Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | ANTÓNIO LATAS | ||
Descritores: | RECURSO PER SALTUM COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUALIFICAÇÃO JURÍDICA PENA PARCELAR PENA ÚNICA MEDIDA CONCRETA DA PENA SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO DA PENA | ||
Data do Acordão: | 10/26/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO EM PARTE. | ||
Sumário : | I- Apesar de o fazer no corpo da motivação, o arguido não se refere nas suas conclusões ao crime de detenção de arma nem à perda de veículo a favor do Estado, pelo que essas questões não integram o objeto do recurso conforme o entendimento jurisprudencial constante a que se alude acima ao reafirmar-se que são as conclusões a delimitar o objeto do recurso, podendo ver-se ainda, nos termos ora enunciados, Simas Santos-Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª ed.-2007 p. 103, em cuja nota 116 pode ler-se: “…se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objeto do recurso), o Tribunal superior só conhecerá das que constam das conclusões.”. II- Em face da factualidade transcrita o arguido não tem razão ao pretender que a conduta descrita se encontra consumida pelo crime de roubo, porquanto as palavras que preenchem os elementos constitutivos do tipo objetivo do tipo legal de coação, “Se ligares à polícia, dou-te uma facada”, foram proferidas quando o arguido já se tinha apoderado da quantia que subtraíra e imediatamente antes de abandonar o estabelecimento (…) pelo que aquelas não visavam impedir a ofendida de se opor à subtração, que já consumara, mas antes condicioná-la na sua liberdade de denunciar os factos ilícitos em causa às autoridades, meio da ameaça da prática de crime contra a vida, de modo a ficar impune pela prática dos mesmos, bem sabendo que a ameaça proferida era adequada a provocar-lhe medo e inquietação e desse modo a inibi-la de denunciá-lo. III- Assim, uma vez que a factualidade provada que se descreve sob os nºs 45 a 49 preenche os elementos constitutivos do crime de coação (ainda que na forma tentada) IV- p. e p. pelo artigo 154º, ambos do C.Penal, e que a demais factualidade preenche os elementos constitutivos de um crime de roubo p. e p.. pelo artigo 210.º, n.os 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP, sem que possa dizer-se que a punição do arguido apenas por um dos crimes é suficiente para punir o facto no seu conjunto, não estamos perante mero concurso aparente ou concurso de normas mas sim perante uma pluralidade de crimes efetivamente cometidos (art. 30º nº1 do C.Penal), ou seja, em face de concurso efetivo de crimes a punir autonomamente, tal como decidiu o tribunal recorrido e entende o MP, tanto no tribunal recorrido como no STJ. V- Apesar de respeitarem essencialmente à ilicitude, à gravidade do facto, os factos destacados pelo tribunal a quo , ou seja, “…a faca não só dificultou as possibilidades de defesa da vítima, como aumentou o potencial agressor, tornando-o, porventura, mais apto a causar lesões graves, mesmo irreversíveis.”, revelam igualmente a especial censurabilidade do arguido pressuposta no artigo 132º nº1 porquanto traduzem forma de realização do facto especialmente desvaliosa, ao agir o arguido contra a integridade física do ofendido nas circunstâncias em que o fez. Por um lado, não hesitou em usar a faca na direção do ofendido que se limitava a interpor-se entre ele e o automóvel, visando atingi-lo para o afastar de si; por outro lado, fê-lo de modo a atingi-lo efetivamente na sua integridade física (não se limitando a mostrar-lhe a faca ou a ameaçá-lo) e fê-lo com faca de 10 cm de lâmina (no limite da punibilidade do crime de uso e porte de faca), instrumento capaz de diminuir as possibilidades de defesa do ofendido, dada a forma direta e repentina como procurou fazê-lo, sendo igualmente meio apto a aumentar significativamente o potencial danoso da ofensa contra o corpo daquele. Conclui-se, pois, que as ofensas à integridade física tentadas foram praticadas em circunstâncias que revelam especial censurabilidade, operando-se a qualificação do crime nos termos do artigo 132º nºs 1 e 2 al. h) em conjugação com os artigos 145º nºs 1 al. a) e 2, do C.Penal. VI- Da factualidade apurada resultam sinais fortes de dissociação entre a personalidade do arguido e os factos ilícitos praticados, que não pode deixar de pesar na medida concreta da pena única a determinar, independentemente de outros aspetos da determinação da sanção a ponderar. Referimo-nos à ausência de antecedentes criminais, à sua inserção familiar, à prática dos factos no curto período de tempo verificado, àmotivação para os factos claramente identificada nos autos e à pressão que tal motivação terá exercido sobre a sua personalidade e mesmo a sua saúde mental, por um lado, e, por outro, aos sinais de estranheza entre essa mesma personalidade e a índole ilícita dos factos praticados, que em alguns casos são quase caricatos, como sucede quando o arguido larga a faca e foge perante a aproximação dos pais da ofendida ou na sua reação imediata ao saber que os visados eram agentes da GNR ou ainda com o episódio passado no Restaurante A...... a que se refere a motivação de recurso. VII- Por outro lado, os factos não se apresentam particularmente graves no seu conjunto, nem tão pouco tomados de per si, não obstante a gravidade dos tipos penais preenchidos (roubo, detenção de arma proibida, ofensa à integridade física qualificada, crime de coação agravado), alguns dos quais na forma tentada. VIII- Assim, ponderados estes aspetos, com destaque para as particularidades de os factos e da personalidade do arguido revelados naqueles mesmos factos e apurados no julgamento conjunto dos mesmos, entendemos julgar parcialmente procedente o recurso relativamente à medida da pena única que fixamos em 5 (cinco) anos de prisão. IX- Posto isto, decide-se suspender a execução da pena de prisão concretamente determinada pelo período máximo legal de 5 anos ( art. 50º nº5), por concluirmos, em necessário juízo de prognose, que a censura do facto e a ameaça da prisão inerentes à pena de suspensão da prisão, realiza de forma adequada as finalidades de prevenção geral e especial da punição, dado o que deixámos referido sobre personalidade do arguido, as condições da sua vida mais recuadas e as contemporâneas dos crimes, a sua conduta anterior e posterior aos crimes e as circunstâncias em que ocorreram os factos, sobretudo no que respeita ao curto período de tempo em que o conjunto dos factos foi praticado e, bem assim, à s condições concretas que terão motivado o arguido para a sua prática. | ||
Decisão Texto Integral: | Recurso Penal Proc. n.º 309/22.2GDLLE-S1 * Acordam os Juízes, em conferência, nas secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça: I. RELATÓRIO 1.No Juízo Central Criminal de ... - .... . -, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, foi submetido a julgamento, em processo comum com intervenção do tribunal coletivo, o arguido, AA, nascido em ... de 1977, a quem o MP imputara a autoria, em concurso efetivo, de: - Um crime de furto, previsto e punível [doravante, p. e p.] pelo artigo 203.º, n.º 1 do Código Penal [doravante CP]; - Um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.os 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n. º1, al. e), e n.º 4, do CP; - Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º, 23.º e 210.º, n.os 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 1, al. e), n.º 2, al. f), e n.º 4, do CP; - Três crimes de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.os 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n. º1, al. e), n.º 2, al. f), e n.º 4, do CP; - Dois crimes de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22.º, 23.º e 210.º, n.os 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n. º1, al. e), e n.º 2, al. f), do CP; – Um crime de roubo, p. e p. pelo artigo 210.º, n.os 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP; - Um crime de resistência e coação sobre funcionário, p. e p. pelo artigo 347.º, n.º 1, do CP; - Quatro crimes de detenção de arma proibida, p. e p. artigo 86.º, n.º 1, al. d), por referência ao disposto nos artigos 2.º, n.º 1, alínea m) e 3.º, n.º 2, alínea ab), todos da Lei 5/2006, de 23, de fevereiro; e - Um crime de coação, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 154.º, n.os 1 e 2, e 155.º, n.º 1, alínea a), do CP. 2. Realizada audiência de julgamento, o tribunal coletivo decidiu condenar o arguido por acórdão de 16.05.2023, pela autoria, em concurso efetivo, dos seguintes crimes: - 1. Um crime de furto, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 203º, n.º 1, do Código Penal, na pena de três meses de prisão [APENSO 375/22.0...]; - 2. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º, e 210º, n.º 1, do Código Penal, na pena de um ano e três meses prisão [APENSO 187/22.1...]; - 3. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 22º, n.os1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b), 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão [APENSO N.º 411/12.0...] - 4. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.s1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e seis meses prisão [APENSO 412/22.9... - 5. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.s1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e cinco meses prisão [APENSO 413/22.7...]; - 6. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b) e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e três meses de prisão [APENSO 308/22.4...]; - 7.Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de três anos e três meses prisão [AUTOS PRINCIPAIS:309/22.2GDLLE]; - 8. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e cinco meses prisão [APENSO 418/22.8...]; - 9. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e seis meses prisão [APENSO 419/22.6...]; - 10. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b), e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e três meses de prisão [APENSO 26/22.3...]; - 11. Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos artigos 14º, 26º, n.º 1, do Código Penal, e artigo 86º n.º 1, alínea d), por referência aos artigos 2º, n.º 1, alínea m) e 3º, n.º 2, alínea ab), da lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, redação da Lei n.º , na pena de nove meses de prisão [apensos 411/22.0..., 412/22.9..., 413/11.7... e 308/22.4...]; - 12. Um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. Artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, n.º 1, alínea h), do Código Penal, na pena de um ano de prisão [APENSO 26/22.3...] - 13. Um crime de coação, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º, n.º 1, alíneas a) e b), 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de quatro mese de prisão [apenso 419/22.6...]; . - Em cúmulo jurídico das penas parcelares, na pena única de seis anos de prisão. 2.1. O arguido foi ainda condenado a pagar, a título de indemnização pelos danos causados às vítimas especialmente vulneráveis que a seguir se identificam, os seguintes valores: - A quantia de € 395 (trezentos e noventa e cinco euros), a BB; - A quantia de € 460 (quatrocentos e sessenta euros), a CC; - Aquantiade€ 300(trezentos euros),a DD; - A quantia de € 300 (trezentos euros), a EE; - A quantia de € 300 (trezentos euros), a FF. 2.2. Foram declarados perdidos a favor do Estado: - O veículo automóvel descrito em 1) dos factos provados; - As facas descritas em 9) e 34) dos factos provados; - O chapéu e o par de óculos descritos em 51) dos factos provados; - A meia de vidro descrita em 56) dos factos provados; - O valor de € 355 (trezentos e cinquenta e cinco euros), referente às vantagens obtidas; 3. Inconformado, veio arguido interpor recurso (per saltum) para o STJ, por ser o competente, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões, que se transcrevem ipsis verbis: « EM CONCLUSÃO I – Os factos provados não preenchem o tipo legal de crime de coacção (na forma tentada), nem o crime de ofensa à integridade física, pelo que deles deve o arguido ser absolvido. II – As penas parcelares aplicadas mostram-se excessivas face à forma como foram praticados os crimes, a personalidade do arguido, o contexto de ameaça física em que foram praticados e o bom comportamento do arguido anterior e posterior aos factos. III – Deve o arguido ser condenado pelos crimes praticados nas seguintes penas parcelares: - Um mês de prisão pelo crime de furto. - Um ano e dois meses de prisão por cada um dos crimes de roubo. - Seis meses de prisão por cada um dos crimes de roubo na forma tentada e em cúmulo jurídico na pena única de três anos de prisão. IV – A pena de prisão de três anos deve ser suspensa na sua execução por aquele período, por se verificarem para o efeito as condições previstas no artigo 50º do Código Penal. V – Mostram-se violadas, entre outras, as disposições conjugadas dos artigos 50º, 71º, 77º e 109º do Código Penal. Nestes termos e nos mais do direito aplicável a suprir doutamente por v. Exas, deve o presente recurso merecer provimento e, por via dele, ser o douto acórdão recorrido revogado e substituído por um outro que condene o arguido em cúmulo jurídico na pena única de três anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, com o que se fará a costumada justiça.» 4. Admitido o recurso e cumprido o disposto no art. 411.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, o MP apresentou a sua resposta, de onde extrai as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem ipsis verbis: « 1ª Salvo melhor opinião, não assiste razão ao ora recorrente. 2ª Com efeito, face à factualidade assentes nos pontos 17 a 21, 22 a 27, 28 a 33, 34 a 39, 40 a 44, 45 a 50, 51 a 55, 65 a 65.1 57 a 63, consideramos que a mesma é subsumível aos crimes de coação na forma tentada, ofensa à integridade física qualificada e de detenção de arma proibida. 3ª Com efeito, relativamente à subsunção da factualidade constante dos pontos 45 a 49 da matéria de facto dada como assente, consideramos que o momento em que o ora recorrente verbalizou a expressão “se ligares à polícia, dou-te uma facada!” acompanhada da exibição desse objeto, ou seja, após a perpetração do crime de roubo, é apta e adequada a constranger a sua interlocutora a não apresentar queixa mediante o anúncio de um mal futuro. 4ª Em consequência, conclui-se pelo preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do crime de coação, na forma tentada, previsto e punível pela alínea a) do nº 1 do art.º 155º do Código Penal, por referência ao nº 1 do art.º 153º e alínea a) do nº 2 e 1 do art.º do mesmo diploma legal, faceà circunstância dea ofendidater apresentado queixa à polícia. 5ª No que respeita à subsunção da factualidade constante dos pontos 57 a 63 da matéria de facto dada como assente, consideramos que, face à circunstância de ter ficado demonstrado que o ora recorrente esticou o braço em que segurava a faca na direção do abdómen do militar da GNR GG, previamente identificado como tal, visou atingir a sua integridade física, mediante a utilização de um objeto que aumentou a potencialidade dessa agressão. 6ª Em consequência, conclui-se pelo preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do crime de ofensa à integridade física qualificada, previsto e punível pela alínea a) do nº 1 e 2 do art.º 145º do Código Penal, por referência à alínea h) do nº 1 do art.º 132º do mesmo diploma legal. 7ª Quanto à subsunção da factualidade apurada, constante da matéria de facto dada como assente relativamente ao crime de detenção de arma proibida, nomeadamente, ao ter ficado demonstrado que o ora recorrente detinha uma faca com uma lâmina de aço de 12 centímetros e que a utilizou para a perpetração da restante factualidade, concluímos pelo preenchimento dos elementos objetivos e subjetivos do crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pela alínea d) do nº 1 do art.º 86º da Lei nº 5/2006, de 23 de Fevereiro. 8ª Em sede de determinação concreta da pena, o aresto em crise considerou as consequências da conduta do arguido e evidenciou as especiais exigências de prevenção geral e especial na determinação concreta da pena. 9ª Com efeito, o Tribunal a quo foi equilibrado ao considerar os fins das penas, designadamente ao sublinhar a erosão dos bens jurídicos na comunidade. 10ª Por seu turno, o Tribunal a quo atendeu, convenientemente, às consequências sofridas pelos ofendidos com a conduta do ora recorrente, a elevada energia empregue pelo mesmos para a perpetração da factualidade apurada, nomeadamente mediante utilização de arma branca, bem como ao seu percurso de vida e suas motivações. 11ª Por conseguinte, Tribunal a quo aplicou penas parcelares adequadas e, consequentemente, uma pena única ajustada face aos comandos consagrados nos artigos 40º, 50º e 53º do Código Penal. 12ª Relativamente ao perdimento do veículo com matrícula ..-XT-.. a favor do Estado, consideramos que o Tribunal a quo não merece reparo nessa matéria, porquanto resulta da matéria de facto dada como provada que o ora recorrente utilizou esse veículo para a perpetração dos crimes de furto e roubo, tendo sido um meio indispensável para esse efeito, caso contrário não teria tido a capacidade de perpetrar esses ilícitos penais num espaço de tempo tão reduzido. 13ª Deste modo, o Tribunal a quo concluiu, assertivamente, pela existência de uma ligação funcional e instrumental entre esse veículo a perpetração desses ilícitos penais, estando, por isso, reunidos os pressupostos consagrados no art.º 109º do Código Penal para o seu perdimento a favor do Estado. Por conseguinte, o recurso interposto não deverá de merecer provimento.» 5. Cumprido o disposto no artigo 416º CPP o senhor Procurador-Geral Adjunto no STJ, emitiu parecer que conclui nos seguintes termos: « Concluindo-se: A. Relativamente ao pedido efetuado no sentido de se entenderem os factos integradores do crime de coação na forma tentada como consumidos pelo crime de roubo, deverá ser o recurso julgado improcedente, porquanto existe efetivo concurso real entre os dois crimes: o de coação foi praticado em momento posterior à consumação do de roubo, ganhando autonomia. B. Quanto ao crime de ofensa à integridade física qualificada na forma tentada pelo qual foi o arguido/recorrente condenado, entende-se – como por este pedido – que deverá ser absolvido da prática desse crime, pois que, não resultando dos factos provados elementos que permitam concluir pela especial censurabilidade ou perversidade na sua atuação, se verificou insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos em que esta figura é caracterizada na alínea a) do nº 2 do artº 410º do CPP, apenas se mostrando preenchidos os elementos integradores de uma tentativa de ofensa à integridade física, que constitui atividade não punível criminalmente. C. Foi correta a condenação do arguido pela prática do crime de detenção de arma proibida, pois que a faca por si utilizada na prática dos crimes de roubo, não obstante utilizada na sua profissão, ter sido utilizada fora dos locais do seu normal emprego, sem que para tal exista justificação válida. D. Entendem-se as penas parcelares como corretamente escolhidas na decisão recorrida, apenas havendo agora que – a ser entendido como atrás mencionado no ponto B.-reformular o cúmulo jurídico, sugerindo-se que a pena única a aplicar se situe em volta dos 5 anos e 4 meses de prisão. E. Por fim, relativamente ao perdimento do veículo pertença do arguido a favor do Estado, entende-se dever ser o recurso julgado procedente e revogada tal decisão, por para tal perdimento não se mostrarem reunidos todos os requisitos exigidos no artº 109º do Código Penal.» 5. Foram colhidos os vistos legais e procedeu-se a julgamento, com observância do formalismo legal, cumprindo, agora, apreciar e decidir o presente recurso. II.FUNDAMENTAÇÃO 1. Delimitação do objeto do recurso – questões a decidir. Conforme jurisprudência constante, são as conclusões extraídas pelos recorrentes que delimitam o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, conforme pode ler-se, por todos, no texto do Ac STJ de 117.09.1997, CJ-STJ, A. V, T.III/p. 173: “ É sabido que o âmbito dos recursos é determinado pelas questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da motivação (conf. arts 402º, 403º e 412º do CPP), podendo o tribunal ad quem, contudo, conhecer, para além dessas questões, de nulidades de conhecimento oficioso que não devam considerar-se sanadas (conf. arts 410º nº3 e 433º do CPP)”. Assim, in casu, são as seguintes as questões que, integrando o objeto do recurso, se impõe decidir: - Da qualificação jurídico-penal dos factos provados relevantes para o preenchimento do tipo legal de coação na forma tentada , p. e p. pelos artigos 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º, n.º 1, alíneas a) e b), 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, pelo qual foi condenado na pena parcelar de quatro meses de prisão [apenso 419/22.6...] e da qualificação jurídico-penal dos factos provados relevantes para o preenchimento do tipo legal de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, n.º 1, alínea h), do Código Penal, pelo qual foi condenado na pena de um ano de prisão, pois o arguido pretende ser absolvido desses dois crimes por não se mostrarem preenchidos os respetivos tipos legais; - Da medida concreta das penas parcelares aplicadas (pela prática de cada um dos crimes), por considerar o recorrente que as mesmas se mostram excessivas e que devem antes ser aplicadas as penas concretas que concretiza para cada uma delas: um mês de prisão pelo crime de furto; um ano e dois meses de prisão por cada um dos crimes de roubo; seis meses de prisão por cada um dos crimes de roubo na forma tentada e em cúmulo jurídico na pena única de três anos de prisão. - Da medida concreta da pena única a aplicar em cúmulo jurídico que entende dever ser de 3 anos de prisão; - Da substituição daquela pena única de 3 anos prisão por igual período de suspensão da sua execução. Na motivação de recurso o arguido tece ainda algumas considerações relativamente ao crime de “detenção de arma proibida”, concluindo que o crime de “detenção de arma proibida” se mostra consumido pelos crimes de roubo praticado, pelo que dele também deverá o arguido ser absolvido” referindo-se ali igualmente ao “perdimento a favor do Estado” do veículo automóvel ..-XT-.., concluindo que aquele veículo “… nunca poderia ter sio declarado perdido a favor do Estado, atento o disposto no nº3 do artigo 109º do Código Penal”. Sucede, porém, que apesar de o fazer no corpo da motivação, o arguido não se refere nas suas conclusões ao crime de detenção de arma nem à perda de veículo a favor do Estado, pelo que essas questões não integram o objeto do recurso conforme o entendimento jurisprudencial constante a que se alude acima ao reafirmar-se que são as conclusões a delimitar o objeto do recurso, podendo ver-se ainda, nos termos ora enunciados, Simas Santos-Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª ed.-2007 p. 103, em cuja nota 116 pode ler-se: “…se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objeto do recurso), o Tribunal superior só conhecerá das que constam das conclusões.”. 2. O tribunal de condenação julgou provada a seguinte factualidade: « A) FACTOS PROVADOS: Com relevância para a decisão, resultaram provados os seguintes factos: A1) RELATIVOS AO APENSO N.º 375/22.0...: 1. Nodia30deabril2022,pelas 21:28,AA, ao volante do veículo automóvel com a matrícula ..-XT-.., de marca Ford, modelo Transit, registado em nome da sociedade “A..... ....... .........., Lda.,” da qual AA é sócio-gerente, ao posto de abastecimento de combustível CEPSA, sito na Zona ...,..., pertencente à sociedade “S........., Lda.”, onde abasteceu o referido veículo com gasóleo simples, no valor de € 84,12 (oitenta e quatro euros e doze cêntimos); 2. Após, abandonou o local sem proceder ao pagamento da quantia referida em 1), fazendo seu o gasóleo; 3. AA, com a conduta descrita, visou, de forma voluntária, livre e consciente, fazer seu o gasóleo, sem pagar o respetivo preço, sabendo que o mesmo não lhe pertencia, que agia contra a vontade de quem pudesse pertencer e que, dessa forma, praticava conduta proibida e punível por lei; A2) RELATIVOS AO APENSO N.º 187/22.1...: 4. No dia 8 de maio de 2022, pelas 10:15, AA entrou no estabelecimento de restauração denominado “A.......e”, sito na Avenida ..., ..., ..., e dirigiu-se a BB [doravante BB], proprietário do dito estabelecimento, e disse-lhe “isto é um assalto, entregue já a quantia de € 40,00, se não faço-lhe mal”; 5. BB disse que não entregava dinheiro e colocou o seu corpo entre AA e a caixa registadora, que se encontrava atrás do balcão; 6. Em ato contínuo, AA: 6.1.empurrou BB, fazendo-o embater com corpo no balcão; 6.2.contornou o balcão, abriu a caixa registadora e daí retirou a quantia monetária de € 100,00 (cem euros); 6.3. dirigiu-se para a porta do estabelecimento, deixando cair, no interio do mesmo, a quantia de € 5,00 (cinco euros); 7. No exterior no estabelecimento, AA dirigiu-se ao veículo identificado em 1) e ausentou-se do local ao volante do mesmo, levando consigo a quantia de € 95 (noventa e cinco euros), que fez sua; 8. AA, ao atuar da forma descrita: 8.1. visou, de forma voluntária, livre e consciente, atingir o corpo de BB para, dessa forma, fazer sua a quantia monetária que encontrou no interior da caixa registadora, sabendo que não lhe pertencia e que agia contra a vontade de quem pudesse pertencer; 8.2. sabia que praticava conduta proibida e punível por lei; A3) RELATIVOS AO APENSO N.º 411/22.0...: 9. No dia 11 de maio de 2022, pelas 6:50, AA entrou no estabelecimento de restauração denominado “C... ..........”, sito na Rua ..., em ..., trazendo consigo uma faca, formada por um cabo de madeira com 11 centímetros e com uma lâmina de aço, com comprimento de 12 centímetros, aqualhabitualmente transportavano interior do veículo identificado em 1) para a levar e usar nos locais onde exercia a sua profissão de empresário de construção civil; 10. No interior do referido estabelecimento encontrava DD [doravante DD], proprietária o mesmo, a quem AA se dirigiu, dizendo-lhe: “a caixa ou a vida”; 11. DD disse-lhe que não havia dinheiro na caixa: 12. Em ato contínuo, AA exibiu e apontou a faca mencionada em 9) na direção de DD e disse-lhe “a caixa ou a vida, isto é um assalto”; 13. Temendo pela sua vida e integridade física, DD afastou-se da caixa registadora e AA visualizou que seu interior não se encontravam quaisquer notas ou moedas; 14. De seguida, AA, saiu do interior do referido estabelecimento e seguiu em direção ao Largo ..., onde entrou no veículo automóvel identificado em 1), e iniciou a marcha pela rua em direção à bomba de gasolina da “BP” de...; 15. AA, ao atuar da forma descrita, visou, de forma voluntária, livre e consciente: 15.1. exibir a faca descrita em 9) a DD para, dessa forma, a determinar a afastar-se da caixa registadora e aceder à mesma e daí retirar e fazer seu o dinheiro que aí pudesse ser encontrado, ciente que não lhe pertencia e que agia contra a vontade de quem pudesse pertencer; 15.2. Trazer consigo a facareferida em 9) emlocal ondenão exercia a sua profissão, ciente que não tinha justificação para a deter e usar naquele local; 16. AA sabia que as condutas que adotou são proibidas e puníveis por lei; A4) RELATIVOS AO APENSO N.º 412/22.9...: 17. No dia 11 de maio de 2022, pelas 7:30, AA entrou na padaria/pastelaria denominada “T.... . ...”, sita na Rua ..., ..., em ..., propriedade de HH [doravante HH], e dirigiu-se a EE [doravante EE], funcionária do aludido estabelecimento, e, exibindo a faca descrita em 9) à mesma, disse-lhe “isto é um assalto, abre a gaveta devagar que eu só quero as notas”; 18. Temendo pela sua vida e integridade física, EE abriu a caixa registadora e entregou a AA a quantia de € 40 (quarenta euros) em numerário, que se encontrava no interior da referida caixa, e pertença de HH; 19. De seguida, AA saiu do interior do referido estabelecimento e, ao volante do veículo automóvel identificado em 1), saiu daquele local, levando e fazendo sua a quantia em dinheiro referida em 18); 20. AA, ao atuar da forma descrita, visou, de forma voluntária, livre e consciente: 20.1. exibir a faca descrita em 9) a EE para, dessa forma, a determinar a entregar-lhe o dinheiro, ciente que o mesmo não lhe pertencia e que agia contra vontade de quem pudesse pertencer; 15.3. Trazer consigo a referida em 9) em local onde não exercia a sua profissão, ciente que não tinha justificação para a deter e usar naquele local; 21. AA sabia que as condutas que adotou são proibidas e puníveis por lei; A5) RELATIVOS AO APENSO N.º 413/22.7...: 22. No dia 11 de maio de 2022, pelas 7:33, AA dirigiu-se, ao volante do veículo automóvel identificado em 1), à paragem de autocarros existente na EN ..., junto ao cruzamento na Rua ..., direção .../..., onde se encontrava FF [doravante FF]; 23. Do interior do referido veículo, AA exibiu a FF a faca identificada em 9) e disse-lhe “Dá-me só o dinheiro! Dá-me só o dinheiro!”; 24. Temendo pela sua vida e integridade física, FF tirou € 5 (cinco euros), em moedas, que estavam no interior da sua carteira e entregou-os a AA; 25. Após, AA saiu do local, ao volante da referida viatura, levando consigo o dinheiro, que fez seu; 26. AA, ao atuar da forma descrita, visou, de forma voluntária, livre e consciente: 26.1. exibir a faca descrita em 9) a FF para, dessa forma, a determinar a entregar-lhe o dinheiro, ciente que o mesmo não lhe pertencia e que agia contra vontade da mesma; 15.4. Transportar consigo a faca referida em 9) em local onde não exercia a sua profissão, ciente que não tinha justificação para a deter e usar naquele local; 27. AA sabia que as condutas que adotou são proibidas e puníveis por lei; A6) RELATIVOS AO APENSO N.º 308/22.4...: 28. No dia 11 de maio de 2022, pelas 19:30, AA entrou no estabelecimento de restauração denominado “A......”, sito na Avenida ..., em ..., exibiu a faca descrita em 9) II [doravante II] e JJ [doravante JJ], respetivamente proprietária e funcionária do mencionado estabelecimento, e disse-lhes “quero o dinheiro”; 29. JJ e II recusaram-se entregar qualquer quantia, tendo esta última atirado um jarro em vidro na direção de AA, não lhe acertando; 30. Em ato contínuo, AA saiu do estabelecimento dirigiu-se à viatura automóvel identificada em 1) e, antes de entrar na mesma, deixou cair na via pública a faca descrita em 9), a qual foi apreendida; 31. Nas circunstâncias de tempo e lugar descritas em 28), a caixa registadora do Restaurante “A......”, continha a quantia de € 350 (trezentos e cinquenta euros), em numerário; 32. AA, ao atuar da forma descrita, visou, de forma voluntária, livre e consciente: 32.1. exibir a faca descrita em 9) a II e JJ para, dessa forma, as determinar a entregar-lhe o dinheiro que pudesse existir na caixa registadora, ciente que o mesmo não lhe pertencia e que agia contra vontade das mesmas; 15.5.[32.2] Transportar consigo a faca referida em 9) em local onde não exercia a sua profissão, ciente que não tinha justificação para a deter e usar naquele local; 33. AA sabia que as condutas que adotou proibidas e puníveis por lei; A7) RELATIVOS AOS AUTOS PRINCIPAIS [NUIPC 309/22.2GDLLE] : 34. No dia 11 de maio de 2022, após as 19:30, AA entrou no estabelecimento “C...... .... ...”, sito em Rua ..., Edifício..., ..., em ..., propriedade de KK [doravante KK], levando à cintura, por baixo da camisola, uma faca, da marca Masterclass, formada por um cabo em metal (inox), com 12 centímetros de comprimento e com uma lâmina em metal (inox), com 10 cm de cumprimento, e dirigiu-se ao balcão, onde atrás do mesmo se encontrava CC [doravante CC], mulher de KK 35. Ato contínuo, AA encaminhou-se para junto da caixa registadora, pelo lado interior do balcão, ao mesmo tempo que tinha colocada a sua mão dentro da camisola e sobre o cabo da faca que trazia consigo e disse a CC, “Caixa, Caixa”; 36. De imediato, CC puxou a gaveta da caixa registadora, mas não logrou abri-la, altura em que o AA arrancou e separou o ecrã da caixa registadora da respetiva gaveta, colocou a gaveta debaixo do braço, assim como a quantia em numerário de € 160 (cento e sessenta euros), que a mesma continha no seu interior, pertença de CC e KK; 37. Após, AA saiu do referido estabelecimento comercial, e entrou no veículo automóvel identificado em 1), e, ao volante do mesmo, ausentou-se do local, fazendo sua a gaveta e o dinheiro; 38. AA, ao atuar da forma descrita, visou, de forma, voluntária, livre e consciente: 38.1. Dar a entender a CC que trazia consigo a faca descrita em 34) para, dessa forma, a determinar a entregar o dinheiro que se encontrava no interior da caixa registadora, sabendo que o mesmo não lhe pertencia, que agia contra a vontade de quem pudesse pertencer; 38.2. Partir o dispositivo que trancava a gaveta da caixa registadora para, dessa forma, fazer seu o dinheiro que aí pudesse encontrar; 39. AA sabia que praticava conduta proibida e punida por lei; A8) RELATIVOS AO APENSO N.º 418/22.8...: 40. No dia 12 de maio de 2022, pelas 8:40, AA entrou no estabelecimento comercial “S..... ... ...”, sito na Av.ª ..., ..., ..., em ..., ..., e exibiu a faca descrita em 34) a LL, proprietário do referido estabelecimento, ao mesmo tempo que lhe dizia: “abre a caixa”; 41. LL abriu a caixa e retirou do seu interior € 5 (cinco euros), de sua pertença; 42. Após, AA saiu do estabelecimento, levando consigo o dinheiro, que fez seu; 43. AA quis, de forma livre e voluntária, exibir a faca descrita em 34) a LL para, dessa forma, o determinar a entregar-lhe o dinheiro que pudesse existir na caixa registadora, ciente que o mesmo não lhe pertencia, que agia contra vontade do mesmo; 44. AA sabia que, ao agir com descrito, praticava conduta proibida e punível por lei; A9) RELATIVOS AO APENSO N.º 419/22.6...: 45. No dia 12 de maio de 2022, pelas 9:00, AA entrou no estabelecimento comercial denominado “C......o”, sito na Av.ª ..., em ..., propriedade da sociedade “C.......,Lda.”,contornou o balcão, atrás do qual se encontrava MM [doravante MM], funcionária do aludido estabelecimento comercial, exibiu-lhe a faca descrita em 34) e disse-lhe “é um assalto”; 46. Temendo pela sua vida e integridade física, MM abriu a caixa registadora e AA retirou do seu interior a quantia de € 50 (cinquenta euros), pertença da sociedade “C......., Lda.” ; 47. Com o dinheiro na sua posse, AA dirigiu a MM as seguintes palavras: “Se ligares à polícia, dou-te uma facada”; 48. Seguidamente, AA saiu do estabelecimento, levando consigo o dinheiro, que fez seu; 49. AA: 49.1. Ao exibir a faca descrita em 34) a MM, quis, de forma livre e consciente, determinar a mesma a entregar-lhe odinheiroque pudesse existir na caixa registadora, ciente que o mesmo não lhe pertencia, que agia contra vontade de quem pudesse ser o dono; 49.2. Ao dirigir MM as palavras mencionadas em 47) sabia que estava a anunciar que atentaria contra a vida da mesma, ciente que tal anúncio era adequado a provocar-lhe medo e inquietação, o que, de forma livre e consciente, quis; 50. AA sabia que, ao agir da forma descrita, praticava condutas proibidas e puníveis por lei; A10) RELATIVOS AO INQUÉRITO APENSADO N.º 26/22.3...: 51. No dia 12 de maio de 2022, pelas 14:47 minutos, AA entrou no estabelecimento comercial denominado “B.. .....”, sito na Av.ª ..., em ..., propriedade de NN e da sua mulher, com um chapéu de pala, de cores vermelha e branca colocado na cabeça, com o símbolo do da personagem de banda desenha “Batman”, com óculos de sol, com lentes espelhadas, da marca Northweek, de cores azul e preto e trazendo a faca identificada em 34); 52. De seguida, AA contornou e entrou para o lado interior do balcão, puxou da faca que trazia enfiava na cintura das calças e por baixo da T- shirt que envergava, exibiu-a a OO [doravante OO], filha dos proprietários, e, em simultâneo, disse-lhe “abre a caixa”, no interior da qual se encontrava a quantia de € 120 (cento e vinte euros); 53. OO respondeu “como?” e, em ato contínuo, AA rodou a chave que estava inserida na fechadura da gaveta da caixa registadora e abriu a mesma, altura em OO, empurroucom a sua mão esquerda a referida gaveta para a fechar, tendo AA voltado a puxar, com a sua mão esquerda, a gaveta para a abrir, ao mesmo tempo que empunhava, na sua mão direita, a faca por cima da sua cabeça, apontando-a à cabeça de OO; 54. De seguida, colocou a sua mão esquerda dentro da gaveta para alcançar o dinheiro que aí se encontrava, tendo OO avançado em direção a AA e colocado as suas mãos na gaveta para evitar que o mesmo lograsse levar o dinheiro, a mesmo tempo que gritava, tendo AA efetuado movimentos de avanço e recuo em direção ao tronco de OO, para que esta se mantivesse afastada da gaveta da caixa registadora; a qual, instintivamente, recuou para evitar ser atingida pela faca em direção; 55. Alertados pelos gritos, o pai e a mãe de OO dirigiram-se ao local onde a mesma estava, altura em que AA saiu do interior do estabelecimento a correr, sem levar consigo o dinheiro ou qualquer outro bem; 56. No exterior do estabelecimento, AA enfiou na sua cabeça, até às orelhas, uma meia de vidro de cor creme, com parte das pernas cortadas, e dirigiu-se, com a faca identificada em 34) na mão, na direção oposta à que havia deixado estacionada a viatura identificada em 1); 57. Nesse momento, os militares da GNR PP [doravante PP] e QQ [doravante QQ] que se encontravam a fazer vigilância e seguimento a AA e trajavam à civil, ao verificarem o descrito em 56), seguiram no seu encalço, pela Rua ..., Rua ... e Rua ...; 58. OO, que havia saído do estabelecimento e informada por vizinhos que ali se encontravam do local onde estava estacionado o veículo automóvel identificado 1), abriu a porta do condutor e tirou da ignição as chaves da viatura, para evitar que AA pudesse ausentar-se do local ao volante do mencionado veículo; 59. O militar da GNR GG [doravante GG], que integrava a equipa de vigilância e seguimento e também trajava à civil, dirigiu-se para Avenida ..., local onde AA havia deixado estacionada a viatura identificada em 1), e colocou-se junto à mesma a vigiar que a ela regressava o arguido; 60. Após chegar Rua ... nos moldes descritos em 57), AA rumou até à rua onde estava estacionada a viatura identificada em 1), altura que GG colocou o seu corpo entre a viatura e AA, para evitar que este acedesse ao interior daquela viatura; AA, deparando-se com o descrito em 60), avançou, com faca identificada em 34) na mão, em direção GG, pessoa que desconhecia ser militar da GNR, e esticou o braço em direção ao quadrante superior direito do abdómen daquele, com o intuito de o atingir nessa zona com a faca, de forma a que o mesmo se desviasse do local onde estava e o deixasse aceder ao interior da viatura identificada em 1); 62. GG recuou instintivamente, evitando, dessa forma, que a lâmina da faca atingisse o seu abdómen e, em simultâneo, retirou e apontou a sua arma de serviço em direção às pernas AA, ao mesmo tempo que gritava: “para, GNR”; 63. Nesse momento, AA, largou a faca, que caiu ao solo e, de seguida, foi-lhe dada voz de detenção, tendo, nessa sequência, sido imobilizado, algemado e revistado; 64. Após, os elementos da GNR procederam à apreensão: 64.1. Da faca descrita em 34); 64.2. Do chapéu, e o par de óculos descritos em 51); 64.3. A meia descrita em 56); 64.4. Do par de ténis, da marca adidas, de cor azul, que o AA calçava; 64.5. Do par de calças de fato-de-treino, de cor cinzenta e a t-shirt, de cor cinzenta clara, que AA vestia; 64.6. Do relógio, da marca “Mormaii”, modelo MO5000, que AA trazia colocado no pulso; 64.7. Da quantia de € 22,02 (vinte e dois euros e dois cêntimos) em notas e moedas e de quatro cartões de contato em nome de “AA”, que AA trazia acomodados no interior da roupa que envergava; 65. AA: 65.1. Ao exibir a faca descrita em 34) a OO nos moldes descritos em 51), quis, de forma livre e consciente, determinar a mesma a entregar-lhe o dinheiro que pudesse existir na caixa registadora, ciente que o mesmo não lhe pertencia, que agia contra vontade de quem pudesse pertencer; 65.2. Ao dirigir a faca descrita em 34) em direção ao abdómen de GG nos moldes descritos em 60), quis, de forma livre e consciente, atingir o corpo daquele, contra a vontade do mesmo, ciente que fazia uso de um objeto com características corto-perfurantes; 66. AA sabia as condutas que assumiu proibidas e puníveis por lei penal. A11) RELATIVOS ÀS CONDIÇÕES PESSOAIS, SOCIOECONÓMICAS: 67. AA completou o 12º ano no Brasil, seu país de origem, onde casou com RR há 27 anos; 68. Dessa relação nascerem duas filhas, atualmente com 20 e 24 anos; 69. No Brasil trabalhava na construção civil até emigrar para Portugal com a mulher e as filhas no ano de 2009, onde trabalhou na construção civil até ano de 2012, altura em que regressou ao Brasil, juntamente com o seu agregado familiar; 70. No ano de 2016 voltou a emigrar para Portugal com a sua mulher e filhas, onde constituiu a empresa identificada em 1), cujo objeto é o de pinturas da construção civil, e da qual retirava o rendimento de € 1200 (mil e duzentos euros mensais); 71. O seu relacionamento marital e com a suas filhas é pautado pela interajuda; 72. AA: 72.1. No ano de 2019 iniciou o consumo de cocaína; 72.2. No decurso do ano de 2021 sofreu ataques de pânico, que conduziram ao seu internamento hospital, ao seu seguimento na psiquiatria e à toma de medicação; 73. No período entre 30 de abril e 12 de maio de 2022, AA: 73.1. Residia em casa arrendada, com condições da habitabilidade, com a mulher, as filhas e o neto, filho da descente mais velha; 73.2. A sua mulher não trabalhava; 73.3. Consumia cocaína, dois a três dias por semana, pagando € (cinquenta euros) por meia grama, e ingeria bebidas alcoólicas em excesso; 73.4. Sofria de ataques de pânico; 73.5. Não conseguia tirar proventos da sociedade identificada em 1), a qual, devido à falta de pagamento dos clientes, apresentava prejuízo; 73.6. Foi abordado por pessoas que lhe vendiam cocaína, que o pressionaram, mediante ameaça de agressão física, para pagar uma dívida no valor de € 1.000 (mil euros); 74. AA confessou integralmente e sem reservas, os factos relativos aos apensos 375/22.0...; 412/22.9...; 413/22.7..., 308/22.4... e confessou parcialmente dos factos relativos aos demais apensos e aos autos principais; 75. AA decidiu praticar os factos acima descritos para obter proventos que lhe permitissem saldar a dívida contraída pela compra de cocaína e para poder continuar a comprá-la; 76. A mulher de AA, após a sua detenção e pedido do mesmo: 76.1. pagou o valor do gasóleo de que ser apropriou nos moldes descritos em 1) a 3), procurou entregar € 50 (cinquenta euros) ao responsável pela sociedade “C.......”, o qual disse que apenas em tribunal aceitava receber tal quantia; 76.2. procurou outros lesados para lhes comunicar que pretende ressarcir os mesmos dos danos causados, mas que, de momento, não é possível por incapacidade financeira para o efeito; 77. Desde que foi preso preventivamente à ordem destes autos no dia 14 de maio de 2022, tem apresentando um comportamento adequado às normas institucionais e recebe visitas da mulher e filhas; 78. AA é primário; * * * B) FACTOS NÃO PROVADOS: Com relevância para a decisão, não se provaram os seguintes factos: B1) RELATIVOS AO APENSO 375/22.0...: a) No circunstancialismo descrito em 4) a 6.3. dos factos provados AA retirou e fez sua a quantia de € 40 (quarenta euros); B2) RELATIVOS AO APENSO N.º 308/22.4...: b) A caixa registadora referida em 31) dos factos provados continha no seu interior a quantia de € 500 (quinhentos euros); B3) RELATIVOS AOS AUTOS PRINCIPAIS [NUIPC 309/22.2GDLLE]: c) A caixa registadora referida em 36) dos factos provados continha no seu interior a quantia de € 180 (cento e oitenta euros); B4) RELATIVOS AO APENSO N.º 418/22.8... d) No circunstancialismo descrito em 40) a 41) dos factos provados, AA bateu com a lâmina da faca em cima do balcão, tentou agarrar LL inclinou sobre o balcão e retirou € 5 (cinco euros); e) A caixa registadora referida em 36) dos factos provados continha no seu interior a quantia de € 180 (cento e oitenta euros); B5) RELATIVOS AO APENSO N.º 26/22.3...: f) No circunstancialismo descrito em 51) dos factos provados, AA, trazia enfiada na cabeça até às orelhas, a meia de vidro, de cor creme, com a parte das perneiras cortada; g) A caixa registadora referida em 52) dos factos provados continha no seu interior a quantia de a quantia de € 180 (cento e oitenta euros); h) Quando AA saiu do interior do estabelecimento “B.. .....” nos moldes descritos em 56) dos factos provados, os militares identificados em 57) dos factos provados, intercetaram-no, informaram-no que eram da GNR, deram-lhe voz de detenção e ordenaram-lhe que largasse a faca de cozinha que trazia na mão; i) No circunstancialismo descrito em 61) dos factos provados AA sabia que GG era militar da GNR; j) AA, ao atuar da forma descrita em 61) quis, de forma livre e consciente, obstar que GG procedesse à sua detenção; * * * C) MOTIVAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO: (…) Não se transcreve a motivação da decisão da matéria de por não ser a mesma relevante para decisão do presente recurso. 3. Apreciemos então as questões objeto do recurso. 3.1. Da qualificação jurídico-penal dos factos relativos ao crime de coação na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º, n.º 1, alíneas a) e b), 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, pelo qual foi condenado na pena parcelar de quatro meses de prisão. A este propósito alega o arguido na sua motivação de recurso que a matéria de facto provada nos pontos 45 a 49 não é de molde a preencher aquele tipo legal de crime, pois, como diz, a “ameaça” que preenche o tipo legal de crime, terá resultado da expressão proferida pelo arguido, “se ligares à polícia, dou-te uma facada”, mas tal expressão tem que ser entendida na dinâmica do comportamento do arguido como um elemento de “violência” que serve apenas para qualificar o seu comportamento como crime de roubo. A referida expressão não tem independência relativamente ao crime de roubo, pelo que sempre este comportamento (coacção) se mostra consumido pelo crime de roubo. Por seu lado, é o seguinte o teor dos pontos 45 a 49 dos factos provados: « 45. No dia 12 de maio de 2022, pelas 9:00, AA entrou no estabelecimento comercial denominado “C......o”, sito na Av.ª ... em ..., propriedade da sociedade“C......., Lda.”, contornou o balcão, atrás do qual se encontrava MM [doravante MM], funcionária do aludido estabelecimento comercial, exibiu-lhe a faca descrita em 34) e disse-lhe “é um assalto”; 46. Temendo pela sua vida e integridade física, MM abriu a caixa registadora e AA retirou do seu interior a quantia de € 50 (cinquenta euros), pertença da sociedade “C........ Lda.” ; 47. Com o dinheiro na sua posse, AA dirigiu a MM as seguintes palavras: “Se ligares à polícia, dou-te uma facada”; 48. Seguidamente, AA saiu do estabelecimento, levando consigo o dinheiro, que fez seu; 49. AA: 49.1.Ao exibir a faca descrita em 34) a MM, quis, de forma livre e consciente, determinar a mesma a entregar-lhe o dinheiro que pudesse existir na caixa registadora, ciente que o mesmo não lhe pertencia, que agia contra vontade de quem pudesse ser o dono; 49.2.Ao dirigir MM as palavras mencionadas em 47) sabia que estava a anunciar que atentaria contra a vida da mesma, ciente que tal anúncio era adequado a provocar-lhe medo e inquietação, o que, de forma livre e consciente, quis;» Ora, em face da factualidade ora transcrita não tem o arguido razão ao pretender que a conduta descrita se encontra consumida pelo crime de roubo, porquanto as palavras que preenchem os elementos constitutivos do tipo objetivo do tipo legal de coação, “Se ligares à polícia, dou-te uma facada”, foram proferidas quando o arguido já se tinha apoderado da quantia que subtraíra e imediatamente antes de abandonar o estabelecimento ( factos provados (FP) nºs 47 e 48), pelo que aquelas não visavam impedir a ofendida de se opor à subtração, que já consumara, mas antes condicioná-la na sua liberdade de denunciar os factos ilícitos em causa às autoridades, meio da ameaça da prática de crime contra a vida, de modo a ficar impune pela prática dos mesmos, bem sabendo que a ameaça proferida era adequada a provocar-lhe medo e inquietação (FP 49.2) e desse modo a inibi-la de denunciá-lo. Assim, uma vez que a factualidade provada que se descreve sob os nºs 45 a 49 preenche os elementos constitutivos do crime de coação (ainda que na forma tentada) p. e p. pelo artigo 154º, ambos do C.Penal, e que a demais factualidade preenche os elementos constitutivos de um crime de roubo p. e p.. pelo artigo 210.º, n.os 1 e 2, al. b), por referência ao disposto no artigo 204.º, n.º 2, al. f), do CP, sem que possa dizer-se que a punição do arguido apenas por um dos crimes é suficiente para punir o facto no seu conjunto, não estamos perante mero concurso aparente ou concurso de normas mas sim perante uma pluralidade de crimes efetivamente cometidos (art. 30º nº1 do C.Penal), ou seja, em face de concurso efetivo de crimes a punir autonomamente, tal como decidiu o tribunal recorrido e entende o MP, tanto no tribunal recorrido como no STJ. Improcede, pois, o recurso nesta parte. 3.2. Da qualificação jurídico-penal dos factos relativos ao crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, n.º 1, alínea h), do Código Penal, pelo qual o arguido foi condenado na pena de um ano de prisão. Estão em causa os FP nºs 57º a 63º, praticados em 12.05.22 (apenso 26/22), para os quais se remete, relativamente aos quais o tribunal recorrido, nos termos do artigo 358º nº3 CPP, convolou a acusação pelo crime de resistência e coação sobre funcionário p. e p. pelo artigo 347º 1 C.Penal para a prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos artigos 143º, 145º nº 1 al. a) e nº2, conjugado com al. h) do nº 2 do artigo 132º, qualificação que se fundamenta in casu em ter o agente “… praticado o facto [utilizando] meio particularmente perigoso ou que se traduza na prática de crime de perigo comum”. O recorrente alega que não há lugar à qualificação do crime , pois “…a faca tinha apenas 10 centímetros, pelo que não pode ser tida como arma especialmente perigosa.”, concluindo que deve ser absolvido daquele crime. Por sua vez o MP no STJ entende que “… não resultando dos factos provados elementos que permitam concluir pela especial censurabilidade ou perversidade na sua atuação, (…) apenas se mostra[m] preenchidos os elementos integradores de uma tentativa de ofensa à integridade física, que constitui atividade não punível criminalmente.” 3.2.1. – Vejamos. Relativamente aos presentes factos e incriminação importa considerar, antes de mais, que a condenação do arguido pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos artigos 143º, 145º nº 1 al. a) e nº2, conjugado com al. h) do nº 2 do artigo 132º, todos do C.Penal, na forma consumada (na pena de 1 ano de prisão), carece de fundamento legal, pois da factualidade provada apenas emerge, inquestionavelmente, que a atuação do arguido se ficou pelo estádio da tentativa, uma vez que o ofendido não chegou a ser atingido na sua integridade física, conforme decorre claramente da factualidade provada, máxime FP 61 e 62, não se verificando, pois, o resultado típico essencial para a consumação do crime. A punibilidade da tentativa depende, porém, de que ao crime consumado corresponda pena superior a 3 anos de prisão (art. 23º nº 1 C.Penal), pelo que a conduta do arguido descrita sob os nºs 57 a 63 dos FP apenas será punível se a mesma for subsumível - como considerou o tribunal recorrido – ao tipo legal do crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, n.º 1, alínea h), com pena de prisão até 4 anos, pois o crime de ofensa à integridade física simples previsto pelo artigo 143º nº1 apenas é punível com prisão até 3 anos. A qualificação da ofensa à integridade física no caso presente releva do modo de cometimento do crime (al. h) do nº2 do art. 132º), alegando o arguido no essencial que “ … a faca tinha apenas 10 centímetros, pelo que não pode ser tida como arma especialmente perigosa”, sendo irrelevante nesta sede a alegação de que “…. desconhecia que a pessoa que estava à sua frente era agente da autoridade …”. Por sua vez, o acórdão recorrido considerou o seguinte, ao proceder à qualificação jurídico penal dos factos em causa: - “…provou-se] que o arguido praticou atos de execução que visavam lesar a integridade física de GG, pois o mesmo esticou o braço em que se segurava uma faca, dotada de uma lâmina com 10 cm, em direção ao abdómen de GG, não o logrando atingir, porque aquele recuou. O uso da faca em causa, nas circunstâncias apuradas, constitui um meio particularmente perigoso, dado que aumenta o potencial agressor do agente e diminuindo, na razão inversa, a capacidade defensiva da vítima. O modo como foi utilizada a faca não só dificultou as possibilidades de defesa da vítima, como aumentou o potencial agressor, tornando-o, porventura, mais apto a causar lesões graves, mesmo irreversíveis. Estamos, assim, seguramente, perante um instrumento que não pode deixar de se considerar como de cariz particularmente perigoso, no que se reporta à execução do crime de ofensa à integridade física e que, atento o modo e circunstâncias que rodearam a sua utilização, revela, inequivocamente, a especial censurabilidade dos factos e perversidade do agente”. Concordamos no essencial com o acórdão recorrido, cabendo acrescentar que apesar de respeitarem essencialmente à ilicitude, à gravidade do facto, os factos destacados pelo tribunal a quo , ou seja, “…a faca não só dificultou as possibilidades de defesa da vítima, como aumentou o potencial agressor, tornando-o, porventura, mais apto a causar lesões graves, mesmo irreversíveis.”, revelam igualmente a especial censurabilidade do arguido pressuposta no artigo 132º nº1 porquanto traduzem forma de realização do facto especialmente desvaliosa, ao agir o arguido contra a integridade física do ofendido nas circunstâncias em que o fez. Por um lado, não hesitou em usar a faca na direção do ofendido que se limitava a interpor-se entre ele e o automóvel, visando atingi-lo para o afastar de si; por outro lado, fê-lo de modo a atingi-lo efetivamente na sua integridade física (não se limitando a mostrar-lhe a faca ou a ameaçá-lo) e fê-lo com faca de 10 cm de lâmina (no limite da punibilidade do crime de uso e porte de faca), instrumento capaz de diminuir as possibilidades de defesa do ofendido, dada a forma direta e repentina como procurou fazê-lo, sendo igualmente meio apto a aumentar significativamente o potencial danoso da ofensa contra o corpo daquele, como bem refere o acórdão recorrido. Conclui-se, pois, que as ofensas à integridade física tentadas foram praticadas em circunstâncias que revelam especial censurabilidade, operando-se a qualificação do crime nos termos do artigo 132º nºs 1 e 2 al. h) em conjugação com os artigos 145º nºs 1 al. a) e 2, do C.Penal. Posto isto, concluímos que os factos provados descritos sob os nºs 57 a 63 preenchem efetivamente os elementos constitutivos do crime de ofensa à integridade física qualificada p. e p. pelos artigos 143º, 145º nº 1 al. a) e nº2, conjugado com al. h) do nº 2 do artigo 132º, embora na forma tentada, pelo que o recurso do arguido improcede nos seus termos, sem prejuízo da qualificação jurídico penal dos factos ora operada e da consequente (re)apreciação da medida concreta da pena correspondente ao crime tentado e seus efeitos na medida da pena única, a que se procederá em sede de apreciação do recurso em matéria de medida das penas. 3.3. Do recurso relativamente à medida concreta das penas parcelares. 3.3.1. A posição do arguido recorrente 3.3.1.1. O arguido alega que a medida concreta das penas parcelares se mostra excessiva e que “…todas elas devem ser fixadas muito próximo dos mínimos legais”, devendo o tribunal a quo ter tomado em conta sobretudo as seguintes circunstâncias: - Todos os crimes foram cometidos em escassos 12 dias (entre 30 de Abril e 12 de Maio) debaixo da mesma solicitação externa e com o mesmo objectivo, o que poderia até configurar apenas um crime continuado. Com efeito, foi dado como provado que o arguido iniciou o consumo de cocaína em 2019, em 2021 teve ataque de pânico que conduziu a tratamento psiquiátrico, não conseguia tirar da empresa rendimentos suficientes, foi abordado por pessoas que lhe vendiam cocaína que o pressionaram mediante ameaça física para pagar uma dívida de 1.000,00€ (factos provados 72 e 73), tendo sido neste contexto que os crimes foram cometidos; - Também se provou que o arguido confessou os factos (facto 74) e decidiu praticá-los para saldar aquela dívida face à ameaça de que foi alvo (facto 75); - Mais se provou que, após a sua detenção, o arguido pediu à sua mulher para falar comos lesados para lhes pedir desculpa e pagar-lhe os valores roubados o que ela fez (factos 75 e 76). - O arguido é primário e após os factos tem apresentado comportamento adequado às normas institucionais e recebe visitas da mulher e dos filhos (factos 77 e 78); - O arguido veio para Portugal em 2009 e atualmente vivia em casa arrendada com a mulher e filhos, com quem tem bom relacionamento e sempre trabalhou como pintor de construção civil (factos 67 a 71); - Tais factos são de molde a fazer crer que o comportamento do arguido entre os dias 30 de Abril e 12 de Maio de 2023 foi único e absolutamente excepcional, motivado pela descompensação provocada pelo consumo da cocaína e pela ameaça física dos traficantes que lha forneciam, para pagar a divida de 1.000,00€; - Com isto não se pretende “branquear” o comportamento do arguido que será sempre objetivamente grave por constituir um manifesto e intolerável desvalor social; - Contudo, também se não pode esquecer que o “modus operandi” do arguido denota manifesto “amadorismo”, aliás compatível com o facto provado de ser primário; - Se atentarmos aos factos, decorre que as mais das vezes o arguido tinha tanto ou mais medo que as vitimas; atente-se ao facto de no assalto ao “Restaurante A......” quando o arguido anunciou o “assalto” a funcionária atirou na sua direcção uma jarra de vidro que não lhe acertou, mas foi o suficiente para o arguido, apesar de munido com a dita faca, se ter posto em fuga, deixando cair a faca (factos 29 a 30). Acresce que a totalidade dos bens objecto de furto, roubo e tentativas de roubo não excedem, no conjunto dos crimes praticados, o montante de 500,00€ o que não pode, no seu conjunto, deixar de ser tido como valor diminuto. O douto Acórdão analisa a situação do arguido nos pontos 1 a 7 da pág 125 a 128, que, no seu conjunto justificam a aplicação das penas próximas dos mínimos da moldura penal de cada um dos crimes. Com efeito, como bem nota o douto Acórdão recorrido, não estamos perante uma tendência criminosa, mas uma situação excepcional provocada por factores exógenos pontuais, nada fazendo prever qualquer necessidade de prevenção especial. Contudo, de forma algo contraditória com a constatação feita nos referidos pontos 1 a 7 a pág. 125 a 128 do douto Acórdão, as penas aplicadas mostram-se exageradas. 3.3.1.2. Face à situação do arguido, globalmente considerada, deveria ter sido condenado apenas nas seguintes penas parcelares [ não incluindo as penas aplicadas pelos crimes cuja condenação impugnou, ou seja, os crimes de “coação na forma tentada” e de ofensa à integridade física qualificada, na forma tentada]: - Um mês de prisão pelo crime de furto; - Um ano e dois meses de prisão por cada um dos crimes de roubo; - Seis meses de prisão por cada um dos crimes de roubo na forma tentada. Em cúmulo jurídico destas penas, entende o arguido que deve ser aplicada a pena única de três anos de prisão. 3.3.2. O MP pronunciou-se como exposto supra. 3.3.3. Os fundamentos do acórdão recorrido (síntese) Como referido antes, o tribunal a quo condenou o arguido nas seguintes penas, pela prática, em concurso efetivo, dos seguintes crimes: - 1. Um crime de furto, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 203º, n.º 1, do Código Penal, na pena de três meses de prisão [APENSO 375/22.0...]; - 2. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º, e 210º, n.º 1, do Código Penal, na pena de um ano e três meses prisão [APENSO 187/22.1...]; - 3. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b), 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão [APENSO N.º 411/12.0...]; - 4. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.s1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e seis meses prisão [APENSO 412/22.9...; - 5. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.s1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e cinco meses prisão [APENSO 413/22.7...]; - 6. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b) e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e três meses de prisão [APENSO 308/22.4...]; - 7.Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de três anos e três meses prisão [AUTOS PRINCIPAIS:309/22.2GDLLE]; - 8. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e cinco meses prisão [APENSO 418/22.8...]; - 9. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e seis meses prisão [APENSO 419/22.6...]; - 10. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b), e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e três meses de prisão [APENSO 26/22.3...]; - 11. Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos artigos 14º, 26º, n.º 1, do Código Penal, e artigo 86º n.º 1, alínea d), por referência aos artigos 2º, n.º 1, alínea m) e 3º, n.º 2, alínea ab), da lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, redação da Lei n.º , na pena de nove meses de prisão [apensos 411/22.0..., 412/22.9..., 413/11.7... e 308/22.4...]; - 12. Um crime de ofensa à integridade física qualificada, p. e p. Artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, n.º 1, alínea h), do Código Penal, na pena de um ano de prisão [APENSO 26/22.3...]; - 13. Um crime de coação, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º, n.º 1, alíneas a) e b), 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de quatro meses de prisão [apenso 419/22.6...]. Em cúmulo jurídico destas penas, o tribunal a quo condenou o arguido na pena única de 6 anos de prisão. 3.3.4. Para fundamentar a medida das penas parcelares aplicadas, o tribunal a quo começou por definir quais as molduras legais aplicadas aos diversos crimes: - “Crime de furto: um mês a três anos de prisão ou multa de 10 (dez) a 360 (trezentos e sessenta) dias [artigo 203º, n.º 1, do Código Penal, por referência aos artigos 41º, n.º 1 e 47º, n.º 1, do mesmo diploma]; - Crimes de roubo: um mês a oito anos [artigo 210º, n.º 1, do Código Penal]; - Crime de roubo agravado: três a quinze anos de prisão [artigo 210º, n.º 2, do Código Penal]; - Crimes de roubo, na forma tentada: um mês a cinco anos e quatro meses de prisão [artigos 23º, n.º 2, 73º, n.º 1, alíneas a) e b) e 210º, n.º1, do Código Penal]; - Crime de roubo agravado, na forma tentada: sete meses e seis dias a dez anos de prisão [artigos 23º, n.º 2, 73º, n.º 1, alíneas a) e b) e 210º, n.º 2, do Código Penal]; - Crime de ofensa à integridade física qualificada: um mês a quatro anos de prisão [artigo145º, n.º 1 alínea a), do Código Penal, por referência aos artigos 41º, n.º 1 e 143º, n.º 1, do Código Penal, do mesmo diploma]; - Crime de detenção de arma proibida: um mês a quatro anos de prisão ou 10 (dez) a 480 (quatrocentos e oitenta) dias de multa [artigo 86º, n.º1, alínea d), da Lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, por referência aos artigos 41º, n.º 1 e 47º, n.º 1, do Código Penal]; - Crime de coação agravada, na forma tentada: um mês a três anos e quatro meses de prisão [artigo155º, n.º 1, por referência aos artigos 23º, n.º 2, 673º, n.º 1, alíneas a) e b), 154º, n.º 1, todos do Código Penal]; 3.3.5.Depois de encontradas as molduras legais, o tribunal recorrido justificou a opção pela pena principal de prisão nos casos em que o tipo legal previa ainda pena não privativa da liberdade (art. 70º C.Penal) e, prosseguindo com a determinação concreta das penas parcelares, começou por considerar, entre os fatores legais de determinação concreta da pena acolhidos no artigo 71º, o grau de ilicitude dos factos, modo de execução destes e suas consequências, relativamente aos diversos crimes em concurso, nos seguintes termos: “1.1. - sofreu lesões; 1.2. A pouca intensidade do empurrão desferido em BB, o qual não A ausência de contacto físico e concomitante ausência de lesões nos demais crimes de roubo; 1.3. A elevada intensidade da ameaça com perigo iminente para a integridade física: o arguido, exibiu, em oito dos nove crimes de roubo que praticou, facas, com lâminas de 12 e 10 cm, o que configura uma ameaça de grau intenso, dado o elevado poder dos objetos para causar lesões graves no corpo humano. 1.4. O valor diminuto do combustível furtado [€ 84,12] e os valores igualmente diminutos dos roubos referentes aos apensos 187/22.1... [€ 100], 412/22.9... [€ 40], 413/22.7... [€ 5], 418/22.8... [€ 5] 419/22.6... [€ 40]; 1.5. [€ 160]: 1.6. O baixo valor apropriado com a prática dos crimes de roubo no processo principal Os prejuízos potenciais no caso dos roubos tentados: € 350 no caso do apenso e € 120 no caso do apenso 26/22.3...; 1.7. A subtração de valor fechado em gaveta no caso dos autos principais [como já ficou dito, esta circunstância, por força do disposto no artigo 204º, n.º 3, do CP, pode ser valorada na determinação da medida concreta da pena, sem violação do princípio da proibição da dupla valoração]; 1.8. A elevada energia criminosa com que o arguido atuou aquando da ofensa à integridade física qualificada, na forma tentada, dado que o mesmo tentou esfaquear uma pessoa, logo após ter tentado cometer o seu nono crime de roubo, no espaço de quatro dias [de 4 a 8 de maio de 2022]; 1.9. A utilização de arma proibida em quatro situações diversas [embora estejamos perante um único crime de detenção de arma proibida, pode e deve ser valorado na medida da pena o número de vezes que essa arma foi usada, sem que tal constitua violação do princípio da proibição de dupla valoração]; 1.10. A elevada intensidade da ameaça com perigo para a integridade física aquando da prática do crime de coação, na forma tentada, dado que, como ficou dito para a prática dos crimes de roubo, a faca exibida é suscetíveis de causar lesões intensas”; 3.3.6. O tribunal a quo ponderou ainda: - No que se refere ao grau de culpa, “ a elevada intensidade dolosa, [pois o arguido], em todos os crimes, agiu sob a forma de dolo direto, que é forma mais gravosa de culpa e, como tal, implica um maior juízo ético-social de desvalor”; - No que se refere aos sentimentos manifestados no cometimento dos crimes e os fins e os motivos que os determinaram, o tribunal a quo considerou assumir relevância o facto de o arguido agir pressionado para obter dinheiro para pagar às pessoas que lhe vendiam cocaína, produto estupefaciente do qual era dependente, sendo tal dependência, aliada à ausência de proventos económicos lícitos, que lhe permitissem sustentar tal vício, o principal motivo da prática dos crimes: - No que se refere às condições pessoais e situação socioeconómica, o tribunal a quo considerou assumir relevância para a determinação da pena: - O facto de o seu processo de desenvolvimento ter decorrido em ambiente normativo; - A solidez da sua vida familiar [está casado há 27 anos com a mesma mulher, tendo duas filhas já adultas, pautando o relacionamento do agregado familiar pelos sentimentos de interajuda]; - A regularidade dos hábitos de trabalho [trabalhou desde a adolescência até à data da prática dos factos]; - A dependência da cocaína desde há cerca de 3 anos, cujos custos económicos se tornaram incomportáveis devido à falta de liquidez da empresa de pinturas da construção civil que geria, o que levaram o arguido a contrair dívidas com os fornecedores de tal substância, o que, por seu turno, levou o arguido à pratica dos crimes em causa [cf. supra]; - Relativamente à conduta anterior aos factos, considerou o tribunal a quo assumir relevância para a determinação da pena o facto de ser primário; - Relativamente à conduta posterior aos factos, o tribunal recorrido considerou assumir relevância para a determinação da pena: -A confissão em larga escala dos factos de que se encontrava acusado [não assumido tal confissão grande valor para a descoberta da verdade material, dado que o arguido foi reconhecido por todas as vítimas como sendo o autor dos factos que confessou, e, como tal, não assume grande peso como atenuante]; - A reparação do prejuízo causado com a prática do crime de furto, o contacto, através da sua mulher, de algumas vítimas, com vista a pedir-lhes desculpa e ressarci-las dos danos causados, não logrando conseguir o ressarcimento relativamente a uma delas, porque a mesma não quis aceitar tal ressarcimento fora do tribunal, e não logrando ressarcir as demais vítimas que contactou porque, entretanto, a situação económica agravou-se, não existindo, de momento, liquidez que permita o ressarcimento; - Tais condutas são exteriorizações de arrependimento sincero, o que se configura como fator de atenuação relevante; - Relativamente à falta de preparação para manter uma conduta lícita, manifestada no facto, o tribunal a quo teve em consideração o contexto em que os crimes fora praticados [obtenção de dinheiro para pagar dívidas que contraiu por ser consumidor de cocaína], a ausência e passado criminal e o ressarcimento parcial dos danos causa, concluindo não se poder afirmar estamos perante uma tendência criminosa, mas uma pluriocasionalidade. 3.3.7. Sopesando todos saqueles fatores o tribunal a quo concluiu que as necessidades de prevenção especial, na sua vertente da ressocialização do delinquente (prevenção especial positiva), não são elevadas e na vertente da prevenção geral, de defesa do ordenamento jurídico (prevenção especial negativa) as necessidades são elevadas, dado o número de crimes cometidos pelo arguido e o número de vítimas de tais crimes. Tudo ponderado, e tendo em conta o limite máximo imposto pela culpa, o tribunal a quo considerou adequadas as seguintes penas: - três meses de prisão: crime de furto [375/22.0...]; - um ano e três meses de prisão: crime de roubo [187/22.1...]: - seis meses de prisão: crime de roubo, na forma tentada [411/12.0...]; - um ano e seis meses de prisão: crime de roubo [412/22.9...]; - um ano e cinco meses de prisão: crime de roubo [413/22.9...]; - um ano e seis meses de prisão: crime de roubo, na forma tentada [308/22.0...]; - três anos e três meses de prisão: crime de roubo [autos principais]; - um ano e seis meses de prisão: crime de roubo [419/22.6...]; - um ano e três meses de prisão: crime de na forma tentada [26/22.3...]; - um ano de prisão: crime de ofensa à integridade física qualificada [26/22.3...]; - nove meses de prisão: crime de detenção de arma proibida [411/22.0..., 412/22.9..., 413/22.7... e 308/22.4...]; - quatro meses de prisão: crime de coação, na forma tentada [419/22.6...]; 3.4.. Decidindo o recurso relativamente à medida das diversas penas parcelares 3.4.1. Antes de mais, impõe-se alterar a medida concreta da pena de prisão aplicada pelo crime de ofensa à integridade física qualificada, pois o tribunal recorrido condenou o arguido pelo crime consumado e, conforme vimos antes (supra 3.2.2.), os factos provados integram a prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada (contrariamente à pretensão do recorrente), mas apenas na forma tentada, pelo que este crime é punível com prisão de 1 mês a 2 anos e 8 meses ( art. 73º ) e não com prisão de 1 mês a 4 anos (correspondente ao crime consumado), como considerado pelo tribunal a quo. Assim, tendo em conta a nova moldura legal e ainda o comportamento do arguido que após a prática do crime largou a faca logo que o visado se identificou como GNR, entende-se ser conforme às menores necessidades de prevenção geral positiva e às razões de prevenção especial positiva ou de ressocialização a seguir destacadas, a pena concreta de 6 meses de prisão pelo crime de Ofensa à integridade física qualificada tentada p. e p. pelos artigos 143º, 145º nº1 a) e 73º nº 1 a9 e b), todos do C. Penal. 3.4.2 Por outro lado, a pena de 3 meses de prisão aplicada pela prática do crime de furto simples p. e p. pelo artigo 203º nº1 (apenso 375/22.0...), bem como a pena de 1 ano e 3 meses de prisão por um crime de roubo simples p. e p. pelo artigo 210º nº1 (apenso 187/22.1...) e a pena de 3 anos e 3 meses de prisão aplicada pelo crime de roubo agravado p. e p. pelo artigo 210º nº s 1 e 2 , por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f), do Código Penal (apenso 309722.2GDLLE), são tão próximas do limite mínimo das molduras legais ( respetivamente 1 mês, 1 ano e 3 anos, de prisão) que não se vê fundamento para a pretendida alteração da medida destas penas concretas. 3.4.3. Quanto aos restantes quatro crimes de roubo simples p. e puníveis pelo artigo 210º nº1 com pena entre 1 e 8 anos de prisão, na forma consumada, o tribunal fixou as penas concretas em 1 ano e 5 meses de prisão (2) e 1 ano e seis meses de prisão (2), ou seja, 5 e 6 meses além do limite mínimo, não se vislumbrando razão que justifique, também quanto a estes crimes, fixar a pena em medida ainda mais próxima do limite mínimo de 1 ano de prisão. Relativamente aos três crimes de roubo simples p. e p. pelo art. 210º nº1, 22º, 23º e 73º, do C.Penal, na forma tentada, cujos limites da moldura legal são, respetivamente, de 1 mês (o limite mínimo) e 5 anos e 4 meses (o limite máximo), o tribunal recorrido aplicou ao arguido as penas de 6 meses, por um deles (apenso 411/12), e de 1 ano e 3 meses pelos restantes dois (apensos 308/22 e 26/22). Vejamos. Uma vez que, relativamente aos factos relativos ao apenso 308/22 foram duas as vítimas envolvidas na conduta do arguido e que a quantia visada por essa mesma conduta tinha algum significado ( 350 € ) e que quanto aos factos relativos ao apenso 26/22 não obstante a quantia visada ser apenas de 120 €, a ofendida foi envolvida de forma intensa no cometimento do crime e a conduta do arguido gerou intranquilidade e insegurança nos pais daquela, até o arguido ter fugido, a necessidade de assegurar as finalidades mínimas de prevenção geral positiva a prosseguir com a pena concreta, enquanto finalidade irrenunciável do ordenamento jurídico, impõem que se mantenha a medida das penas de 1 ano e três meses de prisão aplicadas pelo tribunal a quo por cada um daqueles crimes. Quanto ao crime de roubo tentado a que respeitam os factos do apenso 411/22, a pena de 6 meses aplicada não é igualmente merecedora de reparo face ao limite mínimo de 1 mês de prisão, pois apesar de o património do ofendido não ter estado em perigo iminente visto que a caixa registadora não tinha qualquer quantia no seu interior, a forma como o arguido envolveu a ofendida com a sua conduta, a hora matutina a que ocorreram os factos no interior do estabelecimento de restauração (06h50m) e a circunstância de o arguido ter apontado diretamente à ofendida a faca que tinha consigo, induzem necessidades mínimas de prevenção geral positiva que não permitem pena concreta em medida inferior à pena de 6 meses de prisão aplicada. Também quanto à pena de 9 meses de prisão aplicada pela autoria de um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos artigos 14º, 26º, n.º 1, do Código Penal, e artigo 86º n.º 1, alínea d), por referência aos artigos 2º, n.º 1, alínea m) e 3º, n.º 2, alínea ab), da lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, [apensos 411/22.0..., 412/22.9..., 413/11.7... e 308/22.4...], e quanto à pena de 4 meses de prisão aplicada por um crime de coação agravado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º, n.º 1, alíneas a) e b), 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, [apenso 419/22.6...], entendemos que as mesmas não merecem reparo. A pena de 9 meses de prisão correspondente ao crime de um crime de detenção de arma proibida, cujo limite mínimo é de 1 mês de prisão, é justificada pelo número de vezes em que, naturalisticamente, o arguido teve consigo a arma no período temporal em causa e com o fim visado com a detenção da arma (prática de crimes), independentemente da sua utilização concreta para tal fim. Relativamente à pena de 4 meses de prisão correspondente ao crime de coação agravado na forma tentada, cujo limite mínimo é também de 1 mês de prisão, são a exiguidade desta pena concreta e as finalidades concretamente visadas com as ameaças, ou seja, ficar impune pela prática do crime de roubo antes perpetrado, que impedem a diminuição da pena concreta pretendida pelo arguido. 3.4.4. Concluímos, pois, que tendo o tribunal recorrido tomado em conta na determinação da medida concreta das diversas penas parcelares a generalidade das circunstâncias ou fatores invocados pelo arguido recorrente, conforme ora destacado no ponto 3.3.6 do presente acórdão, como sejam, a motivação concreta para a prática dos factos e a sua conduta posterior para além da confissão, nomeadamente com vista à reparação de alguns dos prejuízos causados, a ausência de antecedentes criminais, tendo o arguido 54 anos à data da prática dos diversos crimes, bom relacionamento familiar e anterior integração social como trabalhador e os montantes visados pelo arguido ao praticar os crimes de furto e roubo, não merece reparo a determinação concreta das penas levada a cabo pelo tribunal a quo. Assim, improcede o recurso na parte em que pede a redução da medida das penas concretas aplicadas parcelarmente, sem prejuízo, naturalmente, da modificação operada na qualificação jurídica dos factos relativos ao crime de ofensa à integridade física qualificada pelo qual fora condenado pelo tribunal a quo, os quais são antes qualificados como crime de integridade física qualificada, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 143º, 145º nº 1 al. a) e nº2, conjugado com al. h) do nº 2 do artigo 132º e os artigos 22º, 23º, a que orresponde a pena concreta de 6 meses de prisão. 3.5. Decidindo o recurso relativamente à medida da pena única aplicada em cúmulo jurídico. 5.5.1. As penas parcelares a integrar no cúmulo jurídico – síntese. O tribunal a quo condenou o arguido nas treze penas parcelares supra enumeradas em 3.3.3., pelo que tendo o recurso improcedido relativamente à medida concreta de todas aquelas penas, são as mesmas que temos a considerar na decisão do recurso relativamente à pena única que o arguido pretende igualmente ver diminuída na sua medida, sem prejuízo da alteração operada na qualificação jurídica do crime de ofensa à integridade física, de que resultou, em vez da pena de um ano de prisão pelo crime consumado aplicada pelo tribunal a quo, a pena de 6 meses ora aplicada pela prática do mesmo tipo legal na forma tentada, como vimos imediatamente antes. São, pois, as seguintes as penas parcelares a considerar: - 1. Um crime de furto, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 203º, n.º 1, do Código Penal, na pena de três meses de prisão [APENSO 375/22.0...]; - 2. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º, e 210º, n.º 1, do Código Penal, na pena de um ano e três meses prisão [APENSO 187/22.1...]; - 3. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b), 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de seis meses de prisão [APENSO N.º 411/12.0...]; - 4. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.s1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e seis meses prisão [APENSO 412/22.9...; - 5. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.s1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e cinco meses prisão [APENSO 413/22.7...]; - 6. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b) e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e três meses de prisão [APENSO 308/22.4...]; - 7. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de três anos e três meses prisão [AUTOS PRINCIPAIS:309/22.2GDLLE]; - 8. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e cinco meses prisão [APENSO 418/22.8...]; - 9. Um crime de roubo, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º e210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e seis meses prisão [APENSO 419/22.6...]; - 10. Um crime de roubo, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 14º, n.º 1, 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º n.º 1, alíneas a) e b), e 210º, n.os 1 e 2, por referência ao artigo 204º, n.º 2, alínea f) e n.º 4, do Código Penal, na pena de um ano e três meses de prisão [APENSO 26/22.3...]; - 11. Um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos artigos 14º, 26º, n.º 1, do Código Penal, e artigo 86º n.º 1, alínea d), por referência aos artigos 2º, n.º 1, alínea m) e 3º, n.º 2, alínea ab), da lei n.º 5/2006, de 23 de fevereiro, redação da Lei n.º , na pena de nove meses de prisão [apensos 411/22.0..., 412/22.9..., 413/11.7... e 308/22.4...]; - 12. Um crime de ofensa à integridade física qualificada, na forma tentada, p.e p. artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, n.º 1, alínea h), 22º , 2 3 º e 7 3 º , do Código Penal , na pena de seis meses de prisão [APENSO 26/22.3...]; - 13. Um crime de coação, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 22º, n.os 1 e 2, alínea a), 23º, n.os 1 e 2, 26º, 72º, n.º 1, 73º, n.º 1, alíneas a) e b), 153º, n.º 1 e 155º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, na pena de quatro meses de prisão [apenso 419/22.6...]. Em cúmulo jurídico o tribunal a quo condenou o arguido na pena única de 6 anos de prisão, cumprindo lembrar que era de 1 ano de prisão a pena então aplicada pelo crime de crime de ofensa à integridade física qualificada (na forma consumada), a qual é agora de 6 meses de prisão por estar em causa aquele crime na forma tentada, como vimos. 5.5.2. Os limites mínimo e máximo da moldura do concurso de penas, são respetivamente de 3 anos e 3 meses e 15 anos e 2 meses, de prisão, de harmonia com a regra do nº2 do artigo 77º C.Penal, sendo certo que o tribunal a quo interpretou devidamente o critério legalmente estabelecido no artigo 72º nº1 do C.Penal, segundo o qual na medida da pena única a aplicar em cúmulo jurídico “… são considerados em conjunto os factos e a personalidade do agente . Quer ao citar o trecho que transcreve de F.Dias (“… a pena conjunta deve ser encontrada, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique, relevando, na avaliação da personalidade do agente sobretudo a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade…”), quer ao discorrer que “ … com a fixação da pena conjunta se pretende sancionar o agente, não só pelos factos individualmente considerados, mas também e especialmente pelo respetivo conjunto, não como mero somatório de factos criminosos, mas enquanto revelador da dimensão e gravidade global do comportamento delituoso do agente, visto que a lei manda se considere e pondere, em conjunto (e não unitariamente), os factos e a personalidade do agente, como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado”. Acompanha-se ainda o tribunal a quo quando considera que “… o arguido praticou todos os crimes num período de doze dias, [que]os motivos subjacentes à prática dos [13] ilícitos foram os mesmos [obter proventos para saldar dívida contraída para compra de cocaína, da qual é dependente] ((…) que o arguido é primário e, até à data da prática dos ilícitos encontrava-se familiar, social e profissionalmente inserido. Entendemos ainda, porém, que da factualidade apurada resultam sinais fortes de dissociação entre a personalidade do arguido e os factos ilícitos praticados, que não pode deixar de pesar na medida concreta da pena única a determinar, independentemente de outros aspetos da determinação da sanção a ponderar. Referimo-nos à ausência de antecedentes criminais, à sua inserção familiar, à prática dos factos no curto período de tempo verificado, à motivação para os factos claramente identificada nos autos e à pressão que tal motivação terá exercido sobre a sua personalidade e mesmo a sua saúde mental, por um lado, e, por outro, aos sinais de estranheza entre essa mesma personalidade e a índole ilícita dos factos praticados, que em alguns casos são quase caricatos, como sucede quando o arguido larga a faca e foge perante a aproximação dos pais da ofendida ou na sua reação imediata ao saber que os visados eram agentes da GNR ou ainda com o episódio passado no Restaurante A...... a que se refere a motivação de recurso. Por outro lado, os factos não se apresentam particularmente graves no seu conjunto, nem tão pouco tomados de per si, não obstante a gravidade dos tipos penais preenchidos (roubo, detenção de arma proibida, ofensa à integridade física qualificada crime de coação agravado), alguns dos quais na forma tentada. Assim, ponderados estes aspetos, com destaque para as particularidades dos factos e da personalidade do arguido revelados naqueles mesmos factos e apurados no julgamento conjunto dos mesmos, entendemos julgar parcialmente procedente o recurso relativamente à medida da pena única que fixamos em 5 (cinco) anos de prisão, com o que pouco nos afastamos da medida sugerida pelo MP neste STJ (5 anos e 4 meses de prisão). 3.6. Posto isto, decide-se suspender a execução da pena de prisão concretamente determinada pelo período máximo legal de 5 anos ( art. 50º nº5), por concluirmos, em necessário juízo de prognose, que a censura do facto e a ameaça da prisão inerentes à pena de suspensão da prisão, realiza de forma adequada as finalidades de prevenção geral e especial da punição, dado o que deixámos referido sobre personalidade do arguido, as condições da sua vida mais recuadas e as contemporâneas dos crimes, a sua conduta anterior e posterior aos crimes e as circunstâncias em que ocorreram os factos, sobretudo no que respeita ao curto período de tempo em que o conjunto dos factos foi praticado e, bem assim, à s condições concretas que terão motivado o arguido para a sua prática. Porém, tendo em conta promover a reintegração do arguido na sociedade, mantendo-se o mesmo afastado do risco de delinquir novamente, decide-se ainda que a suspensão da prisão será acompanhada de regime de prova, assente em plano de reinserção social a elaborar dela DGRSP, nos termos dos artigos 53º e 54º, do C.Penal. Por último, considerando a necessidade de melhor satisfazer as necessidades de prevenção geral positiva decorrentes dos factos em causa, particularmente na medida em que deles resultou a lesão patrimonial de vítimas, decide-se sujeitar o arguido, nos termos do artigo 51º do C.Penal, ao dever de pagar, no prazo de 12 meses, a importância de 100 € a cada um dos lesados por conta dos montantes indemnizatórios que foi condenada a pagar-lhes (BB, CC, DD, EE e FF) III DISPOSITIVO Nesta conformidade, acordam os Juízes nas Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo arguido, AA, decidindo-se: -1. Revogar o acórdão recorrido na parte em que: - Condenou o arguido na pena de 1 ano de prisão pela prática de m crime de ofensa à integridade física qualificada, p. ep. pelos artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, nº1 e 2 al. h) do Código Penal, na pena de um ano de prisão [APENSO 26/22.3...] e em que - Condenou o arguido na pena única de 6 anos de prisão. 2. Condenar o arguido, em substituição: - Na pena de 6 (seis) meses de prisão pela prática de um crime de ofensa à integridade física qualificada, na forma tentada, p. e p. artigos 14º, n.º 1, 26º, 143º, 145º, n.º 1, alínea a) e n.º 2, por referência ao artigo 132º, n.º 1, alínea h), 22º , 2 3 º e 7 3 º , do Código Penal [APENSO 26/22.3...]; - Em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas, na pena única de 5 (cinco) anos de prisão, substituída por suspensão da sua execução pelo período de 5 anos, sujeita a regime de prova, nos termos supra discriminados, e ao dever de pagar a importância de 100 € a cada um dos lesados a quem foi condenada a pagar quantia indemnizatória, conforme discriminado supra. Sem custas, dada a procedência parcial do recurso – art. 513º nº1 C.P.P. Declara-se extinta a medida de coação de Prisão preventiva em que se encontra o arguido – artigo 214º . Passem-se Mandados de Libertação e demais d.n., incluindo notificação imediata ao defensor do arguido. Lisboa, 26.10.2023 Os Juízes Conselheiros, António Latas –Relator Agostinho Torres - Juiz adjunto José Eduardo Sapateiro – Juiz adjunto
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