Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3011/23.4YRLSB-A.S1
Nº Convencional: 5.ª SECÇÃO
Relator: JORGE GONÇALVES
Descritores: HABEAS CORPUS
FUNDAMENTOS
MANDADO DE DETENÇÃO EUROPEU
DETENÇÃO
INDEFERIMENTO
Data do Acordão: 10/19/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: HABEAS CORPUS
Decisão: IMPROCEDÊNCIA / NÃO DECRETAMENTO.
Sumário :

I - Os motivos de «ilegalidade da prisão», como fundamento da providência de habeas corpus, têm de reconduzir-se, necessariamente, à previsão das alíneas do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, de enumeração taxativa.


II – Estando em causa uma detenção com origem em mandado de detenção europeu, considerada válida e mantida por despacho do desembargador-relator na audição a que se reporta o artigo 18.º da Lei n.º 52/2023, de 28/08, o modo de impugnar a manutenção da detenção, em ordem à sua substituição por medida de coação prevista no CPP, é o recurso e não a providência de habeas corpus.

Decisão Texto Integral:




Habeas Corpus


Processo n.º 3011/23.4YRLSB-A.S1


5.ª Secção


Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I – RELATÓRIO


1. O peticionante, que se identifica com o nome de AA, com os sinais dos autos, veio, através do seu advogado, apresentar petição de habeas corpus, nos termos e com os fundamentos que se transcrevem:


«1. AA é súbdito do Tribunal da Relação da Comarca de Lisboa, natural de ..., ..., Brasil, preventivamente preso desde o dia 11/10/2023 com a especificação e tratamento (no que pese provido de previsão legal) carece de proporcionalidade e adequação da medida de coacção gravosa imposta neste caso em concreto.


2. A Prisão Preventiva foi baseada em circunstâncias relacionadas exclusivamente face ao perigo em abstrato do crime e a posterior decretação de prisão preventiva ao qual o ora extraditando supostamente figura como partícipe. Neste contexto, é indispensável salientar que, o ora extraditando nunca possuiu nenhum contato com sequer uma esquadra de polícia em toda sua vida e muito menos com qualquer processo criminal em nenhum lugar do mundo, sendo assim, sabido a sua reputação histórico criminal ilibada.


3. Isto posto, recorremos aqui ao estudo empírico da criminologia, já que ocorre a clara ocorrência da "VITIMIZAÇÃO SECUNDÁRIA", sendo este um claro caso, como traz o grande professor Sérgio Salomão Sheicaira, que o ora extraditando sofre com as consequências do suposto crime na Bélgica, tendo se evadido do lugar em questão para salvar o direito mais precioso resguardado por todos os diplomas normativos penais e constitucionais do mundo, o salvaguardo de sua vida, um bem de tutela indisponível, já que este vinha sendo ameaçado "in loco" e temendo por sua vida (com postagem de fotos na rede social de seu rosto no fundo, com frases que cidadãos marroquinos planejam um ataque e sua morte), não lhe restou outra alternativa a não ser ter que se evadir do pais supracitado com receio de sua própria vida, e não para fugir do pais ou justiça belga, tanto que foi para um pais ainda membro da União Europeia.


4. Se o extraditando tivesse premeditado a fuga (o que coloca em cheque a fundamentação de risco de fuga pela Justiça Portuguesa "a quo", data máxima vénia, teria retornado ao Brasil, sua Pátria, que não lhe extradita para outro país, e não para Portugal, trabalhar fixamente e residir fixamente no país de característica humanistas muito similar ao seu país de origem, de forma honesta sem prática de nenhum desvio de conduta em Portugal.


5. A vitimização secundária está claramente configurada por estar sofrendo tanto um processo danoso em todas as questões, tanto psicológicas, assim como, ameaças a sua integridade física, não obstante, apesar de viver em Portugal cerca de 1 (um) ano com trabalho e residência fixa, o extraditando vem a ser pela primeira vez objeto de controlo do sistema judiciário e policial português.


6. Nesta toada, vale ressaltar que o extraditando, vive de acordo com os princípios de um homem médio, possui trabalho fixo em Portugal - doc. 01, onde seu patrão traz ilibadas referências de seu comportamento mais do que exemplar, não só de um homem trabalhador, mas também de uma pessoa calma, tranquila e que convive com todos os demais em paz e serenidade.


7. Por sua vez, o ora extraditando, vive em residência fixa - doc. 01 em ... há 1 ano (sem nenhum outro novo fato perante a policia ou justiça portuguesa), que é fornecida pelo seu próprio empregador cidadão português, trabalhando como servente, não havendo, portanto, preenchido qualquer requisito para a Prisão Preventiva, prevista no art. 202 do CPP, pois, estamos aqui, colocando como ordem máxima, a Magna Carta, onde até o transito em julgado da sentença final condenatória, prevalece o principio da presunção de inocência, abarcado pelo artigo 32, n.º 2 da CRP, e o mais importante, não restando comprovado o perigo de fuga do ora extraditando.


8. Mister abrir um parêntese para anexar a Autenticação da Declaração objeto do doc. 01, senão vejamos em anexo no doc. 02 em anexo,


9. Somente é aplicável ao caso em concreto todas as medidas de coacção diversas menos gravosas da prisão preventiva, previstas nos artigos 198, 199, 200 e 201 todos do Código de Processo Penal.


10. É de suma importância salientar que, na Bélgica, onde supostamente houve o cometimento do delito, as penas para os crimes contra a vida superam o patamar de 30 anos, podendo chegar até a prisão perpétua, não há proporcionalidade à imputação de um patamar de pena dessa monta à um jovem de 22 anos que supostamente colaborou como partícipe de um crime (o que inexiste de fato, e o próprio MDE apresenta contradição nesse aspecto o que se frisará abaixo oportunamente), cumprir uma pena com uma moldura penal que dará a cabo o resto de sua vida, e desproporcional quanto comparada à moldura penal em Portugal.


11. No mais, e de extrema importância, o mandado de detenção europeu emitido traz em sua redação que o ora extraditando deve ser extraditado para o pais do cometimento do suposto delito, entretanto, agora, adentramos a uma seara muito delicada e perigosa, como podem Vossa Excelências verem, em anexo ao (Doc. 03), existem reais ameaças de retaliação contra à vida de AA, trazendo "Prints" de ameaça à sua vida, com a foto do seu rosto compartilhada nas redes sociais, caso este retorne em solo Belga.


12. Mister frisar que os marroquinos são o maior grupo de imigrantes na Bélgica, com 264.974 pessoas, conforme se comprova no link: https://pt.wikipedia.org/wiki/Bélgica


13. A petição de habeas corpus tem os fundamentos previstos taxativamente no art. 222.º, n.º 2. do CPP, que consubstanciam "situações clamorosas de ilegalidade em que, até por estar em causa um bem jurídico tão precioso como a liberdade ambulatória (...), a reposição da legalidade tem um carácter urgente". O "carácter quase escandaloso" da situação de privação de liberdade "legitima a criação de um instituto com os contornos do habeas corpus" (Cláudia Cruz Santos, "Prisão preventiva - habeas corpus - recurso ordinário", in RPCC, ano 10, n.º 2, 2000, pp. 303-312, p. 310).


14. O habeas corpus in casu não é confundido com um Recurso, já que a ilegalidade, base do presente Habeas Corpus, é manifesta, textual, decorrente de Decisão proferida pelo Juízo "a quo", e de diante da ilegalidade evidente e actual, com a aplicação e manutenção da medida de coação mais gravosa (prisão preventiva) quando na verdade o CPP e a Lei de Cooperação Jurídica Internacional em matéria penal demonstram no caso em concreto estarem preenchidos os requisitos para aplicação de medidas de coacção menos gravosas que a prisão preventiva.


15. E constitui jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal de Justiça, que é respeitada no Habeas Corpus em epigrafe, a excepcionalidade da providência e a sua distanciação da figura dos recursos. O habeas corpus não é um recurso e não se destina a decidir questões que encontram no recurso o seu modo normal de suscitação e de decisão.


16. Assim tem decidido na mesma esteira o Supremo, como se constata por exemplo no acórdão de 16-03-2015 (Rei. Santos Cabral), senão vejamos in verbis:


"II - A providência de habeas corpus não decide sobre a regularidade de actos do processo, não constitui um recurso das decisões em que foi determinada a prisão do requerente, nem é um sucedâneo dos recursos admissíveis. III - Nesta providência há apenas que determinar, quando o fundamento da petição se refira à situação processual do requerente, se os actos do processo produzem alguma consequência que se possa reconduzir aos fundamentos referidos no art. 222.º, n.º 2, do CPP. IV - Como não se substitui nem pode substituir-se aos recursos ordinários, o habeas corpus não é o meio adequado de pôr termo a todas as situações de ilegalidade da prisão, porquanto está reservado para os casos indiscutíveis de ilegalidade que impõem e permitem uma decisão tomada com a celeridade legalmente definida."


17. Preceitua, então, o art. 222.º do CPP, sob a epigrafe "Habeas corpus em virtude de prisão ilegal", que o Supremo tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência a qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa (n.º 1), que é o que ocorre neste caso.


18. Por força do n.º 2 da mesma norma jurídica, a ilegalidade da prisão deve (ou tem de) provir de uma das seguintes circunstâncias:


a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente;


b) Ser motivada por facto pelo qual a lei o não permite;


c) Se mantiver para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.


19. No presente caso, invoca-se como preenchido a ilegalidade na alínea b), já que além de todo o exposto acima, o próprio Mandado de Detenção Europeu contem contradição que foge a essência do devido processo legal e paridade de armas, pois uma hora dispõe expressamente que BB teria sacado a faca e desferido o golpe contra a vitima marroquina; e logo depois dispõe expressamente que AA, ora extraditando, teria passado a faca para BB cujo exerceu a ato de esfaquear, colocando em dúvida a existência do crime por parte do extraditando e demonstra inexistir indícios da prática de crime por parte de AA de forma gritante (o que preenche o in dubio pro reo), e a real existência da aplicação preventiva como medida de coacção mais gravosa (prisão preventiva) se analisada a individualização da pessoa de AA, ora extraditando, e sobretudo tal aplicação de acordo com a legislação portuguesa.


20. No presente caso, o Habeas Corpus é utilizado com natureza excepcional destinada a assegurar o direito à liberdade, como é utilizado, e não como Recurso, embora seja demonstrada a ilegalidade da Decisão do Juízo "a quo" que aplicou a prisão preventiva. 0 remédio é utilizado para ultrapassar situações de prisão decretadas a coberto de ilegalidade grosseira, sendo que no caso em concreto não estão preenchidos os perigos elencados no artigo 204 do CPP.


21. Além disso, de forma concomitante, resta cristalino preenchido todos os requisitos da Lei para a aplicação de medidas de coação menos gravosas que a prisão preventiva.


22. As medidas de coação são meios processuais de limitação da liberdade pessoal dos arguidos com o propósito de acautelar a eficácia do procedimento penal. Pois, como é do conhecimento geral, desde a notícia do crime até à fase de julgamento, por vezes há um enorme lapso temporal, o que nesse aspecto, se usado em analogia no caso do processo de extradição em epigrafe, demonstra a necessidade de revogação da prisão preventiva de imediato.


23. Plenamente cabível in casu a aplicação das medidas de coacção menos gravosas, a saber:


• Termo de identidade e Residência - art. 196° CPP (que já foi realizado no dia da prisão do extraditando)


• Obrigação de apresentação periódica - art. 198° CPP


• Suspensão de direitos - art. 199° CPP


• Proibição e imposição de condutas - art. 200° CPP


• Obrigação de permanência na habitação - art. 201° CPP


24. Preenchido in casu os arts.191° a 194° e 204° CPP.


25. É cediço que o MDE detém por si só indícios de crime sendo isso suficiente para a Justiça, entretanto, a contradição formal e expressa no MDE, referida acima, prejudica o "fumus comissi deliti", o que vai contra inclusive uma convicção de um homem médio e do poder judiciário.


26. Existe ainda os "pericula libertatis", previstos no art. 204° CPP, que não estão preenchidos no caso em epigrafe: fuga ou perigo de fuga (inexiste pois se assim fosse teria ido ao Brasil, pátria que não o extraditaria, o que pode ser evitado por vigilância eletrónica e comparecimento mensal na PSP); perigo de perturbação do decurso do inquérito ou da instrução do processo e perigo para a aquisição, conservação ou veracidade da prova (inexiste em solo português, já que o processo tramita na Bélgica); ou perigo em razão da natureza e circunstâncias do crime (a gravidade abstrata do crime não pode ser utilizada como único requisito pois desproporcional) ou da personalidade do Arguido (a personalidade do extraditando é positiva e não pode somente como 1 requisito ser utilizado a gravidade em abstrato do crime para afastar a aplicação de medidas de coacção menos gravosas que a prisão preventiva); de que este continue a actividade criminosa ou perturbe gravemente a ordem e a tranquilidade pública (inexiste com a aplicação de todas as medidas cautelares diversas da prisão preventiva, que for entendível como aplicadas in casu) .


27. Deve ser aplicada medidas de cocção menos gravosas, em garantia ao princípio da adequação e proporcionalidade, até o trânsito em julgado do processo de extradição, que ainda está em fase embrionária (para oferecimento de oposição no Tribunal da Relação), assim como a fase embrionária da investigação belga, que no MDE não indica nenhum indício de prática de crime por AA, muito pelo contrário) . O diz que me diz, a contradição existente no MDE não pode prosperar a manutenção de uma prisão preventiva como é no caso em concreto.


28. A prisão preventiva é a mais grave das medidas de coacção e só pode ser aplicada se todas as outras forem inadequadas ou insuficientes (e neste caso, ocorre totalmente ao contrário, são adequadas e aplicáveis outras medidas de cocção menos gravosas).


29. Resta acrescentar que a prisão preventiva é das medidas de coacção mais agressivas no ordenamento jurídico pois é privativa da liberdade, e tendo em conta o principio da presunção da inocência patente no art. 32° CRP, impõe-se que as medidas de coacção sejam aplicadas nos estritos limites das necessidades processuais, e no caso em concreto nota-se que a prisão preventiva é desnecessária processualmente.


30. Isto tudo posto, é a presente para requerer digne-se Vossa Excelência de determinar a revogação da prisão preventiva do extraditando, e que lhe seja aplicada medidas de coacção menos gravosas que a prisão preventiva, quais sejam:


Termo de identidade e Residência - art. 196° CPP (que já foi realizado no dia da prisão do extraditando);


Obrigação de apresentação periódica - art. 198° CPP;


Suspensão de direitos - art. 199° CPP;


Proibição e imposição de condutas - art. 200° CPP;


Obrigação de permanência na habitação - art. 201° CPP,


31. Nota-se ser assim possível garantir da mesma forma o que visa garantir na prisão preventiva que hoje prospera (o que demonstra ser a prisão ilegal, abusiva e desproporcional), devendo ser revogada a medida de cocção mais gravosa por todos os motivos de fato e de direito elencados no habeas corpus em epigrafe, sob pena de constrangimento ilegal.


32. Por derradeiro, importante esclarecer quem é AA, sua personalidade e história de vida: seus pais faleceram no Brasil quando tinha 7 meses de idade, e sempre foi criado por sua avó no Brasil pessoa muito humilde sem ter até o que comer, e foi para Bélgica buscar melhores condições de vida para poder ajudar a avó, e infelizmente, estava no local errado e na hora errada, mas nada praticou de ilícito, conforme consta no MDE.


Relação de documentos em anexo:


Doc. 1 - declaração de trabalho fixo e declaração de residência fixa


Doc. 2 - Autenticação do documento de trabalho e residência fixa


Doc. 3 - Ameaças de vida sofridas por AA na Bélgica por marroquinos com a foto do seu rosto compartilhada nas redes sociais em Bruxelas»


2. A informação a que se refere o artigo 223.º, n.º 1, do Código de Processo Penal (doravante CPP), é a seguinte:


«Nos termos e para os efeitos do art. 223º, n.º 1 do C.P.P., deixa-se consignado que:


a) AA foi detido no passado dia 11 de Outubro de 2023;


b) Ouvido no dia 13 de Outubro de 2023, nos termos e para os efeitos do art. 18º da Lei n.º 65/2003, de 23/8, foi determinada a manutenção da detenção;


c) A manutenção da detenção é, no caso, a medida adequada, necessária e proporcional à satisfação das finalidades inerentes ao MDE, de modo a evitar o risco de o detido se furtar à execução do pedido de entrega.»


3. O processo encontra-se instruído com a documentação pertinente.


4. Convocada a secção criminal e notificados o Ministério Público e o defensor, realizou-se audiência, em conformidade com o disposto nos n.ºs 2 e 3 do artigo 223.º do CPP.


Após o que a secção reuniu para deliberar (artigo 223.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPP), fazendo-o nos termos que se seguem.


II – FUNDAMENTAÇÃO


Questão a decidir:


Saber se o peticionante se encontra ilegalmente em prisão preventiva, nos termos do artigo 222.º, n.º 2, al. b), do CPP, sendo a “prisão preventiva” “ilegal, abusiva e desproporcional”, devendo ser revogada e substituída por medidas coativas menos gravosas.


1. Factos


A matéria factual relevante para o julgamento do pedido resulta da petição de habeas corpus, da informação prestada e da certidão que acompanha os presentes autos, extraindo-se os seguintes dados de facto e processuais (em súmula):


1. No dia 11.10.2023, pelas 15h30, o cidadão AA, de nacionalidade brasileira, foi localizado e detido pela PJ, por se ter apurado constar do SIS II um pedido de detenção, por ter sido emitido contra si um MDE (N.º Schengen: .............................01) pelas autoridades judiciárias da Bélgica, mais concretamente o Juiz de Instrução do Tribunal … de 1.ª instância de ..., para efeitos de procedimento criminal, no âmbito do processo J............ ................22, da referida comarca.


2. O referido cidadão é alvo de procedimento criminal, no referido tribunal e processo, como forte suspeito de ter participado nos eventos que conduziram à morte de CC, ocorrida em 28.11.2022, na Praça ..., em ..., como autor de um crime de assassinato /ferimento grave, previsto e punível pelos artigos 392 e 393 do Código Penal da Bélgica, com pena de 20 a 30 anos de prisão.


3. Procedeu-se à audição do detido, no dia 13.10.2023, no Tribunal da Relação de Lisboa, nos termos do artigo 18.º da Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, tendo aquele declarado opor-se à entrega e não renunciar ao princípio da especialidade.


4. Proferiu, então, o Ex.mo Juiz Desembargador, despacho nos seguintes termos:


«A inserção no Sistema de Informação Schengen e o Mandado de Detenção Europeu emanam da autoridade judiciária competente, contêm as informações legalmente exigidas, este é o Tribunal competente para executar o mandado e o crime em causa enquadra-se no disposto no artigo 2.°, n.º 2, alínea o) da Lei n.º 65/2003.


Tendo em vista o não consentimento do detido à sua entrega e já tendo o mesmo feito o uso do artigo 21,°, n.º 1 da Lei n." 65/2003, e concedida a palavra ao Ministério Público nos termos do n.º 3 do mesmo artigo, não tendo sido requerida qualquer produção de prova, cumpre tão só fixar medida de coacção e oportunamente que os autos serem conclusos para os efeitos do artigo 22.°,


Quanto à manutenção da detenção:


A detenção e entrega são os únicos objectivos do mandado de detenção europeu, visando a primeira a efectivação da segunda, Por isso, em princípio, a detenção efectuada no âmbito do mandado de detenção europeu - medida autónoma, não totalmente coincidente com as de coacção, designadamente com a prisão preventiva, quando validada pelo tribunal, deve ser mantida até à entrega, sem embargo de poder (e dever) ser substituída por medida de coacção, como estabelece o n.º 3 do artigo 18.º da Lei n.º 65/2003, designadamente quando a detenção se mostre desnecessária à obtenção do desiderato do mandado, ou seja, à efectivação da entrega (cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21/11/2012, processo n.º 211/12.6YRCBR, www.dgsi.pt).


Fazendo apelo ao próprio mandado e à gravidade dos factos delituosos que determinaram a sua emissão


- 1 crime de assassinato/ferimento corporal grave - a circunstância de o requerido não ter nacionalidade portuguesa, estando em Portugal já desde Novembro de 2022, segundo afirma e só com a dificuldade de se lembrar onde reside, entendemos que a manutenção da detenção se mostra a medida adequada, necessária e proporcional para a satisfação das finalidades inerentes ao mandado de detenção europeu, de modo a evitar o risco de o detido se eximir ao pedido de entrega.


Assim, para além de se validar a detenção efectuada decide-se que o requerido aguarde os ulteriores termos do processo nessa situação.


Passe mandados de condução ao Estabelecimento Prisional de .... /


Proceda às comunicações habituais, concretamente, à P.G,R, à Interpol e às autoridades judiciais belgas.»


*


2. Direito


2.1. Nos termos do artigo 27.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP), todos têm direito à liberdade e ninguém pode ser privado dela, total ou parcialmente, a não ser em consequência de sentença judicial condenatória pela prática de ato punido por lei com pena de prisão ou de aplicação judicial de medida de segurança.


Excetua-se a privação da liberdade, no tempo e nas condições que a lei determinar, nos casos previstos no n.º 3 do mesmo preceito constitucional, em que se incluem: (a) a detenção em flagrante delito; (b) a detenção ou prisão preventiva por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos; (c) a prisão, detenção ou outra medida coativa sujeita a controlo judicial, de pessoa que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou de expulsão; (d) a prisão disciplinar imposta a militares, com garantia de recurso para o tribunal competente; (e) a sujeição de um menor a medidas de proteção, assistência ou educação em estabelecimento adequado, decretadas pelo tribunal judicial competente; (f) a detenção por decisão judicial em virtude de desobediência a decisão tomada por um tribunal ou para assegurar a comparência perante autoridade judiciária competente; (g) a detenção de suspeitos, para efeitos de identificação, nos casos e pelo tempo estritamente necessários e; (h) o internamento de portador de anomalia psíquica em estabelecimento terapêutico adequado, decretado ou confirmado por autoridade judicial competente.


O artigo 31.º da CRP consagra o direito à providência de habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer pela própria pessoa lesada no seu direito à liberdade, ou por qualquer outro cidadão no gozo dos seus direitos políticos, por via de uma petição a apresentar no tribunal competente.


Em anotação ao artigo 31.º, n.º 1, da CRP, escrevem Gomes Canotilho e Vital Moreira (Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, 2007, p. 508):


«Na sua versão atual, o habeas corpus consiste essencialmente numa providência expedita contra a prisão ou detenção ilegal, sendo, por isso, uma garantia privilegiada do direito à liberdade, por motivos penais ou outros, garantido nos arts. 27.º e 28.º (...). A prisão ou detenção é ilegal quando ocorra fora dos casos previstos no art. 27.º, quando efetuada ou ordenada por autoridade incompetente ou por forma irregular, quando tenham sido ultrapassados os prazos de apresentação ao juiz ou os prazos estabelecidos na lei para a duração da prisão preventiva, ou a duração da pena de prisão a cumprir, quando a detenção ou prisão ocorra fora dos estabelecimentos legalmente previstos, etc.


Sendo o único caso de garantia específica e extraordinária constitucionalmente prevista para a defesa dos direitos fundamentais, o habeas corpus testemunha a especial importância constitucional do direito à liberdade.»


O artigo 222.º do CPP, dando expressão ao referido artigo 31.º da CRP, dispõe, sob a epígrafe “Habeas corpus em virtude de prisão ilegal”:


«1 - A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus.


2 - A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de:


a) Ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente;


b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou


c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial.»


A jurisprudência deste Supremo Tribunal vem considerando que os fundamentos do habeas corpus são aqueles que se encontram taxativamente fixados na lei, não podendo esse expediente ser utilizado para a sindicância de outros motivos suscetíveis de pôr em causa a regularidade ou a legalidade da prisão (acórdão de 06.04.2023, proc. n.º 130/23.0PVLSB-A.S1, disponível em www.dgsi.pt, como outros que sejam citados sem diversa indicação).


Tem também decidido uniformemente o Supremo Tribunal de Justiça que a providência de habeas corpus, por um lado, não se destina a apreciar erros de direito, nem a formular juízos de mérito sobre decisões judiciais determinantes da privação da liberdade (por todos, o acórdão do STJ, de 04.01.2017, proc. n.º 109/16.9GBMDR-B. S1, e jurisprudência nele citada) e, por outro, que a procedência do pedido pressupõe a atualidade da ilegalidade da prisão, reportada ao momento em que é apreciado o pedido (entre muitos, o acórdão de 19.07.2019, proferido no proc. n.º 12/17.5JBLSB, com extensas referências jurisprudenciais).


Os motivos de «ilegalidade da prisão», como fundamento da providência de habeas corpus, têm de reconduzir-se, necessariamente, à previsão das alíneas do n.º 2 do artigo 222.º do CPP, de enumeração taxativa.


Como se tem afirmado repetidamente, em jurisprudência uniforme, o Supremo Tribunal de Justiça apenas tem de verificar (a) se a prisão, em que o peticionante atualmente se encontra, resulta de uma decisão judicial exequível, proferida por autoridade judiciária competente, (b) se a privação da liberdade se encontra motivada por facto que a admite e (c) se estão respeitados os respetivos limites de tempo fixados na lei ou em decisão judicial (acórdãos de 16.11.2022, proc. 4853/14.7TDPRT-A.S1, de 18.05.2022, proc. 37/20.3PJLRS-A.S1, e de 06.09.2022, proc. 2930/04.1GFSNT-A.S1), não constituindo a providência de habeas corpus um recurso sobre atos de um processo através dos quais é ordenada ou mantida a privação da liberdade, nem um sucedâneo dos recursos admissíveis, que são os meios adequados de impugnação das decisões judiciais (acórdão de 10.01.2023, proc. 451/21.7POLSB-D.S1).


Assinala o acórdão de 21.10.2021, proc. 260/11.1JASTB-F.S1, que os recursos ordinários e o habeas corpus são institutos diversos, com processamento e prazos diferentes por virtude de prisão ou detenção que o requerente considere ilegais, cuja diversidade mais se acentuou com a alteração da Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, introduzida no artigo 219.º do CPP, quando passou a consignar no seu n.º 2, a propósito da impugnação das medidas de coação: «Não existe relação de litispendência ou de caso julgado entre o recurso previsto no número anterior e a providência de habeas corpus, independentemente dos respetivos fundamentos.»


Ainda que, atualmente, o uso da providência de habeas corpus não tenha como pressuposto a exaustão de recursos ordinários, é assumido pela jurisprudência deste Supremo que o mecanismo do habeas corpus deve apenas ser utilizado em casos extremos de abuso de poder ou erro grosseiro na aplicação do direito, não almejando esta providência a reanálise do caso, mas sim a constatação da ilegalidade, que por isso mesmo tem de ser patente.


Diz-se no referido acórdão de 21.10.2021:


«A jurisprudência deste Supremo Tribunal tem sublinhado que a providência de habeas corpus não constitui um recurso sobre atos de um processo através dos quais é ordenada ou mantida a privação da liberdade do arguido, nem um sucedâneo dos recursos admissíveis, que são os meios adequados de impugnação das decisões judiciais. Esta providência não se destina a apreciar erros de direito e a formular juízos de mérito sobre decisões judiciais determinantes de privação da liberdade.


Não sendo um recurso, - ordinário ou extraordinário - não é uma via procedimental para submeter ao STJ a reapreciação da decisão da instância que determinou a prisão ou à ordem da qual o requerente está privado da liberdade. Não se destina a questionar o mérito do despacho judicial ou da sentença condenatória que impôs a prisão nem a sindicar eventuais nulidades ou irregularidades de que possam enfermar.»


Trata-se, assim, de uma providência destinada a pôr um fim expedito a situações de privação arbitrária da liberdade ou contra a manutenção de uma prisão manifestamente ilegal - ilegalidade grosseira, aparente, ostensiva, indiscutível.


2.2. In casu, a detenção do peticionante e a sua manutenção têm origem num Mandado de Detenção Europeu (MDE).


O MDE constitui a primeira concretização no domínio penal do princípio do reconhecimento mútuo, no âmbito do espaço de segurança e justiça (cf. Anabela Miranda Rodrigues, “O mandado de detenção europeu – Na via da construção de um sistema penal europeu: um passo ou um salto?”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 13, n.º 1, Janeiro-Março, 2003, pp. 27 ss.; Ricardo Jorge Bragança de Matos, “O princípio do reconhecimento mútuo e o mandado de detenção europeu”, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Ano 14, n.º 3, Julho-Setembro, 2004, pp. 325 ss.).


A evolução das formas de cooperação penal, no âmbito europeu, deu origem a diversos instrumentos que, além do mais, visaram modernizar os procedimentos em matéria extradicional. Porém, foi sobretudo com o Tratado de Amesterdão que a cooperação judiciária em matéria penal ganhou uma nova perspetiva, como forma de realização de um espaço de liberdade, de segurança e de justiça.


O aprofundamento desta dimensão, inspirada na noção de “espaço europeu” e orientada no sentido da construção de um espaço judiciário comum, foi impulsionado pelo Conselho Europeu de Tampere, de 15 e 16 de outubro de 1999, que afirmou, nas suas conclusões, o princípio do reconhecimento mútuo como “pedra angular” da cooperação judiciária em matéria penal, preconizando a abolição do processo formal de extradição no que diz respeito às pessoas julgadas à revelia, cuja sentença já tivesse transitado em julgado, bem como a aceleração dos processos de extradição relativos às pessoas suspeitas de terem praticado uma infracção (ponto 35 das conclusões).


A Decisão-Quadro do Conselho, de 13 de junho de 2002 (2002/584/JAI), relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros, constitui, precisamente, uma concretização – a primeira - no domínio penal do referido princípio do reconhecimento mútuo, que visa superar a conceção tradicional do auxílio judiciário entre Estados.


Foi para concretizar a referida Decisão-Quadro, na legislação interna, que a Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, publicada no Diário da República, I Série - A, n.º 194, de 23 de agosto de 2003, aprovou o regime jurídico do MDE, alterado pela Lei n.º 35/2015, de 4 de maio, e pela Lei n.º 115/2019, de 12 de setembro.


Concretizando, o MDE é uma decisão judiciária emitida por um Estado membro com vista à detenção e entrega por outro Estado membro de uma pessoa procurada para efeitos de procedimento criminal ou para cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas da liberdade – artigo 1.º, n.º1, da Lei n.º 65/2003.


O MDE é executado com base no princípio do reconhecimento mútuo e em conformidade com o disposto na supra referida Lei e na Decisão-Quadro - artigo 1.º, n.º2, da Lei n.º 65/2003.


Pode ser emitido por factos puníveis, pela lei do Estado membro de emissão, com pena ou medida de segurança privativas de liberdade de duração máxima não inferior a 12 meses ou, quando tiver por finalidade o cumprimento de pena ou de medida de segurança, desde que a sanção aplicada tenha duração não inferior a 4 meses, sem controlo, em muitos casos, da dupla incriminação (artigo 2.º).


Nos termos da Lei e da Decisão-Quadro, o MDE dirige-se quer ao cumprimento da decisão final do processo criminal – “cumprimento de uma pena ou medida de segurança privativas da liberdade” -, quer ao cumprimento de um procedimento processual no decurso do processo – “efeitos de procedimento criminal”.


O mencionado princípio do reconhecimento mútuo significa que uma decisão judicial tomada por uma autoridade judiciária de um Estado membro com base na sua legislação interna será reconhecida e executada pela autoridade judiciária de outro Estado membro, produzindo efeitos pelo menos equivalentes a uma decisão tomada por uma autoridade judiciária nacional (veja-se, a este propósito, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 25.06.2009, processo n.º 1087/09.6YRLSB.S1).


À autoridade judiciária do país da execução compete verificar se o mandado contém as informações constantes do artigo 3.º da Lei n.º 65/2003, bem como analisar se ocorre qualquer causa de recusa obrigatória (artigo 11.º) ou facultativa (artigo 12.º) de execução.


Como se diz no acórdão do STJ de 25.06.2009 (supra citado), «a sindicância judicial a exercer no Estado recetor é muito limitada, perfunctória, sem abandono, contudo, pese embora a sua celeridade, do respeito por aqueles direitos fundamentais, produzindo a decisão no Estado emitente efeitos pelo menos equivalentes a uma decisão tomada pela autoridade judiciária nacional (…)».


No âmbito do MDE, compete ao juiz relator proceder à audição do detido, no prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção, e decidir sobre a validade e manutenção desta, podendo aplicar-lhe medida de coação prevista no CPP.


Como é sublinhado no acórdão deste STJ, de 21.11.2012, proc. 211/12.6YRCBR, detenção e entrega são os únicos objetivos do MDE, visando a primeira a efetivação da segunda. Isto é, a detenção no âmbito do MDE tem por finalidade a entrega de pessoa procurada ao Estado emissor, entrega que, obviamente, só tem lugar após a tomada de decisão sobre a validade da detenção e sobre a verificação dos requisitos legais de que depende a execução do mandado.


Por isso, em princípio, a detenção efectuada no âmbito do MDE, quando validada pelo tribunal, deve ser mantida até à entrega, sem embargo de poder (e dever) ser substituída por medida de coação, como estabelece o n.º 3, do artigo 18.º, da Lei n.º 65/03, designadamente quando a detenção se mostre desnecessária à obtenção do desiderato do mandado, ou seja, à efetivação da entrega.


Diz-se no acórdão de 21.11.2012:


«O texto do n.º 3 do artigo 18.º da Lei n.º 65/03, ao estabelecer que o juiz relator procede à audição do detido, no prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção, e decide sobre a validade e manutenção desta, podendo aplicar-lhe medida de coação prevista no Código de Processo Penal, considera que a detenção no âmbito do mandado, mais concretamente a sua manutenção, constitui medida autónoma, não totalmente coincidente com as de coação, designadamente com a prisão preventiva. A letra da lei ao aludir à aplicação de medida de coacção prevista no Código de Processo Penal tout court, e não à aplicação de outra medida de coação prevista no Código de Processo Penal, estabelece uma clara distinção entre a detenção no âmbito do mandado e a prisão preventiva no âmbito do processo penal.»


Atente-se, porém, que no acórdão de 21.11.2012 estava em causa um recurso do despacho do relator que manteve a detenção e não uma providência de “habeas corpus”.


No caso agora em apreço, o juiz relator considerou válida a detenção e decidiu no sentido da sua manutenção, apresentando a fundamentação que julgou pertinente.


Não se mostra questionada na presente providência – nem vemos que, no caso, o pudesse ter sido – a competência da entidade que validou e manteve a detenção, do mesmo modo que, decorridos escassos dias após a sua verificação (de sexta-feira para segunda-feira imediata), seguramente não estão excedidos os respetivos prazos de duração máxima.


É manifesto, igualmente, que a detenção e a sua manutenção têm respaldo legal.


Por conseguinte, se o peticionante pretendia sindicar a decisão de manutenção da detenção e pugnar por medidas alternativas, o caminho a seguir deveria ser o recurso, por se tratar de decisão recorrível, nos termos do artigo 24.º, n.º1, al. a), da Lei n.º 65/2003.


Temos como patente que o peticionante utiliza o expediente de habeas corpus não para colocar termo imediato a uma situação de privação ilegal e arbitrária da sua liberdade – que não se verifica -, mas como uma forma substitutiva do recurso que não interpôs.


A utilização manifestamente indevida do habeas corpus por parte do peticionante é particularmente evidenciada na pretensão de que este Supremo substitua a detenção por medidas de coação do CPP, o que não tem qualquer cabimento legal no âmbito deste expediente.


Em consequência do exposto se conclui que o pedido carece manifestamente de fundamento, devendo ser indeferido [artigo 223.º, n.º 4, al. a), e 6 do CPP].


*


III - DECISÃO


Pelo exposto, acordam os juízes desta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em indeferir a providência de habeas corpus ora em apreciação, julgando-a manifestamente infundada.


Custas pelo requerente, com 2 UC de taxa de justiça, sendo ainda condenado, nos termos do artigo 223.º, n.º 6, do CPP, na importância de 8 UC a título de sanção processual.


Supremo Tribunal de Justiça, 19 de outubro de 2023


(certifica-se que o acórdão foi processado em computador pelo relator e integralmente revisto e assinado eletronicamente pelos seus signatários, nos termos do artigo 94.º, n.ºs 2 e 3 do CPP)


Jorge Gonçalves (Relator)


António Latas (1.º Adjunto)


Orlando Gonçalves (2.º Adjunto)


Helena Moniz (Presidente da Secção)