadas no local, conclui-se que a área habitável da moradia revela uma presença sistémica de humidade elevada, não sendo justificável por fenómenos localizados ou episódios singulares. A presença das referidas manchas escuras, destacamentos de tinta, eflorescências e cripto florescências, bolores e manchas com evidências de limpeza e/ou reparações, não são justificáveis por eventos esporádicos, mas antes pela presença constante e prolongada de elevados níveis de humidade, como se justifica pela restante análise descrita no presente relatório.

Nas zonas mais afectadas pelos fenómenos descritos, as argamassas de acabamento das paredes e tectos interiores terão de ser substituídas, visto não se poder efectuar pintura sobre as argamassas que se encontram profundamente degradadas e comprometidas. A execução de pintura sobre tal base degeneraria na rápida degradação elou empolamento da mesma.

Terminada a visita aos espaços interiores habitáveis, a visita de inspecção prosseguiu na cobertura. Nas fotos seguintes é notória a degradação da impermeabilização das coberturas planas, bem como, de todas as caleiras existentes nas coberturas inclinadas. Faz-se desde já notar que esta degradação, que obriga a uma reparação integral dos esquemas de impermeabilização referidos, justifica pontualmente algumas das humidades encontradas no interior da moradia, nomeadamente de alguns pontos a nível dos tectos, não justificando contudo os fenómenos verificados em paredes, nomeadamente na parte inferior das mesmas.

Das próximas fotografias destacamos ainda a presença de diversas reparações localizadas com produto impermeabilizante do tipo pele elástica, reparações essas que denotam a falência dos esquemas de impermeabilização existentes que levaram nos últimos anos a várias reparações pontuais, não tendo sido contudo efectuada a reparação integral da impermeabilização das coberturas planas e das caleiras das coberturas inclinadas.

Na fotografia anterior é possível identificar a presença de diferentes esquemas de impermeabilização, tendo sido informado pelo proprietário que o esquema à direita é o da construção original da moradia, datada de 1984 o esquema à esquerda terá sido realizado aquando das abras em 2005, e por último, reparações localizadas efectuadas par impermeabilizante do tipo pele elástica efectuadas nos últimos anos. […] Como já referido, pelas evidências identificadas no local, os esquemas impermeabilizantes das coberturas estão comprometidos, devendo ser integralmente substituídos, por via da sua completa remoção e aplicação de novo esquema. Contudo, mais uma vez se salienta que os danos presentes na impermeabilização da cobertura justificam apenas parcialmente a presença dos fenómenos de humidade identificados no interior da moradia.

Posteriormente, a visita prosseguiu na zona da cave que se encontra sobre a moradia em toda a sua extensão, com excepção da garagem. Conforme identificado na planta constante das telas finais do processo camarário. A cave está dividida numa área técnica de instalação de equipamentos e numa área de caixa de ar.

Para análise às patologias verificadas no interior deste espaço é fundamental a observância do elemento de projecto abaixo, relativo à estabilidade do piso do r/c, no qual é possível verificar a composição das lajes e da estrutura de betão armado na qual estas se apoiam. Faz-se notar que segundo este desenho relativo a telas finais, isto é, relativo a como o edifício foi efectivamente construído, verifica-se a presença de paredes de betão armado em todo o perímetro da moradia, incluindo o espaço ajardinado interior.

Da visita ao local foi possível comprovar a constituição das referidas paredes e pilares em betão armado, sendo as lajes do tipo aligeiradas compostas por vigotas pré-esforçadas e abobadilhas em cerâmica.

[…] Fotografias. Estas evidenciam o levantamento efectuado em todas as paredes enterradas de betão da moradia, incluindo as paredes da fachada a norte, bem como, ao terreno existente sob a moradia, sendo que em todos os locais sem excepção foi medida uma humidade relativa de 99% no interior da caixa de ar. Assim, conclui-se que todo este espaço, incluindo terreno, paredes e laje superior (laje do rés-do-chão), apesar do tempo quente e seco que se verificava no dia da visita e em toda a semana anterior, se encontra com o valor máximo da escala do aparelho de medida utilizado, denotando a presença de elevada humidade no espaço, o que, não é conducente com o objectivo de arejamento deste espaço. […]

Da análise efectuada a todos os fenómenos presentes na moradia e principalmente na caixa de ar, é de todo evidente que a caixa de ar não está a efectuar a sua função, sendo responsável, juntamente com as fundações, pela presença sistémica de humidade no interior da habitação. Fazemos notar, tal como anteriormente referido para o espaço habitável, que os fenómenos encontrados na cave são sistémicos e não pontuais ou temporários. De entre as causas que justificam a presença da elevada humidade no espaço, encontram-se claramente a não existência (ou eventual falência integral) de isolamento das paredes de betão armado que circundam a moradia e o jardim interior. Verifique-se a presença de 99% de humidade relativa nestas paredes, sendo que de forma mais qualitativa pode-se afirmar que ao tacto, tanto as paredes como o terreno e as abobadilhas cerâmicas, sentem-se húmidas / molhadas. Esta falta de isolamento exterior é justificação essencial para a presença de humidade na habitação. Destaca-se igualmente o facto destas paredes exteriores serem de betão armado e de espessura superior a 0,20 m potenciando grandemente a ascensão das humidades por efeito de capilaridade, fenómeno esse ilustrado no esquema abaixo, o qual mostra que as paredes enterradas em betão armado sem isolamento absorvem humidade, a qual posteriormente ascende por efeito de capilaridade. Este fenómeno considera-se ser fonte de parte considerável do problema de humidade existente.

Por observação dos fenómenos no rés-do-chão é ainda possível concluir que as humidades se devem a águas superficiais e não a águas freáticas, visto que as evidências de humidade são mais manifestas nas paredes exteriores do que nas interiores. Neste ponto é também importante referir as diferenças encontradas ao nível do rés-do-chão entre as paredes exteriores orientadas a sul e as orientadas a norte. As paredes a sul beneficiam de uma maior exposição solar, mas também e mais relevante, beneficiam do espaço exterior adjacente ser permeável, isto é, o solo não se encontra coberto logo respira e a presença de água diminui por evaporação. Por oposição, as paredes a norte sofrem de múltiplos factores penalizadores, a citar:

- Orientação solar desfavorável encontrando-se sombreada quase em permanência;

- O solo encontra-se pavimentado, logo impermeabilizado, não permitindo assim o fenómeno de evaporação;

- O perfil natural do terreno apresenta declive com orientação norte => sul, isto é, a águas superficiais tendem a escoar vindas de norte contra esta fachada ficando aí estagnadas;

- O lote que confronta a norte, tem zona ajardinada adjacente ao lote.

Como se poderá deduzir, as águas provenientes do terreno permeável do lote a norte, escoam naturalmente devido ao declive do terreno até às fundações da moradia em análise, ficando aí estagnadas sob um piso impermeável que não permite evaporação.

É de salientar igualmente a insuficiência de circulação de ar na caixa de ar, circulação esta que deveria ser potenciada para o bom desempenho desta estrutura enterrada. Sem circulação de ar, a caixa não cumpre o seu objectivo. Esta insuficiência de circulação de ar deve-se essencialmente a três fenómenos:

- Clara insuficiência de aberturas nas paredes para arejamento, tendo sido identificadas apenas duas aberturas com cerca de 15x40 cm, com grelhas obturadoras demasiado restritivas, estando as mesmas mal posicionadas para a potenciação de ventilação natural;

- O desaterro da caixa de ar encontra-se mal executado na área a norte, identificando-se movimentos de terras que originaram volumes de aterro que se aproximam da laje superior, oferecendo assim barreiras à circulação de ar;

- A geometria da caixa de ar, não sendo toda uma área aberta, mas antes tendo uma disposição complexa, não propicia a circulação de ar.

Estes três aspectos deverão ser colmatados por abertura de mais grelhas de arejamento, por desaterro de algumas zonas da caixa de ar e por instalação de ventilação forçada da caixa de ar, ventilação esta que permitirá resolver as dificuldades a uma ventilação puramente natural.

Conjuntamente com todos os pontos acima identificados, os quais por si justificam a presença generalizada de evidências de humidade, considera-se que poderá existir um factor penalizador adicional associado à eventual presença de caixa de ar nas paredes exteriores. Tendo por base a espessura das paredes existentes e as metodologias construtivas frequentes à data da construção […], as paredes exteriores deverão ser compostas por dois panos de alvenaria em tijolo com existência de caixa de ar entre ambos. […]

A verificar-se a existência de uma caixa de ar sem qualquer tipo de preenchimento, teremos uma causa adicional para proliferação da humidade pelas paredes, o que se encontraria de acordo com a presença generalizada de evidências de humidade nas paredes. Nesse caso, juntamente com as intervenções acima mencionadas, a intervenção ao nível do preenchimento das caixas de ar é também essencial para a resolução da existência de humidade. Note-se ainda, que a verificar a existência da caixa de ar, a mesma encontra-se mal construída / executada, visto não terem sido encontrados os devidos arejamentos e drenes obrigatórios ao bom funcionamento desta solução construtiva.

Por fim, no espaço da cave, não se considerando uma patologia da moradia, foi solicitada a verificação ao estado actual da rede de águas existente, a qual terá sido integralmente substituída na referida obra realizada em 2005. Da inspecção efectuada, verificou-se a existência de troços de canalização em aço galvanizado, os quais remontam à construção original, instalados juntamente com novos troços em tubo multicamada. Verificou-se ainda que a rede de águas em multicamada está mal dimensionada, apresentando claramente diâmetros de tubulação insuficientes e não regulamentares.

DESCRIÇÃO DAS ALTERAÇÕES AO PROJECTO LICENCIADO 6239/79

Da consulta aos elementos de projecto que se encontram na posse do actual proprietário verificou-se a existência de alterações ao projecto licenciado, nomeadamente, às telas finais que constam do processo n.9 6239/79, a citar:

- Alteração do vão exterior a poente da suite, de porta para janela de peitoril, caracterizando-se por uma alteração de alçados, sujeito a licenciamento; […]

- Eliminação da varanda que contornava a suite, caracterizando-se por uma alteração de alçados, sujeito a licenciamento […]

- Eliminação do acesso directo da varanda/terraço existente para logradouro a poente da moradia, caracterizando-se por uma alteração de alçados, sujeito a licenciamento […]

- Alteração da geometria dos vãos exteriores da fachada norte, caracterizando-se por uma alteração de alçados, sujeito a licenciamento […]

- Construção de uma instalação sanitária de apoio à piscina no logradouro a nascente da moradia, a qual não consta da planta do rés-do-chão do projecto, logo a respectiva área não se encontra legalizada […]

- Construção de divisão em cave, denominada garrafeira, a qual não consta da planta da cave do projecto, logo a respectiva área não se encontra legalizada; [...]

- Substituição de zonas ajardinadas por pavimentos impermeáveis, existindo assim actualmente apenas cerca de 260m2 de área exterior permeável, quando de acordo com o PDM de Cascais, deveriam existir, atenta a área desta parcela, pelo menos 360m2 de área impermeável […] [a parte rasurada corresponde a evidente erro de escrita não do relatório mas da petição, mantido na sentença recorrida - TRL]

- Instalação de um telheiro em frente à garagem, o qual não é passível de licenciamento;

Caldeira a gasóleo para produção de águas quentes sanitárias, com depósito para 1000L de combustível, em violação da portaria 1532/2008, que estabelece que como medida de segurança contra incêndios, os depósitos para gasóleo em cave de edifícios estão limitados a um máximo de depósito de 500L e ainda com sistema de exaustão partilhado com a chaminé da lareira, o que também é contrário aos normativos legais, que impõe sistema de exaustão separado […]

Rede de águas não conforme, por mal dimensionada e com troços de canalização em aço galvanizado e troços com tubo multicamada, que impõe a sua integral substituição […]

INTERVENÇÃO PROPOSTA

As intervenções abaixo listadas descrevem os procedimentos mínimos a executar para a resolução das patologias acima identificadas, bem como, a correcção das não conformidades legais identificadas, para as quais não é possível proceder à sua legalização, como é o caso da área permeável obrigatória de 40%, do telheiro existente, da Instalação Sanitária de apoio à piscina e a alteração do sistema de produção de águas quentes sanitárias.

[…]

ESTIMATIVA DE CUSTO

No presente capítulo, é apresentada a estimativa de custo para a execução das intervenções propostas no capítulo anterior […] Aos valores referidos acresce IVA à taxa legal […]

TOTAL 118.900 €

[…]”.

13\ Antes dos factos 10 e 11, os autores não tinham conhecimento das situações descritas no escrito reproduzido em 12.

13bis\ Os réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido 12 e decidiram não as revelar aos autores antes da assinatura do contrato-promessa (anterior facto não provado C)

13ter\ Os réus sempres disseram aos autores que as obras da moradia estavam legalizadas, à excepção do que se refere à janela, casa de banho exterior e telheiro. (anterior facto não provado B, com modificações)

14\ Em escrito datado de 01/07/2020 e remetido ao réu, os autores, reportando-se ao escrito parcialmente reproduzido em 12, declararam:

“[...] Para a eliminação dos defeitos enumerados, são indispensáveis as intervenções e trabalhos melhor descritos nas páginas 34 a 36 do relatório anexo, as quais têm por objecto:

a\ As coberturas inclinadas. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 34 do relatório;

b\ As paredes exteriores acima da cota de soleira. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 34 do relatório;

c\ As paredes exteriores abaixo da cota da soleira. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 34 do relatório;

d\ O pavimento do logradouro a norte do edifício, a ser substituído por uma solução permeável. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 34 do relatório;

e\ As paredes e tectos interiores. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 35 do relatório;

f\ A cave, onde deve ser instalada ventilação forçada na cave, quer na caixa de ar, quer nas áreas técnicas. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 35 do relatório;

g\ A caixa de ar, para desaterro parcial e pontual da mesma. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 35 do relatório;

h\ A pintura integral das paredes interiores e exteriores da moradia. A intervenção encontra-se descrita na pág. 35 e 36 do relatório;

i\ A instalação de novas canalizações em multicamada. As várias intervenções encontram-se descritas na pág. 35 do relatório.

Quanto às alterações ao projecto licenciado, verifica-se, entre outros pontos devidamente descritos no relatório anexo, a não legalização da construção de instalação sanitária de apoio à piscina no logradouro a nascente da moradia, a qual não consta da planta do r/c do projecto, construção de uma divisão em cave, denominada de “garrafeira”, a qual não consta da planta da cave do projecto e a presença de área exterior permeável de 260m2 com uma deficiência de 100 m2 de acordo com o PDM de Cascais. Para além das deficiências já referidas, acresce, a instalação de produção de águas quentes sanitárias com recurso a caldeira a gasóleo, que não se encontra de acordo com a Portaria 1532/2008 que regulamenta a Segurança Contra Incêndio em Edifícios (SCIE), não sendo a instalação actual legal nem legalizável. Para eliminação destas desconformidades são indispensáveis várias intervenções e trabalhos, em termos melhor descritos nas páginas 35 e 36 do relatório anexo:

1\ Demolição do alpendre e da instalação sanitária de apoio ao jardim; 2\ Substituição de pavimentos exteriores por pavimentos permeáveis; 3\ Alteração do sistema de produção de águas quentes sanitárias por caldeira a gasóleo (considerando-se que o custo será inferior à substituição por sistema alternativo); 4\ Instrução do devido processo de legalização junto das entidades competentes. No que não for licenciável, proceder-se à sua demolição ou reposição de acordo com as telas finais do processo licenciado 6239/7.”

Nestes termos e em face de tudo quanto vai exposto, supra, vimos, por este meio, estabelecer um prazo adicional, não superior a 15 dias, contados da recepção desta notificação, para que V. Exas realizem a correcção integral dos defeitos que identificámos (e constantes do relatório anexo), bem como supram a falta de licenciamento.

Findo este prazo sem que todas as reparações tenham sido feitas e sem que a falta de licenciamento tenha sido suprida, consideraremos o contrato-promessa definitivamente incumprido por facto imputável a V. Exas e resolvido com esse fundamento, o que nos dá o direito, nos termos do estabelecido contratualmente e na lei, ao pagamento do sinal em dobro […]”.

15\ Em escrito remetido pelos réus aos autores e datado de 07/07/2020, aqueles declararam:

“[…]

A moradia foi prometida vender no exacto estado e nas condições em que se encontra, o que foi integralmente aceite por V. Exas nos termos do disposto no número um da cláusula 2ª do contrato promessa, V. Exas, como bem sabem, prometeram comprar a moradia "no estado em que se encontra", tendo declarado e garantido que (i) visitaram o imóvel, (ii) analisaram a documentação do mesmo e (iii) têm conhecimento integral do seu estado físico, áreas e condições jurídicas actuais, matriciais e registais [...].

O que é invocado na comunicação de V. Exas, como sendo vícios na moradia de que só tiveram conhecimento após a celebração do contrato promessa, não tem qualquer acolhimento. A moradia encontra-se nas exactas condições em que se encontrava à data de celebração do contrato promessa, não se tendo verificado qualquer alteração. Nunca, em momento algum, escondemos ou ocultámos o estado da moradia que V. Exas prometeram comprar.

O que consta do relatório que nos enviaram são, por um lado, factos que foram total e integralmente comunicados a V. Exas (e que até levaram à negociação do preço) e, por outro lado, não correspondem ao negócio que foi ajustado com V. Exas., na medida em que nunca ajustámos vender a moradia no estado em que o autor do relatório invoca como sendo o estado em que deveria ser vendida.

Consequentemente, não temos qualquer responsabilidade ou qualquer obrigação de proceder a quaisquer reparações na moradia antes (ou após) a celebração da escritura pública de compra e venda.

Face ao exposto, a Vossa interpelação admonitória carece de qualquer fundamento e eficácia.

Por outro lado, V. Exas incumpriram o disposto no número um da cláusula 4ª do contrato promessa, i.e., V. Exas deveriam ter agendado a celebração da escritura pública de compra e venda no prazo máximo de 60 dias contados da data de assinatura do contrato promessa (desde 14/05/2020).

Deste modo, V. Exas deveriam ter procedido à marcação da escritura pública, no limite máximo até ao dia 13/07/2020, para o que V. Exas, deveriam ter enviado uma comunicação com a antecedência mínima de 10 dias úteis, ou seja até ao passado dia 29/07.

Como V. Exas. não procederam ao agendamento da escritura pública, nos termos consignados no contrato promessa, servimo-nos da presente para, nos termos do disposto no n.º 4 da referida cláusula 4ª, procedermos à comunicação a V. Exas de marcação da escritura definitiva de compra e venda para o próximo dia 27/07/2020, às 11h30m, no Cartório Notarial do Dr. [...]

Na eventualidade de V. Exas não procederem à outorga da escritura de compra e venda no Cartório Notarial, data e hora acima referidos, V. Exas incorrerão em incumprimento definitivo do contrato promessa, com as legais consequências. [...]”.

16\ Em escrito datado de 10/07/2020 e dirigido aos réus, os autores declararam:

“[…]

Também pelas razões que acabamos de expor, é totalmente ineficaz a notificação para a realização da escritura da compra e venda constante da parte final da V. carta. Neste momento, são V. Exas que se encontram em incumprimento do contrato-promessa e não temos qualquer obrigação de comparecer na escritura se e na medida em que V. Exas não estejam em condições de vender o imóvel em termos conformes com o contrato, pois foi apenas nessas condições que nos obrigámos a comprá-lo.

De resto, terminado o prazo indicado na interpelação admonitória sem que V. Exas procedam às reparações e licenciamentos indicados, considerar-se-á o contrato resolvido, pelo que também por essa via deixará de existir qualquer obrigação nossa de comparecer na escritura

[…]”.

17\ Os réus não realizaram as intervenções descritas no escrito parcialmente reproduzido em 12.

18\ Os autores não compareceram no local e hora indicados no escrito parcialmente reproduzido em 15.

19\ Em escrito datado de 27/07/2020 e dirigido aos autores, os réus declararam:

“[...] Tanto a ausência de V. Exas a esta escritura pública como a comunicação que consta do e-mail que foi enviado no passado dia 23/07 geram um incumprimento total e definitivo do contrato-promessa de compra e venda.

O incumprimento determina a perda do sinal que nos foi entregue.

Para além disso, este incumprimento de V. Exas causa-nos prejuízos que vão bem além do valor do sinal que V. Exas tinham pago, na medida em que, estando o imóvel prometido vender a V. Exas, celebrámos, como informámos V. Exas, um contrato promessa de compra de outro imóvel para habitação própria, cujo preço seria pago com o recebimento do preço que V. Exas nos deveriam ter pago. Este incumprimento de V. Exas poderá vir a impedir-nos de celebrar aquela escritura pública e de virmos a ter uma perda do sinal [...].”

20\ Em virtude do facto referido em 14 e de, na mesma altura, terem vendido a casa que antes habitavam, os autores arrendaram uma habitação.

21\ Em virtude das situações referidas no escrito parcialmente reproduzido em 12 e dos factos referidos 15 e 17, os autores sentem- se enganados pelos réus, ansiosos e tristes.

22\ Mediante aditamento ao ajuste referido em 9, os réus reforçaram o sinal em 80.000€ e obtiveram a prorrogação do prazo para a celebração da respectiva escritura pública aí referida para o dia 03/08/2020.

23\ Mediante um outro aditamento ao ajuste referido em 9, foi acordada a prorrogação da data da celebração da escritura pública aí referida para o dia 08/10/2020, tendo se fixado o valor da aquisição em 920.000€.

24\ Para a concretização do negócio referido em 9, os réus obtiveram um empréstimo no valor de 630.000€, amortizável em prestações mensais.

25\ O imóvel referido em 1 foi vendido.

13. Factos não provados (depois das alterações introduzidas pelo TR):

D- Os Autores despenderam a importância de € 988,92 para a elaboração do escrito parcialmente reproduzido no ponto n.º 12.

E- Os Autores suportaram o custo de € 1.326,39 com a encomenda de equipamentos e elementos para redecoração dos espaços sanitários.

F - Os Autores sentem-se desanimados e deprimidos.

G - Em virtude da aquisição mencionada no ponto n.º 9 ter sido efectuada pelo valor de € 920.000, os reconvintes despenderam € 2.400 a título de IMT e € 320,00 a título de imposto de selo.

H - O imóvel referido no ponto n.º 1 foi vendido por € 1.300.000.

I - Os reconvintes despenderam € 31.980 no pagamento da comissão pela mediação do negócio referido no ponto n.º 25.

J - As prestações mensais referidas no ponto n.º 24 ascendem a € 3.800 e estão a ser suportadas pelos reconvindos.

14. Os anteriores factos não provados A, B, e C, diziam:

A - Na sequência do referido no ponto n.º 10, os Autores confrontaram os Réus, tendo estes lhes dito que as manchas seriam apenas resquícios pontuais da situação ocorrida nesse último Inverno e que o bolor - que existiria nesses pequenos pontos concretos -, se resolvia com uma simples limpeza e o Réu limpou com um pano essa zona, indicando que assim já “ficava resolvida essa questão”.

B - Os Réus sempre disseram aos Autores que moradia referida no ponto n.º 1 estava licenciada.

C - Os Réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido no ponto n.º 12 e decidiram não as revelar aos Autores antes da assinatura do escrito reproduzido no ponto n.º 6.

De Direito

15. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso e devendo limitar-se a conhecer das questões e não das razões ou fundamentos que àquelas subjazam, conforme previsto no direito adjetivo civil - arts. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil.

Assim, importa responder às seguintes questões:

a) Saber se a alteração da matéria de facto violou os poderes do tribunal da relação, indicados no art.º 662.º do CPC:

- se foi violado o regime do valor probatório, dando a um documento particular o valor de relatório pericial – escrito reproduzido em 12 dos factos provados; se o TR deixou de se pronunciar sobre dois relatórios de engenheiros civis, independentes, apresentados pelos RR. (ponto 25 e 26 das alegações da revista; ainda ponto 47 da alegação da revista, melhor explicitado a partir dos pontos 58 e ss);

- saber se o TR usou de presunção judicial quando não estariam reunidos os seus pressupostos – ponto 49 da alegação da revista

b) saber se a decisão de direito está certa.

16. Entrando na análise da primeira questão, relativa à alteração da matéria de facto e aos poderes do Tribunal da Relação.

Os recorrentes discordam do aditamento do facto 11 bis. (que diz)

11bis\ Em escrito datado de 21/06/2020 e dirigido aos réus, que o receberam, os autores, declararam:

“(…) Gostaríamos de não ter necessidade de enviar este e-mail, e queremos reforçar que estamos neste processo com a mesma boa fé e vontade de chegar a um entendimento, mas infelizmente os vários vícios e defeitos do imóvel com os quais fomos sendo surpreendidos e se confirmaram nos últimos dias, não nos deixam alternativa que não seja a de expor o nosso desconforto, tendo em conta que não estavam previstos na negociação. De acordo com apreciação técnica de um Engenheiro, efectuada na visita de 5ª feira, dia 18/06, verifica-se que a casa tem determinadas patologias que não podiam ter sido avaliadas e deslindadas sem um olhar clínico profissional, em simples visitas imobiliárias e que rebatem a versão que nos foi apresentada e as garantias prestadas antes da assinatura do CPVC.

Estas patologias têm de ser corrigidas para que a casa tenha qualidade e condições para ser habitável sem danos futuros para quem lá residir. Gostaríamos de recordar que, mediante o que nos foi transmitido, partimos do pressuposto que estaríamos perante uma casa que sofreu uma remodelação total - completa, como foi dito - e não apenas parcial. Acreditamos que também os vendedores há 15 anos possam ter sido induzidos em erro pela empresa que fez a remodelação, porém essa responsabilidade não nos pode ser imputada, uma vez que as patologias estão presentes e já estavam na altura da negociação, sem que nós tivéssemos conhecimento.

Em seguida, enviamos detalhadamente os pontos, tal como foram identificados pelo Engenheiro, seguidos de algumas considerações.

Começando pelas patologias da cobertura:

- Todas as caleiras da cobertura inclinada têm o isolamento comprometido e terá de ser refeito.

- As telhas têm de ser lavadas e sujeitas à colocação de fungicidas, uma vez que estão cobertas de fungos.

- A cobertura plana tem todo o isolamento comprometido, que terá de retirado e refeito, incluindo as caleiras. E a impermeabilização é também fundamental, sendo este ponto do nosso conhecimento.

Estes factos, à excepção da última alínea, contrariam a informação de que dispúnhamos e nos foi relatada por escrito aquando da negociação.

Patologias do interior:

- A casa apresenta sinais de muita humidade em vários pontos, que têm origem em factores de origem diversa.

- A condição exterior da cobertura plana e inclinada, tal como das caleiras e a falta de isolamento térmico são motivo de surgimento de fungos, bolores, manchas e humidade no interior.

- A caixa de ar das paredes externas está comprometida, sendo uma questão estrutural (má construção) que tem de ser resolvida, caso contrário a casa terá sempre humidades e fungos.

- Todas as humidades interiores têm de ser tratadas, com aplicação de fungicidas, não sendo a limpeza e pintura suficientes, sob pena de ser um risco para a saúde. (por exemplo: vários pontos da sala, escritório, sala multiusos, em pelo menos dois quartos, os dois halls do piso térreo, hall superior, não se tratando apenas de pontos específicos).

Uma vez mais, estamos presentes factos contraditórios, face ao que nos havia sido dito: que a humidade e manchas de bolor estariam apenas presentes em alguns pontos do hall dos quartos, na sala, escritório e zonas adjacentes aos algerozes e que teria sido apenas resultado de uma inundação/entupimento que, por ora, estaria resolvida. O que não se coaduna com a realidade, uma vez que pelas razões acima mencionadas o problema é patológico e não circunstancial e muda completamente a perspectiva. Apesar das paredes não terem sido pintadas, uma parte significativa das manchas de humidade e fungos havia sido limpa ou estava oculta, não permitindo avaliar o grau do problema antes da assinatura do CPCV.

Recordamos que no 19/05, 5 dias após a assinatura do CPCV, como sabem, deparámo-nos com outra questão impossível de detectar até esse momento - por se tratar de um espaço oculto da casa - que nos causou bastante apreensão: por detrás de alguns radiadores existia a presença de bolor, o que representa, como se sabe, uma série de riscos. Manifestámos a nossa preocupação face ao problema, até porque a parte compradora tem no núcleo familiar que iria habitar a casa, quem tenha problemas respiratórios, mas o problema foi desvalorizado pelos proprietários.

A título de exemplo, após medições, em anexo, verificou-se que na parede de um dos quartos que apresentava o bolor, os níveis de humidade rondam os 30% e na parede do hall que vai para os quartos temos um valor de cerca de 40%, o que confirma o problema, até porque estamos a falar de valores muito elevados, principalmente nesta época do ano.

A casa não tem qualquer tipo de isolamento, encontrando-se todas as estruturas permeáveis. O que também não está de acordo com uma informação que nos foi dada e nos levou a ser induzidos em erro.

No decorrer das visitas, a propósito da recolha de algumas medidas para as alterações estéticas, fomos detectando alguns pontos que foram causando preocupação e que procurámos sempre junto dos proprietários perceber e obter respostas, mas todas as respostas nos remetiam para o facto de serem questões sem importância ou que estariam resolvidas. Porém, na passada semana, ao constatarmos a percentagem de humidade nas paredes, suspeitámos que estaríamos perante questões mais delicadas e sérias e que não poderiam continuar a ser desvalorizadas. Nesse mesmo dia, percebemos que haveria a necessidade de requerer a presença de um Engenheiro para avaliar a gravidade do problema e de tudo o resto que poderia escapar ao nosso conhecimento. Pedimos, por isso, uma última visita à casa, para ter a real noção do que se passava e, simultaneamente, percebermos se o projecto, perante tudo o que surgiu, continuava a ser viável. O resultado dessa visita trouxe-nos até ao ponto em que estamos hoje.

Por fim, no que diz respeito às patologias, deparamo-nos com o tema das fundações.

Patologias das Fundações:

- Há evidências claras de que não houve isolamento exterior das fundações periféricas, que se encontram húmidas ou bastante húmidas, assim como a terra que em alguns locais se encontra barrenta. Um problema estrutural, que se reflecte na casa e se não for corrigido compromete a habitabilidade sã da moradia em questão. Segundo o que nos foi transmitido, todas estas patologias são factuais e o que delas surge não é transitório. E, à excepção da cobertura plana, o que aqui relatamos não corresponde de todo à informação que tínhamos em fase de negociação e vai ao arrepio do que nos foi dito, nomeadamente que a única necessidade de “obra” seria para pintura e cobertura plana.

Canalizações:

- Na sequência das visitas técnicas da passada semana constatámos, também, que a tubagem da linha de abastecimento de água da casa - não só desde o contador, mas também da alimentação de um furo - até ao início da linha principal de distribuição da moradia - está em ferro galvanizado, incluindo acessórios.

O que nos havia sido transmitido era que teria sido feita uma renovação total, incluindo canalizações, verifica-se porém que a tubagem não terá sido toda renovada, havendo diversos segmentos que remontam à estrutura inicial da casa, de há 36 anos. Em virtude disso é necessário que toda esta sequência de segmentos seja substituída até ao contador, uma vez que pela idade e constituição da mesma, é certo o perigo que a parede interior do tubo esteja comprometida e bastante danificada, com "contaminação" da água, e passível de roturas num futuro próximo. As caixas de esgotos também apresentam sinais de rupturas/vazamentos.

Estes são, na realidade, um conjunto de factores de extrema relevância a ter em conta nos pressupostos essenciais do negócio e de comunicação entre ambas as partes e que seguramente uma delas – a parte compradora - não poderia ter conhecimento antecipado e que a obriga a confiar na boa-fé dos vendedores, confiando nas garantias e explicações que nos foram prestadas. Perante todas estes pontos e os factos aqui sublinhados são inegáveis os prejuízos que os mesmos aportam, para quem com eles se depara, até porque não são “apenas alguns trabalhos”, porque não estamos a falar de afinar portas ou janelas, pinturas ou mudar rodapés, nem se tratam de questões de natureza estética.

Ainda para mais, os pareceres dados após visita técnica, indicam que algumas das patologias fazem parte do ADN da habitação ou já estão presentes há vários anos. Logo, os problemas com os quais fomos surpreendidos, após a assinatura do CPCV – que assinámos de boa fé - deveriam ter sido comunicados quando da negociação, até porque como já foi referido não se apresentavam passíveis de serem constatados e alguns são, aliás, contraditórios com as informações prestadas, por escrito, na sequências dos pedidos de informação que solicitámos.

Também, na mais recente visita, fomos alertados para o facto do terreno, por conta do pavimento exterior colocado pelos actuais proprietários, não estar a cumprir, provavelmente, com a percentagem de permeabilidade exigida por lei e que poderá ser foco também de problemas – para um lote de 900m2 a área de impermeabilização deverá ser de 270m2. O que nos obriga a uma obra total do exterior, na zona de entrada e lateral Poente, com alterações e obras que também não estavam previstas.

A propósito, da alteração da porta para janela e demolição da varanda na fachada sul, sendo uma alteração da geometria da casa, requer parecer/licenciamento da câmara. Uma vez que nos foi dito que tudo estava em conformidade, agradecemos a documentação referente. Nesta fase, é igualmente pertinente questionar se os actuais proprietários estão na posse do número da licença que indica a legalização do alpendre construído na frente da casa. Uma vez que fomos confrontados com o facto de ter características e dimensões que carecem também de licenciamento. Este alpendre, tal como está e segundo os arquitectos, acresce a área coberta da habitação e conta como anexo. Depreendemos que falta um documento, uma vez que o que temos não menciona a presença do telheiro.

Acreditamos que alguns destes pontos (patologias) possam ser uma surpresa para os actuais proprietários e que, com o real conhecimento dos mesmos, teriam sido contemplados na negociação, mas, por maioria de razão, foi-o ainda maior para nós, porque altera completamente a visão que nos foi dada e tínhamos do imóvel. Chegados aqui, se for do interesse dos proprietários, o Engenheiro poderá voltar, esta semana, à moradia com o intuito de fazer um relatório de inspecção, algo que não poderia ter sido feito anteriormente, uma vez que requer autorização dos proprietários, e onde serão feitas medições e listadas e documentadas todas as patologias e respectiva projecção orçamental.

No link abaixo, enviamos várias fotos, que corroboram o que aqui está escrito. https://we.tl/t-NWtT914w4h

Como sinal da nossa boa fé e por todas as razões subjacentes ao que nesta carta foi detalhado, chegámos a uma fase em que somos forçados a reavaliar o processo como um todo e sobretudo as condições de aquisição estipuladas com base em premissas que não se verificam. Em consequência disso, decidimos conferir aos actuais proprietários o direito e primazia de propor uma solução para todo este processo.

Dado o estágio em que nos encontramos, ficamos a aguardar a resposta com a maior brevidade possível. (…)”

Dizem que este facto nada acrescenta, porque apenas relata uma comunicação enviada pelos AA aos RR – e essa comunicação não é contestada. Já o teor dos factos que constam dessa comunicação não pode ser aceite pelos RR., e não se pode dar como demonstrado que a casa tinha dos problemas identificados no referido doc. Porque essa é a versão dos AA., mas a mesma foi contraditada pelos RR.. Também entende que o tribunal, afirmando que apenas ficava provado que houve esta comunicação, mas que já a prova de que o seu conteúdo era outra questão, acabou por vir a dar por provado o seu conteúdo, integrando-a nos factos provados como se o documento em causa e a prova derivassem de um relatório pericial.

Os AA. contra-alegaram indicando:

“E. O facto dado como provado como facto 11bis, ao contrário do alegado pelos Recorrentes, vem deixar claro que os Recorridos enviaram aos Recorrentes tal missiva, que a mesma foi por estes recebida, e que foi dado conhecimento, pelos Recorridos aos Recorrentes dos factos que compõe o teor da referida comunicação, sendo que o que fica provado com este facto é o envio da referida comunicação e não os factos que da mesma constam.

F. Se, de facto, tal comunicação foi enviada pelos Recorridos e recebida pelos Recorrentes e se, tanto os Recorridos como os Recorrentes, não só não colocaram em causa tal comunicação como, ainda, a juntaram aos presentes autos com os seus articulados, não existe razão para que não se dê como provado o referido facto 11bis.”

A justificação do Tribunal para a alteração da matéria de facto foi a seguinte:

“Não há dúvida que, em escrito datado de 21/06/2020 e dirigido aos réus, que o receberam, os autores lhes deram conhecimento do que viria a constar do relatório sob 12. Os réus aceitaram este facto foram eles que juntaram o documento que o comprova. Tendo o tribunal recorrido dito, por duas vezes, em 9 e 12 da fundamentação de direito da sentença que, com o escrito sob 14, “era a primeira vez que os réus eram confrontados com tais situações”, há naturalmente que saber se esta fundamentação de direito tem ou não suporte nos factos provados. Ora, com a carta de 21/06/2020 os autores pretendem demonstrar que não existe tal suporte. Tanto basta para se concluir pela necessidade de se dar como provado o envio de tal carta, com o seu conteúdo para se poder saber se o que o constava da mesma “confrontava ou não os réus com tais situações”. As objecções dos réus não têm razão de ser (i) o princípio da livre apreciação da prova também se impõe aos tribunais da relação; (ii) o envio de um documento e o seu conteúdo, também são factos que, por isso, em certas situações – como no caso – se pode justificar dar como provados, sem com isso se estar a dizer que as afirmações de facto que constem do conteúdo do documento estejam provados; (iii) sendo um escrito dos autores de que os réus tiveram conhecimento, irrelevante a via de transmissão do mesmo; (iv) a razão para o tribunal recorrido dar como provado o facto resulta do já explicado: contradiz directamente a afirmação que o tribunal recorrido ia fazer mais à frente; (v) o facto de os réus não terem aceitado o seu teor, não impede que o seu teor os confrontasse com as situações; (vi) se estão ou não provadas as afirmações lá feitas é outra questão que não é a agora discutida; (vii) as outras intenções que os autores visarão com a pretensão de dar este facto como provado (segundo os réus: servirem-se dele como interpelação) são irrelevantes por agora e na altura própria, se for necessário, serão apreciadas – o que interessa, agora, é saber se a fundamentação da pretensão, apresentada agora, procede ou não.”

Analisando

Nesta apreciação do tribunal recorrido – com a qual se concorda – o tribunal teve oportunidade de explicar por que motivos não assistia razão aos RR. quando estes se manifestaram contra esta alteração, esclarecendo, ponto por ponto, os argumentos apresentados, tudo fazendo no âmbito da livre apreciação da prova e em respeito dos poderes conferidos pelo art.º 662.º do CPC.

A interpretação apresentada pelos RR. não tem correspondência com o que se afirma no acórdão recorrido, nem se identifica aqui qualquer tratamento do documento como relatório pericial ou com força probatória especial distinta da força probatória do documento particular – fundada na livre apreciação do tribunal.

Mesmo que os RR. tivessem razão, os relatórios periciais não estão sujeitos a um regime de prova tabelada, por e lei indicar que serão valorados pelo juiz de acordo com a sua convicção (art.º 389.º do CC).

Quer isto dizer que não poderia estar aqui em causa uma das situações em que é permitido ao STJ conhecer de uma questão jurídica relativa à impugnação da matéria de facto, de acordo com as normas habilitantes – também citadas pelos recorrentes, bem como jurisprudência deste supremo tribunal – art.º 674.º, n.º3 e 682.º, n.º2 do CPC.

Quer isto dizer que a alteração da matéria de facto introduzida pelo Tribunal da Relação não é desconforme com a lei.

Os argumentos dos recorridos correspondem ao raciocínio do tribunal recorrido, posição que não merece reparo, no contexto da explicação que se fez no início da análise deste ponto.

Questão diversa é a de saber se na aplicação do direito aos factos provados o Tribunal veio a incorrer em erro de julgamento, identificando factos provados que não tenham constado do elenco anteriormente apurado e sobre eles emitindo uma pronúncia. Essa é outra questão, que é independente da anterior.

Parece que os recorrentes vêm na decisão do Tribunal uma situação deste tipo, mas já mais no que se reporta aos factos 10bis, 13 bis e 13 ter.

Vejamos.

A justificação do tribunal para facto não provado A, correspondente ao 10 bis, foi a seguinte:

“Os autores relatam o episódio pelo escrito do doc. 4 uns dias depois deter ocorrido, os réus respondem e não põem em causa o episódio e dão uma explicação para a situação em causa. Isto é um início de prova do episódio ter ocorrido. Uma testemunha vem contar em tribunal o facto e a forma que os réus arranjam para a desvalorizar, sem pôr em causa que a testemunha tenha estado na moradia com a autora e o réu na ocasião do episódio, é dizer que é uma testemunha que só sabe de fengshui. A autora também relata o episódio. O conjunto destes três elementos de prova é suficiente para entender que os autores produziram prova bastante do facto – pelo menos da parte que entendem agora como provado; e os réus não produziram prova para tornar duvidoso o facto. Aliás, repare-se, que este tipo de resposta já tinha sido dado antes (facto 3). Assim sendo o facto deve considerar-se provado (art.º 346 do CC) e deve ser aditado com a redacção proposta pelos autores.”

Ao contrário do que os recorrentes afirmam, não está aqui em causa a violação das regras do ónus da prova. Isso mesmo ressalta das afirmações do tribunal – aos autores competia demonstrar um facto constitutivo do seu direito – que lograram provar. Aos RR incumbia demonstrar que esse facto não devia ter o significado que os AA. pretendiam que tivesse, por terem demonstrado um facto impeditivo ou modificativo do direito dos AA. – que não lograram provar.

Assim, não houve violação do regime do ónus da prova, mas aplicação do mesmo – o facto é julgado com aplicação da lei em sentido desfavorável a quem tinha o ónus de o demonstrar e não o conseguiu.

No demais, veja-se o que vem referido quanto aos factos 13 bis e 13 ter, se seguida.

17. Os recorrentes também discordam do aditamento do facto 13 bis e 13 ter

Entendem que se traduzem em uso de presunção judicial não permitida por lei, ou que se apresenta de manifesta ilogicidade.

18. Quanto ao anterior ponto não provado C, que passou a facto 13 bis:

13bis\ Os réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido 12 e decidiram não as revelar aos autores antes da assinatura do contrato-promessa.

Dizem os recorrentes que foi retirada uma presunção judicial a partir de certos factos e que isso não seria permitido. O tribunal teria deduzido que os RR. tinham conhecimento e ocultaram os problemas da casa pelo facto de os recorrentes não terem contestado o episódio, ainda que várias testemunhas tivesse dito o contrário – (ponto 105 e 106 das alegações da revista).

Na sua alegação parecem pretender que o tribunal recorrido tivesse procedido a uma análise de toda a prova produzida, mesmo a que não convocaram em sede de contra-alegações da apelação, quando aí tiveram oportunidade de exercer o contraditório ao pedido de alteração efectuado pelos AA.

A justificação do tribunal para facto C foi a seguinte:

“O que está aqui em causa é saber se “os réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido 12 e decidiram não as revelar aos autores antes da assinatura do contrato-promessa. “os réus, em resposta a esse escrito dizem no escrito sob 15: “O que consta do relatório que nos enviaram são, por um lado, factos que foram total e integralmente comunicados a V. Exas (e que até levaram à negociação do preço) e, por outro lado, não correspondem ao negócio que foi ajustado com V. Exas, na medida em que nunca ajustámos vender a moradia no estado em que o autor do relatório invoca como sendo o estado em que deveria ser vendida. “Portanto é inequívoco que os réus aceitam que tinham conhecimento dê tudo o que consta do relatório e até dizem que comunicaram tudo isso aos autores (o que equivale a uma confissão acompanhada da alegação de factos favoráveis ao confitente: art.º 360 do CC). Ora, os autores provaram sob facto 13 – e isso não está impugnado – que não tinham conhecimento do que consta do relatório (afastaram os factos favoráveis ao confitente, pelo que fica só a confissão). Logo, ao contrário do que os réus dizem eles não comunicaram aos autores todas as situações descritas no relatório. E não o comunicaram, logicamente e de acordo com as regras da experiência comum das coisas, de acordo com uma decisão tomada por eles de forma consciente: os promitentes vendedores de coisas com defeitos (materiais ou jurídicos), que tem conhecimento desses defeitos e que não os comunicam aos promitentes compradores fazem-no deliberadamente de modo a que o preço do bem não seja diminuído. As razões invocadas em sentido contrário pela sentença (de 18 a 20) e pelos réus não convencem minimamente: o modo de proceder dos réus, de disponibilizarem a moradia para que os autores a vissem enquadra-se antes num comportamento deliberado, de modo a que mais tarde os autores não pudessem – ou não o pudessem fazer com êxito - reagir como era espectável que reagissem. De resto, a maior parte dos defeitos materiais que estão em causa não seriam facilmente detectáveis por potenciais compradores. E os defeitos ligados à falta de licenciamento de alterações, não são visíveis e não foram revelados. Ora, quanto àqueles, se é inevitável que quem vive numa moradia há mais de 15 anos tenha de saber que os problemas de humidade e, inerentemente, de bolores, não resultam de uma inundação recente ou de qualquer outra situação esporádica e temporária, o mesmo não é verdade para um potencial comprador em visita a essa moradia, que deles se possa aperceber – se isso acontecer, o que não é provável (é natural para um habitante de uma casa, no seu dia a dia, acontecer ter de afastar um móvel de uma parede e para o efeito ter de encostar a mão à parede e nessa altura aperceber-se da humidade da mesma, ao mesmo tempo que vê, na parede por trás do móvel, bolores, mas já não é provável que isso aconteça a uma visitante não familiar ou próximo -, para mais acompanhado da contraparte que vai desvalorizando os indícios em sentido contrário e que, ainda por cima, teve o cuidado de ir limpando esses sinais (do que a própria sentença dá nota, por exemplo, em 2 da motivação da decisão de facto). Assim, os futuros vendedores arriscam: se o potencial comprador não se apercebe dos problemas, mais tarde não os poderá reclamar (tanto mais que os futuros compradores até tiveram o cuidado de pôr no contrato as declarações de ciência que são costume serem colocadas nos contratos de adesão a dizer que os aderentes têm conhecimento de tudo e mais alguma coisa, e que agora os réus têm o cuidado de invocar, mas que a própria sentença teve o cuidado de desvalorizar em 8 da fundamentação de Direito). Se se apercebe, os futuros vendedores podem desvalorizar o problema e o resultado é o mesmo. Por fim, senão os convencerem, não há mal nenhum, trata-se apenas de um contrato que se acaba por não celebrar. Os depoimentos invocados pelos réus não servem pois para o efeito pretendido pelos réus; serviriam se desses depoimentos resultasse que, durante as visitas, os réus tivessem explicado aos autores que as humidades das paredes resultavam dos problemas estruturais descritos no relatório sob 12 (veja-se, mais à frente, a passagem citada da obra de Calvão da Silva). Portanto, o facto sob C\ também está provado e é aditado aos factos provados.

Os réus na parte final da resposta à impugnação da decisão do facto C têm uma parte a discutir o Direito. Ou seja, dizem que os autores alegam que “[a] a decisão recorrida reconhece plenamente os factos em que se consubstanciam os defeitos invocados pelos autores e melhor descritos no relatório sob 12.” E dizem que não é como os autores dizem. Ora, por um lado, está certo o que os autores dizem, ao contrário do entendimento dos réus: a sentença nos factos sob 12 está a reconhecer que os defeitos alegados pelos autores ficaram provados. A sentença tem uma forma de o fazer que não é usual, mas do seu teor decorre inequivocamente isso. Veja-se, nesse sentido o que se diz de forma expressa, sem margem para dúvidas, em 7 e 9, onde, para além disso, é revelado que os factos foram dados como provados também com base no relatório junto pelos próprios réus com a contestação. Na parte final de 8 diz-se expressamente: “o que permitiu concluir pela verosimilhança das constatações ali [no relatório sob 12] vertidas.” E em 7: O facto sob 12 (cujo conteúdo se reporta ao que se alega em 25a 36 e 53 a 60 da PI) foi tido como demonstrado com base naval oração do “Relatório […]”. Não se tratou pois de reproduzir um documento, mas de dar como provado um facto, com base numa valoração de uma prova [documento/relatório].E, por outro, sendo certo, ou seja, correspondendo, pois, os factos sob12 a defeitos dados como provados pela sentença recorrida, os réus, querendo afastá-los tinham que impugná-los – ao abrigo do art.º636/2 do CPC, cumprindo ao mesmo tempo os ónus que o art.º 640/1-2 lhes impõe, por força do seu n.º 3, sujeitando a questão a discussão dos autores (art.º 638/8 do CPC) e a decisão deste TRL. Não o tendo feito, é irrelevante tudo o que os réus dizem nessa parte, sendo irrelevante também todas as passagens de depoimentos que invocam nessa parte. Note-se que isto também é válido para o que os réus dizem no penúltimo § dessa parte das contra-alegações, em que os réus, sem observância de quaisquer regras ou ónus, põem em causa o dado como provado nos factos sob 13 e 21. Toda essa parte da contra-alegação, a pretexto da discussão do facto C, é, pois, irrelevante.

Apreciando

O tribunal considerou que os RR. sabiam dos problemas alegados pelos AA e que os RR não informou os AA. dos mesmos para evitar uma descida do preço – sendo que esta segunda conclusão foi tida por demonstrada por presunção judicial.

O que acontece é que os RR. não concordam com a solução do tribunal – dizem que nunca afirmaram ter conhecimento da existência dos problemas e que a sua carta identificada no ponto 15 não traduz nenhuma confissão, nem nenhuma aceitação do dever de repararem quaisquer defeitos.

De notar que só existiu um recurso de apelação – o dos AA. – ainda que os RR. tivessem tido obtido ganho de causa na reconvenção e visto a pretensão dos AA. ser julgada improcedente, isso não impediria que pudesse recorrer subordinadamente se achassem que a decisão da 1ª instância não havia sido bem tomada, por questões de cautela.

Os argumentos dos RR. agora apresentados visam questionar o que podia ter sido questionada na apelação, mas já não na revista.

A argumentação apresentada é desprovida de sentido, em face dos argumentos usados pelo tribunal para dar o facto como provado – provou-se que ocorrerem certas comunicações entre as partes e tão só isto (num primeiro momento)

E estando provado que essas comunicações ocorreram, delas o tribunal deduziu que os RR. tinham conhecimento das situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido em 12.

Se tinham conhecimento, de acordo com as regras da experiência, o tribunal retirou a ilação normal – não foram comunicadas antes da assinatura do contrato promessa por decisão dos RR.

Esta conclusão é lógica: é que as situações elencadas no indicado escrito eram relativas a problemas do imóvel objecto da promessa de venda, que a serem revelados, podiam comprometer o negócio – quer na sua realização, quer quanto ao seu valor.

Não há aqui qualquer ilogicidade manifesta.

Não há assim motivos para este STJ proceder a qualquer censura ao tribunal recorrido.

Isto se conjuga com o facto 10 bis, e seu aditamento, bem realizado.

19. Quanto ao anterior ponto não provado B, que passou a facto13 ter:

13ter\ Os réus sempres disseram aos autores que as obras da moradia estavam legalizadas, à excepção do que se refere à janela, casa de banho exterior e telheiro.

Alegam os Recorrentes /RR a violação do regime do ónus da prova, que o tribunal da Relação atribuiu ao escrito reproduzido em 12 um valor que o mesmo não tinha, e que as ilações retiradas dos depoimentos de duas testemunhas – e que fundaram uma presunção judicial, são ilógicas, e absolutamente incompreensíveis – o que justificam transcrevendo o teor dos depoimentos e o que o tribunal concluiu.

A justificação do tribunal para facto B foi a seguinte:

“Relembre-se: a declaração de facto que o tribunal dá como não provada, com base no facto de não haver prova sobre ela, foi a seguinte: B\ Os réus sempre disseram aos autores que a moradia estava licenciada. [O que os autores diziam em 115 da PI era mais precisamente o seguinte: Os réus sempre garantiram aos autores que todo o imóvel estava devidamente licenciado.]Os réus, em defesa da decisão recorrida, dizem, entre o mais: “Ao contrário do que os autores pretendem fazer crer, resulta inequívoco do depoimento da testemunha SR, mediadora dos autores, que os réus alertaram os autores para a existência no imóvel de construções posteriores à edificação e aquisição do imóvel (na medida em que eram os segundos proprietários do mesmo) que careciam de licenciamento.” Logo, os réus estão a admitir que sabiam que havia obras na moradia que tinham que ser legalizadas. Faltaria, pois, apenas saber se tinham informado disso aos autores. Utilizou-se a forma verbal ‘faltaria’ porque as contra-alegações de recurso não são um meio de prova, pelo que, apesar das contra-alegações, tem que se apurar se há ou não prova daquele saber; mas o facto de os réus o dizerem expressamente aponta nesse sentido. Ora, os réus tinham feito obras na moradia com o arquitecto que foi ouvido como testemunha e este diz que sabia que era necessário fazer a legalização de várias obras e tenta justificar a conduta dos réus ao não promoverem a legalização, o que tem o sentido de que ele sabe que os réus sabiam que era necessário legalizar, pois que só assim se justifica a tentativa de justificação. Essas obras que era necessário legalizar constam da extensa lista do facto 12, compreendendo algumas alterações que teriam de ser licenciadas (se possível ou desfeitas) - alteração do vão exterior a poente da suite, de porta para janela de peitoril, eliminação da varanda que contornava a suite, eliminação do acesso directo da varanda/terraço existente para logradouro a poente da moradia, alteração da geometria dos vãos exteriores da fachada norte e construção de divisão em cave, denominada garrafeira, a qual não consta da planta da cave do projecto - e outras que teriam de ser desfeitas para a situação passar a ficar conforme às normas legais -sendo estas últimas a substituição de pelo menos 100m2 de pavimentos impermeáveis por zonas ajardinadas, a destruição de um telheiro em frente à garagem, a substituição de uma caldeira a gasóleo de 1000L por uma de 500L, a separação do sistema de exaustão da caldeira em relação ao da chaminé da lareira e a substituição da rede de águas, mal dimensionada e com troços de canalização em aço galvanizado e troços com tubo multicamada, diga-se que: Na comunicação que consta do facto 4 os réus nada dizem sobre tais situações apesar de fazerem afirmações sobre questões conexas que são próprias para dar a impressão de que não há nada a legalizar. Depois, apesar de confrontados expressamente sobre tais situações (com o envio do doc. 4, agora transcrito, e com o envio do relatório sob 12), os réus nada dizem sobre elas e, apesar de serem chamados à atenção para isso com o § transcrito pelos autores da comunicação sob 16, continuam sem dizer seja o que for sobre elas. Das partes assinaladas pelos autores do depoimento da testemunha SR e das declarações da autora resulta que os autores souberam que havia algumas alterações na casa (janela, varandas e vãos), mas que os réus não lhes disseram que era necessário legalizar alguma coisa (à excepção da janela, casa de banho exterior e do telheiro).Portanto, se os réus tinham feito obras na moradia, se sabiam que essas obras tinham de ser legalizadas e se apenas informaram os autores de que algumas delas não estavam a coberto de licenciamento, é porque estão a dizer que o resto está licenciado; logo, foi produzida prova bastante sobre parte do facto B, isto é, que os réus sempres disseram aos autores que as obras da moradia estavam legalizadas, à excepção do que se refere à janela, casa de banho exterior e telheiro. Os réus objectam no sentido de tentarem demonstrar que deram conhecimento aos autores das obras feitas – que não é o que está em causa – e que elas careciam de licenciamento. Quanto a isto invocam o depoimento da testemunha SR mas não indicam nenhuma passagem desse depoimento nesse sentido, o que tinham de fazer por força do art.º 640/2-b do CPC, pelo que é irrelevante. Sugerem também que tal resultaria ainda dos depoimentos das testemunhas EE e II mas das passagens citadas desses depoimentos não decorre que os réus tenham indicado aos autores que as obras careciam de licenciamento. Assim, não tornaram duvidosa aquela parte do facto B que deve ser acrescentada aos factos provados.”

Apreciando

Os recorrentes não têm razão.

O tribunal teve oportunidade de explicar o porquê no acórdão recorrido – contradisseram os argumentos do apelante, com invocação de depoimentos – um deles não indicaram em que parte se apoiavam; os outros foram ouvidos e o tribunal considerou que era outra a conclusão a retirar.

Não estando em causa nenhuma das situações em que o STJ pode conhecer da questão de facto, nada mais há a acrescentar.

20. Entrando agora na análise da segunda questão objecto do recurso - solução de direito – em que os recorrentes consideram que houve ilegalidade nas seguintes posições do tribunal:

- O contrato promessa em questão incluía a garantia da qualidade do imóvel, como se de uma casa nova se tratasse – acham que é diferente o contrato incluir uma garantia de qualidade (que não tinha) e poder ser vendido um bem com defeitos que não comprometem a sua utilização para o fim pretendido, porque se trata de uma casa já com 40 anos;

- o contrato promessa devia considerar-se como tendo sido celebrados entre consumidores – para as duas partes;

21. No processo foi suscitada a questão de saber se vigora o princípio da equiparação entre o contrato promessa e o contrato prometido, nomeadamente para efeitos de extensão do regime da venda de coisas defeituosas à promessa de venda.

Sobre a questão o Tribunal decidiu no sentido da equiparação, sentido que tem acolhimento da doutrina e jurisprudência, como se comprova através da leitura dos seguintes extractos do texto de Nuno Manuel Pinto Oliveira,” CONTRATO-PROMESSA, CONFORMIDADE E FALTA DE CONFORMIDADE”, in ANUÁRIO DO NOVA CONSUMER LAB YEARBOOK OF THE NOVA CONSUMER LAB, Ano 3 – 2021, p. 59-84, que passamos a citar:

(p. 59 e ss) - “O art. 410.º, n.º 1, do Código Civil consagra o princípio da equiparação entre o contrato-promessa e o contrato prometido: ao contrato-promessa são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato prometido1 – logo, em princípio, ao contrato-promessa de compra e venda são aplicáveis as disposições legais relativas ao contrato de compra e venda. Entre os tópicos controvertidos está a extensão do regime da venda de coisas defeituosas à promessa de venda. Em favor da aplicação dos arts. 913.º ss. do Código Civil à promessa de venda, pronunciaram-se, p. ex., Antunes Varela, Calvão da Silva e Pedro Romano Martinez. Antunes Varela diz que “[s]ão aplicáveis à promessa de venda, com as necessárias adaptações, as regras que na compra e venda se referem à determinação e à redução do preço, à venda de bens alheios, de coisas defeituosas, de bens onerados, etc.”2. Calvão da Silva, que “não se vê por que razão séria as normas do contrato de venda sobre coisas defeituosas (arts. 913.º ss.) não devam considerar-se extensivas ao contrato-promessa, em conformidade com o princípio da equiparação de regime consagrado pelo art. 410.º”3. Pedro Romano Martinez, que não se vê por que razão séria não devam considerar-se preenchidos os pressupostos das acções edilícias: “o cumprimento imperfeito já se realizou e o promitente-adquirente terá de reagir nos termos prescritos para a compra e venda”4. Em desfavor da aplicação dos arts. 913.º ss. do Código Civil à promessa de venda, pronunciam-se, p. ex., Menezes Cordeiro e Menezes Leitão: “… o regime das perturbações da prestação no contrato de compra e venda não se estende ao contrato-promessa”5 – e, em consequência, não se estenderiam ao contrato-promessa as disposições dos arts. 913.º a 922.º6. O princípio da prioridade do cumprimento depõe no sentido da extensão do regime da venda à promessa de venda: o contrato-promessa de compra e venda só será cumprido ou, em todo o caso, só será cumprido pontualmente desde que o promitente-vendedor transmita ao promitente-comprador a propriedade de uma coisa conforme com o contrato, ou seja, de uma coisa sem os defeitos designados no art. 913.º do Código Civil7-8.”

p. 79 e ss - “8. O direito de resolução decorrente da coordenação do art. 914.º com os arts. 801.º, n.º 2, 802.º e 808.º do Código Civil deve aplicar-se ao contrato-promessa de compra e venda.

O promitente-comprador terá o ónus de fixar um prazo adicional ou suplementar, de duração razoável, para que o promitente-vendedor repare ou substitua a coisa defeituosa – e, desde que o promitente-vendedor não repare ou não substitua a coisa defeituosa dentro do prazo adicional ou suplementar fixado de acordo com o art. 808.º, n.º 1, do Código Civil, o comprador poderá resolver o contrato de compra e venda.

Exceptua-se os casos em que o cumprimento se tenha tornado impossí­vel52, ou em que o cumprimento se tenha tornado inútil53, em que o devedor declare que não cumprirá54 ou em que, ainda que o devedor nada declare, deva considerar-se que a continuação (subsistência) da relação contratual não é exigível ao credor55-56.

22. No presente processo – e na revista – também se questiona se ao contrato dos autos se deve aplicar o regime civilista ou o regime da protecção do consumidor.

Na situação dos autos, quer os promitentes vendedores, quer os promitentes compradores actuaram na sua veste de particulares, realizando um negócio onde não se identifica um profissional.

O tribunal aplicou o regime civilista – e bem.

A sujeição ao regime da protecção do consumidor pressuporia a intervenção de um profissional que se relacionaria com um particular-consumidor.

23. No presente processo também se discutia o direito à resolução do contrato, por parte do promitente-comprador.

Ainda que a questão não esteja abarcada no objecto do recurso, para enquadramento do referido objecto, pode dizer-se que, também por força do princípio da equiparação, o direito à resolução não estaria excluído.

No mesmo sentido, e também fazendo a comparação entre o regime civilista e o resultante da protecção do consumidor, acompanhamos Nuno Pinto Oliveira, na obra já citada, onde diz:

p. 76 e ss - “Os arts. 913.º ss. do Código Civil não atribuem ao comprador o direito de resolução; ainda que os arts. 913.º ss. não atribuam ao comprador um direito de resolução, a doutrina e a jurisprudência chegaram a algum consenso quanto a duas coisas.

O comprador poderá fixar um prazo adicional ou suplementar, de duração razoável, para que o vendedor cumpra a obrigação prevista no art. 914.º do Código Civil, para que o vendedor repare ou para que o vendedor substitua a coisa defeituosa – e, desde que o vendedor não cumpra a obrigação prevista no art. 914.º, não repare ou não substitua a coisa defeituosa dentro do prazo adicional ou suplementar fixado de acordo com o art. 808.º do Código Civil, o comprador poderá resolver o contrato de compra e venda44.

Em contraste com os arts. 913.º ss. do Código Civil, o art. 4.º do Decreto--Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, e o art. 24.º do Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro, conferem ao comprador o direito de resolução. O art. 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003 fazia-o sem mais; i.e., fazia-o sem distinguir os requisitos da resolução dos contratos de compra e venda de bens móveis e de bens imóveis; os arts. 15.º, n.º 4, e 24.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 84/2021, esses, fazem-no, distinguindo os requisitos da resolução do contrato.

O art. 15.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 84/2021 aplica-se à venda de bens móveis e determina que o comprador-consumidor tem de dar uma segunda oportunidade ao vendedor-profissional. Em regra, o comprador-consumidor não pode resolver o contrato antes de dar ao vendedor-profissional uma oportunidade de reparar ou de substituir o bem não conforme45. O art. 24.º, n.º 1, aplica-se à venda de bens imóveis, e determina que o comprador­-consumidor não tem de dar uma segunda oportunidade ao vendedor profissional. Em regra, o comprador-consumidor pode resolver o contrato, sem mais46.

Em relação à venda de bens móveis, alterou-se o regime do Decreto-Lei n.º 67/2003. Eliminou-se a regra de que o comprador-consumidor pode escolher entre os direitos orientados para o cumprimento (reparação e substituição) e os direitos orientados para a extinção, total ou parcial, do contrato (resolução e redução do preço). Em relação à venda de bens imóveis, não se alterou o regime do Decreto-Lei n.º 67/2003 – não se eliminou a regra de que o comprador pode escolher entre os direitos orientados para o cumprimento e os direitos orientados para a extinção, total ou parcial, do contrato.

O resultado da separação, da “incompreensível separação”47, entre os regimes da venda de bens móveis e imóveis seria absurdo – sistemática e teleologicamente insustentável. Os requisitos da resolução do contrato de compra e venda de bens móveis seriam mais rigorosos que os requisitos da resolução do contrato de compra e venda de bens móveis48. Estando em causa um resultado absurdo, um resultado sistemática e teleologicamente insustentável, estamos convencidos de que deverá corrigir-se – e de que deverá corrigir-se através da aplicação dos requisitos do art. 15.º, n.º 4, à resolução do contrato de compra e venda de bens imóveis, como concretização da cláusula geral do abuso do direito. O comprador-consumidor que actua ou exerça o direito de resolução sem dar ao vendedor-profissional uma oportunidade para reparar ou para substituir os bens não conformes, ainda que a falta de conformidade não seja tão grave que explique ou justifique a resolução imediata do contrato49, está a actuá-lo ou a exercê-lo abusivamente – o exercício do direito de resolução constituirá abuso de direito, “nos termos gerais”50-51.”

Em termos em tudo semelhantes, o art. 24.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 84/2021 desde que interpretado correctivamente, de uma forma sistemática e teleologicamente sustentável, deverá aplicar-se ao contrato-promessa de compra e venda.

Entre o direito civil e o direito do consumo haverá, tão-só, uma diferença sensível: em direito civil, o promitente-comprador terá o ónus de fixar um prazo adicional ou suplementar, de duração razoável, para que o promitente-vendedor repare ou substitua a coisa defeituosa; em direito do consumo, o promitente-comprador não terá sequer o ónus de fixar um prazo adicional ou suplementar. O art. 15.º, n.º 4, alínea a), sub-alínea ii), do Decreto-Lei n.º 84/2021 dispõe que o comprador-consumidor pode resolver o contrato caso o profissional não tenha efectuado a reparação ou a substituição do bem nos termos do art. 18.º e o art. 18.º, n.º 2, alínea b), diz que a reparação ou substituição deve ser efectuada “num período razoável a contar do momento em que o vendedor[-profissional] tenha sido informado pelo [comprador-]consumidor da falta de conformidade”. O prazo começa a correr com a comunicação da falta de conformidade – e, desde que o vendedor (ou o promitente-vendedor) não repare ou não substitua os bens dentro de um prazo razoável, o comprador (ou o promitente-comprador) pode resolver o contrato.

Excluída a diferença, e diferença sensível, em tema de ónus de fixação de um prazo adicional ou suplementar para a reparação ou substituição, as regras do art. 15.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 84/2021 são só uma concretização dos princípios e das regras gerais.

Em tema de resolução do contrato por impossibilidade de cumprimento, o art. 15.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 84/2021 distingue consoante o vendedor tenha ou não declarado que a reparação e a substituição do bem não conforme se tornaram impossíveis.

Quando o vendedor-profissional tenha declarado que os dois meios de reposição da conformidade do bem com o contrato são impossíveis aplica-se a sub-alínea iii) da alínea a): O comprador-consumidor pode escolher entre a redução proporcional do preço, nos termos do artigo 19.º, e a resolução do contrato, nos termos do artigo 20.º, caso o profissional tenha recusado repor a conformidade dos bens nos termos do número anterior. Ora o art. 15.º, n.º 3, diz que o vendedor-profissional pode recusar repor a conformidade dos bens se a reparação ou a substituição forem impossíveis. Quando o vendedor-profissional não tenha declarado que os dois meios de reposição da conformidade dos bens com o contrato são impossíveis, aplica-se a sub-alínea iv) da alínea a): O comprador-consumidor pode escolher entre a redução proporcional do preço, nos termos do artigo 19.º, e a resolução do contrato, nos termos do artigo 20.º, caso resulte evidente das circunstâncias que [o profissional] não vai repor os bens em conformidade num prazo razoável ou sem grave inconveniente para o consumidor.

A resolução do contrato por inutilidade do cumprimento, ainda que não esteja expressamente prevista, deve coordenar à alínea d): O consumidor pode escolher entre a redução proporcional do preço, nos termos do artigo 19.º, e a resolução do contrato, nos termos do artigo 20.º, caso a gravidade da falta de conformidade justifique a imediata redução do preço ou a resolução do contrato de compra e venda. A resolução do contrato por recusa de cumprimento, essa, está expressamente prevista; deve coordenar-se à sub-alínea iv) da alínea a): O comprador-consumidor pode escolher entre a redução proporcional do preço, nos termos do artigo 19.º, e a resolução do contrato, nos termos do artigo 20.º, caso o profissional tenha declarado que não vai repor os bens em conformidade num prazo razoável ou sem grave inconveniente para o consumidor57.

Finalmente, em tema de resolução do contrato por inexigibi­lidade da continuação da relação contratual, as alíneas a), b) e c) desenvolvem a cláusula geral da alínea d) – falta de conformidade tão grave que justifique a imediata redução do preço ou a resolução do contrato de compra e venda – e, ao desenvolverem a cláusula geral da alínea d), dis­tinguem os casos de não cumprimento antecipado ou de não cumprimento sintomático.

O não cumprimento antecipado está previsto na sub-alínea iv) da alínea a): O consumidor pode resolver o contrato, desde que resulte evidente das circunstâncias que o profissional não vai repor os bens em conformidade num prazo razoável ou sem grave inconveniente para o consumidor. O não cumprimento sintomático está previsto nas alíneas b) e c): O consumidor pode resolver o contrato desde que a falta de conformidade tenha reaparecido apesar de uma tentativa do profissional de repor os bens em conformidade ou desde que (depois de uma tentativa) surja uma nova falta de conformidade58-59.

Entre as razões por que o art. 24.º, n.ºs 1 e 2, do Decreto-Lei n.º 84/2021, desde que interpretado correctivamente, de uma forma sistemática e teleologicamente sustentável, deve aplicar-se, com as adaptações necessárias, ao contrato-promessa de compra e venda, está a circunstância de as regras aplicadas ao direito do consumo serem, em tudo ou em quase tudo, uma concretização dos princípios e das regras gerais de direito civil.”

24. Na presente revista – apenas interposta pelos RR., relativamente à improcedência do seu pedido reconvencional de retenção do sinal – não se podendo entrar no conhecimento da questão já decidida da procedência ou improcedência do pedido dos AA, cumpre verificar se os RR. têm razão nos seus argumentos no sentido de afirmar que os AA. deixaram de cumprir as suas obrigações assumidas no contrato-promessa, facultando à parte cumpridora o direito à resolução do contrato e à retenção do sinal.

A questão deve ser analisada pelo STJ, enquanto tribunal que aplica o direito aos factos apurados pelas instâncias, e com respeito pelas decisões tomadas no processo já transitadas em julgado.

Assim:

Vem decidido que os AA. não podiam resolver o contrato-promessa, nos termos em que o fizeram, pedindo aos RR. o valor do sinal passado em dobro.

Os factos provados – mas com os quais os RR. não se conformam – confirmam que o bem objecto da promessa de venda, ainda que fosse em segunda mão, com mais de 40 anos, apresentada defeitos/vícios que os promitentes compradores desconheciam, no momento em que se vincularam através da promessa de compra.

Os factos provados também são claros no sentido de que esses vícios/defeitos, dada a sua dimensão e significado, não seriam aceitáveis para os AA. se tivessem sabido da sua existência na data em que se vincularam.

Os vícios/defeitos em causa incidiam sobre a qualidade da coisa – por via das humidades e infiltrações – e por via da não observância dos regimes legais de carácter administrativo na realização de alterações ao projecto inicial do imóvel.

Não estava em causa a falta de licença de utilização para habitação, que existia, mas a inobservância das regras de autorização para realização de certas obras – as ditas licenças camarárias – que poderiam conduzir a problemas legais futuros dos compradores na relação com a edilidade (com risco de serem obrigados a demolições, entre outras consequências).

Os RR, por seu turno, entendem que os AA. se vincularam a adquirir o imóvel no estado em que estava – e, na sua perspectiva, isso significaria que nenhuma vicio da coisa seria relevante; os AA. teriam declarado saber o estado em que o bem se encontrava e seria sua vontade adquiri-lo ainda assim.

A instrução da causa não permitiu ao tribunal acompanhar o raciocínio dos RR.

Mesmo que os AA. tivessem efectuado as indicadas declarações, nelas não se poderia compreender a aceitação de todo e qualquer defeito/vício do objecto, se não havia a possibilidade de o conhecer ou ter razões para admitir que o vicio existia e era irrelevante na decisão dos AA. de contratarem.

Os AA. provaram qual era a situação do bem, objecto da promessa, que conheciam e que aceitaram, na data da vinculação.

Os AA. provaram que, depois da sua vinculação, vieram a ter conhecimento de outros vícios/defeitos da coisa, que não se coadunava com o preço acordado e com o fim que pretendiam dar à coisa, e que os RR. sabiam.

Quanto ao fim, tratava-se de imóvel onde pretendiam residir. Os RR. estavam disso cientes.

Os RR. dizem que esse fim não estava comprometido, até porque eles próprios residiam no imóvel à data. Seria possível habitar ali.

Não se acompanha integralmente a posição dos RR.

Ainda que fosse possível habitar no imóvel – e é um facto que os RR. lá habitavam – isso não significa que o fim “habitação” não pudesse estar comprometido. O fim habitação não é só o de existirem paredes, tectos e certas infra-estruturas. É também algo que as partes podem conformar no contrato, por via da sua vontade manifestada com a contratualização. E esse fim – habitação – comporta graduações. Habitar com qualidade ou habitar sem qualidade, nomeadamente ao nível das implicações para a saúde decorrentes de certas características da habitação. Para se saber se os AA. queriam apenas um tecto ou uma casa de habitação de certa qualidade, as relações pré-contratuais podem ser um indicador fundamental. Mas também existem elementos objectivos - como seja o preço.

No caso dos autos, resulta dos factos provados:

Quanto ao valor

2\ Em 25/04/2020, os autores, após saberem que a moradia estava à venda pelo valor de 1.490.000€, efectuaram uma visita à mesma para verificarem as suas características e localização.

6\

1\ O preço convencionado para a prometida venda é de 1.440.000€ […] e será pago nos seguintes termos:

a\ A título de sinal e princípio de pagamento por conta do preço acordado. Os promitentes compradores entregam com a assinatura do presente contrato aos promitentes vendedores a importância total de 144.000€ […]

b\ O remanescente do preço, ou seja, 1.296.000€ será pago no acto da outorga do contrato prometido, através de cheque bancário.

[…]

Quanto ao conhecimento de problemas/vícios/defeitos da coisa na data da contratação

3\ Em 27/04/2020, a autora efectuou uma visita à moradia, tendo questionado os réus acerca da origem de sinais de humidade que se verificavam em algumas zonas da casa, ao que estes responderam que aqueles resultavam de uma situação que ocorrera no Inverno e que já havia sido resolvida, mediante intervenção que haviam efectuado na cobertura plana da moradia.

4\ Em escrito datado de 28/04/2020 e dirigido aos autores, os réus declararam:

“[…] Este Inverno notámos o aparecimento de alguma humidade em pontos específicos que nos levaram a inspeccionar possíveis áreas de infiltração tendo chegado as seguintes conclusões:

Detectaram-se três pequenas áreas na cobertura do terraço, não do telhado, com quebra da integridade da tela de cobertura, que justificaram a infiltração na área do corredor. Já reparadas.

Constatou-se entupimento da caixa colectora que leva todas as águas pluviais ao colector exterior com consequente impossibilidade de drenagem e acumulação de água nas caleiras e algerozes, sem drenagem, o que levou ao aparecimento de humidade em pontos específicos, adjacentes aos algerozes, nomeadamente na sala e no escritório.

Tirando estes locais as restantes paredes não têm sinais de humidade. O sistema de drenagem de águas pluviais foi submetido a uma inspecção e intervenção por uma empresa especializada na semana passada com total resolução do problema.

Não foram alteradas as áreas da casa encontrando-se conforme as plantas originais, portanto não julgo haver qualquer problema com os bancos que também intervieram em 2005 quando nós comprámos a casa.”

10\ Em visitas realizadas à moradia que tiveram lugar em momentos posteriores à celebração do contrato, os autores viram manchas de humidade e bolor em paredes daquela habitação que antes estavam tapadas por mobiliário e radiadores.

10bis\ Na sequência do referido em 10, os autores confrontaram os réus, tendo-lhes estes dito que as manchas seriam apenas resquícios pontuais da situação ocorrida nesse último Inverno e que se resolvia com uma simples limpeza

Quanto à informação que puderam obter dos RR. sobre o estado da casa antes/contemporânea da contração:

4\ (não se reproduz para evitar duplicação)

5\ Na sequência da apresentação de uma proposta de aquisição pelos autores, os réus, em escrito datado de 28/04/2020 e àqueles dirigido, declararam:

“[…] A casa está bem conservada e naturalmente necessita apenas de alguns trabalhos. Toda a zona do telhado apresenta uma cobertura de telhas de boa qualidade e integras sem necessidade de reparações. As zonas de terraço do telhado estão estanques mas aqui julgo que se podia optar por uma nova impermeabilização. Esta obra é relativamente pouco dispendiosa e garante tranquilidade por muito tempo. […] Finalmente resta a necessidade de pintura completa do interior da moradia que é normal numa casa usada e até por motivos de higiene.

Quaisquer outras obras serão puramente pessoais, a gosto de cada um e normais quando existe uma mudança de proprietários.

Sendo assim gostaríamos de fazer a seguinte contra proposta: Deduzindo o valor das obras a realizar, com uma margem alargada, nomeadamente as do terraço e pintura, de cerca de 20.000€ e ainda de uma dedução negocial de 30.000€ ao preço anunciado, apresentamos uma contra proposta de 1.440.000€. […]”.

Quanto à reacção dos AA. sobre o conhecimento superveniente dos vícios e defeitos

11\ Na sequência do facto 10, os autores solicitaram a realização de uma inspecção à moradia.

11bis\ Em escrito datado de 21/06/2020 e dirigido aos réus, que o receberam, os autores, declararam:

“(…) Gostaríamos de não ter necessidade de enviar este e-mail, e queremos reforçar que estamos neste processo com a mesma boa fé e vontade de chegar a um entendimento, mas infelizmente os vários vícios e defeitos do imóvel com os quais fomos sendo surpreendidos e se confirmaram nos últimos dias, não nos deixam alternativa que não seja a de expor o nosso desconforto, tendo em conta que não estavam previstos na negociação. De acordo com apreciação técnica de um Engenheiro, efectuada na visita de 5ª feira, dia 18/06, verifica-se que a casa tem determinadas patologias que não podiam ter sido avaliadas e deslindadas sem um olhar clínico profissional, em simples visitas imobiliárias e que rebatem a versão que nos foi apresentada e as garantias prestadas antes da assinatura do CPVC.

Estas patologias têm de ser corrigidas para que a casa tenha qualidade e condições para ser habitável sem danos futuros para quem lá residir. Gostaríamos de recordar que, mediante o que nos foi transmitido, partimos do pressuposto que estaríamos perante uma casa que sofreu uma remodelação total - completa, como foi dito - e não apenas parcial. Acreditamos que também os vendedores há 15 anos possam ter sido induzidos em erro pela empresa que fez a remodelação, porém essa responsabilidade não nos pode ser imputada, uma vez que as patologias estão presentes e já estavam na altura da negociação, sem que nós tivéssemos conhecimento.

Em seguida, enviamos detalhadamente os pontos, tal como foram identificados pelo Engenheiro, seguidos de algumas considerações.

Começando pelas patologias da cobertura:

- Todas as caleiras da cobertura inclinada têm o isolamento comprometido e terá de ser refeito.

- As telhas têm de ser lavadas e sujeitas à colocação de fungicidas, uma vez que estão cobertas de fungos.

- A cobertura plana tem todo o isolamento comprometido, que terá de retirado e refeito, incluindo as caleiras. E a impermeabilização é também fundamental, sendo este ponto do nosso conhecimento.

Estes factos, à excepção da última alínea, contrariam a informação de que dispúnhamos e nos foi relatada por escrito aquando da negociação.

Patologias do interior:

- A casa apresenta sinais de muita humidade em vários pontos, que têm origem em factores de origem diversa.

- A condição exterior da cobertura plana e inclinada, tal como das caleiras e a falta de isolamento térmico são motivo de surgimento de fungos, bolores, manchas e humidade no interior.

- A caixa de ar das paredes externas está comprometida, sendo uma questão estrutural (má construção) que tem de ser resolvida, caso contrário a casa terá sempre humidades e fungos.

- Todas as humidades interiores têm de ser tratadas, com aplicação de fungicidas, não sendo a limpeza e pintura suficientes, sob pena de ser um risco para a saúde. (por exemplo: vários pontos da sala, escritório, sala multiusos, em pelo menos dois quartos, os dois halls do piso térreo, hall superior, não se tratando apenas de pontos específicos).

Uma vez mais, estamos presentes factos contraditórios, face ao que nos havia sido dito: que a humidade e manchas de bolor estariam apenas presentes em alguns pontos do hall dos quartos, na sala, escritório e zonas adjacentes aos algerozes e que teria sido apenas resultado de uma inundação/entupimento que, por ora, estaria resolvida. O que não se coaduna com a realidade, uma vez que pelas razões acima mencionadas o problema é patológico e não circunstancial e muda completamente a perspectiva. Apesar das paredes não terem sido pintadas, uma parte significativa das manchas de humidade e fungos havia sido limpa ou estava oculta, não permitindo avaliar o grau do problema antes da assinatura do CPCV.

Recordamos que no 19/05, 5 dias após a assinatura do CPCV, como sabem, deparámo-nos com outra questão impossível de detectar até esse momento - por se tratar de um espaço oculto da casa - que nos causou bastante apreensão: por detrás de alguns radiadores existia a presença de bolor, o que representa, como se sabe, uma série de riscos. Manifestámos a nossa preocupação face ao problema, até porque a parte compradora tem no núcleo familiar que iria habitar a casa, quem tenha problemas respiratórios, mas o problema foi desvalorizado pelos proprietários.

A título de exemplo, após medições, em anexo, verificou-se que na parede de um dos quartos que apresentava o bolor, os níveis de humidade rondam os 30% e na parede do hall que vai para os quartos temos um valor de cerca de 40%, o que confirma o problema, até porque estamos a falar de valores muito elevados, principalmente nesta época do ano.

A casa não tem qualquer tipo de isolamento, encontrando-se todas as estruturas permeáveis. O que também não está de acordo com uma informação que nos foi dada e nos levou a ser induzidos em erro.

No decorrer das visitas, a propósito da recolha de algumas medidas para as alterações estéticas, fomos detectando alguns pontos que foram causando preocupação e que procurámos sempre junto dos proprietários perceber e obter respostas, mas todas as respostas nos remetiam para o facto de serem questões sem importância ou que estariam resolvidas. Porém, na passada semana, ao constatarmos a percentagem de humidade nas paredes, suspeitámos que estaríamos perante questões mais delicadas e sérias e que não poderiam continuar a ser desvalorizadas. Nesse mesmo dia, percebemos que haveria a necessidade de requerer a presença de um Engenheiro para avaliar a gravidade do problema e de tudo o resto que poderia escapar ao nosso conhecimento. Pedimos, por isso, uma última visita à casa, para ter a real noção do que se passava e, simultaneamente, percebermos se o projecto, perante tudo o que surgiu, continuava a ser viável. O resultado dessa visita trouxe-nos até ao ponto em que estamos hoje.

Por fim, no que diz respeito às patologias, deparamo-nos com o tema das fundações.

Patologias das Fundações:

- Há evidências claras de que não houve isolamento exterior das fundações periféricas, que se encontram húmidas ou bastante húmidas, assim como a terra que em alguns locais se encontra barrenta. Um problema estrutural, que se reflecte na casa e se não for corrigido compromete a habitabilidade sã da moradia em questão. Segundo o que nos foi transmitido, todas estas patologias são factuais e o que delas surge não é transitório. E, à excepção da cobertura plana, o que aqui relatamos não corresponde de todo à informação que tínhamos em fase de negociação e vai ao arrepio do que nos foi dito, nomeadamente que a única necessidade de “obra” seria para pintura e cobertura plana.

Canalizações:

- Na sequência das visitas técnicas da passada semana constatámos, também, que a tubagem da linha de abastecimento de água da casa - não só desde o contador, mas também da alimentação de um furo - até ao início da linha principal de distribuição da moradia - está em ferro galvanizado, incluindo acessórios.

O que nos havia sido transmitido era que teria sido feita uma renovação total, incluindo canalizações, verifica-se porém que a tubagem não terá sido toda renovada, havendo diversos segmentos que remontam à estrutura inicial da casa, de há 36 anos. Em virtude disso é necessário que toda esta sequência de segmentos seja substituída até ao contador, uma vez que pela idade e constituição da mesma, é certo o perigo que a parede interior do tubo esteja comprometida e bastante danificada, com "contaminação" da água, e passível de roturas num futuro próximo. As caixas de esgotos também apresentam sinais de rupturas/vazamentos.

Estes são, na realidade, um conjunto de factores de extrema relevância a ter em conta nos pressupostos essenciais do negócio e de comunicação entre ambas as partes e que seguramente uma delas – a parte compradora - não poderia ter conhecimento antecipado e que a obriga a confiar na boa-fé dos vendedores, confiando nas garantias e explicações que nos foram prestadas. Perante todas estes pontos e os factos aqui sublinhados são inegáveis os prejuízos que os mesmos aportam, para quem com eles se depara, até porque não são “apenas alguns trabalhos”, porque não estamos a falar de afinar portas ou janelas, pinturas ou mudar rodapés, nem se tratam de questões de natureza estética.

Ainda para mais, os pareceres dados após visita técnica, indicam que algumas das patologias fazem parte do ADN da habitação ou já estão presentes há vários anos. Logo, os problemas com os quais fomos surpreendidos, após a assinatura do CPCV – que assinámos de boa fé - deveriam ter sido comunicados quando da negociação, até porque como já foi referido não se apresentavam passíveis de serem constatados e alguns são, aliás, contraditórios com as informações prestadas, por escrito, na sequências dos pedidos de informação que solicitámos.

Também, na mais recente visita, fomos alertados para o facto do terreno, por conta do pavimento exterior colocado pelos actuais proprietários, não estar a cumprir, provavelmente, com a percentagem de permeabilidade exigida por lei e que poderá ser foco também de problemas – para um lote de 900m2 a área de impermeabilização deverá ser de 270m2. O que nos obriga a uma obra total do exterior, na zona de entrada e lateral Poente, com alterações e obras que também não estavam previstas.

A propósito, da alteração da porta para janela e demolição da varanda na fachada sul, sendo uma alteração da geometria da casa, requer parecer/licenciamento da câmara. Uma vez que nos foi dito que tudo estava em conformidade, agradecemos a documentação referente. Nesta fase, é igualmente pertinente questionar se os actuais proprietários estão na posse do número da licença que indica a legalização do alpendre construído na frente da casa. Uma vez que fomos confrontados com o facto de ter características e dimensões que carecem também de licenciamento. Este alpendre, tal como está e segundo os arquitectos, acresce a área coberta da habitação e conta como anexo. Depreendemos que falta um documento, uma vez que o que temos não menciona a presença do telheiro.

Acreditamos que alguns destes pontos (patologias) possam ser uma surpresa para os actuais proprietários e que, com o real conhecimento dos mesmos, teriam sido contemplados na negociação, mas, por maioria de razão, foi-o ainda maior para nós, porque altera completamente a visão que nos foi dada e tínhamos do imóvel. Chegados aqui, se for do interesse dos proprietários, o Engenheiro poderá voltar, esta semana, à moradia com o intuito de fazer um relatório de inspecção, algo que não poderia ter sido feito anteriormente, uma vez que requer autorização dos proprietários, e onde serão feitas medições e listadas e documentadas todas as patologias e respectiva projecção orçamental.

No link abaixo, enviamos várias fotos, que corroboram o que aqui está escrito. https://we.tl/t-NWtT914w4h

Como sinal da nossa boa fé e por todas as razões subjacentes ao que nesta carta foi detalhado, chegámos a uma fase em que somos forçados a reavaliar o processo como um todo e sobretudo as condições de aquisição estipuladas com base em premissas que não se verificam. Em consequência disso, decidimos conferir aos actuais proprietários o direito e primazia de propor uma solução para todo este processo.

Dado o estágio em que nos encontramos, ficamos a aguardar a resposta com a maior brevidade possível. (…)”

Quanto ao conhecimento dos RR. sobre o estado (defeitos e vícios) do bem:

13bis\ Os réus tinham conhecimento de todas as situações a que se refere o escrito parcialmente reproduzido 12 e decidiram não as revelar aos autores antes da assinatura do contrato-promessa.

13ter\ Os réus sempres disseram aos autores que as obras da moradia estavam legalizadas, à excepção do que se refere à janela, casa de banho exterior e telheiro.

15\ Em escrito remetido pelos réus aos autores e datado de 07/07/2020, aqueles declararam:

“[…]

A moradia foi prometida vender no exacto estado e nas condições em que se encontra, o que foi integralmente aceite por V. Exas nos termos do disposto no número um da cláusula 2ª do contrato promessa, V. Exas, como bem sabem, prometeram comprar a moradia "no estado em que se encontra", tendo declarado e garantido que (i) visitaram o imóvel, (ii) analisaram a documentação do mesmo e (iii) têm conhecimento integral do seu estado físico, áreas e condições jurídicas actuais, matriciais e registais [...].

O que é invocado na comunicação de V. Exas, como sendo vícios na moradia de que só tiveram conhecimento após a celebração do contrato promessa, não tem qualquer acolhimento. A moradia encontra-se nas exactas condições em que se encontrava à data de celebração do contrato promessa, não se tendo verificado qualquer alteração. Nunca, em momento algum, escondemos ou ocultámos o estado da moradia que V. Exas prometeram comprar.

O que consta do relatório que nos enviaram são, por um lado, factos que foram total e integralmente comunicados a V. Exas1 (e que até levaram à negociação do preço) e, por outro lado, não correspondem ao negócio que foi ajustado com V. Exas., na medida em que nunca ajustámos vender a moradia no estado em que o autor do relatório invoca como sendo o estado em que deveria ser vendida.

Consequentemente, não temos qualquer responsabilidade ou qualquer obrigação de proceder a quaisquer reparações na moradia antes (ou após) a celebração da escritura pública de compra e venda.

Face ao exposto, a Vossa interpelação admonitória carece de qualquer fundamento e eficácia.

Por outro lado, V. Exas incumpriram o disposto no número um da cláusula 4ª do contrato promessa, i.e., V. Exas deveriam ter agendado a celebração da escritura pública de compra e venda no prazo máximo de 60 dias contados da data de assinatura do contrato promessa (desde 14/05/2020).

Deste modo, V. Exas deveriam ter procedido à marcação da escritura pública, no limite máximo até ao dia 13/07/2020, para o que V. Exas, deveriam ter enviado uma comunicação com a antecedência mínima de 10 dias úteis, ou seja até ao passado dia 29/07.

Como V. Exas. não procederam ao agendamento da escritura pública, nos termos consignados no contrato promessa, servimo-nos da presente para, nos termos do disposto no n.º 4 da referida cláusula 4ª, procedermos à comunicação a V. Exas de marcação da escritura definitiva de compra e venda para o próximo dia 27/07/2020, às 11h30m, no Cartório Notarial do Dr. [...]

Na eventualidade de V. Exas não procederem à outorga da escritura de compra e venda no Cartório Notarial, data e hora acima referidos, V. Exas incorrerão em incumprimento definitivo do contrato promessa, com as legais consequências. [...]”.

Também releva o comportamento dos RR., que resulta do facto 25\ O imóvel referido em 1 foi vendido – mas não aos promitentes-compradores.

Do que veio decidido – e não se pode agora conhecer – também resulta que os AA. tinham direito a não comparecer na escritura pública, marcada pelos RR, porque não estavam obrigados a cumprir o contrato-promessa adquirindo um bem que apresentava os defeitos referidos nos factos provados. Ainda que se pudesse conhecer desta questão, não se vislumbra que o tribunal adoptasse uma decisão diversa.

Se os AA. não estavam obrigados a comparecer na escritura, não entraram em mora no cumprimento do contrato. E, em consequência, não podia uma não mora ser transmutada em incumprimento definitivo que facultasse ao promitente não faltoso resolver o contrato e fazer seu o sinal.

Improcede, assim, a revista dos RR.

III. Decisão

Pelos fundamentos indicados, é negada a revista dos RR. e confirmado o acórdão recorrido.

Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 12 de Outubro de 2023

Relatora: Fátima Gomes

1º adjunto: Dr Lino Ribeiro

2º adjunto. Dr Manuel Capelo

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1. Sublinhado nosso.