INCIDENTE
RECLAMAÇÃO RECUSA
Processo n.º 2140/06.3TAAVR-I.P1-A.S1
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça
I – RELATÓRIO
1. AA, arguido nestes autos, apresentou nova reclamação, desta feita do despacho proferido em 09/02/2023, que indeferiu o requerimento de recusa dos Juízes Conselheiros que assinaram o acórdão de 10/01/2023, proferido nestes autos, bem como do Juiz Conselheiro Presidente e do Tribunal Coletivo, por eles constituído para julgamento do Processo de Recusa n.º 2140/06.3TAAVR-I.P1-A.S1, por ele deduzido e indeferiu a reclamação por nulidade insanável, nos termos das alíneas a) e e) do artigo 119.º do Código de Processo Penal.
Para tanto, requer que “Se dignem Vossas Excelências declarar-se impedidos de intervir no Julgamento do incidente de recusa de Vossas Excelências, deduzido no requerimento de 23 de janeiro, por serem os Juízes visados para o artigo 45.º n.º 1 alínea b) do Código de Processo Penal, que exclui a participação do Juiz visado na decisão dos requerimentos de recusa e dos pedidos de escusa.”.
E, do mesmo passo, apresenta reclamação da mesma decisão de 09/02/2023, que em seu entendimento “(…) deverá ser julgada pelo Coletivo a quem o processo venha a ser distribuído…” alegando que a mesma padece de nulidade insanável e de erro na forma de processo por a tramitação e decisão do incidente não respeitou o processo e decisão previstos no artigo 45.º do Código de Processo Penal, o que “(…) é causa de nulidade insanável da Decisão Reclamada e do processo. desde o Despacho de 23 de janeiro que Sua Excelência o Senhor Presidente deste Supremo Tribunal manuscreveu e assinou na margem superior do “E-Mail - Recibo" de 23 de janeiro – cf. CITIUS – e da própria decisão reclamada.”, pedindo que o processo seja “(…) DECLARADO INSANAVELMENTE NULO DESDE O DESPACHO DO SENHOR JUIZ PRESIDENTE DESTE SUPREMO TRIBUNAL DE 23 DE JANEIRO, INCLUINDO A DECISÃO RECLAMADA.”
2. Efectivamente, insistindo o arguido numa postura de manifesta indiferença pelo que foi decidido vem, de novo, arguir nulidades do despacho, de 09/02/2023, que já incidira e apreciara alegadas nulidades por si invocadas sobre o acórdão do STJ, proferido em 10/01/2023, no âmbito do incidente de recusa, pugnando que o mesmo seja julgado pelo Coletivo a quem o processo vier a ser distribuído, voltando a invocar que o referido incidente de recusa e agora, também, a decisão reclamada, violaram as regras da distribuição nos moldes que pretende ver efectuada e conforme vem peticionando, pretendendo a nulidade da distribuição dos processos nos tribunais superiores (no caso na Relação e no STJ) e, agora, também a nulidade de todo o processo, desde o despacho do Senhor Presidente do STJ, de 23/01/2023, pretendendo nova distribuição, considerando que a nulidade da decisão reclamada e a violação das referidas regras são motivo de recusa e de escusa dos juízes que intervieram na decisão de recusa proferida em 10/01/2023, devendo o processo ser apreciado e julgado pelos juízes naturais.
3. Realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
1. QUESTÃO PRÉVIA
1.2.Após inscrição em tabela veio o arguido introduzir no dia anterior à data da presente conferência, 4 requerimentos, a pedir, num deles, que os juízes intervenientes na conferência designada para hoje se declarem impedidos ou peçam escusa e, não o fazendo ou entendendo que não o estão, pedir (nos restantes requerimentos) a recusa dos mesmos na intervenção na decisão do incidente.
Estes requerimentos inserem-se na mesma linha de todo o processo de obstrução que o requerente tem utilizado, usando sempre de idêntica argumentação, sendo certo que vem repristinar questões já levantadas e decididas, numa nova tentativa de obstrução do prosseguimento dos autos.
A conferência prosseguirá, pois, já que os juízes visados consideram inexistirem quaisquer motivos de facto e de direito que justifiquem qualquer declaração de impedimento ou de escusa.
1.3.Quanto aos pedidos de recusa os mesmos devem ser considerados repetitivos, manifestamente impertinentes e inadmissíveis na mesma linha dos fundamentos que, de seguida, se irão desenvolver na decisão acerca do tema da reclamação da decisão sumária.
2. O presente processo incidental respeita, apenas, ao Exmo. Senhor Juiz Conselheiro BB, Presidente da ... Secção Criminal, deste Supremo Tribunal.
Nestes autos verificaram-se as seguintes ocorrências processuais:
i. Em 22/12/2022, o arguido AA apresentou requerimento de Recusa dos Juízes Conselheiros da ... Secção do STJ, BB (Presidente), CC (Relator), DD (Primeiro Adjunto) e EE (Segunda Adjunta), que haviam decidido a recusa que o mesmo apresentara contra Juízes Desembargadores do Tribunal da Relação ..., tendo sido o incidente autuado autonomamente – Ref.ª Cítius;
ii. Em 09/01/2023, foi ordenada a inscrição do incidente em tabela a fim de o mesmo ser julgado em conferência no dia 10/01/2023, como o foi tendo sido na mesma data proferido acórdão que indeferiu o pedido de recusa do Juiz Conselheiro BB – Ref.ªs Cítius n.ºs ...02, ...34 e ...44;
iii. Na mesma data, 10/01/2023, foi o arguido notificado do teor do acórdão do STJ – Ref.ª ...22;
iv. Em 19/01/2023, o arguido requereu que lhe fosse disponibilizada a acta da conferência realizada no dia 10/01/2023, alegando não aceder à mesma através da plataforma Cítius e requerendo o prazo de 10 dias para reagir ao acórdão de 10/01/2023 – Ref.ª ...14;
v. Em 23/01/2023, o requerimento em causa foi parcialmente deferido, conforme despacho Ref.ª ...57;
vi. Na mesma data o arguido foi notificado daquele despacho, tendo no mesmo dia apresentado reclamação por nulidade insanável, de todo o processo desde a sua Distribuição e, simultaneamente, requerendo a recusa de todos os Juízes Conselheiros que subscreveram o Ac. de 10/01/2023. – Ref.ª ...45;
vii. Em 09/02/2023, pelo relator do presente processo foi proferido o despacho judicial, ora reclamado, nos termos do qual, logo se rejeitou o requerimento de recusa apresentado por ser, manifestamente extemporâneo e indeferiu as alegadas nulidades processuais por considerar que o incidente de recusa não constitui o meio processual adequado ao conhecimento de nulidades processuais, que dispõe de regime próprio, tendo o arguido sido notificado no próprio dia 09/02 – art.º 118.º e segs. do CPP – Ref.ªs ...97 e ...70;
viii. Em 28/02/2023, o arguido apresentou novo requerimento, que após o pagamento da multa respectiva, ora se aprecia, requerendo, nova recusa dos Juízes Conselheiros, incluindo a relatora e, no mesmo requerimento, apresentando nova reclamação, desta feita do despacho proferido em 09/02/2023 – Ref.ª ...76.
3. Ao incidente de recusa ou escusa não são aplicáveis as regras do recurso, não sendo admissível a reclamação para a conferência da decisão que rejeitou liminarmente o requerimento de recusa, ao abrigo do disposto no art.º 45.º, n.º 4, posto que o despacho “reclamado” se mostra proferido nos termos da lei, por tribunal imediatamente superior – art.º 45.º, n.º 1, al. a), do CPP, tendo na conta que o requerimento de recusa que foi apresentado era, manifestamente extemporâneo.
Todavia, mesmo admitindo que é admissível a reclamação do despacho singular proferido nos termos referidos, no caso, a reclamação não seria admitida porquanto incide sobre despacho que já havia rejeitado o requerimento de recusa por intempestividade, e já apreciara e decidira não conhecer das nulidades processuais arguidas pelo requerente, deixando claro que o incidente de recusa não constitui o meio processual adequado ao conhecimento de nulidades processuais, existindo regime próprio para o efeito e que não foi utilizado pelo arguido – art.º 118.º e segs. do CPP.
Acresce que dispõe expressamente o artigo 205.º, n.º 1 do CPC, aplicável ex vi art.º 4.º, do CPC, “a falta ou irregularidade da distribuição não produz nulidade de nenhum ato do processo, mas pode ser reclamada por qualquer interessado ou suprida oficiosamente até à decisão final”. O que o arguido não fez. Ora, a irregularidade da distribuição, não produz a nulidade processual pretendida pelo arguido e muito menos do acórdão proferido em 10/01/2023. Além disso, como já se disse a reclamação do arguido é intempestiva.
Tanto basta para não haver lugar a nova pronúncia sobre as invocadas nulidades.
4. As questões colocadas pelo arguido no seu requerimento dito reclamação não são novas e têm sido objecto de resposta deste STJ, sendo certo que não se vê de que forma a interpretação que se vem fazendo viole qualquer preceito constitucional, nomeadamente os invocados pelo arguido no seu requerimento.
Aliás, toda a laboriosa argumentação do Requerente, emergindo da alegada inobservância das regras da distribuição, ignorando o facto de já ter sido proferida decisão sobre reclamação do acórdão que incidiu sobre o pedido de recusa que o próprio efectuou, remete para uma manifesta intenção de, a qualquer custo, inviabilizar o cumprimento do julgado ou a baixa do processo ou a sua remessa para o tribunal competente.
Com efeito, o facto de o arguido ignorar o teor do despacho de 09/02/2023, voltando a repetir argumentos e a invocar nulidades, ainda que sob argumentação diversa, acrescentando que a decisão de que reclama também é nula, não invalida, nem inutiliza o que ali se decidiu, nem equivale a qualquer nulidade e, muito menos quanto à forma do processo.
A decisão de indeferimento recusa liminar do requerimento de recusa assentou na verificada intempestividade do requerimento e na ineptidão do próprio pedido de recusa, sendo certo que, ali se decidiu que o que o arguido arguira fora a nulidade de actos processuais que nada tinham a ver com a regularidade do acórdão visado, relativamente ao qual não assacara quaisquer nulidades das previstas no art.º 379.º, do CPP, pelo que, o requerimento em causa não seria apreciado em conferência.
Em consequência, não pode haver nova pronúncia sobre a mesma matéria, pelo que, por manifesta falta de fundamento, a presente reclamação terá de improceder.
5. Na verdade, com todo o seu laborioso esforço retórico, repetitivo e redundante, o arguido vem despendendo no processo uma actividade baseada em incidentes sucessivos, pretendendo renovar os argumentos já expendidos nos seus inúmeros requerimentos, visando desse modo protelar no tempo o trânsito em julgado das decisões proferidas. Tal comportamento processual consubstancia um expediente dilatório, inaceitável na relação entre partes processuais, comprometendo a boa administração da Justiça.
Nestes termos, tendo em consideração o que dispõe o art.º 670.º, n.º 2, do CPC, aplicável ao caso por força do art.º 4.º, do CPP, por parecer ser manifesto que o arguido pretende, com mais este requerimento obstar ao trânsito em julgado das decisões já proferidas, através da suscitação de novos incidentes, em espiral crescente, manifestamente infundados e a elas posteriores.
Por isso se impõe determinar a imediata extração de traslado e ordenar que os autos prossigam os seus termos no tribunal precedente.
III – DECISÃO
Termos em que, acordando, se decide:
a) Indeferir o requerimento de reclamação do despacho de 09/02/2023, ora efectuado pelo arguido;
b) Declarar transitado o acórdão do STJ de 10/01/2023, proferido nestes autos;
c) Ordenar a extracção de traslado e a remessa do processo ao tribunal precedente;
d) Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 2 UCs, nos termos da tabela III, anexa ao Regulamento das Custas Processuais .
Lisboa, 27 de Abril de 2023 (processado e revisto pelo relator)
Leonor Furtado (Relator)
Orlando Gonçalves (Adjunto)
José Eduardo Sapateiro (Adjunto)