Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1088/12.7TYLSB-C.L1.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: LUIS ESPÍRITO SANTO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
REAPRECIAÇÃO DA PROVA
PODERES DA RELAÇÃO
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
RECURSO DE REVISTA
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
MATÉRIA DE DIREITO
VIOLAÇÃO DE LEI
LEI PROCESSUAL
LAPSO MANIFESTO
RETIFICAÇÃO DE ACÓRDÃO
INSOLVÊNCIA
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
Data do Acordão: 10/17/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (COMÉRCIO)
Decisão: REVISTA IMPROCEDENTE.
Sumário :

I São definitivas (e nessa medida insindicáveis pelo Supremo Tribunal de Justiça), nos termos do nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil, as decisões proferidas pelo Tribunal da Relação em que é ordenada a renovação da prova, quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento (alínea a); a produção de novos meios de prova, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada (alínea b); em que é anulada a decisão de 1ª instância por ser deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre determinados pontos da matéria de facto, não constando do processo todos os elementos que permitiriam a alteração da decisão de facto, ou quando se considere indispensável a sua ampliação (alínea c); e em que é determinada a fundamentação da decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, que se revelou insuficiente (alínea d).

II Não é abrangido pela regra da irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça o recurso de revista que verse sobre os pressupostos legais do exercício desses poderes funcionais por parte do Tribunal da Relação, excluindo as situações supra enunciadas, quando o recorrente invoque uma violação processual que esteve na base desse mesmo exercício.

III - É o que sucede quando o Tribunal da Relação, numa atitude passiva, omite indevidamente a prática dos seus poderes funcionais, não determinando as diligências que o preceito prevê e que, perante o circunstancialismo em causa, legalmente se impunha.

IV O mesmo já não acontece quando o Tribunal da Relação haja ordenado as diligências e/ou tenha anulado a decisão recorrida nos termos do artigo 662º, nº 2, alínea c), do Código de Processo Civil, uma vez que o seu juízo relativamente à indispensabilidade de ampliação de matéria de facto, perante a insuficiência dos factos dados como provados, insere-se no âmbito próprio da discussão de facto (quanto à sua inteligibilidade ou completude), não dizendo respeito ao enquadramento jurídico a realizar em momento logicamente posterior, vigorando aí a regra da irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça imposta pelo nº 4 do mesmo preceito.

V - O alargamento do quadro factual para viabilizar a apreciação jurídica pertinente releva no âmbito da prova e não retira, por si só, qualquer direito às partes, permitindo que as suas pretensões sejam analisadas e decididas perante todos os elementos tidos por indispensáveis, concorrendo ainda para uma solução jurídica conforme à vertente substantiva – e não meramente formal – do pleito, prosseguindo desse modo o princípio pro actione que vigora no nosso ordenamento jurídico processual.

VI - Qualquer vício de natureza processual que a parte interessada pretenda suscitar (e que deva ser conhecido) será naturalmente objecto da ulterior interposição do recurso de revista perante a decisão final de mérito ou forma, nos termos gerais dos artigos 671º, nº 1, e 674º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil.

VII - Na situação sub judice, apenas o incorrecto uso da alínea b) do nº 2 do artigo 662º, do Código de Processo Civil, assente na circunstância de o Tribunal da Relação haver ordenado a remessa dos autos à 1ª instância quando a renovação da prova, nessas circunstâncias, deve ser realizada no âmbito do Tribunal da Relação, é passível da interposição do recurso de revista, escapando ao crivo estabelecido pelo nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil.

VIII O acórdão recorrido cometeu um lapso manifesto e inadvertido quando remeteu para a alínea b) do nº 2 do artigo 622º do Código de Processo Civil, sendo que a fundamentação por si empregue e aquilo que foi concretamente ordenado têm o seu lugar próprio na alínea c) do mesmo preceito, disposição legal que foi materialmente usada apenas não tendo sido formalmente mencionada por ostensivo engano, o que, nestas especiais circunstâncias, justifica considerar oficiosamente a sua rectificação nesses termos.

Decisão Texto Integral:

Revista nº 1088/12.7TYLSB-C.L1.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção).

I - RELATÓRIO.

Por sentença proferida nos autos principais foi declarada a insolvência da sociedade comercial Cimpomóvel - Imobiliária, S.A., com sede no Edifício ....

Foi fixado o prazo de 30 dias para reclamação de créditos.

Findo o prazo da reclamação, o Sr. Administrador da Insolvência juntou aos autos lista de credores reconhecidos, lista de credores não reconhecidos e os comprovativos do cumprimento do disposto no artigo 129.º, n.º 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

Foram apresentadas diversas impugnações, tendo os trabalhadores impugnantes arrolado testemunhas.

Para a massa foram apreendidos os bens móveis e imóveis descritos nos autos de apreensão.

Nos Apensos de Habilitação de Cessionário foram habilitados:

Lidl & Companhia foi habilitada a prosseguir no lugar do credor reclamante Caixa Geral de Depósitos, S.A. relativamente ao crédito reclamado no valor de € 5.898.611,56 - Apenso H.

O credor Caixa Geral de Depósitos, S.A. por contrato de cessão de créditos de 4 de Outubro de 2018 cedeu os créditos à sociedade comercial C...... ...... ........ ........

Por contrato de cessão de créditos outorgado a 29 de Abril de 2019, a sociedade comercial C...... ...... ........ ....... cedeu a P...... ............ .........., Ld.ª os créditos do contrato n.º .................91.

Por escritura pública datada de 26 de Março de 2021 a P...... ........... ........... .... cedeu à Lidl & Companhia. Apenso G

C.... .............. ...... Limited, por contrato de cessão de créditos de 15 de Junho de 2018, adquiriu os créditos reclamados pelo Banco Popular Portugal, S.A., adquiridos por fusão de 27 de Dezembro de 2017 pelo Banco Santander Totta, S.A. - cfr. Apenso F.

Foi proferido despacho saneador e sentença que, nos termos dos artigos 130.º, n.º 3 e 131.º n.º 3 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, homologou a lista de credores reconhecidos apresentada pelo Administrador da Insolvência com as alterações resultantes:

- foi julgado verificado à E..... ....... . ........ . ............ .........., SA., um crédito comum no valor de € 4 002,67.

- foi julgada procedente a impugnação da Fazenda Nacional com um crédito de € 11.539,40, sendo € 3.371,91 de natureza privilegiada e € 8.167,49 de natureza comum

- foi julgada procedente a impugnação do Novo Banco, S.A. [anterior Banco Espirito Santo, S.A.] com um crédito no valor de € 1.172 891,95, de natureza comum

- foram julgadas improcedentes as impugnações apresentadas quanto ao créditos da Caixa Geral de Depósitos, S.A., adquiridos por Lidl & Companhia, mantendo-se a natureza garantida dos créditos.

- foram julgadas procedentes as impugnações quanto aos créditos reconhecidos a AA, sendo de verificar um crédito no valor de €87.210,00, com privilégio mobiliário geral e imobiliário especial.

- foram julgadas procedentes as impugnações dos credores trabalhadores quanto à natureza dos créditos, beneficiam de privilégio imobiliário sobre os imóveis da insolvente afetos à actividade das sociedades do grupo empresarial.

- foram julgadas improcedentes quanto ao valor as impugnações de BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT e UU e considerou-se de verificar os créditos reconhecidos na lista do artigo 129.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.

Em consequência, julgaram-se verificados os seguintes créditos: (…) que foram graduadospara serem pagos da seguinte forma:

A. Do produto dos bens imóveis correspondentes às verbas 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13,14,15,16,17,18,19,20,21, 22, 23, 24, 25, 32 e33

1.ºrateadamente

(…)

2.º

Instituto da Segurança Social, I.P. 8.109,24

Fazenda Nacional 3 371,91

3.ºratedamente Créditos comuns

4.º rateadamente

Créditos subordinados

B. Do produto dos bens imóveis correspondentes às verbas 27, 28 e 29 estão oneradas com hipoteca voluntária a favor do Banco Popular Portugal, S.A. para garantiado montante máximo de€5.417.250,00 – certidão predial afls. 76do Apenso A 1.ºrateadamente

(…)

2.º

Banco Santander Totta, S.A. [Banco Popular, S.A.]

3.º ratedamente

Instituto da Segurança Social, I.P. € 8.109,24

Fazenda Nacional € 3.371,91

4.ºrateadamente

Créditos comuns

5.º rateadamente

Créditos subordinados

C. Do produto dos bens imóveis correspondentes às verbas 30, 31 e 34, hipoteca a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. para garantia do montante máximo de 8 645 125,00 - certidãopredial afls. 80do Apenso A.

1º rateadamente

(…)

Lidl & Companhia [reclamante Caixa Geral de Depósitos, S.A.] garantido

3.º rateadamente

Instituto da Segurança Social, I.P. € 8.109,24.

Fazenda Nacional € 3.371,91.

4º rateadamente

Créditos comuns.

5º rateadamente

Créditos subordinados.

D. Do produto da venda dos bens móveis não onerados, valores direitos apreendidos e a apreender para a massa insolvente

1º rateadamente

(…)

Instituto da Segurança Social, I.P. € 8.109,24

Fazenda Nacional € 3.371,91

3ºrateadamente

S........ . ........ .. ........., S.A. €45.519,06 – priv. artigo 98.º, do CIRE

4º rateadamente

Créditos comuns.

Créditos subordinados.

Foi ainda decidido que as dívidas da massa insolvente nos termos do artigo 51.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, saem precípuas na devida proporção do produto da venda de cada bem móvel nos termos do artigo 172.º nºs 1 e 2.

Apresentaram Novo Banco S.A. e Lidl & Companhia recurso de apelação.

Por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa datado de 16 de Maio de 2023 foi decidido:

“- julgar procedente o recurso interposto pelo Novo Banco no que concerne ao montante dos créditos do mesmo e, em consequência, julgar verificado, para além do crédito comum já reconhecido no montante de € 1.172.891,95, um crédito – comum - sob condição no valor de € 550.000,00 e

- anular a sentença proferida pelo tribunal a quo na parte em que reconhece aos créditos dos trabalhadores privilégio especial sobre os imóveis apreendidos nos autos e em que gradua estes créditos com preferência relativamente ao produto de tais bens sobre os demais credores, devendo tais matérias ser objecto de ulterior decisão por parte do Tribunal “a quo”, após a indagação da matéria de facto que acima se apontou, para o que fará as diligências tidas por necessárias”.

Apresentou a credora Lidl & Companhia recurso de revista donde constam as seguintes conclusões:

A) Não obstante a intervenção do Supremo Tribunalde Justiça no tocante à decisão sobre a matéria de facto ser residual e de o n.º 4 do artigo 662.º do CPC determinar a irrecorribilidade das decisões através das quais o Tribunal da Relação exerce os poderes previstos nos n.ºs 1 e 2 da mesma norma, é admissível julgar o modo de exercício destes poderes, dado que tal previsão constitui “lei de processo” para os efeitos do disposto na alínea b) n.º 1 do art.º 674.º do CPC.

B) A presente revista vem interposta do Acórdão da Relação de Lisboa que decidiu, “nos termos do artº 662º, 2, alínea b), do CPC, anular a sentença impugnada, na parte em que reconheceu aos créditos dos trabalhadores privilégio especial sobre os imóveis apreendidos e em que graduou estes créditos com referência a estes imóveis, devendo tais matérias ser objecto de ulterior decisão por parte do Tribunal a quo”, após as diligências de prova que entender efectuar, nomeadamente a obtenção de esclarecimentos junto do Administrador da Insolvência e a produção de prova testemunhal, se assim for entendido, para apuramento da factualidade acima apontada.”

C) Nos termos do Acórdão Recorrido, tal decisão funda-se na circunstância de“os elementos constantes dos autos não permitem desde sustentar tal conclusão e na sentença nenhum facto concreto se consignou como provado que permita, relativamente aos imóveis apreendidos e aos créditos dos trabalhadores, considerar preenchida a previsão normativa do citado artº 333º, 1, al. b). A graduação foi feita conferindo primazia aos mesmos créditos sobre o crédito do apelante graduado como comum.”

D) A Relação violou a norma contida na alínea b) n.º 2 do art.º 662.º do CPC, ao decidir anular parcialmente a decisão da 1.ª instância [na parte em que esta reconheceu aos créditos dos trabalhadores privilégio especial sobre os imóveis apreendidos e em que graduou estes créditos com referência a estes imóveis] e ao ter ordenado que tais matérias fossem objecto de ulterior decisão por parte do Tribunal de 1.ª instância, após a realização das diligências de prova que viessem a ser ordenadas por aquele Tribunal.

E) Na alíneab)n.º 2do art.º 662.º do CPC consigna-se que a Relação, apelando a critérios de objectividade possa ultrapassar dúvidas fundadas sobre a prova, ou falta dela, acerca de factos essenciais, mediante a realização de diligências probatórias suplementares.

F) A produção de novosmeiosde prova é ordenada pelo Relator, sendo a prova produzida apreciada pelo Coletivo. – cfr. Ac. do STJ, de 24-1-19, proc. 834/16 (disponível em www.dgsi.pt)

G) Defluem da decisão recorrida três vícios fundamentais, posto que o preceituado na alínea b) n.º 2 do art.º 662.º do CPC não permite à Relação:

− anular parcialmente a sentença da 1.ª instância;

− remeter para o Tribunal de 1.ª instância a produção de novos meios de prova e respectivo julgamento;

− realizar um segundo julgamento sobre o facto que determinou a anulação parcial da sentença.

H) Ao ter anulado parcialmente a sentença com fundamento na alínea b) n.º 2 do art.º 662.º do CPC, o Acórdão recorrido violou a disciplina processual prevista naquela norma, constituindo a prática de um ato que a lei não admite e cominado com o vício de nulidade à luz do n.º 1 do art.º 195.º do CPC, o que aqui expressamente se invoca.

I) É ao Tribunal da Relação, e não à 1.ª instância, que compete a determinação dos concretos meios de prova complementares que deverão ser produzidos, cabendo ao Colectivo dos Juízes Desembargadores a apreciação e decisão sobre os mesmos, conforme resulta da alínea a)n.º 3 do art.º 662.º do CPC, conjugado como n.º 1 do art.º 56.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aplicável por via do art.º 74.º do mesmo diploma - cfr. Acórdão do STJ, proferido em 24/01/2019, no processo n.º 834/16.4T8LB.L1.S1 (disponível em www.dgsi.pt).

J) No Acórdão recorrido, o que se procura não é a realização de prova suplementar mas antes a realização de um novo julgamento.

K) A Relação, deparando-se com a manifesta ausência de prova sobre os factos constitutivos do privilégio creditório imobiliário especial previsto na alínea b) n.º 1 do art.º 333.º do CT, não pode, socorrendo-se da alínea b) n.º 2 do art.º 662.º do CPC, ou de qualquer outra norma, determinar a realização de novo julgamento sobre aquele facto.

L) Impõe-se, pois, a revogação da decisão recorrida por errada aplicação da lei de processo, nos termos da alínea b) do n.º 1 do art.º 674º do CPC.

M) Sem embargo,

N) Caso se entenda que o Tribunal da Relação incorreu num lapso de escrita ao fundamentar a sua decisão apelando à norma constante da alínea b) do n.º 2 do art.º 662.º do CPC, quando quereria referir-se à alínea c) do mesmo preceito, decidindo anular parcialmente a sentença com fundamento em deficiência da matéria de facto, o desfecho da decisão recorrida também deverá ser adverso.

O) As decisões podem revelar-se total ou parcialmente deficientes quando o Tribunal, devendo pronunciar-se sobre algum facto essencial que constitui o objecto do litígio, não lhe dá resposta ou fá-lo de forma deficiente, impedindo o estabelecimento de uma plataforma sólida para a integração jurídica do caso.

P) Existe deficiência nas respostas quando o tribunal deixou de decidir algum facto sobre o qual se formulara quesito” – Como anota ALBERTO DOS REIS, in Código de Processo Civil Anotado., vol. IV, p. 553.

Q) A matéria factual constante dos autos permite uma decisão definitiva e segura sobre os fundamentos das impugnações apresentadas pelos trabalhadores à lista elaborada nos termos do artigo 130º do CIRE.

R) O Acórdão recorrido confunde a insuficiência de matéria de facto com a inexistência de alegação e prova sobre factos essenciais constitutivos dos direitos.

S) Apesar da norma constante da alínea b) n.º 1 do art.º 333.º do CT, conferir aos trabalhadores, em termos gerais e abstratos, privilégio creditório imobiliário especial desde que verificados os respectivos pressupostos, a verdade é que das impugnações apresentadas não resulta sequer a invocação de tal direito, menos ainda a alegação e prova dos respectivos factos constitutivos.

T) Em momento algum os trabalhadores invocaram que os seus créditos deveriam beneficiar do privilégio creditório imobiliário especial previsto na alínea b) n.º 1 do art.º 333.º do CT, o que para ser reconhecido sempre teria que ser alegado e provado.

U) Em nenhum dos articulados de impugnação é feita sequer uma única referência a imóveis ou prédios que pertençam ou tenham pertencido ao seu anterior empregador ou a alguma das empresas que em relação a ele se encontrassem numa relação de grupo.

V) Em momento algum das referidas impugnações é alegado, sugerido e ainda menos pedido o reconhecimento da existência do privilégio creditório imobiliário especial sobre qualquer imóvel do empregador ou de qualquer empresa que integrasse o respectivo grupo empresarial.

W) Circunscrevendo-se tais impugnações ao pedido de alteração da qualificação da natureza de créditossubordinadospara créditosprivilegiados“ser reconhecido, comocrédito privilegiado, e graduado no lugar que lhe competir, em observância pelas disposições conjugadas do art. 334.º ex vi art.º 333º do Código do Trabalho.”

X) Constitui jurisprudência pacifica junto desse Supremo Tribunal que o privilégio imobiliário especial sobre determinado imóvel do empregador, concedido aos seus trabalhadores pela alínea b) n.º 1 do art.º 333.º do CT, depende da alegação e prova dos factos constitutivos de tal garantia. – cfr. nesse sentido: Acórdão do STJ, de 31.01.2007, processo n.º 07A4111); Acórdão do STJ, de 07.02.2008, processo n.º 07A4137; Acórdão do STJ, de 29.04.2008, processo n.º 08A1090 (disponíveis em www.dgsi.pt).

Y) Designadamente, se os imóveis apreendidos se encontravam afectos à actividade do empregador como é exigido, mesmo numa interpretação ampla da alínea b) n.º 1 do art.º 333.º do CT.

Z) Não pode a ausência de factualidade constitutiva do direito de garantia previsto na alínea b), n.º 1 do art.º 333.º do CT, consistir em matéria de facto carecida de esclarecimento e/ou concretização, para os efeitos do disposto na alínea c) n.º 2 do art.º 662.º do CPC. Trata-se antes de matéria estranha ao objecto do litígio, por não alegada.

AA) A prerrogativa prevista na alínea c) n.º 2 do art.º 662.º do CPC não se destina, obviamente, a procurar suprir a inexistência ou insuficiência na alegação de factos essenciais constitutivos dos direitos invocados pelas partes, sendo antes dirigida a ultrapassar a insuficiência de matéria de facto que, devendo constar dos autos, deles carecem.

BB) Seria intolerável e flagrantemente ilegal, que o Tribunal da Relação, fazendo um uso totalmente anómalo dos poderes que lhe são conferidos pela alínea c) n.º 2 do art.º 662.º do CPC, pudesse ultrapassar insuficiências de alegação, prova e até de pedido verificadas nos articulados de impugnação.

CC) Em face do exposto, ao invés de ter decidido anular a decisão da 1.ª instância “na parte em que reconheceu aos créditos dos trabalhadores privilégio especial sobre os imóveis apreendidos e em que graduou estes créditos com referência a estes imóveis”, deveria antes ter apreciado os recursos apresentados e, em consequência, revogar a decisão recorrida na parte em que atribui aos trabalhadores impugnantes privilégio especial sobre a totalidade dos imóveis apreendidos, já que os autos, sem qualquer deficiência ou incoerência, não permitem outra decisão.

DD) A ser possível à Relação, com o fundamento na alínea c) n.º 2 do art.º 662.º do CPC, anular o segmento decisório que entende afectado por insuficiência, dando a oportunidade à 1.ª instância de obter meios de prova adicionais que, eventualmente, fossem aptos a preencher os elementos constitutivos do direito ao privilégio imobiliário especial previsto na alínea b) n.º 1 do art.º 333.º do CT, estaria a lançar um convite a que aquele Tribunal “conheça de questões de que não podia tomar conhecimento” [cfr. n.º 1 do art.º 3.º e n.º 1 do art.º 5.º do CPC], situação que é fatalmente cominada pelo vício de nulidade, nos termos da alínea d) n.º 1 do art.º 615.º do CPC.

Não houve resposta.

II – FACTOS PROVADOS.

Foi dado como provado nas instâncias:

1 Cimpomóvel - Imobiliária, S.A., pessoa colectiva n° ... ... .90, tem sede no Edifício ..., e encontra-se matriculada na Conservatória do Registo Comercial ....

2 Tem por objecto social a aquisição, venda, construção, arrendamento e exploração de imóveis, próprios e alheios e a prestação de serviços conexos.

3 - Tem o capital social de €7.500.000,00 e mostram-se registados como seus administradores VV e AA, nomeado em Abril de 2008.

4 Por requerimento de 22.05.2013 O Administrador de Insolvência apresentou a seguinte lista de credores:

(…)

5- Para a massa foram apreendidos os seguintes bens, descritos nos autos de apreensão:

1. Fracção Autónoma designada pelas letras “CD”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 34 na cave menos Quatro. Composta por uma divisão destinada a estacionamento. Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00.

2. Fracção Autónoma designada pelas letras “DG”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 60 na cave menos Quatro. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

3. Fracção Autónoma designada pelas letras “DL”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 3 na cave menos Três. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

4. Fracção Autónoma designada pelas letras “EL”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 26 na cave menos Três. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

5. Fracção Autónoma designada pelas letras “EX”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 37 na cave menos Três. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

6. Fracção Autónoma designada pelas letras “EZ”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 38 na cave menos Três. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

7. Fracção Autónoma designada pelas letras “FA”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 39 na cave menos Três. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

8. Fracção Autónoma designada pelas letras “FO”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 52 na cave menos Três. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha nº 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

9. Fracção Autónoma designada pelas letras “FP”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 53 na cave menos Três. Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

10. Fracção Autónoma designada pelas letras “HQ”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 38 na cave menos dois Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e Inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

11. Fracção Autónoma designada pelas letras “HR”, sita na Avenida ..., Composição: Estacionamento n° 39 na cave menos dois Composta por uma divisão destinada a estacionamento Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1201 e Inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 1857 da Freguesia de ... e Com o Valor Patrimonial de 10.316,00

12. Fracção Autónoma designada pelas letras “AF”, sita na ..., Composição: RC CV, Destinada a Comercio, T2, Descrita na CRP de ... sob a ficha N° 682 e Inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 11010 da Freguesia ... e com o Valor Patrimonial de 241.590,00

13. Fracção Autónoma designada pelas letras “AG”, sita na ..., Composição: RC CV, Destinada a Comercio, T2, Descrita na CRP de ... sob a ficha N° 682 e Inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 11010 da Freguesia ... e com o Valor Patrimonial de 167.040,00

14. Fracção Autónoma designada pelas letras “D”, sita na ..., Composição: CV, Destinado a Estacionamento coberto e fechado, Descrito na CRP ... sob a ficha n° 682 e Inscrita na Matriz Predial Urbana Sob o art 11010 da Freguesia ... e com o V.P. de 3.290,00

15. Fracção Autónoma designada pelas letras “E”, sita na ..., Composição: CV, Destinado a Estacionamento coberto e fechado, Descrito na CRP ... sob a ficha n° 682 e Inscrita na Matriz Predial Urbana Sob o art 11010 da Freguesia ... e com o V.P. de 3.290,00

16. Fracção Autónoma designada pelas letras “F”, sita na ..., Composição: CV, Destinado a Estacionamento coberto e fechado, Descrito na CRP ... sob a ficha n° 682 e Inscrita na Matriz Predial Urbana Sob o art 11010 da Freguesia ... e com o V.P. de 3.290,00

17. Fracção Autónoma designada pela letra “B”, sita na Travessa ..., Composição: Estacionamento Coberto, destinada a lugar de garagem, a nível Da subcave e tem uma área de 15m2, descrita na CRP de ... Sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art N° 5930 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 4.679,13

18. Fracção Autónoma designada pelas letras “BA”, sita na Travessa ..., Composição: Estacionamento Coberto, destinada a lugar de garagem, a nível Da subcave e tem uma área de 28,85m2, descrita na CRP de ... Sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob Art n° 5930 da Freguesia de ... e com o V.P. de 8.984,75

19. Fracção Autónoma designada pelas letras “DW”, sita na Travessa ..., Composição: Estacionamento Coberto, destinada a lugar de garagem, a nível Da cave e tem uma área de 11,40m2, descrita na CRP de ... Sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art N° 5930 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 3.558,63

20. Fracção Autónoma designada pelas letras “EK”, sita na Travessa ..., Composição: Estacionamento Coberto, destinada a lugar de garagem, a nível Da subcave e tem uma área de 75,50m2, descrita na CRP de ... Sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o Art n° 5930 da Freguesia de ... e com o V.P. de 23.509,75

21. Fracção Autónoma designada pela letra “G”, sita na Travessa ..., Composição: Estacionamento Coberto, destinada a lugar de garagem, a nível Da subcave e tem uma área de 14,60m2, descrita na CRP de ... Sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o Art n° 5930 da Freguesia de ... e com o V.P. de 4.679,13

22. Fracção Autónoma designada pelas Letras “EL”, sita na ..., Composição: Estacionamento Coberto, destinada a Aparcamento Automóvel ao nível da Subcave, com entrada pelo n° 75 da ... e tem Uma área de 608,10m2, Descrito na CRP de ... sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 5930 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 189.354,13

23. Fracção Autónoma designada pelas letras “GG” sita na Rua ..., Composição: R/C – destinada A comercio, serviços, restauração e bebidas a nível do r/c, com Entrada pelo n° 87 da Rua ..., Constituída por salão Lavabos e instalações sanitárias para ambos os sexos e ainda um Terraço com 120,40 m2 que sendo uma zona comum é de uso Exclusivo desta fracção, possui meios próprios para exaustão de Fumos e gases, tem uma área de 205m2, descrito na CRP de ... sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob O art n° 5930 da Freguesia de ... e com o V.P. de 180.110,00.

24. Fracção Autónoma designada pelas letras “EM”, sita na Rua ..., Composição: R/C- Destinada a comércio, serviços, restauração e bebidas, a nível Do rés-do-chão com entrada pelo n° 65 da Rua ... Constituída por salão e instalações sanitárias, possui meios Próprios para a exaustão de fumos e gases e tem uma área de 273,10m2, Descrito na CRP de ... sob a ficha n° 1094 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 5930 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 204.097,00

25. Fracção Autónoma designada pela letra “E”, sita na Rua ..., Composição: R/C Estabelecimento comercial, destinado a comercio, serviço, Restauração e bebidas ao nível do rés-do-chão, com entrada Pelo n° 231 da Rua ..., constituída por Salão e instalações sanitárias para ambos os sexos, tendo meios Próprios de exaustão de fumos e gases e com a área de 252,80m2, Descrita na CRP ... sob a ficha n° 882 e Inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art n° 5929 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 188.928,75

26. Prédio Urbano sito na Rua ..., Composição: Terreno para Construção, Confrontações: Norte Rua ...; Sul Cimpomovel; Nascente S... ...... ..... . ....... ........ Lda, Descrita na CRP de ... sob A ficha n° 1593 e inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 4187 da Freguesia de ... e com o V.P. de 12.952,57

27. Prédio Urbano sito na Estrada ..., destinado a Armazéns e Actividade Industrial, T3, Descrito na CRP de ... sob a Ficha n° 812 e inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 3482 Da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 1.396.920,00

28. Prédio Urbano sito na Estrada ..., destinado a Armazéns e Actividade Industrial, T3, Descrito na CRP de ... sob a Ficha n° 812 e inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 5031 Da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 177.780,00

29. Prédio Urbano sito na Estrada ..., destinado a Armazéns e Actividade Industrial, T4, Descrito na CRP de ... sob a Ficha n° 812 e inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 5032 Da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 141.700,00

30. Prédio Urbano sito na Quinta ..., Composição: Pavilhão amplo para comercio, Confrontações: Norte, Sul, Nascente e Poente: Cimpomovel Imobiliária. S.A, Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 285 e inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 3409 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 88.422,93

31. Prédio urbano sito na Rua ... Composição: Prédio que se destina a indústria e se compõe de Rés-do-chão com 5 divisões e casa de banho, andar com 2 Divisões e sótão com 1 divisão, 1 casa de banho e arrumo, Descrita na CRP de ... sob a ficha n° 1843 e inscrita na Matriz Predial Urbana sob o art 3332 da Freguesia de ... e com O Valor Patrimonial de 620.900,00

32. Fracção Autónoma designada pela letra “B”, sita no Bairro ... Lugar: ..., Composição: R/C 2 – Comercio – T1, Descrito na CRP de ... sob a ficha n° 6588 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 12163 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 90.740,00

33. Fracção Autónoma designada pela letra “A”, sita Avenida ..., Composição: Garagem na subcave com Acesso à via publica pelo n° 6-A por rampa situada a tardoz do Edifício, ao nível de caboucos, Descrito na CRP de ... sob a Ficha n° 718 e Inscrito na Matriz Predial Urbana sob o art n° 529 da Freguesia de ... e com o Valor Patrimonial de 79.443,27

34. Prédio urbano sito na Rua ..., área total de 17 286 m2, área coberta de 6626m2 e área descoberta de 1076m2. Bloco – escritório, gabinete de direção, gabinete de reuniões, hall de entrada, .... descrito na Conservatória do Registo Predial de ... com o n.° 9261 e inscrito na matriz sob o n.° 3510.

6- A verba 33 está onerada com hipoteca voluntária a favor da Fazenda Nacional para garantia do montante 51 755,05 - certidão predial a fls. 88 do Apenso A.

7- As verbas 27, 28 e 29 estão oneradas com hipoteca voluntária a favor do Banco Popular Portugal, S.A. para garantia do montante máximo de 5 417 250,00 – certidão predial a fls. 76 do Apenso A.

8- Sobre as verbas 30, 31 e 34 incide hipoteca a favor da Caixa Geral de Depósitos, S.A. para garantia do montante máximo de 8 645 125,00 - certidão predial a fls. 80 do Apenso A.

9- No Relatório do artigo 155º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, junto a 23.01.2013, a fls. 272, consta: «... a empresa detentora de 100% do capital da agora insolvente, a C......... ....... . ............., S.A., sentenciada insolvente a 21.11.2012, pelo ... Juízo do Tribunal de Comércio ..., entrou em liquidação por deliberação do Tribunal aquando da assembleia de credores ocorrida a 14.01.2013 [...]

A Cimpomóvel- Imobiliária, S.A. pertence a um grupo empresarial de 10 empresas, das quais para além desta, 5 foram recentemente declaradas insolventes:

. C......... . ...... . ............., S.A . C......... . ........ ........, S.A.

. C......... . ...... . ........ .........., S.A. . C......... . ........ .........., S.A.

. R..... . ......., S.A

10- O crédito do Banco Popular Portugal, S.A. foi reduzido para 3 556 740,43, por liquidação do valor de 860 928,05 - req. de 16.06.2021.

11- No Apenso F C.... .............. ...... Limited foi habilitado a prosseguir em substituição do credor reclamante Banco Santander Totta, S.A.

12- A Caixa Geral de Depósitos, S.A. cedeu os créditos reclamados à sociedade comercial C...... ...... ........ ......., que os cedeu P...... ............ .........., Lda. - Apenso G.

13- Lidl & Companhia adquiriu daquela cessionária os créditos reclamados pela Caixa Geral de Depósitos, S.A. – Apenso H.

14- Na acção de verificação de créditos – Apenso B foi reconhecido ao credor E..... ....... . ........ . ............ .........., SA. um crédito comum no valor de € 4.002,67.

III – QUESTÕES JURÍDICAS ESSENCIAIS DE QUE CUMPRE CONHECER.

1 – Admissibilidade do presente recurso de revista. Aplicação da regra prevista no nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil (irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça) à decisão do Tribunal da Relação que, por insuficiência de factos indispensáveis para a boa decisão da causa, determinou a ampliação da decisão de facto ao abrigo da alínea c) do nº 2 da mesma disposição legal, com a consequente remessa dos autos à 1ª instância.

2- Alegada violação dos pressupostos legais em que assenta o exercício pelo Tribunal da Relação do poder funcional consignado na alínea b) do nº 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil. Lapso manifesto no acórdão recorrido. Rectificação.

Passemos à sua análise:

1 – Admissibilidade do presente recurso de revista. Aplicação da regra prevista no nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil (irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça) à decisão do Tribunal da Relação que, por insuficiência de factos indispensáveis para a boa decisão da causa, determinou a ampliação da decisão de facto ao abrigo da alínea c) do nº 2 da mesma disposição legal, com a consequente remessa dos autos à 1ª instância.

O presente recurso de revista incide, em termos gerais, sobre o modo de exercício – alegadamente com violação de normas processuais aplicáveis – dos poderes funcionais do Tribunal da Relação, tal como se encontram previstos nos nºs 1 e 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil.

Segundo invoca essencialmente o recorrente:

Na alínea b), do n.º 2do artigo 662.º do Código de Processo Civil consigna-se que a Relação, apelando a critérios de objectividade, possa ultrapassar dúvidas fundadas sobre a prova, ou falta dela, acerca de factos essenciais, mediante a realização de diligências probatórias suplementares.

Defluem da decisão recorrida três vícios fundamentais, posto que o preceituado na alínea b) n.º 2 do art.º 662.º do CPC não permite à Relação:

- anular parcialmente a sentença da 1.ª instância;

- remeter para o Tribunal de 1.ª instância a produção de novos meios de prova e respectivo julgamento;

- realizar um segundo julgamento sobre o facto que determinou a anulação parcial da sentença.

Ao ter anulado parcialmente a sentença com fundamento na alínea b) n.º 2 do art.º 662.º do CPC, o acórdão recorrido violou a disciplina processual prevista naquela norma, constituindo a prática de um acto que a lei não admite e cominado com o vício de nulidade à luz do n.º 1 do art.º 195.º do CPC, o que aqui expressamente se invoca.

Caso se entenda que o Tribunal da Relação incorreu num lapso de escrita ao fundamentar a sua decisão apelando à norma constante da alínea b) do n.º 2 do art.º 662.º do CPC, quando quereria referir-se à alínea c) do mesmo preceito, decidindo anular parcialmente a sentença com fundamento em deficiência da matéria de facto, o desfecho da decisão recorrida também deverá ser adverso.

O acórdão recorrido confunde a insuficiência de matéria de facto com a inexistência de alegação e prova sobre factos essenciais constitutivos dos direitos.

Em nenhum dos articulados de impugnação é feita sequer uma única referência a imóveis ou prédios que pertençam ou tenham pertencido ao seu anterior empregador ou a alguma das empresas que em relação a ele se encontrassem numa relação de grupo.

Não pode a ausência de factualidade constitutiva do direito de garantia previsto na alínea b), n.º 1 do art.º 333.º do CT, consistir em matéria de facto carecida de esclarecimento e/ou concretização, para os efeitos do disposto na alínea c) n.º 2 do art.º 662.º do CPC. Trata-se antes de matéria estranha ao objecto do litígio, por não alegada.

A prerrogativa prevista na alínea c) n.º 2 do art.º 662.º do CPC não se destina, obviamente, a procurar suprir a inexistência ou insuficiência na alegação de factos essenciais constitutivos dos direitos invocados pelas partes, sendo antes dirigida a ultrapassar a insuficiência de matéria de facto que, devendo constar dos autos, deles carecem.

Apreciando:

Quanto à admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, dispõe o nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil:

“Das decisões da Relação previstas nos nºs 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça”.

(Preceito introduzido pelo Decreto-lei nº 375-A/99, de 20 de Setembro, com a seguinte justificação:

Elimina-se ainda o recurso para aquele Tribunal das decisões das Relações atinentes a matéria de facto, nos termos do artigo 712.º, à margem do âmbito da sua actual admissibilidade, que não é jurisprudencialmente pacífico”).

O que significa que, por força desta disposição legal, são definitivas (e nessa medida insindicáveis pelo Supremo Tribunal de Justiça) as decisões do Tribunal Relação em que:

- é ordenada a renovação da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento (alínea a);

- é ordenada, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova (alínea b);

- é anulada a decisão de 1ª instância por ser deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre determinados pontos da matéria de facto, não constando do processo todos os elementos que permitiriam a alteração da decisão de facto, ou quando se considere indispensável a sua ampliação (alínea c);

- é determinada a fundamentação da decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, que se revelou insuficiente (alínea d).

Contudo, não é abrangido pela regra da irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça o recurso de revista que verse sobre os pressupostos legais do exercício desses poderes funcionais por parte do Tribunal da Relação, excluindo as situações supra enunciadas, quando o recorrente invoque uma violação processual que esteve na base desse mesmo exercício.

(Vide sobre este o tema Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa in “Código de Processo Civil Anotado. Volume I. Parte Geral e Processo de Declaração. Artigos 1º a 702º”, Almedina 2020, 2ª edição, a página 827).

Conforme escreve Abrantes Geraldes in “Recursos em Processo Civil”, Almedina 2022, 7ª edição, a página 363:

“Todavia, esta delimitação (do nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil) não é totalmente rígida. Com efeito, é admissível recurso de revista quando sejam suscitadas questões relacionadas com o modo como a Relação aplicou as normas de direito adjectivo conexas com a apreciação da matéria de facto, máxime quando seja invocado pelo recorrente o incumprimento dos deveres previstos no artigo 662º”.

No mesmo sentido, vide José Lebre de Freitas, Armindo Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume III, Almedina 2022, 3ª edição, a página 177, onde enfatizam os autores que: “(…) a lógica do preceituado no nº 4 – o STJ tem a sua competência limitada às questões de direito – não impede que “seja admissível recurso de revista quando se suscitem questões relacionadas com o modo como a Relação aplicou as normas de direito adjectivo, conexas com a apreciação da impugnação da decisão de facto” (…). Trata-se de errores in procedendo, respeitantes ao desenvolvimento do procedimento probatório. Ao STJ é possível verificar se a Relação, ao apreciar a matéria de facto, respeitou as normas procedimentais dos nºs 1 a 3 do artigo 662º (…)”; João de Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa, in “Manual de Processo Civil”, Volume II, AAFDL 2022, a página 239, onde pode ler-se: “A irrecorribilidade estabelecida no artigo 662º, nº 4, não impede que o STJ possa controlar se a Relação usou os poderes que lhe são conferidos dentro da lei ou se os deixou de usar com violação da lei”.

É o que sucede quando o Tribunal da Relação, numa atitude passiva, omite indevidamente a prática de actos correspondentes aos seus poderes funcionais, não ordenando as diligências que o mesmo preceito prevê e que, perante o circunstancialismo em causa, legalmente se impunha.

Todavia, o mesmo não acontece quando o Tribunal da Relação haja ordenado as mesmas diligências e/ou tenha anulado a decisão recorrida nos termos do artigo 662º, nº 2, alínea c), do Código de Processo Civil.

Com efeito, tendo o Tribunal da Relação usado activamente a prerrogativa prevista na alínea c) do nº 2 do artigo 662º, o seu juízo relativamente à indispensabilidade de ampliação de matéria de facto perante a insuficiência dos factos dados como provados e com vista à boa decisão da causa, nos termos aí contemplados, é definitivo e soberano, encontrando-se impedida nestas circunstâncias a interposição da revista.

Note-se que esta temática – ampliação da decisão de facto com vista ao esclarecimento de pontos essenciais e indevidamente omitidos pela 1ª instância - insere-se de pleno no âmbito da discussão de facto, não dizendo directamente respeito ao enquadramento jurídico a realizar em momento logicamente posterior.

Como salienta Francisco Ferreira de Almeida, in “Direito Processual Civil”, Volume II, Almedina 2019, 2ª edição, a página 595:

“O desideratum ínsito a uma insusceptibilidade de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, face ao carácter taxativo do nº 4 do artigo 662º, foi precisamente o de restituir-lhe a sua fisionomia de tribunal vocacionado para a interpretação e aplicação da lei substantiva.”.

(Sobre esta matéria vide - todos publicados in www.dgsi.pt -: o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 2020 (relator Tomé Gomes) proferido no processo nº 4016/13.9TBVNG.P1.S3; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Fevereiro de 2016 (relator Abrantes Geraldes), proferido no processo nº 907/13.5TBPTG.E1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 30 de Maio de 2019 (relatora Catarina Serra), proferido no processo nº 156/16.0T8BCL.G1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 2020 (relator Rijo Ferreira), proferido no processo nº 277/12.9.TBALJ-B.G1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Outubro de 2018 (relatora Rosa Ribeiro Coelho), proferido no processo nº 1295/11.0TBMCN.P1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 2018 (relatora Rosa Tching), proferido no processo nº 90/13.6TVPRT.P2-A.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Julho de 2015 (relatora Prazeres Beleza), proferido no processo nº 284040/11.0YIPRT.G1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Setembro de 2020 (relatora Rosário Morgado), proferido no processo nº 2882/16.5T8LRA.C1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de Setembro de 2022 (relatora Graça Amaral), proferido no processo nº 3714/15.7T8CRA.C1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 5 de Julho de 2022 (relator Ricardo Costa), proferido no processo nº 400/18.0T8PVZ.P1.S1; o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15 de Junho de 2023 (relator Ricardo Costa), proferido no processo nº 6132/18.1T8ALM.L1.S2 e, em especial, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Novembro de 2019 (relator Pedro Lima Gonçalves), proferido no processo nº 431/14.9TVPRT.P1.S1, versando a questão concreta e essencial que é tratada nos presentes autos).

Ou seja, quando o Tribunal da Relação usa a prerrogativa prevista na alínea c) do nº 2 do artigo 662º, ordenando as diligências probatórias correspondentes, o seu juízo quanto à necessidade de ampliação de matéria de facto perante a insuficiência dos factos dados como provados, nos termos aí contemplados, é insusceptível de revista, tal como resulta, directa, expressa e incontornavelmente, do preceituado no nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil.

O necessário alargamento do quadro factual para viabilizar a apreciação jurídica pertinente releva no âmbito da produção de prova (da sua inteligibilidade ou completude) e não retira, por si só, qualquer direito às partes, permitindo que as suas pretensões sejam analisadas e decididas perante todos os elementos de facto essenciais e indispensáveis, concorrendo ainda para uma solução jurídica conforme à vertente substantiva – e não meramente formal – do pleito, prosseguindo desse modo o princípio pro actione que vigora no nosso ordenamento jurídico processual (o qual visa garantir que serão rigorosamente observadas todas as condições para que a lide processual fique subordinada à salvaguarda da real e substantiva possibilidade de afirmação material das respectivas pretensões, sem a colocação de entraves iníquos, obstáculos de índole processual desproporcionados ou excessivamente formalistas que, as impeçam, diminuam ou dificultem injustificadamente, com primado da substância (verdade material) sobre a forma (verdade estritamente processual), enquanto garante do direito de acção e do direito à tutela jurisdicional efectiva consagrados no artigo 20º da Constituição da República Portuguesa).

Qualquer vício de natureza processual que a parte interessada pretenda suscitar, e que deva ser conhecido, será naturalmente objecto da ulterior interposição do recurso de revista perante a decisão final de mérito ou forma, nos termos gerais dos artigos 671º, nº 1, e 674º, nº 1, alínea b), do Código de Processo Civil.

A interpretação em sentido adverso ensaiada pelo ora recorrente acarretaria o relativo (mas significativo) esvaziamento da aplicação da regra processual contida nesse nº 4, através de uma interpretação incompreensivelmente restritiva do seu âmbito e alcance.

Isto é, se se entendesse que seria, sempre e em qualquer circunstância, possível questionar junto do Supremo Tribunal de Justiça a decisão que considera a insuficiência da matéria de facto indispensável e que justifica a ampliação ordenada, a simples pretexto de haver acontecido uma violação de norma processual (qualquer que ela fosse), daí resultaria necessariamente que todas as situações previstas na alínea c) do nº 2 do artigo 662º, nos casos em que o Tribunal da Relação houvesse exercido activamente os seus poderes funcionais (ao invés dos casos em que, censuravelmente, de forma passiva e com violação da lei processual, deles não tivesse feito o devido uso), seriam desde logo passíveis de impugnação junto do Supremo Tribunal de Justiça, colocando em crise a ratio e o alcance expectável da previsão do nº 4 do mesmo preceito legal, o que redundaria, como se compreende, numa clara incongruência, carente de lógica intrínseca e sistemática.

Assim sendo, tomando em consideração a situação sub judice, apenas o incorrecto do uso da alínea b) do nº 2 do artigo 662º, do Código de Processo Civil, assente na circunstância de o Tribunal da Relação haver ordenado a remessa dos autos à 1ª instância, sendo que a renovação da prova nessas circunstâncias é realizada no âmbito do Tribunal da Relação, é passível da interposição do recurso de revista, escapando ao crivo estabelecido pelo nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil.

Pelo que se julga inadmissível a revista, nos termos do nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil, relativamente à decisão do Tribunal da Relação de Lisboa que se prende com a ordenada ampliação da matéria de facto nos termos da alínea c), do nº 2 do artigo 662º, do mesmo diploma legal, não se conhecendo parcialmente do seu objecto, sendo o recurso de revista apenas admissível quanto à alegação respeitante à alínea b) da mesma disposição legal.

2- Alegada violação dos pressupostos legais em que assenta o exercício pelo Tribunal da Relação do poder funcional consignado na alínea b) do nº 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil. Lapso manifesto no acórdão recorrido. Rectificação.

Sustenta essencialmente a recorrente que:

É errada a invocação da alínea b) do nº 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil na medida em que a nova produção de meios de prova é ordenada pelo juiz desembargador relator e apreciada pelo colectivo do Tribunal da Relação, não determinando a remessa dos autos à 1ª instância.

Ao fazê-lo o acórdão recorrido cometeu uma nulidade processual à luz do nº 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil

Apreciando:

A invocação formal no acórdão recorrido do fundamento constante da alínea b) do nº 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil não faz de facto sentido.

No aresto é entendido que determinadas matérias “deverão ser objecto de ulterior decisão por parte do Tribunal “a quo”, após a indagação da matéria de facto que acima se apontou, para o que fará as diligências tidas por necessárias”.

Ora, tal norma processual implica o desenvolvimento da actividade instrutória junto do Tribunal da Relação e não em 1ª instância, o que torna incompreensível e inadequada a remessa dos autos ao Tribunal a quo.

(vide, a este propósito, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Janeiro de 2019 (relator Tomé Gomes), proferido no processo nº 834/16.4T8LSB.L1.S1, publicado in www.dgsi.pt).

Todavia, há naturalmente que entender que o acórdão recorrido cometeu um lapso, manifesto e objectivo, quando inadvertidamente remeteu para a alínea b) do nº 2 do artigo 622º do Código de Processo Civil, sendo que o concretamente decidido tem o seu lugar próprio na alínea c) do mesmo preceito, disposição legal que efectivamente usou, só não a mencionando por ostensivo e inadvertido engano.

Do mesmo consta, a este propósito:

“O tribunal a quo entendeu que ao credor AA cabia reconhecer um crédito no valor de € 87.210,00, tendo concluído, como já se referiu, que o mesmo, bem como os reclamados pelos mais trabalhadores, se tratavam de créditos privilegiados.

Considerando o que ficou referido, os elementos constantes dos autos não permitem desde já sustentar tal conclusão e na sentença nenhum facto concreto se consignou como provado que permita, relativamente aos imóveis apreendidos e aos créditos dos trabalhadores, considerar preenchida a previsão normativa do citado artº 333º, nº1, al. b). A graduação foi feita conferindo primazia aos mesmos créditos sobre o crédito do apelante – graduado como comum.

Mas se assim é, também não é de ter como definitivamente afastada a possibilidade dos créditos dos trabalhadores deverem beneficiar do aludido privilégio, carecendo, uma decisão segura quanto a essa matéria de indagação apta a fornecer dados concretos sobre se os imóveis apreendidos eram, efectivamente, utilizados no âmbito da actividade da insolvente e, em caso afirmativo, de que modo.

Os elementos constantes dos autos não permitem, pois, a esta Relação, por carência dessa matéria factual, proferir uma decisão definitiva sobre o reconhecimento aos créditos dos trabalhadores do dito privilégio especial e, consequentemente, sobre o lugar desses créditos, em confronto como os créditos do apelante, reconhecidos como comuns.

Cumpre, assim, nos termos do artº 662º, nº 2, alínea b), do CPC, anular a sentença impugnada, na parte em que reconheceu aos créditos dos trabalhadores privilégio especial sobre os imóveis apreendidos e em que graduou estes créditos com referência a estes imóveis, devendo tais matérias ser objecto de ulterior decisão por parte do Tribunal “a quo”, após as diligências de prova que entender efectuar, nomeadamente a obtenção de esclarecimentos junto do Administrador da Insolvência e a produção de prova testemunhal, se assim for entendido, para apuramento da factualidade acima apontada”.

Resulta deste excerto, com toda a segurança e em termos inequívocos, que o acórdão recorrido não viu qualquer necessidade da realização de novos meios de prova junto do Tribunal da Relação, por existirem dúvidas fundadas sobre a prova realizada, antes dando conta da necessidade de ampliação da decisão de facto pela insuficiência dos factos dados como provados em 1ª instância.

O que significa, insofismavelmente, que o mesmo acórdão se queria referir nitidamente à alínea c) do nº 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil, embora por manifesto lapso haja referenciado, enquanto fundamento para o decidido, a alínea b) do mesmo preceito.

Assim, há simplesmente que operar oficiosamente a rectificação dessa parte do acórdão recorrido, sendo a remissão que concretamente o acórdão recorrido pretendia deixar expressa para a alínea c), e não para a alínea b), como resulta da sua fundamentação e da tramitação processual seguida no aresto.

Era essa a única questão que, neste tocante, a revista suscitava e que será desta forma resolvida.

Por outro lado, e como se disse, o modo de exercício dos poderes consignados na mencionada alínea c), quando a decisão consiste em ordenar a ampliação da decisão de facto, não comporta a interposição do recurso de revista por via do nº 4 do artigo 662º do Código de Processo Civil, pelo que nada mais há a conhecer no âmbito do objecto da revista.

De referir ainda que não se vislumbra na situação sub judice qualquer nulidade por excesso de pronúncia, genericamente prevista na alínea d) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, limitando-se o acórdão recorrido a fazer correctamente uso dos poderes funcionais que lhe competiam, nos termos supra expostos.

Nega-se, portanto, a revista.

IV – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Secção) negar a revista, confirmando o acórdão recorrido.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 17 de Outubro de 2023.

Luís Espírito Santo (Relator)

Ricardo Costa

Graça Amaral

V – Sumário elaborado pelo relator nos termos do artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil.