Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1036/12.4YRLSB.S1
Nº Convencional: 7ª SECÇÃO
Relator: GRANJA DA FONSECA
Descritores: REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
DECISÃO ARBITRAL
ORDEM PÚBLICA
INDEMNIZAÇAO DE CLIENTELA
PRESSUPOSTOS
NORMA IMPERATIVA
CONHECIMENTO OFICIOSO
CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE
Data do Acordão: 10/23/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Área Temática: DIREITO PROCESSUAL CIVIL / REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA / ARBITRAGEM / CONTRATO DE AGÊNCIA / INDEMNIZAÇÃO DE CLIENTELA
Doutrina: - ALBERTO DOS REIS, «PROCESSOS ESPECIAIS», VOL. II, PÁG. 175 E 176.
- ANTÓNIO MARQUES DOS SANTOS, «ESTUDOS DE DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO E DIREITO PROCESSUAL CIVIL INTERNACIONAL», ALMEDINA, PAG. 347;
- ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, “CONTRATOS DE DISTRIBUIÇÃO COMERCIAL», ALMEDINA, PÁG. 105 E SS.
- BAPTISTA MACHADO, «LIÇÕES DE DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO», ALMEDINA, 3.ª EDIÇÃO, P. 256;
- GOMES CANOTILHO E VITAL MOREIRA, «FUNDAMENTO DA CONSTITUIÇÃO», COIMBRA, PÁG. 65;
- JOSÉ MIGUEL JÚDICE E ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, «DO RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO DE SENTENÇAS ARBITRAIS ESTRANGEIRAS AO ABRIGO DA CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE», IN REVISTA INTERNACIONAL DE ARBITRAGEM E CONCILIAÇÃO, ANO III, 2010, PÁGS. 159 E SS.;
- LUÍS LIMA PINHEIRO, «ARBITRAGEM TRANSNACIONAL- DETERMINAÇÃO DO ESTATUTO DA ARBITRAGEM», ALMEDINA, PÁG. 289 E SS.;
- MARIA CRISTINA PIMENTA COELHO, «A CONVENÇÃO DE NOVA YORK DE 10 DE JUNHO DE 1958», REVISTA JURÍDICA DA AAFDL, N.º 20, OUTUBRO 1996, PÁGS. 42 E SS.;
- MENEZES LEITÃO, “A INDEMNIZAÇÃO DE CLIENTELA», ALMEDINA, PAG. 84 E SS.
- NEIL KAPLAN, “GUIA SOBRE A INTERPRETAÇÃO DA CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE: UM TEXTO DE REFERÊNCIA PARA OS JUÍZES», IN WWW.ARBITRIONICCA.ORG ;
- OLIVEIRA ASCENSÃO, “PARECER” IN COLECTÂNEA DE JURISPRUDÊNCIA, TOMO IV, 1985, PAGS. 24 E SS.
- PAULA COSTA E SILVA, «A EXECUÇÃO EM PORTUGAL DE DECISÕES ARBITRAIS NACIONAIS E ESTRANGEIRAS», ROA, N.º 67, VOL. II, 2007;
- SAVIGNY, «LIÇÕES DE DIREITO INTERNACIONAL PRIVADO – I», ALMEDINA, PÁG. 406;
- TABORDA FERREIRA, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS», ANO X, PÁG. 186;
Legislação Nacional: CÓDIGO CIVIL: ARTS. 11.º, 12.º, N.º 2 E 809;
NCPC: ART. 980.º, AL. F);
LEI DA ARBITRAGEM VOLUNTÁRIA (APROVADA PELA LEI 63/2001, DE 14-12): ARTS. 55.º, 56.º E 57.º;
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA: ARTS. 8.º, N.º 2;
Legislação Comunitária: CONVENÇÃO RELATIVA AO RECONHECIMENTO E EXECUÇÃO DE SENTENÇAS ARBITRAIS ESTRANGEIRAS, ASSINADA EM NOVA IORQUE EM 10-06-1958;
DIRECTIVA 86/653/CEE
Jurisprudência Nacional: - AC. STJ DE 18-2-2014, PROC. 1630/06.2YRCBR.C2.S1;
- AC. STJ DE 19-3-2009,
- AC. STJ 30-04-2002, PROC. 01ª824;
- AC. STJ DE 08-05-2003, PROC. 03B1123;
- AC. STJ 08-07-2003, PROC. N.º 03B2106;
- AC. STJ 12-10-2004, PROC. N. 1823/04;
- AC. STJ DE 02-02-2006, PROC. N.º 05B3766;
- AC. STJ DE 09-10-2003, PROC. N.º 03B1604;
- AC. STJ DE 27-04-2005, PROC. N.º 05B1067;
- AC. STJ DE 21-02-2006, PROC. 05B4168;
- AC. STJ 19-02-2008, PROC. N.º 07ª4790;
- AC. STJ 26-05-2009, PROC. N.º 43/09.9YFLSB;
- AC. STJ 04-05-1993, CJSTJ, T II, 1993, PÁG. 78;
- AC. STJ 20-04-1998, CJSTJ, T II, 1998, PÁG. 57;
- AC. STJ DE 31-03-2004, REV. N.º 545/04;
- AC. STJ DE 04-04-2006, REVI. N.º 4348/05;
- AC. STJ DE 24-01-2012, REVISTA N.º 39/2000.L1.S1;
- AC. STJ SE 20-06-2013, REVISTA N.º 178/07.2TVPRT.P1.S1;
- AUJ N.º 3/2008, DR I, SÉRIE, 03-04;
Jurisprudência Internacional: - AC. TJUE, DE 09-11-2000, PROC. C-381-98 (INGMA)
Sumário :
I - À revisão de sentença arbitral proferida por tribunal arbitral sedeado em Estado que haja subscrito a Convenção de Nova Iorque sobre o Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras de 1958 aplica-se primordialmente este tratado internacional, estando o tribunal estadual português, a quem é pedido o reconhecimento da mesma, adstrito a recusá-lo quando oficiosamente constate que o resultado a que se chegou naquela decisão contraria a ordem pública internacional do Estado Português.

II - O conceito de ordem pública internacional é vago, fluído e impreciso mas, numa aproximação com escopo meramente operativo, podemos, para o efeito assinalado em I, designá-la como uma amálgama de valores basilares e concepções dominantes de índole social, ética, política e económica expressos em princípios e regras que o aplicador deve, em cada momento histórico, interpretar e reconhecer a fim de apreciar se os mesmos se podem ter como afrontados pelo resultado a que se chegou na sentença arbitral revidenda.

III - A contrariedade à ordem pública internacional do Estado Português avalia-se em função do efeito jurídico a que a decisão arbitral conduz, irrelevando os fundamentos em que ela se ateve.

IV - O reconhecimento do direito à indemnização de clientela prevista no artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho a um concessionário assenta numa analogia que não prescinde da averiguação concreta das circunstâncias de cada caso, pelo que, sem mais, não se pode considerar que o direito português outorga àquele tal benefício, o que equivale por dizer que o facto de não se lhe conceder tal compensação não se revela manifestamente intolerável à luz da ordem pública internacional do Estado Português.

V - Sendo inviável, a partir dos factos apurados, considerar que a recorrente estava em condições de preencher os pressupostos que têm sido avançados para efectuar essa equiparação, não se pode concluir que afronta a ordem pública internacional do Estado Português uma decisão arbitral em que não se lhe reconheceu o direito a uma indemnização clientela.

VI – Muito embora o artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho deva ser considerado como uma norma imperativa – e, como tal, integrante da ordem pública nacional - tal constatação não implica, em atenção ao seu fundamento ou à natureza da indemnização de clientela, que a sua desaplicação pela decisão arbitral – por invocação de outra norma escolhida pelas partes e por outras razões – conflitue com a ordem pública internacional do Estado Português.

Decisão Texto Integral:
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1.

AA, SA instaurou contra SOC. BB DE AUTOMÓVEIS, SA processo especial, destinado ao reconhecimento da sentença do Tribunal Arbitral, proferida em 7 de Março de 2005, sob a égide Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (doravante CCI).

Alegou, em síntese, que manteve com a requerida, ao longo de cerca de vinte anos, relações comerciais, tendo sido esta última importadora de veículos AA produzidos pela primeira.

Aquelas relações comerciais foram regidas ao longo daquele período por sucessivos contratos, designados como "Contratos de Importador", que conferiam à requerida o exclusivo de importação e exportação de produtos AA em Portugal.

O último desses contratos foi outorgado em 1 de Outubro de 1966, tendo sido escolhida, como lei aplicável às relações contratuais, a lei espanhola.

O mesmo contrato continha a estipulação de uma cláusula compromissória nos termos da qual quaisquer litígios decorrentes da execução e interpretação do mesmo seriam submetidos a um Tribunal Arbitral sob a égide do Tribunal Internacional de Arbitragem da CCI, devendo a referida arbitragem ter sede em Paris e sendo os procedimentos conduzidos no idioma espanhol.

Em 27 de Setembro de 2002, a requerente, no quadro de entrada em vigor do Regulamento (CE) n.º 1400/2002, da Comissão, de 31 de Julho de 2002, relativo a certas categorias de acordos verticais e práticas concertadas no sector automóvel, comunicou à requerida a denúncia do “Contrato de Importador” com efeitos a partir de 30 de Setembro de 2003.

Discordando da denúncia que tinha por ilegal e do comportamento negocial adoptado pela requerente, a requerida instaurou um processo arbitral em Paris, na CCI, em 14 de Março de 2003, no qual formulou vários pedidos, nomeadamente de uma indemnização de clientela.

A requerente decidiu, através de carta de 21 de Março de 2003, resolver, com efeitos imediatos, o referido “Contrato de Importação”.

O processo arbitral, em que houve reconvenção deduzida pela AA, ora Requerente, decorreu em Paris, vindo a ser decidido a final por sentença arbitral proferida por unanimidade dos Árbitros, em 7 de Março de 2005, tendo a AA sido condenada a pagar determinadas importâncias, a título de dever de recompra de Stocks de peças e material técnico e a título de lucros cessantes, acrescidas de juros, bem como condenou a requerente a pagar certo montante a título de preço de veículos e de peças importadas.

A mesma sentença arbitral absolveu ambas as partes dos restantes pedidos reciprocamente formulados.

Tendo as Partes sido notificadas em 16 de Março de 2005 desta sentença, nenhuma delas a impugnou perante os tribunais franceses, tendo a mesma transitado em julgado.

Seguiram-se negociações entre as Partes relativas ao acatamento voluntário das decisões colhidas nessa sentença, tendo, em 28 de Setembro de 2005, sido outorgado pela AA e a SOC. BB de Automóveis, SA um “Acordo de Quitação Recíproca” que reconheceu terem sido pagas as quantias em que as partes haviam sido reciprocamente condenadas, com um saldo a favor da SOC. BB de Automóveis, SA de € 606.926,35, dando a requerida quitação das indemnizações recebidas da ora requerente.

Nesse documento, os subscritores AA e SOC. BB de Automóveis, SA declararam nada mais ter a haver ou a reclamar no âmbito da sentença proferida pelo Tribunal Arbitral da CCI, não tendo nenhuma das partes requerido, por isso, a revisão e confirmação da sentença arbitral estrangeira junto dos tribunais portugueses.

Contrariando as expectativas da requerente, dado o acordo alcançado com a requerida acima referido, a requerida e uma sociedade por ela detida, a Garagem CC, Ldª, concessionária da AA, propuseram, em 15 de Março de 2006, uma ação declarativa contra a requerente e a sua subsidiária em Portugal, AA PORTUGAL, UNIPESSOAL, L.da em que formularam pedidos condenatórios a título principal e a título subsidiário relacionados exclusivamente com a questão da indemnização da clientela a que aquelas primeiras sociedades, cada um por si, se julgavam com direito, não obstante a SOC. BB de Automóveis, SA ter decaído em idêntico pedido na acção arbitral CCI.

A tese central da SOC. BB de Automóveis, SA e da Garagem CC é a de que o artigo 38º da Lei do Contrato de Agência (DL n.º 178/86, de 3 de Julho) impõe que, nos contratos de agência em que a actividade do agente se tenha desenvolvido preponderantemente em Portugal, “só será aplicável legislação diversa da portuguesa, no que respeita ao regime de cessação, se a mesma se revelar mais vantajosa para o agente”, sendo certo que tal disciplina é aplicável por analogia ao contrato de concessão comercial, não restando dúvidas de que o “Contrato de Importador” se deve qualificar como tal.

Esta acção foi julgada no saneador com absolvição da ora requerente da instância, quanto ao pedido formulado pela SOC. BB de Automóveis, SA e absolvição quanto ao pedido relativamente às pretensões formuladas pela Garagem CC.

Interpostos recursos pelas então Autores foram ambos julgados improcedentes pela Relação de Lisboa.

Interpostos depois recursos para o STJ, este, por acórdão de 22 de Setembro de 2011, anulou o Acórdão recorrido, tendo considerado que a Relação deveria ter afrontado "a problemática de saber se o nosso ordenamento jurídico concede à recorrente SOC. BB de Automóveis, SA o direito que invoca de ter de ser indemnizada pela clientela que fez acrescer à recorrida AA e, do mesmo modo, caso se afirme que à recorrente lhe assiste esta regalia, a de averiguar se, ao denegar à SOC. BB de Automóveis, SA o pedido de indemnização de clientela por si formulado, o Tribunal Arbitral escolhido pelas partes violou a ordem pública portuguesa

Em execução deste Acórdão, a Relação de Lisboa revogou o saneador-sentença e mandou baixar o processo à primeira instância, para ser elaborada a base instrutória, por entender que havia factos controvertidos que careciam de prova, só depois se podendo conhecer das deduzidas excepções, o que foi feito com ulterior marcação de audiência preliminar.

Face aos antecedentes, acima delineados, entendeu a requerente peticionar o reconhecimento da Sentença Arbitral proferida pela CCI, para que tenha eficácia em Portugal.

A requerida tem sustentado, no processo judicial a que se fez referência, que a sentença arbitral, na parte em que absolveu a ora requerente do pedido de indemnização de clientela, não é susceptível de produzir efeitos em Portugal e, por isso, não pode ser reconhecida ou executada neste país, por conduzir a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública internacional do Estado Português.

Torna-se, por isso necessário discutir esta questão neste processo, concluindo que nada obsta ao reconhecimento da sentença estrangeira a qual não viola a ordem pública internacional do Estado Português.

A requerida deduziu oposição. Arguiu a incompetência absoluta deste Tribunal para rever a sentença arbitral, com consequente absolvição da instância da requerida, sendo que, se assim não se entender, deverá a acção ser julgada improcedente.

A requerente respondeu à excepção de incompetência, pugnando pela sua improcedência.

Cumprido o disposto no artigo 57º, n.º 3 da LAV de 2011, apresentaram alegações a requerente e o MP, ambos pugnando pela improcedência da excepção, devendo a acção ser julgada procedente.

O Tribunal da Relação, pronunciando-se sobre as questões que lhe foram colocadas, decidiu, quanto à excepção peremptória de incompetência absoluta deste Tribunal, que o Tribunal da Relação é competente para conhecer da presente acção, improcedendo a excepção. Quanto à segunda questão, (saber se a confirmação da sentença arbitral conduz, ou não, a um resultado incompatível com a ordem pública internacional portuguesa), decidiu que tal confirmação não conduz a um resultado incompatível com a ordem pública internacional portuguesa e, consequentemente, julgando procedente o pedido, reconheceu a Sentença Arbitral proferida na CCI, em 7 de Março de 2005, e junta aos autos.

Inconformada, recorreu de revista a SOC. BB de Automóveis, SA, pretendendo que, na procedência do recurso, seja julgada improcedente a acção, negando-se o reconhecimento da sentença arbitral revidenda por manifesta contradição com a ordem pública internacional portuguesa. Para tanto, finaliza as alegações com as seguintes conclusões:

1ª – No presente caso concreto, está em causa uma decisão arbitral estrangeira, proferida segundo a lei espanhola, em que foi negada a indemnização de clientela reclamada pela cessação de um contrato de distribuição ou concessão comercial que se desenvolveu exclusiva ou preponderantemente em território português;

2ª – A mesma decisão, apesar de ter julgado inválida a resolução do contrato com efeitos imediatos declarada pela aqui requerente e de ter também declarado que a denúncia do mesmo contrato efectuada pela requerente com o pré – aviso de um ano só poderia ter sido feita, no caso concreto, mediante pré – aviso de dois anos, pronunciou-se no sentido de que no caso dos contratos de concessão comercial não assiste ao concessionário (no caso Importador – Distribuidor) direito a indemnização de clientela porque a mesma não está contemplada pela lei espanhola;

3ª – Está em causa uma sentença arbitral proferida em França, país que, como Portugal, é parte na Convenção de Nova Iorque de 1958 sobre o reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras, razão pela qual a decisão não pode contrariar a ordem pública do estado de reconhecimento (artigo V, n.º 2, alínea b) da Convenção);

4ª – O acórdão recorrido reconhece expresssamente a “divergência entre a ordem jurídica interna, que reconhece a indemnização de clientela, e a sentença arbitral estrangeira que, por força da aplicação da lei espanhola, rejeitou essa indemnização”, tal como reconhece que “as normas dos artigos 33º e 38º do DL 178/96, de 3 de Julho, têm carácter imperativo”, mas conclui que as referidas normas “integram a ordem pública de Direito material, mas não a ordem pública internacional do Estado português”;

5ª – As normas dos artigos 33º e 38º do DL 178/96, de 3 de Julho, são normas de aplicação directa e imediata, ou internacionalmente imperativas, que o nosso ordenamento consagra como imperativamente aplicáveis, independentemente da lex contractus, quando a concreta situação real tenha com a ordem jurídica portuguesa uma especial conexão por elas definida (no caso tratar-se de contratos preponderante ou exclusivamente executados em território português);

6ª – Como bem decidiu o Tribunal de Justiça da União Europeia (processo C-381/98 INGMAR) a propósito das normas correspondentes da Directiva, “… é essencial para a ordem jurídica comunitária que um comitente estabelecido num país estrangeiro (…) não possa iludir estas disposições pelo simples jogo de uma cláusula de escolha da lei aplicável. A função que as disposições em causa preenchem exige com efeito que elas se apliquem (…) qualquer que seja a lei a que as partes tenham decidido sujeitar o contrato” e como bem assinala o Prof. Moura Ramos no parecer que ora se junta, este raciocínio jurídico aplica-se, mutatis mutandis, à ordem jurídica portuguesa e ao caso dos autos;

7ª - Com efeito, as regras (mínimas) que o nosso ordenamento jurídico exige que sejam aplicáveis independentemente da lex contractus, ou seja precisamente em vista de um potencial conflito com as regras de ordenamento jurídicos estrangeiros, integram necessariamente a ordem pública internacional portuguesa;

8ª – Se assim não fosse tais regras cederiam sempre que fossem postergadas por decisões estrangeiras o que constituiria um manifesto absurdo e uma contradição insanável, tanto em termos substanciais como em termos lógico – formais;

9ª – Aliás, na prática, atenta a doutrina obrigatória do Acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 3/2008, tais regras tornar-se-iam letra morta na grande maioria dos casos;

10ª – A decisão revidenda é manifestamente contraditória com a ordem pública internacional portuguesa e não pode portanto ser reconhecida como eficaz na nossa ordem jurídica.

11ª – A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 33º e 38º do DL 178/96, o artigo 21º do Código Civil e o artigo V, n.º 2, alínea b) da Convenção de Nova Iorque.

Contra – alegou a Recorrida AA, defendendo a confirmação do acórdão recorrido e, consequentemente, o reconhecimento da sentença arbitral revidenda, por ser plenamente compatível com a ordem pública internacional portuguesa, relevante de harmonia com o artigo V, n.º 2, alínea b) da Convenção de Nova IORQUE. Formula as seguintes conclusões:

1ª - Conforme concluído por Lima Pinheiro, “a sentença arbitral foi proferida em França, numa arbitragem realizada em França, razão por que cai dentro do âmbito de aplicação do regime da Convenção de Nova Iorque sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras tal como ele vigora na ordem jurídica portuguesa (artigo 1º da Convenção). Este regime prevalece sobre o regime de fonte interna, uma vez que a Convenção é uma fonte do Direito hierarquicamente superior à lei ordinária (artigos 8º, n.º 2, 277º, n.º 2, 278º, n.º 1, 279º, n.º 1 e 280º, n.º 3 da Constituição Portuguesa e artigo 70º, n.º 1 da Lei Orgânica sobre a Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional” (Conclusão 8ª do Parecer).

2ª - Lima Pinheiro peremptoriamente afirma que “a Convenção de Nova Iorque fixa taxativamente os fundamentos com os quais o reconhecimento de uma sentença arbitral estrangeira pode ser recusado (artigo 5º), por forma que não se podem fundar na lei ordinária quaisquer outros fundamentos de recusa de reconhecimento. O único fundamento de recusa de reconhecimento que está em causa no caso em apreço é o constante do artigo 5º, n.º 2, alínea b) da Convenção: contrariedade do reconhecimento à ordem pública do Estado de reconhecimento.

A previsão deste fundamento de recusa de reconhecimento não se confunde com o controlo de mérito da decisão. O tribunal de reconhecimento não pode verificar se o Direito aplicável foi corretamente determinado, se os factos foram devidamente apurados e se o Direito foi corretamente interpretado e aplicado aos factos.

Com efeito, é pacífico que a Convenção de Nova Iorque não permite um controlo de mérito da decisão arbitral "estrangeira" (Conclusão 9ª do Parecer);

3ª - Na presente ação de reconhecimento de sentença arbitral estrangeira, está em causa saber se viola a ordem pública internacional portuguesa, prevista no artigo V, n.º 2, alínea b), da Convenção de Nova Iorque de 1958, o entendimento perfilhado pelo Tribunal Arbitral CCI, a funcionar em França, de que o direito espanhol, aplicável por convenção das partes ao Contrato de Importador, não reconhece indemnização de clientela ao importador/concessionário português;

4ª - No Acórdão da Relação de Lisboa ora recorrido negou-se que ocorresse a excepção de ordem pública internacional e que, portanto, houvesse fundamento para não conceder o reconhecimento, por se entender, de forma inatacável, que tal reconhecimento não podia considerar-se susceptível de conduzir a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública internacional do Estado português, pois não se mostrava preterido nenhum princípio fundamental do Direito nacional em virtude desse reconhecimento, sendo certo que não se podia confundir a norma internacionalmente imperativa ou de aplicação imediata do artigo 38º da LCA com uma cláusula especial de reserva de ordem pública internacional;

5ª - Tal entendimento da Relação de Lisboa, por ser conforme à Lei, deve ser sufragado pelo Supremo Tribunal de Justiça;

6ª - Contrariamente ao sustentado pela Recorrente, o contrato de concessão, na modalidade de contrato de importador, não tem as mesmas caraterísticas jurídicas do contrato de distribuição paradigmático;

7ª - Todavia, se é verdade que a doutrina maioritária (Pinto Monteiro e Pinto Duarte, embora este último com nuances significativas) e a jurisprudência tendem a reconhecer, nos litígios apreciados pelos tribunais cíveis portugueses, o direito à indemnização de clientela, regulado no artigo 33º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 178/86 (LCA, Lei do Contrato de Agência), ao concessionário, existem opiniões que sustentam a solução de inaplicabilidade (sobretudo, a voz autorizada de F. Ferreira Pinto e, ao que se crê, de Helena de Brito);

8ª - A existência de controvérsia sobre a aplicação por analogia à situação contratual do concessionário/importador de indemnização de clientela do agente comercial indicia que não é reconhecida tal indemnização, naquele caso, como um princípio estruturante de ordem jurídica portuguesa, e muito menos que existe um reconhecimento desse direito de indemnização de clientela com um direito fundamental do concessionário;

9ª - A inderrogabilidade do disposto nos artigos 17º e 18º da Directiva n.º 86/653 CEE, (sendo certo que a primeira dessas disposições regula a indemnização de clientela), reconhecida no artigo 19º dessa Directiva vale, como solução uniformizada, em todos os Estados - Membros da União Europeia, embora a maior parte deles não tenha criado uma norma internacional imperativa na matéria, diferentemente do que fizeram o legislador belga (o qual, no artigo 27º da Lei Belga do Contrato de Agência, sujeitou toda e qualquer actividade de um agente comercial com sede na Bélgica à lei belga e estabeleceu a jurisdição internacional exclusiva dos tribunais belgas para conhecer desses litígios, sem prejuízo do disposto em convenções internacionais) e o legislador português, (o qual se limitou a consagrar no artigo 38º da LCA uma regra de conflitos unilateral qualificável como norma internacional imperativa ou norma de aplicação imediata sem estabelecer qualquer competência exclusiva dos tribunais estaduais portugueses na matéria);

10ª - A jurisprudência do TJCE em 2000, no caso INGMAR, reconheceu que não podia ser aplicada, atento o disposto no Direito comunitário, uma solução do Direito de um país terceiro, (no caso, o Direito da Califórnia, Estado Federado dos E.U.A.), estipulado com lex causae num contrato de agência de que era parte um agente sedeado num Estado - Membro, a qual negava a indemnização de clientela ao agente;

11ª - Essa solução jurisprudencial aplica-se em exclusivo ao contrato de agência, atendendo à uniformização mínima de respectiva regulamentação em todos os Estados Membros, por força da referida Directiva;

12ª - Diferentemente do que sustenta a Recorrente, não é aplicável por analogia ao Contrato de Importador sub judicio a doutrina do caso INGMAR, precisamente porque todos os outros contratos de distribuição, (isto é, excluindo o contrato de agência), não têm uma disciplina uniformizada a nível europeu, sendo, na maior parte dos países, contratos juridicamente atípicos;

13ª - Não existindo um regime uniformizado dos contratos de concessão ou de importador a nível europeu, não pode afastar-se a solução jurídica acolhida num Estado - Membro da União Europeia que não reconhece a indemnização de clientela do concessionário/importador - num contrato em que seja lex causae a lei desse país - com invocação do disposto no artigo V, n.º 2, alínea b), da Convenção de Nova Iorque;

14ª - O artigo 38º da LCA é uma norma internacionalmente imperativa que tem de ser aplicada pelos tribunais estaduais portugueses nos contratos de agência em que o agente tenha desenvolvido de forma preponderante a sua actividade em território português mas, ainda que por hipótese seja aplicado por analogia a um contrato de concessão que se haja desenvolvido em Portugal, tal não significa que não haja relevantes diferenças entre ambos os contratos, ou que o concessionário haja de ser sempre considerado uma parte débil na economia do contrato;

15ª - A circunstância de o referido artigo 38º da LCA ser uma norma internacionalmente imperativa e que, por isso, integra a ordem pública portuguesa, não significa que integre a ordem pública internacional do Estado português;

16ª - Como sustenta Dário Moura Vicente, no Parecer junto aos autos, o não reconhecimento do direito de indemnização de clientela pela sentença arbitral revidenda, por o mesmo não ser reconhecido no Direito espanhol aplicável ao litígio contratual, não viola qualquer princípio jurídico fundamental do Direito português, não obstando ao reconhecimento neste ordenamento daquela sentença arbitral estrangeira; não sendo esta afirmação prejudicada "pela circunstância de o artigo 38º da Lei do Contrato de Agência determinar que aos contratos deste tipo que se desenvolvam exclusiva ou preponderantemente em Portugal só é aplicável legislação diversa da portuguesa (como sucedeu no caso) se esta for mais vantajosa para o agente. Uma coisa são, com efeito, as normas internacionalmente imperativas (ou de aplicação imediata) da lei portuguesa, cuja eficácia aquela regra de conflitos unilateral visa acautelar nos processos submetidos a tribunais portugueses; outra, bem diversa, é a reserva de ordem pública internacional, que, a nosso ver, não compreende a indemnização de clientela reclamada no caso em apreço e que não se opõe, também por isso, ao reconhecimento em Portugal da sentença em questão (conclusão 5ª do seu Parecer, a fls. 417/418 dos autos);

17ª – Deve, aliás, notar-se que a Recorrente, no presente caso, aceitou a sentença arbitral CCI, que aplicava o Direito espanhol, não a impugnou perante os tribunais franceses, deixou-a transitar em julgado, celebrou um Acordo de Quitação Recíproca com a ora Recorrida, declarou que nada mais tinha a reclamar desta última, e, depois, apressou-se a propor uma ação nos tribunais estaduais portugueses, invocando a aplicação analógica dos artigos, 33º, n.º 1º e 38º da LCA ao “Contrato de Importador”, desse modo se comportando com uma falta de lisura que tem de ser censurada neste processo;

18ª - Em qualquer caso e como põe em destaque Lima Pinheiro, "o contrato em presença apresenta um desvio relativamente ao tipo normal do contrato de concessão comercial, uma vez que prevê que os veículos automóveis sejam revendidos principalmente a outros concessionários, e não a consumidores. Trata-se, assim, de um tipo modificado, razão por que a aplicabilidade a este contrato de quaisquer soluções desenvolvidas para contratos de concessão comercial terá de ser sujeita a um escrutínio cuidadoso, que atenda à particularidade do caso" (Conclusão 1ª do Parecer);

19ª - "Se a atribuição do direito de indemnização de clientela ao agente não constitui uma concretização seja de qualquer direito fundamental seja de um princípio fundamental estruturante da ordem jurídica portuguesa, a extensão analógica desse direito a outros distribuidores e, em particular, ao «importador», é uma solução muito controversa que por maioria de razão nunca poderia ser vista como uma imposição de qualquer direito ou princípio fundamental estruturante da ordem jurídica portuguesa" (Conclusão 7ª do Parecer de Lima Pinheiro);

20ª - Como sustenta Lima Pinheiro, no caso presente "não estamos perante um contrato de agência e, por conseguinte, não existe qualquer norma vigente na ordem jurídica portuguesa que determine a aplicação necessária da regra que atribui o direito à indemnização de clientela, e a jurisprudência INGMAR é obviamente inaplicável, não só porque não se trata de um contrato de agência, mas também porque a lei escolhida pelas partes (a espanhola) é a lei de um Estado - Membro da União Europeia" (Conclusão 12 do Parecer de Lima Pinheiro);

21ª - "O direito à indemnização de clientela não só não é concretização de um direito fundamental, como tão-pouco existem proposições legais ou consuetudinárias das quais se possa inferir implicitamente a aplicação necessária da norma do regime do contrato de agência que atribui esse direito a outros contratos de distribuição" (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 13ª);

22ª – “O artigo 5º, n.º 2, alínea b) da Convenção de Nova Iorque admite que o reconhecimento seja recusado se o tribunal do Estado de reconhecimento verificar que o reconhecimento é contrário à ordem pública deste país. Segundo a intencionalidade do legislador internacional, que se infere dos trabalhos preparatórios da Convenção, este fundamento de recusa de reconhecimento deve ser interpretado restritivamente” (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 16ª).

23ª – “Daí decorre, em primeiro lugar, que nos sistemas em que há uma dualidade de conceitos de ordem pública - ordem pública interna e ordem pública internacional-, a ordem pública que está aqui em causa não é a ordem pública interna (ou de Direito material), mas a ordem pública internacional relevante para o Direito Internacional Privado.

Não se trata, portanto, do conjunto das regras ou princípios imperativos do Direito material português (ordem pública interna), mas de um núcleo muito mais restrito do que aqueles que subjazem à ordem pública interna. Isto liga-se com uma característica fundamental da cláusula de ordem pública internacional: a sua excepcionalidade. Esta cláusula só intervém como limite à aplicação do Direito estrangeiro quando a solução dada ao caso for não apenas divergente da que resultaria da aplicação do Direito português, mas também manifestamente intolerável” (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 17ª).

24ª - "Enquanto limite ao reconhecimento dos efeitos de uma decisão estrangeira, a cláusula de ordem pública internacional só intervém quando o resultado do reconhecimento for, no caso concreto, manifestamente incompatível com normas e princípios fundamentais estruturantes da ordem jurídica do foro.

À luz das razões que justificam o reconhecimento de sentenças arbitrais «estrangeiras», este fundamento de recusa de reconhecimento das decisões arbitrais «estrangeiras» deve ser entendido por forma especialmente restritiva" (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 18ª);

25ª - "Da interpretação restritiva deste fundamento de recusa de reconhecimento decorre ainda que ele não pode ser invocado com base na simples violação de uma qualquer norma de aplicação imediata ou necessária (…)" (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 19ª).

26ª - "No presente caso, não existe qualquer norma imediata ou necessariamente aplicável que atribua o direito de indemnização ao concessionário ou ao "importador", e, por conseguinte, nem é relevante a questão de saber se essa norma constitui uma cláusula especial de ordem pública." (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 21ª).

27ª - "Com respeito ao reconhecimento de decisões estrangeiras, a fraude à lei competente só pode ser relevante quando haja uma revisão de mérito da decisão que permita o controlo da lei aplicável). Com efeito, se for irrelevante a lei que foi aplicada pelo tribunal estrangeiro é obviamente irrelevante o modo de determinação dessa lei e, designadamente, a atitude do tribunal estrangeiro perante uma qualquer manobra fraudulenta contra a lei normalmente competente.

Sendo pacífico que a Convenção de Nova Iorque exclui o controlo de mérito da decisão arbitral "estrangeira" e que contém uma enumeração taxativa dos fundamentos de recusa de reconhecimento, o instituto da fraude à lei não desempenha qualquer papel no reconhecimento de decisões arbitrais "estrangeiras" (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 25ª).

28ª - De forma certeira afirma Lima Pinheiro: "O argumento sobre as consequências do entendimento adoptado pela decisão recorrida não é um argumento de Direito positivo, mas um argumento de política jurídica que é irrelevante para a decisão do caso (…)" (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 26ª).

29ª - "A admissibilidade de pactos de jurisdição e de convenções de arbitragem numa matéria em que vigora uma norma de aplicação imediata ou necessária não pode justificar por si que essa norma constitua uma cláusula especial de ordem pública. Decisivo, a este respeito, é apenas que essa norma possa ser vista como a concretização de um princípio fundamental estruturante da ordem jurídica portuguesa" (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 27ª);

30ª - Como afirma Lima Pinheiro," ... o legislador português tão-pouco tomou a iniciativa de estender a indemnização de clientela a outros distribuidores, e muito menos de determinar a aplicação imediata ou necessária deste regime, razão por que nem sequer está garantida a aplicação desse regime pelos tribunais estaduais portugueses quando apreciem contratos internacionais de distribuição que não sejam de agência. É paradoxal que, perante a situação legislativa existente, e o sentido liberalizante da evolução verificada nos últimos anos, se venha contestar o reconhecimento de uma sentença arbitral proferida numa arbitragem que se realizou no estrangeiro por não ter aplicado esse regime" (Parecer, Conclusão 29ª);

31ª - Por isso, o "legislador português, à semelhança da maioria dos legisladores estrangeiros, e designadamente, de Estados-Membros da União Europeia, valorou mais, nas relações internacionais entre empresas, e designadamente, em modalidades contratuais em que não se pode afirmar genericamente uma grande desigualdade económica e negocial entre as partes, o princípio da autonomia da vontade do que a absoluta e incondicional aplicabilidade de determinados regimes imperativos.

Se a SOC. BB de Automóveis, SA aceitou a competência de um tribunal arbitral e a aplicabilidade da lei espanhola mediante cláusulas contratuais livremente negociadas, não pode agora subtrair-se às consequências jurídicas das suas escolhas, mediante uma oposição ao reconhecimento da sentença arbitral que não tem fundamento jurídico-positivo." (Lima Pinheiro, Parecer, Conclusão 30ª).

Colhidos os vistos, cumpre apreciar:

2.

Com relevância para a apreciação das questões suscitadas, o Tribunal da Relação considerou provados os seguintes factos:

1º - A requerente (abreviadamente designada por AA) e requerida (abreviadamente designada por SOC. BB) mantiveram, ao longo de cerca de vinte anos, relações comerciais, tendo sido esta última importadora de veículos AA produzidos pela primeira.

2º - A requerida foi responsável nesse período pela comercialização por grosso em Portugal desses veículos e respectivas peças e sobresselentes.

3º - Essas relações foram regidas ao longo desse período por sucessivos contratos, designados como "Contratos de Importador", que conferiam à requerida o exclusivo de importação e distribuição de produtos AA em Portugal.

4º - O último desses contratos, redigido em língua espanhola, foi outorgado por requerente e requerida, em 1 de Outubro de 1996, tendo sido escolhida como lei aplicável às relações contratuais a lei espanhola.

5º - O mesmo "Contrato de Importador" continha a estipulação de uma cláusula compromissória, nos termos da qual quaisquer litígios decorrentes da execução e interpretação do mesmo seriam submetidos a um Tribunal Arbitral sob a égide do Tribunal Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI), devendo a referida arbitragem ter sede em Paris e sendo os procedimentos conduzidos no idioma espanhol.

6º - Em 27 de Setembro de 2002, a ora requerente comunicou à requerida a denúncia do Contrato de Importador com efeitos a partir de 30 de Setembro de 2003.

7º - Em 14 de Março de 2003, a requerida instaurou um processo arbitral em Paris, no qual formulou vários pedidos, nomeadamente o pagamento de uma indemnização de clientela.

8º - A requerente decidiu, através de carta de 21 de Março de 2003, resolver com efeitos imediatos o referido Contrato de Importador.

9º - Na pendência do processo arbitral, a requerida requereu uma providência cautelar contra a requerente, que foi decretada em 1ª instância, depois revogada pelo Tribunal da Relação.

10º - O processo arbitral - em que houve reconvenção deduzida pela requerente - decorreu em Paris, vindo a ser decidida a final por sentença arbitral proferida por unanimidade dos árbitros em 7 de Março de 2005.

11º - Tal sentença acha-se redigida em língua castelhana e condenou a AA a pagar certas importâncias, a título de dever de recompra de stock de peças e material técnico e a título de lucros cessantes, acrescidas de juros, bem como condenou a Soc. BB a pagar certo montante, a título de preço de veículos e de peças importadas.

12º - A mesma sentença absolveu ambas as partes dos restantes pedidos reciprocamente formulados, determinando a repartição de custas em partes iguais, devendo cada parte suportar os seus próprios custos decorrentes dessa arbitragem.

13º - As partes foram notificadas dessa sentença, em 16 de Março de 2005, não a tendo nenhuma delas formulado impugnado junto dos tribunais estaduais franceses.

14º - Seguiram-se negociações entre as partes relativas ao acatamento voluntário das decisões contidas nessa sentença.

15º - Em 28 de Setembro de 2005, foi outorgado pela AA e a Soc. BB um “Acordo de Quitação Recíproca”, em língua inglesa ("Mutual Acquitance"), que reconheceu terem sido pagas as quantias a que as partes haviam sido reciprocamente condenadas, com um saldo a favor da Soc. BB de € 606.929,35, dando a requerida quitação das indemnizações recebidas da requerente.

16º - Nesse documento, os subscritores AA e Soc. BB declararam nada mais ter a haver ou a reclamar no âmbito da sentença proferida pelo Tribunal Arbitral da CCI.

17º - Nenhuma das partes requereu a revisão e confirmação da sentença arbitral estrangeira.

18º - A requerida e a Garagem CC, Ldª, concessionária da AA, propuseram, em 15 de Março de 2006, acção declarativa contra a requerente e a sua subsidiária em Portugal, AA PORTUGAL, UNIPESSOAL, L.da, em que formularam pedidos condenatórios a título principal e a título subsidiário relacionados exclusivamente com a questão da indemnização da clientela que aquelas primeiras sociedades, cada uma por si, se julgavam com direito, não obstante a Soc. BB ter decaído em idêntico pedido na acção arbitral.

19º - Essa acção foi distribuída à 3ª Vara Cível de Lisboa, 2ª Secção (Processo n.º 1772/06.4TVLSB).

20º - A tese central da requerida e da Garagem CC, Ldª é a de que o artigo 38º da Lei do Contrato de Agência impõe que, nos contratos de agência em que a actividade do agente se tenha desenvolvido preponderantemente em Portugal, "só será aplicável legislação diversa da portuguesa, no que respeita ao regime de cessação, se a mesma se revelar mais vantajosa para o agente", sendo certo que tal disciplina é aplicável por analogia ao contrato de concessão comercial.

21º - Essa acção foi contestada, tendo terminado no saneador, datado de 26 de Janeiro de 2010, com a absolvição da requerente da instância quanto ao pedido formulado pela Soc. BB e absolvição quanto ao pedido relativamente às pretensões formuladas pela GARAGEM CC.

22º - Interpostos recursos pelas então Autores, foram ambos julgados improcedentes por Acórdão da Relação de Lisboa de 28 de Novembro de 2010.

23º - Interpostos depois recursos para o STJ, este por Acórdão de 22 de Setembro de 2011, anulou o Acórdão recorrido, tendo considerado que a segunda instância deveria ter afrontado "a problemática de saber se o nosso ordenamento jurídico concede à Recorrente "SOC. BB de Automóveis, SA" o direito que invoca [de] ter de ser indemnizada pela clientela que fez acrescer à recorrida "AA" e, do mesmo modo, caso se afirme que à recorrente lhe assiste esta regalia, a de averiguar se, ao denegar à Soc. BB o pedido de indemnização de clientela por si formulado, o Tribunal Arbitral escolhido pelas partes violou a ordem pública portuguesa".

24º - Em execução deste Acórdão, esta Relação, por Acórdão de 12 de Janeiro de 2013, revogou o saneador sentença e mandou baixar o processo à 1ª instância, para ser elaborada base instrutória, por entender que havia factos controvertidos que careciam de prova, só depois se podendo conhecer das deduzidas excepções.

25º - Em 26 de Setembro de 2012, foi proferida decisão pelo primeiro grau que suspendeu a instância por ter considerado que o pedido de Revisão/Confirmação de sentença estrangeira constitui causa prejudicial.

26º - O presente processo foi instaurado em 25 de Setembro de 2012.

3.

Tendo em conta as alegações da recorrente Soc. BB, constata-se que esta se conformou com a decisão, na parte em que se julgou improcedente a excepção peremptória de incompetência absoluta do Tribunal da Relação, pelo que a única questão a abordar é a de saber se a confirmação da sentença arbitral da CCI proferida no litígio entre a Soc. BB e a AA «conduz ou não a um resultado incompatível com a ordem pública internacional do Estado Português.

4.

4.1.

QUESTÃO PRÉVIA:

Pretende a requerente, perante os tribunais portugueses, o reconhecimento de uma sentença que foi proferida por um tribunal arbitral sedeado em França (cfr. ponto 10º). Tal decisão versou sobre relações de cariz comercial mantidas entre as partes e que se consubstanciaram em sucessivos “Contratos de Importador” (cfr. pontos 1º a 5º, 7º e 8º do mesmo elenco).

Tendo em conta estes elementos factuais basilares, impõe-se chamar à colação a Convenção Relativa ao Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, celebrada em Nova Iorque em 10 de Junho de 1958 (doravante apenas a “Convenção”) de que tanto a República Portuguesa[1] como a República Francesa são partes.

Resulta da primeira parte do n.º 1 do artigo I desse tratado internacional que “a Convenção se aplica ao reconhecimento e à execução das sentenças arbitrais proferidas no território de um Estado que não aquele em que são pedidos o reconhecimento e a execução das sentenças e resultantes de litígios entre pessoas singulares ou colectivas. Aplica-se também às sentenças arbitrais que não forem consideradas sentenças nacionais no Estado em que são pedidos o seu reconhecimento e execução”.

Ou seja, esta norma aplica-se sempre que se almeje o reconhecimento de uma sentença arbitral perante um Estado diferente daquele em que se proferiu a decisão arbitral, contanto que “as sentenças arbitrais tenham sido proferidas no território de Estados a ela (Convenção) vinculados”, por força da reserva formulada pelo Estado Português ao abrigo do n.º 3 desse artigo (cfr. artigo 2º da Resolução da Assembleia da República n.º 37/94 de 10 de Março de 1994).

Por sua vez, resulta da parte final do n.º 3 do artigo I que a Convenção se aplicará aos litígios resultantes de relações de direito, contratuais ou não contratuais de índole comercial[2].

Confrontando os factos provados com o que resulta do artigo I da Convenção e da referida reserva, não restam dúvidas de que estamos perante uma sentença arbitral que, nos próprios termos da Convenção, se deve ter como “estrangeira” e que versa sobre matéria comercial.

Crê-se assim ser claro que a Convenção tem plena aplicabilidade ao caso dos autos.

Na medida em que a Convenção, após a sua ratificação, constitui direito vigente na ordem jurídica do Estado Português (cfr. n.º 2 do artigo 8º da Constituição da República Portuguesa), a mesma prevalece sobre outras normas jurídicas internamente vigentes[3], como, aliás, deriva do artigo 55º da Lei da Arbitragem Voluntária, (aprovada pelo n.º 1 do artigo 1º da Lei n.º 63/2011 de 14 de Dezembro) que encima o capítulo desse diploma dedicado ao reconhecimento de sentenças arbitrais estrangeiras, salvaguardando, no entanto, o âmbito de aplicabilidade da Convenção.

4.2.

Se a sentença arbitral, na parte em que absolveu a AA do pedido de indemnização de clientela é, ou não, susceptível de produzir efeitos em Portugal e, em caso negativo, se não pode ser reconhecida ou executada em Portugal, por conduzir a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública internacional do Estado Português.

Tornando-se imprescindível que a recorrida logre obter o reconhecimento da supra citada decisão arbitral[4] para que dela se possa prevalecer perante os tribunais estaduais portugueses, importa afrontar a questão suscitada pela recorrente como óbice maior à pretensão por aquela deduzida.

4.2.1.

O artigo V da Convenção elenca os casos em que poderão ser recusados o reconhecimento e a execução da sentença arbitral, prevendo-se, na alínea b) do n.º 2 do artigo V da Convenção, o que ora interessa, que “poderão igualmente ser recusados o reconhecimento e a execução de uma sentença arbitral se a autoridade competente do país em que o reconhecimento e a execução foram pedidos, constatar (…) que o reconhecimento ou a execução da sentença são contrários à ordem pública desse país”.

Por contraponto aos motivos de recusa que somente são invocáveis pela parte contra quem se deduz o pedido de reconhecimento (cfr. n.º 1 do mesmo artigo), evidencia-se que estamos perante um fundamento de recusa de reconhecimento e da execução de sentença arbitral estrangeira de conhecimento oficioso.

Corrobora este entendimento o artigo 56º da Lei de Arbitragem Voluntária. Pronunciando-se sobre os fundamentos de recusa do reconhecimento e execução, salienta a alínea a) do seu n.º 1 que o reconhecimento e a execução de uma sentença arbitral proferida numa arbitragem localizada no estrangeiro só podem ser recusados a pedido da parte contra a qual a sentença for invocada, se (…), contrapondo a sub - alínea ii) da alínea b) do n.º 1 desse artigo 56º que o reconhecimento pode ser recusado se “(…) o tribunal verificar que (…) o reconhecimento ou a execução da sentença conduz a um resultado manifestamente incompatível com a ordem pública internacional do Estado português.” (cfr., paralelamente e a respeito de sentenças judiciais, o disposto na alínea f) do artigo 980º do Código de Processo Civil).

4.2.2.

Sendo a ordem pública internacional do Estado português um dos fundamentos, de conhecimento oficioso, que obsta ao reconhecimento ou à execução de uma sentença arbitral proferida numa arbitragem localizada no estrangeiro, o certo é que nem a Convenção nem a Lei da Arbitragem Voluntária definem o que se deva entender por ordem pública internacional, parecendo, contudo, desde já, ser claro que a ordem pública referida naquele preceito da Convenção é a ordem pública internacional do estado em que se pede o reconhecimento ou a execução[5].

A vaguidade e fluidez do conceito permitem antever o cariz espinhoso[6] da tarefa que é cometida ao julgador ao solicitar-se-lhe que concretize tal conceito em face de uma situação da vida real, importando, pois, recolher alguns contributos que permitam densificar esse conceito.

4.2.3.

De acordo com ALBERTO DOS REIS, os princípios gerais de orientação que permitem sustentar o que se deva entender sobre ordem pública internacional devem, por um lado, ser buscados nos caracteres gerais das normas de ordem pública – a rigorosa imperatividade, a consagração de interesses superiores da comunidade e a antinomia entre elas e as disposições de leis estrangeiras - e, por outro, nas razões – de ordem política, moral ou económica - que impõem a prevalência dessas normas sobre outras que normalmente seriam competentes[7].

No campo do direito internacional privado, BAPTISTA MACHADO ensinava que, para evitar um intolerável afrontamento à harmonia jurídico-material interna ou a oposição flagrante com os princípios fundamentais que sustentam a ordem jurídica nacional, se facultara ao juiz um meio que lhe permite arredar a aplicação do direito estrangeiro dissonante, qual seja a excepção da ordem pública internacional ou a reserva da ordem jurídica[8].

O mesmo Autor dava nota da dificuldade de concretizar univocamente o conceito de ordem pública internacional, dado que este “(…) transcende sempre, em último termo, as coordenadas analíticas com que a tentamos apreender (…)” porque “(…) não se trata de um valor jurídico entre muitos outros, mas – digamos – do lugar geométrico de todos os valores jurídicos (…)”, acabando por trilhar os mesmos caminhos de ALBERTO DOS REIS - (enunciou as características das normas de ordem pública interna – a tutela de interesses superiores do Estado ou da comunidade, a divergência essencial entre as normas nacionais e as normas do direito estrangeiro e a absoluta imperatividade - e completou-as com a referência de que as normas da “lex fori” relevantes para desencadear o funcionamento da excepção terão de ser fundadas em razões de ordem económica, ético-religiosa ou política) e apelando ao senso jurídico do julgador, o que se traduz, no plano psicológico, por “(…) uma reacção fortemente desaprovadora do seu espírito de jurista, formado no estudo do direito interno (…)[9]”.

Em suma, trata-se de “(…) acordar para a vida, no substrato ético-jurídico da comunidade, historicamente sedimentado, os radicais ou étimos do sistema para nos assegurarmos daquilo que a sua dinâmica interna (o seu «metabolismo») rejeita como inassimilável (…)”[10]

Esta concepção de ordem pública internacional – que pode ser designada como aposteriorística - contrapõe-se a uma outra – apelidada como apriorística e hoje afastada – segundo a qual esta se consubstanciaria numa qualidade inerente a certas normas materiais do foro que estendia a sua aplicabilidade mesmo em casos ligados por determinados elementos de conexão a ordenamentos estrangeiros, derrogando as normas de conflitos gerais[11].

Também FERRER CORREIA, (igualmente no domínio do direito internacional privado), perfilhava uma concepção aposteriorística de ordem pública internacional inspirada na lição de SAVIGNY, sustentando que a ordem pública constitui um limite de cariz excepcional à aplicação da lei normalmente competente em virtude de tal dar azo ao surgimento (…) de uma situação manifestamente intolerada pelas concepções ético-jurídicas reinantes na colectividade, ou lesiva de interesses fundamentais do Estado. (…)”[12].

Assinalava-lhe ainda um cariz forçosamente impreciso e apenas definível pela função de evitar situações jurídicas incompatíveis com postulados basilares do direito nacional - considerando que (…) a decisão de não aplicar as leis estrangeiras é alguma coisa que joga essencialmente com avaliações subjectivas do juiz, com a representação que na mente deste se forme acerca do sentimento jurídico dominante na colectividade e das reacções desse sentimento à constituição ou reconhecimento do efeito jurídico que se tem em vista. (…)” – e considerava que era em “(…) função de concepções que hão-de vigorar no próprio país onde a questão se põe (ela varia, portanto, no espaço), que hão-de vigorar na própria ocasião do julgamento (…)”[13]. Noutro passo[14], explanou o mesmo Autor que o julgador “(…), socorrendo-se do seu senso jurídico (…),” deve apurar “(…) se a aplicação da lei estrangeira importaria, na hipótese, um resultado intolerável, quer do ponto de vista do comum sentimento ético-jurídico, (bons costumes), quer do ponto de vista dos princípios fundamentais do direito português: algo de inconciliável com as concepções jurídicas que alicerçam o sistema (…)”.

Na esteira deste entendimento, parece encaminhar-se OLIVEIRA ASCENSÃO[15], ao sustentar que a ordem pública internacional é composta por “(…) princípios caracterizadores do ordem jurídica desse Estado, que representa o que aos olhos da comunidade nacional será considerado como essencial para a vida (…)”. Acrescenta ainda este Autor que o afastamento da lei estrangeira normalmente competente ocorre por ser “(…) valorativamente inadmissível acolher aquele resultado [aquele que é propiciado pela aplicação da lei estrangeira] no ordenamento do foro (…)”, o que o leva concluir que a noção em causa tem um pendor essencialmente valorativo e não formal e  que apenas funciona no momento da aplicação, demandando do intérprete a “(…) retomada da colocação histórica do problema a cada novo caso que surge (…)”.

Também TABORDA FERREIRA[16] sustenta que a ordem pública da “lex fori” é “(…) o conjunto de princípios que, por serem fundamento de uma ordem jurídica determinada, impedem a aplicação na respectiva esfera de influência da lei estrangeira normalmente competente ou o conhecimento dos respectivos efeitos. Esses princípios serão estabelecidos em função de diversas circunstâncias e, nomeadamente, da concepção do justo e do injusto própria de cada Estado, a qual deverá no entanto, desenvolver-se dentro do conceito universal do justo e do injusto, por sua vez resultante de uma Justiça Natural, tida como valor objectivo e permanente (…)", assinalando-lhe um efeito negativo, (impedir a aplicação da lei normalmente competente). Distingue ainda este Autor entre a ordem pública geral – os princípios aplicáveis a todo o ordenamento jurídico – e a ordem pública especial – a qual resulta “(…) de disposições de carácter especial, enunciadas a propósito de certas e determinadas instituições ou institutos jurídicos (…)”.

Na mesma esteira de entendimento se encaminha a lição de ANTÓNIO MARQUES DOS SANTOS[17], ao considerar que “(…) estão em causa apenas princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa que de tão decisivos que são não podem ceder, nem sequer nas relações jurídico-privadas plurilocalizadas (…)”.

Por seu turno, MARIA CRISTINA PIMENTA COELHO considera que existirá violação da ordem interna do Estado em que se pede o reconhecimento ou a execução em casos em que se verifiquem “(…) ofensas graves aos princípios fundamentais do ordenamento jurídico (…)”[18].

Em sentido distinto, no que tange ao preenchimento do conceito a que vimos aludindo, encaminha-se a lição de LUÍS DE LIMA PINHEIRO.

Refere este Autor que a cláusula de ordem pública internacional não “(…) se tem acantonado aos valores ético-jurídicos nem a realidade das normas susceptíveis de aplicação necessária se circunscreve a fins económicos, sociais e políticos é apta para veicular todos os princípios e normas fundamentais da ordem jurídica do foro que tenham aplicação a situações transnacionais. Não pode fazer-se uma limitação a princípios ético-jurídicos. Também podem ser veiculados, como vem sendo reconhecido pela jurisprudência, princípios e normas que prosseguem finalidades económico-sociais, políticas ou outras (…)”, ensinando, mais adiante, que nela se englobam “(…) todas as normas e princípios constitucionais, internacionais e comunitários que reclamem aplicação ao caso (…)”, o que inclui os direitos universais reconhecidos a quaisquer seres humanos mas também a violação de normas adjectivas – verbi gratia o princípio do contraditório -, constituindo a não contrariedade à ordem pública internacional um pressuposto de índole substantiva do reconhecimento e execução[19].

A respeito da concretização do aludido conceito no plano do reconhecimento e execução de sentenças arbitrais, NEIL KAPLAN[20] escreve que a “(…) maioria dos tribunais estatais adopta os parâmetros mais restritos da ordem pública internacional, aplicando normas materiais advindas de fontes internacionais. (…)” e assevera que (…) as recomendações da International Law Association emitidas em 2002 (…) com relação à “Ordem Pública” são cada vez mais reconhecidas como reflectindo as melhores práticas internacionais (…)”.

De entre estas recomendações, impõe-se destacar a cláusula 1ª, alínea d) segundo a qual “(…) a expressão “ordem pública internacional” é utilizada nas recomendações para designar um corpo de princípios e regras reconhecidos por um Estado que, em razão da natureza dessas regras e princípios, pode impedir o reconhecimento e a execução de uma sentença arbitral proferida no contexto da arbitragem comercial internacional, caso o reconhecimento e a execução de referida sentença enseje violação dessas regras, seja em razão do procedimento sob o qual a sentença foi proferida, (ordem pública processual internacional), seja em razão de seu conteúdo, (ordem pública material internacional) (…)” e inclui:

(i) - Princípios fundamentais, pertinentes à justiça e à moral, que o Estado visa a proteger, ainda que os referidos princípios não sejam directamente violados;

(II) - Regras designadas para servir aos interesses políticos, económicos e sociais essenciais ao Estado, conhecidos como “lois de police” ou “regras de ordem pública”;

(iii) - O dever do Estado de respeitar suas obrigações perante outros Estados ou organizações internacionais (…)”[21].

Refira-se, por fim, que o cerne da violação da ordem pública internacional radica na solução dada ao caso, isto é, nos seus efeitos jurídicos e não nos fundamentos ou critérios empregues para a sua obtenção[22].

4.2.4.

Colhidos os ensinamentos da doutrina mais autorizada, busquemos na jurisprudência deste Supremo Tribunal os moldes em que tem sido concretizado o conceito de ordem pública internacional, anotando-se que, na sua maioria, os acórdãos infra referidos incidem sobre a revisão de sentenças judiciais proferidas por tribunais estrangeiros.

Nos arestos de 30 de Abril de 2002[23], de 8 de Maio de 2003[24], de 8 de Julho de 2003[25], de 12 de Outubro de 2004[26], de 2 de Fevereiro de 2006[27], professou-se, em suma, o entendimento de que a ordem pública internacional do Estado Português coincidia essencialmente com os princípios fundamentais e cogentes do direito do foro.

Ao invés, nos acórdãos de 9 de Outubro de 2003[28] e de 27 de Abril de 2005[29] e de 21 de Fevereiro de 2006[30], encarou-se a ordem pública internacional por referência às normas que a integram e às finalidades políticas, sociais e económicas que a elas presidem.

Nos acórdãos de 19 de Fevereiro de 2008 e de 26 de Maio de 2009[31] recorreu-se expressamente aos critérios de que ALBERTO DOS REIS e BAPTISTA MACHADO deram nota, temperando-os com a exigência de que a esses caracteres se deviam acrescentar o seu fundamento em razões de ordem económica, ético-religiosa ou política.

4.2.5

Qual então, afinal, o sentido da expressão “ordem pública internacional” adoptada na alínea b) do n.º 2 do artigo V da Convenção?

Sintetizando o que podemos colher da análise destes contributos, sem quaisquer preocupações dogmáticas e com fito meramente operacional, cremos estar em condições de considerar que a ordem pública internacional do Estado Português é integrada por uma amálgama de valores basilares e conceitos dominantes de índole social, ética, política e económica expressos em princípios e regras que o aplicador deve, em cada momento histórico, interpretar e reconhecer a fim de apreciar se os mesmos se podem ter como afrontados pelo resultado a que se chegou na sentença arbitral revidenda.

4.3.

Na posse desta noção, importará analisar as normas em cuja preterição sustenta a recorrente a invocação da violação da ordem pública internacional.

Dispõe o n.º 1 do artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho.

1 - Sem prejuízo de qualquer outra indemnização a que haja lugar, nos termos das disposições anteriores, o agente tem direito, após a cessação do contrato, a uma indemnização de clientela, desde que sejam preenchidos, cumulativamente, os requisitos seguintes:

a) - O agente tenha angariado novos clientes para a outra parte ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente;

b) - A outra parte venha a beneficiar consideravelmente, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente;

c) - O agente deixe de receber qualquer retribuição por contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes referidos na alínea a)”.

Estatui, por sua vez, o artigo 38º do mesmo diploma:

Aos contratos regulados por este diploma que se desenvolvam exclusiva ou preponderantemente em território nacional só será aplicável legislação diversa da portuguesa, no que respeita ao regime da cessação, se a mesma se revelar mais vantajosa para o agente”.

A denominada “indemnização de clientela” prevista no n.º 1 do artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho, (cujos termos sintetizam os modelos previstos no artigo 17º da Directiva 86/653/CEE do Conselho, de 18 de Dezembro de 1986), consiste não tanto numa indemnização, (não se apura nem se exige a ocorrência de danos), mas antes numa compensação devida ao agente pela circunstância de o principal continuar a usufruir das mais-valias alcançadas pela actividade do primeiro[32] após a cessação do contrato de agência, justificando-se, por isso, a cumulação com outras compensações devidas em virtude da cessação.

Por sua vez, a norma contida no artigo 38º, atrás transcrito, confere às normas que disciplinam a cessação do contrato de agência a qualidade de “normas de aplicação imediata ou necessária”, o que lhes permite prevalecerem sobre as normas de direito de conflitos previstas conquanto se verifique o elemento de conexão nela previsto – o desenvolvimento da actividade predominantemente em território nacional -. Por via da sua aplicação, a lei portuguesa só será arredada se se demonstrar que a lei estrangeira é mais favorável ao agente[33].

5.

Depois de recolhidos os contributos pertinentes e tendo em devida conta os dados factuais apurados, qual a solução a dar ao caso?

5.1.

Muito embora os dados factuais fixados pelo tribunal “a quo” não permitam, com a devida propriedade, fixar o exacto conteúdo dos acordos firmados pelas partes (cfr. pontos n.os 1º a 4º do elenco factual), não se crê que, para efeitos de prolação desta decisão, se deva problematizar o seu enquadramento no contrato de concessão[34].

O contrato de concessão não está tipicamente regulado, sendo definível como um “(…) contrato-quadro que faz surgir entre as partes uma relação obrigacional complexa por força da qual uma delas, o concedente, se obriga a vender à outra, o concessionário, e esta a comprar-lhe, para revenda, determinada quota de bens, aceitando certas obrigações – mormente no tocante à sua organização, à política comercial e à assistência a prestar aos clientes – e sujeitando-se a um certo controlo e fiscalização do concedente (…)”[35].

Na sequência da denúncia operada pela recorrida e porque estava cometida a um tribunal arbitral a competência para dirimir os litígios emergentes dessa relação, a recorrente instaurou, na competente instância, um processo arbitral que veio a ser decidido por sentença da qual não foi interposto recurso (cfr. pontos 6º a 8º, 10º a 13º do elenco factual).

Nesse processo, a recorrente peticionou, além do mais, o pagamento de uma indemnização de clientela, tendo decaído nessa pretensão (pontos 7º e 13º do citado elenco).

Os factos elencados não permitem apreender a razão pela qual se verificou tal decaimento.

Como se extrai, porém, da própria decisão revidenda, (transcrita, nesse segmento, pela recorrente), essa pretensão naufragou por, em primeira linha, a legislação aplicável à relação contratual – a lei espanhola (cfr. ponto 5º do elenco factual) – não prever a atribuição de uma indemnização de clientela ao concessionário.

Mas não foi apenas a aplicação de normativos da lei espanhola que conduziu ao decaimento naquele pedido. Para esse juízo e como ali se lê, contribuiu ainda a consideração de que o contrato não a previa e de que não existia lacuna que devesse ser suprida.

Ora, dado que o direito positivo português não regula o contrato de concessão, não se prevê, logicamente, que o concessionário deva, no termo daquele, receber qualquer indemnização de clientela paga pelo concedente.

Daí que, desde já, não se possa concordar com a asserção de que existe uma divergência essencial entre a lei espanhola e a lei portuguesa.

Não se desconhece, por seu turno, o entendimento doutrinal e jurisprudencial que, partindo da análise dos dados do caso concreto, sustenta que, por analogia com o contrato de agência e na sequência da cessação do contrato de concessão, o concedente deve satisfazer ao concessionário uma indemnização de clientela. Tal justificar-se-á sempre que possa considerar que o concessionário desenvolveu uma actividade que se pode equiparar à do agente, que angariou clientela para o concedente ou incrementou substancialmente o volume de negócios deste e que essa clientela ficará acessível ao mesmo após a cessação do contrato[36].

Ora, como é reclamado pela previsão do n.º 2 do artigo 12º do Código Civil e como nos parece apodítico, a reversão desse entendimento para o caso concreto não prescinde de uma análise próxima aos factos tidos como demonstrados a fim de se evidenciarem esses pressupostos[37].

Por isso, não se pode, com propriedade, afirmar que o direito português reconhece, automática e incondicionadamente, ao concessionário um jus indemnizatório que a lei espanhola liminarmente lhe refuta[38].

Esta constatação, embora se revele, a nosso ver, evidente, implica, desde logo, que não se possa tomar como acertada a posição da recorrente, dado que a mesma assume, sem necessidade de demonstração e de uma forma assaz simples, que o ordenamento jurídico nacional lhe confere, na qualidade de concessionária e sem mais, o jus à “indemnização de clientela”[39].

Desse modo, é inviável considerar que, só por si, a decisão do pleito arbitral afronta os valores e concepções que, neste momento histórico, integram a ordem pública internacional portuguesa e que relevam nos termos e para os efeitos previstos pela alínea b) do n.º 2 do artigo V da Convenção.

Por outro lado, há que ter consideração que, como dissemos, o cotejo entre aquela solução e a ordem pública internacional do Estado Português deve ser feita perante um resultado concreto e não em termos meramente abstractos, o que inevitavelmente demanda que se conheçam, na íntegra, os pressupostos fácticos da decisão[40]. É, como agora se reafirma, a solução dada ao caso, (o que envolve a apreciação dos seus concretos contornos fácticos), que releva.

No caso vertente, é indiscernível, no elenco dos factos provados, qualquer complexo factual que nos leve, ainda que a título perfunctório e num juízo meramente hipotético, a considerar que a recorrente reunia as condições legalmente indispensáveis para, em face dos citados preceitos da lei pátria e com apelo à mencionada construção doutrinal e jurisprudencial, reconhecer-lhe o direito à sobredita compensação.

Por outras palavras, não se antevê que, se houvesse de se julgar a causa segundo a lei portuguesa e aplicando, por analogia, a norma extraída do artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86, a solução dada à sobredita pretensão viesse a ser necessária e diametralmente oposta[41].

Assim, também por este motivo crê-se estar seriamente comprometida a possibilidade de considerar que a decisão do pleito arbitral afronta os valores que compõem a ordem pública internacional portuguesa.

5.2.

E terá acaso havido um qualquer propósito defraudatório por parte da recorrida de frustrar a aplicação do artigo 33º do Decreto – Lei n.º 178/86, com a adopção da lei espanhola na dirimição de qualquer conflito entre as partes?

O elenco factual dos autos não faculta qualquer elemento que permita considerar que a adopção da lei espanhola, (e foi este o elemento relevante e não a submissão da causa a um tribunal arbitral como a recorrente, a dado passo das suas doutas alegações, parece sustentar), se deveu a uma imposição da recorrida com o propósito defraudatório de frustrar a aplicação do disposto no artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86.

Resulta, aliás, do elenco dos factos provados que foi escolhida a lei espanhola (vide ponto 4º).

E o certo é que, como já vimos, não foi apenas a aplicação da lei espanhola que sustentou o juízo efectuado pelo tribunal arbitral mas também a consideração de que inexistia uma situação lacunosa que importasse regular.

Assim, não obstante se reconhecer que o artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86 tem cariz imperativo (como flui do artigo 19º da Directiva 86/653/CEE[42] de 18 de Dezembro de 1986 e do disposto no 809º do Código Civil[43]), cabe considerar que não se pode, sem mais, concluir que a sua desaplicação se deveu a iniciativa defraudatória da recorrida.

E mesmo que assim fosse, o certo é que, estando os autos despojados de elementos factuais pertinentes, jamais se poderia considerar que a solução, à luz do direito português tido pela recorrente como aplicável, seria diversa, o que sempre seria decisivo para, por essa via ínvia, concluir pela necessidade de fazer actuar a reserva de ordem pública internacional.

Não tem, pois, aplicação, face ao condicionalismo factual com que nos deparamos, os ensinamentos do citado Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia. Note-se, ademais, que tal aresto foi prolatado com base na Directiva 86/653/CEE, não se podendo, sem uma ponderação necessariamente casuística, transpor os seus considerandos para os quadros do contrato de concessão, tanto mais que, no seio da União Europeia, inexiste qualquer obrigação de legiferação sobre essa matéria[44].

5.3.

Acresce que a natureza jurídica da indemnização de clientela é controvertida, perfilando-se, na doutrina e na jurisprudência deste Supremo, uma posição que considera que se trata de um afloramento do princípio segundo o qual se devem evitar ou eliminar os enriquecimentos injustificados e que assenta “(…) na consideração de que se o concessionário proporcionou, pela sua actividade, incremento significativo na clientela do concedente, assim o beneficiando “substancialmente” para o futuro, em termos de volume de negócios, deve ser compensado pelo esforço despendido[45] (…)” e uma outra que adianta estarmos em presença de uma retribuição diferida pela clientela angariada[46].

Não é este o espaço para adoptar uma posição definitiva sobre esse tema.

Em todo o caso, afigura-se-nos que a atribuição dessa compensação – seja qual for a sua natureza – ao concessionário não radica num valor essencial, num direito fundamental, ou numa concepção de índole social, ética, ou económica que, no presente momento histórico, integre aquilo que este tribunal tem como sendo a ordem pública internacional do Estado Português.

É que só o conhecimento das concretas circunstâncias atinentes às partes e ao modo como se relacionaram no domínio dos contratos de concessão que sucessivamente firmaram entre si - o que, como transparece do elenco supra, é, no caso, absolutamente inviável - permitirá considerar que a recorrente/concessionária deve ser tida como a parte economicamente mais débil e que deve ser compensada pelos benefícios que a recorrida/concedente continue a auferir em decorrência da sua actividade[47] (na verdade, é perfeitamente plausível que esta última em nada tenha beneficiado e tenha até sido prejudicada pela actuação da contraparte).

Por isso, atenta a inelutável e premente necessidade de o referenciar a dados do caso concreto, esse enunciado não pode ser erigido em princípio fundamental da ordem jurídica cuja violação desencadeie o funcionamento da reserva de ordem pública internacional do Estado Português.

Não se olvide, aliás, o facto de, como vimos, o mesmo enunciado provir do labor doutrinal e jurisprudencial sobre a matéria, o que desmerece a possibilidade de o alcandorar a um patamar tão elevado[48].

A circunstância de a atribuição da indemnização de clientela – recorde-se, no contexto do contrato de agência – ter, como se reconheceu, natureza imperativa, (mesmo no caso de relações jurídicas plurilocalizadas, como flui do artigo 38º do Decreto-Lei n.º 178/86), não basta, por si só e como demos nota, para postergar esta valoração.

Com efeito, importa, como vimos, distinguir entre a aplicabilidade impositiva dessa norma, (e das demais que integram o regime jurídico da cessação do contrato de agência), às relações jurídicas conexas com mais do que um ordenamento jurídico que sejam subsumíveis ao conceito de contrato de agência (e apenas a este e já não ao contrato de concessão) e os elementos integradores e definidores da noção de ordem pública internacional. Como lucidamente refere DÁRIO MOURA VICENTE[49], às disposições internacionalmente imperativas e à reserva de ordem pública subjazem critérios de justiça e considerações de política legislativa muito diversa, baseando-se o primeiro numa “(…) “especial vontade de aplicação” das disposições nacionais ou estrangeiras que veiculam o intervencionismo e o proteccionismo estadual nas relações entre privados (…)” e a segunda na defesa de valores fundamentais do ordenamento jurídico do foro, não tendo como função “(…) impor a aplicação incondicional de quaisquer disposições de Direito interno (…)”.

Sublinhe-se ainda o cariz excepcional das normas internacionalmente imperativas, o que inviabiliza a sua aplicação a outros contratos de distribuição (artigo 11º do Código Civil), não se antevendo, outrossim, que nos deparemos com uma lacuna que deva ser preenchida por essa via[50].

Não se alcança, por seu turno, que, a partir da decisão dada ao caso “sub judice”, se possa extrair a ilação de que está ao alcance de qualquer decisão estrangeira o afastamento das normas imperativas cuja aplicação é comandada pelo artigo 38º do Decreto-Lei n.º 178/86.

Embora se trate de um argumentação de política legislativa e não de direito, importa reafirmar que aquele normativo não impõe que seja sempre aplicável o regime da cessação do contrato previsto nesse diploma e, em todo o caso, o certo é que, ainda que fosse, não se divisa que ficasse intoleravelmente afrontada a ordem pública internacional do Estado Português, justamente porque, como vimos, a atribuição da indemnização de clientela ao concessionário não pode ser erigida em princípio fundamental.

E essa é a única questão que, como se reitera, importa analisar e não o mérito ou o demérito da decisão revidenda ao olvidar a aplicação daquele dispositivo – como, a dado passo, parece pretender a recorrente - o que, num sistema de revisão formal como aquele que deriva da Convenção, escapa ao contexto em que se podem mover as instâncias nacionais.

Acresce que, se o legislador pretendesse que fossem sempre aplicáveis as normas imperativas internas que regulam o contrato de agência ao contrato de concessão, tê-lo-ia, por certo, afirmado expressamente e excluído a arbitrabilidade das disputas que ocorressem nesse contexto, (o que não foi nitidamente o caso, como se extrai da referência à patrimonialidade do litígio contida no n.º 1 do artigo 1º da Lei da Arbitragem Voluntária)[51].

Refira-se, enfim, que o que se veio de expor não apresenta qualquer relação com o entendimento professado no Acórdão de Uniformização de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 3/2008[52], não se prefigurando – como, aliás, ressalta dos trechos desse aresto e de um outro acórdão deste Tribunal citados pela recorrente - que a posição aí adoptada a respeito da vigência/validade das cláusulas compromissórias tenha, como contraponto, a consideração de que o direito português seria sempre aplicável em litígios transnacionais dirimidos por árbitros, com vista a preservar a ordem pública.

6.

Nesta conformidade, resta concluir que não podem merecer acolhimento as doutas conclusões de recurso apresentadas que contrariam o aqui exposto (2º e 5º a 11º), apresentando-se as demais como meramente instrumentais em relação a estas últimas, não merecendo, por isso, uma atenção individualizada, tanto mais que não merece discussão o que nelas vem inscrito.

Não se divisa, pelos mesmos motivos, que hajam sido violadas as normas indicadas pela recorrente.

Confirma-se, pois, a decisão recorrida.

7.

Sumariando:

I - À revisão de sentença arbitral proferida por tribunal arbitral sedeado em Estado que haja subscrito a Convenção de Nova Iorque sobre o Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras de 1958 aplica-se primordialmente este tratado internacional, estando o tribunal estadual português, a quem é pedido o reconhecimento da mesma, adstrito a recusá-lo quando oficiosamente constate que o resultado a que se chegou naquela decisão contraria a ordem pública internacional do Estado Português.

II - O conceito de ordem pública internacional é vago, fluído e impreciso mas, numa aproximação com escopo meramente operativo, podemos, para o efeito assinalado em I, designá-la como uma amálgama de valores basilares e concepções dominantes de índole social, ética, política e económica expressos em princípios e regras que o aplicador deve, em cada momento histórico, interpretar e reconhecer a fim de apreciar se os mesmos se podem ter como afrontados pelo resultado a que se chegou na sentença arbitral revidenda.

III - A contrariedade à ordem pública internacional do Estado Português avalia-se em função do efeito jurídico a que a decisão arbitral conduz, irrelevando os fundamentos em que ela se ateve.

IV - O reconhecimento do direito à indemnização de clientela prevista no artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho a um concessionário assenta numa analogia que não prescinde da averiguação concreta das circunstâncias de cada caso, pelo que, sem mais, não se pode considerar que o direito português outorga àquele tal benefício, o que equivale por dizer que o facto de não se lhe conceder tal compensação não se revela manifestamente intolerável à luz da ordem pública internacional do Estado Português.

V - Sendo inviável, a partir dos factos apurados, considerar que a recorrente estava em condições de preencher os pressupostos que têm sido avançados para efectuar essa equiparação, não se pode concluir que afronta a ordem pública internacional do Estado Português uma decisão arbitral em que não se lhe reconheceu o direito a uma indemnização clientela.

VI – Muito embora o artigo 33º do Decreto-Lei n.º 178/86 de 3 de Julho deva ser considerado como uma norma imperativa – e, como tal, integrante da ordem pública nacional - tal constatação não implica, em atenção ao seu fundamento ou à natureza da indemnização de clientela, que a sua desaplicação pela decisão arbitral – por invocação de outra norma escolhida pelas partes e por outras razões – conflitue com a ordem pública internacional do Estado Português.

Custas, nas instâncias, pela recorrente, porque vencida (n.º 1 do artigo 527º do Código de Processo Civil).

8.

Pelo exposto, nega-se a revista e confirma-se o acórdão recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 23 de Outubro de 2014

Manuel F. Granja da Fonseca

António da Silva Gonçalves

Fernanda Isabel Pereira

___________________________
[1] A Convenção foi aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 37/94 de 10 de Março de 1994 e ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 52/94 de 8 de Julho, estando em vigor desde 16 de Janeiro de 1995.
[2] A respeito do âmbito material desta Convenção, vide MARIA CRISTINA PIMENTA COELHO “A Convenção de Nova Iorque de 10 de Junho de 1958 Relativa ao Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais EstrangeirasinRevista Jurídica”, AAFDL, n.º 20, Outubro de 1996, páginas 42 a 44 e LUÍS DE LIMA PINHEIRO, “Arbitragem Transnacional – A Determinação do Estatuto da Arbitragem”, Almedina, página 289.
[3] A este respeito, vide GOMES CANOTILHO e VITAL MOREIRA, “Fundamentos da Constituição”, Coimbra Editora, página 65.
[4] Neste sentido, vide JOSÉ MIGUEL JÚDICE e ANTÓNIO PINTO MONTEIRO “Do reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras ao abrigo da Convenção de Nova Iorque - Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19/03/2009in “Revista Internacional de Arbitragem e Conciliação”, Ano III, 2010, páginas 159 a 164 e, entre outros, o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 18 de Fevereiro de 2014, proferido no processo n.º 1630/06.2YRCBR.C2.S1 e acessível em www.dgsi.pt; contra, porém, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Março de 2009 comentado no artigo doutrinal citado nesta nota e aí integralmente transcrito.
[5] Assim LUÍS DE LIMA PINHEIRO, obra citada, página 310 e PAULA COSTA E SILVA – “A execução em Portugal de decisões arbitrais nacionais e estrangeiras”, in R.O.A. n.º 67, vol. II, ano 2007.
[6] Como escrevia ALBERTO DOS REIS “Processos Especiais”, Volume II, Coimbra, págs. 175 e 176 a definição de “ordem pública portuguesa é questão árdua e complicada" e que “(…) Ninguém até hoje conseguiu exprimir numa fórmula precisa e nítida o conceito de ordem pública internacional; ninguém pôde apresentar uma noção capaz de habilitar o julgador a resolver, sem hesitação todas as dificuldades que os casos concretos suscitam. No estado actual da ciência a única a que pode aspirar-se é à enunciação de princípios gerais de orientação, que sirvam de critério e de bússola no mar flutuante e incerto das realidades da vida jurídica".
[7] Obra citada, páginas 176 e 177.
[8] Assim BAPTISTA MACHADO “Lições de Direito Internacional Privado”, Almedina, 3ª Edição, página 256.
[9] Obra citada, página 261, nota 1).
[10] Idem, obra citada, páginas 259 e 260.
[11] Idem, obra citada, páginas 257 a 259.
[12]Lições de direito internacional privado I”, Almedina, páginas 406 e 407.
[13] Obra citada., págs. 410 e 411.
[14] Apud ALBERTO DOS REIS, obra citada, página 178.
[15] Em douto parecer publicado na C.J., tomo IV/1985, págs. 24, 25 e 26.
[16] In "Revista de Direito e de Estudos Sociais", ano X, pág. 186.
[17]Estudos de Direito Internacional Privado e de Direito Processual Civil Internacional”, Almedina, pág. 347.
[18] Obra citada, páginas 62 e 63.
[19] Obra citada, páginas 266, 300 e 310. A respeito das situações que podem despoletar o funcionamento da reserva, vide, do mesmo autor, paralelamente, “Direito Internacional Privado”, vol. III, Almedina, páginas 406 e 426. No sentido, porém, de que, no domínio do reconhecimento de sentenças judiciais estrangeiras importa apenas considerar princípios de ordem material, vide RUI MOURA RAMOS “A reforma do direito processual civil internacionalin R.L.J. ano 130º, n.os 3881, página 236, o qual, em douto parecer junto aos autos (págs. 17 a 19), perfilha o entendimento de que a reserva de ordem pública abarca a chamada “constituição material”, bem como os preceitos relativos a direitos humanos e a regras da concorrência estabelecidas nos Tratados da União Europeia.
[20]Guia do ICCA (International Council For Commercial Arbitration) Sobre a Interpretação da Convenção De Nova Iorque De 1958: Um Texto De Referência Para Juízes”, disponível em www.arbitrationicca.org/media/1/13320134139400/portuguese_guide_composite_for_website_final.pdf., páginas 110 e 111.

[21] As recomendações, adoptadas na 70ª Conferência da “International Law Association” que teve lugar em Nova Deli entre 2 e 6 de Abril de 2002 e que são aludidas no texto estão acessíveis, em língua inglesa, no sítio www.ila-hq.org/download.cfm/docid/032880D5-46CE-4CB0-912A0B91832E11AF.
[22] Assim ALBERTO DOS REIS, obra citada, páginas 179, 180, LUÍS DE LIMA PINHEIRO, “Direito …”, citado, página 407 e ANTÓNIO MARQUES DOS SANTOS, obra citada, páginas 347 a 349, OLIVEIRA ASCENSÃO, local citado e, entre outros, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Janeiro de 1977, B.M.J. n.º 263, página 195 e de 21 de Fevereiro de 2006, proferido no processo n.º 05B4168 e acessível em www.dgsi.pt.
[23] Proferido no processo n.º 01A824 e acessível em www.dgsi.pt;
[24] Proferido no processo n.º 03B1123 e acessível em www.dgsi.pt;
[25] Proferido no processo n.º 03B2106 e acessível em www.dgsi.pt;
[26] Proferido no processo n.º 1823/04 e acessível na Colectânea de Sumários da Assessoria Cível deste Supremo Tribunal em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2004.pdf.
[27] Proferido no processo n.º 05B3766 e acessível em www.dgsi.pt;

[28] Proferido no processo n.º 03B1604 e acessível em www.dgsi.pt;
[29] Proferido no processo n.º 05B1067 e acessível em www.dgsi.pt;
[30] Já referido na nota 22.
[31] Proferidos, respectivamente, nos processos n.º 07A4790 e 43/09.9YFLSB e acessíveis em www.dgsi.pt;
[32] Neste sentido, v. ANTÓNIO PINTO MONTEIRO “Contrato de Agência”, 5ª Edição, Almedina, páginas 132 e 133 e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12 de Outubro de 2000, C.J.S.T.J., Tomo III/2000, página 77.
[33] Assim ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, obra citada, páginas 147 e 148 e o proficiente parecer de DÁRIO MOURA VICENTE junto aos autos pela recorrida (pág. 41).
[34] Pese embora a recorrente tivesse funções de distribuidora dos produtos da recorrida (ponto 2º do elenco factual), deve-se entender que ela os comercializava a esse nível, motivo pelo qual se concluiu nesse sentido. Assim, v. o Acórdão da Relação de Lisboa de 2 de Fevereiro de 2006, C.J., tomo I/2006, págs. 87 e ss. e o eloquente parecer de ANTÓNIO PINTO MONTEIRO junto aos autos (págs. 54 a 59).  
[35] ANTÓNIO PINTO MONTEIRO “Contratos de Distribuição Comercial”, Almedina, página 105.

[36] Sintetiza-se o pensamento de ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, obra ultimamente citada, páginas 163 a 170 e, bem assim, no douto parecer junto aos autos – págs. 21 a 27 -. No mesmo sentido, vide Menezes Leitão, “A Indemnização de Clientela”, Almedina, página 84. No sentido de que a indemnização de clientela é, por analogia, devida ao concessionário, vide inter alia, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Maio de 1993 – C.J.S.T.J., tomo II/1993, página 78 -, de 20 de Abril de 1998 – C.J.S.T.J., Tomo II/1998, página 57 -, de 31 de Março de 2004 – proferido no processo n.º 545/04 e acessível na Colectânea de Sumários da Assessoria Cível deste Supremo Tribunal disponível em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2004.pdf –, de 4 de Abril de 2006 - proferido no processo n.º 4348/05 e acessível na Colectânea de Sumários da Assessoria Cível deste Supremo Tribunal em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2004.pdf -, de 24 de Janeiro de 2012 - proferido no processo n.º 39/2000.L1.S1 e acessível na Colectânea de Sumários da Assessoria Cível deste Supremo Tribunal em http://www.stj.pt/ficheiros/jurisp-sumarios/civel/sumarios-civel-2012.pdf – e de 20 de Junho de 2013, proferido no processo n.º 178/07.2TVPRT.P1.S1 e acessível em www.dgsi.pt; em sentido diverso, porém, v. os ensinamentos doutrinais recenseados por LUÍS LIMA PINHEIRO no esclarecedor parecer junto aos autos (pág. 11).
[37] É particularmente impressiva a lição de ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, obra última citada., página 169 ao escrever que “(…) a análise do caso concreto afigura-se, pois, decisiva, quer no tocante à consideração do concessionário ou do franquiado como relevantes factores de atracção da clientela, nos termos atrás indicados, quer a respeito da “transferência” da clientela para o concedente (…)”. No mesmo sentido, atente-se no que o mesmo Autor escreveu na sua outra obra antes citada (página 138) “(…) É necessário apurar, contudo – et pour cause -, relativamente a cada questão e em cada caso concreto, se pode afirmar-se uma analogia de situações que justifique a aplicação a um contrato de normas estabelecidas para outro. Ora, afigura-se que, em princípio, a actividade típica de concessionários e franquiados, por si só, não será susceptível de justificar, por analogia, uma indemnização de clientela. (…)”.  Ainda neste sentido, vide MENEZES LEITÃO, obra citada, páginas 83 e 84. No mesmo sentido, aponta o douto parecer de LIMA PINHEIRO (pág. 11) junto aos autos.
[38] Sublinhe-se o valoroso contributo colhido no douto parecer de RUI MOURA RAMOS (pág. 25, nota 56) sobre o estado da legislação espanhola sobre a matéria.
[39] Posição também perfilhada nos pareceres de RUI MOURA RAMOS (pág. 25 e 26) e ANTÓNIO PINTO MONTEIRO (págs. 64 e 65).
[40] Crê-se, aliás, que o parecer de RUI MOURA RAMOS junto pela recorrente, apesar de começar por rejeitar esta posição – cfr. pág. 23 e nota 51 - acaba por sufragar o entendimento expresso, ao nele se inscrever que “(…) o controlo do respeito da ordem pública (com o poder de crítica e de sanção do juiz que lhe é inerente) apenas pode ter sentido se ligado ao raciocínio na base do qual os árbitros se determinaram, tendo de passar, de uma forma ou doutra, por uma comparação entre o resultado consagrado pela sentença e aquele a que teria conduzido, de acordo com o juiz, uma aplicação correcta das disposições em causa (…)” (pág. 24).
[41] No sentido de que este é um critério decisivo para aquilatar a necessidade de fazer intervir a reserva de ordem pública, v. o douto parecer de RUI MOURA RAMOS junto aos autos (pág. 16 e nota 31 e o trecho transcrito na nota antecedente).
[42] Neste sentido, o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia de 9 de Novembro de 2000, proferido no processo “INGMAR” (processo n.º C-381/98), o qual está acessível em língua portuguesa em http://curia.europa.eu/juris/showPdf.jsf?text=&docid=45788&pageIndex=0&doclang=pt&mode=lst&dir=&occ=first&part=1&cid=515642. 
[43] Reconhecendo-se-lhe, pois, o cariz de norma de ordem pública no direito privado interno. Sobre esta noção, vide BAPTISTA MACHADO, obra citada, página 254.
[44] LIMA PINHEIRO, no eloquente parecer junto aos autos (pág. 10) dá, inclusive, nota de que a maior parte dos sistemas jurídicos o concessionário não goza do direito à indemnização de clientela.
[45] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Janeiro de 2012, proferido no processo n.º 39/2000.L1.S1 e acessível em www.dgsi.pt. No mesmo sentido, vide, entre outros, os arestos deste Tribunal de 14 de Junho de 2011 e 18 de Junho de 2014 - proferidos, respectivamente, no processo n.º 2394/06.5TBVCT.P1.S1 e no processo n.º 2709/08.1TVLSB.L1.S1 e acessíveis no mesmo sítio cibernético – e MENEZES LEITÃO, obra citada, página 100.
[46] Neste sentido, vide ANTÓNIO PINTO MONTEIRO, “Contratos…”, página 162 e no parecer por si doutamente elaborado (pág. 70) e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10 de Dezembro de 2009, proferido no processo n.º 763/05.7TVLSB.S1.
[47] É esse o princípio identificado por RUI MOURA RAMOS no parecer junto aos autos (pág. 32) ao designá-lo como “(…) desiderato fundamental do ordenamento jurídico português (…)”.
[48] Como, aliás, decorre do entendimento de LIMA PINHEIRO no parecer junto aos autos (pág. 33).
[49] Em parecer junto aos autos, pág. 43. No mesmo sentido, se encaminha o entendimento professado por LIMA PINHEIRO no parecer junto a estes autos (págs. 29 e 30).
[50] Segue-se, em termos próximos, o entendimento de LIMA PINHEIRO no parecer junto aos autos, págs. 20 a 22.
[51] Como bem nota LIMA PINHEIRO no parecer junto aos autos, págs. 37 e 38.
[52] Publicado no DR, Série I-A de 3 Abril.