Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2520/20.1T8GMR.G2.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: NUNO PINTO OLIVEIRA
Descritores: EXTENSÃO DO CASO JULGADO
OFENSA DO CASO JULGADO
ANULAÇÃO DE SENTENÇA
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
RECURSO DE APELAÇÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
MODIFICABILIDADE DA DECISÃO DE FACTO
Data do Acordão: 07/06/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
Quando se anula a decisão proferida em 1.ª instância para ampliação da matéria de facto, ao abrigo do art. 662.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Civil, não se forma caso julgado sobre a parte da decisão que o Tribunal da Relação dê como viciada.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA


I. — RELATÓRIO


1. Cari – Construtores, S.A., intentou a presente acção declarativa contra Novo Modelo Europa, S.A., pedindo:

I. — a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 150.572,81, dos quais:

a. — € 86.814,38 a título de penalidade compulsória estabelecida contratualmente;

b. — € 2.070,46 por conta dos materiais que a Autora, em vez da Ré, teve de comprar para a obra;

c. — € 54.372,00 referentes à contratação, por parte da autora, de mão de obra capaz de suprir as necessidades da obra;

d. — € 10.049,97 relativos ao custo suportado pela autora com a reparação dos trabalhos defeituosamente executados pela Ré;

II. — a condenação da Ré em juros de mora desde a citação até integral pagamento.


2. A Ré Modelo Europa, S.A., contestou e deduziu reconvenção, pedindo:

I. — a condenação da Autora no pagamento

a. — do valor de € 95.497,46, a título de capital;

b. —do valor de € 470,98, a título de juros de mora vencidos, “desde a data de vencimento das faturas”;

II. — a condenação da Autora no pagamento de juros de mora vincendos sobre o capital, calculados à taxa comercial, até integral pagamento.


3. A Autora Cari – Construtores, S.A., replicou, pugnando, designadamente, pela inadmissibilidade e, subsidiariamente, pela improcedência da reconvenção.

4. O Tribunal de 1.ª instância proferiu uma primeira sentença, em que julgou parcialmente procedentes a acção e a reconvenção.

5. O dispositivo da primeira sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, depois de rectificada, é do seguinte teor:

Pelo exposto, vai a acção julgada parcialmente procedente, com a consequente condenação da ré Novo Modelo Europa S.A. a pagar à autora Cari - Construtores S.A. a quantia que venha apurar-se ulteriormente, correspondente ao valor do material aludido no artigo 34) dos factos provados (400 metros de rodapé).

No mais, a acção improcede.

Mais vai a reconvenção julgada parcialmente procedente, na medida do valor que venha a apurar-se em ulterior liquidação, relativamente aos trabalhos e materiais referidos no artigo 44) dos factos provados (forras das portas corta-fogo; execução da porta da entrada do edifício; fornecimento e colocação de corrimão em madeira de IPE; fornecimento e colocação de calhas que estavam excluídas no item 260 do orçamento, a fls. 17 dos autos; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho) e que, somado ao valor referido em 51) - € 51.336,68 - será depois deduzido da quantia referida em 43) - € 60.000,00 -, ficando a reconvinda Cari - Construtores, S.A,. condenada a pagar à reconvinte Novo Modelo Europa S.A. o valor que exceda o crédito peticionado por via de acção, caso haja excesso.

Os valores a liquidar estarão limitados pelos aqui peticionados, nos termos do nº 1 d art. 609º do CPC.

Tratando-se de crédito(s) de que são titulares sociedades comerciais, os juros, devidos por uma ou outra, em função do crédito apurado, serão calculados à taxa comercial, contados desde a data da liquidação.

No mais, vão a acção e a reconvenção julgadas improcedentes, com a consequente absolvição da ré e da reconvinte do pedido.

As custas da acção da reconvenção serão a suportar pela autora e pela ré/reconvinte, sendo que, sem prejuízo do que venha a apurar-se em ulterior liquidação, provisoriamente, fixa-se em 90% o decaimento da acção para a autora, e em 50% o decaimento da reconvenção para a ré reconvinte - art. 527° do CPC".

6. Inconformada, a Ré Novo Modelo Europa, S.A., interpõs recurso de apelação.

7. A Autora Cari — Construtores S.A., contra-alegou, requerendo, subsidiariamente, a ampliação do objecto do recurso.

8. O Tribunal da Relação proferiu um primeiro acórdão, por que anulou a sentença recorrida.

9. O dispositivo do primeiro acórdão proferido pelo Tribunal da Relação é do seguinte teor:

Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação, ao abrigo do artº. 662º, nº. 2, c), C.P.C., em anular a sentença proferida a fim de ser ampliada a matéria de facto aos trabalhos contratuais que a R. alegadamente executou e cujo pagamento reclama, levando aos temas da prova e incidindo sobre a mesma a respetiva instrução, e respeitando o disposto no nº. 3, c), do mesmo artigo.

Ficam prejudicadas as demais questões suscitadas no recurso.

Custas consoante o vencimento final.


10. O Tribunal de 1.ª instãncia proferiu despacho, convidando a Ré / Reconvinte a alegar o que lhe era determinado e, depois de a Autora / Reconvinda ter exercido o contraditório, proferiu sentença, em que julgou parcialmente procedentes a acção e a reconvenção.

11. O dispositivo da segunda sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância é do seguinte teor:

Pelo exposto, vai a acção julgada parcialmente procedente, com a consequente condenação da ré Novo Modelo  Europa  S.A.  a pagar  à autora Cari - Construtores S.A. a quantia que venha apurar-se ulteriormente, correspondente ao valor do material aludido no artigo 34) dos factos provados (400 metros de rodapé).

Mais vai a reconvenção julgada parcialmente procedente, na medida do valor que venha a apurar-se em ulterior liquidação, relativamente aos trabalhos e materiais referidos nos artigos 16), 44), 51) e 52) dos factos provados, acrescido da quantia de € 733,33 pela obra da Escola ..., deduzindo-se ao resultado, por um lado, o adiantamento de € 60.000,00 referido em 43), por outro, a quantia que venha a liquidar-se por conta do referido em 34), a título de compensação de créditos, ficando a reconvinda Cari - Construtores S.A. condenada a pagar à reconvinte Novo Modelo Europa S.A. o valor que exceda o crédito peticionado por via de acção, caso haja excesso.

Os valores a liquidar estarão limitados pelos aqui peticionados, nos termos do nº 1 d art. 609º do CPC.

Tratando-se de crédito(s) de que são titulares sociedades comerciais, os juros, devidos por uma ou outra, em função do crédito apurado, serão calculados à taxa comercial, contados desde a data da liquidação.

No mais, vão a acção e a reconvenção julgadas improcedentes, com a consequente absolvição da ré e da reconvinte do pedido.

As custas da acção e da reconvenção serão a suportar pela autora e pela ré/reconvinte, sendo que, sem prejuízo do que venha a apurar-se em ulterior liquidação, provisoriamente, fixa-se em 90% o decaimento da acção para a autora, e em 40% o decaimento da reconvenção para a ré reconvinte – art. 527º do CPC.

12. Inconformadas. Autora e Ré interpuseram recursos de apelação.

13. O Tribunal da Relação:

I. — julgou totalmente improcedente o recurso interposto pela Autora Cari – Construtores, S.A.;

II. — julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela Ré Novo Modelo Europa, S.A..


14. O dispositivo do acórdão recorrido é do seguinte teor:

Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação em julgar o recurso da A./reconvinda Cari totalmente improcedente, e em consequência, negam provimento à apelação; mais acordam em julgar o recurso da R./reconvinte Novo Modelo parcialmente procedente, e em consequência, concedem parcial provimento à apelação alterando a condenação proferida no que concerne à procedência parcial da reconvenção nos seguintes termos: na medida do valor que venha a apurar-se em ulterior liquidação, relativamente aos trabalhos e materiais referidos nos artigos 16), 44), e 52) dos factos provados com a redação aqui dada (mantendo-se: acrescido da quantia de € 733,33 pela obra da Escola ...), somado ao valor referido em 51 de € 51.336,68, mantendo-se no mais o decidido quanto às deduções a fazer e limite estabelecido, e ainda tudo o mais decidido.

Relativamente à condenação em custas do recurso, as mesmas são a cargo da A. no que concerne à sua apelação, e no que respeita à apelação da R. são provisoriamente fixadas a cargo de A. e R. na proporção de 60% para a primeira e 40% para a segunda, sem prejuízo do acerto final dependente do resultado da liquidação (artº. 527º, nºs. 1 e 2, do C.P.C.).

15. Inconformada, a Autora Cari – Construtores, S.A., interpôs recurso de revista.

16. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões:

a) O presente Recurso e Revista é admissível porquanto, numa causa em que o valor da ação foi fixado em €248.276,22, é de €27.971,80, o valor que a Recorrente se considera prejudicada em virtude e de acordo com a procedência parcial do Recurso de Apelação apresentado pela aqui e agora recorrida,

b) e a recorrente entende, e assim pretende ver declarado por este Colendo Tribunal, que o Tribunal da Relação de Guimarães, ao acrescentar ao ponto 44) dos factos provados, o aumento do aro das portadas, fornecimento e colocação de peitoris em MDF, aro lateral da porta de correr, novas portadas, novas guarnições interiores e portas/aros novas com guarnições interiores e exteriores, fornecimento e colocação de peças de remate de portada à janela lateral em MDF, e ao ter eliminado a alínea m) dos factos não provados, ofendeu o caso julgado formal, formado em sua anterior decisão, em violação do artigo 620.º, n.º 1 do CPC.

c) Se o Tribunal da Relação de Guimarães, em anterior Acórdão a fls. 758, de 17-02-2022, considerou que “não se provou que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44, a R. tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido face ao orçamento de fls 15 e segs. – alínea m) dos factos não provados. Esta factualidade não foi impugnada pela recorrente e impõe-se,

d) O Douto Acórdão em recurso, ao considerar que, afinal, a não impugnação de tal matéria não se “impõe” à recorrida, porque “Proferida nova sentença, há novo recurso e neste a parte não fica vinculada ao alegado no anterior … a sentença anterior, repete-se, foi anulada e o que temos é uma nova sentença”, modificando e alterando o ponto 44) dos factos provados, e a alínea m) dos factos não provados que não havia sido impugnada no 1.º recurso, ofendeu o caso julgado formal formado em anterior decisão – n.º 1 do artigo 620.º do CPC, ofensa essa que se pretende ver declarada por este Colendo Tribunal.

e) A recorrida não tendo impugnado, no recurso de apelação de 21 de outubro de 2021, ref.ª citius ...93, a matéria e facto dada como não provada na alínea m), não mais pode impugnar essa matéria, mesmo que a anterior Sentença proferida pela 1ª instância tenha sido anulada.

f) Assim decidiu, mutatis mutandis, o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão de 29.06.2017, Revista n.º 934/09.7TBVRL.G2.S1 - 2.ª Secção, em que foi Relatora a Exma. Senhora Juíza Conselheira Maria da Graça Trigo, disponível em https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2022/03/onusimpugnacaomateriafacto.pdf - “Sumários de Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça”, cujo sumário se transcreveu.

g) “A economia processual, o prestígio das instituições judiciárias, reportando à coerência das decisões que proferem, e o prosseguido fim de estabilidade e certeza das relações jurídicas, são melhor servidas pelo critério ecléctico, que sem tomar extensiva a eficácia de caso julgado a todos os motivos objectivos da sentença reconhece todavia essa autoridade à decisão daquelas questões preliminares que foram antecedente lógico indispensável à emissão da parte dispositiva do julgado” – Rodrigues Bastos, in “Notas ao Código de Processo Civil”, 3.°, pág. 253.

h) Admitindo-se, por hipótese, que o Acórdão da Relação de Guimarães de 17-02-2022, anulou a sentença na sua globalidade, fê-lo, ainda assim, para trabalhar com a matéria de facto apurável, e não para alterar matéria de facto dada como “provada ou não provada” naquela sentença, e não impugnada no 1.º recurso.

i) A Sentença foi anulada para, nos termos da al. c) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC, se ampliar a matéria de facto, em repetição do julgamento, relativa aos trabalhos contratuais reclamados pela recorrida na fatura ...57, mas sem qualquer interferência quanto ao que a mesma deu como provado e não provado respeitante à execução de trabalhos a mais e mais valias,

j) E a factualidade que, no seguimento da ordenada ampliação, se apurou no julgamento repetido, e que deu origem ao “novo” ponto 52) dos factos provados, não originou a necessidade de (re)apreciação da matéria de facto respeitante aos trabalhos a mais e mais valias, ínsita no ponto 44) dos factos provados e na alínea m) dos factos não provados, pelo violou o Acórdão em Recurso, o disposto na 2.ª parte da al. c) do n.º 2 do artigo 662.º do CPC.

k) O Aresto em recurso, ao modificar e alterar o ponto 44) dos factos provados, e a alínea m) dos factos não provados, assim impondo factualidade diversa daquela que, sobre a mesma relação processual, já antes havia imposto, entrou em contradição com a Jurisprudência da mesma Relação de Guimarães, de 04.10.2018, relatado pela Exma. Senhora Juíza Desembargadora Maria João Matos, que, aliás, citou.

Nestes termos e nos mais de Direito, que V. Exas., mui doutamente, suprirão, deverá o presente recurso de proceder, revogando-se a decisão recorrida, com todas as consequências legais, assim se fazendo à já acostumada JUSTIÇA!

17. A Ré Novo Modelo Europa, S.A., não contra-alegou.

18. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), a questão a decidir, in casu, é, tão-só, a seguinte: — se a alteração do ponto n.º 44 da matéria de facto dada como provada e a eliminação do ponto m) da matéria de facto dada como não provada envolve ofensa de caso julgado.


II. — FUNDAMENTAÇÃO


OS FACTOS


19. Na primeira sentença — anulada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17 de Fevereiro de 2022 —, o Tribunal de 1.ª instância deu como provados os factos seguintes:

1) A autora dedica-se profissionalmente e com intuito lucrativo à execução de empreitadas de construção civil.

2) No exercício da sua actividade, a ora autora declarou à sociedade “OC..., S.A.” que executaria a obra do “Edifício Avenida ..., 84”.

3) Por escrito particular celebrado entre a autora e a ré, esta última declarou aceitar a realização das “carpintarias” na obra mencionada em 2), com o orçamento de fls. 15 verso ss., tendo a autora declarado pagar o preço de €434.071,89.

4) Na cláusula 3a do escrito referido em 3), sob a epígrafe “Preço, regime” ficou consignado o seguinte:

a. “6. São considerados trabalhos a mais (ou a menos) aqueles que não estiverem previstos no projecto e ou que resultarem de indicação escrita da primeira contraente (…) dirigida à segunda contraente”.

b. “7. Se forem solicitados à segunda contraente trabalhos a mais é indispensável, tanto para a sua execução como para o ajuste do seu custo, que a primeira contraente aprove, previamente e por escrito, as respectivas quantidades e preços. Considera-se, contudo, que os preços unitários contratuais e descontos comerciais que lhe estejam associados são aplicáveis a trabalhos a mais (ou a menos), desde que da mesma natureza”.

c. “8. Sempre que os trabalhos a mais não excedam 20% da totalidade do valor mencionado no ponto 1 da cláusula 3ª, não terá a segunda contraente direito a qualquer prorrogação do prazo”.

d. “9. Sempre que circunstâncias particulares o justifiquem, a primeira contraente pode solicitar, e a segunda contraente obriga-se a executar, trabalhos na obra em regime de administração directa. Os valores a facturar pela eventual execução destes trabalhos são os que resultarem dos preços a acordar para os meios de produção empregues, os quais incluirão todos os encargos e a percentagem para cobertura para os encargos administrativos e lucro da segunda contraente”.

e. “12. Todos os encargos adicionais, indemnizações ou qualquer outra pretensão que venham a ser requeridos pela segunda contraente à primeira contraente deverá ser alvo de análise por parte desta última. Caso entenda que a posição da segunda contraente seja justificada, a primeira contraente apresentará a reclamação ou pretensão da segunda contraente ao dono da obra, e apenas pagará à segunda contraente se e na medida em que o dono da obra lhe pagar pelo mesmo título. Nestas pretensões incluem igualmente os trabalhos a mais.


5) Na cláusula 5ª do escrito referido em 3), sob a epígrafe “Prazos, Meios de produção” ficou consignado o seguinte:

a. “A segunda contraente fica obrigada a apresentar um programa de trabalhos detalhado (programa de trabalhos propriamente dito, mapas de cargas de pessoal e de equipamento e cronograma financeiro) até duas semanas após a data de início (…) e a proceder à sua atualização quinzenalmente. Os programas de trabalhos referidos carecem da aprovação expressa da primeira outorgante” - pto 3.

b. “Em caso de ocorrência de trabalhos a mais, um eventual pedido de prorrogação do prazo por parte da segunda contraente só será considerado e analisado por parte da primeira contraente se o mesmo for entregue à primeira contraente até ao limite máximo de 22 dias úteis em relação ao prazo previamente estipulado. O cumprimento deste prazo não implica uma aprovação automática do pedido” - pto. 4.

c. “A segunda contraente obriga-se a adotar todas as medidas convenientes para, em nenhum caso, comprometer o ritmo de laboração desejado pela primeira contraente, nomeadamente mantendo em obra um responsável pela execução dos trabalhos, as cargas de pessoal e de equipamentos necessárias e praticando um horário de trabalho adaptado às circunstâncias” - pto. 5.

d. “Sempre que se verifique a atraso relativamente ao programa de trabalhos estabelecido, a segunda contraente obriga-se a reforçar os meios de produção necessários para a recuperação daquele, sem qualquer encargo adicional para a primeira contraente” - pto. 6.

e. “(…) constitui obrigação da segunda contraente a execução de trabalhos fora do horário normal (…) bem como em fins-de-semana sempre que se verifiquem atrasos que lhe sejam imputáveis ou sempre que, na perspectiva da primeira contraente, se corra o risco de os prazos parciais que sejam acordados não serem cumpridos” - pto 7.

f. “É da responsabilidade da segunda contraente o aprovisionamento atempado de todos os materiais, equipamentos e fornecimentos necessários à execução da subempreitada objecto do presente contrato” - pto. 8.

g. “É da responsabilidade da segunda contraente o fornecimento de todos os equipamentos e fornecimentos ligeiros e ferramentas (incluindo consumíveis) que esta venha a necessitar no decurso dos trabalhos. Esses materiais são mencionados na listagem de quantidades anexa. Caso não cumpra com essa responsabilidade, o custo dos mesmos poderá ser-lhe imputado pela primeira contraente” - pto. 9.

6) Na cláusula 7ª, sob a epígrafe “Penalidades” ficou consignado o seguinte:

“Se o subempreiteiro não concluir a obra no prazo contratualmente estabelecido, ser-lhe-á aplicada, até à receção dos trabalhos ou à rescisão do contrato, a seguinte multa contratual diária:

a) 1(por mil) do valor da adjudicação, no primeiro período correspondente a um décimo do referido prazo;

b) Em cada período subsequente de igual duração, a multa sofrerá um aumento de 0,25 (por mil), até atingir o máximo de 5 (por mil), sem contudo, e na sua globalidade, poder vir a exceder 20% do valor da adjudicação.

2 - Se o subempreiteiro não cumprir prazos parciais   vinculativos, quando existam, ser-lhe-á aplicada multa contratual de   percentagem igual a metade da estabelecida no número anterior e calculada pela mesma forma sobre o valor dos trabalhos em atraso.

3 – Para que se possam definir os atrasos que não lhe sejam imputáveis, deverá a segunda outorgante avisar o representante em obra da primeira contraente, por escrito e com antecedência, das ocorrências verificadas que estiverem na sua origem. A primeira contraente avaliará e aceitará ou não os argumentos expostos.

4 – Para além das multas previstas nos números anteriores, a segunda contraente é ainda obrigada a indemnizar a primeira contraente pelo dano excedente sofrido (…)”.

7) Na cláusula 5ª, ponto 2, do escrito particular referido em 3) a 6) foi ainda acordado que a ré entraria em obra no dia 14.01.2019 e terminaria os seus trabalhos em 28.02.2019.

8) A autora tinha interesse em que os trabalhos de carpintaria terminassem a 28.02.2019, pois, nos termos do escrito junto a fls. 20 verso a 24, havia acordado com a “OC..., S.A.” num prémio de €300.000,00 se entregasse a obra final em 25 de Março de 2019 e um prémio de € 150.000,00 se terminasse a obra em 15 de Abril de 2019.

9) A ré sabia que a autora tinha interesse no cumprimento dos prazos referidos em 7).

10) Em 13.03.2019, a ré aguardava a aprovação, pela autora, de um planeamento revisto para os trabalhos da sua responsabilidade, advertindo-a, no e-mail junto a fls. 46 verso (e 157), que “as datas apresentadas dependem de validações de preparações já enviadas, definição das portadas, adjudicações e respectivos aditamentos” e solicitando a revisão das datas contratuais.

11) A aprovação, pela autora, da porta da entrada do edifício, cuja   execução pela ré foi acordada posteriormente ao escrito referido em 3) a 7), ocorreu através de e-mail junto a fls. 157 verso, enviado no dia em 19.03.2019.

12) Em data anterior a 26.03.2019 houve uma alteração das medidas dos aros dos saguões, a implicar nova medição.

13) Durante o mês de Abril de 2019 houve alterações das forras das casas de banho, face ao que constava do projecto, estando ainda indefinido se os veios seriam na vertical ou na horizontal.

14) Durante a execução dos trabalhos de carpintaria, houve vários momentos em que a ré teve que aguardar o prosseguimento de trabalhos de outras áreas, designadamente aquando da montagem dos roupeiros e da colocação de rodapés.

15) No mês de Julho de 2019 a ré aguardava confirmação, pela autora, de orçamentos relativos a trabalhos extra e mais valias, com vista à encomenda de materiais e execução dos trabalhos em curso.

16) Após a celebração do acordo referido em 3) a 7), a autora e a ré acordaram na alteração de alguns materiais, face ao que constava do projecto e do orçamento inicial, designadamente para as portadas (que passaram a ter cremones), material de casas de banho (que passou a ser em contraplacado marítimo) e material dos corrimãos (que passou a ser IPE), que implicaram novos preços, mais elevados, novas encomendas a efectuar pela ré para efeitos de fabrico e maior demora na execução dos trabalhos.

17) Ao longo dos meses de Junho e Julho de 2019, a autora foi dando nota à ré de que estava a sofrer constrangimentos e sobrecustos com o dono da obra que iria depois imputar-lhe.

18) Ao longo do mês de Julho de 2019 a ré informou a autora de constrangimentos que estava a ter, quer com a obtenção de frente de obra, quer com as encomendas que tinha que efectuar sem que a autora tivesse validado orçamento para as mais valias.

19) Atento o referido em 10) a 16) e 18), na sua pendência, o acordo referido em 3) foi sendo sujeito a alterações quanto às datas de finalização dos trabalhos que a ré se obrigou a executar, referidas em 7).

20) Em correspondência trocada entre Abril e Setembro de 2019, junta a fls. 63 a 69 e 39, por várias vezes a ora ré solicitou à autora o envio do contrato com as alterações efectuadas designadamente quanto a prazos e multas, sendo que na carta junta a fls. 39, datada de 31.07.2019, referiu, entre o demais, o seguinte:

“[q]uanto ao contrato relembramos que o mesmo ainda não se encontra formalizado, estando dependente de V.Exªs a sua respectiva alteração quanto a prazos e multas, para posterior assinatura desta sociedade, o que ainda não aconteceu.

A acrescer ao contrato, encontram-se também por formalizar os aditamentos correspondentes a trabalhos a mais contratados para esta obra, dependentes igualmente do envio por V. Exas. e, apesar das nossas diversas solicitações, até à presente data, tal não aconteceu.

Quando mencionam o incumprimento de prazos contratuais, querermos uma vez mais relembrar que esta sociedade tinha todo o planeamento desta obra delineado (…) no entanto, fruto de atrasos dos quais não é a NME responsável, determinados, entre outros, pela indefinição na aprovação pela Cari dos materiais a aplicar[;] atrasos, pela Cari, no envio dos elementos essenciais para o avanço da obra, os atrasos na validação de autos de medição, com a particularidade, neste caso, de aprovarem montantes permanentemente desviados da realidade (…) promoveram o estado actual em que a obra se encontra”.

21) Dou por reproduzido o teor da carta enviada pela autora à ré com data de  09.08.2019, junta a fls. 47 verso e 48, em resposta à comunicação que a ré fizera a 31.07.2019, onde está consignado, entre o demais, o seguinte:

“[v]erifica-se em obra que o desenvolvimento dos trabalhos – por clara incapacidade de entrega de materiais em obra e reforço de pessoal (carga média de pessoal semanal entre 3 a 4 colaboradores) – permanece claramente insuficiente.

Balizando os V/ últimos planeamentos com os rendimentos atuais em obra, projeta a conclusão da vossa empreitada para final de setembro, na melhor das perspectivas (…).

(…) o último planeamento por V. Ex.as enviado a 13/06/2019 com data de términus da empreitada a 19/07/2019, já teria o impacto de todas e mais algumas questões por V/Exas colocadas, visto que as últimas questões reportam à data de 6 de Junho de 2019, ou seja, bem anteriores à data em que enviam o vosso último planeamento, ou seja, tais alegados “constrangimentos” já estariam introduzidos no plano de trabalhos por Vós enviado”.

Pelo exposto e face aos prejuízos graves causados pela V/ reiterada conduta de incumprimento e caso não se vislumbrem claras e manifestas alterações de comportamento no desenvolvimento dos trabalhos que Vos foram contratados, com claro reforço de equipas e entrega de material por forma a concluir a empreitada até, o mais tardar, 22 do corrente mês por forma a assim avaliarmos a situação internamente e junto do nosso cliente, ver-nos-emos forçados a dar continuidade ao procedimento de incumprimento culposo do contrato com as penalizações daí inerentes, acrescido dos prejuízos causados (…)” – sublinhado acrescentado.

22) Dou por reproduzido o teor da carta enviada pela ré à autora com data de 09.08.2019, de fls. 48 verso, onde a mesma refere, entre o demais, o seguinte:

“(…) no que diz respeito à subempreitada   (…)   desde o seu início, nomeadamente quanto ao pedido de alteração do contrato   inicial, bem como ao pedido de envio dos aditamentos ao respectivo   contrato, solicitados por diversas ocasiões, somos, pela presente, informar que a Novo Modelo Europa S.A. (NME) na ausência do envio do pretendido de forma imediata, deixa de possuir qualquer condição financeira que permita prosseguir e terminar os trabalhos em obra. (…) Face a este impasse que persiste há meses promovido por V/Exas, a sua não resolução colocará em causa a continuidade dos trabalhos e respectiva conclusão da subempreitada.

23) Dou por reproduzida a resposta da autora, a 12.08.2019 (fls. 49), instando a ré a terminar os trabalhos e notando que já estava pago 95% do preço, quando, no seu entender, apenas 57% da obra se mostrava executada.

24) A autora enviou à ré a carta datada de 13.08.2019, junta a fls. 50, verso, referindo ter efectuado um relatório fotográfico explicativo dos trabalhos que ainda se encontravam por executar e dos trabalhos que se encontravam defeituosamente executados, concedendo-lhe, quanto a estes últimos, um prazo de 30 dias para eliminar os defeitos.

25) Apesar do prazo de 30 dias referido em 24), no dia 22.08.2019 a autora enviou o um e-mail à ré, junto a fls. 93, com o seguinte teor:

“[n]o seguimento de anteriores contactos, somos a comunicar que, estando os V/ trabalhos atrasados e não se registando o necessário e já muito por nós Vos solicitado reforço da V/ equipas de montagem das V/carpintarias, nomeadamente das peças que se encontram depositadas em obra a aguardar pela V/ montagem e assim nesse contexto, a impedirem V/ Exas o avanço dos restantes trabalhos de acabamento interligados com as V/ tarefas e delas dependentes, informamos que iniciamos diligências para colocar de imediato em obra uma nova equipa para a execução de tais tarefas, nos moldes contratualmente estabelecidos, devendo por isso o V/ pessoa de enquadramento coordenar o trabalho desta nova equipa no sentido do seu melhor aproveitamento e da mais breve execução e conclusão dos V/ trabalhos”.

26) Dou por reproduzida a carta de 03.09.2019, junta a fls. 51 ss., 168 ss. e 192 ss., enviada pela ré à autora, onde aquela aceita que a autora pagara já, nessa altura, o valor de € 412.851,99, refutando, porém, a percentagem a que esse valor correspondia e afirmando antes que, com os trabalhos a mais, apenas estava paga uma percentagem de 83% da obra, mais afirmando que

“(…) a Cari não conseguiu respeitar qualquer compromisso para com os V/ trabalhos, verificando-se a necessidade de alteração sucessiva dos planeamentos enviados de forma a que fossem criadas as condições para execução das nossas tarefas. Recorda-se, particularmente, o caso dos (i) portaros cuja data conclusão das alhetas, trabalhos da V/ responsabilidade foi, como já supra referido em junho de 2019, (ii) da aplicação do nosso rodapé possível após a colocação do V/ pavimento cuja conclusão foi a meados de julho e (iii) das condições das forras dos hall dos elevadores (condições ideais para a respectiva conclusão em início de Julho). (…)

É com grande preocupação que nos deparamos com o esforço mantido por V/ Exas em registar por escrito o avanço da obra, ainda que tais comunicações omitam factos que condicionaram o estado da obra actual e, em sentido inverso, registamos a falta de apoio na preparação, gestão de obra, validações de materiais em tempos oportunos e falta de condições em obra que acautelem esta situação, que tanto tem vindo a prejudicar os nossos planeamentos internos e gestão de pessoal.

Sem prejuízo da falta de responsabilidade pelo atraso global da empreitada, mais uma vez relembramos que estamos deliberadamente a condicionar o bom andamento de outras obras para que esta tenha o melhor desfecho possível”.

27) Ao longo do mês de Setembro de 2019 a ré insistiu com a autora pela validação dos autos de medição relativos aos trabalhos extra e mais valias, mas a autora recusava essa validação, afirmando que apenas validaria autos na medida em que os mesmos fossem aprovados e medidos pelo dono da obra, mais referindo que não aceitava o valor dos trabalhos extra.

28) Dou por reproduzido o teor da carta enviada pela autora à ré com data de 13.09.2019, junta a fls. 53, verso e 174 verso e 175, onde a mesma refere, entre o demais, que

“[d]a análise do contrato convém esclarecer V/Ex.as que o mesmo é claro quanto à V/ aceitação do conteúdo do mesmo, quer das suas datas, quer das cláusulas penais aí estabelecidas, ainda que V/ Ex.as se recusem a assiná-lo por reiterado incumprimento do mesmo, achando certamente que o contrato é mutante e ao longo do mesmo as datas se podem alterar de acordo com a vontade de apenas uma das partes, no caso do relapso incumpridor”.

29) No dia 23.10.2019 a autora enviou à ré a carta junta a fls. 58 verso ss., comunicando a intenção de aplicar uma multa pelo incumprimento dos prazos e instando-a mais uma vez a terminar os trabalhos; efectuou um cálculo da multa com base em três cálculos distintos, terminando por referir que a multa efectiva seria de € 86.814,38 e que não prejudicaria o dever de a ré terminar os trabalhos.

30) No dia 28.10.2019 a autora (AA) enviou à ré (BB) o e-mail junto a fls. 190 e 205, referindo o seguinte:

“(…) dada a gravidade do atraso que se regista e acumula nos trabalhos da V/ subempreitada, neste contexto de não resposta às necessidades recorrentemente por nós Vos identificadas, iremos ter que recorrer a outras entidades para fazer as reparações em falta, bem como o fabrico dos materiais que ainda se revelam necessários para conclusãos dos V/ trabalhos (…)”.

31) A ré respondeu por carta datada de 31.10.2019, a fls. 61 ss., rejeitando a imputação de qualquer multa, pelas razões ali reiteradas, designadamente porque na data acordada para o fim dos trabalhos não havia ainda frente de obra, estando em curso validações de trabalhos, esclarecimento de dúvidas e escolhas de materiais; houve trabalhos extra requeridos pela autora e por esta validados a cinco dias do prazo originariamente previsto; houve dois acordos posteriores para a data final de entrega dos trabalhos, um para 31.08.2019 e outro para 27.09.2019; havia um desalinhamento das paredes para o qual a ré alertou a autora e que implicou maior delonga na aplicação das forras; alguns trabalhos já executados estavam a ser rectificados em virtude de estragos provocados por equipas externas.

32) A ora autora dirigiu à ré a carta junta a fls. 88, datada de 03.01.2020, onde referiu o seguinte: “[f]ace ao V/ abandono da empreitada e uma vez que a mesma se encontra por concluir, com base nos autos de medição já enviados e na ausência de reparação dos trabalhos defeituosamente executados – conforme diversas comunicações (…) somos a informar, sem mais demandas e face ao incumprimento contratual culposo e reiterado de V/Exas, que iremos proceder com a conclusão dos trabalhos e retificação dos mesmos por entidades terceiras, fazendo, por isso tempestivamente chegar a quantificação de tais custos e prejuízos, de tal a V/ Exas, acrescido das demais penalizações já executadas no âmbito do incumprimento dos prazos da empreitada.

33) A ré enviou à autora uma comunicação, junta a fls. 234, 235 e 521, dando por findos os seus trabalhos, em 28.01.2020.

34) Em Agosto de 2019 a sociedade “D... S.A.” forneceu à autora 400 metros de rodapé que a ré, nesse momento, não tinha para colocar e que, nos termos do acordo de vontades originário, lhe caberia a si fornecer.

35) A sociedade “D... S.A.” emitiu uma factura no valor de €1.968,00, junta a fls. 96, pelo fornecimento do rodapé referido em 34).

36) A sociedade N... emitiu à autora a factura junta a fls. 95 verso, no valor de € 102,46, relativa à compra de catalisador, de diluente e esmalte.

37) A autora contratou mão de obra durante os meses de Setembro de 2019 a Março de 2020, tendo-lhe sido facturadas as quantias de € 9.300,00, € 6.210,00 e € 2.160,00, € 2.700,00 pela sociedade T..., nos termos que constam das facturas de fls. 98 verso a 100 verso, no período compreendido entre 30.09.2019 e 04.12.2019.

38) A autora contratou mão de obra durante os meses de Dezembro de 2019 e Janeiro de 2020, tendo-lhe sido facturadas por F... e “O... Ld.ª” as quantias indicadas nas facturas de fls. 102 verso a 104, num total de € 14.490,00 de “valor executado” (e € 38.030,00 a título de “valor de retenção/desconto”).

39) A autora contratou mão de obra em Fevereiro de 2020, tendo-lhe sido emitida a factura de fls. 104 verso, pela sociedade “P... Unipessoal, Ld.ª”, no valor de € 2.496,00.

40) A autora contratou serviços de lacagem à sociedade “L... Ld.ª”, tendo-lhe sido emitida, em Março de 2020, a factura de fls. 105, no valor de € 1.344,00.

41) A autora contratou à sociedade “D..., S.A.” a execução de 18 armários, pela qual, nos termos que constam do doc. de fls. 107, verso, lhe foi cobrada a quantia de €10.049,97.

42) A autora remeteu à ré as facturas relativas aos trabalhos referidos em 34) a 41).

43) Em data não concretamente apurada mas que coincide com uma fase inicial do acordo de vontades, a autora adiantou à ré, por conta do preço referido em 3), a quantia de €60.000,00.

44) Por acordo com a autora, em alteração do que constava do orçamento que acompanhou o escrito referido em 3), a ré executou os seguintes trabalhos: colocação das forras das portas corta-fogo; execução da porta da entrada do edifício; fornecimento e colocação de corrimão em madeira de IPE; fornecimento e colocação de calhas que estavam excluídas no item 260 do orçamento, a fls. 17 dos autos; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho.

45) A ré enviou à autora a factura nº ...57, junta a fls. 595 a 602, relativa, entre outros, aos trabalhos e materiais referidos em 44).

46) A autora devolveu à ré a factura referida em 45) nos termos que constam da carta de fls. 594 verso, onde refere erros de medição, vícios nos valores cobrados, erros nos trabalhos e duplicação de trabalhos.

47) Entre Outubro de 2019 e Fevereiro de 2020 decorreram na obra trabalhos de reparação de lacados, limpezas e afinações relativas às carpintarias.

48) Em Janeiro de 2020 a ré esteve em obra a proceder a afinações e à reparação de lacados que anteriormente colocara.

49) A mais do referido em 48), a autora contratou a empresas terceiras a reparação de lacados.

50) Parte dos lacados referidos  em  47)  haviam  sido  danificados  por  intervenção  de outros trabalhadores, após a realização dos trabalhos de carpintaria.

51) Por conta de trabalhos efectuados no âmbito do acordo de vontades referido em 1) a 7) e, bem ainda, no âmbito de outros acordos de vontade celebrados entre a autora e a ré, esta última executou trabalhos pelos preços que constam das seguintes facturas: nº ...85, no valor de € 5.061,29; nº ...94, no valor de € 4.496,73; nº ...027, no valor de € 1.078,00; nº ...83, no valor de € 9.410,39; nº; nº ...26 no valor de € 7.936,53 e nº ...27, no valor de € 23.353,74, num total de € 51.336,68.


20. Em contrapartida, na primeira sentença — anulada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17 de Fevereiro de 2022 —, o Tribunal de 1.ª instância deu como não provados os factos seguintes:

a) Que a ré tenha dado primazia à execução de outros trabalhos que lhe foram adjudicados após a contratação com a autora.

b) Que, para além do referido em 34), a ré não tenha garantido o aprovisionamento de materiais e respetivo fabrico, havendo um défice de fornecimentos das carpintarias à obra.

c)  Que em Dezembro de 2019 a ré tenha retirado todos os seus trabalhadores da obra.

d) Que houvesse um acordo entre as partes no sentido de o abatimento dos € 60.000,00 referidos em 43) ser efectuado proporcional e/ou parcelarmente nos autos de medição subsequentes.

e) Que a recusa de validação dos autos de medição pela autora se fundasse na omissão do abatimento referido em d).

f) Que a colocação de mais trabalhadores em obra, por parte da ré, tivesse permitido o cumprimento dos prazos referidos em 5), 7) e 19).

g) Que a ré tenha deixado de fazer comparecer trabalhadores em obra, não informando a autora das razões justificativas, designadamente em Novembro ou Dezembro de 2019 ou em Janeiro de 2020.

h) Que execução dos 18 armários referidos em 41), no valor de € 10.049,97 tenha sido consequência de uma má execução desses mesmos armários pela ré.

i) Que a autora tenha pedido à ré a correcção ou substituição de trabalhos relativos aos 18 armários referidos em 41).

j) Que as facturas emitidas pela T..., F..., O..., P..., L... Disponível de fls. 97 a 107, referidas em 37) a 40), respeitem a trabalhos constantes do orçamento de fls. 15 ss. que haviam sido acordados pelas partes, sem que a ré os houvesse executado e/ou os houvesse executado com erros.

k) Que o preço dos rodapés referido em 35) tenha correspondência com o acordado entre as partes para o restante rodapé, adquirido e colocado pela ré, ou com o valor de mercado.

l) Que os materiais fornecidos pela N..., mencionados em 36), fossem a fornecer pela ré para algum trabalho que esta não tivesse executado ou houvesse executado deficientemente, sendo € 102,46 o preço acordado ou o valor de mercado.

m) Que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44), a ré tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido, face ao orçamento de fls. 15 ss.

n) Que o preço ou valor de mercado dos materiais e trabalhos referidos em 44) corresponda ao que consta da factura referida em 45).

o) Que só depois do dia 28.02.2018 é que a ré tenha podido começar os trabalhos de carpintaria.

p) Que a mais do referido em 10) a 19), houvesse questões relacionadas com o sistema de funcionamento da abertura dos quadros técnicos referentes ao elevador do 9º piso ou outras decisões por tomar que impediam o avanço dos trabalhos de carpintaria.

q) Que a autora tenha pago algum valor à ré por conta do referido em 44) e 51).

r) Que as intervenções referidas em 49) respeitassem a problemas relativos à execução, pela ré, dos trabalhos que foram objecto dessa intervenção.

21. Na segunda sentença, o Tribunal de 1.ª instância deu como provados os factos seguintes:

1) A autora dedica-se profissionalmente e com intuito lucrativo à execução de empreitadas de construção civil.

Obra da Av. António Augusto Aguiar

2) No exercício da sua actividade, a ora autora declarou à sociedade “OC..., S.A.” que executaria a obra do “Edifício Avenida ..., 84”.

3) Por escrito particular celebrado entre a autora e a ré, esta última declarou aceitar a realização das “carpintarias” na obra mencionada em 2), com o orçamento de fls. 15 verso ss., tendo a autora declarado pagar o preço de €434.071,89.

4) Na cláusula 3a do escrito referido em 3), sob a epígrafe “Preço, regime” ficou consignado o seguinte:

a. “6. São considerados trabalhos a mais (ou a menos) aqueles que não estiverem previstos no projecto e ou que resultarem de indicação escrita da primeira contraente (…) dirigida à segunda contraente”.

b.“7. Se forem solicitados à segunda contraente trabalhos a mais é indispensável, tanto para a sua execução como para o ajuste do seu custo, que a primeira contraente aprove, previamente e por escrito, as respectivas quantidades e preços. Considera-se, contudo, que os preços unitários contratuais e descontos comerciais que lhe estejam associados são aplicáveis a trabalhos a mais (ou a menos), desde que da mesma natureza”.

c. “8. Sempre que os trabalhos a mais não excedam 20% da totalidade do valor mencionado no ponto 1 da cláusula 3ª, não terá a segunda contraente direito a qualquer prorrogação do prazo”.

d. “9. Sempre que circunstâncias particulares o justifiquem, a primeira contraente pode solicitar, e a segunda contraente obriga-se a executar, trabalhos na obra em regime de administração directa. Os valores a facturar pela eventual execução destes trabalhos são os que  resultarem dos preços  a acordar para os meios  de produção empregues, os quais incluirão todos os encargos e a percentagem para cobertura para os encargos administrativos e lucro da segunda contraente”.

e. “12. Todos os encargos adicionais, indemnizações ou qualquer outra pretensão que venham a ser requeridos pela segunda contraente à primeira contraente deverá ser alvo de análise por parte desta última. Caso entenda que a posição da segunda contraente seja justificada, a primeira contraente apresentará a reclamação ou pretensão da segunda contraente ao dono da obra, e apenas pagará à segunda contraente se e na medida em que o dono da obra lhe pagar pelo mesmo título. Nestas pretensões incluem igualmente os trabalhos a mais.

5) Na cláusula 5ª do escrito referido em 3), sob a epígrafe “Prazos, Meios de produção” ficou consignado o seguinte:

a. “A segunda contraente fica obrigada a apresentar um programa de trabalhos detalhado (programa de trabalhos propriamente dito, mapas de cargas de pessoal e de equipamento e cronograma financeiro) até duas semanas após a data de início (…) e a proceder à sua atualização quinzenalmente. Os programas de trabalhos referidos carecem da aprovação expressa da primeira outorgante” - pto 3.

b. “Em caso de ocorrência de trabalhos a mais, um eventual pedido de prorrogação do prazo por parte da segunda contraente só será considerado e analisado por parte da primeira contraente se o mesmo for entregue à primeira contraente até ao limite máximo de 22 dias úteis em relação ao prazo previamente estipulado. O cumprimento deste prazo não implica uma aprovação automática do pedido” - pto. 4.

c. “A segunda contraente obriga-se a adotar todas as medidas convenientes para, em nenhum caso, comprometer o ritmo de laboração desejado pela primeira contraente, nomeadamente mantendo em obra um responsável pela execução dos trabalhos, as cargas de pessoal e de equipamentos necessárias e praticando um horário de trabalho adaptado às circunstâncias” - pto. 5.

d. “Sempre que se verifique a atraso relativamente ao programa de trabalhos estabelecido, a segunda contraente obriga-se a reforçar os meios de produção necessários para a recuperação daquele, sem qualquer encargo adicional para a primeira contraente” - pto. 6.

e. “(…) constitui obrigação da segunda contraente a execução de trabalhos fora do horário normal (…) bem como em fins-de-semana sempre que se verifiquem atrasos que lhe sejam imputáveis ou sempre que, na perspectiva da primeira contraente, se corra o risco de os prazos parciais que sejam acordados não serem cumpridos” - pto 7.

f. “É da responsabilidade da segunda contraente o aprovisionamento atempado de todos os materiais, equipamentos e fornecimentos necessários à execução da subempreitada objecto do presente contrato” - pto. 8.

g. “É da responsabilidade da segunda contraente o fornecimento de todos os equipamentos e fornecimentos ligeiros e ferramentas (incluindo consumíveis) que esta venha a necessitar no decurso dos trabalhos. Esses materiais são mencionados na listagem de quantidades anexa. Caso não cumpra com essa responsabilidade, o custo dos mesmos poderá ser-lhe imputado pela primeira contraente” - pto. 9.

6) Na cláusula 7ª, sob a epígrafe “Penalidades” ficou consignado o seguinte:

“Se o subempreiteiro não concluir a obra no prazo contratualmente estabelecido, ser-lhe-á aplicada, até à receção dos trabalhos ou à rescisão do contrato, a seguinte multa contratual diária:

a) 1(por mil) do valor da adjudicação, no primeiro período correspondente a um décimo do referido prazo;

b) Em cada período subsequente de igual duração, a multa sofrerá um aumento de 0,25 (por mil), até atingir o máximo de 5 (por mil), sem contudo, e na sua globalidade, poder vir a exceder 20% do valor da adjudicação.

2 - Se o subempreiteiro não cumprir prazos parciais vinculativos,quando existam, ser-lhe-á aplicada multa contratual de percentagem igual a metade da estabelecida no número anterior e calculada pela mesma forma sobre o valor dos trabalhos em atraso.

3 - Para que se possam definir os atrasos que não lhe sejam imputáveis, deverá a segunda outorgante avisar o representante em obra da primeira contraente, por escrito e com antecedência, das ocorrências verificadas que estiverem na sua origem. A primeira contraente avaliará e aceitará ou não os argumentos expostos.

4 - Para além das multas previstas nos números anteriores, a segunda contraente é ainda obrigada a indemnizar a primeira contraente pelo dano excedente sofrido (…)”.

7) Na cláusula 5ª, ponto 2, do escrito particular referido em 3) a 6) foi ainda acordado que a ré entraria em obra no dia 14.01.2019 e terminaria os seus trabalhos em 28.02.2019.

8) A autora tinha interesse em que os trabalhos de carpintaria terminassem a 28.02.2019, pois, nos termos do escrito junto a fls. 20 verso a 24, havia acordado com a “OC..., S.A.” num prémio de €300.000,00 se entregasse a obra final em 25 de Março de 2019 e um prémio de € 150.000,00 se terminasse a obra em 15 de Abril de 2019.

9) A ré sabia que a autora tinha interesse no cumprimento dos prazos referidos em 7).

10) Em 13.03.2019, a ré aguardava a aprovação, pela autora, de um planeamento revisto para os trabalhos da sua responsabilidade, advertindo-a, no e-mail junto a fls. 46 verso (e 157), que “as datas apresentadas dependem de validações de preparações já enviadas, definição das portadas, adjudicações e respectivos aditamentos” e solicitando a revisão das datas contratuais.

11) A aprovação, pela autora, da porta da entrada do edifício, cuja execução pela ré foi acordada posteriormente ao escrito referido em 3) a 7), ocorreu através de e-mail junto a fls. 157 verso, enviado no dia em 19.03.2019.

12) Em data anterior a 26.03.2019 houve uma alteração das medidas dos aros dos saguões, a implicar nova medição.

13) Durante o mês de Abril de 2019 houve alterações das forras das casas de banho, face ao que constava do projecto, estando ainda indefinido se os veios seriam na vertical ou na horizontal.

14) Durante a execução dos trabalhos de carpintaria, houve vários momentos em que a ré teve que aguardar o prosseguimento de trabalhos de outras áreas, designadamente aquando da montagem dos roupeiros e da colocação de rodapés.

15) No mês de Julho de 2019 a ré aguardava confirmação, pela autora, de orçamentos relativos a trabalhos extra e mais valias, com vista à encomenda de materiais e execução dos trabalhos em curso.

16) Após a celebração do acordo referido em 3) a 7), a autora e a ré acordaram na alteração de alguns materiais, face ao que constava do projecto e do orçamento inicial,  designadamente para as portadas (que passaram a ter cremones), material de casas de banho (que passou a ser em contraplacado marítimo)  e material dos corrimãos (que passou a ser IPE) , que implicaram novos preços, mais elevados, novas encomendas a efectuar pela ré para efeitos de fabrico e maior demora na execução dos trabalhos.

17) Ao longo dos meses de Junho e Julho de 2019, a autora foi dando nota à ré de que estava a sofrer constrangimentos e sobrecustos com o dono da obra, que iria depois imputar-lhe.

18) Ao longo do mês de Julho de 2019 a ré informou a autora de constrangimentos que estava a ter, quer com a obtenção de frente de obra, quer com as encomendas que tinha que efectuar sem que a autora tivesse validado orçamento para as mais valias.

19) Atento o referido em 10) a 16) e 18), na sua pendência, o acordo referido em 3) foi sendo sujeito a alterações quanto às datas de finalização dos trabalhos que a ré se obrigou a executar, referidas em 7).

20) Em correspondência trocada entre Abril e Setembro de 2019, junta a fls. 63 a 69 e 39, por várias vezes a ora ré solicitou à autora o envio do contrato com as alterações efectuadas designadamente quanto a prazos e multas, sendo que na carta junta a fls. 39, datada de 31.07.2019 referiu, entre o demais, o seguinte:

“[qJuanto ao contrato relembramos que o mesmo ainda não se encontra formalizado, estando dependente de V.Exªs a sua respectiva alteração quanto a prazos e multas, para posterior assinatura desta sociedade, o que ainda não aconteceu. A acrescer ao contrato, encontram-se também por formalizar os aditamentos correspondentes a trabalhos a mais contratados para esta obra, dependentes igualmente do envio por V. Exas. e, apesar das nossas diversas solicitações, até à presente data, tal não aconteceu. Quando mencionam o incumprimento de prazos contratuais, querermos uma vez mais relembrar que esta sociedade tinha todo o planeamento desta obra delineado (...) no entanto, fruto de atrasos dos quais não é a NME responsável, determinados, entre outros, pela indefinição na aprovação pela Cari dos materiais a aplicar[;] atrasos, pela Cari, no envio dos elementos essenciais para o avanço da obra, os atrasos na validação de autos de medição, com a particularidade, neste caso, de aprovarem montantes permanentemente desviados da realidade (...) promoveram o estado actual em que a obra se encontra”.

21. Dou por reproduzido o teor da carta enviada pela autora à ré com data de 09.08.2019, junta a fls. 47 verso e 48, em resposta à comunicação que a ré fizera a 31.07.2019, onde está consignado, entre o demais, o seguinte:

“ [v]erifica-se em obra que o desenvolvimento dos trabalhos - por clara incapacidade de entrega de materiais em obra e reforço de pessoal (carga média de pessoal semanal entre 3 a 4 colaboradores) - permanece claramente insuficiente.

Balizando os V/ últimos planeamentos com os rendimentos atuais em obra, projeta a conclusão da vossa empreitada para final de setembro, na melhor das perspectivas (...) . (...) o último planeamento por V. Ex.as enviado a 13/06/2019 com data de términus da empreitada a 19/07/2019, já teria o impacto de todas e mais algumas questões por V/Exas colocadas, visto que as últimas questões reportam à data de 6 de Junho de 2019, ou seja, bem anteriores à data em que enviam o vosso último planeamento, ou seja, tais alegados “constrangimentos” já estariam introduzidos no plano de trabalhos por Vós enviado”.

Pelo exposto e face aos prejuízos graves causados pela V/ reiterada conduta de incumprimento e caso não se vislumbrem claras e manifestas alterações de comportamento no desenvolvimento dos trabalhos que Vos foram contratados, com claro reforço de equipas e entrega de material por forma a concluir a empreitada até, o mais tardar, 22 do corrente mês por forma a assim avaliarmos a situação internamente e junto do nosso cliente, ver-nos-emos forçados a dar continuidade ao procedimento de incumprimento culposo do contrato com as penalizações daí inerentes, acrescido dos prejuízos causados (…)” - sublinhado acrescentado.

22) Dou por reproduzido o teor da carta enviada pela ré à autora com data de 09.08.2019, de fls. 48 verso, onde a mesma refere, entre o demais, o seguinte:

“(…) no que diz respeito à subempreitada (…) desde o seu início, nomeadamente quanto ao pedido de alteração do contrato inicial, bem como ao pedido de envio dos aditamentos ao respectivo contrato, solicitados por diversas ocasiões, somos, pela presente, informar que a Novo Modelo Europa S.A. (NME) na ausência do envio do pretendido de forma imediata, deixa de possuir qualquer condição financeira que permita prosseguir e terminar os trabalhos em obra. (…)

Face a este impasse que persiste há meses promovido por V/Exas, a sua não resolução colocará em causa a continuidade dos trabalhos e respectiva conclusão da subempreitada.

23) Dou por reproduzida a resposta da autora, a 12.08.2019 (fls. 49), instando a ré a terminar os trabalhos e notando que já estava pago 95% do preço, quando, no seu entender, apenas 57% da obra se mostrava executada.

24) A autora enviou à ré a carta datada de 13.08.2019, junta a fls. 50, verso, referindo ter efectuado um relatório fotográfico explicativo dos trabalhos que ainda se encontravam por executar e dos trabalhos que se encontravam defeituosamente executados, concedendo-lhe, quanto a estes últimos, um prazo de 30 dias para eliminar os defeitos.

25) Apesar do prazo de 30 dias referido em 24), no dia 22.08.2019 a autora enviou o um e-mail à ré, junto a fls. 93, com o seguinte teor:

“[n]o seguimento de anteriores contactos, somos a comunicar que, estando os V/ trabalhos atrasados e não se registando o necessário e já muito por nós Vos solicitado reforço da V/ equipas de montagem das V/carpintarias, nomeadamente das peças que se encontram depositadas em obra a aguardar pela V/ montagem e assim nesse contexto, a impedirem V/ Exas o avanço dos restantes trabalhos de acabamento interligados com as V/ tarefas e delas dependentes, informamos que iniciamos diligências para colocar de imediato em obra uma nova equipa para a execução de tais tarefas, nos moldes contratualmente estabelecidos, devendo por isso o V/ pessoa de enquadramento coordenar o trabalho desta nova equipa no sentido do seu melhor aproveitamento e da mais breve execução e conclusão dos V/ trabalhos”.

26) Dou por reproduzida a carta de 03.09.2019, junta a fls. 51 ss., 168 ss. e 192 ss., enviada pela ré à autora, onde aquela aceita que a autora pagara já, nessa altura, o valor de € 412.851,99, refutando, porém, a percentagem a que esse valor correspondia e afirmando antes que, com os trabalhos a mais, apenas estava paga uma percentagem de 83% da obra, mais afirmando que

“(…) a Cari não conseguiu respeitar qualquer compromisso para com os V/ trabalhos, verificando-se a necessidade de alteração sucessiva dos planeamentos enviados de forma a que fossem criadas as condições para execução das nossas tarefas.

Recorda-se, particularmente, o caso dos (i) portaros  cuja  data  conclusão  das  alhetas, trabalhos  da  V/responsabilidade foi, como já supra referido em junho de 2019, (ii) da aplicação do nosso rodapé possível após a colocação do V/ pavimento cuja conclusão foi a meados de julho e (iii) das condições das forras dos hall dos elevadores (condições ideais para a respectiva conclusão em início de Julho). (...)

É com grande preocupação que nos deparamos com o esforço mantido por V/ Exas em registar por escrito o avanço da obra, ainda que tais comunicações omitam factos que condicionaram o estado da obra actual e, em sentido inverso, registamos a falta de apoio na preparação, gestão de obra, validações de materiais em tempos oportunos e falta de condições em obra que acautelem esta situação, que tanto tem vindo a prejudicar os nossos planeamentos internos e gestão de pessoal.

Sem prejuízo da falta de responsabilidade pelo atraso global da empreitada, mais uma vez relembramos que estamos deliberadamente a condicionar o bom andamento de outras obras para que esta tenha o melhor desfecho possível”.

27) Ao longo do mês de Setembro de 2019 a ré insistiu com a autora pela validação dos autos de medição relativos aos trabalhos extra e mais valias, mas a autora recusava essa validação, afirmando que apenas validaria autos na medida em que os mesmos fossem aprovados e medidos pelo dono da obra, mais referindo que não aceitava o valor dos trabalhos extra.

28) Dou por reproduzido o teor da carta enviada pela autora à ré com data de 13.09.2019, junta a fls. 53, verso e 174 verso e 175, onde a mesma refere, entre o demais, que

“[d]a análise do contrato convém esclarecer V/Ex.as que o mesmo é claro quanto à V/ aceitação do conteúdo do mesmo, quer das suas datas, quer das cláusulas penais aí estabelecidas, ainda que V/ Ex.as se recusem a assiná-lo por reiterado incumprimento do mesmo, achando certamente que o contrato é mutante e ao longo do mesmo as datas se podem alterar de acordo com a vontade de apenas uma das partes, no caso do relapso incumpridor”.

29) No dia 23.10.2019 a autora enviou à ré a carta junta a fls. 58 verso ss., comunicando a intenção de aplicar uma multa pelo incumprimento dos prazos e instando-a mais uma vez a terminar os trabalhos; efectuou um cálculo da multa com base em três cálculos distintos, terminando por referir que a multa efectiva seria de € 86.814,38 e que não prejudicaria o dever de a ré terminar os trabalhos.

30) No dia 28.10.2019 a autora (AA) enviou à ré (BB) o e-mail junto a fls. 190 e 205, referindo o seguinte:

“(…) dada a gravidade do atraso que se regista e acumula nos trabalhos da V/ subempreitada, neste contexto de não resposta às necessidades recorrentemente por nós Vos identificadas, iremos ter que recorrer a outras entidades para fazer as reparações em falta, bem como o fabrico dos materiais que ainda se revelam necessários para conclusãos dos V/ trabalhos (…)”.

31) A ré respondeu por carta datada de 31.10.2019, a fls. 61 ss., rejeitando a imputação de qualquer multa, pelas razões ali reiteradas, designadamente porque na data acordada para o fim dos trabalhos não havia ainda frente de obra, estando em curso validações de trabalhos, esclarecimento de dúvidas e escolhas de materiais; houve trabalhos extra requeridos pela autora e por esta validados a cinco dias do prazo originariamente previsto; houve dois acordos posteriores para a data final de entrega dos trabalhos, um para 31.08.2019 e outro para 27.09.2019; havia um desalinhamento das paredes para o qual a ré alertou a autora e que implicou maior delonga na aplicação das forras; alguns trabalhos já executados estavam a ser rectificados em virtude de estragos provocados por equipas externas.

32) A ora autora dirigiu à ré a carta junta a fls. 88, datada de 03.01.2020, onde referiu o seguinte: “[f]ace ao V/ abandono da empreitada e uma vez que a mesma se encontra por concluir, com base nos autos de medição já enviados e na ausência de reparação dos trabalhos defeituosamente executados - conforme diversas comunicações (…) somos a informar, sem mais demandas e face ao incumprimento contratual culposo e reiterado de V/Exas, que iremos proceder com a conclusão dos trabalhos e retificação dos mesmos por entidades terceiras, fazendo, por isso tempestivamente chegar a quantificação de tais custos e prejuízos, de tal a V/ Exas, acrescido das demais penalizações já executadas no âmbito do incumprimento dos prazos da empreitada.

33) A ré enviou à autora uma comunicação, junta a fls. 234, 235 e 521, dando por findos os seus trabalhos, em 28.01.2020.

34) Em Agosto de 2019 a sociedade “D... S.A.” forneceu à autora 400 metros de rodapé que a ré, nesse momento, não tinha para colocar e que, nos termos do acordo de vontades originário, lhe caberia a si fornecer.

35) A sociedade “D... S.A.” emitiu uma factura no valor de €1.968,00, junta a fls. 96, pelo fornecimento do rodapé referido em 34).

36) A sociedade N... emitiu à autora a factura junta a fls. 95 verso, no valor de € 102,46, relativa à compra de catalisador, de diluente e esmalte.

37) A autora contratou mão de obra durante os meses de Setembro de 2019 a Março de 2020, tendo-lhe sido facturadas as quantias de € 9.300,00, € 6.210,00 e € 2.160,00, € 2.700,00 pela sociedade T..., nos termos que constam das facturas de fls. 98 verso a 100 verso, no período compreendido entre 30.09.2019 e 04.12.2019.

38) A autora contratou mão de obra durante os meses de Dezembro de 2019 e Janeiro de 2020, tendo-lhe sido facturadas por F... e “O... Ld.ª” as quantias indicadas nas facturas de fls. 102 verso a 104, num total de € 14.490,00 de “valor executado” (e € 38.030,00 a título de “valor de retenção/desconto”).

39) A autora contratou mão de obra em Fevereiro de 2020, tendo-lhe sido emitida a factura de fls. 104 verso, pela sociedade “P... Unipessoal, Ld.ª”, no valor de € 2.496,00.

40) A autora contratou serviços de lacagem à sociedade “L... Ld.ª”, tendo-lhe sido emitida, em Março de 2020, a factura de fls. 105, no valor de € 1.344,00.

41) A autora contratou à sociedade “D..., S.A.” a execução de 18 armários, pela qual, nos termos que constam do doc. de fls. 107, verso, lhe foi cobrada a quantia de €10.049,97.

42) A autora remeteu à ré as facturas relativas aos trabalhos referidos em 34) a 41).

43) Em data não concretamente apurada mas que coincide com uma fase inicial do acordo de vontades, a autora adiantou à ré, por conta do preço referido em 3), a quantia de €60.000,00.

44) Por acordo com a autora, em alteração do que constava do orçamento que acompanhou o escrito referido em 3), a ré executou os seguintes trabalhos: colocação das forras das portas corta-fogo;execução da porta da entrada do edifício; fornecimento e colocação de corrimão em madeira de IPE; fornecimento e colocação de calhas que estavam excluídas no item 260 do orçamento, a fls. 17 dos autos; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho.

45) A ré enviou à autora a factura nº ...57, junta a fls. 595 a 602, relativa, entre outros, aos trabalhos e materiais referidos em 44).

46) A autora devolveu à ré a factura referida em 45) nos termos que constam da carta de fls. 594 verso, onde refere erros de medição, vícios nos preços, erros nos trabalhos e duplicação de trabalhos.

47) Entre Outubro de 2019 e Fevereiro de 2020 decorreram na obra trabalhos de reparação de lacados, limpezas e afinações relativas às carpintarias.

48) Em Janeiro de 2020 a ré esteve em obra a proceder a afinações e à reparação de lacados que anteriormente colocara.

49) A mais do referido em 48), a autora contratou a empresas terceiras a reparação de lacados.

50) Parte dos lacados referidos em 47) haviam sido danificados por intervenção de outros trabalhadores, após a realização dos trabalhos de carpintaria.

51) Por conta de trabalhos efectuados no âmbito do acordo de vontades referido em 1) a 7) e, bem ainda, no âmbito de outros acordos de vontade celebrados entre a autora e a ré, esta última executou trabalhos pelos preços que constam das seguintes facturas:

— n° ...85, no valor de € 5.061,29; n° ...94, no valor de € 4.496,73;

— n° ...027, no valor de € 1.078,00;

— n° ...83, no valor de € 9.410,39;

— n° ...26 no valor de € 7.936,53;e

— n° ...27, no valor de € 23.353,74, num total de € 51.336,68.

52) Por conta da factura nº ...57 referida em 45), a NME executou os seguintes serviços que haviam sido acordados aquando do referido em 3) a 7)1: fornecimento e assentamento de rodapé MDF, encastrado na parede; fornecimento e assentamento de vãos em madeira, com bandeira e portas, incluindo ferragens, revestido com duas placas de HDF, topos com rebate e acabamento lacado; fornecimento e assentamento de armários roupeiros com portas em HDF, lacados, incluindo fixações, ferragens e acessórios, prateleiras, módulos de gavetas, varão, rodapés interiores, vedantes e afinações; fornecimento e assentamento de portadas alveolares com encabeços em HDF, acabamento com primário de madeira e esmalte sintético, incluindo fixações, ferragens e acessórios; execução de corrimão em madeira maciça de carvalho, fresado na face inferior para fixação a barra de aço inox,a chumbar previamente na parede, acabamento envernizado, incluindo fixações; execução de conjunto de caixas de correio constituídas por uma estrutura em perfis tubulares, placas de MDF revestidas a chapa de aço inox, acabamento escovado, portas em MDF folheado a madeira de Carvalho envernizado; fornecimento e aplicação de cunhais em MDF lisos, incluindo acabamento lacado branco; execução de revestimento em painéis de madeira com acabamento lacado a branco, incluindo reboco base, fixações, cortes e remates.

53) Os trabalhos referidos no item 7.2.8 da factura nº ...57,  no valor de € 8.757,72, foram facturados em excesso, uma vez que houve alterações a determinar a compensação com o item 5 dessa factura.

Obra denominada “Instituto ...” - factura nº ...82: […]

54) No âmbito das actividades mencionadas em 1) , a ora autora e a ora ré acordaram na realização de trabalhos e aplicação de materiais pela NME, contra o pagamento de um preço por parte da Cari.

55) A NME enviou à Cari a factura nº ...08, junta a fls. 274 dos autos, no valor total de € 8.880,86, que indica o seguinte: “7.4.1 -rodapé para pavimentos 100 x 15 (mm)/Qtd. 805,69 /P. Unit. 8,830 /Total 7.111,240; 7.4.2 - rodapé para escadas, 290 x 15 (mm)/Qtd. 70,920/ P. Unit. 24,910 /1.766,620”.

56) A factura mencionada em 55) foi devolvida em 18.12.2018, nos termos que constam de fls. 619, referindo-se aí o seguinte: “Recepcionada sem o correspondente Auto de Medição, devidamente assinado por ambas as partes”.

57) O auto de medição junto a fls. 620, com o número 7, mostra-se assinado apenas pela ré/reconvinte e dele consta a menção “Trabalho adicional”.

58) A Cari pagou à NME a colocação de rodapés na obra denominada “Instituto ...”.

Obra da Escola ... (factura ...03)[…]

59) Entre a Câmara Municipal ... e a Cari foi celebrado um acordo de vontades nos termos do qual a primeira solicitou à segunda a realização de trabalhos de construção civil na Escola ....

60) Na sequência do referido em 59), a Cari acordou com a NME a execução,  por esta última,  de vários trabalhos,  designadamente o fornecimento e assentamento de revestimento de chapa de aço galvanizado, perfis, fixações e colocação de vedantes.

61) Pelos trabalhos referidos em 60), o preço acordado foi € 3.325,33.

62) Por conta desses trabalhos foi enviado à Cari o auto de medição nº 255, datado de 24.04.2017, junto a fls. 301 verso dos autos.

63) Após o referido em 62), a partir de data não concretamente apurada começaram a verificar-se infiltrações de água no corredor de salas de aula na Escola ....

64) Por carta datada de 28.01.2020, junta a fls. 828 dos autos, a Cari declarou à NME que “só procederemos com o pagamento dos mesmos quando forem sanados os vícios já denunciados em cartas anteriores, tais como infiltrações graves no edifício principal da escola”.

65) Por carta datada de 05.11.2020, a Cari declarou à NME que

“na sequência das inúmeras comunicações trocadas sobre o assunto e da não resolução do tema das infiltrações da cobertura da Escola ... em ..., segue em anexo (…) mais uma comunicação da Câmara Municipal ... a evidenciar a persistência do problema sendo, neste momento, a única questão em garantia que permanece por resolver na obra.

Esta situação impede que a Cari Construtores, S.A. cumpra pontualmente as suas obrigações para com o dono da obra.

Solicita-se a vossa comparência no dia e hora indicada nesse ofício (dia 20 de Novembro pelas 10.30) com o intuito de apresentarem uma solução definitiva para o problema, sob pena de termos de proceder, nós próprios, à eliminação de tais defeitos, e de, nos termos legais e contratuais aplicáveis, reivindicarmos de V.Ex.ªs adequada indemnização pelos danos emergentes, procedendo à compensação dos valores em pagamento ou retidos para efeitos de garantia”.

66) Dou por reproduzido o teor da carta de fls. 830 verso, datada de 04.11.2020, enviada pela Câmara Municipal ... à Cari, convocando esta última para a reunião do dia 20 de Novembro de 2020, para realização de vistoria tendente à identificação das anomalias detectadas, das quais constavam as infiltrações visíveis no relatório fotográfico de fls. 831 ss.

67) A NME não compareceu à reunião mencionada em 65) e 66), nem se disponibilizou para resolver o problema das infiltrações referidas em 63).

68) Por causa do referido em 67)  a  Cari  contratou uma empresa terceira para esse efeito e suportou o custo de € 2.592,00 com as reparações da cobertura.


22. Em contrapartida, o Tribunal de 1.ª instância deu como não provados os factos seguintes:

a) Que a ré tenha dado primazia à execução de outros trabalhos que lhe foram adjudicados após a contratação com a autora.

b) Que, para além do referido em 34), a ré não tenha garantido o aprovisionamento de materiais e respetivo fabrico, havendo um défice de fornecimentos das carpintarias à obra.

c) Que em Dezembro de 2019 a ré tenha retirado todos os seus trabalhadores da obra.

d) Que houvesse um acordo entre as partes no sentido de o abatimento dos € 60.000,00 referidos em 43) ser efectuado proporcional e/ou parcelarmente nos autos de medição subsequentes.

e) Que a recusa de validação dos autos de medição pela autora se fundasse na omissão do abatimento referido em d).

f) Que a colocação de mais trabalhadores em obra, por parte da ré, tivesse permitido o cumprimento dos prazos referidos em 5), 7) e 19).

g) Que a ré tenha deixado de fazer comparecer trabalhadores em obra, não informando a autora das razões justificativas, designadamente em Novembro ou Dezembro de 2019 ou em Janeiro de 2020.

h) Que execução dos 18 armários referidos em 41), no valor de € 10.049,97 tenha sido consequência de uma má execução desses mesmos armários pela ré.

i) Que a autora tenha pedido à ré a correcção ou substituição de trabalhos relativos aos 18 armários referidos em 41).

j) Que as facturas emitidas pela T..., F..., O..., P..., L... Disponível de fls. 97 a 107, referidas em 37) a 40), respeitem a trabalhos constantes do orçamento de fls. 15 ss. que haviam sido acordados pelas partes, sem que a ré os houvesse executado e/ou os houvesse executado com erros.

k) Que o preço dos rodapés referido em 35) tenha correspondência com o acordado entre as partes para o restante rodapé, adquirido e colocado pela ré, ou com o valor de mercado.

l) Que os materiais fornecidos pela N..., mencionados em 36), fossem a fornecer pela ré para algum trabalho que esta não tivesse executado ou houvesse executado deficientemente, sendo € 102,46 o preço acordado ou o valor de mercado.

m) Que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44), a ré tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido, face ao orçamento de fls. 15 ss.

n) Que  o preço  ou valor  de mercado  dos materiais e trabalhos referidos em 44) corresponda ao que consta da factura referida em 45).

o) Que só depois do dia 28.02.2018 é que a ré tenha podido começar os trabalhos de carpintaria.

p) Que a mais do referido em 10) a 19), houvesse  questões relacionadas com o sistema de funcionamento da abertura dos quadros técnicos referentes ao elevador do 9º piso ou outras decisões por tomar que impediam o avanço dos trabalhos de carpintaria.

q) Que a autora tenha pago algum valor à ré por conta do referido em 44) e 51).

r)  Que as intervenções referidas em 49)  respeitassem a problemas relativos à execução, pela ré, dos trabalhos que foram objecto dessa intervenção.

s) Que tenha havido um acordo de vontades no sentido de a autora/reconvinda suportar custos com os trabalhos de afinação e reparação mencionados em 48), designadamente o valor de € 4.230,00.

t) Que, quanto ao assentamento de rodapé MDF, encastrado na parede referido em 52), da medição final resultasse ser devido o valor de € 1.682,63, conforme item 6.3 da fatura nº ...57 (pág. 6/17).

u) Que, quanto ao fornecimento e assentamento de vãos em madeira referido em 52), da medição final resultasse serem devidos  os valores de € 2.536,38, € 1.149,27, € 515,08, € 2.054,18, € 1072,26, € 322,82, € 283,20 e € 748,73, num total de € 8.501,92,  conforme item 9.1 da fatura nº ...57 (ps. 7 a 10).

v) Que quanto ao fornecimento e assentamento de armários roupeiros com portas em HDF referido em 52), da medição final resultasse serem devidos os valores de € 3.895,32, € 7.838,01, € 120,82, € 167,29, € 106,06, € 16,31, € 30,34, € 48,13, num total de € 12.222,28, conforme item 9.2 da fatura nº ...57.

w) Que quanto ao fornecimento e assentamento de portadas alveolares com encabeços em HDF, acabamento com primário de madeira e esmalte sintético, incluindo fixações, ferragens e acessórios referidos em 52), da medição final resultasse serem devidos os valores de € 308,03, € 164,90, € 1.421,04, € 762,46, € 401,90, € 263,21, € 141,01, € 85,92, € 3.153,49, € 923,79, € 1.569,21 e € 396,02, num total de € 9.590,98, conforme item 9.3 da fatura nº ...57 (ps. 14 e 15).

x) Que quanto à execução de corrimão em madeira maciça de carvalho, fresado na face inferior para fixação a barra de aço inox, a chumbar previamente na parede, acabamento envernizado, incluindo fixações, da medição final resultasse serem devidos os valores de € 39,61 e € 39,61, num total de € 79,22, conforme item 9.4.1 da fatura nº ...57 (ps. 15 e 16).

y) Que quanto à execução de conjunto de caixas de correio constituídas por uma estrutura em perfis tubulares, placas de MDF revestidas a chapa de aço inox, acabamento escovado, portas em MDF folheado a madeira de Carvalho envernizado referida em 52), da medição final resultasse ser devido o valor de € 189,68, conforme primeira parte do item 9.4.2 da fatura nº ...57 (p. 16). z) Que quanto ao fornecimento e aplicação de cunhais em MDF lisos, incluindo acabamento lacado branco, referido em 52), da medição final resultasse ser devido o valor de € 380,73, conforme segunda parte do item 9.4.2 da fatura n.º ...57 (p. 16).

aa) Que quanto à execução de revestimento em painéis de madeira com acabamento lacado a branco, incluindo reboco base, fixações, cortes e remates, da medição final resultasse ser devido o valor de € 748,88, conforme item 7.2.9 da fatura nº ...57 (p. 17).

bb) Que a NME tivesse colocado preços errados, trabalhos por reparar ou trabalhos em duplicado na factura nº ...57.

Instituto ...

cc) Que o valor de € 8.880,86, referido em 55), represente a diferença de custo pela aplicação, na obra em questão, a pedido da Cari, de material mais caro do que o contratado.

dd) Que a mais do referido em 58), houvesse alguma quantia a pagar pela colocação de rodapés.

Escola ...

ee) Que as entradas de água mencionadas em 63) a 66) tenham resultado de intervenções posteriores feitas na cobertura por parte de terceiros, designadamente pela instalação de extractores de fumo.

ff) Que as entradas de água mencionadas em 63) a 66) tenham resultado de vícios da caixilharia.

gg) Que as inundações e as reparações às infiltrações na Escola ... referidas em 63) tenham ocorrido ainda no ano de 2017.

hh) Que a Cari tenha sentido vergonha pela não reparação, por parte da NME, das infiltrações na Escola ....


23. O Tribunal da Relação:

I. — alterou a redacção do facto dado como provado sob o n.º 44;

II. — alterou a redacção do facto dado como provado sob o n.º 52

III. - eliminou o facto dado como não provado sob a alínea m);

IV. — alterou a redacção do facto dado como não provado sob a alínea v).

24. Em primeiro lugar, alterou a redacção do facto dado como provado sob o n.º 44.

I. — O Tribunal de 1.ª instância atribuiu ao facto dado como provado sob o n.º 44 a redacção seguinte:

44) Por acordo com a autora, em alteração do que constava do orçamento que acompanhou o escrito referido em 3), a ré executou os seguintes trabalhos: colocação das forras das portas corta-fogo;execução da porta da entrada do edifício; fornecimento e colocação de corrimão em madeira de IPE; fornecimento e colocação de calhas que estavam excluídas no item 260 do orçamento, a fls. 17 dos autos; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho.

II. — O Tribunal da Relação acrescentou aumento do aro das portadas, fornecimento e colocação de peitoris em MDF, aro lateral da porta de  correr,  novas  portadas,  novas guarnições  interiores e portas/aros novas com guarnições interiores e exteriores, fornecimento e colocação de peças de remate de portada à janela lateral em MDF fazendo com que a redacção do facto dado como provado sob o n.º 44 passasse a ser a seguinte:

Por acordo com a autora, em alteração do que constava do orçamento que acompanhou o escrito referido em 3), a ré executou os seguintes trabalhos: colocação das forras das portas corta-fogo;execução da porta da entrada do edifício; fornecimento e colocação de corrimão em madeira de IPE; fornecimento e colocação de calhas que estavam excluídas no item 260 do orçamento, a fls. 17 dos autos; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho; aumento do aro das portadas, fornecimento e colocação  de  peitoris em MDF,  aro  lateral   da   porta  de  correr,  novas  portadas,  novas guarnições  interiores e portas/aros  novas com guarnições interiores e exteriores, fornecimento e colocação de peças de remate de portada à janela lateral em MDF.

25. Em segundo lugar, o Tribunal da Relação alterou a redacção do facto dado como provado sob o n.º 52.

I. — O Tribunal de 1.ª instância atribuiu ao facto dado como provado sob o n.º 52 a redacção seguinte:

52) Por conta da factura nº ...57 referida em 45), a NME executou os seguintes serviços que haviam sido acordados aquando do referido em 3) a 7): fornecimento e assentamento de rodapé MDF, encastrado na parede; fornecimento e assentamento de vãos em madeira, com bandeira e portas, incluindo ferragens, revestido com duas placas de HDF, topos com rebate e acabamento lacado; fornecimento e assentamento de armários roupeiros com portas em HDF, lacados, incluindo fixações, ferragens e acessórios, prateleiras, módulos de gavetas, varão, rodapés interiores, vedantes e afinações; fornecimento e assentamento de portadas alveolares com encabeços em HDF, acabamento com primário de madeira e esmalte sintético, incluindo fixações, ferragens e acessórios; execução de corrimão em madeira maciça de carvalho, fresado na face inferior para fixação a barra de aço inox,a chumbar previamente na parede, acabamento envernizado, incluindo fixações; execução de conjunto de caixas de correio constituídas por uma estrutura em perfis tubulares, placas de MDF revestidas a chapa de aço inox, acabamento escovado, portas em MDF folheado a madeira de Carvalho envernizado; fornecimento e aplicação de cunhais em MDF lisos, incluindo acabamento lacado branco; execução de revestimento em painéis de madeira com acabamento lacado a branco, incluindo reboco base, fixações, cortes e remates.

II. — O Tribunal da Relação substituiu “fornecimento e assentamento de armários roupeiros com portas em HDF, lacados, incluindo fixações, ferragens e acessórios, prateleiras, módulos de gavetas, varão, rodapés interiores, vedantes e afinações” por “fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho”, fazendo com que o facto dado como provado sob o n.º 52 passasse a ter a redacção seguinte:

52) Por conta da factura nº ...57 referida em 45), a NME executou os seguintes serviços que haviam sido acordados aquando do referido em 3) a 7): fornecimento e assentamento de rodapé MDF, encastrado na parede; fornecimento e assentamento de vãos em madeira, com bandeira e portas, incluindo ferragens, revestido com duas placas de HDF, topos com rebate e acabamento lacado; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho; fornecimento e assentamento de portadas alveolares com encabeços em HDF, acabamento com primário de madeira e esmalte sintético, incluindo fixações, ferragens e acessórios; execução de corrimão em madeira maciça de carvalho, fresado na face inferior para fixação a barra de aço inox,a chumbar previamente na parede, acabamento envernizado, incluindo fixações; execução de conjunto de caixas de correio constituídas por uma estrutura em perfis tubulares, placas de MDF revestidas a chapa de aço inox, acabamento escovado, portas em MDF folheado a madeira de Carvalho envernizado; fornecimento e aplicação de cunhais em MDF lisos, incluindo acabamento lacado branco; execução de revestimento em painéis de madeira com acabamento lacado a branco, incluindo reboco base, fixações, cortes e remates.

26. Em terceiro lugar, o Tribunal da Relação eliminou o facto dado como provado sob a alínea m):

 m) Que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44), a ré tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido, face ao orçamento de fls. 15 ss.

27. Finalmente, o Tribunal da Relação harmonizou a redacção do facto dado como não provado sob a alínea v) com os factos dados como provados sob os n.ºs 44 e 52, “a fim de evitar contradições”.


O DIREITO


28. O problema põe-se por causa da alteração da matéria de facto, nos seguintes termos:

29. I. — Na primeira sentença, o Ttribunal de 1.º instância:

a. — deu como provado, sob o n.º 44, o facto seguinte:

44) Por acordo com a autora, em alteração do que constava do orçamento que acompanhou o escrito referido em 3), a ré executou os seguintes trabalhos: colocação das forras das portas corta-fogo;execução da porta da entrada do edifício; fornecimento e colocação de corrimão em madeira de IPE; fornecimento e colocação de calhas que estavam excluídas no item 260 do orçamento, a fls. 17 dos autos; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho.

b. — deu como não provado, sob a alínea m), o facto seguinte:

m) Que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44), a ré tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido, face ao orçamento de fls. 15 ss.

30. II. — Confrontada com a primeira sentença, a Ré, agora Recorrida, não impugnou a decisão relativa ao facto dado como provado sob o n.º 44 e ao facto dado como não provado sob a alínea m) [1].

31. III. — O Tribunal da Relação anulou a primeira sentença proferida,“a fim de ser ampliada a matéria de facto aos trabalhos contratuais que a R. alegadamente executou e cujo pagamento reclama, levando aos temas da prova e incidindo sobre a mesma a respectiva instrução, e respeitando o disposto no nº. 3, c), do mesmo artigo”;

32. IV. — Na segunda sentença, o Tribunal de 1.º instância:

a. — deu de novo como provado, sob o n.º 44, o facto seguinte:

44) Por acordo com a autora, em alteração do que constava do orçamento que acompanhou o escrito referido em 3), a ré executou os seguintes trabalhos: colocação das forras das portas corta-fogo;execução da porta da entrada do edifício; fornecimento e colocação de corrimão em madeira de IPE; fornecimento e colocação de calhas que estavam excluídas no item 260 do orçamento, a fls. 17 dos autos; fornecimento e assentamento de armários das instalações sanitárias em contraplacado marítimo folheado a madeira de carvalho.

b. — deu de novo como não provado, sob a alínea m), o facto seguinte:

m) Que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44), a ré tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido, face ao orçamento de fls. 15 ss.;

34. V. — Confrontada com a segunda sentença, a Ré, agora Recorrida, impugnou o facto dado como provado sob o n.º 44, em ligação com o facto dado como não provado sob a alínea m).

35. Fê-lo, designadamente, nas conclusões 14.ª e 17.ª do recurso de apelação:

DÉCIMA QUARTA: Assim sendo, e quanto aos trabalhos extras e maiores valias de materiais aplicados, impunha-se que, para além dos materiais mencionados na alínea 16) dos factos provados e dos trabalhos elencados na alínea 44) dos Factos provados, tivesse o Tribunal dado como provado que a ré, a pedido e solicitação da autora, executou também os seguintes trabalhos e aplicou os seguintes materiais:

— forras de contraplacado marítimo folheado nas paredes das casas de banho;

— aumento do aro das portadas;

— fornecimento e colocação de peitoris em MDF;

— aro lateral da porta de correr;

— novas portadas, nomeadamente as referenciadas nos pontos 2 e 3 da fatura n.º ...57;

— novas guarnições interiores e portas/aros novas com guarnições interiores e exteriores; e

— fornecimento e colocação de peças de remate de portada à parede lateral em MDF e

— fornecimento e colocação de peças de remate de portada à janela lateral em MDF.

 DÉCIMA SÉTIMA Decorre assim da prova documental constante dos autos e da prova testemunhal acima transcrita que o Tribunal de 1ª Instância incorreu em erro de julgamento ao não ter dado como provado que a ré executou todos os trabalhos a mais que constam da fatura de n.º ...57, sendo que todos esses trabalhos foram adjudicados pela autora à ré à medida que a obra foi sendo realizada, a qual solicitou cotações e recebeu orçamentos, dando ordem de execução à ré.

DÉCIMA OITAVA: Vai, assim, pelos motivos invocados, impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto vertida nas alíneas 16) e 44) dos Factos Provados, devendo a redação daquelas alíneas ser alterada no sentido de ali ficar expressamente  a  constar,  para  além  dos já enumerados, os seguintes materiais aplicados em obra pela ré e os correspondentes trabalhos extras efetivamente realizados pela ré na obra do “Edifício ...”: forras de contraplacado marítimo folheado nas paredes das casas de banho; aumento do aro das portadas; fornecimento e colocação de peitoris em MDF; aro lateral da porta de correr; novas portadas, nomeadamente as referenciadas nos pontos 2 e 3 da fatura nº ...57; novas guarnições interiores e portas/aros novas com guarnições interiores e exteriores; e fornecimento e colocação de peças de remate de portada à parede lateral em MDF e fornecimento e colocação de peças de remate de portada à janela lateral em MDF.

DÉCIMA NONA: Concomitantemente, vai impugnada a decisão proferida sobre a matéria de facto vertida na alínea m) dos Factos Não Provados, a qual deverá ser excluída da matéria dos Factos Não Provados.

VIGÉSIMA: Em consequência, deverá a autora/reconvinda ser condenada a pagar à ré/reconvinte a quantia de 27.971,80€, acrescida de juros de mora, calculados à taxa comercial, desde a data do vencimento da fatura ...57 e até integral pagamento.

36. VI. — O Tribunal da Relação julgou procedente a impugnação da matéria de facto deduzida pela Ré, agora Recorrida, nas conclusões 14.ª a 17.ª do recurso de apelação:

I. — alterou a redacção do facto dado como provado sob o n.º 44,

II. — eliminou o facto dado como não provado sob a alínea m).

37. A Autora, agora Recorrente, alega em síntese que o acórdão recorrido incorreu em ofensa de caso julgado e que incorreu em ofensa de caso julgado ao alterar a redacção do ponto n.º 44 da matéria e ao eliminar o facto dado como não provado sob a alínea m).

38. O problema relacionar-se-á essencial, se não exclusivamente com a aplicação do art. 662.º do Código de Processo Civil, cujo teor é o seguinte:

1. - A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.

2. — A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:

a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;

b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;

c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;

d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.

3. — Nas situações previstas no número anterior, procede-se da seguinte forma:

a) Se for ordenada a renovação ou a produção de nova prova, observa-se, com as necessárias adaptações, o preceituado quanto à instrução, discussão e julgamento na 1.ª instância;

b) Se a decisão for anulada e for inviável obter a sua fundamentação pelo mesmo juiz, procede-se à repetição da prova na parte que esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições;

c) Se for determinada a ampliação da matéria de facto, a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições;

d) Se não for possível obter a fundamentação pelo mesmo juiz ou repetir a produção de prova, o juiz da causa limitar-se-á a justificar a razão da impossibilidade.

4. — Das decisões da Relação previstas nos n.os 1 e 2 não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

39. Interpretando o art. 662.º do Código de Processo, a doutrina e a jurisprudência chamam a atenção para que  “na apelação não podem ser conhecidos fundamentos de acção e de defesa já processualmente precludidos, em resultado do não exercício dos ónus de dedução da causa de pedir na petição inicial, de contestação, de concentração da defesa na contestação, de impugnação, de dedução de réplica à acção de simples apreciação negativa e de tomada de posição do autor quanto aos factos articulados pelo réu[2].

40. A Autora, agora Recorrente, ao alegar que o acórdão recorrido incorreu em ofensa de caso julgado, está em substância a alegar que o acórdão recorrido, ao conhecer da impugnação do facto dado como provado sob o n.º 44, em ligação com o facto dado como não provado sob a alínea m), conheceu de fundamentos da reconvenção já processualmente precludidos, em resultado do não exercício do ónus de impugnação pela Ré, agora Recorrida.

41. Entre todos os números do art. 662.º, é decisivo o n.º 3 e, entre todas as alíneas do n.º 3, é decisiva a alínea c):

c) Se for determinada a ampliação da matéria de facto, a repetição do julgamento não abrange a parte da decisão que não esteja viciada, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de facto, com o fim de evitar contradições.

42. Se se concluir que a matéria do ponto n.º 44 dos factos dados como provados e do ponto m) dos factos dados como não provados se encontra na parte da decisão da matéria de facto que o primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães deu como viciada, então a faculdade de a Ré impugnar a decisão proferida na segunda sentença não estará precludida.

43. A decisão proferida na primeira sentença terá sido anulada e a decisão proferida na segunda sentença terá sido uma decisão nova — logo, susceptível de uma nova impugnação.

44. Se, pelo contrário, se concluir que a matéria do ponto n.º 44 dos factos dados como provados e do ponto m) dos factos dados como não provados se encontra na parte da decisão da matéria de facto que o primeiro acórdão do Tribunal da Relação deu como não viciada, então a faculdade de a Ré impugnar a decisão proferida na segunda sentença estará precludida.

45. A decisão proferida na primeira sentença não terá sido, nessa parte, anulada e a decisão proferida na segunda sentença não terá sido, nessa parte, uma decisão nova.

46. O critério para a resolução do problema está — só pode estar — na interpretação do primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães.

47. O Supremo Tribunal de Justiça tem afirmado constantemente que, “[e]mbora, em regra, só o dispositivo da decisão constitua caso julgado, frequentemente há que relacioná-lo com os seus fundamentos, para se determinar o verdadeiro alcance da decisão” [3]:

“Para interpretarmos correctamente a parte decisória de uma sentença, temos de analisar os seus antecedentes lógicos que a tornam possível e a pressupõem, dada a sua íntima interdependência. A interpretação da sentença exige, assim, que se tome em consideração a fundamentação e a parte dispositiva, factores básicos da sua estrutura. No dizer incisivo de Carnelutti, a sentença não é ‘nem dispositivo, sem motivos, nem motivos sem dispositivo, mas a fusão deste com aqueles’” [4] [5].

48. Os critérios relevantes para a interpretação das decisões judiciais aproximam-se dos critérios relevantes para a interpretação dos actos jurídicos e, em especial, dos negócios jurídicos [6], ainda que deva atender-se a que “o declarante se situa ‘numa específica área técnico-jurídica’, investido na função de aplicador da lei, que […] está obrigado a interpretar, em conformidade com as regras estabelecidas no art. 9.º do Código Civil, dirigindo-se outros técnicos de direito” [7].

49. Interpretando o dispositivo do primeiro acórdão em ligação com os seus fundamentos, concluir-se-á que a matéria do ponto n.º 44 dos factos dados como provados e do ponto m) dos factos dados como não provados se encontra na parte da decisão da matéria de facto que o Tribunal da Relação de Guimarães deu como viciada.

50. Embora o primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães diga que a factualidade descrita no ponto n.º 44 dos factos dados como provados e no ponto m) dos factos dados como não provados se impõe [8], a fundamentação esclarece quatro coisas:

I. — que a factualidade descrita no ponto n.º 44 dos factos dados como provados e no ponto m) dos factos dados como não provados “[tem] de ser conjugada com a demais [i.e., com os demais factos dados como provados e como não provados] [9];

II. — que a factualidade descrita no ponto n.º 44 dos factos dados como provados e no ponto m) dos factos dados como não provados tem de ser conjugada com a matéria de facto que devia ter sido levada aos temas de prova e não foi;

III. — que, entre a matéria de facto que devia ter sido levada aos temas de prova e não foi está toda a matéria de facto relevante para o julgamento da reconvenção;

IV. — e que. entre a matéria de facto relevante para o julgamento da reconvenção, está a falta de pagamento de trabalhos contratuais, a falta de pagamento de trabalhos a mais realizados, a falta de pagamento dos materiais aplicados na obra e a falta de pagamento de trabalhos reportados nas faturas relativas a outras obras [10]

51. Em consequência, a ampliação da matéria de facto é necessária para discriminar:

I. — quais os trabalhos contratualizados (i.e, previstos no contrato inicial) que foram executados pela Ré, agora Recorrida, na Obra da Avenida ...;

II. — quais os trabalhos a mais que foram executados pela Ré, agora Recorrida, na Obra da Avenida ...;

III. — qual o valor dos materiais que foram aplicados pela Ré, agora Recorrida, nos trabalhos a mais por si realizados na Obra da Avenida ...;

IV.— qual o valor dos trabalhos a mais que foram executados pela Ré na Obra da Avenida ...;

V. — qual o valor dos trabalhos realizados nas demais obras em que a Autora, agora Recorrente, se relacionou com a Ré, agora Recorrida.

52. Ora, se a ampliação da matéria de facto determinada pelo primeiro acórdão é necessária para discriminar “quais os trabalhos contratualizados (i.e, previstos no contrato inicial) que foram executados pela Ré, agora Recorrida, na Obra da Avenida ...” e “quais os trabalhos a mais que foram executados pela Ré, agora Recorrida, na Obra da Avenida ...”, o ponto n.º 44 dos factos dados como provados — relativos aos trabalhos executados — e o ponto m) dos factos dados como não provados — relativos aos trabalhos a mais — encontram-se na parte da decisão da matéria de facto que o primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães deu como viciada; se a ampliação da matéria de facto determinada pelo primeiro acórdão é necessária para determinar qual o valor dos materiais que foram aplicados pela Ré, agora Recorrida, nos trabalhos a mais por si realizados na Obra da Avenida ..., o ponto m) dos factos dados como não provados — relativos aos materiais a mais — encontra-se na parte da decisão da matéria de facto que o primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães deu como viciada.

53. A interpretação preconizada nos parágrafos precedentes:

I. — está implícita na segunda sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância,

II. — está explícita no segundo acórdão proferido pelo Tribunal da Relação.

54. Está, em primeiro lugar, implícita na segunda sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, porque houve repetição de julgamento na parte relativa ao ponto n.º 44 dos factos dados como provados e ao ponto m) dos factos dados como não provados.

55. Está, em segundo lugar, explícita no segundo acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, em que se diz:

“o acórdão determinou a anulação da sentença, mas com um determinado objetivo -a averiguação dos trabalhos contratuais executados e cujo pagamento vem reclamado; a restante matéria ficou estabilizada -ou seja, não podia ser discutida em sede de instrução em 1ª instância.

Proferida nova sentença, há novo recurso e neste a parte não fica vinculada ao alegado no anterior (que ‘valia’ apenas para sua apreciação), não se verifica qualquer efeito de ‘caso julgado’ uma vez que a sentença anterior, repete-se, foi anulada e o que temos é uma nova sentença, é sobre esta que incide o recurso. A limitação que se tem de verificar é a nível de instrução e meios de prova, ou seja, a recorrente não pode basear a sua impugnação em prova produzida após a anulação porque esta não incide sobre a matéria estabilizada”.

56. Em resposta à questão suscitada pela Autora, agora Recorrente, dir-se-á então que o acórdão recorrido não incorreu em ofensa de caso julgado ao alterar a redacção do ponto n.º 44 da matéria e ao eliminar o facto dado como não provado sob a alínea m).


III. — DECISÃO

Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se o acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente Cari – Construtores, S.A.


Lisboa, 6 de Julho de 2023


Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator)

José Maria Ferreira Lopes

Manuel Pires Capelo

______

[1] Como reconhece o acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 17 de Fevereiro de 2022 — em cuja fundamentação se diz que “… se é verdade que a fatura nº ...57 não se esgota na referência aos trabalhos mencionados no ponto 44 –cfr. ponto 45 dos factos provados-, também é certo que resulta do ponto 46 que a A. não aceitou a fatura invocando erros de medição, vícios nos valores cobrados, erros nos trabalhos e duplicação de trabalhos, e não se provou que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44, a R. tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido face ao orçamento de fls 15 e segs. –alínea m) dos factos não provados. Esta factualidade não foi impugnada pela recorrente e impõe-se, tendo de ser conjugada com a demais”.

[2] Rui Pinto, anotação ao art. 662.º, in: Código de Processo Civil anotado, vol. II — Artigos 546.º-1085.º, Livraria Almedina, Coimbra, 2018, págs. 321-344 (329).

[3] Cf. acórdão do STJ de 11 de Março de 1949 — in: Boletim do Ministério da Justiça n.º 12 (Maio de 1949).

[4] Expressão do acórdão do STJ de 28 de Janeiro de 1997 — in: Colectânea de jurisprudênciaAcórdãos do Supremo Ttibunal de Justiça, ano V — 1997, tomo I, pág. 83.

[5] Em termos em tudo semelhantes, vide, p. ex., acórdãos do STJ de 16 de Abril de 2002 — processo n.º 02B3349 —, de 17 de Fevereiro de 2003 — processo n.º 03B1993 —, de 5 de Março de 2009 — processo n.º 331/09 —, de 5 de Novembro de 2009 — processo n.º 4800/05.TBAMD-A.S1 —, de 3 de Fevereiro de 2011 — processo n.º 190-A/1999.E1.S1 — , de 26 de Abril de 2012 — processo n.º 289/10.7TBPTB.G1.S1 —, de 12 de Junho de 2012 — processo n.º 521-A/1999.L1.S1 — , de 13 de Fevereiro de 2014 — processo n.º 2081/09.2TBPDL.L1.S1 —, de 12 de Março de 2014 — processo n.º 177/03.3TTFAR.E1.S1 —, de 17 de Novembro de 2015 — processo n.º 34/12.2TBLMG.C1.S1 — , de 20 de Dezembro de 2017 — processo n.º 144/11.3TYLSB.L2.S2 — , de 4 de Outubro de 2018 — processo n.º 10758/01.4TVLSB-A.L1.S1 — ou de 23 de Janeiro de 2019 — processo n.º 4568/13.3TTLSB.L2.S1.
[6] Cf. designadamente os acórdãos do STJ de 16 de Abril de 2002 — processo n.º 02B3349 —, de 17 de Fevereiro de 2003 — processo n.º 03B1993 —, de 5 de Novembro de 2009 — processo n.º 4800/05.TBAMD-A.S1 —, de 3 de Fevereiro de 2011 — processo n.º 190-A/1999.E1.S1 — , de 12 de Junho de 2012 — processo n.º 521-A/1999.L1.S1 — , de 13 de Fevereiro de 2014 — processo n.º 2081/09.2TBPDL.L1.S1 —, de 12 de Março de 2014 — processo n.º 177/03.3TTFAR.E1.S1 —,  de 24 de Novembro de 2015 — processo n.º 7368/10.9TBVNG-C.P2.S1 —, de 29 de Setembro de 2016 — processo n.º 17/13.5TBLSA.C1.S1 —, de 20 de Dezembro de 2017 — processo n.º 144/11.3TYLSB.L2.S2 — , de 4 de Outubro de 2018 — processo n.º 10758/01.4TVLSB-A.L1.S1 — ou de 5 de Janeiro de 2019 — processo n.º 27881/15.0T8LSB-A.L1.A.S1.
[7] Expressão do acórdão do STJ de 3 de Fevereiro de 2011 — processo n.º 190-A/1999.E1.S1 —, retomada, p. ex., no acórdão do STJ de 12 de Junho de 2012 — processo n.º 521-A/1999.L1.S1 —, de 13 de Fevereiro de 2014 — processo n.º 2081/09.2TBPDL.L1.S1 — ou de 12 de Março de 2014 — processo n.º 177/03.3TTFAR.E1.S1.
[8] O primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães começa por dizer “que se é verdade que a fatura nº 2257 não se esgota na referência aos trabalhos mencionados no ponto 44 –cfr. ponto 45 dos factos provados-, também é certo que resulta do ponto 46 que a A. não aceitou a fatura invocando erros de medição, vícios nos valores cobrados, erros nos trabalhos e duplicação de trabalhos, e não se provou que, a mais dos materiais e trabalhos referidos em 44, a R. tenha fornecido e executado outros, com custo acrescido face ao orçamento de fls 15 e segs. –alínea m) dos factos não provados. Esta factualidade não foi impugnada pela recorrente e impõe-se […]”.
[9] O primeiro acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães continua dizendo que a factualidade não impugnada “[tem] de ser conjugada com a demais”.
[10] Entre as afirmações do primeiro acórdão estão a de que, “admitida a reconvenção, a sua causa de pedir consiste na falta de pagamento de trabalhos contratuais, trabalhos e a mais realizados, e materiais aplicados na obra aqui discutida, além de trabalhos reportados nas faturas relativas a outras obras” e a de que “[os] factos relativos á causa de pedir da reconvenção (que podiam ser concretizados), não foram levados aos temas de prova”: “Dos temas da prova não consta qualquer menção que se reporte ao pedido reconvencional”.