Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
947/19.0T8BCL.G1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: MANUEL CAPELO
Descritores: RECURSO DE REVISTA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA
RELAÇÃO PROCESSUAL
OPOSIÇÃO DE JULGADOS
IDENTIDADE DE FACTOS
QUESTÃO FUNDAMENTAL DE DIREITO
ACORDÃO FUNDAMENTO
ACÓRDÃO RECORRIDO
Data do Acordão: 10/12/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I - O acórdão da Relação que aprecie decisão interlocutória que recaia unicamente sobre a relação processual, no caso a decisão que indeferiu a suspensão da instância, apenas pode ser objeto de revista, nos casos prevenidos no art. 629 nº2 do CPC.

II - Este recurso exige a existência de um acórdão do STJ; que a contradição (frontal e não implícita) seja no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.

III - Afirmar-se num acórdão do STJ que a decisão de suspender ou não a instância é uma possibilidade colocada pelo legislador na disponibilidade do juiz que não equivale a poder ser usada indiscriminadamente, exigindo que se verifique uma prejudicialidade entre duas ações, sendo perante esta prejudicialidade que o tribunal pode optar por ordenar ou não ordenar a suspensão, é uma reflexão normativa de caráter geral que reproduzindo a lei em nada define uma solução concreta.

IV - Não existe contradição entre o acórdão-fundamento e o acórdão-recorrido quando ambos enunciam o mesmo critério de prejudicialidade apenas diferindo na aplicação desse critério à situação concreta de cada uma das ações, que têm, um quadro factual e uma natureza diferente.

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


Relatório

Na ação declarativa com forma de processo comum que Zurich Insurance Plc – Sucursal Portugal propôs contra Martins da Cruz & Cruz II Metalomecânica SA a autora pediu a condenação da ré no pagamento de 40.211,42 €, acrescida de juros de mora desde a citação e até efetivo e integral pagamento, alegando que ocorreu um acidente de trabalho imputável à Ré, por violação de regras de segurança, o qual foi participado e deu origem a processo que culminou com sentença transitada que condenou no pagamento ao sinistrado das “prestações normais previstas na Lei”, sem prejuízo do direito de regresso sobre a ora Ré. Invocou ainda que despendeu 4.227,34 €, a título de despesas judiciais, tratamentos e pensões ao sinistrado e a quantia de 35.984,08 € liquidados ao sinistrado, conforme auto de entrega do capital.

A Ré contestou impugnando a matéria de facto alegada e negou que a sentença que condenou a Autora no pagamento das quantias indemnizatórias em função do acidente faça caso julgado perante si, no que toca à sua responsabilidade no acidente, visto que naquele não foi parte.

No despacho saneador foi decidido que a ação tinha “por pressuposto aquilo que anteriormente foi definido: as prestações que têm por base a obrigação de indemnização a que a autora está vinculada, concretizada no dever de pagamento daquelas prestações fixadas no Tribunal do Trabalho e o direito de reembolso a cargo da ré dessas prestações, desde que efetivamente pagas pela autora. No que concerne a tal base comum, abrangendo elementos que constituem pressuposto lógico e necessário da decisão, impõe-se a autoridade do caso julgado, não cabendo discutir aqui, portanto, o que, a esse título, já foi decidido com trânsito e que aqui deve ser acatado: o acidente de trabalho e o referido direito de regresso, assente na responsabilidade da ré, também já antes reconhecida.”

Sobre esta decisão foi interposto recurso que a confirmou nos seus precisos termos.

A Ré, por requerimento apresentado em ...-...-2022, pediu a suspensão da instância com fundamento em causa prejudicial, o qual, após oposição da parte contrária, foi indeferido por despacho em que se decidiu “ compulsados os presentes autos e além de nestes o objeto do litígio ser a aferição dos pressupostos do direito de regresso da Autora sobre a Ré pelas quantias pagas a título de despesas judiciais, tratamentos, pensões, entrega do capital ao sinistrado, no âmbito do Processo n.º 213/14.8... que correu termos no Juízo 2 do Trabalho de ..., os factos apurados em sede de processo crime não constituem caso julgado nos presentes autos, não impedem a realização da presente audiência. Entende-se assim que não se vislumbra ser o processo-crime questão prejudicial relativamente aos presentes autos, pelo que vai tal pedido indeferido.”

Foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente e que condenou a Ré a pagar à Autora o montante de € 35.984,08, acrescido dos respetivos juros de mora, desde a sua citação e até integral e efetivo pagamento, à taxa legal em vigor, absolvendo-a do demais peticionado.

A ré veio interpor recurso de apelação dessa decisão e também daquela outra que havia indeferido a requerida suspensão da instância tendo o Tribunal da Relação acordado em julgar improcedente a suspensão da instância nos mesmos termos em que a decisão da 1ª instância tinha julgado e em julgar improcedente a apelação quanto à decisão final igualmente com os mesmos fundamentos da sentença.

… …

Inconformada com esta decisão dela interpôs recurso de revista a ré concluindo que:

“ I. É materialmente inconstitucional o disposto no artigo 671º n.º 3 do CPC, por violação das normas constantes do artigo 18º n.º 2 e 20º n.º 1 da CRP, porque estabelecem um limite desproporcional e desnecessário ao direito ao recurso, impedindo que as partes sindiquem de direito as decisões proferidas, sem qualquer razão e/ou alternativa.

II. A presente revista, não obstante ser apresentada em sede de um processo com dupla confirmação (em sede de 1ª instância e na Relação), deve ao abrigo do disposto no artigo 672º do CPC ser admitida.

III. Porquanto foi proferida contra o decidido no douto acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 11-10-1994 e já transitado em julgado, proferido no processo n.º JSTJ00025529, que decidiu que «I - A decisão de suspender ou de não suspender a instância, ao abrigo do disposto no artigo 279 do Código de Processo Civil é, em certo sentido, discricionária, o que não significa que o tribunal possa ordenar a suspensão sempre que o queira, mas apenas se ocorrer uma relação de prejudicialidade entre duas ações;

mas ocorrendo a prejudicialidade o tribunal, tomando em consideração as circunstâncias concretas de cada hipótese pode ordenar ou não ordenar a suspensão. II – Existe prejudicialidade quando na causa prejudicial se discuta, em via principal, uma questão que seja essencial para a decisão da prejudicada e que nesta não possa ser resolvida a título incidental»

Dito isto

IV. Salvo o devido respeito ambas decisões não tiveram em conta que constitui objeto de litígio nos presentes autos o seguinte - «Aferir dos pressupostos do direito de regresso da Recorrida sobre a Recorrente pelas quantias pagas a título de despesas judiciais, tratamentos, pensões, entrega do capital, ao sinistrado, no âmbito do processo que correu termos pelo Juízo do Trabalho de ...- J2, no total de 40.211,42 € e juros de mora contados da citação».

V. A existência de uma sentença num dado sentido, não significa que entre as partes exista uma obrigação cartular pura, isto é, que a mesma tenha de ser cumprida, sem que e sindique a sua origem e as relações que lhe são subjacentes.

VI. Os autos têm conhecimento do procedimento criminal para aferir da culpa ou não – da existência ou não de ato ilícito penal – por banda da aqui Recorrente – patronal, ou do Encarregado Geral da mesma, Sr. AA, na questão em litígio.

VII. Tal culpa não esta apurada nem dirimida, porquanto ainda não existe sequer decisão em primeira instância.

VIII. A questão que ali vier a ser apurada – culpa / ou não! E havendo culpa – de que! É absolutamente fundamental – para o desfecho da presente lide, pois que não se demonstrando ter havido culpa da aqui Recorrente – não opera o pretendido direito de regresso.

IX. Acresce que no processo-crime em questão, imputa o ministério publico, como se vê, grande quota parte da responsabilidade pelo acidente quer deu origem aos pagamentos da recorrida, ao ali arguido, AA e, não foi apurada nem provada a eventual culpa da aqui Recorrente.

X. O eventual direito de regresso da seguradora (art. 79 n° 3 da Lei 98/2009, de 4/9), está inelutavelmente dependente de eventual violação por parte da Recorrente das normas de Higiene, Segurança e Saúde no Trabalho, de acordo com o disposto no artigo 18 da Lei 98/2009, de 4 de setembro.

XI. Será até motivo de recurso de revisão dos próprios autos da ação de trabalho em que foi proferida a sentença à qual se decidiu conferir autoridade de caso em julgado, nestes autos.

XII. Por tal ordem de razão e sem prejuízo de melhor e douto entendimento, discute se nos autos de processo Comum (Tribunal Singular) nº 222/19.0... do Juízo Criminal 1 de ... – Tribunal Judicial da Comarca de Braga, questão prejudicial para a presente lide – e que determina que esta não tenha início, até que aquela questão, ali, se mostre dirimida.

XIII. E in casu, só pode concluir-se por uma relação de prejudicialidade quando a decisão do processo-crime tem a virtualidade de destruir os efeitos da causa laboral e a presente nos presentes autos.

XIV. Veja-se, no mesmo sentido, o Ac. TR Porto, de 07.01.2010, proc. n.º 940/08.9TVPRT.P1 disponível in www.dgsi.pt: “I - Para efeitos do disposto no art.º 279º, n.º 1, do C.P.C., uma causa está dependente do julgamento de outra já proposta, quando a decisão desta pode afetar e prejudicar o julgamento da primeira, retirando-lhe o fundamento ou a sua razão de ser, o que acontece, designadamente, quando, na causa prejudicial, esteja a apreciar-se uma questão cuja resolução possa modificar uma situação jurídica que tem que ser considerada para a decisão do outro pleito. II - Entende-se, assim, por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia. III - Existindo entre duas ações esse nexo de prejudicialidade, deverá ser suspensa a instância na causa dependente, até à decisão da causa prejudicial. (…).”

XV. Poderá até dar-se o caso, de a culpa nos autos crime em discussão não vir a ser da aqui Recorrente, e esta indevidamente nos presente autos vir a ser condenada a restituir à recorrida verbas.

XVI. O que viola o princípio da segurança jurídica constitucionalmente consagrado, no artigo 20º da CRP.

XVII. Deste modo, existindo nexo de prejudicialidade entre os presentes autos e o processo crime 222/19.0... do Juízo Criminal 1 de ... – Tribunal Judicial da Comarca de Braga, deve o despacho recorrido ser revogada e substituída por outro que determine a suspensão dos autos até ser dirimida a questão prejudicial ora invocada, respeitante à efetiva aferição da culpa por banda da aqui Recorrente (substrato legal imprescindível à verificação da existência do direito de regresso que fundamenta os presentes autos)., sob pena de estar a ser aplicada uma interpretação das normas vd. al. c), n.º 1, art.º 276.º e art.º 279.º CPC ferida de inconstitucionalidade.

XVIII. Sendo que a aplicação da norma interpretada no sentido da douta sentença é nula impondo anulação do processado, o que se requer.

Alem disso

XIX. O ónus imposto ao recorrente que impugna a matéria de facto, no que tange a indicação dos meios de prova que impõem decisão diversa da tomada, teve em vista essencialmente a situação em que a pretensão do recorrente se funda na existência de provas que conduzem a um resultado probatório diferente daquele que foi acolhido na decisão sob censura.

XX. De facto, essa indicação parece mais talhada para os casos em que o recorrente sustenta a existência de prova do contrário ou de contraprova daquela que na decisão sob censura foi relevada (veja-se o artigo 346º do Código Civil).

XXI. Não é possível proceder à indicada de contraprova do que não existe.

XXII. Tal como não é possível, a ausência de posição, quanto a factos que não são do conhecimento do reu, nem são passiveis do seu conhecimento por neles não ter qualquer intervenção.

XXIII. Pelo que e ao contrário do que afirma o douto acórdão recorrido, nunca tais atos poderiam ser dados como assentes.

XXIV. O que no presente caso, se invoca, a falta de prova para a condenação nos ermos exarados, constitui uma violação dos artigos 342º e 344 do Código Civil, tal qual tem sido o entendimento na nossa jurisprudência, cfr. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça proferido em 11.07.2012, disponível em www.dgsi.pt,

XXV. Pelo que é manifesta a falta de prova de facto e de direito, para que a ré se veja condenada nos termos em que o foi, pelo que desde já se pugna pela revisão da douta sentença.

Nos termos em que se requer a Vossas Excelências. que se dignem admitir o presente recurso, julgá-lo procedente por provado e, consequentemente, a) Declarar que é materialmente inconstitucional o disposto nos artigos 629º n.º 1 e 671º n.º 3 do CPC, por violação das normas constantes do artigo 18º n.º 2 e 20º n.º 1 da CRP.

b) Declarar materialmente inconstitucional por violação do disposto no artigo 20º da CRP a interpretação das normas das normas presentes na al. c), n.º 1, art.º 276.º e art.º no 279.º CPC, no sentido em que não é suscetível de suspender uma causa, sempre que, exista uma sentença, transitada em julgado, que determina o direito de regresso sem apurar da responsabilidade efetiva do alegado devedor e esteja em curso um outro processo que visa apurar essa responsabilidade efetiva, e declarar a nulidade do processado após a prolação do despacho em sede de audiência de julgamento.

c) Em todo o caso, modificando o douto acórdão recorrido e alterando-o por outro que absolva a recorrida nos pedidos formulados contra ela. “

Não houve contra alegações.

Cumpre decidir.

… …

Fundamentação

Foi julgada provado a seguinte matéria de facto

“ 1. A Autora exerce a indústria de seguros em vários ramos.

2.. No exercício da sua atividade, a ora Autora celebrou com a ora Ré um acordo de seguro de Ramo Acidentes de Trabalho – na modalidade Prémio de Prémio variável, ou folhas de férias, titulado pela Apólice n.º .......97 através do qual transferiu para si a responsabilidade infortunística laboral emergente de acidente de trabalho sofridos pelos trabalhadores da Ré.

3.. No âmbito da referida Apólice foi participado à Autora a ocorrência de um acidente de trabalho, onde constava como sinistrado BB.

4. O acidente ocorreu no dia ... de outubro de 2013, pelas 14:30 horas.

5. Nesse dia a ora Ré procedeu ao revestimento em chapa da fachada principal do pavilhão industrial da sociedade F..., Lda., sita em Vila Seca, ....

6. Apurou-se, em sede de julgamento, do processo emergente de acidente de trabalho que correu termos pela 2.ª secção do Trabalho de ..., Juiz 2., Proc. N.º 213/14.8..., que o alegado acidente terá ocorrido no dia supramencionado, estando o sinistrado no exercício das suas funções de serralheiro civil, sob ordens, direção e instruções da Ré.

7. O sinistrado efetuava trabalhos de revestimento da referida fachada, com outros colegas.

8. No dia do acidente a Ré ordenou que o sinistrado subisse ao telhado do aludido pavilhão industrial, para retirar umas chapas com cerca de 5 metros de comprimento por 1 metro de largura que se encontravam a servir de chapéus da fachada.

9. Para a realização das tarefas a Ré havia levado para a obra uma plataforma elevatória que se destinava a ser usada pelos trabalhadores quando efetuassem trabalhos de altura.

10. Todavia, o sinistrado acedeu ao telhado por uma escada de mão, a qual estava a ser segurada por um colega.

11. Chegado ao telhado, coberto por telhas de lusalite, o sinistrado teve que se colocar sobre o mesmo para retirar as chapas, uma vez que não conseguia retirá-los se ficasse em cima da escada de mão.

12. Cerca das 14:40h, o sinistrado caiu ao solo através do telhado, de uma altura de cerca de cinco metros, porque uma das telhas partiu.

13. A Ré não avaliou os riscos de queda em altura dos seus trabalhadores na zona do telhado, não tendo, por isso, elaborado o competente plano de segurança e saúde no trabalho, no que toca ao acesso ao telhado do pavilhão.

14. O telhado do pavilhão, construído em telhas de fibrocimento, não dispunha de linha de vida, nem de tábuas de rojo ou escadas de telhador, meios de proteção estes que era possível colocar no telhado.

15. Também não se encontravam colocados andaimes nas fachadas do pavilhão, nem rede de captação/proteção no seu interior, meios de proteção que eram também possíveis de colocar na obra e evitariam a queda do sinistrado.

16. No âmbito do processo de trabalho identificado em 6. foi declarada a existência e caracterização do acidente de trabalho sofrido pelo sinistrado, e tendo-se considerado que a queda daquele se deveu a violação das regras de segurança por parte da Ré empregadora foi a ora Autora condenada ao pagamento ao sinistrado, sem prejuízo do respetivo direito de regresso sobre a ora Ré.

17. Por via dessa condenação a Autora pagou em Tribunal ao sinistrado a quantia de €35.984,08.

… …

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso, conforme prevenido nos arts. 635 n.º 4 e 639 n.º 1, ex vi, art. 679, todos do Código de Processo Civil.

O conhecimento das questões a resolver, delimitadas pelas conclusões, importa em saber se a ação deveria ter sido suspensa por existência de causa prejudicial e se deve ser admitida a revista excecional dirigida à decisão de mérito proferida no acórdão recorrido.

… …

Os recursos interpostos incidem sobre seguintes questões:

- O que é dirigido à decisão sobre a suspensão da instância requerida pela ré /recorrente e indeferida em 1ª instância e na Relação;

- O que tem como alvo a decisão de mérito da ação, que foi julgada na sentença parcialmente procedente e que foi confirmada no acórdão recorrido, condenando a Ré Martins da Cruz & Cruz II, Metalomecânica, S.A. a pagar à autora Zurich Insurance PLC – Sucursal em Portugal o montante de €35.984,08 (trinta e cinco mil novecentos e oitenta e quatro euros e oito cêntimos), acrescido dos respetivos juros de mora, desde a sua citação e até integral e efetivo pagamento, à taxa legal em vigor.

… …

O recurso sobre a indeferida suspensão da instância configura uma decisão interlocutória suscitada em primeira instância e que aí foi decidida tendo em recurso de apelação o Tribunal da Relação confirmado esse indeferimento.

Como acórdão da Relação que aprecie decisão interlocutória que recaia unicamente sobre a relação processual, a decisão que indeferiu a suspensão da instância apenas pode ser objeto de revista, nos casos prevenidos no art. 629 nº2 do CPC - não tendo o recorrente apresentado nessa previsão, qualquer fundamento - ou quando a decisão esteja em contradição com acórdão do STJ já transitado em julgado no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência conforme – art. 671 nº2 do CPC. Este recurso de revista, que não é excecional, por ter previsão própria no normativo citado, exige a existência de um acórdão do STJ (no caso não interessa a polémica jurisprudencial sobre se a contradição pode ocorrer com um acórdão da Relação); que a contradição seja no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.

A decisão impugnada deve traduzir uma oposição frontal e não apenas implícita ou pressuposta em relação ao acórdão fundamento;

A divergência jurisprudencial deve ser verificar-se relativamente a questões de direito sendo irrelevantes quanto a eventuais questões de facto; a questão de direito sob controvérsia deve revelar-se essencial para o resultado numa e noutra decisões sendo irrelevantes respostas ou argumentos que não tenham valor decisivo – vd. Abrantes Geraldes , Recurso em Processos Civil 6ª ed. pg. 575 e 58.

Da análise do acórdão fundamento em confronto com a decisão recorrida resulta que aquele entendeu e decidiu que «I - A decisão de suspender ou de não suspender a instância, ao abrigo do disposto no artigo 279 do Código de Processo Civil é, em certo sentido, discricionária, o que não significa que o tribunal possa ordenar a suspensão sempre que o queira, mas apenas se ocorrer uma relação de prejudicialidade entre duas ações; mas ocorrendo a prejudicialidade o tribunal, tomando em consideração as circunstâncias concretas de cada hipótese pode ordenar ou não ordenar a suspensão.

II - Existe prejudicialidade quando na causa prejudicial se discuta, em via principal, uma questão que seja essencial para a decisão da prejudicada e que nesta não possa ser resolvida a título incidental»

Num primeiro momento o acórdão fundamento refere em termos genéricos o sentido da suspensão da instância que então estava previsto no art. 279 do CPC de 1961 e agora se encontra no art. 272 do CPC, sendo que no inciso em questão a redação das normas é exatamente igual – vd. 279 nº1 primeiro parágrafo e nº2 e art. 272 nº1 e 2 . Afirmar-se que a decisão de suspender ou não a instância é uma possibilidade colocada pelo legislador na disponibilidade do juiz que não equivale a poder ser usada indiscriminadamente, exigindo que se verifique uma prejudicialidade entre duas ações, sendo perante esta prejudicialidade que o tribunal pode optar por ordenar ou não ordenar a suspensão, é, reflexão normativa que em nada interessa ao caso em concreto. Efetivamente, quer no caso do acórdão fundamento, quer no da decisão recorrida, quer em qualquer outro em que a questão se coloque essas observações são válidas, mas em nada entram em contradição, seja a decisão proferida a de ordenar ou não ordenar a suspensão.

Quanto à segunda parte, o acórdão fundamente enuncia que a prejudicialidade existe quando se discuta, em via principal, uma questão que seja essencial para a decisão da prejudicada e que nesta não possa ser resolvida a título incidental. No entanto, esta enunciação do que é a prejudicialidade não significa, não impõe, nem diz o acórdão fundamento que imponha, que reconhecida que seja tenha de ser ordenada a suspensão. Na verdade, é a própria lei a advertir para que, ainda que exista causa prejudicial “não deve ser ordenada a suspensão” quando aquela foi intentada unicamente para obter a suspensão ou se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superam as vantagens.

Do exposto decorre que o acórdão fundamento vê reduzida a sua utilidade à parte em que tenta uma definição de questão prejudicial que é, afinal, a repetição do que refere Manuel de Andrade - Lições de Processo Civil, págs. 491 e 492 - quando nelas se referte que só existe verdadeira prejudicialidade e dependência quando na primeira causa se discute, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda e que não pode resolver-se nesta em via incidental.

Aceitando-se por causa prejudicial aquela onde se discute e pretende apurar um facto ou situação que é elemento ou pressuposto da pretensão formulada na causa dependente, de tal forma que a resolução da questão que está a ser apreciada e discutida na causa prejudicial irá interferir e influenciar a causa dependente, destruindo ou modificando os fundamentos em que esta se baseia, a prejudicialidade referida nos preceitos citados verifica-se quando exista impossibilidade de apreciar um objeto processual (o objeto processual dependente) sem interferir na análise de um outro (o objeto processual prejudicial) - Miguel Teixeira de Sousa, Revista de Direito e Estudos Sociais, ano XXIV.

No caso em decisão o acórdão recorrido, confirmando a sentença, entendeu não existir prejudicialidade entre a ação identificada e a ação e decidiu enunciando exatamente os requisitos constantes do acórdão fundamento. De facto, nas fls. 14 a 18 do acórdão recorrido deixou-se expresso o critério de verificação da prejudicialidade dizendo-se exatamente que "Uma causa é prejudicial a outra quando a decisão da primeira pode destruir o fundamento ou a razão de ser da segunda" - José Alberto dos Reis - Comentário ao Código de Processo Civil, vol. 3.º, Coimbra, 1946, pág. 268. Ou, numa outra perspetiva, «quando na primeira causa se discuta, em via principal, uma questão que é essencial para a decisão da segunda»; Manuel de Andrade - Lições de Processo Civil, págs. 491 e 492”

ou ainda que

“Assim pode considerar-se como prejudicial, em relação a outro em que se discute a título incidental uma dada questão, o processo em que a mesma questão é discutida a título principal" – cfr. Manuel de Andrade, "Lições de Processo Civil", págs. 491 e 492.”

Todavia, com este mesmo critério normativo, que é o constante do acórdão fundamento, na concretização aos termos e factos da ação, a decisão recorrida, de fls. 18 a 20, entendeu não existir relação de prejudicialidade porque “já foi decidido neste processo, com trânsito em julgado, por força do acórdão desta Relação que o confirmou, que a questão da responsabilidade da Ré pelo acidente apreciada no processo que condenou a ora Autora a suportar as consequências desse acidente, por força da autoridade do caso julgado, se impõe nestes autos, no que toca à possibilidade deste poder exercer contra aquela o direito de regresso (ou o que lhe advém da sub-rogação legal) pelo que pagar no cumprimento dessa decisão.” E mais fundamentou que, se constitui objeto de litígio aferir dos pressupostos do direito de regresso da Recorrida sobre a Recorrente pelas quantias pagas a título de despesas judiciais, tratamentos, pensões, entrega do capital, ao sinistrado, no âmbito do processo 213/14.8... que correu termos pelo Juízo do Trabalho de ...- J2, foi já decidida a existência do direito de regresso, havendo, apenas, que verificar se os montantes objeto do pedido se inserem dentro do seu âmbito. Por isso o tema da prova dos autos foi na mesma decisão que fixou o objeto do processo definido da forma seguinte: “Apurar as quantias pagas pela autora ao sinistrado BB e a que título o foram.

Em conformidade com o que se deixa exposto é evidente que não existe qualquer contradição entre o acórdão-fundamento e o acórdão-recorrido sendo ambos coincidentes quanto ao critério que enunciam de prejudicialidade. Apenas diferem na aplicação desse critério à situação concreta de cada ação, que têm, um quadro factual e uma natureza diferentes, não sendo estes elementos de concretização que relevam para a contradição que, como se disse não existe.

Assim, se o fundamento para a admissibilidade da revista nos termos do art. 671 nº2 al. b) do CPC está limitado à existência de contradição (frontal e direta) entre a decisão recorrida e um acórdão do STJ no âmbito da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, a conclusão de não existir contradição determina que o recurso seja rejeitado nesta parte. Aliás, deve acrescentar-se que se admissibilidade da revista neste ponto dependia da verificação de existência de contradição o seu objeto, em caso de ter admitia, restringia-se exclusivamente à apreciação da questão essencial em conflito e não de qualquer outra.

Em resumo, por falta de verificação dos pressupostos de admissibilidade da revista excecional rejeita-se a interposição do recurso quanto à suspensão da instância, e, em consequência, confirma-se nessa parte a decisão recorrida.

… …

Na segunda parte do recurso, mais corretamente, no dirigido contra a decisão do mérito da causa, o recorrente, sustenta que “ é manifesta a falta de prova de facto e de direito, para que a ré se veja condenada nos termos em que o foi, pelo que desde já se pugna pela revisão da douta sentença.”

Existindo dupla conforme entre a sentença e o acórdão recorrido e interpondo recurso de revista excecional invocando inconstitucionalidade do nº3 do art. 671 do CPC quando prevê que das decisões com dupla conformidade não há por regra recurso de revista, o recorrente protesta também que “ao contrário do que afirma o douto acórdão recorrido” nunca poderia ter sido dado como provado o facto 17 “ Por via dessa condenação a Autora pagou em Tribunal ao sinistrado a quantia de €35.984,08”.

Neste domínio, porque as conclusões de recurso parecem querer imputar à decisão recorrida em sede de matéria de facto uma violação das regras do direito probatório material contidas no art. 674 nº3 do CPC, entende-se ser a revista admissível como normal quanto a este segmento (da matéria de facto).

Analisando, observamos que a sentença julgou provado esse facto (17) e fundamentou a sua convicção no depoimento de uma testemunha conjugado com um documento (notificação para entrega do capital de remição, o cálculo do capital de remição e o termo de entrega do capital de remição).

Contra isto defendeu a recorrente nas conclusões de apelação que esse facto não poderia ser julgado provado, baseando essa sua posição em que deveria ser outra a convicção do julgador uma vez que “ de todo depoimento da testemunha, não se retira que o pagamento efetuado, ao sinistrado tenha resultado da apólice em discussão nem tão pouco consta algum recibo de quitação”.

A decisão recorrida manteve esse facto como provado e entendeu que por ele não ter sido expressamente impugnado, nem posto em causa pela defesa no seu conjunto, nem a ré ter afirmado que não sabia se tal pagamento tinha tido lugar, deveria desde logo o mesmo ser admitido por acordo nos termos do artigo 574º nº 2 do Código de Processo Civil, por ser suscetível de confissão (não versando sobre direitos indisponíveis e para ser exercido não estava sujeito a prova por documento escrito).

Neste quadro de referência obtemos que o facto 17 dos provados foi assim julgado em 1ª instância com base em elementos de livre apreciação e foi impugnado pela recorrente por entender que a convicção do tribunal de 1ª instância havia sido inconvenientemente formada. Por seu turno, o acórdão recorrido veio considerar que esse facto 17 teria de ser julgado como provado por o mesmo se dever ter por admitido por acordo nos termos do art. 574 nº2 do CPC, não tendo por sua vez a recorrente no recurso de revista pedido que caso fosse decidido que o facto em questão não poderia ser admitido por acordo, se ordenasse ao Tribunal da Relação que apreciasse então a convicção formada na sentença para a prova desse facto.

Em rigor, a recorrente nas suas conclusões de recurso de revista não disputa claramente que a decisão recorrida tenha violado as regras de direito probatório material, designadamente, que a matéria de facto considerada como admitida por acordo não o pudesse ser por não estarem verificados os pressupostos do art. 574 nº2 do CPC (por dever essa matéria ter-se por impugnada; estar em oposição com a defesa no seu conjunto, não ser admissível confissão sobre os mesmos ou poderem ser provados por documento escrito). Repetindo o que escrevera nas alegações de apelação onde arremetia contra a deficiente convicção do julgador sobre elementos probatórios de livre apreciação, a recorrente imputou que que “o ónus imposto ao recorrente que impugna a matéria de facto, no que tange a indicação dos meios de prova que impõem decisão diversa da tomada, teve em vista essencialmente a situação em que a pretensão do recorrente se funda na existência de provas que conduzem a um resultado probatório diferente daquele que foi acolhido na decisão sob censura.

De facto, essa indicação parece mais talhada para os casos em que o recorrente sustenta existência de prova do contrário ou de contraprova daquela que na decisão sob censura foi relevada (veja-se o artigo 346º do Código Civil).

Não é possível proceder à indicada de contraprova do que não existe.

Tal como não é possível, a ausência de posição, quanto a factos que não são do conhecimento do reu, nem são passiveis do seu conhecimento por neles não ter qualquer intervenção.”

Contudo, do que a recorrente refere, tem-se como aproveitável em sede de revista e com incidência no direito probatório material, a alusão que parece querer realizar, no final, a que não poderia ser tomado por acordo facto que não seria do seu conhecimento pessoal. Porém, não sofre censura o que o acórdão recorrido acolhe quanto a tal matéria não ter sido expressamente impugnada, nem posta em causa pela defesa no seu conjunto (por a ré não ter afirmado que não sabia se tal pagamento tinha tido lugar) pelo que se encontra respeitado o direito probatório em matéria de prova fixada legalmente no art. 574 nº2 do CPC e, acresce ainda, a sentença (diferentemente) por não ter considerado esse facto admitido por acordo, julgou-o provado com base na prova de livre apreciação. Assim, mesmo que no caso se acolhesse (e não acolhe) que não havia admissão por acordo, esta decisão de revista teria de aceitar o facto discutido como provado por ele resultar do julgamento realizado em 1ª instância com base na prova de livre apreciação. Efetivamente, a não admissão por acordo colocaria de novo esse facto no âmbito dos discutíveis e a provar e, nessa conformidade, não se podendo remeter os autos ao tribunal recorrido para apreciar a convicção formada na sentença (porque tal não consta do objeto da revista) não haveria então fundamento para, em matéria de livre convicção, este STJ se pronunciar.

Em resumo, não se verificando violação das regras de direito probatório material, improcede o recurso de revista tendo por objeto esse segmento.

… …

No mais, e referente ao mérito da causa, a recorrente aceitando existir dupla conforme, para a admissibilidade da revista que interpõe, não se socorre diretamente do art. 671 nº1 do CPC e tão pouco esgrime que deva a revista ser recebida ao abrigo desse preceito depois de declarada a inconstitucionalidade do mesmo. Limita-se a interpor a revista excecional sem alegar qualquer dos fundamentos das alíneas do art. 672 nº1 do CPC e por essa razão deve a revista ser rejeitada.

A recorrente ao interpor recurso de revista da decisão recorrida, que não suspendeu a instância, invocou a existência de contradição de acórdãos e identificou o fundamento, mas essa invocação apenas serve para essa decisão (de suspensão da instância ) e não para a do mérito. Se interpõe revista excecional, como expressamente diz que o pretende fazer, e se baseia o recurso na al. c) do nº1 do art. 272 do CPC, então, deveria ter identificado a questão ou questões que (quanto ao mérito) estariam em contradição com um outro acórdão, devendo igualmente identificar esse acórdão juntando cópia e nota de trânsito em julgado. O que se verifica é que, quanto ao mérito da causa, a recorrente não identifica qualquer questão que esteja em contradição com algum acórdão do Supremo e não identifica também qualquer acórdão fundamento.

Como no caso em presença e quanto à decisão de mérito proferida na decisão recorrida não foi suscitada essa contradição, e porque nenhum outro fundamento do art. 671 nº1 é alegado, não se admite a revista excecional interposta.

Por fim, e no âmbito das inconstitucionalidades alegadas, sem embargo de, como a antes advertimos, nenhuma das normas invocadas pelo recorrente como inconstitucional ter tido intervenção na presente decisão, sempre diremos que elas não ocorrem.

Efetivamente o artigo 671º n.º 3 do CPC, não é inconstitucional quando limita o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça das decisões relativamente às quais exista dupla conforme, porque como o próprio TC já declarou “ o direito ao recurso em processo civil, e sobretudo o acesso ao recurso junto do Supremo Tribunal de Justiça, não encontra previsão expressa no artigo 20.º da Constituição, não resultando como uma imposição constitucional dirigida ao legislador, que, neste âmbito, dispõe de uma ampla margem de liberdade” e, sobretudo, que “a imposição da verificação dos pressupostos do recurso de revista consagrados no artigo 671.º, n.º 1, do CPC, como delimitativa da admissibilidade do recurso de revista […] não se afigura arbitrária ou aleatória, antes encontrando uma justificação objetiva na teleologia deste tipo de recurso – que visa, como referimos, a proteção do interesse geral na boa aplicação do direito e a segurança jurídica no âmbito de causas que legalmente se encontram impedidas, por motivo estranho à alçada, de ser submetidas à apreciação do Supremo Tribunal de Justiça – conjugada com uma política de racionalização do acesso ao órgão de cúpula da ordem jurisdicional” - Cf. acórdão do Tribunal Constitucional n.º 159/2019, de 13 de Março de 2019, retificado pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 206/19, de 27 de Março de 2019.

Quanto à inconstitucionalidade invocada das normas presentes na al. c), n.º 1, art. 276 e art. no 279 do CPC, no sentido de não ser suscetível suspender uma causa, sempre que, exista uma sentença, transitada em julgado, que determina o direito de regresso sem apurar da responsabilidade efetiva do alegado devedor e esteja em curso um outro processo que visa apurar essa responsabilidade efetiva, e declarar a nulidade do processado após a prolação do despacho em sede de audiência de julgamento, observe-se que o art. 272 nº1 que define o que é causa prejudicial não dispõe, em absoluto, que a verificada a prejudicialidade o tribunal tenha de decretar a suspensão. Por outro lado, não cabe na invocação da inconstitucionalidade da norma que define o que é uma causa prejudicial a decisão concreta sobre a prejudicialidade. Se o preceito enuncia o critério (de prejudicialidade) e este não é inconstitucional, nem o recorrente o argui, a aplicação concreta do conteúdo da norma legal, declarando em cada caso se ela existe ou não, não é matéria de fiscalização da inconstitucionalidade, mas, quando seja admissível, de recurso de mérito.

Em resumo é improcedente a revista interposta da decisão de (não) suspensão da instância; não é admissível a revista excecional sobre a decisão de mérito e são julgadas como não inconstitucionais as normas invocadas como tal pela recorrente.

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Síntese conclusiva

- O acórdão da Relação que aprecie decisão interlocutória que recaia unicamente sobre a relação processual, no caso a decisão que indeferiu a suspensão da instância, apenas pode ser objeto de revista, nos casos prevenidos no art. 629 nº2 do CPC.

- Este recurso exige a existência de um acórdão do STJ; que a contradição (frontal e não implícita) seja no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito.

- Afirmar-se num acórdão do STJ que a decisão de suspender ou não a instância é uma possibilidade colocada pelo legislador na disponibilidade do juiz que não equivale a poder ser usada indiscriminadamente, exigindo que se verifique uma prejudicialidade entre duas ações, sendo perante esta prejudicialidade que o tribunal pode optar por ordenar ou não ordenar a suspensão, é uma reflexão normativa de caráter geral que reproduzindo a lei em nada define uma solução concreta.

- Não existe contradição entre o acórdão-fundamento e o acórdão-recorrido quando ambos enunciam o mesmo critério de prejudicialidade apenas diferindo na aplicação desse critério à situação concreta de cada uma das ações, que têm, um quadro factual e uma natureza diferente.

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Decisão

Pelo exposto acordam os juízes deste tribunal em não admitir o recurso de revista interposta tendo por objeto a suspensão da instância;

Julgar improcedente a revista (normal) quanto à matéria de facto e, em consequência, confirmar nesta parte a decisão recorrida;

Julgar inadmissível a revista excecional referente à decisão de mérito e como não inconstitucionais as normas invocadas como tal pela recorrente.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 12 de outubro de 2023


Relator: Cons. Manuel Capelo

1ª adjunta: Srª. Juíza Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza

2º adjunto: Sr. Juiz Conselheiro Lino Ribeiro