Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
11785/19.0T8SNT.P1.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: NELSON BORGES CARNEIRO
Descritores: DESTITUIÇÃO DE GERENTE
FACTO LÍCITO
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
CESSAÇÃO AD NUTUM
JUSTA CAUSA
INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO
RESPONSABILIDADE DO GERENTE
INTERPRETAÇÃO DA LEI
ANALOGIA
INTEGRAÇÃO DAS LACUNAS DA LEI
INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA
Data do Acordão: 11/16/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I – A deliberação de destituição de gerente, quer com justa causa, quer sem qualquer fundamento (ad nutum), é sempre lícita.

II – Não obstante, a inexistência de justa causa fundamentadora de destituição é geradora de responsabilidade civil da sociedade por facto lícito, cabendo ao destituído o direito de indemnização pelos danos que tiver sofrido com a respetiva deliberação.

III – Prescreve no prazo de vinte anos a ação de indemnização intentada por gerente contra os sócios da sociedade por destituição sem justa causa.

IV – A interrupção é determinada por atos que tanto podem resultar de uma iniciativa do titular do direito (credor), como do beneficiário da prescrição (devedor).

V – O recurso à analogia pressupõe a existência de uma lacuna da lei, isto é, que uma determinada situação não esteja compreendida nem na letra nem no espírito da lei.

VI – Interpretação extensiva significa que a formulação adotada pela letra do texto legal diz menos do que aquilo que se pretendia dizer, habilitando o intérprete, com recurso a elementos racionais, a alargar ou a estender o texto, dando-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo.

Decisão Texto Integral:

RECURSO DE REVISTA1,,2,3,4,5 : 11785/19.0T8SNT.P1.S1

RECORRENTE6: AA

RECORRIDOS7:

BB;

CC;

DD.



***


SUMÁRIO8,9


I – A deliberação de destituição de gerente, quer com justa causa, quer sem qualquer fundamento (ad nutum), é sempre lícita.

II – Não obstante, a inexistência de justa causa fundamentadora de destituição é geradora de responsabilidade civil da sociedade por facto lícito, cabendo ao destituído o direito de indemnização pelos danos que tiver sofrido com a respetiva deliberação.

III – Prescreve no prazo de vinte anos a ação de indemnização intentada por gerente contra os sócios da sociedade por destituição sem justa causa.

IV – A interrupção é determinada por atos que tanto podem resultar de uma iniciativa do titular do direito (credor), como do beneficiário da prescrição (devedor).

V – O recurso à analogia pressupõe a existência de uma lacuna da lei, isto é, que uma determinada situação não esteja compreendida nem na letra nem no espírito da lei.

VI – Interpretação extensiva significa que a formulação adotada pela letra do texto legal diz menos do que aquilo que se pretendia dizer, habilitando o intérprete, com recurso a elementos racionais, a alargar ou a estender o texto, dando-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo.



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ACÓRDÃO10



Acordam os juízes da 1ª secção (cível) do Supremo Tribunal de Justiça:

1. RELATÓRIO

AA, intentou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra EE e BB pedindo a condenação destes a pagarem a quantia de 179 787,12€, a título de danos patrimoniais provenientes das retribuições que iria receber em 4 anos de trabalho efetivo; 2 524,77€, a título de retribuição, respeitante a março de 2003 e, 75 000,00€ a título de danos não patrimoniais, tudo acrescido de juros de mora.

Foi proferida sentença em 1ª instância que julgou procedente a exceção perentória de prescrição e, consequentemente, absolveu os réus do pedido contra os mesmos formulado pelo autor.

Inconformado, o autor interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação do Porto proferido acórdão que julgou procedente o recurso, revogando a decisão recorrida, que substituiu por outra a julgar improcedente a exceção perentória de prescrição invocada pelos réus.

Inconformado, veio o réu, BB, interpor recurso de revista deste acórdão, tendo extraído das alegações11,12 que apresentou as seguintes


CONCLUSÕES13:


1ª – Conforme o disposto no Artº 257 do C.S.C., os sócios podem sempre deliberar a destituição do gerente, atendendo a que a relação existente entre Sociedade e o gerente é de mera administração, o que justifica a sua imediata conveniência.

2ª – A exceção constante no nº 5 do mesmo artigo, não põe em causa esta regra, pois justifica-se por razão diversa – garantir o direito de defesa do sócio-gerente.

Todavia,

3ª – A licitude ou ilicitude da destituição de um gerente, sem justa causa, decorre apenas de tal ato lhe não ter ou ter causado dano – ter sido ou não acompanhada do pagamento da respetiva indemnização.

4ª – Se esta indemnização não for paga, estaremos em presença de um ato ilícito, e como tal sujeita ao foro da responsabilidade civil extracontratual prevista no Artº 498 do C.C., como, de resto, tem sido jurisprudência generalizada.

Além disto,

5ª – No douto Acórdão recorrido não se encontra sequer definido qual o negócio estabelecido entre o A. e a Sociedade (ou os seus sócios), apenas ali sendo dadas vagas opiniões sem qualquer base factual.

Sem prescindir,

6ª – Se não fosse aplicável ao caso o prazo de 3 anos previsto no nº 1 do Artº 498 do C.C., sempre se aplicaria neste caso o prazo da prescrição de 5 anos, que também já decorrera, previsto no Artº 174 do C.S.C., por analogia e maioria de razão, pois cabendo, por lei (nº 2 do artº 197, alínea d) do nº 1 do Artº 246 e Artº 257 do C.S.C.) a responsabilidade da destituição à Sociedade, a sua exigibilidade aos sócios justificaria um prazo igual, senão mais curto, atendendo a que estes não têm sequer contabilidade, havendo especial conveniência na obtenção da Paz e da segurança jurídica.

7ª – A alusão pelo R., aqui recorrente, ao Artº 257, nº 7 do C.S.C. é correta quando – por mero dever de patrocínio -, coloca a hipótese de que se o A. tivesse sido destituído e sem justa causa, não tinha direito a indemnização.

8ª – Entre as datas da nomeação de gerente e da sua destituição, provadas nos autos (respetivamente 15.5.99 e 13.5.2003) teria decorrido 4 anos (menos 2 dias) o que de acordo com aquela disposição, praticamente não lhe daria direito a receber o que quer que fosse.

9ª – O douto Acórdão recorrido, violou, além de outros, por erro de interpretação e de aplicação, o disposto no artº 257 do Código das Sociedades Comerciais, e nos artºs 498 e 309 do Cód. Civil e o Artº 174 do C.S.C..

Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exªs doutamente suprirão, deve a presente Revista ser concedida, revogando-se o Acórdão recorrido, e julgando-se prescrito o direito que o A. pretende exercer nesta ação, sendo o R., aqui recorrente, absolvido do pedido contra si formulado.

O recorrido/autor não contra-alegou.

Colhidos os vistos14, cumpre decidir.

OBJETO DO RECURSO15,16

Emerge das conclusões de recurso apresentadas por BB, ora recorrente, que o seu objeto está circunscrito às seguintes questões:

1.) Saber qual é o prazo prescricional em ação intentada por gerente contra os sócios de uma sociedade comercial por destituição sem justa causa.

2.) Saber se em ação intentada por gerente contra os sócios da sociedade comercial por destituição sem justa causa, será de aplicar por analogia, o prazo de prescrição de cinco anos, previsto no art. 174º, do CSComerciais.

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. FACTOS

1 – A presente ação foi intentada em 15/07/2019.

2 – O A. peticionou apoio judiciário no ano de 2013 e este foi deferido em 04/02/2013, também na modalidade de nomeação de Patrono, tendo em vista a propositura desta ação.

3 – O Patrono subscritor da petição inicial foi nomeado em 07/09/2016.

4 – O A. fundamenta o pedido de indemnização formulado no art. 483º do C. Civil, a que expressamente se reporta no art. 58º do seu articulado inicial.

2.2. O DIREITO

Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso17 (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).

1.) SABER QUAL É O PRAZO PRESCRICIONAL EM AÇÃO INTENTADA POR GERENTE CONTRA OS SÓCIOS DE UMA SOCIEDADE COMERCIAL POR DESTITUIÇÃO SEM JUSTA CAUSA.

O recorrente alegou que “numa Sociedade com mais de 2 sócios, a destituição de um gerente sem a invocação de justa causa é, à partida, um ato lícito, mas não deixa de ser ilícito quando a destituição causar dano, ou seja, não se fizer acompanhar do pagamento da respetiva indemnização”.

Mais alegou que “Da mesma forma, numa Sociedade com 2 sócios e um gerente não sócio (não necessariamente a dos autos, por os correspondentes factos invocados não terem sido aceites), podendo licitamente destituir-se o gerente, sem justa causa, tal prática ter-se-á que se considerar ilícita, caso lhe não seja paga a respetiva indemnização. A ilicitude existe em ambas as situações, não se podendo aceitar que, nestas condições, se tenha praticado qualquer ato lícito”.

Assim, concluiu que “O douto Acórdão recorrido violou a lei, ao erradamente não aplicar ao caso o disposto no Artº 498 do C.C.”.

O tribunal a quo entendeu que “Não havendo um prazo específico de prescrição para o pedido desta indemnização em concreto, deve então recorrer-se àquele artigo 309.º, do C. C., não existindo óbice a que o autor possa exercer o direito durante vinte anos”.

Vejamos a questão.

O prazo da prescrição começa a correr quando o direito puder ser exercido; se, porém, o beneficiário da prescrição só estiver obrigado a cumprir decorrido certo tempo sobre a interpelação, só findo esse tempo se inicia o prazo da prescrição – art. 306º/1, do CCivil.

O prazo ordinário da prescrição é de vinte anos – art. 309º, do CCivil.

A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente – art. 323º/1, do CCivil.

A interrupção inutiliza para a prescrição todo o tempo decorrido anteriormente, começando a correr novo prazo a partir do ato interruptivo, sem prejuízo do disposto nos n.ºs 1 e 3 do artigo seguinte – art. 326º/1, do CCivil.

Se o contrato social não dispuser diversamente, compete aos sócios deliberar sobre a designação de gerentes – art. 246º/2/a, do CSComercial.

Às assembleias gerais das sociedades por quotas aplica-se o disposto sobre assembleias gerais das sociedades anónimas, em tudo o que não estiver especificamente regulado para aquelas – art. 248º/1, do CSComercial.

A convocação das assembleias gerais compete a qualquer dos gerentes e deve ser feita por meio de carta registada, expedida com a antecedência mínima de quinze dias, a não ser que a lei ou o contrato de sociedade exijam outras formalidades ou estabeleçam prazo mais longo – art. 246º/3, do CSComercial.

Os sócios podem deliberar a todo o tempo a destituição de gerentes – art. 257º/1, do CSComercial.

Não havendo indemnização contratual estipulada, o gerente destituído sem justa causa tem direito a ser indemnizado dos prejuízos sofridos, entendendo-se, porém, que ele não se manteria no cargo ainda por mais de quatro anos ou do tempo que faltar para perfazer o prazo por que fora designado – art. 257º/7, do CSComercial.

A ação considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono – art. 33º/4, da Lei do Apoio Judiciário, aprovado pela Lei n.º 34/2004, de 29-07.

Os sócios deliberam normalmente em assembleia geral reunida mediante convocatória efetuada de acordo com os preceitos legais18.

Ora, decorre do art. 257º/1, do CSComerciais, que a destituição é, em regra, consequência de deliberação dos sócios19,20.

Porém, a deliberação dos sócios não é a única via para destituir gerentes. Havendo justa causa, é possível a destituição judicial: via facultativa nalguns casos (art. 257º/4), via obrigatória em outros (art. 257º/3/5)21.

A destituição de gerente, que significa a cessação da relação de “gerência”, por regra, pode ser livremente tomada por decisão unilateral da sociedade, independentemente da existência de justa causa.

A razão deste amplo poder, reside no facto de a destituição satisfazer o interesse da sociedade, permitindo que esta seja gerida por quem mereça confiança aos sócios detentores da maioria dos votos, o que implica o completo sacrifício dos interesses pessoais do gerente, que deles abdica22.

A deliberação de destituição de gerente, quer com justa causa, quer sem qualquer fundamento (ad nutum), é sempre lícita.

É entendimento generalizado, ainda que não fundada em justa causa, a destituição é facto lícito: a lei não a proíbe, pelo contrário, a lei atribui às sociedades o direito (potestativo) de destituir, com ou sem justa causa, gerentes23,24,25,26,27.

Não obstante a inexistência de justa causa fundamentadora de destituição, será, no entanto, geradora de responsabilidade civil da sociedade por facto lícito, cabendo ao destituído o direito de indemnização pelos danos que tiver sofrido com a respetiva deliberação.

Assim, sendo sempre lícita, a deliberação de destituição de gerente, com ou sem justa causa, não se poderá aplicar o prazo de prescrição de três anos, previsto no art. 498º/1, do CCivil, o qual se encontra previsto para a responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos.

Ora, não será pelo facto de ser eventualmente paga qualquer indemnização pela destituição sem justa causa do gerente, que a mesma passará a ser considerada ilícita28.

Isto porque, o ato pode ser lícito e obrigar, todavia, o agente a reparar o prejuízo que a sua prática porventura cause a terceiro. Não há contradição entre as duas ideias. O ato (lesivo) pode ser lícito, porque visa satisfazer um interesse coletivo ou o interesse qualificado de uma pessoa de direito privado. Mas pode, ao mesmo tempo, não ser justo que ao interesse coletivo, ou ao interesse qualificado da pessoa coletiva ou singular, se sacrifique, sem nenhuma compensação, os direitos de um ou mais particulares, ou os bens de uma outra pessoa, que sejam atingidos pela prática do ato29,30,31.

Assim sendo, não será pela reparação do prejuízo pela prática de um ato lícito, que este o deixará de o ser, isto é, que tal ato passará a ser ilícito.

A reparação destina-se assim, à compensação que possa ser devida às pessoas atingidas pela prática do ato, não deixando, por tal facto, de continuar a ser um ato lícito.

Concluindo, tendo sido praticado um ato lícito (deliberação de destituição de gerente em assembleia geral da sociedade), o mesmo não está sujeito ao prazo de prescrição de três anos, previsto no art. 498º/1, do CCivil, prazo esse previsto para a prescrição do direito de indemnização decorrente de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito.

Assim, sendo um caso de responsabilidade civil contratual32 decorrente da prática de ato lícito, não poderá ser aplicado o prazo previsto para situações de responsabilidade civil extracontratual pela prática de atos lícitos/ilícitos, isto é, o prazo previsto no art. 498º/1, do CCivil33.

Temos, pois, que na ausência de regra especial, aplicar-se-á o prazo ordinário da prescrição de vinte anos previsto no art. 309º, do CCivil, isto é, o prazo aplicável à generalidade dos direitos prescritíveis34.

E, encontra-se prescrito tal direito de indemnização pela destituição do cargo de gerente, por terem decorrido mais de vinte anos desde a data em que o direito podia ter sido exercido?

Estão sujeitos à prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição – art. 298.º/1, do CCivil.

A prescrição é uma forma de extinção que o decurso do tempo provoca sobre direitos subjetivos, tornando-os inexigíveis, ou seja, é um mecanismo legal que impede o normal exercício de direito, transformando obrigações jurídicas em meras obrigações naturais.

Ela representa o sacrifício do valor da justiça em favor da prevalência do valor da certeza ou segurança, na medida em que impede o credor de exigir o cumprimento do seu direito, para além de um certo período de tempo.

Por outro lado, o único pressuposto da prescrição reside na falta do exercício do direito, em consequência da inércia do seu titular35.

A prescrição interrompe-se pela citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima, direta ou indiretamente, a intenção de exercer o direito, seja qual for o processo a que o ato pertence e ainda que o tribunal seja incompetente – art. 323.º/1, do CCivil.

A interrupção é determinada por atos que tanto podem resultar de uma iniciativa do titular do direito (credor), como do beneficiário da prescrição (devedor)36.

Consagra-se a modalidade de interrupção promovida pelo titular do direito (denominada a parte creditoris ou da parte do credor). Esta terá lugar sempre que se dê conhecimento ao devedor, através de citação, notificação judicial ou de outro meio judicial, da intenção, de exercício de direito pelo credor37.

A referência à intenção, direta ou indireta, traduz a regra de que bastará uma diligência judicial que seja incompatível com o desinteresse pelo direito de cuja prescrição se trate. Este vetor é complementado com a ideia de que não releva o processo onde o problema se ponha. A própria incompetência do tribunal não prejudica38.

O facto interruptivo provém de ato do credor, por meio de citação ou notificação judicial de qualquer ato que exprima intenção de exercício do direito, ainda que praticado por um representante, legal ou voluntário39,40.

Se a citação ou notificação se não fizer dentro de cinco dias depois de ter sido requerida, por causa não imputável ao requerente, tem-se a prescrição por interrompida logo que decorram os cinco dias – art. 323.º/2, do CCivil.

A ação considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono – art. 33º/4, da Lei do Apoio Judiciário, aprovado pela Lei n.º 34/2004, de 29-07.

Para acautelar os direitos do credor no caso de atrasos na citação ou notificação quando estes atrasos não lhe são imputáveis, o legislador ficcionou a efetivação do ato de citação ou notificação no prazo máximo de cinco dias após a propositura da ação.

A ficção legal prevista no art. 323º/2, do CCivil, pressupõe a verificação de três requisitos: (i) que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; (ii) que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias; (iii) que o retardamento na efetivação desse ato não seja imputável ao autor/exequente41.

Este último requisito deve ser interpretado em termos de causalidade objetiva, ou seja, a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei, em qualquer termo processual, até à verificação da citação.

Nesta situação, a interrupção opera logo que decorram esses cinco dias. Relevante é, pois, a ausência de culpa por parte do autor ou requerente42,43,44,45,46.

Conforme entendimento do tribunal a quo, que subscrevemos, “a citação dos Réus nos autos ocorreu em 11/11/2019 (BB) e, pelo menos, em

10/12/2019 (EE), conforme atos do processo de 15/11 e 10/12, de 2019. Ora, alegando o Autor que foi destituído de gerente em 13/05/2003, alguns dias depois (com o recebimento da carta em questão) terá ficado a conhecer que tinha sido destituído sem indicação de justa causa, estando apto a poder exercer o seu direito de indemnização; significa então que, por volta de 13/05/2023, prescreveria o seu direito, data que não foi atingida ainda hoje, pelo que não é necessário fixar com rigor a data de prescrição”.

No caso dos autos, como a data de prescrição do direito de indemnização pela destituição do cargo de gerente ocorreria em 13-05-2023, e a ação intentada em tribunal em 04/02/2013, o que significa que a prescrição se tem por interrompida cinco dias após (09/02/2013).

É que, a lei substantiva estabelece a regra de que para efeitos de interrupção da prescrição, se deve considerar como efetuada a citação decorridos cinco dias após a instauração da ação, salvo se a omissão for imputável ao autor47.

Assim sendo, entende-se que a prescrição foi interrompida no prazo de cinco dias depois de ter sido apresentado o pedido de nomeação de patrono (art. 33º/4, da Lei do Apoio Judiciário).

Temos, pois, que na data em que se interrompeu a prescrição, ainda não tinha decorrido o prazo de prescrição de vinte anos do direito de indemnização pela destituição do cargo de gerente, que prescreveria em 13-05-2023.

Conforme entendimento do tribunal a quo, que subscrevemos, “há muito, que a prescrição em causa estava interrompida – pelo menos em 09/02/2013 (decisão de nomeação de patrono data de 04/02/2013). Conclui-se assim que o direito do Autor não está prescrito, devendo os autos prosseguirem os seus termos por toda a factualidade que importa analisar estar impugnada, desde logo a que é o pilar do pedido: se o Autor foi ou não nomeado gerente da sociedade e, se o foi, se produziu efeitos, além de poder estar em causa a qualidade de sócia da Ré, entretanto falecida”.

Concluindo, por não terem decorrido mais de vinte anos desde 13-05-2003 (data de destituição de gerente) até cinco dias após a entrada em juízo da ação, isto é, em 09/02/2013 (data em que se tem por interrompida a prescrição), não se tem por prescrito o direito de indemnização pela destituição do cargo de gerente.

Destarte, improcedem, nesta parte, as conclusões 1ª) a 5ª), do recurso de revista.

2.) SABER SE EM AÇÃO INTENTADA POR GERENTE CONTRA OS SÓCIOS DA SOCIEDADE COMERCIAL POR DESTITUIÇÃO SEM JUSTA CAUSA, SERÁ DE APLICAR POR ANALOGIA, O PRAZO DE PRESCRIÇÃO DE CINCO ANOS, PREVISTO NO ART. 174º, DO CSCOMERCIAIS.

O recorrente alegou que “a ser aplicável, tratando-se de Sociedade, ao caso, o prazo de prescrição previsto no Artº 174 C.S.C., por analogia e maioria de razão, dever-se-ia aplicar também aos seus sócios”.

Mais alegou que “Se não fosse aplicável ao caso o prazo de 3 anos previsto no nº 1 do Artº 498 do C.C., sempre se aplicaria neste caso o prazo da prescrição de 5 anos, que também já decorrera, previsto no artº 174 do C.S.C., por analogia e maioria de razão, pois cabendo, por lei (nº 2 do artº 197, alínea d) do nº 1 do Artº 246 e Artº 257 do C.S.C.) a responsabilidade da destituição à Sociedade, a sua exigibilidade aos sócios justificaria um prazo igual, senão mais curto, atendendo a que estes não têm sequer contabilidade, havendo especial conveniência na obtenção da Paz e da segurança jurídica”.

Assim, concluiu que “sempre se justificaria para os sócios um prazo igual, senão mesmo mais curto que as Sociedades”.

O tribunal a quo entendeu que “Os prazos mais curtos de prescrição estipulados no artigo 174.º, n.º 1 (e mesmo os do n.º 3, quando está em causa a extinção da sociedade), visam que a sociedade, mesmo extinta, encontre uma estabilidade quanto às suas dívidas que não se prolongue por tanto tempo. No caso, quem alegadamente é devedor (por serem réus) são os também alegados sócios da sociedade, pelo que esta pode desenvolver a sua atividade, sem ocorrer perturbação por causa do pedido de pagamento deste crédito. Temos assim que o Autor tinha vinte anos para poder deduzir a sua pretensão”.

Vejamos a questão.

Os direitos da sociedade contra os fundadores, os sócios, os gerentes, administradores e diretores, os membros do conselho fiscal e do conselho geral, os revisores oficiais de contas e os liquidatários, bem como os direitos destes contra a sociedade, prescrevem no prazo de cinco anos – art. 174º/1, do CSComercial.

Prescrevem no prazo de cinco anos, a partir do momento referido no n.º 1, alínea b), os direitos dos sócios e de terceiros, por responsabilidade para com eles de fundadores, gerentes, administradores, membros do conselho fiscal ou do conselho geral, liquidatários, revisores oficiais de contas, bem como de sócios, nos casos previstos nos artigos 82.º e 83.º – art. 174º/2, do CSComercial.

Prescrevem no prazo de cinco anos, a contar do registo da extinção da sociedade, os direitos de crédito de terceiros contra a sociedade, exercíveis contra os antigos sócios e os exigíveis por estes contra terceiros, nos termos dos artigos 163.º e 164.º, se, por força de outros preceitos, não prescreverem antes do fim daquele prazo – art. 174º/3, do CSComercial.

Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma aplicável aos casos análogos – art. 10º, do CCivil.

As normas excecionais não comportam aplicação analógica, mas admitem interpretação extensiva – art. 11º, do CCivil.

O art. 174º, do CSComerciais, fixa uma prescrição objetiva de tipo quinquenal. Domina uma preocupação de segurança jurídica48.

É facilmente compreensível a definição de prazos curtos de prescrição para estes casos: mesmo quando o direito da sociedade extinta estivesse sujeito a um prazo mais longo de prescrição – nomeadamente, de 20 anos, como é a regra (art. 309.º, do CCivil), pretende-se que se estabilize num tempo razoável a situação de eventuais devedores de sociedades extintas, tal como sucede com os ex-sócios, relativamente a créditos de terceiros49.

A responsabilidade dos gerentes ou administradores no plano societário contempla: (i) responsabilidade para com a sociedade (artigo 72º); (ii) responsabilidade para com os credores sociais (artigo 78º); (iii) responsabilidade para com os sócios e terceiros (artigo 79º). E verifica-se desde que estejam presentes os pressupostos da responsabilidade – facto ilícito, culpabilidade, prejuízos, nexo de causalidade50.

Estabeleceu o legislador um período razoável para o exercício dos direitos correspondentes à violação dos deveres impostos – contratuais ou legais – aos gerentes e administradores durante o qual seria legítimo presumir que o titular do direito o exercesse, se nisso estivesse interessado51.

O art. 174.º, do CSComerciais, fixa, concretamente, em cinco anos o prazo de prescrição relativamente ao exercício de direitos da sociedade (n.º 1), dos sócios e de terceiros (n.º 2) por responsabilidade dos gerentes e administradores, tendo, assim, o legislador optado por um prazo substancialmente mais reduzido do que o prazo ordinário de vinte anos estabelecido no art. 309.º do CC, por ter considerado nefasta a indefinição de direitos por período tão dilatado52,53.

O art. 174º, do CSComerciais, constituiu um regime próprio da prescrição que derroga as normas civis relativas a tal instituto, alargando o prazo de prescrição no exercício de direitos sociais para, pelo menos, cinco anos.

No caso, o recorrido/autor propôs a ação contra pessoas singulares (sócios da sociedade) e não contra a pessoa coletiva (sociedade), o que afasta desde logo a aplicação do art. 174º/1, do CSComerciais (ações de responsabilidade civil instauradas pelos sócios ou terceiros contra sócios fundadores, gerentes, administradores, membros do conselho fiscal ou do conselho geral, liquidatários, revisores oficiais de contas, ou, sócios decorrente de condutas ativas ou omissivas destes, no exercício das suas funções societárias).

E, poder-se-á aplicar por analogia, o prazo de prescrição de cinco anos, previsto no art. 174º/1, do CSComerciais, que comtempla os direitos da sociedade e direitos contra a sociedade, para as ações de indemnização intentadas por gerente contra os sócios da sociedade pela sua destituição sem justa?

O recurso à analogia pressupõe a existência de uma lacuna da lei, isto é, que uma determinada situação não esteja compreendida nem na letra nem no espírito da lei. Esgotou-se todo o processo interpretativo dos textos sem se ter encontrado nenhum que contemplasse o caso cuja regulamentação se pretende, ao passo que na interpretação extensiva, encontra-se um texto, embora, para tanto, haja necessidade de estender as palavras da lei, reconhecendo que elas atraiçoaram o pensamento do legislador que, ao formular a norma, disse menos do efetivamente pretendia dizer, mas o caso está comtemplado. Não há omissão54.

A analogia é, pois, uma aplicação correspondente dum princípio ou dum complexo de princípios a casos juridicamente semelhantes. Base de analogia pode ser: ou uma só disposição (analogia legis) ou um complexo de princípios jurídicos, a síntese deles, e mesmo espírito de todos eles (analogia iuris)55.

A analogia consiste na aplicação de uma regulamentação jurídica prevista para um facto a outro, não regulado, mas juridicamente semelhante, intervindo o julgador no sentido de regular uma situação nos termos em que o legislador o teria feito se a tivesse previsto.

Assenta na ideia de que factos de igual natureza devem ter igual tratamento jurídico.

Ora, no caso, não será possível o recurso à analogia, pois não se está perante uma lacuna da lei (caso omisso) cuja regulamentação se imponha através de norma aplicável a caso análogo56.

A interpretação extensiva é admitida apenas no que concerne às normas excecionais.

Assim, o art. 174º, do CSComerciais, por ser uma norma excecional quanto aos direitos de prescrição em ações intentadas pela sociedade ou contra a sociedade, admite o recurso à interpretação extensiva.

Interpretação extensiva significa que a formulação adotada pela letra do texto legal diz menos do que aquilo que se pretendia dizer, habilitando o intérprete, com recurso a elementos racionais, a alargar ou a estender o texto, dando-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo.

A interpretação extensiva não faz mais do que reconstruir a vontade legislativa já existente, para uma relação que só por inexata formulação dessa vontade parece excluída. A interpretação extensiva revela o sentido daquilo que o legislador realmente queria e pensava57.

A interpretação extensiva limita-se a esclarecer o pensamento da lei em face de uma expressão demasiado restrita, sem intentar aplicá-la a casos que ela não previu, como já sucede no processo analógico58.

Ora, pese embora a responsabilidade da destituição possa caber à sociedade, o facto de os sócios não disporem de contabilidade, não decorre que a sua exigibilidade a estes justificasse um prazo igual, senão mais curto, como entende o recorrente.

Por outro lado, não resulta que o legislador no art. 174º, do CSComerciais, tivesse dito menos do que pretendia, e deste modo, quisesse alargar esse prazo, também às ações de indemnização intentadas por gerente contra os sócios da sociedade por destituição sem justa causa.

Por outro lado, se quisesse que as ações de indemnização intentadas por gerente contra os sócios da sociedade por destituição sem justa causa ficassem sujeitas a um prazo de prescrição de cinco anos, teria expressado tal pensamento em alguma das alíneas do citado artigo.

Assim, nestas ações não considerou ser nefasta a indefinição de direitos por um período mais dilatado do que os cinco anos, previstos no art. 174.º, do CSComerciais, isto é, quando são demandados os sócios, e não a sociedade.

Temos, pois, que as razões que levaram o legislador a estabelecer um prazo de prescrição de cinco anos, para os direitos da sociedade e direitos contra a sociedade, sejam os adversários os fundadores, os sócios, administradores, os membros do conselho fiscal e do conselho geral e de supervisão, os revisores oficiais de contas ou os liquidatários, não são justificativas para se estender tal prazo às ações instauradas contra os sócios, e não contra a sociedade59.

Desta forma, além de não haver uma lacuna da lei (caso omisso), também não se verifica qualquer similitude de situações que justifiquem tratamento legal semelhante, pelo que será inaplicável a prescrição do art. 174.º/1, do CSComerciais, quando a ação é instaurada contra os sócios, como foi o caso dos autos.

Concluindo, a situação não se tem por abrangida, quer por analogia, quer por interpretação extensiva.

Destarte, improcedem, nesta parte, a conclusão 6ª), do recurso de revista.

3. DISPOSITIVO

3.1. DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes desta secção cível (1ª) do Supremo Tribunal de Justiça em julgar improcedente a revista e, consequentemente, em confirmar-se o acórdão recorrido.

3.2. REGIME DE CUSTAS

Custas pelo recorrente (na vertente de custas de parte, por outras não haver60), porquanto a elas deu causa por ter ficado vencido61.

Lisboa, 2023-11-1662,63

(Nelson Borges Carneiro) – Relator

(Manuel Aguiar Pereira) – 1º adjunto

(Jorge Leal) – 2º adjunto

_____________________________________________

1. As decisões judiciais podem ser impugnadas por meio de recursos – art. 627º/1, do CPCivil.↩︎

2. No nosso sistema processual (no que à apelação e à revista) predomina o «esquema do recurso de reponderação»: o objeto do recurso é a decisão impugnada, encontrando-se à partida, vedada a produção defeitos jurídicos ex-novo. Através do recurso, o que se visa é a impugnação de uma decisão já ex-ante proferida que não o julgamento de uma qualquer questão nova. Uma relevante exceção ao modelo de reponderação é a que se traduz nas questões de conhecimento oficioso: o tribunal superior pode sempre apreciar qualquer dessas questões ainda que não suscitadas perante o tribunal a quo – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 468.↩︎

3. Os recursos são ordinários ou extraordinários, sendo ordinários os recursos de apelação e de revista e extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e a revisão – art. 627º/2, do CPCivil.↩︎

4. Segundo a classificação legal, os recursos são ordinários ou extraordinários, conforme o reexame da decisão tenha lugar antes ou depois (respetivamente) do trânsito em julgado da decisão reexaminada, sendo de qualificar como ordinários os recursos de apelação e de revista e como extraordinários o recurso para uniformização de jurisprudência e o recurso de revisão (art. 627º/2) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, pp. 472/473.↩︎

5. A lei estabelece uma divisão entre recursos ordinários e recursos extraordinários a partir de um critério formal ligado ao trânsito em julgado da decisão. Enquanto os recursos ordinários pressupõem que ainda não ocorreu o trânsito em julgado, devolvendo-se ao tribunal de recurso a possibilidade de anular, revogar ou modificar a decisão, os recursos extraordinários são interpostos depois daquele trânsito – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 777.↩︎

6. Aquele que interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎

7. Aquele contra quem se interpõe o recurso – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 477.↩︎

8. O juiz que lavrar o acórdão deve sumariá-lo – art. 663º/7, do CPCivil.↩︎

9. O sumário não faz parte da decisão, consistindo tão só numa síntese daquilo que fundamentalmente foi apreciado com mero valor de divulgação jurisprudencial. Por tais motivos, o sumário deve ser destacado do próprio acórdão, sendo da exclusiva responsabilidade do relator – ABRANTES GERALDES, Recursos em Processo Civil, Novo Regime, p. 301.↩︎

10. O acórdão principia pelo relatório, em que se enunciam sucintamente as questões a decidir no recurso, expõe de seguida os fundamentos e conclui pela decisão, observando-se, na parte aplicável, o preceituado nos artigos 607.º a 612.º – art. 663º/2, do CPCivil.↩︎

11. Para além do dever de apresentar a sua alegação, impende sobre o recorrente o ónus de nela concluir, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão – ónus de formular conclusões (art. 639º/1) – FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, volume II, 2ª edição, p. 503.↩︎

12. As conclusões exercem ainda a importante função de delimitação do objeto do recurso, como clara e inequivocamente resulta do art. 639º/3. Conforme ocorre com o pedido formulado na petição inicial, as conclusões devem corresponder à identificação clara e rigorosa daquilo que o recorrente pretende obter do tribunal superior, em contraposição com aquilo que foi decidido pelo tribunal a quo – ABRANTES GERALDES – PAULO PIMENTA – PIRES DE SOUSA, Código de Processo Civil Anotado, volume 1º, 2ª ed., p. 795.↩︎

13. O recorrente deve apresentar a sua alegação, na qual conclui, de forma sintética, pela indicação dos fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão. Versando o recurso sobre matéria de direito, as conclusões devem indicar, as normas jurídicas violadas; o sentido com que, no entender do recorrente, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, e invocando-se erro na determinação da norma aplicável, a norma jurídica que, no entendimento do recorrente, devia ter sido aplicada – art. 639º/1/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎

14. Na sessão anterior ao julgamento do recurso, o processo, acompanhado com o projeto de acórdão, vai com vista simultânea, por meios eletrónicos, aos dois juízes-adjuntos, pelo prazo de cinco dias, ou, quando tal não for tecnicamente possível, o relator ordena a extração de cópias do projeto de acórdão e das peças processuais relevantes para a apreciação do objeto da apelação – art. 657º/2 ex vi do art. 679º, ambos do CPCivil.↩︎

15. Todas as questões de mérito que tenham sido objeto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões do recorrente, mostrando-se objetiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas, não podendo de elas conhecer o tribunal de recurso.↩︎

16. Vem sendo entendido que o vocábulo “questões” não abrange os argumentos, motivos ou razões jurídicas invocadas pelas partes, antes se reportando às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por “questões” as concretas controvérsias centrais a dirimir.↩︎

17. Relativamente a questões de conhecimento oficioso e que, por isso mesmo, não foram suscitadas anteriormente, deve ser assegurado o contraditório, nos termos do art. 3º/3, do CPCivil.↩︎

18. PEREIRA DE ALMEIDA, Sociedades Comerciais, 3ª ed., p. 110.↩︎

19. Só por meio de deliberação, nalguma das formas admitidas pela lei, os sócios exprimem uma vontade imputável à sociedade. Isto implica que esta deliberação está sujeita ao regime geral de impugnação das deliberações sociais, a não ser que a lei lhe atribua outro regime – RAUL VENTURA, Sociedade por Quotas, 1991, vol. III, p. 69.↩︎

20. A destituição de gerentes depende, em princípio, de deliberação dos sócios, mas também pode opera-se através da decisão judicial quando ocorra justa causa. A deliberação de destituição é tomada, em princípio, por maioria simples, ainda que os gerentes tenham sido designados no pacto social – ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, Sociedades Comerciais, 3ª edição, p. 268.↩︎

21. COUTINHO DE ABREU, Código das Sociedades Comerciais em comentário, vol. IV (Artigos 246.º a 270.º-G), 2.ª ed., coord. J. M. Coutinho de Abreu, Almedina, Coimbra, 2017, pág. 126.↩︎

22. RAUL VENTURA, Sociedade por Quotas, 1991, vol. III, p. 118.↩︎

23. COUTINHO DE ABREU, Código das Sociedades Comerciais em comentário, vol. IV (Artigos 246.º a 270.º-G), 2.ª ed., coord. J. M. Coutinho de Abreu, Almedina, Coimbra, 2017, pág. 126.↩︎

24. Em sentido contrário: MENEZES CORDEIRO, Manual de Direito das Sociedades, II – Das Sociedades em Especial, 2ª edição, 2007, pp. 439/440.↩︎

25. A sociedade tem o direito de afastar o gestor, fazendo cessar unilateralmente a relação jurídica de administração, mesmo na ausência de motivo atendível. Se o fizer, pratica, sem dúvida, um ato lícito – JOÃO LABAREDA, Direito Societário Português – Algumas Questões, p. 80.↩︎

26. É lícito à sociedade pôr termo à relação de administração por manifestação de vontade unilateral. Essa manifestação de vontade provém sempre de um órgão da sociedade colegial, constituindo, portanto, uma deliberação social – ILÍDIO DUARTE RODRIGUES, A Administração das Sociedades por Quotas e Anónimas – Organização e Estatuto dos Administradores, p. 250.↩︎

27. A regra é a livre revogação do mandato, podendo o gerente ser destituído “ad nutum”, isto é, sem justos motivos, apenas tendo, nesse caso, direito a uma indemnização, sem que possa ser impugnada a deliberação de destituição por falta de fundamento – ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, Sociedades Comerciais, 3ª edição, pp. 267/68.↩︎

28. A indemnização é um direito que o gestor destituído tem contra a sociedade, por virtude da prática por ela de um ato lícito que, todavia, gera responsabilidade civil – JOÃO LABAREDA, Direito Societário Português – Algumas Questões, p. 92.↩︎

29. ANTUNES VARELA, Das Obrigações em Geral, vol. I, 10ª edição, p. 715.↩︎

30. O nosso sistema jurídico admite, também, com caracter excecional, alguns casos contados de responsabilidade por atos lícitos ou intervenções lícitas. Pretende-se em tais casos compensar o sacrifício de um interesse menos valorado na composição de um conflito teleológico, porque uma prevalência absoluta e total do interesse oposto seria injusta – MOTA PINTO, Teoria Geral do Direito Civil, 1976, p. 91.↩︎

31. O art. 1348º do Código Civil consagra um caso de responsabilidade objetiva por facto lícito. Em divergência do regime geral da responsabilidade civil, prescinde-se aqui da ilicitude do ato gerador do dano, bem como da culpa, ainda que presumida. Daí a ressalva legal quanto ao não afastamento do direito à indemnização, mesmo se tomadas as precauções consideradas necessárias – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-07-07, Relator: ALVES VELHO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

32. A designação de uma pessoa como gerente e a correlativa aceitação originam um contrato entre a sociedade e o gerente – RAUL VENTURA, Sociedade por Quotas, 1991, vol. III, p. 25.↩︎

33. Prescreve no prazo de três anos o direito de indemnização por danos causados no âmbito da responsabilidade civil extracontratual por atos lícitos – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-07-07, Relator: ALVES VELHO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

34. A responsabilidade delitual tem prazos de prescrição mais curtos (art. 498º), enquanto a responsabilidade obrigacional é sujeita aos prazos de prescrição gerais das obrigações (arts. 309º e ss.) – MENEZES LEITÃO, Direito das Obrigações, vol. 1.º, 4.ª ed., p. 268.↩︎

35. O fundamento último da prescrição situa-se na negligência do credor em não exercer o seu direito durante um período de tempo razoável, em que seria legítimo esperar que ele o exercesse, se nisso estivesse interessado. Compreendendo-se que razões de certeza e de segurança nas relações jurídicas imponham que a inércia prolongada do credor envolva consequências desfavoráveis para o exercício tardio do direito, nomeadamente em defesa da expectativa do devedor de se considerar libero de cumprir e até da dificuldade que ele poderia ter de, passado muito tempo, fazer prova de um cumprimento que, porventura, tivesse feito – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-03-04, Relator: SERRA BAPTISTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

36. ANA MORAIS ANTUNES, Prescrição e Caducidade, p. 129.↩︎

37. ANA MORAIS ANTUNES, Prescrição e Caducidade, pp. 129/30.↩︎

38. MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil Português, Tomo IV, 2005, p. 197.↩︎

39. ANA PRATA (Coord.), Código Civil Anotado, 2ª Edição Revista e Atualizada, volume I, p. 429.↩︎

40. A interrupção é determinada por atos que tanto podem resultar de uma iniciativa do titular do direito (credor), a qual terá lugar sempre que se dê conhecimento ao devedor, através de citação, notificação judicial ou outro meio judicial da intenção de se exercitar o direito (art. 323.º), como por atos do beneficiário da prescrição, ou seja do devedor (art. 325.º) – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-03-04, Relator: SERRA BAPTISTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

41. O efeito interruptivo da prescrição, estabelecido no n.º 2, do art. 323.º do CC, pressupõe a concorrência de três requisitos: (i) que o prazo prescricional ainda esteja a decorrer e assim se mantenha nos cinco dias posteriores à propositura da ação; (ii) que a citação não tenha sido realizada nesse prazo de cinco dias; (iii) que o retardamento na efetivação desse ato não seja imputável ao autor – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2007-10-03, Relator: SOUSA GRANDÃO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

42. ANA MORAIS ANTUNES, Prescrição e Caducidade, pp. 130.↩︎

43. A expressão legal – “causa não imputável ao requerente” – contida naquele citado normativo, deve ser interpretada em termos de causalidade objetiva, ou seja, quando a conduta do requerente em nada tenha contribuído, em termos adjetivos, para que haja um atraso no ato de citação – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2018-07-03, Relator: ANA PAULA BOULAROT, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

44. Uma vez que a citação ou a notificação demora, por vezes, mais tempo do que o devido, e se a demora não resultar de causa imputável ao requerente, estatui a norma excecional do nº 2 do art. 323.º do CC que o efeito interruptivo se verifica cinco dias depois daquelas diligências terem sido requeridas, se, entretanto, ainda não tiverem sido feitas – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2010-03-04, Relator: SERRA BAPTISTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

45. A cláusula geral que consta no art.º 323.º, n.º 2, do Código Civil, «por causa não imputável ao requerente» tem sido densificada em diversos arestos do Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que a conduta do requerente só exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual e até à verificação da citação, devendo a referida expressão legal ser interpretada em termos de causalidade objetiva – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2018-09-12, Relator: CHAMBEL MOURISCO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

46. É entendimento pacífico na jurisprudência do STJ que a conduta do requerente só não exclui a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação, sendo que a expressão «causa não imputável ao requerente», usada no art. 323º nº 2 do CCivil, deve ser interpretada em termos de causalidade objetiva, só excluindo a interrupção da prescrição quando tenha infringido objetivamente a lei em qualquer termo processual até à verificação da citação – Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2016-11-29, Relator: GARCIA CALEJO, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

47. Ac. Tribunal da Relação de Évora de 2019-10-10, Relatora: CONCEIÇÃO FERREIRA, http://www.dgsi.pt/jtre.↩︎

48. CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS ANOTADO, Coordenação: ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, 2ª edição, p. 577.↩︎

49. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2021-06-17, Relatora: MARIA PRAZERES BELEZA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

50. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-04-06, Relatora: FERNANDA ISABEL, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

51. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-04-06, Relatora: FERNANDA ISABEL, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

52. Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2017-04-06, Relatora: FERNANDA ISABEL, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

53. O direito de requerer a destituição judicial de administradores ou gerentes de sociedades comerciais, sempre fundada em “justa causa”, promovida pela sociedade ou por sócios, está sujeito ao prazo especial de prescrição societária regulado no art. 174.º, n.º 1, al. b), do CSC – a Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 2020-06-16, Relator: RICARDO COSTA, http://www.dgsi.pt/jstj.↩︎

54. PIRES DE LIMA – ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, volume I, 4.ª edição, p. 60.↩︎

55. MANUEL DE ANDRADE, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, p. 159.↩︎

56. O caso omisso é realidade diferente de simples caso não regulado, pois abrange apenas a situação que, sendo juridicamente relevante, não constitui objeto de nenhuma disposição legal – PIRES DE LIMA – ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, volume I, 4.ª edição, p. 59.↩︎

57. MANUEL DE ANDRADE, Ensaio sobre a Teoria da Interpretação das Leis, pp. 162/63.↩︎

58. RODRIGUES BASTOS, Das Leis, sua Interpretação e Aplicação, 2ª edição, p. 46.↩︎

59. Por exemplo, as ações do comerciante que vende objetos à sociedade e desta contra eles não se regem quanto à prescrição, pelo art. 174º; idem quanto a obrigações não societárias entre o sócio e a sociedade – CÓDIGO DAS SOCIEDADES COMERCIAIS ANOTADO, Coordenação: António Menezes Cordeiro, 2ª edição, 2014, p. 577.↩︎

60. Como o conceito de custas stricto sensu é polissémico, porque é suscetível de envolver, nos termos do artigo 529º/1, além da taxa de justiça, que, em regra, não é objeto de condenação – os encargos e as custas de parte, importa que o juiz, ou o coletivo de juízes, nos segmentos condenatórios das partes no pagamento de custas, expressem as vertentes a que a condenação se reporta – SALVADOR DA COSTA, As Custas Processuais, Análise e Comentário, 7ª ed., p. 8.↩︎

61. A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condena em custas a parte que a elas houver dado causa ou, não havendo vencimento da ação, quem do processo tirou proveito – art. 527º/1, do CPCivil.↩︎

62. A assinatura eletrónica substitui e dispensa para todos os efeitos a assinatura autógrafa em suporte de papel dos atos processuais – art. 19º/2, da Portaria n.º 280/2013, de 26/08, com as alterações introduzidas pela Portaria n.º 267/2018, de 20/09.↩︎

63. Acórdão assinado digitalmente – certificados apostos no canto superior esquerdo da primeira página.↩︎