Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0257/17.8BELRA
Data do Acordão:12/09/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:IMPOSTO DE SELO
OPERAÇÕES FINANCEIRAS
Sumário:As operações financeiras entre sociedades do mesmo grupo que não respeitem o disposto no artigo 7º, n.º 1, g) do Código do Imposto do Selo não estão isentas do pagamento do respectivo imposto.
Nº Convencional:JSTA00071345
Nº do Documento:SA2202112090257/17
Data de Entrada:10/30/2020
Recorrente:A.................., SGPS, LDA
Recorrido 1:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECURSO JURISDICIONAL
Objecto:SENTENÇA TAF DE LEIRIA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:IMPOSTO DE SELO
Legislação Nacional:artigo 7º, n.º 1, g) do Código do Imposto do Selo
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:


A……………………., SGPS, SA, Impugnante/Recorrente nos autos acima referidos, inconformada, interpôs recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria (TAF de Leiria), datada de 20 de Junho de 2020, que julgou improcedente a impugnação judicial que intentara contra o despacho da Chefe de Divisão de Gestão e Assistência Tributária, da Unidade dos Grandes Contribuintes, datado de 04 de Novembro de 2016, mediante o qual foi indeferida a reclamação graciosa que apresentou contra as liquidações de Imposto de Selo (IS) e de juros compensatórios, do período de tributação de 2013, no valor total a pagar de € 12.139,79.

Alegou, tendo apresentado as seguintes conclusões:
“1. Estão em causa operações financeiras de abertura de crédito em conta corrente, por parte da Impugnante/Recorrente, a favor da AI, por prazos inferiores a 1 ano, destinadas exclusivamente a suprir carências de tesouraria da AI.
2. A AI era titular de 100% do capital social da Impugnante/Recorrente e esta detinha 0,1% do capital social da AI. 3. As operações financeiras em questão beneficiam da isenção de IS prevista no artigo 7º nº 1 g) do CIS, pelo que a douta Sentença padece de erro de julgamento e violação dos artigos 1º nº 1 e 7º nº 1 g) do CIS, e verba 17.1 da TGIS anexa ao CIS.
4. A Impugnante/Recorrente e a AI eram ambas dominadas e detidas, directamente (no caso da AI) e indirectamente (no caso da Impugnante/Recorrente), apenas pela sociedade CA, uma SGPS,
5. Estando, por isso, numa relação de grupo e de domínio total entre todas elas, nos termos dos artigos 486º e 488º e ss. do CSC.
6. A Impugnante/Recorrente, uma SGPS, fez operações (financeiras) de tesouraria, por prazo inferior a 1 ano, em benefício indirecto/último de uma SGPS, a CA, que com a Impugnante/Recorrente se encontrava em relação de domínio/grupo.
7. O que está em paralelo com o regime jurídico-societário das SGPS’s, do qual resulta a possibilidade legal das SGPS’s serem beneficiárias de operações de tesouraria, efectuadas por sociedades que com aquelas se encontrem em relação de grupo ou de domínio - independentemente da relação de participação directa ou indirecta entre elas.
8. E o regime fiscal da isenção de IS em questão deve ser interpretado coerentemente com o regime jurídico-societário das SGPS’s - o princípio fundamental de interpretação normativa da unidade do sistema jurídico como um todo assim demanda (cfr. artigo 9º nº 1 do CC, ex vi do artigo 11º nº 1 da LGT).
9. Sendo as isenções de imposto benefícios fiscais (cfr. o artigo 2º nº 2 do EBF), as normas que estabeleçam benefícios fiscais admitem interpretação extensiva (e não restritiva), nos termos do artigo 10º do EBF – obviamente, no sentido da sua extensão, em benefício do contribuinte, e não em seu prejuízo.
Sem prescindir,
10. A AT/Recorrida considera que as operações financeiras em questão estariam vedadas por lei (cfr. alínea c), nº 1, do artigo 5º do DL nº 495/88, de 30/12), pelo que não poderiam beneficiar da isenção de IS do artigo 7º nº 1 g) do CIS.
11. Segundo afirma a AT, aquele preceito legal veda a concessão de crédito por parte de uma SGPS a favor de qualquer sociedade em que não detenha uma participação qualificada.
12. Embora a alínea c) do nº 1 do artigo 5º, em princípio, proíba à SGPS a concessão de crédito, o nº 3 do mesmo preceito afirma que não constitui concessão de crédito (ou seja, são legalmente admissíveis) as operações de tesouraria efectuadas em benefício da SGPS pelas sociedades participadas em relação de domínio ou de grupo com a SGPS – é o caso, já que a AI era detida a 100% pela CA e esta detinha indirectamente a Impugnante/Recorrente.
13. Assim, não foi violado o disposto no artigo 5º do DL nº 495/88, de 30/12 - não existia qualquer interdição legal às operações financeiras em questão.
14. De acordo com a alínea d) do nº 2 do artigo 9º do RGICSF, as operações de tesouraria, entre sociedades que se encontrem numa relação de domínio ou de grupo, não são consideradas concessão de crédito - pelo que não estão abrangidas pelo princípio geral da exclusividade do exercício da actividade de concessão de crédito pelas instituições de crédito e sociedades financeiras.
Sendo certo que,
15. O entendimento aqui propugnado foi já sufragado, designadamente, pela jurisprudência arbitral, de que é exemplo o douto Acórdão de 07.10.2019, do CAAD, proferido no Processo nº 294/2019-T.
Sem prescindir,
16. Ainda que, por mera hipótese, tivesse sido violado o regime jurídico-societário do DL nº 495/88, de 30/12, jamais essa eventual violação colocaria em causa a isenção de IS.
17. Com efeito, os pressupostos legais da sujeição ou isenção de imposto estão consignados na respectiva lei fiscal – e não na lei das SGPS’s.
18. A eventual violação do regime jurídico-societário das SGPS’s, consagrado no DL nº 495/88, de 30/12, poderia, quando muito, sujeitar a sociedade infractora ao regime sancionatório contraordenacional previsto no artigo 13º nº 1 daquele DL.
Também sem prescindir,
19. Os documentos particulares gozam de força probatória plena, nos termos do artigo 376º, nº 1, do CC.
20. As partes, dentro dos princípios fundamentais da autonomia privada e da liberdade contratual (cfr. artigo 405º do CC), vincularam-se juridicamente nos termos dos documentos analisados pela AT e mencionados no relatório inspectivo.
21. A menos que se demonstre ter havido abuso de formas jurídicas (cfr. artigo 38º nº 2 da LGT), em que os efeitos económicos não se coadunariam com os acordos firmados – o que a AT não demonstrou (aliás, se fosse o caso, a AT deveria observar o procedimento especial de aplicação de normas anti-abuso, cfr. artigo 63º do CPPT, o que não sucedeu),
22. O enquadramento jurídico-fiscal deve respeitar a vontade das partes e os efeitos económicos e reais que daí advieram - ainda que as partes, por mera hipótese, se tivessem vinculado em violação do regime do DL 495/88, de 30 de Dezembro.
23. Com efeito, por força do nº 1 do artigo 38º da LGT, a eventual invalidade ou ineficácia jurídica dos negócios jurídicos não obsta à sua tributação, caso se tenham produzido os efeitos económicos visados pelas partes – como foi o caso.
Mais,
24. A própria Direcção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património, na Circular nº 3, de 20/02/1997 (averbada de Despacho concordado da DGI), entende que as "operações de tesouraria” são, entre outras, as operações financeiras efectuadas em benefício da sociedade gestora de participações sociais pelas sociedades participadas que com ela se encontrem em relação de domínio ou de grupo.
25. O regime legal das SGPS’s, à data daquela Circular, 1997, e à data dos factos sub judice, 2013, é o mesmo, na parte que aqui releva.
26. Entendimento contrário ao da própria AT que atropela o princípio da boa-fé e da protecção da confiança e legítimas expectativas dos administrados/contribuintes (cfr. artigos 266º nº 2 da CRP e 10º do CPA).
27. Sendo certo que a AT está juridicamente vinculada à interpretação da lei que a própria anteriormente expressou em circular administrativa (cfr. artigo 68º-A nº 1 da LGT).
Nestes termos, nos melhores de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., concedendo provimento ao presente recurso e, consequentemente, revogando a douta Sentença recorrida e julgando a Impugnação procedente, com as legais consequências, V. Exas., como sempre, farão inteira JUSTIÇA.”.

A Recorrida – Fazenda Pública - veio apresentar contra-alegações, concluindo como segue:
“I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida em 1ª Instância que julgou improcedente a Impugnação Judicial, à margem referenciada, interposta pelo autor contra os actos de liquidação de Imposto de Selo (IS) do ano de 2013 com o n.ºs 20156430002197 (€ 11.125,77), e das liquidações de juros compensatórios n.ºs 201500002355287 a 20150000235594, no montante total de € 1.014,02, num total de € 12.139,79.
II. Visa a presente impugnação judicial a anulação do Acto Tributário de liquidação de imposto de selo que incide sobre o apoio financeiro concedido pela impugnante A………….. à sociedade B……………. SA no sentido de satisfazer as necessidades financeiras e de financiamento das atividades desta empresa, de acordo com o previsto e preceituado no n.º 1 do CIS compaginado com a verba 17.1.4 da Tabela Geral de IS.
III. A AT acompanha a Douta Sentença no sentido de que aquilo que se tributa, na medida em que se encontra sujeito a IS, são as transferências de saldos entre empresas que correspondem a financiamentos obtidos e concedidos através de operações de tesouraria que se consubstanciam e materializam nestas ditas operações.
IV. E é à A………….. concedente do crédito, aquela a quem incumbe a liquidação e entrega nos cofres do Estado, razão pela qual a AT na ausência dessa entrega promoveu a respetiva liquidação.
V. São condições imperativas da isenção da al) g) do n.º 1 do artigo 7º do CIS, apelada pela parte, estas sem condições de afastamento por vontade das partes intervenientes, logo obrigatórias, o prazo, ou seja, que as operações de tesouraria não excedam o prazo de um ano, se destinem exclusivamente a cobertura de carências de tesouraria, bem como a qualidade das intervenientes, em favor de SGPS desde que com ela se encontrem em relação de domínio ou grupo, ou ainda se se verificar uma detenção de capital social de entidades nas quais a participação no capital não seja inferior a 10% do capital e desde que a participação esteja na titularidade da cedente durante um ano consecutivo ou desde a constituição da entidade participada, ainda que os intervenientes estejam sediados em território nacional.
VI. Ficou provado dos autos que a impugnante não reunia as condições e plasmadas na Lei para beneficiar de qualquer isenção e a sua participação na financiada B………………, era apenas de uns escassos 0,1% do capital social, (inferior aos 10% exigidos) razão pela qual nunca poderia usufruir da isenção consignada na al) g) do nº 1 do artigo 7.º do CIS, pelo que não se verifica qualquer erro na liquidação que seja imputável à AT, pelo que se mostram integralmente devidos os juros compensatórios cobrados.
Termos em que não deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional devendo manter-se na ordem jurídica as liquidações impugnadas”

Colhidos os vistos legais cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:
1. A coberto da Ordem de Serviço n.º OI201500242, de 31 de Julho de 2015, dos Serviços de Inspecção Tributária, da Unidade dos Grandes Contribuintes, a Impugnante foi alvo de um procedimento de inspecção tributária relativamente ao IS, do período de tributação de 2013 (cfr. relatório final de inspeção tributária, de fls. não numeradas do 2.º volume do processo administrativo tributário, em apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
2. No dia 16 de Novembro de 2015, os Serviços de Inspecção Tributária, da Unidade dos Grandes Contribuintes, elaboraram o relatório final do procedimento de inspecção tributária identificado no ponto antecedente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)
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(…)
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(…)
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(…)” (cfr. relatório final de inspeção tributária, de fls. não numeradas do 2.º volume do processo administrativo tributário, em apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
3. Sobre o relatório descrito no ponto antecedente recaiu um despacho do Director Adjunto da Unidade dos Grandes Contribuintes, datado de 24 de Novembro de 2015, no sentido de “
1. Concordo
2. Remeta-se auto de notícia ao SF competente.
3. Notifique-se o contribuinte nos termos do art. 62.º do RCPITA. (…)” (cfr. despacho, de fls. não numeradas do 2.º volume do processo administrativo tributário, em apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
4. Na sequência do relatório descrito nos pontos antecedentes, os serviços da administração tributária emitiram, em nome da Impugnante, a liquidação de IS n.º 2015 6430002197, do período de tributação de 2013, no valor de € 11.125,77, e as liquidações dos correspondentes juros compensatórios, com os n.ºs 2015 00002355287 a 2015 00002355294, no valor de € 1.014,02, o que perfaz o valor total a pagar de € 12.139,79 (cfr. demostração de liquidação de imposto de selo de juros compensatórios, de fls. 19 do 2.º volume do processo administrativo tributário, em apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
5. No dia 25 de Maio de 2016, a Impugnante remeteu ao Serviço de Finanças de Coruche, uma reclamação graciosa contra as liquidações identificadas no ponto antecedente, via fax (cfr. data aposta no fax e petição de reclamação, de fls. 11 a 18 do 2.º volume do processo administrativo tributário, em apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
6. No dia 03 de Novembro de 2016, a Divisão de Gestão e Assistência Tributária, da Unidade dos Contribuintes, elaborou uma informação, onde se pode ler, designadamente, que “(…)
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(…)
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(…)” (cfr. informação, de fls. 16 a 19 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
7. Sobre a informação descrita no ponto antecedente recaiu um despacho da Chefe de Divisão de Gestão e Assistência Tributária, da Unidade dos Grandes
Contribuintes, datado de 04 de Novembro de 2016, no sentido de “
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(…)” (cfr. despacho, de fls. 16 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
8. Através de ofício, datado de 04 de Novembro de 2016, os serviços da Unidade dos Grandes Contribuintes comunicaram à Impugnante a decisão descrita nos pontos antecedentes (cfr. ofício, de fls. 15 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
9. No dia 07 de Fevereiro de 2017, e Impugnante remeteu a este Tribunal a presente impugnação judicial, via fax (cfr. data do fax aposta na petição inicial, de fls. 01 a 10 dos autos, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
10. Pelo menos, desde 04 de Abril de 2006, a Impugnante tem sede na Zona Industrial ……………., na freguesia e concelho de Coruche, do distrito de Santarém (cfr. prints do portal de justiça, de fls. juntas aos presentes autos pelo despacho que antecede, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
11. Pelo menos, desde 28 de Junho de 2006, a sociedade B..……….. SA tem sede na freguesia de Santa Maria de Lamas, do concelho de Santa Maria da Feira, do distrito de Aveiro (cfr. prints do portal de justiça, de fls. juntas aos presentes autos pelo despacho que antecede, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
12. A coberto da Ordem de Serviço n.º OI201700178, de 02 de Outubro de 2017, dos Serviços de Inspecção Tributária, da Unidade dos Grandes Contribuintes, a Impugnante foi alvo de um procedimento de inspecção tributária relativamente ao IS, do período de tributação de 2015 (cfr. relatório final de inspeção tributária, de fls. juntas aos presentes autos pelo despacho que antecede, cujo teor se dá por integralmente reproduzido);
13. No dia 29 de Dezembro de 2017, os Serviços de Inspecção Tributária, da Unidade dos Grandes Contribuintes, elaboraram o relatório final do procedimento de inspecção tributária identificado no ponto antecedente, onde se pode ler, designadamente, que “(…)
[IMAGEM]
(…)
(…)” (cfr. relatório final de inspeção tributária, de fls. juntas aos presentes autos pelo despacho que antecede, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).
Nada mais se deu como provado.

Há que conhecer do recurso que nos vem dirigido.
A questão que vem colocada no presente recurso, tal como identificada na sentença recorrida, passa por saber se o apoio financeiro concedido pela Impugnante, uma SGPS, à sociedade B…..….., SA está isento de IS.
Face aos termos em que vem delineado este recurso, v.g. as conclusões das alegações anteriormente reproduzidas, a recorrente apenas pede a este Supremo Tribunal que reanalise a pretendida isenção do Imposto de Selo face ao disposto nos artigos 1º nº 1 e 7º nº 1 g) do CIS, e verba 17.1 da TGIS anexa ao CIS, cfr. conclusões 3) e 10).

Após enunciar as normas pertinentes aplicáveis ao caso concreto, sendo que as partes não divergem quanto à sua adequação ao caso concreto, apenas divergem quanto à sua interpretação, escreveu-se na sentença recorrida, tendo sempre presente a matéria de facto levada ao probatório:
In casu, da análise do relatório das incidências processuais decorre que não é controverso de que as operações financeiras em causa nos presentes autos, consubstanciadas na concessão de créditos, por parte da Impugnante, à sociedade B……………….., SA, estão sujeitas a IS, nos termos dos arts. 1.º, n.º 1, e 4.º, n.º 1 do CIS e na verba 17.1 da TGIS (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).
Por conseguinte, resta tão-somente averiguar se as referidas operações beneficiam de alguma isenção, ao abrigo do disposto no art. 7.º, n.ºs 1, als. g), h) e i), 2 e 3, do CIS, na redacção vigente à data dos factos, conforme é sustentado pela Impugnante (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 e 10 a 13 do probatório).
E, neste sentido, extrai-se dos autos que a Impugnante, com sede na Zona Industrial …………….., na freguesia e concelho de Coruche, do distrito de Santarém, faz parte de um grupo de sociedades, composto pela Impugnante e pelas sociedades C……………. SGPS, SA, D…………….. , SA, B………, SA e E………… (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 e 10 do probatório).
Resulta, igualmente, dos autos que, pelo menos, desde 30 de Abril de 2013, o capital social da Impugnante é detido a 100% pela sociedade B…………….. SA, com sede na freguesia de Santa Maria de Lamas, do concelho de Santa Maria da Feira, do distrito de Aveiro, sendo que, entre os dias 30 de Abril de 2013 e 30 de Abril de 2015, a Impugnante foi titular de uma participação de 0,10% do capital social dessa mesma sociedade, SA, adquirida pelo valor de € 108.000,00 (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 e 11 a 13 do probatório).
Para além disso, deriva dos autos que, no dia 11 de Junho de 2012, a Impugnante concedeu um financiamento à sociedade B……………….., SA, sob a forma de conta corrente, sem plafond, destinado exclusivamente a suprir carências de tesouraria, por um prazo não superior a um ano, no valor de € 2.303.000,00, sem que tivesse procedido à liquidação de IS (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).
E, ainda, que a sociedade B……………….., SA reembolsou a Impugnante da totalidade daquele valor, em 30 de Abril de 2013 (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).
Mais, deriva dos autos que, no dia 30 de Abril de 2013, a sociedade B……………., SA solicitou à Impugnante a abertura de crédito, em conta corrente, sem plafond, destinado exclusivamente a suprir carências de tesouraria, por um prazo não superior a um ano, no valor de € 2.340.000,00, tendo a Impugnante concedido esse financiamento, em 01 de Maio de 2013, sem proceder à liquidação de IS, por considerar que o mesmo estava isento, ao abrigo do disposto no art. 7.º, n.º 1, al. g), do CIS (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).
Por último, verifica-se que a sociedade B……………., SA fez a primeira utilização daquele valor, em 02 de Maio de 2013, tendo reembolsado a Impugnante da quantia de € 52.000,00, em 28 de Maio de 2013, e que, depois de ter utilizado um valor adicional de € 37.500,00, a mesma reembolsou a Impugnante da totalidade do valor em falta, em 30 de Abril de 2014 (cfr. pontos n.ºs 1 a 3, 12 e 13 do probatório).
Ora, atenta esta sucessão de factos, é manifesto que as operações financeiras supramencionadas não beneficiam de isenção de IS, nos termos do art. 7.º, n.ºs 1, als. g), h) e i), 2 e 3 do CIS, na redacção vigente à data dos factos (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 e 10 a 13 do probatório).
Senão vejamos.
Relativamente à isenção prevista no art. no art. 7.º, n.º 1, al. g), do CIS, na redacção originária, anterior às alterações introduzidas pela Lei n.º 83-C/2013, de 31.12, a mesma não é de aplicar ao caso dos presentes autos, desde logo, porque, não obstante estarem em causa créditos concedidos pela Impugnante à sociedade B………………., SA, por prazo não superior a um ano, exclusivamente destinados à cobertura de carências de tesouraria, e de ambas as sociedades terem sede em território nacional, não resulta dos autos que a Impugnante, enquanto SGPS, possuísse uma influência dominante sobre a sociedade B………………., SA, nos termos que vêm previstos no art. 486.º do Código das Sociedades Comerciais (CSC) (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 e 10 a 13 do probatório)
Para além disso, porque também não deriva dos autos que a Impugnante detivesse naquela sociedade uma participação igual ou superior a 10% do capital social, com direito de voto, ou que, sendo essa percentagem inferior, o respectivo valor de aquisição tivesse sido igual ou superior a € 4.987.978,97, ou sequer que essa aquisição tivesse derivado de uma fusão ou cisão da sociedade participada, em conformidade com o disposto nos arts. 1.º, n.º 2, e 3.º, n.º 3, als. b) e c), do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30.12 (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).
Na realidade, se alguma coisa se extrai dos autos é que a participação da Impugnante nessa sociedade não ultrapassou 0,10% e que o respectivo valor de aquisição quedou-se em € 108.000,00, ficando assim muito aquém dos valores exigidos nas citadas disposições legais (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).
Depois, porque o apoio financeiro em questão foi concedido pela Impugnante à sociedade B………………., SA e não o inverso, pelo que não se pode dizer que se trata de uma operação financeira efectuada em benefício de uma SGPS, já que a mesma foi realizada a favor de uma sociedade anónima que não é uma SGPS (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 do probatório).

Aqui chegados, sendo certo que não estão preenchidos todos os pressupostos necessários à aplicação das isenções de IS, previstas no art. 7.º, n.ºs 1, als. g), h), e i), do CIS, não resta outra alternativa senão a de concluir que a Impugnante estava obrigada a liquidar o IS sobre a realização dessas operações, em cumprimento do estipulado nos arts. 1.º, n.º 1, 2.º, n.º 1, al. b), 5.º, n.º 1, al. g), 23.º, n.º 1, 41.º e 44.º, n.º 1, do CIS e da verba 17.1 da TGIS (cfr. pontos n.ºs 1 a 3 e 10 a 13 do probatório).

Vejamos então.
Dispunham à data dos factos, anos de 2012 e 2013, os referidos artigos:
Artigo 1.º - Incidência objectiva
1 - O imposto do selo incide sobre todos os actos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.
Este artigo passou a ter a seguinte redacção ainda no período respeitante ao caso dos autos:
1 - O imposto do selo incide sobre todos os atos, contratos, documentos, títulos, papéis e outros factos ou situações jurídicas previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens - redacção da Lei n.º 55-A/2012, de 29 de Outubro;
Artigo 7.º - Outras isenções:
1 - São também isentos do imposto:
g) As operações financeiras, incluindo os respectivos juros, por prazo não superior a um ano, desde que exclusivamente destinadas à cobertura de carência de tesouraria e efectuadas por sociedades de capital de risco (SCR) a favor de sociedades em que detenham participações, bem como as efectuadas por sociedades gestoras de participações sociais (SGPS) a favor de sociedades por elas dominadas ou a sociedades em que detenham participações previstas no n.º 2 do artigo 1.º e nas alíneas b) e c) do n.º 3 do artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 495/88, de 30 de Dezembro, e, bem assim, efectuadas em benefício da sociedade gestora de participações sociais que com ela se encontrem em relação de domínio ou de grupo.

A recorrente pretende, no essencial, que sempre poderia beneficiar da isenção do imposto de selo em causa, porque a Impugnante/Recorrente e a AI eram ambas dominadas e detidas, directamente (no caso da AI) e indirectamente (no caso da Impugnante/Recorrente), apenas pela sociedade CA, uma SGPS, estando, por isso, numa relação de grupo e de domínio total entre todas elas, nos termos dos artigos 486º e 488º e ss. do CSC.

Ao contrário do alegado pela recorrente, para efeitos de beneficiar da isenção de IS pretendida não basta que as entidades intervenientes na operação de financiamento façam parte de um grupo empresarial ou económico, e que todas elas se encontrem numa relação de grupo e de domínio por referência a uma terceira entidade, é essencial que se mostrem verificados os requisitos exigidos pelo referido artigo 7º, n.º 1, g) relativamente às entidades ai expressamente designadas e que são as que devem ser as participantes no financiamento.
Ou seja, as relações e posições relativas de cada uma das concretas sociedades intervenientes no apoio financeiro de que tratam os autos, não se subsumem à norma legal que a impugnante pretende ver aplicada à situação concreta dos autos e que lhe permitiria beneficiar da isenção do imposto de selo, sendo de todo irrelevante que a posição de dominância seja por referência a uma terceira entidade que não foi participante no negócio.
Nem as sociedades participantes no negócio têm as qualidades, natureza e características legalmente exigidas para a concessão da referida isenção do imposto.
Ou seja, ao contrário do alegado pela recorrente, sempre seria indiferente para efeitos da isenção pretendida, que o negócio concreto dos autos fosse legal ou ilegal face ao Código das Sociedades Comerciais, isto é, proibido ou não por lei, uma vez que não se mostram preenchidos os requisitos legalmente estabelecidos para que a referida isenção possa ser concedida ou reconhecida, ainda que de forma automática.
A interpretar-se a norma em causa tal como pretendido pela recorrente, o sentido que daí se retiraria não teria qualquer apoio legal no texto da Lei, cfr. artigo 9º, n.º 2 do Código Civil, levando o intérprete a criar uma norma com contornos diferentes, afastando-se por completo da relação de domínio societário específico legalmente prevista, não cabendo, igualmente, à Administração Tributária e Aduaneira a função interpretativa da Lei com força obrigatória, mesmo para os Tribunais.
Daqui resulta, assim, que não está demonstrado o erro de julgamento que vem apontado à sentença recorrida, antes se terá que concluir que se interpretou a norma em causa segundo as regras estabelecidas no artigo 9º do Código Civil, não se podendo, portanto, concluir que tenha ocorrido um julgamento errado.

Pelo exposto, acordam os juízes que compõem a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
D.n.

Lisboa, 9 de Dezembro de 2021. – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia (relator) – Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos – Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro.