Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
25/23.8SWLSB-B.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: ALBERTINA PEREIRA
Descritores: HABEAS CORPUS
PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA
PRISÃO ILEGAL
REEXAME DOS PRESSUPOSTOS DA PRISÃO PREVENTIVA
DECISÃO INSTRUTÓRIA
Data do Acordão: 10/19/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HABEAS CORPUS
Decisão: IMPROCEDÊNCIA / NÃO DECRETAMENTO.
Sumário :

I – Podendo ocorrer aplicação ilegal da medida de coação de prisão preventiva, como meio de garantir a rápida libertação do arguido, consagra a nossa Constituição no seu art.º 31.º o direito fundamental ao habeas corpus, que se traduz numa garantia privilegiada do direito à liberdade.


II - A providencia de habeas corpus está regulada nos artigos 222.º e 223.º do Código de Processo Penal, e consoante resulta do prazo concedido para ser proferida decisão (8 dias) e da própria tramitação do respectivo procedimento, assume aquela carácter célere, tendo em vista a obtenção de uma decisão que rapidamente reponha a legalidade no caso de privação ilegal da liberdade.


III - Nesta sede, o controlo feito pelo Supremo Tribunal de Justiça é exercido apenas em face da decisão que está na origem da requerida providência. Não envolve valoração dos elementos de prova, com base nos quais se decidiu, visto o habeas corpus (que não se confunde com o recurso) não ter como escopo sindicar o mérito ou os erros de direito da decisão que privou o arguido da liberdade.


IV - Considerando que no presente caso o arguido foi detido em 04-04-2023, foi-lhe aplicada a medida de coação de prisão preventiva em 05-04-2023, deduzida acusação em 07-06-2023, analisados os pressupostos da prisão preventiva em 09-06-2023 e 21-07-2023 e proferido despacho de pronúncia em 04-10-2023, sendo-lhe imputada a prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo art.º 21.º n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/01, com referência às tabelas 1-A, 1-B, 1-C e 11-A, a este anexas, com a pena de prisão superior a 8 anos, integrando o aludido crime o conceito de “criminalidade altamente organizada”, nos termos do art.º 1.º, al. m), do Código de Processo Penal, mostra-se perfeitamente respeitado o prazo da prisão preventiva aplicável, que é de um ano e seis meses, nos termos do art.º 215.º n.º 1, alínea c) e n.º 2, do referido diploma legal.

Decisão Texto Integral:

Processo n.º 25/23.8SWLSB-B.S1


Habeas corpus


Acordam em audiência na 5.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça


I - Relatório


1.1. Vem o arguido, AA, detido no estabelecimento prisional de ..., à ordem do processo 25/93.8SWLSB, nos termos do art.º 222.º n.º 2 alínea c), do Código de Processo Penal (CPP), requerer a este Supremo Tribunal de Justiça providência de habeas corpus, invocando, para o efeito, o seguinte:


“AA, c.c. …50 e residente na Rua ..., .., atualmente detido no EP de ... à ordem do processo 25/23.8SWLSB que corre termos no TCIC de ... J... . oriundo da .. secção do DIAP de ... vem nos termos e para os efeitos do artº 222º nº 2 c) e seguintes bem como do art.º 31º da CRP, intentar providência de Habeas corpus, com os seguintes fundamentos:


1.º O Arguido AA encontra-se atualmente detido no EP de... à ordem do processo 25/23.8SWLSB que corre termos no TCIC de ... J... . oriundo da .. secção do DIAP de ... por decisão da Meritíssima Dra. Juíza de Instrução Criminal que validou a sua detenção de 4 de abril de 2023 a 5 de abril de 2023 conforme despacho proferido nessa mesma data;


2.º Foi proferida decisão instrutória a 4 de outubro de 2023 pelo Meritíssimo Dr. Juiz de Instrução Criminal do TCIC - J... . que mantém a medida de prisão preventiva ao Arguido ora requerente;


3.º À data da apresentação da presente providência o Arguido mantém-se detido preventivamente sem ter sido deduzida acusação,


4.º mostrando-se assim ultrapassado o prazo previsto no nº 1 e 2 do art.º 215.º do CPP, nomeadamente os seis meses aí previstos.


5.º Em consequência, afigura-se que mostrando-se ultrapassado o prazo máximo de prisão preventiva deve ser declarada extinta a prisão preventiva aplicada como medida de coação ao Arguido.


Nestes termos e nos mais de Direito, fundamentada a petição e prosseguindo os devidos termos legais, deve ser concedida ao Arguido AA a providência de Habeas corpus e restituído à liberdade.


1.2. Pelo Exmo. Juiz do Tribunal Central Instrução Criminal – J... ., foi prestada a informação a que alude o art.º 223.º, n.º 1 do CPP, nos termos a seguir transcritos:


“1 - No dia 04/04/2003, pelas 06H50, foi detido o arguido AA.


2 - No dia 05/04/2003, foi o arguido submetido a 1.º Interrogatório Judicial de arguido detido e aplicada ao mesmo medida de coacção de prisão preventiva.


3 - No dia 07/06/2023 foi deduzida acusação, pelo Ministério Público, imputando ao arguido a prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo art. 21º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com referência às tabelas 1-A, 1-B, 1-C e II-A, a este anexas.


4 - Por decisões proferidas em 09/06/2003 e em 21/07/2003 foi mantida a medida de coacção de prisão preventiva imposta ao arguido, por se manterem inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da mesma.


5 - No dia 04/10/2023 foi proferida decisão instrutória de pronúncia, pronunciando o arguido pela prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo art. 21º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com referência às tabelas 1-A, 1-B, 1-C e 11-A, a este anexas, por referência às razões de facto e de direito enunciadas na acusação do Ministério Público, nos termos do disposto no art. 307º, n.º 1, 2ª parte do Cód. Processo Penal.


6 - Na decisão instrutória de pronúncia proferida foi mantida a medida de coacção de prisão preventiva imposta ao arguido, por se manterem inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da mesma.


7 - Veio agora o arguido AA requerer a providência de habeas corpus, em virtude de prisão ilegal, por se manter para além dos prazos fixados pela lei, a saber, por se mostrar ultrapassado o prazo previsto no art. 215º n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal.


8 - Conclui, assim, que a manutenção da medida de coacção de prisão preventiva é ilegal por se mostrar ultrapassado o prazo máximo de prisão preventiva, pelo que deve ser ordenada a sua imediata libertação.


Nos termos do art. 222.º do Cód. Processo Penal, a petição de habeas corpus deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:


a) ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;


b) ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou


c) manter-se além dos prazos fixados por lei ou por decisão judicial.


Resulta dos autos que a medida de coacção de prisão preventiva foi ordenada pelo Tribunal Central de Instrução Criminal, J... ., pelo que foi ordenada pela entidade que para tal era competente — art. 194.º, n.º 1 e 268.º n.º 1, al. b) do Cód. Processo Penal.


Por outro lado, tanto na acusação deduzida pelo Ministério Público, como na decisão instrutória de pronúncia, são imputados ao arguido factos susceptíveis de integrar a prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de produto estupefaciente, previsto e punível pelo artigo 21º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, crime a que corresponde a moldura abstracta de prisão de 4 a 12 anos.


Resulta dos autos que o arguido foi detido em 04/04/2003, encontrando-se, ininterruptamente sujeito à medida de coacção de prisão preventiva desde o dia 05/04/2023 até ao presente momento, tendo-se procedido ao reexame dos pressupostos desta medida de cocção em 09/06/2023, em 21/07/2023 e em 04/10/2023, pelo que não se mostram ultrapassados os prazos de duração máxima desta medida de coacção, que é de dez meses, nos termos do preceituado no art. 215.º, ns.º 1, al. b) e 2 Cód. Processo Penal.


Atendendo existirem fortes indícios da prática, pelo arguido AA, em co-autoria material, de um crime de tráfico de produto estupefaciente, previsto e punível pelo artigo 21.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, não existe, assim, impedimento, no presente caso, à aplicação da medida de coacção de prisão preventiva — art. 202.º n.º 1, al. a) do Cód. Processo Penal, razão pela qual não se verifica a apontada ilegalidade da prisão preventiva prevista no art. 222, n.º 2, al. c) do Código de Processo Penal.


Pelo exposto, não se verifica, no caso dos autos, uma situação de prisão ilegal, pelo que deve a presente providência de habeas corpus ser indeferida, por carecer de fundamento legal, mantendo-se o arguido AA sujeito à medida de coacção de prisão preventiva”.


1.3. Convocada a 5.ª Secção Criminal deste Supremo Tribunal de Justiça, foram notificados o Ministério Público e o Exmo. Advogado do requerente. Com observância do disposto no art.º 223.º n.º 2 e 435.º, do CPP, teve lugar a audiência, após o que reuniu a Secção, tendo deliberado nos termos infra descritos.


II- Fundamentação


1. Os Factos


Dos elementos juntos aos autos, resulta apurado o seguinte:


1.1. No dia 04/04/2003, pelas 06H50, foi detido o Arguido AA (fls. 2-16)


1.2. No dia 05/04/2003, foi o mencionado arguido submetido a 1.º Interrogatório Judicial de Arguido detido, tendo-lhe sido aplicada a medida de coacção de prisão preventiva (fls. 20 -29).


1.3. No dia 07/06/2023 foi deduzida acusação pelo Ministério Público, imputando ao arguido a prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo art. 21º, nº 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com referência às tabelas 1-A, 1-B, 1-C e II-A, a este anexas (fls. 22-44).


1.4. Por decisões proferidas em 09/06/2003 e em 21/07/2003 foi mantida a medida de coacção de prisão preventiva imposta ao Arguido, por se manterem inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação da mesma (fls. 46 e 47).


1.5. No dia 04/10/2023 foi proferida decisão instrutória, pronunciando o Arguido pela prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo art. 21º n.º 1 do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22/01, com referência às tabelas 1-A, 1-B, 1-C e 11-A, a este anexas, por referência às razões de facto e de direito enunciadas na acusação do Ministério Público, nos termos do disposto no art. 307º, n.º 1, 2ª parte do Cód. Processo Penal (fls. 48 -52).


1.6. Na referida decisão instrutória, foi mantida a medida de coacção de prisão preventiva imposta ao Arguido, por se manterem inalterados os pressupostos de facto e de direito que determinaram a sua aplicação.


1.7. Pelo Exmo. Juiz do Tribunal Central Instrução Criminal – J... ., foi prestada a informação a que alude o art.º 223.º, n.º 1 do CPP, nos termos supra transcritos (fls. 54 a 56).


1.8. A presente providência de habeas corpus foi apresentada em 12-10-2023 (fls. 2).


2. O Direito


Num estado de direito democrático, como é a República Portuguesa (art.º 2.º da Constituição da República Portuguesa – CRP), a liberdade nas suas várias vertentes, constitui um valor essencial para qualquer cidadão - encontrando-se o direito à liberdade consagrado no art.º 27.º n.º 1, da CRP “Todos têm direito à liberdade (…)”, como direito fundamental. Todavia, uma vez que a liberdade de alguns pode colidir com a liberdade de outros, ou mesmo pôr em causa demais interesses constitucionalmente protegidos, não sendo por isso um direito absoluto, é a própria Lei Fundamental a prever expressamente os casos em que é legítima a privação total ou parcial da liberdade (princípio da tipicidade das situações de privação total ou parcial da liberdade). Assim, nos termos prescritos no citado art.º 27.º “2-Ninguém pode ser total ou parcialmente privado da liberdade, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de ato punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança. 3- Excetua-se deste princípio a privação da liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determinar, nos casos seguintes: a) Detenção em flagrante delito; b) Detenção ou prisão preventiva por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos;(…)”


Em linha com o acima descrito, determina o art.º 191.º do Código de Processo Penal (CPP), no qual se consagra o princípio da legalidade das medidas de coação, que “ 2- A liberdade das pessoas só pode ser limitada, total ou parcialmente (…) pelas medidas de coação (…) previstas na lei”, e onde se incluem, como é sabido, a prisão preventiva (art.º 202.º do CPP), a medida de coação mais gravosa. A prisão preventiva tem natureza excecional, não sendo decretada nem mantida sempre que possa ser aplicada caução ou outra medida mais favorável prevista na lei (art.º 28.º da CRP). Para além das condições gerais de aplicação das medidas de coação a que se referem os artigos 192.º e 204.º do CPP, a aplicação da prisão preventiva depende da verificação de alguma das condições previstas no art.º 202.º, do CPP, onde, para o que ora releva, se determina o seguinte:


“Artigo 202.º


1- Se considerar inadequadas ou insuficientes as medidas referidas nos artigos anteriores, o juiz pode impor ao arguido a prisão preventiva quando:


a) Houver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 5 anos;


(...)


c) Houver fortes indícios de prática de crime doloso de terrorismo ou que corresponda a criminalidade altamente organizada punível com pena de prisão de máximo superior a três anos;


(…)”


Podendo, todavia, ocorrer casos de aplicação ilegal da medida de coação de prisão preventiva, como meio de garantir a rápida libertação do arguido, consagra a nossa Constituição, o direito fundamental ao habeas corpus, preceituando o art.° 31.° o seguinte:


1 - Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.


2 - A providência de Habeas Corpus pode ser requerida pelo próprio ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos.


3 - O juiz decidirá no prazo de oito dias o pedido de habeas corpus em audiência contraditória.


A figura do habeas corpus, consiste numa “providência expedita contra a prisão e detenção ilegal, sendo por isso uma garantia privilegiada do direito à liberdade (…)”. (Cfr. Gomes Canotilho e Vital Moreira in “CRP Anotada”, I Vol. Coimbra Editora, pág. 508).


“Sendo o único caso de garantia específica e extraordinária constitucionalmente prevista para a defesa dos direitos fundamentais, o habeas corpus testemunha a especial importância constitucional do direito à liberdade” constituindo uma “garantia privilegiada” daquele direito” (Vd. Ac. do STJ de 11-05-2023, proc. 4/22.2GMLSB-B.S1, in www.dgsi.pt).


Em linha com o prescrito na Constituição, para o que importa, prevê o art.º 222.º do CPP o seguinte:


“1- A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.


2 - A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:


a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;


b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou


c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.”


Impõe-se referir, nos termos assinalados no Ac. do STJ de 28-06-2023, proc. 27/21.9PJLRS-C.S1, in www.dgsi.pt. que “A petição de habeas corpus tem os fundamentos previstos taxativamente no art.º 222.º, n.º 2. do CPP, que consubstanciam “situações clamorosas de ilegalidade em que, até por estar em causa um bem jurídico tão precioso como a liberdade ambulatória (…), a reposição da legalidade tem um carácter urgente”. O “carácter quase escandaloso” da situação de privação de liberdade “legitima a criação de um instituto com os contornos do habeas corpus” (Cláudia Cruz Santos, “Prisão preventiva – habeas corpus – recurso ordinário”, in RPCC, ano 10, n.º 2, 2000, pp. 303-312, p. 310”.


Acresce, consoante resulta do prazo concedido para ser proferida decisão (8 dias) e da própria tramitação do respectivo procedimento (art.º 223.º do CPP), que a mencionada providência assume carácter célere, tendo em vista a obtenção de uma decisão que rapidamente reponha a legalidade no caso de privação ilegal da liberdade - não sendo confundível com o recurso.


Assim, o controlo feito pelo Supremo Tribunal de Justiça é exercido apenas em face da decisão que está na origem da requerida providência, não envolvendo valoração dos elementos de prova, com base nos quais se decidiu, sendo certo que o habeas corpus, não tem como escopo sindicar o mérito ou os erros de direito da decisão que privou o arguido da liberdade (Vd. Ac. do STJ de 05-09-2019, proc.
600/18.2JAPRT.P1.S1-A
, in www.dgsi.pt).


No presente caso, invoca o arguido, como já dito, que à data da apresentação da presente providência o mesmo se mantém detido preventivamente sem ter sido deduzida acusação, mostrando-se ultrapassado o prazo de seis meses previsto nos n.ºs 1 e 2, do art.º 215.º do CPP.


Não tem razão.


Com efeito, dispõe o aludido art.º 215.º do CPP, nomeadamente, o seguinte:


1- A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido:


a) Quatro meses sem que tenha sido deduzida acusação;


b) Oito meses sem que, havendo lugar a instrução, tenha sido proferida decisão instrutória;


c) Um ano e dois meses sem que tenha havido condenação em 1.ª instância;


d) Um ano e seis meses sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado.


2 - Os prazos referidos no número anterior são elevados, respectivamente, para seis meses, dez meses, um ano e seis meses e dois anos, em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, ou quando se proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a 8 anos (…).”


Ora, analisando os autos verifica-se que no processo à ordem do qual se encontra preso preventivamente o arguido, já foi deduzida acusação e decisão instrutória de pronúncia. Foi-lhe imputada a prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, p.p. pelo art.º 21.º n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/01, com referência às tabelas 1-A, 1-B, 1-C e 11-A, a este anexas, com a pena de prisão superior a 8 anos e que integra o conceito de “criminalidade altamente organizada”, nos termos do art.º 1.º, al. m), do CPP. Assim, ao contrário do sufragado pelo arguido, por força do n.º 1, alínea c) e do n.º 2 do art.º 215.º do CPP, o prazo da prisão preventiva, não é de seis meses, mas sim de um ano e seis meses.


Considerando que o arguido foi detido em 04-04-2023, foi-lhe aplicada a medida de coação de prisão preventiva em 05-04-2023, deduzida acusação em 07-06-2023, analisados os pressupostos da prisão preventiva em 09-06-2023 e 21-07-2023 e proferido despacho de pronúncia em 04-10-2023, mostra-se perfeitamente respeitado o prazo da prisão preventiva aplicável de um ano e seis meses.


Desta feita, uma vez que a privação da liberdade foi determinada por autoridade competente, por facto que a lei permite e sem que tenham sido ultrapassados os prazos máximos da sua duração, é manifestamente infundada a petição de habeas corpus apresentada pelo Requerente. O arguido será, assim, condenado a título de sanção processual, no pagamento de uma soma entre 6 UC e 30 UC (art.º 223.º, n.º 6 do CPP), que no caso se fixa em 10 UC, para além da condenação na correspondente taxa de justiça (em 2 UC) face ao seu decaimento.


III – Decisão


Em face do exposto, acordam os Juízes da 5.ª Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em indeferir o pedido de habeas corpus requerido pelo Arguido, por falta de fundamento bastante.


Condena-se o arguido no pagamento de 10 UCS.


Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça em 2 UCS.


Lisboa, 2023-10-19


Albertina Pereira (Relatora)


António Latas (1.º Adjunto)


Agostinho Torres (2.º Adjunto)


Helena Moniz (Presidente da Secção)